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História | Folclore | Meio Ambiente | Arquitetura | Gastronomia | Turismo Ubatuba exibe uma riqueza cultural harmônica e singular Cidade de paisagens exuberantes: EDIÇÃO 01 www.cidadeecultura.com.br Nº01 - R$ 10,00 - Brasil

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Revista cultural de Ubatuba

Transcript of Ubatuba/SP

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História | Folclore | Meio Ambiente | Arquitetura | Gastronomia | Turismo

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exibe uma riqueza cultural harmônica e singular

Cidade de paisagens exuberantes:

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Índice

06 34 86LINHA DO TEMPOFatos históricos marcantes na evolução da cidade de Ubatuba

ArTEsANATOA mistura da arte nas cores vivas do mar e da floresta

VIDA DE CAIçArACultura tradicional ainda preservada em muitas praias

08 38 90HIsTÓrICOPalco de um acordo revolucionário entre nativos e colonizadores

MEIO AMbIENTE Um reduto de capital importância da valorização ambiental

NãO DEIxE DE VIsITArDicas essenciais para sua estada

16 56 92rELIgIOsIDADEFé, sentimento imprescindível aos que tinham o mar como desafio diário

QuILOMbOO passado vivo pulsante e intrigante para os dias atuais

sE Eu FOssE VOCêMomentos gravados para sempre

18 62 94ILHA ANCHIETASaiba tudo sobre uma fantástica história de inteligência e astúcia

ÍNDIOsA sabedoria da mata e o convívio coeso do povo com suas crenças

gENTE DA TErrAUm povo que sabe viver muito bem

26 72 96FOLCLOrEA tradição cultural do Brasil ainda preservada

LENDAsO imaginário sob a luz do luar e o barulho da mata, faz a magia

DADOs EsTATÍsTICOsGeral sobre os números da cidade

30 76ArQuITETurAA importância da história de Ubatuba retratada nos detalhes de seus casarios

EsPOrTEsAs inúmeras atividades esportivas para o corpo e a alma

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CIDADE & CULTURA é uma publicação anual da ABCD Cultural.Todos os artigos aqui publicados são de responsabilidade dos autores, não representando neces sariamente a opinião da revista. Todos os direitos reser vados. Proibida a cópia ou reprodução (parcial ou integral) das matérias e fotos aqui publicadas.

EDITORIA

COnsELhO ExECUTIvO: Eduardo Hentschel, Luigi Longo, Márcio Alves e Roberto Debouch

EDITORA: Renata Weber Neiva

REpORTAgEm: Elaine Leme e Nathália Weber AssIsTEnTE DE pRODUçãO: Thabata Alves

pRODUçãO gRáfICA: Purim Comunicação Visual (www.purimvisual.com.br)

pRODUçãO DIgITAL: OnePixel (www.onepixel.com.br)

pRODUçãO AUDIOvIsUAL: VSet (www.vset.com.br)

fOTOgRAfIAs: Bera Palhoto, Tatyana Andrade e Márcio Alves

fOTO CApA: Francisco Petrone

ImpREssãO: Gráfica Silvamarts

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Podemos dizer que conhecer a fundo a cidade de Ubatuba nos modificou em muitas formas de pensar. Quando entra-mos em contato com pessoas simples no pensar, mas que carregam uma sabedoria fantástica, como é o caso do pes-cador apelidado de Inglês, vimos como a vida deve ser sim-plificada em todos os aspectos. Apesar das dificuldades ge-ográficas de acesso de muitas comunidades, o tempo aqui não é fator determinante de ansiedade ou estresse. Nesta cidade o que se dá importância é o desprendimento material supérfluo e a valorização do essencial. Essencial para eles é ter seu peixe, sua farinha, uma viola à beira do mar, sua rede de pesca perfeita e a proteção de São Pedro Pescador.

Renata Weber Neiva

Editorial

Gente da terraUm povo que sabe viver muito bem

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Linha do tempo

1450

XVII e XIX XIX

Por volta de

Entre os séculos Final do século

1855

1500 1554

1808

Sambaquieiros, ocupação humana mais antiga na região

Abertura dos Portos por D. João VI - a cidade prospera

A costa brasileira foi invadida por corsários e piratas

A diminuição da importância da cana foi acompanhada pelo crescimento do café

entra em decadência o ciclo do engenho da cana-de-açúcar

A estrada de Ferro D. Pedro II é construída, levando Ubatuba ao isolamento

Descobrimento do Brasil

Confederação dos Tamoios – revolta contra os colonizadores portugueses

Tupiniquins e Tupinambás, tribos indígenas que disputavam território na região

Ubatuba é constituída como cidade

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2013

Década de

1557 1563 1728

1888 1952 1957 1980

1637

Ocorreu a Abolição da Escravatura

A Estrada de Ferro D. Pedro II é construída, levando Ubatuba ao isolamento

Inaugurada a Rodovia Floriano Rodrigues Pinheiro (SP 123), comunicação importante para o Turismo

Iniciou-se a construção da Rodovia Tamoios facilitando o acesso para o Litoral norte

Fica pronta a Rodovia SP 55, consagrando de vez o acesso à cidade de Ubatuba

Paz de Iperoig – coordenada pelos jesuítas Manoel da Nóbrega e José de Anchieta

Publicado o livro de Hans Stadem “Duas Viagens ao Brasil”

Fundação de Ubatuba

Foi elevada a Vila Nova da Exaltação à Santa Cruz do Salvador de Ubatuba

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Histórico

A origemde bravos guerreiros

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A origem

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A região do litoral de São Paulo era povoada por várias tribos indígenas que, com seus “códigos de ética”, viviam em aparente harmonia. Com a chegada dos colonizado-res portugueses e mais tarde dos franceses, a “calma-ria” entre as tribos foi extinta. Os colonizadores tinham como finalidade, transformar os índios em mão-de-obra escrava, mas, pelo temperamento guerreiro de algumas tribos, tanto os portugueses, como franceses aliaram-se aos mais rebeldes. Isso gerou uma grande rivalidade. Em Ubatuba, a tribo existente era a dos Tupinambás. Esta cidade foi palco de um dos primeiros tratados dos nati-vos do Brasil. A conscientização dos índios veio com a chamada Confederação dos Tamoios, prova da disputa desses nobres guerreiros contra cruéis forasteiros.

TupinambásAntes dos portugueses, os Tupinambás eram tribos

habitantes do litoral brasileiro. Índios guerreiros, ariscos e extremamente selvagens, não se submeteram ao domínio dos colonizadores. Construíam suas casas (tabas) no alto dos morros e margens de rios. De gênio alegre, eram mú-sicos, dançarinos e construíam vários instrumentos mu-sicais como tambores e flautas. Fabricavam canoas com a madeira cedro, guapuruvus e imbiricus. Lutaram brava-mente contra a invasão de suas terras e eram extrema-mente temidos, pois o canibalismo fazia parte de suas tra-dições. Entenda-se que o canibalismo era, para eles, um ritual, no qual se sacrificava um adversário corajoso nos aniversários do cacique e do pajé. As mulheres comiam as vísceras, as crianças tomavam o sangue para crescerem fortes e os homens comiam o cérebro, para possuírem a coragem e o espírito guerreiro de seu rival. Muitos perso-nagens foram devorados como Francisco Pereira Coutinho (antigo donatário de Salvador).

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Confederação dos Tamoios “A Confederação dos Tamoios foi a reunião dos

chefes índios da região do Litoral Norte paulista e sul fluminense que ocorreu entre 1554 e 1567. O principal motivo da Confederação dos Tamoios , que reuniu diversos caciques, foi a revolta ante a ação violenta dos portugueses contra os índios Tupinam-bás, causando mortes e escravidão. Na língua dos Tupinambá “Tamuya” quer dizer “o avô, o mais ve-lho, o mais antigo”. Por isso essa Confederação de chefes chamou-se Confederação dos Tamuya, que os portugueses transformaram em Confederação dos Tamoios. Cunhambebe foi eleito chefe e junto com Pindobuçú, Koakira, Araraí e Aimberê resolveu fazer guerras aos portugueses. O problema entre Tupinambás e Portugueses tem início com o casa-mento de João Ramalho, português e braço direito de Brás Cubas, governador da Capitania de São Vi-cente, com a filha de Tibiriçá, chefe dos índios Guaia-nazes. Desse casamento nasceu uma aliança entre brancos e Guaianazes contra as outras nações in-

dígenas. Quando a nação Tupinambá foi atacada, o chefe da aldeia de Angra dos Reis, Cunhambebe, in-vestiu contra as propriedades portuguesas. Enquan-to isso, Brás Cubas continuava a escravizar índios e aprisionou um chefe Tupinambá, Kairuçu, e seu filho Aimberê. Kairuçu morreu dos maus tratos recebidos e Aimberê conseguiu organizar uma fuga em massa das propriedades de Brás Cubas.

Livre do cativeiro, Aimberê encontrou-se com Pindobuçu, da aldeia Tupinambá do Rio de Janeiro, Cunhambebe, da aldeia de Angra dos Reis, Koakira, da aldeia de Ubatuba e Agaraí, chefe dos Guainases, e ainda com os índios Goitacases e Aimorés. Assim, em ataque aos portugueses, foi formada a Confede-ração dos Tamoios, chefiada por Cunhambebe.

Nessa ocasião chegaram os franceses ao Rio de Janeiro. Villegaignon, o chefe francês, aliou-se aos Tupinambás para garantir sua permanência no Rio de Janeiro e ofereceu armas a Cunhambebe para lutar contra os portugueses. Outra nação indígena, Termiminó, aliou-se aos portugueses contra os Tu-

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Histórico

gravura do Museu Histórico de Ubatuba

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A pintura O último tamoio de Rodolfo Amoêdo (1857-1941)

pinambás e os franceses, acirrando as disputas. Um surto de doenças, contraído pelo contato com o branco, dizimou centenas de índios, entre eles Cunhambebe. Aimberê foi escolhido o novo chefe e a luta continuou. Aimberê procurou o apoio de Tibiriçá e, juntos, combinaram lutar contra os portugueses num prazo de três luas. Acirrou-se assim a luta entre os Tupinambás e seus aliados contra os portugue-ses.” Fonte: Funart.

Portanto “tamoio” não se trata de um etnônimo. Os portugueses não encontraram facilidade para colonizar. Por muitas décadas, a única resistência organizada contra a invasão ibérica foi a Confedera-ção dos Tamoios que com apenas 160 canoas (al-gumas com 13 metros e 30 tripulantes), segundo relatos dos jesuítas, muitas batalhas foram ganhas. Os jesuítas Manoel da Nóbrega e José de Anchie-ta, em 1563 conseguiram selar uma trégua, na qual os portugueses foram obrigados a libertar todos os indígenas escravizados, chamada a Paz de Iperoig (antigo nome de Ubatuba). Foi nessa época que An-chieta escreveu na praia de Iperoig muitos de seus 4.172 versos do famoso “ Poema à Virgem”. Mas os interesses portugueses eram transformar mesmo os índios em escravos. Esta era uma empreitada dificí-lima, o que levou os lusos, por meio do escambo, a importar escravos africanos.

Hans Staden (1525 – 1579)Mercenário alemão que, por duas vezes, participou de

lutas contra o franceses – a última na Capitania de São Vicente. Depois de naufragar próximo a São Vicente, Hans foi ser artilheiro no Forte de São Felipe Bertioga. Caiu nas mãos dos inimigos, os Tupinambás, e foi levado para Uba-tuba. Ali permaneceu cativo por nove angustiantes meses. Foi resgatado pelo navio francês Catherini de Vetteville. Após terrível experiência, o mercenário escreveu um livro intitulado “Warhaftige Historia und Beschreibung eyner Landtschafft der wilden, nacketen, grimmigen Menschfres-ser Leuthen in der Newenwelt America gelegen” comumen-te chamado de “Duas Viagens ao Brasil” publicado em Marburgo, Alemanha, em 1557. Leia os trechos:

“Formaram um círculo ao redor de mim, ficando eu no centro com duas mulheres, amarraram-me numa per-na um chocalho e na nuca penas de pássaros. Depois começaram as mulheres a cantar e, conforme um som dado, tinha eu de bater no chão o pé onde estavam ata-dos os chocalhos.

As mulheres fazem bebidas. Tomam as raízes de man-dioca, que deixam ferver em grandes potes. Quando bem fervidas tiram-nas (...) e deixam esfriar (...) Então as mo-ças assentam-se ao pé, e mastigam as raízes, e o que fica mastigado é posto numa vasilha à parte.

Acreditam na imortalidade da alma(...).”

Cena de Antropofagia (um ritual indígena).“Voltando da guerra, trouxeram prisioneiros. Leva-

ram-nos para sua cabana: mas muitos feridos desem-barcaram e os mataram logo, cortarm-nos em peda-ços e assaram a carne (...) Um era português (...) O outro chamava-se Hyeronimus; este foi assado de noite.” Viagem ao Brasil - Rio de Janeiro : Academia Brasileira, 1930.

Relevo de Hans Staden

(1525 – 1579) Homberg

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José de Anchieta Nascido em Tenerife, nas Ilhas Canárias, José de An-

chieta, filho de família nobre, não tendo vocação às armas, ingressou no colégio jesuíta da Universidade de Coimbra, em 1551. Aos 19 anos acompanha Duarte da Costa, na expedição ao Brasil e chega a São Vicente. Em 1554, An-chieta e o jesuíta Manuel da Nóbrega sobem a Serra do Mar e fundam um colégio destinado principalmente à ca-tequização dos índios em Piratininga – mais tarde definida como a cidade de São Paulo. Fazia de tudo um pouco des-de medicar até ensinar latim aos índios.

Com os vários ataques dos índios Tamoios na região de Piratininga, o Jesuíta parte para Iperoig (Ubatuba), tentar uma conciliação pacífica, mesmo contrariando as ordens de Duarte da Costa. Apesar de duras penas, tornando-se cativo dos índios, ele consegue seu intento levando a paz da província. Mas precisava fazer mais e migrou para o Rio de Janeiro, onde lutou ao lado de Es-tácio de Sá contra os franceses, e Salvador. Em 1585 o missionário, no Espírito Santo, fundou Guarapari e fale-ceu, aos 63 anos, na cidade de Iriritiba, hoje chamada de Anchieta, para onde seu corpo foi levado e sepultado. Muitos fatos inexplicáveis pela ciência giraram em torno dessa personalidade incrível de Anchieta como o fato dos índios o acharem um feiticeiro por terem visto-o levitar em seu cativeiro, ou até pessoas atribuírem-lhe milagres como curas impossíveis.

Anchieta foi gramático, teatrólogo, poeta e historiador. Muito contribuiu com seu aprendizado nas Américas, dei-xando um legado enorme para as gerações vindouras como: “De gestis Mendi de Saa” (“Os feitos de Mem de Sá”), primeiro poema épico da America.

Em 1980 José de Anchieta foi beatificado por João Paulo II.

A morte do padre Anchieta, em detalhe do quadro Glorificação de Anchieta,de Lucílio de Albuquerque

Anchieta escrevendo na areia, óleo de Benedito Calixto

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Ubatuba: sítio das canoas ou das canas

Salvador Corrêa de Sá e Benevides, Governador Geral do Rio de Janeiro, agilizaram a ocupação da re-gião, após a Paz de Iperoig, transformando-a em pólo colonizador fixo. Após tanta demonstração de bravura, Ubatuba foi fundada em 28 de outubro de 1637. Em 1728, foi elevada a vila, com o nome de Vila Nova da Exaltação à Santa Cruz do Salvador de Ubatuba, e em 13 de março de 1855, à cidade.

Com a decosberta de ouro na Minas Gerais, Uba-tuba transforma-se em área de produção de cana--de-açúcar, construindo vários engenhos, serrarias, olarias e um porto praticamente natural para escoa-mento dessa produção. Essa prosperidade é abalada quando, em 1787, o Governador de São Paulo decreta uma lei na qual todas as mercadorias deveriam ser movimentadas no porto da cidade de Santos. Mas, com a abertura dos portos ao exterior, decretada por Dom João VI em 1808, o porto cresce principalmen-te pelo escoamento da produção de todo o Vale do Paraíba e Minas Gerais, transformando-o no porto o mais movimentado de todo o estado. Todavia, mais um grande golpe assola a sorte da região, quando da construção da estrada de ferro D. Pedro II, que ia de São Paulo ao Rio de Janeiro, onde a tal produção

era levada ao porto do Rio. Devido à sua geografia, Ubatuba ficou isolada, tão isolada que, para ir ou vir à cidade demorava-se dias, tanto por mar como por terra. O isolamento total foi crucial a um período es-tagnado, caracterizado pela agricultura e pesca de sobrevivência.

Finalmente, em 1953, as Rodovias que ligam Uba-tuba a Taubaté e depois a Rio-Santos, transformou a região em um ponto turístico de fenomenal atração até os dias de hoje.

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Primeira fábrica de vidros do Estado de São Paulo

Há controvérsias em relação a esse pioneirismo em fabricação de vidros no Brasil, mas sabemos que aqui eram feitas as garrafas para aguardentes que eram exportadas. Porém, com a proibição da manufa-tura no Brasil, ordem essa de Portugal, a fábrica foi obrigada a ser desativada. Hoje, apenas uma peque-na amostra desse tempo ainda resiste e fica a 25 km do centro de Ubatuba, na Lagoinha.

Ruínas do Ipiranguinha No sentido Bairro do Ipiranguinha pela Rodovia SP

125, o acesso pode ser efetuado pela Cachoeira do Ipiranguinha. Se for a pé, siga por uma trilha, ou de carro por uma estrada de terra, pelo Horto Florestal, ao lado do rio. Esse bairro servia como entrada ao Vale do Paraíba, onde encontramos as Ruínas do Ipi-ranguinha, construção em pedra, datada do século XVII, que formava uma fazenda com variedade de pro-dutos grande e servia também para a estocagem e ar-mazenamento de material de escambo que vinham do Vale, permanecendo em alta até o início do século XX.

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Fotos do Museu Histórico de Ubatuba, situado na Cadeia Velha da cidade, onde abrigava “meliantes” na era do café. Sua edificação é considerada Patrimônio Histórico Municipal. Hoje abriga peças de várias épocas da região.

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Ruínas da LagoinhaAs ruínas em pedra e cal da Fazenda Bom Retiro es-

tão localizadas próximo ao km 72, da Rodovia Rio-Santos, sentido serra. Construídas, segundo estudos recentes, provavelmente no início do século XIX, antes da abertura de subscrição pública - venda de ações, por um dos pri-meiros proprietários da Lagoinha, o engenheiro francês Stevenné, em 1828; são remanescentes de uma Uba-tuba próspera, quando em seu porto eram negociadas e exportadas a produção valeparaibana, trazida pelos tro-peiros pela estrada Ubatuba-São Luís do Paraitinga, e a ubatubana (aguardente, açúcar mascavo, milho, fumo...). Nesse período, assim como Stevenné, muitos outros es-trangeiros: os Vigneron Jussilendiere, Garroux, Bourget (Borgete ou Borges), Charleaux, Bruyer (Brié ou Brulher) etc., foram atraídos para a abastada vila da Exaltação da Santa Cruz do Salvador de Ubatuba. As Ruínas do Antigo Engenho da Fazenda Bom Retiro da Lagoinha do Muni-cípio de Ubatuba, foram tombadas pelo CONDEPHAAT - Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueoló-gico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo em 16 de dezembro de 1985, para sua proteção e valorização enquanto Patrimônio Histórico de suma importância para o Município. Foi classificado como engenho devido ao grande aqueduto existente e ao que restou das instala-ções de uma roda d’água. O terreno onde se encontram as Ruínas foi doado pelo senhor Jamil Zantut e sua espo-sa Benedicta Corrêa Zantut à FUNDART em 19 de outubro de 1989. O engenheiro francês João Agostinho Stevenné ou Stevenin, no início do século, proprietário, também, da Maranduba e Sapé, criou na Lagoinha um engenho de açú-car - uma grande fazenda modelo, escola para o ensino de novas técnicas para a fabricação de açúcar e introdução e propagação de carneiros merinós para a produção de car-vão animal, através de abertura de processo de subscrição pública de ações (venda de ações). A fazenda modelo na Lagoinha entrou em decadência por volta de 1850 com a evolução das técnicas agrícolas. As datas de compra da propriedade por Stevenné, anterior à da abertura de ações, e de venda do Engenho da Lagoinha são desconhecidas e objetos de estudo pelo Departamento de Patrimônio, Bi-blioteca e Arquivo, da FUNDART. Segundo relatos orais e recentes pesquisas, outro importante proprietário foi o Ca-pitão Romualdo, já no final do século, possuidor de vasta cultura de café e cana de açúcar, fabricante e exportador de aguardente e açúcar mascavo. Seus escravos teriam ganhado a liberdade com a abolição da escravatura, mas sem terem para onde ir e por gratidão e amizade, permane-ceram até o falecimento do fazendeiro.” Fonte: FUNDART

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Religiosidade

A influência cristã

na cultura local

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Procuramos em diversas fontes o significado mais próximo sobre religião para o que vimos principalmen-te nas comunidades caiçaras de Ubatuba. A definição mais cabível para o panorama encontrado é essa: “A etimologia tradicional faz derivar a palavra religião do la-tim: religio, religare [religar, ligar bem], o que nos permi-te afirmar que a religião é, assim, uma ligação entre os homens. A religião pode, portanto, definir-se como um sistema de crenças [dogmas] e de práticas [ritos] relati-vos ao sentimento da divindade [ou realidade sagrada] e que une na mesma comunidade moral [Igreja] todos aqueles que a ela aderem.” (www.eurosophia.com).

Conversamos com Frei Luiz Avelar, 45 anos, pároco da região há sete anos, que nos explicou a grandiosi-dade do que representa a religião nas muitas comuni-dades de Ubatuba. Antes, essas comunidades eram

atendidas apenas por três ou quatro padres que se dividiam entre todos os fiéis. Tarefa difícil de ser fei-ta devido às distâncias e acessos complicados, pois a área de abrangência ia de Maranduba até Camburí. Mas nem por isso a fé deixou de mover montanhas. Atualmente, esse território está dividido em cinco pa-róquias, são elas: Centro, que tem como padroeira a Santa Cruz da Exaltação; Perequê-Açú, como padroei-ra Nossa Senhora Imaculada Conceição; Ipiranguinha, como padroeira Nossa Senhora de Fátima; Itaguá, como padroeira Nossa Senhora das Dores; e Marandu-ba, como padroeira Nossa Senhora das Graças. Abaixo das paróquias, vem as comunidades: Matriz, São Fran-cisco, São Benedicto, Santo Expedito e Santa Clara.

Também não podemos esquecer as devoções parti-culares, como São Pedro que é o padroeiro dos pesca-

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dores. Ou seja, Ubatuba é o “resumo” do catolicismo. Logicamente toda essa devoção vem da colonização portuguesa, principalmente difundida pelos jesuítas. Essa religiosidade era fundamental, porque os primei-ros colonizadores se viam em terras inóspitas, cerca-dos de um povo totalmente diferente de sua cultura. Primordial também aos pescadores, povo que lida dire-tamente com o mar, que, segundo eles, a ajuda divina é a única que pode salvá-los de suas intempéries.

E essa demonstração unida em Cristo se dá em várias festas, como a Festa do Divino, muito esperada todos os anos. Há 146 anos ela é feita nos mesmos traços, sempre a partir da segunda semana de julho, que começa pela novena e depois com a procissão que sai da capela de São Francisco e vai até a Matriz; seu ápice é a festa que possui várias brincadeiras e comidas, sendo o prato principal a tainha. Aqui em Ubatuba, a festa é feita fora de época, pois segundo a tradição seria realizada na Pentecostes, porém, para contar com a presença dos pescadores, a data foi transferida para julho.

Uma curiosidade é a devoção a São Benedicto, que por ser um santo tão adorado, acaba participando de todas as festas religiosas.

Outra festa muito representativa é a de São Pedro que, como já dissemos, é o Santo protetor dos pesca-dores. Essa homenagem é feita em 29 de junho.

Altar mor da Matriz

Exaltação da Santa CruzMuitas definições foram compiladas para justificar o amor e adoração ao símbolo da Cruz, porém, entre tantas, esta acreditamos que seja a mais represen-tativa de maneira generalizada, não só ao Cristia-nismo, mas para todas as outras religiões: “A Cruz está de pé, enquanto o mundo gira”, cantava-se em séculos passados, aparecendo, assim, a Cruz como a rocha firme, o baluarte que não treme diante das coisas que passam. Ela é estável e firme! Ela está firme enquanto os acontecimentos humanos se de-senrolam aos seus pés, transformados pelo sangue redentor, pelo benefício de um amor eterno.” Fonte: http://www.universocatolico.com.br

A MatrizNão podemos falar da Matriz sem antes dar aten-

ção ao Frei Pio Populin, que como o nome parece dizer, popular. Morto aos 96 anos em 2009, essa figura foi crucial para organizar e levar a fé aos seus pastores. Um homem de generosidade ímpar e empreendedor do templo de Deus tendo ele mesmo erguido vários em comunidades distantes.

A construção da Matriz foi iniciada em 1780, substituin-do a primeira capela, que ficou pequena devido ao grande crescimento do porto no século XIX, que tinha como padro-eira, Nossa Senhora da Conceição. A realização do projeto para a Matriz atual teve muitos percalços pela falta de sub-sídios e, em 1842, foi criada uma loteria municipal em prol da Matriz. Em 1876, ainda inacabada, finalmente pode ser usada pelos fiéis e, somente em 1940, a obra foi conclu-ída. Porém esta foi elevada sob a invocação da Exaltação da Santa Cruz do Salvador de Ubatuba, comemorada todo dia 14 de setembro.

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Ilha Anchieta

RebeliãoUma estratégia digna de aplausos

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A Rebelião do presídio da Ilha de Anchieta foi como aqueles filmes nos quais você não sabe se torce pelo bandido ou pelo mocinho, pois após os acontecimentos o que restou foi ape-nas a marca registrada de um grande estrate-gista e sua formidável inteligência. O que pas-sou não se julga, deixa apenas seus vestígios. E essa magnífica história, cheia de dores e ale-grias é o que queremos deixar aqui registrada.

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Uma ilha paradisíaca cuja história foi marcada por acontecimentos de relevância inconteste para a histó-ria do Brasil, primeiramente, recebeu em suas praias Cunhambebe, chefe Tupinambá que dominou todos os caciques Tamoios entre a região de Cabo Frio e Bertio-ga, que fazia da ilha uma espécie de colônia de férias além de todas as negociações e estratégias de luta contra seus inimigos. Foi palco também de observatório dos ingleses, que controlavam o tráfico negreiro, pois sabia que pelo porto de Ubatuba havia carregamentos ilícitos de escravos.

A Ilha, em 1902 era habitada por 402 famílias caiçaras, que foram deslocadas para o continente com a construção de um presídio que inicialmente foi feito para presos de pe-quenos delitos – vagabundos e cassineiros (pessoas que trabalhavam com o jogo) – inaugurado em 1908.

Em 1914 foi desativado e só foi reaberto em 1928. Quando Getúlio Vargas subiu ao poder, transformou a cadeia em prisão para políticos e foi denominada de Instituto Correcional da Ilha Anchieta. Na segunda Gran-de Guerra, muitos presos que ali viviam e também sol-dados e civis, avistaram um submarino, que achavam ser de nacionalidade alemã. Com medo, todos pediram para que fossem transferidos por conta da ameaça, e foram prontamente atendidos. Então, mais uma vez o presídio ficou estagnado por um período curto e depois transformado no primeiro presídio de segurança máxi-ma do estado de São Paulo, devido a sua localização supostamente à prova de fugas.

Tivemos o privilégio de conversar com a Sra. Dionéia da Cruz, professora aposentada. Hoje, Dio, como gosta de ser chamada, é monitora histórico-cultural da ilha do Programa Filhos da Ilha, uma iniciativa que visa trazer an-tigos moradores do local que vivenciaram a Rebelião. O objetivo maior é preservar a história de maneira viva. Jun-to às ruínas, mais uma testemunha, o estudo desse mo-mento brasileiro gera um tom realístico atual à história.

Dio, na época com sete anos, morava com sua família na então denominada Ilha dos Porcos, quando seu pai era chefe de presídio. Sua família tinha um convívio tran-quilo em relação aos detentos. A vida das famílias era ba-seada na rotina dos presos. O governo enviava alimentos e gêneros de primeira necessidade pelo mar de Santos. No local havia horta, bananal, galinhas, vacas, uma mini fazenda com muitos porcos, tudo destinado ao presídio. Os moradores compravam comida do continente. Com-pravam a sobra dos bois abatidos para os presidiários. O pão era comprado do presídio, o sovado e o rústico. “Era gostoso, a vida era maravilhosa. Quando saía daqui, era para casa dos meus avós, no Perequê Mirim, nas festas religiosas. O pessoal tratava a gente como se fosse da capital, pois tinha mais gente aqui que lá. Era como um bairro chique.”

Eram mais ou menos 440 internos que se revezavam nas tarefas. Havia turnos para corte de madeira, para a produção de lenha, para a criação dos animais, padaria, limpeza etc. Os que não saíam para trabalhar ficavam no chamado quadrado e as celas permaneciam abertas

O início de tudo

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durante o dia. Tudo era feito e tratado pelos presos, inclu-sive a pesca, oportunidade de muitas fugas. As canoas eram trancadas a noite e vigiadas.

Perguntamos à Dio como era possível essa convivên-cia tão díspar. E com uma resposta simples ela disse que não conhecia outra realidade e que não tinha parâmetros. Conta-nos algumas curiosidades a respeito; um exemplo foi quando ela viu um carro pela primeira vez, achou que era uma fera que roncava. Essa forma de vida era simples e o convívio com o “barril de pólvora” era normal.

Mas, em 1952, o “barril” explodiu de forma tão ela-borada que é difícil de acreditar. Um plano arquitetado durante um ano e minuciosamente colocado em ação.

Um ano antes, foi feito um abaixo assinado, tanto pe-los detentos como pelos policiais, para tirarem o Capi-tão, que era deveras enérgico. Ele foi substituído pelo Tenente Fausto Sady Ferreira, relações públicas e sem experiência para a monta do cargo. Nas “entrelinhas” do presídio, Álvaro da Conceição Carvalho Farto, engenheiro estelionatário, com um enorme currículo de fugas, com muita astúcia, foi o mentor dessa eclosão. Portuga, seu codinome, “recrutou” Pereira Lima (ex-sargento da Força Pública condenado pela morte de outro militar num caba-ré por causa de uma mulher), que entendia muito de ar-mas e manejo de grupos. Os dois ordenaram aos outros detentos que, dali por diante, todos tinham que ser muito disciplinados, não brigarem entre si e deixar assim um clima de muita paz.

Dio conta que seu pai andava preocupado com ta-manha calmaria dentro do presídio, que isso era um mau presságio.

Com toda essa “tranquilidade”, os presos foram tendo mais regalias e liberdade. O diretor atendia aos presos e ouvia o representante dos grupos com suas reinvidica-ções. Um dia, Portuga foi conversar com o diretor e disse que fazia cinco noites que não dormia porque escutou um boato que queriam matá-lo, então ele foi transferido para a cela chamada “isolada”. Ali, Portuga teria condição de planejar a fuga à vontade e durante o dia passava as ordens para os outros.

Na rotina diária, o tiro de fuzil era considerado o alar-me e só era disparado no caso de muita necessidade, dessa forma, os militares que moravam na parte mais acima, iam para o quartel pegar as armas. Sabedor dis-so, Portuga tinha que desarmar o alarme. Como o diretor era exímio atirador e ficava no píer jogando pratos trei-nando com arma pequena, utilizou o responsável pela

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Ilha Anchieta

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limpeza (Leitão) para bajular toda vez que Sady acertava o alvo, empolgando e desafiando para que utilizasse uma arma mais poderosa, como um fuzil. Como Leitão caiu nas graças do dirigente, o tiro do fuzil virou uma rotina aos ouvidos dos militares. Pronto, o primeiro passo foi dado, o alarme não existia mais.

Para poderem pegar as armas, precisavam saber tudo o que acontecia no local em que eram guardadas e, para isso, o estrategista convocou Mão Francesa que era homossexual, um assassino frio e calculista e que sa-bia cortar cabelo. Com essa habilidade e uma disciplina exemplar, o cabeleireiro conseguiu a permissão de cortar os cabelos dos soldados na casa onde as armas eram guardadas e assim entendeu todos os procedimentos adotados pela segurança do local e passou um desenho da casa por dentro para Portuga.

O estelionatário tinha agora nas mãos tudo o que pre-cisava de básico para colocar seu plano em ação, acres-centando mais alguns pontos de genialidade que era re-tirar o máximo de soldados da área do presídio no dia da fuga. Para isso, na coleta de lenha, alguns prisioneiros assassinaram Dentinho, um cativo dedo-duro. Com o de-saparecimento do mesmo, vários guardas foram destaca-dos para procurá-lo nas matas.

No dia seguinte, sobraram apenas três soldados para acompanhar 117 presos na área da lenha, o que não é di-fícil imaginar que os infelizes não deram conta do recado e ali ficaram para sempre. Os cativos vieram das matas carregando as toras normalmente e quando chegaram à casa de armas a invadiram e mataram dois soldados. Pe-garam as munições e partiram para a casa do Chefe de Disciplina para matá-lo. Depois fizeram de refém o Diretor e o Tenente e os prenderam em uma cela. Agora estava tudo calmo aparentemente, para que quando a lancha Ubatubinha – que vinha regularmente à ilha abastecer o almoxarifado – chegasse, os rebelados pudessem sair da ilha com ela junto às outras canoas de pesca. Porém o mar ficou ruim e a lancha não chegava, deixando todos desesperados. Começaram a beber e a queimar os arqui-vos que ficavam na administração, e consequentemente o prédio pegou fogo. A lancha que já estava chegando voltou porque havia algo de errado. Mas quem chegou a dar a notícia da rebelião foi o soldado Simão Rosa da Cunha que correu e atravessou o boqueirão no Morro da Espia e, como estava acostumado com o mar, calculou onde poderia nadar até o continente. As forças estaduais foram acionadas e as tropas vieram por volta das quatro

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horas da manhã. Com o retorno da Ubatubinha ao conti-nente, os presos se apavoravam e saíram com as cano-as. Desesperados, pois não havia lugar para tanta gente, muitos se afogaram. Os que conseguiram fugir chegaram a Ubatumirim e seguiram os fios do telégrafo. Junto ao bando, estava o mentor disso tudo, Portuga, que era car-díaco e perto da cidade de Cunha veio a falecer. Os de-mais foram perseguidos e pegos, vivos ou mortos, mas todos. Às quatro horas da manhã veio o primeiro reforço e os presos que não se revoltaram ajudaram as famílias que ficaram, o que reduziu suas penas. Um cativo até se tornou guarda de presídio.

“Na hora do conflito não vi nada, minhas irmãs es-tavam na escola que fica ao lado do local onde ocorreu todo o conflito e meu pai estava de folga nesse dia, mas

ia levar uma pessoa ao médico. No caminho, encontrou Simão Rosa que contou ao meu pai o que estava acon-tecendo. Então desesperado correu até a escola para resgatar minhas irmãs, que estavam cantando e enco-lhidas no chão, voltou e falou para todos fugirem para o mato. Nisso vieram dois presos para ajudar os civis, uma grávida com seus cinco filhos e as mulheres viúvas. E fomos para o sul, subimos o morro e entramos numa gruta cheia de morcegos. Ali nos escondemos, passan-do fome. A grávida entrou em trabalho de parto no meio de 18 crianças, ou seja, nós tínhamos que sair dali. Ca-minhamos pelas praias com meu pai e outros homens, sempre apagando nossos rastros na areia e no meio do caminho encontramos um grupo de soldados que nos acalmou dizendo que os presos chefes já tinham fugido e

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Ilha Anchieta

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muitos armados se enfiaram no mato. Encontramos tudo queimado e muito sangue no chão e a notícia dos mari-dos mortos logo chegou, uma cena brutal e doída, não consigo apagar da memória. E ficamos em celas, protegi-dos até tudo se normalizar”.

Tinham 452 presos no dia da rebelião, 99 são chama-dos de desaparecidos, China Show foi encontrado dois anos depois em Salvador. Paulo Viana assumiu a direção do presídio. Mais tarde vieram o juiz, promotor e advoga-dos que abriram uma corte provisória e alguns presos fo-ram julgados. Em 1955 os últimos presos foram levados embora e, em 1977, a Ilha Anchieta virou Parque Estadual.

O Programa Filhos da Ilha foi criado por Samuel Mes-sias de Oliveira. É a maneira mais impressionante de conhecer nossa história. “Sinto que é uma obrigação mi-

Monumento aos soldados mortos na rebelião, que estavam na casa de armas

nha, primeiro porque amo demais a ilha, o chão que pisei quando criança, é meu berço, com uma infância extrema-mente feliz. Faço pela minha terra, pela minha gente, por esse parque e todos os componentes. O que eu quero mais é divulgar a minha vida. Não fui a filha do Cunham-bebe mas fui a Dionéia que nasci na ilha.”

Alguns relatos fazem a Ilha ser chamada de ilha amal-diçoada. “Ocorreram algumas coisas estranhas, a gente ouve muitas histórias. Uma vez chegou uma senhora que passou pela monitora correndo e perguntou se alguém conhecia um tal de Juarez, e todos disseram que esse homem não trabalhava lá. Perguntaram como ele estava vestido e ela descreveu a roupa que os presos usavam na época e descreveu também a de um outro, com uma calça cáqui, e disse que eles foram até o píer e falaram para ela “bem vindos à ilha Anchieta”. Perguntamos a ela se era parente de algum preso e ela disse que não. Depois mostramos fotos e ela identificou o Mão Francesa e o tal Juarez, que era um antigo funcionário. Outro fato emocionante foi a visita da neta do preso Portuga, Lu-ciana, que foi recebida aqui de braços abertos, pois que culpa ela tem. Demos as boas vindas, ela também é uma Filha da Ilha, e ela disse: só que do outro lado. Mas não é nada disso. Hoje somos todos de um lado só!”

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Folclore

TradiçõesDe pais para filhos, perpetuando um ritual ou uma representação de um dado momento histórico, tornam-se parte integrante da comunidade e representam-na de modo significativo. Assim, o folclore passado de gerações a gerações pulsa a identidade de uma cidade.

e usos populares

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Congada e MoçambiqueCongada – originária do Congo (África), a Congada é

uma celebração de cortejo de reis do Brasil por meio dos escravos e aqui se adaptou aos cultos católicos. Essa dança mantém uma separação em duas partes: o cortejo real, quando se cantam as cantigas, e a em-baixada, a parte dramática com personagens e enredo, uma luta simbólica entre um princípio benéfico e outro maléfico. Existe também a versão da Congada como uma celebração à Abolição da Escravatura. É uma luta entre os senhores de engenho, representados pela cor vermelha, e os escravos, representados pela cor azul. A rainha representa a Princesa Isabel.

A Dança do Boi de UbatubaTradição carnavalesca, trazida pelo maranhense

Sr. Carlinhos, está presente desde a década de 1930. Uma adaptação do Bumba-Meu-Boi, na qual o boi e os cavalinhos são confeccionados pelos próprios participantes.

Festa do DivinoRainha de Portugal, Isabel, por volta do ano de

1300, mandou construir a Igreja do Divino Espírito Santo, em Alenquer. Para comemorar a obra, surgiu a Romaria ou Folia do Divino. Trazida para o Brasil pelos colonizadores portugueses, essa tradição perdura até os dias de hoje.

Segundo o caiçara Sr. Ozório Antonio de Oliveira, nascido em 10 de fevereiro de 1899 em Pomirim, seu avô já cantarolava as canções que tinha aprendido com seu bisavô. Ou seja, fazendo os cálculos, essa tradição está viva em Ubatuba há mais de 200 anos. Todas as casas faziam comidas típicas, como peixada, biju, farinha e doces. A Festa era um momento de pagar promessas e pedir outras graças. Um fato pitoresco é a ocorrência dos “espias”, homens que ficavam em lugares altos para ver a chagada da Romaria, recepcio-nando-a com rojões.

e usos populares

MoçambiqueDe origem incerta, Moçambique é uma dança fol-

clórica constituída por um cortejo que percorre as ruas dançando e cantando, com instrumentos de percussão, de corda e guizos presos aos tornozelos. Seu nome remete à cultura africana, porém sua exe-cução lembra a dança dos Pauliteiros de Miranda, tradicional no nordeste de Portugal. Teria chegado ao Brasil durante a colonização também como uma maneira de catequização, já que os cantos são lou-vações religiosas, principalmente a São Benedito. As danças possuem nomes religiosos, como Escada de São Benedito e Estrela da Guia, e suas coreografias são realizadas com bastões de madeira, utilizando instrumentos como o tarol (caixinha de guerra), reco--recos, pandeiros, rabecas, tamborins e violas.

Na década de 1940, o espanhol Benigno Castro montou uma serraria para tratar a caxeta, espécie de madeira encontrada em grande quantidade na praia de Puruba, para depois levá-la à cidade de Santos, transportada pela lancha Santense. O destino era uma fábrica de lápis. Os trabalhadores da serraria vieram de Cunha para morar em ranchos. Logo fize-ram amizade com os residentes de Puruba e ensina-ram a eles a famosa Congada. Curiosos, os habitan-tes naturais iam até Cunha para conhecer as danças e aprenderam também o Moçambique. Empolgaram--se tanto que trouxeram essas tradições para a praia do Puruba. Os pioneiros na Congada foram Ditinho Alves, Basílio Alves, Guilherme Pedro dos Santos, Marcolino Fernandes e Francisco Paulo Fernandes de Cristo. Essa tradição teve altos e baixos, com a morte de alguns integrantes e, em 1987, a Fundação de Arte e Cultura de Ubatuba (FUNDART) retomou a Companhia da Congada de São Benedito do Sertão do Puruba. Dessa vez de forma sólida, essa mani-festação com apresentações não ficou apenas no município, expandindo-se também para outras loca-lidades. O Moçambique, por sua vez, sempre esteve presente, composto agora pelos purubanos.

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Folclore

FandangoÉ composto por muitas danças de natureza popular,

chamadas de ‘marcas’. Chegou ao Brasil pelos portu-gueses açorianos no litoral paranaense por volta de 1750. Integrado ao Intrudo (o ancestral do Carnaval), os componentes do Fandango eram chamados de fol-gadores e folgadeiras e dançavam muitos bailados, como Anu, Andorinha, Chimarrita, Tonta, Caranguejo, Vilão do Lenço, Sabiá, Marinheiro, Xarazinho, Xará Grande, entre outros.

Durante a Festa do Divino em Ubatuba, o Fandango era apresentado em várias etapas: primeiramente a Xiba ou Bate-pé e depois a Ciranda de Roda, Canoa, Serrabaile, Marrafa, Ubatubana, etc. Os participantes dançavam até o amanhecer.

Dança da Fita Tradição ariana chegou em nossas terras pelos por-

tugueses e espanhóis. Com um mastro no centro or-nado com flores e várias fitas coloridas soltas, os dan-çarinos trançam essas fitas formando vários desenhos ao som de sanfona, violão e pandeiro.

Em Ubatuba, o senhor João Vitório, pescador da praia da Enseada, trouxe para o município a Dança da Fita, a qual aprendeu em Santos, no século XVIII. Tí-pica do carnaval, a dança era feita dentro das casas.

Máscaras FolclóricasTradição carnavalesca de Ubatuba, típica dos car-

navais vienenses, chegou por essas bandas no sécu-lo XIX. As máscaras eram feitas com moldes de barro, polvilho, papel higiênico, jornal velho e o que mais servisse. Criatividade e beleza eram os pontos altos, tendo José Carneiro Bastos (Zé Cabé), Manoel Nunes de Souza (Manequinho Carcereiro), Antônio Felix de Pinho (Seo Pinho), José Luiz Pimenta (Zé Pimenta), e mais recentemente João Teixeira Leite como seus me-lhores criadores. Hoje os mascareiros se apresentam na Dança do Boi.

Folia de Reis É uma festa religiosa de origem portuguesa, que

chegou ao Brasil no século XVIII. Em Portugal tinha a finalidade de divertir o povo, já no Brasil teve um cará-ter mais religioso. De 24 de dezembro a 6 de janeiro, dia de Reis, um grupo de cantadores e instrumentistas percorre a cidade entoando versos relativos à visita dos reis magos ao Menino Jesus em busca de oferen-das com um prato de comida ou uma xícara de café.

Nas praias de Perequê-Açu e Maranduba e no centro urbano, ainda existem grupos que lutam pela continui-dade dessa tradição.

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a imponência de uma cidade rica

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Na fachada dos casarões

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Casarão do PortoO armador e responsável, Manoel

Balthazar da Cunha Fortes era uma personalidade, em uma época de crescente desenvolvimento econô-mico, social e cívico da cidade. Bal-thazar da Cunha, um homem pobre e de poucos estudos, construiu um patrimônio suficiente para a cons-trução do seu Casarão, chamado de majestoso solar para o conforto de sua família. Ali vivia com sua esposa Dona Benedita Batista da Cunha For-tes e seus filhos, que depois fizeram parte da sociedade local. Baltazar veio a falecer no dia 26 de fevereiro de 1874, sendo seu nome imortali-zado em uma das ruas do centro de Ubatuba. Cabe salientar que alguns historiadores sustentam que o So-bradão do Porto funcionava como Alfândega local, outros afirmam que nesse local Dom Pedro I, encontrava--se secretamente com a Marquesa de Santos. Ao certo, sabemos por fontes primárias, recolhidas por Washington de Oliveira que apenas a parte de cima do edifício era resi-dência de Balthazar da Cunha e sua família, no térreo estava o armazém e a casa comissária – importadora e exportadora de bens comerciais (De Oliveira, 1977:74).

Outros inúmeros casarões na pequena Vila de Ubatuba, hoje re-gião central da cidade, foram ergui-dos pomposamente e mostravam os fartos recursos dos comercian-tes locais e seu desenvolvimento econômico. Ubatuba viveu momen-tos de glória, sendo considerada uma das principais cidades de São Paulo, ajudou à economia do Estado, ficando à frente dos muni-cípios com a maior renda de toda a Província. Eram viajantes erran-tes, que vinham negociar, tropeiros

Na fachada dos casarões

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Arquitetura

e aventureiros de todas as fronteiras desfilavam pelas ruas ubatubenses. Festas e bailes nos pomposos solares com muito esplendor e ostentação. Isso demonstrava a importân-cia, para aqueles que aqui passavam, da prospera Ubatuba, cidade portuária de grande destaque no cenário nacional.

Existiu até mesmo um belo teatro na cidade com apresentações de peças e óperas de diferentes com-panhias, nacionais e estrangeiras. O Teatro de Ubatu-ba ficava localizado exatamente onde hoje se encontra o Fórum de Ubatuba, na antiga Praça Nóbrega, hoje o calçadão, esquina com a Rua Celso Ernesto de Oli-veira. Construído, pelo português Joaquim Ferreira Go-mes, com espaço para trezentas pessoas, as de maior poder econômico tinham lugar cativo em camarotes para assistir as representações. Instalações de muito bom gosto mostravam uma construção com um acaba-mento e decoração de primeira, tudo feito de madeira. Mas, durante a segunda decadência do município, este edifício foi esquecido e abandonado. Em 1910, a her-

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deira do teatro, Dona Luzia Dias Círio, sem recursos decide demoli-lo e então prefeito Ernesto Gomes de Oliveira, o adquiriu como bem municipal.

Nas comemorações do III Centenário de Ubatuba parte do antigo teatro foi demolido: camarotes e frisas, pois se encontravam em péssimo estado de conserva-ção . Chegou ainda, a funcionar em suas dependências o primeiro cinema de Ubatuba, por pouco tempo. Nos anos 50, o governo municipal da época decidiu doá-lo ao Estado para a construção do atual Fórum Municipal, que mudou dali, depois de meio século.

O exemplo deste teatro é ilustrativo. Ubatuba guarda pouco de sua herança em edificações que poderiam traduzir uma imagem arquitetônica do pa-trimônio histórico de miscigenação artística, uma mistura de estilos na construção. Em uma época importante, a cidade conquistou para sua população um estado de urbanização ímpar que revolucionou a projeção de sua imagem em termos de futuro. Al-guns poucos traços históricos de suas construções arquitetônicas foram preservadas e servem como referência para seus habitantes.

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Taipa de PilãoÉ uma construção que consiste em levantar

paredes de barro, comprimidas com golpes de pilão entre placas de madeira. É uma técnica de origem árabe, ainda muito utilizada para construções em clima seco. Este tipo de cons-trução tem a qualidade de isolamento térmico. Existem diversas construções da antiguidade feitas com este método, principalmente na Chi-na, onde boa parte de suas famosas Muralhas foi edificada desta maneira. No ocidente, esta técnica foi apresentada pelos mouros, e Algar-ves é um exemplo típico disso. Atualmente, os estados Unidos, Alemanha, Austrália, Nova Ze-lândia e Chile estão retomando a taipa de pilão em suas construções consideradas modernas.

Na praia de Iperoig, cores em suas construções se destacam do verde da Mata Atlântica.

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Arte ou artesanato?Nos detalhes, as lembranças, e nas formas , a realidade.

A difícil arte de trançar a palha, moldar o barro, talhar a madeira ou ma-nusear o “canivete de roca” é uma tradição transmitida de pai para filho entre os caiçaras do litoral norte de São Paulo. Os trabalhos originalmente feitos em vime, taquara e palha, só foram se mesclar ao barro e à madeira com a chegada dos franceses que utilizavam amplamente estes artigos. No início o artesanato praticado em Ubatuba, assim como em outros lugares, era uma atividade de subsistência, apenas para uso doméstico. Hoje os artesãos já contam com uma poderosa indústria que desperta o interesse dos turistas e movimenta o comércio local, além de participações em feiras e exposições pelo Brasil.

Com muita habilidade estes caiçaras conseguiram popularizar uma arte primitiva sem sofrerem influências da mecanização. Os pintores continuam a desenvolver o seu rico trabalho com cores vibrantes em peças de cerâmicas e madeiras, tais quais ensinaram os seus antepassados. Cestos, peneiras, vasos, chapéus, imagens religiosas, móveis rústicos, de tudo podemos en-contrar nos ateliês destes artistas. B

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O talento caiçara é tanto que já conferiu fama a um dos seus arte-sãos. É o caso do Seu Antônio Teodoro de Souza. Seu Bigode, como é conhecido, se tornou uma figura lendária em Ubatuba graças à habilida-de revelada desde pequeno em esculpir peças de madeira.

Nascido em uma casa humilde no Pequerê-Açu, este escultor é a maior referência do artesanato da cidade com mais de 5.200 peças que vão desde uma minúscula imagem de São Francisco até a estátua da Igreja da Imaculada Conceição, com mais de 1,70m. Aos treze anos teve uma bronquite que o impediu de frenquentar a escola. Sem saber ler e escrever, já transformava pedaços de guairana e cedro em piões e máscaras de carnaval. Mais tarde, a sua intimidade com a arte de entalhar seria responsável pelo sustento da família e lhe renderia trabalhos internacionais. Sem esconder as influências de sua forma-ção católica, seu Bigode pode dizer com orgulho que é um dos poucos artistas nacionais a ter uma obra exposta no Vaticano e mais de 2000 peças espalhadas pelo exterior. São de sua autoria também os quatro santos na igreja do Pilar, em Taubaté (São José, Santo Antônio, São Francisco e São Jorge).

Outro ícone de cunho artístico é Seu José Vicente da Motta, artista plás-tico, escultor e pintor com premiações internacionais, fez da arte, seu viver. Seus trabalhos são ecléticos apesar de sua formação católica. Uma frase que resume seu espírito artístico: “Nasci católico, frequentei umbanda e cultos evangélicos, agora sou um terráqueo. Aprendi a conhecer o ser humano”.

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Visita obrigatória é a Casa do Artesão de Ubatuba. É uma associação com 40 membros que expõem e vendem seus pro-dutos feitos de matéria-prima variada, onde o consumidor se esbalda em tanta criatividade e cores. Muitos são os artesãos que se fixaram em Ubatuba e hoje vivem das vendas de seu trabalho. A Casa do Artesão fica na Av. Iperoig nº 10 – Centro.

Não podemos deixar de citar as canoas de Ubatuba. Alguns etimologis-tas falam que Ubatuba vem do tupi e significa abundância de canoas. Não vamos discutir, pois na realidade, sua costa é salpicada delas. E, como o visitante de Ubatuba não tem como levar de souvenir uma canoa para casa, obviamente que esta arte foi reduzida a pequeninas embarcações que cabem em qualquer mala. São réplicas perfeitas das originais e com o mesmo colorido. Conversamos com jovens que vendem essas peque-nas jóias ao longo da estrada. Aprenderam o ofício com seus pais e avós. A renda obtida pelas vendas dá o sustento de suas famílias.

Os trabalhos artísticos são tantos e tão variados que, no meio do verde da mata, encontramos artesanatos de toda a espécie, de móveis a aves nativas. Vale a pena conferir e também “negociar” o preço. Sem dúvida são peças feitas com capricho e perfeição.

Carnaval de 1983“Jacob pegou na praia um tronco de madeira parecido com um boi, adaptou um tonel que encheu de vinho, colocou as rodinhas e entrou na avenida para alegria dos foliões que tinham bebida de graça. E ainda teve a marchinha para animar a festa”.Essas são as palavras que descrevem seu Jacob, artista e músico de espírito cigano que, como poucos, retrata a vida cotidiana caiçara. Suas obras são de extrema pureza e sensibilidade que só um fer-voroso defensor e admirador da natureza pode transmitir.

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Sinuosidade, esta é a forma como se pode descrever Ubatuba, entre

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nós a sensação de que realmente necessitamos do belo.matas, sacos, enseadas, ilhas e mares, a cada curva desperta em

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Meio Ambiente

Não é por acaso que a cidade de Ubatuba é considerada um dos pólos turísticos mais procurados do estado de São Paulo. En-tre cachoeiras, praias e ilhas, além do belo colorido formado pela diversidade de espécies que contrastam com o abundante verde da Mata Atlântica, são encontradas duas importantes unidades de conservação ambiental: O Parque Estadual da Serra do mar, tomba-do pelo COMDEPHAAT e o Parque Estadual da Ilha Anchieta, e ainda abriga em seu território a sede do Projeto Tamar que é destinado à conservação de tartarugas marinhas no território brasileiro. Deu para perceber que quando o assunto é meio ambiente Ubatuba não deixa nem um pouco a desejar. Cortada pelo Trópico de Capricór-nio, coberta pela Serra do Mar e sua exuberante Mata Atlântica, a cidade de Ubatuba localizada no litoral norte da capital do Estado de São Paulo possui muitas praias e várias ilhas, dentre as quais podemos destacar duas: a Ilha das Couves e a Ilha Anchieta.

Sua geografia é interessante, espremida entre a Serra do Mar e o Oceano Atlântico, Ubatuba forma um corredor verde muito preservado.

“As areias das praias litorâneas são geralmente originárias dos rios que erodem os continentes e transportam seus frag-mentos até o litoral, onde o mar encarrega-se de distribuí-los pela costa. Pode-se também encontrar praias formadas por conchas ou outros materiais, bastando que tenham um tama-nho, densidade e quantidade suficientes para tanto... Os ma-teriais que compõem uma praia podem também ser de várias cores. Nas ilhas do Havaí (EUA), por exemplo, há praias de areia branca, compostas de esqueletos de corais, e praias de areias pretas, nas quais o material é derivado de lava vulcâ-nica. Podemos encontrar praias de coloração amarela, verde ou rosa, dependendo do material específico ou dos tipos de conchas dominantes no material depositado.”Fonte: http://cursos.unisanta.br/oceanografia/regiao_costeira.htm

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Serra do mar“Costão rochoso é o nome dado ao ambiente costeiro forma-

do por rochas situado na transição entre os meios terrestre e aquático. É considerado muito mais uma extensão do ambiente marinho que do terrestre, uma vez que a maioria dos organismos que o habitam, estão relacionados ao mar... É um ambiente extre-mamente heterogêneo: pode ser formado por paredões verticais bastante uniformes, que estendem-se muitos metros acima e abaixo da superfície da água (ex. a Ilha de Trindade) ou por mata-cões de rocha fragmentada de pequena inclinação (ex. a costa de Ubatuba/SP). No Brasil, pode-se encontrar costões rochosos por quase toda a costa... a maior concentração deste ambiente está na região Sudeste, onde a costa é bastante recortada. A partir da observação da fisiografia da costa do Brasil, pode-se estabelecer uma relação entre a ocorrência de costões rochosos e a proximi-dade das serras em relação ao Oceano Atlântico. Tomando como exemplo o Estado de São Paulo, observa-se que em locais onde a Serra do Mar se elevou próxima ao oceano, ocorre um predo-mínio de costões rochosos na interface da terra com o mar (ex. Ubatuba), já em locais onde a Serra do Mar está muito distante da costa, ocorre o predomínio de manguezal e restinga (ex. Cana-néia/SP). Os costões são, portanto, na maioria das vezes, exten-sões das serras rochosas que atingem o fundo do mar. O costão rochoso pode ser modelado por aspectos físicos, químicos e bio-lógicos. Em relação aos aspectos físicos, a erosão por batimento de ondas, ventos e chuvas é o principal deles, mas a temperatura também possui papel importante na de composição das rochas, a longo prazo, através da expansão e contração dos minerais. Os fatores químicos envolvidos dependem do tipo de rocha que for-ma o costão, uma vez que minerais reagem quimicamente com a água do mar (ex. ferro), sendo que estas relações são reguladas principalmente pelos fatores climáticos. Além destes, temos o desgaste das rochas que pode ser causado por organismos habi-tantes ou visitantes do costão, como ouriços, esponjas e molus-cos. O ecossistema costão rochoso pode ser muito complexo e, normalmente, quanto maior a complexidade, maior a diversidade de organismos em um determinado ambiente.” Fonte: http://www.ib.usp.br

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Mata Atlântica Espalhada ao longo da costa atlânti-ca, a Mata Atlântica é um complexo conjunto de ecossistemas de grande importância por abrigar uma parcela significativa da diversidade biológi-ca do Brasil, reconhecida nacional e internacionalmente no meio cien-tífico sendo considerada a flores-ta mais diversificada do planeta. O elevado índice de chuvas ao longo do ano permite a existência de uma vegetação rica, densa, com árvores que chegam a 30m de altura como: jequitibá-rosa, quaresmeira, palmito, jacarandá, pau-ferro, murici, jambo, jambolão, xaxim, paineira, manacá--da-serra, figueira, angico, guapuru-vu, maçaranduba, ipê-amarelo, jato-bá, imbaúba, canela-amarela, são os destaques dessa floresta.

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GalhetasFigueiraPonta AgudaMansaLagoaBrava do ForteSaco das BananasRaposaCaçandoquinhaCaçandocaPulsoMarandubaSapéLagoinhaOestePeresBoneteGrande do BoneteDesertoPrainha do DesertoCedroFortalezaBrava da FortalezaCosta

PraiasCom quase 100 km de extensão, o litoral

de Ubatuba apresenta inúmeras praias, gran-des ou pequenas, nas quais podemos desfru-tar desde o selvagem até o conforto máximo.

Contabilizamos 92 praias, fora as das ilhas. Não daria aqui para descrever todas, mas garantimos que se você estiver só ou acompanhado, se quiser agito ou solidão, temos certeza de que achará a praia ideal. São tantas e tão belas que qualquer um ficará satisfeito. Um exemplo de extremos é a praia da Brava da Almada e da Iperoig. A primeira é o total isolamento, com um “muro” de abricoeiro que se estende na orla inteira e na segunda encontramos co-mércio, restaurantes e tudo que a vida ur-bana proporciona.

Prainha VermelhaVermelha do SulBrava do SulPrainhaDuraBarraPalmiraDomingas DiasLázaroSunungaSete FontesFlamenguinhoFlamengoDionísiaRibeiraSaco da RibeiraCodóLambertoBrava do Perequê-MirimPerequê-MirimSanta RitaGerônimo ou Boa Vista

EnseadaPrainha da EnseadaForaXandraItapecericaGodóiToninhasPraia GrandeTenórioVermelha do CentroCedrinhoPrainha do CaisItaguáIperoig ou CruzeiroMatarazzo ou do PadrePerequê AçuBarra SecaSaco da Mãe MariaVermelha do NorteAltoItamambucaBrava de ItamambucaPrainha do Félix

FélixLúcio ou ConchasPrumirimCanto ItaipuLéoPrainhaMeioPurubaSurutubaJustaUbatumirimEstaleiro do PadreAlmadaEngenhoLaço da CavalaBrava da AlmadaTaquaraFazendaBicasPicinguabaBrava do CamburiPrainha do CamburiCamburi

Praias de Ubatuba. Sentido Caraguatatuba - Paraty:

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Meio Ambiente

Praia Brava do FradePor meio de uma linda trilha, ao lado do Saco da Banana, a praia do Frade aparece de forma extasiante, no seu canto direito, em época de chuvas fortes, tem uma cachoeira maravilhosa de águas límpidas. Há também um fato curioso que é o magnetismo das rochas, que para pessoas mais sensíveis, é sentida uma vibração. Muitos dizem que bússolas ficam descontroladas.

Praia das Conchas ou do LúcioPela trilha entre as praias do Promirim e do Félix nos deparamos com outra maravilha da natureza, a praia das Conchas. O nome é literal, pois não há areia, apenas conchas mesmo em seus 10 me-tros de extensão. Fora este inusitado fato, a praia possui grandes rochas que formam muitas piscinas naturais com águas translúci-das. Uma rocha em particular chama a atenção, pois, posicionada de costas para o mar, ela foi esculpida pelas intempéries do tempo em forma de um monge com um capuz.

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Praia do Tenório Pelos idos anos de 1700, o Sr. Manoel de Oliveira Thenório, de família tradicional, muito respeitado, foi assassinado por seu afilhado, Zé do Porfírio. Em homenagem à sua personalidade, a praia recebeu seu nome. Mais tarde, o local virou um alambi-que de propriedade do Sr. Vladimir Toledo Pizza que recebia seus visitantes “matan-do o bicho”, que no linguajar caiçara signi-fica beber pinga. Alguns mistérios ainda existem ali, como as pontas de rochas que aparecem no inverno ao lado direito da praia. Dizem que é a bruxa Brisa que está sentindo frio e o seu tremor causa uma ventania muito forte que afasta a areia da praia. Com bruxa ou sem bruxa, o que im-porta é a beleza, que pode ser desfrutada por toda família, com várias atividades pro-porcionadas aos visitantes.

Praia do PurubaAlém da fascinante paisagem do encon-tro da Mata Atlântica com o mar, a praia do Puruba, distante do Centro a 24 km, exibe suas areias em forma de “ilha”, pois são cercadas pelos rios Puruba e Quiririm. O acesso é feito por pequenos barcos. Com toda essa exuberância, Pu-ruba virou cenário do longa metragem “Invenção do Brasil”.Estes são pequenos exemplos das péro-las que encontramos nesse vasto litoral composto, não apenas de areia, rochas, matas e mar, mas também lugares reple-tos de histórias fascinantes que causam muitas vezes calafrios, mas que dão um tempero diferente para quem as visita.

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Meio Ambiente

Como sempre, se tratando de Ubatuba, não temos apenas um exemplar de ilha e sim vá-rios e, sendo assim, uma lista é fundamental.

Ilhas: Comprida, das Couves, da Pesca, da Selinha, da Pedra, dos Porcos, Redonda, Rapada, do Negro, Pequena, do Prumirim, das Palmas, Anchieta, do Mar Virado, da Ponta e da Maranduba.Ilhotas: da Carapuça, da Comprida, das Cou-ves, das Cabras, do Sul, de Fora e de Dentro.

Lajes: Mofina, Pequena, Grande, Feia, das Palmas, do Forno e Grande do Perequê

Ilha do Mar ViradoFoi encontrado nessa ilha um sítio ar-queológico do povo “coletor-pescador”,

população pré-histórica que vivia da pes-ca e caça de pequenos mamíferos. Cons-truíam o que comumente chamamos de Sambaqui, uma espécie e lugar sagrado onde eram enterrados seus mortos e co-bertos por ossos de animais, conchas e espinhas de peixes. Hoje, esse sítio está sob a tutela do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP.

Ilha da PontaA peculiaridade desta ilha, que fica entre as praias de Maranduba e Lagoinha, é que se pode ir a pé ou nadando, pois está lo-calizada a apenas 150 metros da costa. O esforço vale a pena e, se estiver bem disposto, ainda poderá dar 360º na ilha.

Ilhote do SulParte do complexo do Parque Estadual da Ilha Anchieta, por estar muito próximo à ela, forma um canal por vezes com fortes correntes marítimas. Os mergulhadores mais experientes recomendam o mergu-lho noturno.

Ubatuba tem em sua costa 16 ilhas, 7 ilhotas e 7 lajes, ou seja, é um litoral vas-to em termos de visitação e de admiração da natureza. Além da beleza, encontra-mos a história de nosso país preservada.

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Ilha Anchieta Conversamos com Viviane Buchia Neri,

gestora do Parque Estadual da Ilha An-chieta, que nos explicou o funcionamento desta como um todo. “Aqui é uma Unidade de Conservação de Proteção Integral na categoria de Parque Estadual. O trabalho é feito por meio de programas, tais como: pesquisas para estudo sobre meio ambien-te; aspectos culturais e de fiscalização rea-lizada junto à polícia ambiental, devido aos problemas de caça, pesca e de certa forma um turismo desordenado que causa impac-to ambiental à natureza. Desenvolvemos os trabalhos junto à comunidade por meio do Conselho Consultivo e um programa de visitação pública com oportunidade para a Educação Ambiental e Turismo com o con-tato com a natureza.

Na ilha há uma represa que fornece ener-gia para o parque com uma micro hidrelé-trica, na qual abordamos a importância do armazenamento de água e sua distribuição.

Em relação à fauna local, não reconhe-cemos nenhum animal endêmico, pois esta ilha foi muito devastada. Se compararmos uma foto área de 1954 a uma atual, na an-terior quase não tinha vegetação, pois na época do presídio viviam duas mil famílias, que se abasteciam também dos recursos naturais como a madeira. Hoje a vegetação está se restabelecendo. A fauna normal de um sistema insular é avi-fauna, répteis e anfíbios, em qualquer ilha que você vá não há grandes mamíferos. Em 1983 houve a introdução da capivara pela Fundação Zo-ológico, que teve duas conotações: uma era a pesquisa de como seria a introdução de animais exóticos num ambiente fecha-do, ou seja, numa ilha, pois dessa forma o monitoramento é mais eficaz, e a outra conotação era a luta ambiental para a pre-servação, pois uma grande rede hoteleira estaria disposta a construir um empreen-dimento enorme usando o argumento de que como a ilha não tinha mais vegetação e animais, o espaço seria propício à cons-trução civil, então na época a Fundação da B

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Meio Ambiente

Cultura desenvolveu esse projeto. Existe um mito muito grande

que as capivaras estão causando impacto ambiental, e com isso a

vegetação não está se regenerando, mas o que estamos assistin-

do não é nada disso. Em 1983 foram introduzidas sete capivaras,

em dez anos contamos setenta. “Houve a mistura genética e hoje

está havendo um declínio na população destes animais.” Viviane,

que trabalha há 20 anos na área ambiental de vegetação, tem per-

cebido que a capivara está ajudando no processo de regeneração.

Para que a vegetação comece a restabelecer o crescimento das

“orelhas de burro” é fundamental o papel da capivara, pois esta

só come o capim, permitindo o crescimento de outras plantas.

Portanto, ao contrário do que dizem, a capivara está contribuindo

para a volta da flora nativa. “Além das capivaras foram introduzi-

dos tamanduá, veado, preguiça e, com maior reprodução, sagüis,

macacos pregos e quatis. Um problema grande que temos hoje é

a questão dos macacos pregos e dos saguis, pois eles depredam

os ovos de aves, sendo que o ambiente insular é área migratória.

O Parque Estadual da Ilha de Anchieta pertence totalmente ao

Governo Estadual, diferente do Parque da Serra do Mar. O que pre-

ocupa em termos de poluição ambiental e degradação é a questão

da poluição no mar, devido ao tráfego de petroleiros, o gasoduto,

o aumento do Porto de São Sebastião. Esses fatores apresentam

risco de vazamento e, como medida preventiva, estão fazendo um

plano integrado de emergência de derramamento de óleo ou pro-

dutos químicos junto às marinas que atuam ao redor do Saco da

Ribeira. Já está em funcionamento trabalho com oito marinas, com

a polícia ambiental, com o exército e com o corpo de bombeiros. É

um plano inédito no Brasil e no mundo.

Na Ilha, fomos guiados pela Trilha do Saco Grande por Carlos

Jorge, mais conhecido por Fininho, que trabalha há quatro anos

fazendo a limpeza das trilhas e manutenções necessárias. Nesses

cinqüenta minutos de ida e volta, nosso guia falou da fauna ilhéu

como cobras caninanas e algumas jararacas, o pássaro Trinca-fer-

ro, aranhas armadeiras e caranguejeiras e escorpiões. Uma das

curiosidades são os filhotes de carrapato que ficam aninhados

nas folhas em uma espécie de teia de aranha que, aos mais desa-

visados, raspam a pele ali e ficam com o corpo inteiro infestado.

Mostrou-nos também a Balieira, planta local calmante para a dor e

também um excelente cicatrizante.

O contato com a natureza é tão próximo que na Ilha temos uma

ilustre moradora chamada Catarina, uma canina preta, amarela e

esverdeada que já não se incomoda com a presença de humanos.

E como qualquer ilha que se preze, as praias Grande ou das Pal-

mas, do Presídio, do Sapateiro, do Sul, de Fora e do Leste, formam

as principais estrelas desse reduto paradisíaco.

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“Era fim de dezembro, tarde de verão com mar parado e tempo chuvoso. Minha esposa comentou que estávamos sem peixe para o jantar. Disse-lhe que iria tentar pegar algum e ainda brinquei:

- Pode escolher. O que você quer? – prontamente ela respondeu: - Robalo e lagosta!Empurrei para o mar o bote de alumínio e rumei para o

pesqueiro mais próximo e provável de conseguir bom resul-tado. Quando joguei a poita próximo as pedras do Pontal da Cruz, na Ilha Anchieta, notei a extrema limpidez da água, coisa que permitia uma animada perspectiva de caça, mor-mente naquela hora de fim de tarde.

Nos primeiros mergulhos, consegui três lagostas. Pouco depois, no fundo de areia, encontrei os robalões . Quatro ou cinco de 10 a 12 kg cada. Arpoei um deles e o levei para o bote. Mas eis que, a bordo e recolhendo o cabo da poita para levar o jantar de encomenda, surge rápida e assustadora o que chamei de “nave guerreira” – uma grande lancha cinzen-ta com bizarra tripulação. Mulheres e crianças, provavelmen-te familiares dos dois aguerridos policiais fardados que me apontavam metralhadoras portáteis e berravam:

- É proibido mergulhar aqui! Isto é uma reserva!A despeito das armas ameaçadoramente apontadas em

minha direção, dei um berro de alegria e comecei a rir. Então havia acontecido! A Ilha Anchieta era agora parque estadual submarino: o projeto Água-Viva havia sido deferido e efetiva-do. Os policiais entreolharam-se de forma estranha, silen-ciosamente concordando: haviam encontrado um lunático! Expliquei-lhes que não sabia das proibições, pois não havia avisos e que nada havia lido a respeito. Disse-lhe que era o autor do projeto e que estava contente com a transformação da ilha em reserva submarina etc. Uma das crianças come-çou a enjoar e as mulheres reclamavam da demora, o que fez que os policiais me libertassem, não sem antes exigirem que lhes entregassem os pescados.

Dias depois, consegui um exemplar do Diário Oficial no qual figurava a portaria N-056, de 10 de Novembro de 1983, homologando uma área restrita e proibida à pesca em torno da Ilha Anchieta, que já alguns anos antes havia sido tomba-da como reserva florestal.”

Relato de Edgard O. C. Prochaska, mergulhador nato e profundo conhecedor das águas do litoral brasileiro. Autor do valiosíssimo projeto Água-Viva, que está contribuindo deveras para o repovoamento de nossos mares. Também autor do livro “Caçadores Submarinos: histórias, técnicas e conceitos”.

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Meio Ambiente

Fauna MarinhaPeixes de Fundo, das Pedras, do Coral ou de Toca - estas espécies são territo-rialistas, passando praticamente toda sua existência em espaço circunscrito, nadando entre as tocas formadas pe-las rochas ou pelos buracos de coral onde também se abrigam. Peixes colo-ridos como salemas, budiões, pirangi-cas, frades, cangulos etc. Nesses con-juntos também encontramos polvos, cavaquinhas e lagostas. Exemplares:

•Garoupas•Badejos•Budião azul•Caranhas•Cação lambaru ou lixa•Marimba•Mero•Paru ou enxada•Sargo•Vermelho•Chernes•Namorado•Pargos•Bagre bandeira•Cação anjo•Corvinas •Linguados•Pescada•Prejereba•Piraúna ou miraguaia•Robalos

Peixes de Curso ou de Passagem - também denominados peixes de corrida, são espécies pelágicas, migratórias de águas abertas que, ocasionalmente, passam próximas às áreas costeiras de águas mais profundas, como pon-tas de penínsulas, costões de mar batido, lajes e parceis. Ge-ralmente constituídos por peixes fortes e combativos.

•Barracuda•Bicuada•Bijupirá •BonitoCações ou tubarões:•Mangona•Corta garoupa•Martelo•Cabeça chata•Mako•Canejo

•Tintureira•Limão•Cavala•Espada•Enchova•Galo de penacho•Graçainha•Guaiúba•Guaivira•Guarajuba•Olhete

•Olho-de-boi•Pampos•Remeiro•Sernambigura•Sarda•Tainha•Tarpão•Ubarana•Xaréus•Xereletes

Peixes Oceânicos - habitantes migratórios do alto mar ou na-vegantes das correntes marinhas apenas excepcionalmente se aproximam da costa. São os pesos pesados, os lutadores sensacionais e os moradores das águas azuis profundas que, eventualmente, são capturados por caçadores submarinos quando encontrados próximos à superfície, geralmente em águas bastante distantes da costa.

•Agulhão•Atum•Albacora da laje

•Cavala aipim•Dourado•Marlin

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Peixes das formações artificiais - as formações artificiais que acabam por se integrar ao mundo submerso constituem, passado algum tempo, verdadeiros oásis nas extensas planícies de areia do fundo marinho. São formadas pelos escombros de navios naufragados e pelos pilares das plataformas petrolíferas. Um verdadeiro ecossistema peculiar acaba criando em tor-no das colunas ou das ferragens, abrigando uma fauna variada, inclusive de peixes... “Um volumoso Mero poderá estar espreitan-do na porta de um antigo camarote povoado por polvos e anêmonas enquanto desliza na sua frente um portentoso tubarão mako es-pantando o cardume de olhos-de-boi.”Fonte: “Caçadores Submarinos – Histórias, técni-cas e conceitos”. Edgard O. C. Prochaska.

Animais meiofaunaEm cada punhado de areia da praia, vi-

vem em média uns 7.000 seres de mais ou menos um milímetro de tamanho. Monstruosos na aparência, porém inofen-sivos ao homem. Alimentam-se de restos de animais e algas em decomposição. Formam um verdadeiro mundo sob nos-sos pés. “Em termos de taxionomia — a ciência que cuida da classificação das espécies —, pode-se dizer que a areia é um ambiente tão rico quanto a floresta amazônica”, segundo o zoólogo america-no Robert Higgins, pesquisador emérito do Departamento de Invertebrados do Museu de História Natural da Smithso-nian Institution, um dos maiores especia-listas do mundo em meiofauna. O pouco que se sabe desses “animaizinhos” é que eles transformam a matéria orgânica decomposta em nutrientes, recicladores. A zoóloga Liliana Medeiros identificou 35 gêneros em uma praia da Ilha Anchieta e acrescenta que foram os primeiros ani-mais pluricelulares da Terra. Vale a pena aprofundar no estudo da meiofauna, pois é por meio dela que os cientistas podem medir a poluição de nossas praias. Fonte:http://super.abril.com.br/mundo-animal/ani-mais-meiofauna-donos-praia-441137.shtml

Mero - corpo volumoso de cor par-da-acizentada com faixas escuras verticais. Penetra em rios, estuá-rios e maguezais. Chega, raras as vezes, a 400kg. Alimenta-se de la-gostas, polvos e pequenos peixes.

Tubarão e cação é exatamente o mesmo animal. “Cação-anjo é o mesmo que tubarão-anjo e cação-martelo é o mesmo que tubarão-martelo, por exemplo. As pessoas costumam chamar de cação os tubarões pequenos, que são comercializados para o consumo de pescados, e usam a palavra tubarão para designar os animais maiores. “Biologicamente, não existe ne-nhuma diferença. A diferença é muito mais psicológica: cação é o que comemos e, tubarão é o que come a gente”, afirma o biólogo Otto Bismarck Gadig, da Universidade Estadual Pau-lista (UNESP), um especialista em tubarões. A palavra cação veio para o Brasil trazida pelos portugueses e foi citada in-clusive na famosa carta que o escrivão Pero Vaz de Caminha mandou ao rei de Portugal, contando as novidades das novas terras descobertas pelos portugueses no ano de 1500.”Fonte: http://mundoestranho.abril.com.br/home/

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Preservação: Parque Estadual da Serra do Mar - Maior parque paulistaOs parques são criados com a finalidade de proteger atributos excepcionais da na-tureza, no caso deste visa à proteção do que restou da Mata Atlântica no estado de São Paulo. Foi criado no ano de 1977 e possui área total de 315.390 hectares sendo considerado o maior parque paulista, designado não apenas à preservação ambiental como também à valorização da cultura local e pesquisa científica. Extende-se de São Paulo à divisa com o Rio de Janeiro, contendo a maior área de mata contínua preser-vada da Mata Atlântica do Brasil. Tombado pelo COMDEPHAAT em 1985, é divido em oito núcleos, sendo eles: Núcleo Caraguatatuba (Caraguatatuba), Núcleo Curucutu (Itanhaém), Núcleo Pedro de Toledo (Pedro de Toledo), Núcleo Pinciguaba (Ubatuba), Núcleo Pilões (Cubatão), Núcleo São Sebastião (São Sebastião), Núcleo Pilões (Cuba-tão), Núcleo Santa Vírginia (São Luís do Paraitinga). Grande parte de sua vegetação é de mata secundária, manguezais e vegetação de planície, e não possui fauna de grande porte devido à caça intensa e ao corte de palmito. São encontrados pontos culminantes como a Pedra do Espelho (1670m) e os picos do Corcovado (1.150m) e Cuscuzeiro (1.275m) No Estado de São Paulo as unidades de conservação, como é o caso do Parque Estadual da Serra do Mar, são administradas pela Secretaria do Meio Ambiente através do Instituto Florestal.

52 Cidade&Cultura

Meio Ambiente

HidrografiaUma das paisagens que mais agradam aos olhos humanos é o encontro das águas dos rios com o mar. E banhar-se em água salobra é uma das sensações mais gos-tosas quando se vai à praia. Ubatuba tem isso de sobra. Seu litoral é “regado” pelos rios que descem com águas abundantes. Sua rede hidrográfica é dividida em duas classificações: as grandes e as pequenas bacias. As grandes percorrem do interior à costa e as pequenas são bacias costeiras e insulares. Então, temos: Rio da Prata, Rio Maranduba, Rio Escuro, Rio Grande de Ubatuba, Rio Indaiá, Rio Itamambuca, Rio Puruba, Rio Iriri, Rio Fazenda, Rio das Bi-cas; Córregos Duas irmãs, Córrego Lagoi-nha, Rio Acaraú, Rio Promirim, Rio Quiririm e Rio Ubatumirim.

Estação Ecológica Tupinambás – ESECCom uma área de 31,5 há, Tupinambás é uma Unidade de Proteção Integral Federal que compreende a ilha de Palmas e seu ilhote e a Laje do Forno e ilhote das Cabras, abrangendo também, na cidade de São Sebastião o Arquipélago dos Alcatrazes.

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Núcleo Pinciguaba - Um encontro de florestas e mar: Em Ubatuba, o parque possui uma área de 47.500 hectares totalizando 83% de seu

território, localizado a 36 Km do centro. Sendo denominado Núcleo Picinguaba, por faze-rem parte do Núcleo a vila Pinciguaba, uma aldeia de pescadores da praia de Cambury e um agrupamento de pequenos posseiros no sertão da Fazenda Picinguaba. Esta última é o único ponto do Parque Estadual da Serra do Mar onde também são protegidos ecos-sistemas costeiros, tais como praias, mangue, costões rochosos e mata de restinga.

Em 1979, foi incorporado à área original do Parque o Núcleo Picinguaba, pela Secre-tária do Meio Ambiente, e hoje são desenvolvidos programas de educação ambiental e pesquisas. Este Núcleo, que está localizado em Ubatuba, próximo à divisa com o Estado do Rio de Janeiro, ao lado de Paraty, é o único que atinge o nível do mar, apre-sentando em sua área tanto ambientes costeiros, de praia, como também, ambien-tes com alta declividade. No total, abrange 5 praias e 3 vilas caiçaras. Sua fauna é composta por: Gambá, gato-do-mato, lontra, morcego, preguiça, macaco-prego, paca, capivara, onça-parda, onça-pintada, tatu, tamanduá, veado cateto, cotia, sabiá, tucano, tiê, gaivota, trinta-reis, atobás, saíras, ariranha, jacu. E sua flora por: juquitibá, jatobá, figueira-branca, jussara, canela, jacaterão, lhosão, manacá da serra, cedro, figueira, espinheira santa, angelim, guabiroba, guaca, guapeva, araticum, cortiça, tucum, patim, paté, estopeiro, caroba, caxeta, ipê-amarelo, imbiruçu, ingá-da-mata, pau-cigarra, em-baúva, mata-pau, bacupari, beira-campo, tabuceiva, olho de cabra, canela-sassafras amarela, canela-limão, muchista, pimenteira.

Principais Transformações

A dificuldade de acesso conseguiu preservar a região até a década de 70 (inau-guração da Rodovia BR-101) boa parte da mata e da cultura dos moradores da região. Porém a partir da década de 80 observa-se um grande desmatamento e freqüente descaracterização do modo de vida dos moradores bem como um pro-cesso de tensão social. É dentro deste contexto que o Núcleo começa a promover a preservação da mata, e estimular a integração dos diferentes segmentos de população: pescadores, índios, pesquisadores, turistas.

Além da fauna e flora, são muitos os atrativos que o Núcleo oferece, tais como: cachoeiras de águas cristalinas, visita a praias selvagens, voltar um pouquinho no passado e conhecer uma histórica Casa de Farinha, além de conhecer a cultura caiça-ra através de um bate-papo com esses ilustres e tradicionais moradores da região. O parque é aberto em diversos trechos: Vila Picinguaba, Bairro do Cambury, Praia e Ser-tão da Fazenda, Praias Bravas do Cambury e da Almada. As trilhas, passeios de bote e outras programações oferecidas, especialmente para grupos organizados, devem ser agendados no Centro de Visitantes que possui sanitários, sala de exposições, bi-blioteca, mapoteca, videoteca e oficina de recreação, fornecendo informações gerais sobre o parque e atividades de educação ambiental. Muitas trilhas podem ser reali-zadas ao longo do Núcleo e todas elas regadas a muita natureza, história e cultura, orientadas pelo grupo Monitora que é duplamente educativo, não apenas por receber os visitantes, como também por ser uma opção de trabalho para os moradores da região, que são treinados em ecoturismo e cursos de capacitação profissional. Além de desfrutar das belezas naturais, é possível conhecer histórias da cultura caiçara bem como as principais transformações ambientais, sociais, culturais e econômicas da Picinguaba por meio de um bate-papo com “seo” Genésio, morador antigo do Cam-bury, cuja história de mais de 70 anos é um testemunho dessas modificações.

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Ornitólogos

A vida vista de cima

João-botina-da-mataEsse pássaro mede cerca de 17 cm de com-primento e vive em áreas de brejo. Vive na Mata Atlântica. Devido ao fato de construir seus ninhos de graveto em forma de botina, recebe o nome popular de joão-botina. Fonte:wikiaves.com.br/phacellodomus

Tangará-dançadorMedindo 13 cm, esse pássaro é encontrado na Região Sudeste e Sul. Vive nas matas frondosas e dão um verdadeiro espetáculo pré-nupcial. Outra curiosidade é que pegam formigas para friccioná-las nas asas e na base da cauda, utilizando-as na higiene da plumagem, esfregando os insetos vivos nas asas para gozar o efeito do ácido fórmico, atividade que é tratada como “formicar-se”. Pode ser encontrado na Bahia, São Paulo, Rio de Janeiro, até o Rio Grande do Sul.Fonte:curiosidadeanimal.com/aves_tangara.shtml

Saí-verde Esse pássaro é também conhecido como saí--tucano, no Rio de Janeiro, e tem-tem. Mede apenas 13,5 cm de comprimento e pesa 18,5 g (macho). Vive nas copas e nas bordas das árvores, solitariamente ou em pares. Um pássaro que pouco se ouve o som. Encontra-do em vários pontos do Brasil, assim como em muitos países das Américas. Fonte: wikiaves.com.br/saí-verde

Se evoluímos muito nesses séculos, foi graças à curiosidade e à observação do meio em que vivemos. Esse dom que temos originou diversas invenções e abriu muitos horizontes, mas não ficamos apenas no campo científico. Com a arte da observação, aprendemos a admirar o belo e, com ele, seus encantamentos.

Muitos foram os que escreveram sobre as aves brasileiras. Al-guns deles em especial foram Hans Staden, conhecido na história de Ubatuba, os franceses André Thevet e Jean Léry e o holandês naturalista Georg Marcgrave, que relata as aves indígenas brasilei-ras em seu livro “História Naturalis Brasiliae”, datado de 1648.

Em Ubatuba, a observação de aves é algo natural, pois tamanha é a sua diversidade – são mais 400 espécies - que torna-se impossí-vel não termos essa curiosidade. Consequentemente, temos vários amantes dessa arte-ciência, como o casal Elis e Rick Simpson. Eles fundaram o Ubatuba Birdwatching Center (UBWC), que tem como prioridade estimular a preservação dos habitats naturais por meio da informação educativa aos visitantes e à população nativa.

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Ornitologia - ramo da biologia que estu-da as aves como um todo: seus habitats, distribuição geográfica, hábitos e costu-mes e classifica-os de acordo com suas espécies, gêneros e famílias. Um fato curioso é que essa ciência tem forte con-tribuição dos observadores amadores.

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Quilombo - Palavra de origem africana, da língua banto (kilombo), que significa acampamento, fortaleza de difícil acesso, onde negros que re-sistiam à escravidão conviviam com brancos pobres e indígenas. O banto encontra suas origens em países africanos como Angola, Congo, Gabão, Zaire e Moçambique.

Variadas são as formas de se colocar a condição do negro fugitivo, mas, que, no final, todas definem a situação, no mínimo cruel, dessa gente que impulsionou de forma significativa o desenvolvimento econômico brasilei-ro. À base de chicotadas, suas mãos tiraram da terra os ricos tesouros que abasteceram uma nação. Foram eles que elevaram o Brasil de mera terra de extração para um país de produção competitiva. E é dentro des-se contexto que devemos, ao entrarmos em um quilombo, admirar esses remanescentes que mostram tão pulsante, um passado muitas vezes ig-norado e não valorizado. E foi essa experiência fantástica que tivemos ao visitar os quilombos que ainda resistem em Ubatuba. Divina arte de se deslocar no tempo, mas não no espaço.

O passado pulsa

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“Em 1740, reportando-se ao rei de Portugal, o Conselho Ultramarino valeu-se da seguinte definição de quilombo: “toda habitação de ne-gros fugidos, que passem de cin-co, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levanta-dos e nem se achem pilões nele.”Fonte: www.itesp.sp.gv.br

Localização - hoje a fazenda mede 890 hectares que vão da orla ma-rítima até a Serra de Caçandoca, com 512 m de altura. “O território historicamente ocupado por aque-la comunidade quilombola hoje é identificado pelos seus moradores através dos nomes de cada uma das localidades que o compõem: Praia do Pulso, Caçandoca, Bairro Alto, Saco da Raposa, São Louren-ço, Saco do Morcego, Saco da Ba-nana, Praia do Simão.” Fonte: www.itesp.sp.gv.br

A cidade tem dois quilombos. O primeiro, Caçandoca, formado por descendentes do português José Antunes de Sá que adquiriu, em 1858, a fazenda de mesmo nome. Produtora de café e cana--de-açúcar, a mão-de-obra escrava foi largamente utilizada. Com o tempo a produção foi substituída pela banana e mandioca até a dé-cada de 1970.

Esse quilombo já abrigou inú-meras famílias, porém com a va-lorização das terras e a abertura da Rodovia Rio-Santos, muitos se deslocaram para regiões próxi-mas e atualmente a comunidade possui apenas 19. A economia lo-cal é tipicamente caiçara, voltada principalmente para o consumo próprio sendo a pesca e a coleta de marisco, além das plantações de bananas, as atividades econô-micas básicas. Seguindo a onda moderna de valorização cultural e do meio ambiente, o ecoturis-mo também é mais uma fonte de renda. Até hoje, o quilombo não tem distribuição de rede elétrica e água encanada e suas casas ain-da são feitas em sua maioria de pau-a-pique.

Camburi (Cambury)Segundo os moradores locais,

a ocupação da área foi feita pela escrava Josefa, fugitiva de Paraty, junto a outros negros. Diziam que esse bando vinha a Camburi para caçar e pernoitava em uma toca localizada morro acima (Toca da Josefa – que ainda apresenta ves-tígios da época), em muitos locais ainda a chamam de “tia”.

Também existe a versão de que por volta de 1870 estabeleceu-se o núcleo dos Conceição – oriundo

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“Os grupos que hoje são conside-rados remanescentes de comunida-des de quilombos se constituíram a partir de uma grande diversidade de processos que incluem as fugas com ocupação de terras livres e geralmente isoladas, mas também as heranças, doações, recebimento de terras como pagamento de ser-viços prestados ao Estado, simples permanência nas terras que ocu-pavam e cultivavam no interior das grandes propriedades, bem como a compra de terras, tanto durante a vigência do sistema escravocrata quanto após a sua extinção.”Fonte: www.itesp.sp.gv.br

Caçandoca - Apesar de a palavra ser confundida com algo relaciona-do a casa, devido ao sufixo local (casa em tupi-guarani), concluiu- se que o termo significa “gabão de mato” numa referência ao país do centro-oeste africano Gabão.Fonte: cpisp.sp.org.br

de Paraty - e ao mesmo tempo os do Basílio, liderado pelo chamado Velho Basílio, que originou vários troncos familiares até hoje encon-trados em Camburi. Outra origem também se dá à escrava Cristina, que morreu aos 115 anos na dé-cada de 1950, assim como os Bento e outros como os Zacaria e os Rosário, todos fugitivos de fazendas do Rio de Janeiro. Nes-se contexto é que as gerações formaram o quilombo de Cambu-ri. Mas também há relatos sobre a existência de uma fazenda no local denominado Cambory, cujos registros vão de 1798 a 1855, sendo os proprietários Domingos dos Santos e seus filhos, Manuel de Oliveira Santos e Francisco dos Santos. Mas não há registros da exata extensão dessa proprie-dade, o que se sabe é que era uma fazenda como as do local e com a mesma produção. Então conclui-se que vários escravos fugitivos ocuparam essa região e que parte dessas terras pertencia a uma fazenda de mesmo nome. Esse povoado permaneceu a viver como caiçaras, ou seja, vivendo da roça e da pesca até a década de 1960, comunitariamente, onde a terra não tinha valor comercial, era apenas um local para se mo-rar e viver. Após o surgimento do interesse por esse lugar, encrava-do em verdadeiros paraísos, os “compradores de terra” ganharam muito, mas muito dinheiro mes-mo, iludindo esse povo simplório.

Hoje, 50 famílias moram nesse re-duto que sofre também com a cons-cientização ambiental. Esse é um grande desafio, pois com a criação de Parques Ecológicos, as atividades básicas como a agricultura de sub-

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“É uma coisa comum a gente ou-vir aqui em Ubatuba que o cidadão chegou aqui bem vestido em uma casa e falou que queria comprar uma terra, aquela terra. O caiçara respondia “do lado direito do rio, eu vendo para você 15 braças”. Só que quando o caiçara vinha para a cidade, aquelas 15 braças que ele tinha vendido tinham se transforma-do em 100 braças: toda a terra do caiçara. O caiçara analfabeto colo-cava o dedão no documento e toda a sua terra ia embora, era “vendida”. Na cidade de Ubatuba isso é uma coisa natural. Até hoje é meio com-plicado, porque, o poder econômico ainda fala mais alto.” (depoimento de morador obtido por Paulo Ramos, ex-prefeito pelo PFL de Ubatuba).

sistência e a extração de madeira, ficaram proibidas, levando aos ha-bitantes da região poucas possibili-dades de recursos financeiros. Hoje a pesca e a venda de produtos na praia são o modo de obter recurso, além da exploração do Ecoturismo.

Apesar dessas situações arbi-

trárias, o que encontramos foram pessoas sofridas, mas amáveis e acolhedoras, que continuam a lutar pela sua “liberdade” para dar conti-nuidade à sua cultura que por tan-tos anos se manteve intacta, com respeito à natureza e com a simpli-cidade no viver.

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A riqueza

Todos nós sabemos dos acontecimentos históricos que envolveram a raça indígena no Brasil. Mas, muitas vezes, esses nobres legitimamente brasileiros foram caracterizados como pessoas indolentes e incivilizadas. Um erro absurdo, que atualmente pessoas envolvidas em sua causa tentam desmistificar. E é fácil detectar isso, pois com apenas uma visita e um parco convívio, pudemos observar a consciência ambiental que eles possuem e que o homem branco busca hoje incansavelmente aprender.

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Aldeia da Boa Vista da Nação Guarani(Tekoa Ñabdeva ‘eYuy Marãeyre)

Os índios brasileiros foram divididos de acordo com o tronco linguístico: tupi-guarani no litoral; macro-jê ou tapuias na região do Planalto Central; aruaques e cara-íbas na Amazônia.

Em Prumirim, na década de 1960, chegaram os ín-dios guaranis, que estavam se deslocando desde o Paraguai. As terras onde habitam foram devidamente oficializadas e possuem 801 hectares.

Em busca da terra sagrada, os índios guaranis ru-maram ao litoral. Segundo os antigos pajés, a terra teve uma segunda fase, que teria acabado em água (dilúvio). Porém, antes desse acontecimento, um índio atravessou o oceano e encontrou o paraíso que pode ser imaginário, uma energia ou algum lugar concreto onde os costumes são cultivados (ñande reko - nossos costumes) e só o bem prevalece. Por isso, pode ser uma terra que procuram ou, quem sabe, já habitam, pois acreditam que quanto mais próximos do mar, mais perto estão da terra prometida.

Os guaranis originaram-se no Paraguai e Argentina, ins-talando-se ao sul do nosso país. Porém, foram os nativos da Aldeia Rio Branco, em Itanhaém, os primeiros habitan-tes da Tekoa Ñabdeva’e (Aldeia Boa Vista), há trinta anos. Localiza-se a aproximadamente 2,3 Km da rodovia BR 101, no bairro do Prumirim, sendo 1,5 Km de estrada de terra até a escola da tribo. Depois segue-se uma trilha de 800m.

A aldeia segue seu cotidiano sem muitas surpresas. Porém, sempre atenta ao que seu Deus Ñanderu, o criador da terra, seus seres habitantes e do universo tem a lhes falar através de seus anjos protetores (os elementos que a terra manifesta) ou através das pre-monições do Pajé.

A aldeia de Ubatuba é liderada pelo cacique Marcos Tupã, desde 1993. É ele quem se responsabiliza por todo e qualquer ato da tribo. Marcos diz que toda a

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força de uma aldeia prospera da casa de reza, ela é o tronco de tudo. É onde o pajé, Sr. Marcelino ou Ñaman-do (Pequeno Sol), se reúne com o cacique Tupã (tro-vão), junto aos conselheiros para traçar as diretrizes da aldeia. Por exemplo: todo ano eles decidem juntos o que vão plantar e a função que cada um vai exercer. Primeiro decidem as responsabilidades dos homens e depois as das mulheres. Toda esta organização é em função de uma importante festa que acontece de de-zembro a fevereiro, na qual todas as aldeias guaranis participam visitando-se entre si, para o batizado das crianças nascidas no decorrer do ano. Após três noites de recolhimento na casa de reza, os pajés e os homens da aldeia fumam o cachimbo da paz e na última noite, por volta das quatro horas da manhã, saem juntos com o pajé para este dar os nomes guaranis às crianças. Na festa também é comemorada a boa colheita do ano anterior. O festejo é cultuado com bebidas e comidas sagradas. Quando tem alguém enfermo na aldeia, to-dos vão para a casa de reza e aguardam uma resposta do Deus-trovão (Tupã) que, quando responde, é um si-nal de que coisas boas vão acontecer, seja um retorno físico ou espiritual. Também se baseiam na resposta da mata, rios, animais, vento, de toda a natureza!

Boa Vista não recebeu este nome por acaso, pois a vista que oferece aos olhos é de inigualável beleza. É com este panorama que as crianças da Aldeia rece-bem aulas na escola indígena Tembiguai (mensageiro), mantida pela prefeitura, onde os alunos de 1ª e 2ª sé-ries aprendem sua língua de origem, o guarani-mbya e os de 3ª e 4ª séries recebem aulas em português.

Por meio de Marcos Siqueira, da Funai, junto ao pro-jeto Tamar, os espaços comunitários da aldeia (escola, farmácia e casa de reza) contam com a energia solar.

Índio, íntegro a seu planeta; na simplicidade, o pri-mor de saber viver!!

Quem quiser vivenciar o cotidiano da aldeia Boa Vista, ver como surgem através de trançados lin-dos cestos, apreciar o som primitivo de nossos ancestrais, ou vivenciar uma língua para nós des-conhecida, pode entrar em contato com a Fundart (12) 3832-7732 ou Cx. Postal 149 - Ubatuba/SP. CEP: 11680-000 a/c de Marcos Tupã. Há’e Vete (muito obrigada)!

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Projeto Tamar

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Projeto TamarDedicação que deu certo

O Projeto Tartarugas Marinhas - TAMAR nasceu em 1980 por conta da preocupação com a possível extinção das tartarugas cabeçudas, verde, de pente, oliva e de couro, pois com o au-mento de redes de pesca, muitas delas eram capturadas, além do consumo desordenado de seus ovos que são depositados nas areias de determinadas praias. Essas espécies circulam pelo litoral brasileiro para se reproduzirem e se alimentarem. Primeiramente a prioridade era a proteção de fêmeas e filhotes. Hoje esse projeto é referência mundial em manejo e educação ambiental. Já possui 23 bases espalhas pelo litoral brasileiro numa área de 1100km².

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Projeto Tamar

Ubatuba está entre os 11 Centros de Visitantes do Projeto TAMAR ini-ciado em 1991, sendo um dos mais completos para as principais atividades desenvolvidas que são: educação ambiental, pesquisa científica e preser-vação. Em uma área de 2500m², esse centro recebe em média 100 mil visitantes por ano, transformando-se num dos pontos turísticos mais visita-dos na cidade. Bem aparelhado, o local dá completo suporte para a educa-ção ambiental, onde inclusive, possui o Museu do Caiçara - uma forma de preservação e de comunhão com a comunidade pesqueira, que se tornou parceira na preservação das tartarugas. E essa parceria deu certo, já foram salvas 5 mil tartarugas presas em redes de pesca. Por Ubatuba ser uma antiga região de porto do litoral paulista apresenta grande frota pesqueira fator esse que favorece a incidência de captura acidental em redes de pes-ca ao longo de todo ano. Na região são encontradas grandes quantidades de tartarugas juvenis bem como as tartarugas verdes com mais de 95% dos registros, a cabeçuda e a de pente são capturadas sempre. Em 2000, o TAMAR iniciou em Ubatuba o monitoramento da captura incidental de tar-tarugas marinhas pela frota camaroneira. Equipes do Projeto embarcam na pescaria para marcar e soltar os animais capturados, além de ensinar à tripulação as técnicas para reanimar as tartarugas que estejam afogadas.

As atrações no Centro são os tanques com exemplares vivos de tar-tarugas e uma maquete que representa a desova e o nascimento dos filhotinhos, museu com peças naturais, loja e lanchonete.

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Locais de atuação O TAMAR trabalha em 106 quilômetros de praia em Ubatuba, monitorando

cercos flutuantes no continente nas praias do Bonete, do Cedro e Camburi. No Parque Estadual da Ilha Anchieta, o TAMAR trabalha em parceria

com os pescadores dos três cercos existentes no local, nas praias: do Sul, do Leste e Pedra do Sul, destacando-se o da Praia do Sul, que é visita-do por técnicos diariamente desde 1995, gerando dados de grande valor para ampliar os conhecimentos sobre a interferência dessa arte de pesca na vida das tartarugas marinhas.

Na praia do Itaguá também há marcação periódica de tartarugas no rancho de pescadores, capturadas em redes de espera.

Em outras nove praias - Almada, Enseada, Flamengo, Lázaro, Perequê--Açu, Picinguaba, Pulso, Saco da Ribeira e Tenório - os pescadores colabora-dores informam quando ocorrem capturas, geralmente em redes de espera.

Turismo e trabalho social A Base do Projeto TAMAR é outro importante atrativo turístico da região e

se destaca também no trabalho de inserção social, por meio de dois impor-tantes programas: a Oficina de Sacolas de Papel Reciclado (que produz 7 mil sacolas/mês) e o Projeto de Educação Ambiental: Aprendendo a Preservar a Terra e o Mar e Tartarugas Marinhas - a vida pede respeito, no qual alunos de Ubatuba aprendem a cuidar de tartarugas marinhas dos tanques do Centro de Visitantes e participam do trabalho de campo.

E, no meio de nossa visita, tivemos o privilégio de participar de uma ocor-rência na praia de Camburí, onde pescadores locais resgataram mais de 20 tartarugas. Todas foram pesadas, medidas e aneladas pelos técnicos do TA-MAR e pudemos, nós, os pescadores e seus filhos, devolvê-las ao mar. Expe-riência única que todos, pelo menos uma vez, deveriam ter, pois a sensação de dever cumprido e de dar liberdade a esses animais fantásticos é de uma profunda satisfação e emoção de difícil descrição.

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Aquário

O aquárioEducação ao alcance dos que mais precisam

Fundado em 1996, o Aquário de Ubatuba é uma referência em educação ambiental com uma gama enorme de espécies marinhas, acessíveis ao público visitante. São 12 tanques de água salgada, sendo o principal com 800 mil litros, um dos maiores do Brasil.

Em parceria com o Instituto Argonauta para a Conservação Marinha, foi montado o Museu da Vida Marinha que possui um acervo que retrata e evolução da fauna marinha. A maioria de-las é proveniente do nosso litoral e uma minoria, importada.

O interessante do Aquário de Ubatuba é a interatividade com as escolas do município que, via convênio, tem a possibilidade de participar das atividades desenvolvidas por biólogos. Essa

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forma prática de educação ambiental para o en-sino fundamental é importantíssima para que as crianças já cresçam com a mentalidade objetiva na preservação e uso consciente dos recursos na-turais, pois a maioria dessas crianças é de comu-nidades caiçaras que ainda estão se adaptando aos novos conceitos de conservação ambiental.

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Lendas

O imaginário

O Brasil é um país rico em histórias, muitas vezes, alteradas pelo tempo. Essas histórias têm origem na prosa e no poder da imaginação de cada local. A isso se dá o nome de lenda, pois nunca se saberá ao certo se o fato foi verdadeiro ou não, porém nos encanta e nos faz, bem no fundo, acreditar que o místico existe e ainda sobrevive de geração para geração. Ubatuba não é diferente, em cada canto uma lenda admirável pela criatividade expressa por seu povo.

Corcovado O Morro do Corcovado é o ponto mais alto de Uba-

tuba, onde muitas histórias sem explicações racionais aconteceram. Uma delas é a do desaparecimento de frei Bartolomeu, ocorrido em 1697. Antes da chega-da do Frei a Ubatuba, dois jovens, Pablo e Juan, filhos de um fidalgo espanhol, resolveram chegar ao topo do Corcovado. E, infelizmente, desapareceram na pri-meira curva do caminho ao amanhecer. O sumiço in-quietou os familiares, amigos e demais moradores da vila. Para achá-los, entregaram a busca a um escravo

concretizadoque foi acompanhado por mais cinco homens. Porém, ao começar a subida, o escravo nunca mais foi visto. Passados sessenta anos, frei Bartolomeu, da Ordem de Francisco, saiu de São Vicente para Ubatuba com a finalidade de oficiar uma missa em homenagem ao padre Anchieta, e ali, em contato com os moradores do lugar, tomou conhecimento do que acontecera no passado e quis provar que não havia nenhuma coisa maligna no local. Disse que subiria ao alto do morro para provar e ainda colocaria lá em cima uma grande bandeira vermelha capaz de ser vista por quantos o acompanhassem ao pé da elevação, afastando, dessa forma, qualquer dúvida porventura existente entre os ainda recalcitrantes. E foi o que fez. Satisfeitos, todos ficaram esperando o retorno do religioso. Os mais aten-tos haviam percebido a figura de frei Bartolomeu des-cendo lentamente do alto do morro. O frei se arrastava pedra abaixo com extrema dificuldade, e quando se ex-pôs completamente ao luar, nenhum dos homens dei-xou de perceber a palidez fantasmagórica estampada em sua face triste, os olhos encovados e sem brilho, a

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concretizado

boca murcha com lábios contraídos e esbranquiçados. Mesmo assim, eles correram para abraçá-lo, mas só avançaram alguns metros porque o frei simplesmente desapareceu da vista de todos. Para onde tinha ido? Foi o que se perguntaram. Gritaram o seu nome, uma, duas, três vezes, até que um gemido rouco, terrível, veio do alto, ecoou pela mataria e se perdeu na noite. Um frio de morte gelou os presentes, e por mais valentes que fossem, tanto que estavam ali até àquela hora, to-dos eles saíram em carreira desabalada, abandonando o mais depressa que podiam aquele pedaço de chão amaldiçoado. Dizem que ainda hoje, quem se atrever a ficar no sopé do morro do Corcovado poderá ver frei Bar-tolomeu descendo devagar pela rocha, tentando chegar à base da elevação.

A Mina de Ouro do CorcovadoAlice, filha do maldoso capitão Manoel Fernandes

Corrêa, desapareceu em uma caçada. Desesperado, o pai pede a seus escravos que a busquem no preocu-pante pico do Corcovado e em seus arredores com a promessa do salvador ter a liberdade como prêmio. O escravo Pedro, apesar da ira por Corrêa, achou Nina Ali-ce esfarrapada por entre arbustos espinhosos. Chegan-do à escadaria da Casa Grande, Pedro não foi recom-pensado com liberdade e também sofreu castigos no tronco. A menina, revoltada pela atitude do pai, fez com que saísse em defesa do escravo e obrigasse seu pai a cumprir sua palavra. Liberto, Pedro se instalou e fez uma choça próxima à escarpa misteriosa do Corcovado. Tempos depois, Alice, que já havia morrido, apareceu em seu reduto e revelou-lhe uma mina de ouro, com o aviso de que este segredo jamais poderia ser revela-do a ninguém, pois as conseqüências seriam terríveis. Sabendo disso, o ex-escravo sobreviveu durante anos pagando suas compras com pepitas de ouro. Tal fato despertou a curiosidade popular e também de seu anti-go algoz, que o capturou e o torturou com o objetivo de saber de onde vinha aquele ouro. E, quando já estava totalmente sem forças para resistir e prestes a contar tudo sobre a mina, o aviso de Alice se materializou, cul-minando na morte de Pedro.

O Corpo Seco Todas as noites, no botequim do Moreno, a turma se

reunia para jogar truco. Um dos jogadores era o famige-rado Bernardino de Campos, conhecido por Didico, um rapaz de costumes e vícios abomináveis. Didico tinha

uma família pobre de pais idosos e mais dois irmãos. Certo dia, durante um jogo, o rapaz recebeu a notícia de que seu pai havia falecido. Ignorando completamen-te o acontecido, absteve-se concentrado nas cartas, o que espantou seus companheiros. Quando voltou para casa, alguns dias depois, deu uma surra em sua mãe, Maria Rosa, que ficou paralítica, pois queria o dinheiro que seu irmão mais velho havia enviado. Indignada, a mãe rogou uma praga a Didico, proferindo-lhe essas pa-lavras: “Miserável! Vai! A minha maldição te perseguirá sempre! Não terás sossego em tua vida nem paz depois de morto! Bandido! A própria terra te rejeitará... Vai!”. Com a morte de Maria Rosa, que não tardou a vir devido a seu estado de abandono, Didico ficou na miséria total e sem amigos. O mais intrigante é que tudo o rejeita-va mesmo, inclusive a sombra das árvores, que abriam suas ramas para dar passagem ao sol escaldante. Não tendo forças para continuar vivendo, Didico suicidou-se. Encontraram-no enforcado no galho de uma árvore, pen-dente sobre o Rio Lagoa, conhecido por Barra da La-goa. Mas a “praga” de sua mãe sobreviveria após sua morte e tudo o rejeitaria, assim como a terra em que foi sepultado. Conforme seu corpo era enterrado, este

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Lendas

emergia no dia seguinte, o que atraiu a curiosidade do coveiro local. Os parentes do rapaz trataram de levar o corpo para a costeira do Caruçumirim (Prainha), lá para os “lados de fora”. Coitados dos pescadores da Prainha que sofriam amedrontados pelos gritos que partiam do local do sepultamento de Didico. Este rogava aos vivos que o enterrassem na Barra da Lagoa, onde cometeu o suicídio. Não se sabe como, depois de algum tempo, o corpo do malfadado não estava mais lá e muitos morado-res viram-no ser transportado por vultos, trazendo a paz de volta ao lugarejo. Em uma véspera de Natal, pessoas montavam presépios com liquens. Chiquinha Bastos e Clarita Pinto foram pegar os fungos na margem do Rio Lagoa e encontraram um cepo disforme coberto de be-líssimos liquens. Maravilhadas pela quantidade oferecida de matéria-prima, trataram de tirar tudo o que podiam, mas foram surpreendidas por uma voz: “Moça, aqui tem mais”. Quando se deram conta, o cepo deixou transpa-recer sua verdadeira forma: a de um corpo humano, res-sequido e corroído pela ação do tempo. Dizem que ele ainda está lá, padecendo da praga rogada por sua mãe.

Gruta que Chora

Gruta que Chora (Dragão da Sununga)

Existem duas versões para essa lenda. A primei-ra é que nessa gruta havia um monstro marinho que atacava os barcos pesqueiros e seus tripulantes. Um dia, o padre Anchieta foi ao local para ver se a fera era coisa do diabo e aspergiu água benta por toda a gruta. Feito isso, nunca mais o monstro foi visto.

A segunda é a história de Marcelina, uma adoles-cente que, de uma hora para a outra, acometeu-se numa cama e ali permaneceu à espera de uma ser-pente com cara de dragão que a visitava esporadica-mente. A serpente transformava-se num lindo moço que a enamorava. Segundo Marcelina, Sr. Antero, um pescador local, contou-lhe que, certa noite, quando ia para sua casa na Praia das Sete Fontes, ouviu um ba-rulho muito forte e viu o tal monstro saindo da gruta e, com muito temor, começou a rezar, pedindo prote-ção para não ser devorado. O bicho então começou a encolher e sumiu no meio da mata. Depois que soube do acontecido, a pobre moça não tirou mais essa his-tória da cabeça e, com sua imaginação, passou a ver o dragão por todos os lugares, até que, certa noite, ele apareceu em seu quarto. E não foi apenas uma noite, foram muitas e, a partir de então, Marcelina passou a ficar esperando por seu “amado”, todas as noites, com a esperança de um dia ficarem juntos para sempre. A mãe da adolescente estava deses-perada, quando, um dia, bateu à sua porta um mon-ge idoso, o qual Dona Amália deu de comer e beber. Vendo aquela amável senhora aflita, perguntou-lhe o que se passava, e o pobre monge escutou. Não era a primeira vez que ele ouvia a história do monstro e, junto com a população assustada, foi para o local tenebroso. Chegando à gruta, o homem santo fez o si-nal da cruz e jogou água benta com o som das preces dos que o ajudavam. Nesse momento, trovões foram ouvidos e o dragão saiu, mergulhando sem volta no fundo do mar. As duas versões se fundem, pois não se sabe se o monge era ou não o jesuíta Anchieta. A gruta foi batizada por Gruta que Chora, pois de seu teto e paredes, vertem água benta que, no caso, é a água benta jogada para impedir que o monstro volte. Muitos acreditam que as águas que caem são as lá-grimas de Marcelina, que muitas vezes voltou ali com a esperança de seu lindo amante voltar.

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te move?

Para os adoradores de esporte, a cidade de Ubatuba é uma verdadeira arena. Muito rara é a modalidade esportiva que não se encontra por essas bandas. As condições naturais são extremamente favoráveis, tanto para modalidades aquáticas, quanto para as terrestres.

Capital do Surf

O número de praias favoráveis à prática do esporte faz da cidade uma das favoritas pelos surfistas nacionais e in-ternacionais, tanto é que a cidade passou a ser denomina-da como a Capital do Surf, fator esse que tem contribuído para favorecer o nome do Brasil no exterior. Dentre as praias mais procuradas para tal modalidade, podemos citar: Ita-mambuca onde são realizadas as mais importantes com-petições, com maior variedade de ondulações; Félix, para surfistas mais experientes; Vermelha do Norte, com ondas tubulares e rápidas; Vermelha do Centro (Vermelhinha), praia de tombo com ondas cavadas; Canto das Bananas, o lugar perfeito; Toninhas, com ondas longas e bem manobráveis. Circuito Municipal de Surf

O evento, que já ocorre há três décadas em Ubatuba, é considerado o maior circuito municipal de surf do país com média de 120 atletas divididos em 15 categorias, contemplando atletas em formação, profissionais con-sagrados e veteranos que contribuíram para a evolução do surf no município. Além da Prefeitura o evento conta com apoio de empresas de Ubatuba e surfwears.

Curiosidade: Nas escolas públicas da cidade, o esporte está incluso nas aulas de Educação Física.

Surf - Diz a lenda que o rei Tahito foi o primeiro sur-fista polinésio que chegou ao Havaí, mas o navegador James Cook, ao descobrir o arquipélago, em 1778, já havia encontrado surfistas nas ilhas. A divulgação do surf ocorreu quando o surfista Duke Paoa Kahanamoku conquistou a medalha de ouro em natação na Olimpía-da de 1912, mostrando o Havaí ao mundo. No Brasil, a atividade surgiu na década de 30, tendo como marco a fabricação da primeira prancha de surf nacional pelos paulistas Júlio Putz, João Roberto e Osmar Gonçalves.Fonte: Associação Brasileira de Surf

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Para AprenderPara se tornar um mergulhador profissional, o interessado tem que aprender sobre física, fisiologia, equipamen-tos, meio ambiente, tabelas de descompressão, segurança do mergulho, planejamento, entre outros assuntos, em cursos de mergulho profissional especializados.

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MergulhoUbatuba é referência em todo litoral brasileiro quando

se trata do assunto: é uma região privilegiada por pro-porcionar mais de 50 pontos de mergulho, com peculia-ridades diferenciadas. Os lugares mais visitados ficam no máximo a 21 milhas do continente, como as ilhas das Couves, Rapada, Laje Grande, Anchieta e Vitória.

Conversamos com Carlos Eduardo Reichmann Filho, 39, na área há 14 anos como instrutor e mergulha-dor especialista em mergulho de costão. Kadu, como é conhecido, já mergulhou em diversos locais, como Bonito, na Gruta do Limoso e Buraco das Abelhas e também no mar Mediterrâneo, precisamente na Ilha de Mallorca. Formado pela Naui (National Association of Underwater Instructors), explicou-nos que, em Uba-tuba, a melhor época para a prática do mergulho é no verão, pois é o tempo da água limpa (quer dizer que há boa visibilidade), oferecendo ao praticante uma visão da rica fauna marinha local: badejos, garoupas, roba-los, uma variedade de crustáceos, tartarugas etc.

Para os iniciantes, uma dica de Kadu é procurar pela Ilha das Couves, pois existem lugares abrigados, bons para desenvolver todas as técnicas e também para a realização do check-out – batismo – que é a prova final do curso. Para os mais radicais, a ilha Vitória é muito boa por sua grande profundidade e pela correnteza.

O que é mergulhar? “Mergulho, para mim (Kadu), é um trabalho que faço porque gosto, me sinto feliz. Quando mergulho, é um mundo à parte; o tempo, o ritmo em que você se move, a audição, o olfato com o ar denso do regulador, os sentidos, tudo muda. No recreativo, a ausência de gravidade dá a sensação de vôo, só sabe que se está debaixo d’ água por causa do barulho do regulador. Acredito que seja o momento em que o homem voa de verdade e, para quem é princi-piante, isso é deslumbrante. A adrenalina flui por estar em um mundo desconhecido. No mergulho noturno, a sensação é de estar mergulhando naquele lugar pela primeira vez; pelo conhecimento anterior, você aprovei-ta mais as sensações. A vida noturna é diferente pela fauna e pelas cores. Tudo fica mais colorido por conta do foco da lanterna, pois não dá tempo da água de-compor a luz e, sem a interferência da luz solar, tudo fica mais nítido. Aos 22 anos, fiquei dependente de nitrogênio e hoje sou um grande incentivador do mer-gulho, porque ele transforma a vida das pessoas pelo contato com a natureza. Além de tudo, o mar ainda não é totalmente conhecido, isso dá aquela sensação de explorador, como na época das Grandes Navegações”.

HomenagemNa praia do Leste, Ilha Anchieta, a 10 metros de profundidade, foi colocada uma estátua em home-nagem a Jacques Cousteau, com 1,80m de altura e 300 kg. Essa homenagem foi feita em 1997, em um encontro de mergulhadores.

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VelaPrática que teve início pela necessidade de um povo que tinha o mar como rota de transporte. Em Ubatuba, o Saco da Ribeira é o local onde grande parte dos eventos acontece. Existem muitas escolas extrema-mente qualificadas para quem quer se aven-turar. Todo ano acontece o Circuito da Vela, organizado pelo Clube de Regatas Saco da Ribeira e Associação de Vela de Monotipos.

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Pesca de Vara EsportivaAo longo das praias ubatubenses, existe uma grande variedade de peixes que fazem a alegria dos pesca-dores amadores, como o bagre, o linguado, o pam-po e vários outros que vivem em fundos arenosos e também a garoupa, o mero, o badejo que vivem em fundos rochosos. Esta modalidade de pesca só pode ser feita com a devida licença concedida pelo IBAMA.

Haka RaceCompetição que envolve várias modalidades, como rafting, caminhada de longa duração, ciclo turismo e outras. Uma prova de resistência e estratégia. Ubatu-ba já recebeu em suas terras essa competição e foi avaliada em alto grau de qualidade.

CavalgadaNo haras em Itamambuca, podemos percorrer a bela e exuberante Mata Atlântica sobre um cavalo. Além disso, o local oferece aulas de equitação, arquearia (tiro com arco e flecha) a cavalo e conta com uma tropa composta por 10 animais de qualidade, da raça Mangalarga Marchador. O trabalho é desenvolvido pelo projeto de Normalização e Certificação em Tu-rismo de Aventura no Brasil (ABNT), do Ministério do Turismo, sempre garantindo a segurança.

CanoagemHá um roteiro turístico compreendendo uma via-gem curta de dois dias que atrai os que praticam canoagem. O trajeto inicia-se na praia do Lázaro e Sununga até a praia do Cedro onde é armado um acampamento para seguir viagem no dia seguinte. No segundo dia, desarmado o acampamento, a península é contornada e a canoagem é seguida através das praias do Bonete, Prainha e Lagoinha, retornando à praia de Fortaleza.

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Montain BikeBicicleta da montanha é uma modalidade de ciclismo que consiste em transpor percursos com diversas irregulari-dades e obstáculos. Exige do praticante auto-suficiência e muita resistência. Em Ubatuba, esse esporte é levado ao extremo, com Bike Run, prova feita entre o Sertão e Praia do Ubatumirim, situada a 30 km do centro de Uba-tuba sentido Paraty. Os atletas têm de percorrer 22 km de mountain bike e 8 km de corrida, passando pela diver-sidade da natureza local de Mata Atlântica, mas sempre em terreno misto, entre trilhas e asfalto.

RaftingIdeal para aqueles que estão em busca de aventura, esse esporte radical pode ser realizado em diferentes níveis, desde o iniciante até o avançado. É uma boa forma de conhecer a Serra do Mar, aliando duas sensações emo-cionantes: contemplar as belezas naturais e a adrenalina que o esporte proporciona.

TreckingTrilhas dos mais variados níveis levam a praias selvagens de Ubatuba e de municípios vizinhos, como Parati e Trin-dade, no Estado do Rio de Janeiro. As mais percorridas são as do Corcovado, considerada de nível difícil, com su-bida de 1150 metros e média de duração de sete horas; Bonete, de nível médio, com duas horas de caminhada, saindo da praia da Lagoinha, passando pelas praias Bo-nete e Grande Bonete; Sete Fontes, de nível fácil, sain-do do Saco da Ribeira e Monte Valério, também de nível fácil, localizada dentro do Parque Municipal. Em alguns roteiros, há passagens por aldeias indígenas, ruínas de

fazendas e cachoeiras. Na Associação dos Monitores de Ecoturismo de Ubatuba, na praia do Tenório, há informa-ções detalhadas de todas as trilhas. Várias outras modalidades esportivas podem ser pratica-das em Ubatuba, fazendo dessa cidade um atrativo para os admiradores de diversas categorias, principalmente na época de férias. Para isto, existe um grande trabalho de-sempenhado pela Secretaria de Esportes e Lazer do muni-cípio, sempre atenta à preservação do seu ecossistema.

Ecosurf - ONG A açãoda Associação Ubatuba de SurfHá mais de 20 anos, a Ecosurf é uma en-tidade sem fins lucrativos ou políticos, tendo como principal objetivo a dissemi-nação do surf não apenas como esporte mas também como estilo de vida. Voltada para a melhoria dos esportistas da região bem como para a formação de novos atle-tas que ocorre nas escolas municipais de Surf, reunindo cerca de 350 alunos matriculados. Atua também na preserva-ção de praias e rios, além de promover campanhas ecológicas, culturais e sociais.

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Vida de Caiçara

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De lua a lua, esse povo leva vida simples e singela, mas de riqueza sem igual. Um povo que, há gerações, vive harmoniosamente com a natureza. O caiçara é dono de sabedoria secular, é um verdadeiro elo entre homem e natureza.

Oriundos da miscigenação entre indígenas, coloni-zadores europeus e negros, os caiçaras incorporaram tradições e costumes ligados a esses povos, adaptan-do-os num modo de vida singular baseado na pesca, agricultura de subsistência, artesanato e extrativismo vegetal, desenvolvendo um conhecimento aprofundado sobre os ambientes em que vivem, além de tradições folclóricas e um vocabulário único.

CaiçaraFarinheiras

Aprender a arte da fabricação da farinha de man-dioca, era uma das tarefas da mulher caiçara, que começava cedo, às vezes começavam bem crianças. A lida não era fácil, preparar a terra, plantar e colher fazia parte da rotina. Plantava-se também a mandioca venenosa, mas que não faz mal à saúde porque é la-vada, raspada, espremida, coada, seca no forno, na coxa, vai outra vez no forno, outra vez na coxa até virar farinha pura. Os horários são rígidos, pois os trabalhos começam as 3 horas da manhã e só acabam ao meio--dia. O caiçara chama esse fabrico de “farinhando” e era vendida a litros.

A pesca

O caiçara aprendeu muitas técnicas de pesca ao longo do tempo, “para a pesca usa espinhel (corda extensa onde prende anzóis) e redes: tarrafa, picaré, jereré, puçá e faz nos rios as cercas ou chiqueiros de peixes. A pesca com rede requer o uso de canoa - a ubá. A rede mede cerca de 140 braças de comprimen-to por 6 de largura. Para facilitar a flutuação na parte superior da rede, colocam bóias de cortiça. E na parte inferior colocam as chumbadas ou peso de barro cozi-

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do. Nas extremidades da rede, colocam cordas para puxar o arrastão. Colocam a rede no mar, levada pela ubá, e depois vêm arrastando até a praia - é o famoso “arrastão”. Hoje, os barcos a motor, fazem parte da pesca, ou seja, cada vez mais aprimorando e evoluindo dentro de seu meio.

“Com estes, o homem caiçara pesca no “mar de dentro” para sua subsistência. O arrasto da tainha me-rece atenção especial, pois se trata de um momento de congregação da comunidade, no qual todos traba-lham para todos”.

A agriculturaO complemento alimentar dos pescadores e seu

principal produto é a farinha de mandioca - consumida em quase todas as refeições - que desde os tempos imemoriais se trata de um substituto do pão europeu e, por isso mesmo, chamada de “pão dos trópicos”. Existe, ainda, uma infinidade de produtos secundá-rios e ervas medicinais. Seus principais produtos são: mandioca, milho, cana, feijão, guandu, inhame, entre outros.

A fabricação de canoas e a memória caiçaraA construção de canoas foi uma importante ativida-

de desenvolvida pelos caiçaras durante muitos anos. Esta embarcação artesanal comprida, movida a remos, ou por vela de pendão ou motor de popa era muito utilizada por pescadores em suas longas jornadas ao mar. Hoje, devido às legislações de proteção ambien-tal, a sua fabricação é desenvolvida por pouquíssimas pessoas e está praticamente esquecida entre os ha-bitantes do Litoral Norte. No entanto, o Instituto Cos-ta Brasilis e seus parceiros lançaram o projeto “Com quantas memórias se faz uma canoa” justamente com o intuito de preservar e relembrar esta importante prá-tica da cultura indígena, além de prestarem uma justa

Origem do nome palavra caa-içara é de origem tupi-guarani; caa significa galhos, paus, “mato”, enquanto que içara significa armadilha.Os caiçaras formam um povo que evoluiu e aprendeu a aproveitar os recursos naturais. Convivendo com o mar e a mata, sabe como poucos utilizar os benefícios da natureza.

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homenagem ao mais ilustre folclorista da região Ney Martins, idealizador do projeto e falecido em 2007.

Resultado de um ano e meio de pesquisa, junto a construtores e proprietários de canoas, realizada em 36 praias e uma ilha de Ubatuba, o empreendimento resultou em um livro de mesmo nome, uma página na internet e um vídeo documentário “Canoa Caiçara”. To-dos estes produtos procuraram abordar, dentre outros temas, a importância da canoa para os pescadores, a problemática que a envolve na atualidade, a complexi-dade da sua produção e, claro, como não poderia faltar, as histórias de pescador, os incríveis “causos” oriun-dos de muitas viagens a bordo da antiga embarcação, também estão lá.

Canoas de VogaFeita de um único tronco como o Cedro Guapuruvu

e o Jequitibá, com mais ou menos 8 metros de com-primento, essas canoas talhadas à mão, quando da retirada do tronco até a oficina, havia entre a comuni-dade grandes festas. Era um rito quase religioso, pois a canoa era o meio de transporte das mercadorias cai-çaras que eram levadas ao porto de Santos. Possuía velas e remos e era pilotada por 6 marujos em média. Esse tipo de construção de canoa era típica dos caiça-ras ubatubenses.

Ser caiçara é ter orgulho de suas origens, é ter cora-gem para enfrentar o mar, é ter capacidade de viver no isolamento, saber dividir o produto de sua pesca e ter consciência que Deus lhe deu as duas maiores forças da natureza: a floresta e o mar.

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Vida de Caiçara

A troco de banana: preço baixoAcabosse o que era doce: terminouAmolante: vagarosoAntonte: dois dias antesAperreando: não deixar fazer direitoArria: coloca no chãoBabau: acabouBocaina: horizonteBurburinho: confusãoCala boca: admiração, espantoCaniço: vara de pescarChio de peito: asmaCoça: surraCodó: pedaço de praia pequenoCoisinha: substitui o nome esquecido naquele momentoConsertar o peixe: limpar o peixeCurriola: um bando de pessoasDe marca maió: muito grandeDe veiz: quase maduroDeixestá: você vai ver como é que ficaDesacorçoado: não ter motivaçãoDor nas cadeira: dor nos quadrisEscambo: trocaEscárnio: pouco casoEsculhambar: xingar, chamar a atenção, advertirEscorar: amparar árvore caídaEstais tão gabosa: estás muito bonitaEstrada de rodagem: ruas dos dias atuais Foi pro beleléu: já foi embora, morreuFuzilando: relampejandoGuardanapo: pano de pratoLambedô: xaropeMarmandado: desobedienteMe aprecatei: preveniNaco: pedaçoOrdenado: salárioPicape: vitrolaPrenha: grávidaQuebrante: mal olhadoRachei o bico: ri muitoReparar: olhar para criticarSapeca: assanhadaSubaco: sovacoTarrafa: espécie de rede de pescaTemperar o café: adoçar o caféTo em pandareco: estou malTrês antonte: três dias antesUm bocado: grande porçãoVerdolenga: quase maduraViração: vento do sul fracoZanzando: andando de um lado para o outro

VocabulárioVoz mansa, cheia de peculiaridades. O sotaque caiçara acentua as palavras de um modo diferente, troca o “v” pelo “b” e, claro, o “você” é substituído pelo “tu”. Muitas expressões do nosso dia-a-dia tiveram suas origens nessa cultura.

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não deixe de visitar

Instituto Oceanográfico da USPPesquisas realizadas principalmente em relação às tábuas das marés, é um perfeito local para termos uma ideia do desenvolvimento científico brasileiro. Está localizado na Enseada do Flamengo. É necessá-rio agendamento prévio.

Estátua Pe. José de AnchietaEm comemoração ao 4º Centenário do município, essa estátua está localiza-da na Av. Iperoig, justamente no ponto onde o próprio escreveu seu famoso “Poema à Virgem”, enquanto cativo dos índios Tupinambás.

Praia do Lúcio ou das ConchasSe você é adepto à pesca, vale à pena seguir a trilha a partir da praia do Félix para curtir um visual e ainda ter o que fazer para o jantar. A trilha é de grau médio.

O ponto do Trópico de Capricórnio“Linha imaginária que marca 23º26’21” - Sul, que é o valor médio da inclinação do eixo de rotação da Terra com relação ao plano de órbita dela em torno do Sol. E aqui em Ubatuba, nos dias 22 de junho e 22 de dezembro, o Sol fica totalmente a pino. São chamados de Solstícios de Inverno e Verão, respectivamente. Em nenhu-ma outra cidade do Litoral há esta ocorrência.

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Vila

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Aproveite as baladas que agitam as noites da vila

Uma obra de 1937 feita pelo escultor Vicente Larocca, no Largo da Matriz, esculpido em grani-to picolado, em comemoração ao 3º Centenário da cidade de Ubatuba.

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Feira de ArtesanatoNa praia do Cruzeiro você terá uma gama variada de artigos artesanais com bom preço e quali-dade. Muito bem organizada reúne artesãos de todo o litoral paulista. Aproveite para saborear os petiscos à venda sentindo a brisa do mar.

Cantão de ItamambucaNo encontro do rio com o mar, há uma formação de água salo-bra e tranquila para uma boa relaxada no corpo. A paisagem é um descanso aos olhos.

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...tomaria VÁRIOS banhos de cachoeira ...levaria para casa uma artesanato indígena

... caminharia pela praia com os ami-gos até os últimos raios de sol

Se eu fosse você...

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...observava cada detalhe da exuberante flora

...prestigiaria o projeto Tamar

...pedalaria pelas praias da cidade...relaxaria a beira do rio

...mergulharia entre os peixes

...apreciaria o artesanato local

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Gente da Terra

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Dados estatísticos

Localização Geográfica:Localização GeográficaLatitude: -23°.26’.02’’SLongitude: -45°.04’.15’’OAltitude: Máx 1.670m Mín: 0m

Pessoas Residentes:79.718 (censo 2011)

Gentílico:Ubatense

Limites:Norte: CunhaNordeste: ParatiSudoeste: CaraguatatubaNoroeste: Natividade da Serra e São Luís do Paraitinga

Clima:

Distâncias:São Paulo – 250kmSão José dos Campos – 137kmRio de Janeiro – 310km

Densidade demográfica: 105,3 hab/km²

Área Total:712 km²

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Data de fundação:28 de outubro de 1637 Tropical úmido

Temperatura média 25,5º C no verão e 18,4º no inverno

IDHM:Índice de Desenvolvimento Humano Municipal - 0,795

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Guarujá

Bertioga

São Sebastião

BR 101 Trecho Rod. Rio SantosBR 116 Trecho Rod. Presidente Dutra

SP 070 Ayrton Senna e Carvalho PintoSP 099 Rodovia dos Tamoios

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Ubatenses

“Obra de Deus”Muitos lugares são lindos e suas paisagens mais ainda, mas Ubatuba tem uma alma diferente que nos faz sentir livres. Aqui podemos abrir os braços sen-tindo a brisa do mar que causa uma sensação de liberdade e comunhão com a divina obra de Deus.Seus recantos são como paraísos com espetacula-res imagens que ficam gravadas em nossas retinas e que aos poucos vão se absorvendo em nossos so-nhos. E como falar de um povo que vive em um lugar

com esses espetáculos diários? É um povo que está além das preocupações cotidianas das grandes cidades. Um povo que mostra sua interação com a natureza e suas forças. Portanto, um povo que nasceu de bravos guerreiros corajosos e de uma sabedoria adquirida com as intempéries do mar e da proteção da mata.

Renata Weber Neiva

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