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Museu de Topografia prof. Laureano Ibrahim Chaffe Departamento de Geodésia - UFRGS ETAPAS DE CONSTRUÇÃO DE UM AQUEDUTO ROMANO Texto original: Nicole Schmoll Setembro/2015 Tradução, ampliação e ilustrações: Iran Carlos Stalliviere Corrêa- IG/UFRGS Aquedutos romanos Os aquedutos romanos estavam muito bem construídos, estruturas arquitetônicas duráveis e altamente avançadas, criadas pelo Império Romano. Os aquedutos eram sistemas antigos destinados ao transporte de água fresca aos centros de cidades ou populações em todo o Império. Alguns aquedutos ainda hoje podem ser vistos na Espanha, Portugal, Itália, Turquia e Israel. As cidades antigas eram geralmente construídas perto de locais que havia muita água, como foi o caso de Roma. No início, o rio Tibre fornecia toda água de que a cidade precisava. Mas, a partir do século

Transcript of TRATADO DE TORDESILHAS - rl.art.br · que havia muita água, como foi o caso de Roma. No início, o...

Museu de Topografia prof. Laureano Ibrahim Chaffe Departamento de Geodésia - UFRGS

ETAPAS DE CONSTRUÇÃO DE UM

AQUEDUTO ROMANO

Texto original: Nicole Schmoll

Setembro/2015

Tradução, ampliação e ilustrações: Iran Carlos Stalliviere Corrêa-

IG/UFRGS

Aquedutos romanos

Os aquedutos romanos estavam muito bem construídos,

estruturas arquitetônicas duráveis e altamente avançadas, criadas pelo

Império Romano. Os aquedutos eram sistemas antigos destinados ao

transporte de água fresca aos centros de cidades ou populações em

todo o Império. Alguns aquedutos ainda hoje podem ser vistos na

Espanha, Portugal, Itália, Turquia e Israel.

As cidades antigas eram geralmente construídas perto de locais

que havia muita água, como foi o caso de Roma. No início, o rio Tibre

fornecia toda água de que a cidade precisava. Mas, a partir do século

IV a.C. em diante, Roma cresceu rapidamente, assim como a

necessidade por água

Visto que poucas pessoas tinham água encanada em casa, os

romanos construíram centenas de banhos, ou termas, privados e

públicos. O primeiro banho público de Roma recebia água do Aqua

Virgo, aqueduto inaugurado no ano 19 a.C. Seu construtor foi Marco

Agripa, amigo de César Augusto, o qual investiu muito de sua vasta

fortuna na modernização e expansão do sistema de abastecimento de

água romano

Os banhos se tornaram lugares onde as pessoas se encontravam

socialmente. Os maiores deles tinham até mesmo jardins e bibliotecas.

Os aquedutos forneciam um constante suprimento de água corrente.

Essa água, depois de utilizada, fluía para o esgoto, levando embora

toda a sujeira, inclusive os dejetos das latrinas instaladas nos banhos.

Vista superior dos canais do aqueduto

Localização do sitio

O primeiro passo na construção de um aqueduto no antigo

Império romano era localizar uma fonte de água adequada. As fontes

de água incluíam mananciais perenes ou rios que constantemente

apresentavam um grande volume de água durante o ano todo.

Estas fontes de água eram avaliadas quanto à qualidade da água

para consumo, sua limpidez, seu sabor e sua vazão. Também era

levando em conta a saúde dos moradores da região que bebiam dessa

água. Se o local fosse aprovado, calculava-se o percurso, o declive, a

largura e o comprimento dos condutores de água

Os topógrafos com antecedentes militares buscavam zonas com

pendentes naturais de pelo menos 1% e que possibilitasse o

escoamento da água enquanto fosse necessária a construção de pontes

e túneis com a menor frequência possível. A terra era comprada do

proprietário, quando era necessário, e as ferramentas como as gromas,

usadas para medir ângulos retos, os chorobates, utilizados para o

nivelamento de superfícies e as dioptrias, que serviam para medir

ângulos verticais, eram empregadas para tomar medidas topográficas

do terreno.

Quando se ouve a palavra “aqueduto romano”, pensa-se em

arcos imponentes enfileirados até onde a vista alcança. Na verdade, os

arcos constituíam menos de 20% desse antigo sistema de transporte de

água. O aqueduto Aqua Marcia, que ficou pronto em 140 a.C., tinha

92 km de extensão, e apenas 11 km de arcos. A maior parte dos

aquedutos era subterrânea, o que os tornava mais econômicos. Isso

também os protegia contra danos provocados por fatores climáticos e

causava menos transtornos a quem vivia no campo e nas áreas

urbanas.

Estas construções eram realizadas com a utilização de mão de

obra escrava.

Construção de canal

Levando-se em consideração que a gravidade era a força que

movia a água através da maioria dos aquedutos romanos ao longo de

uma inclinação contínua para baixo, canais e tubulações, às vezes,

eram os elementos principais na construção dos aquedutos. Os canais

eram escavados seguindo o declive natural do terreno, para assegurar

uma pendente continua para baixo. Os túneis eram escavados quando

era necessário ultrapassar uma elevação ou montanha, já que tentar

circundar o obstáculo não manteria a pendente do terreno. Um buraco

era escavado, era construído um canal e finalmente este era coberto.

Quando era necessário construía-se uma ponte com arcos para mover

a água através dos vales.

Esquema de um aqueduto e seus componentes

Canais cobertos

Os canais podiam ser cobertos com três tipos de materiais:

alvenaria, tubulação de chumbo ou tubulação de terracota. O material

mais comum utilizado era a alvenaria. Os telhados pontiagudos e os

condutos, destinados a cobrir os canais, eram construídos em pedra e

concreto triturado. Os canais mesmos eram cobertos de gesso

impermeável chamado opus signinum.

Aqueduto coberto

Operação

Uma vez construídos, os aquedutos romanos tinham que ter

manutenção constante e serem defendidos contra inimigos. Quando um

aqueduto era projetado, sua manutenção também era levada em conta

As fugas de água eram reparadas continuamente e os detritos

acumulados dentro dos canais eram removidos. A manutenção dos

caminhos e estradas era efetuada continuamente. Câmaras de

inspeção eram construídas ao lado dos aquedutos e em túneis

subterrâneos depois de terem sido completados. Equipes de

trabalhadores organizadas se ocupavam continuamente de mantê-los

em bom estado de funcionamento.

Aquedutos da cidade de Roma

No início do século III da era cristã, havia 11 aquedutos principais

que atendiam Roma. O mais antigo deles, o Aqua Appia, construído no

ano 312, tinha apenas 16 km de extensão e era quase totalmente

subterrâneo. Parte de outro aqueduto, o Aqua Claudia, ainda existe,

apresentava 69 km de extensão e uns 10 km de arcos, alguns deles

com 27 m de altura.

Quanta água os aquedutos de Roma transportavam? Muita! O

Aqua Marcia levava diariamente cerca de 190 milhões de litros de

água para Roma. Com a ajuda da força da gravidade, a água chegava

às áreas urbanas. Essa água fluía para tanques de distribuição e daí

para tubulações, que a canalizavam para outros tanques de distribuição

ou para fontes, banhos públicos e assim por diante. Alguns calculam

que esse sistema de distribuição tenha crescido tanto que, diariamente,

conseguia fornecer mais de mil litros de água a cada habitante de

Roma.

À medida que o Império Romano se expandia, “os aquedutos

iam para onde Roma fosse”, disse o livro Roman Aqueducts and Water

Supply (Os Aquedutos Romanos e o Abastecimento de Água).

Atualmente, quem viajar pela Ásia Menor, França, Espanha e

Norte da África ainda poderá apreciar essas maravilhas da engenharia

antiga.

Principais vias romanas

Aqua Ápia

Aqueduto Aqua Ápia

Aqueduto construído pelos censores Ápio Cláudio Cego e Caio

Pláucio Venox no ano 312 a.C., captava água das nascentes ao longo

da via Prenestina. Praticamente subterrâneo na totalidade, com entrada

em Roma perto da Porta Maior (Porta Maggiore), na localidade

designada como ad spem veterem (Velha Esperança), dirigia-se ao

Célio e Aventino e terminava perto da Porta Trigemina, no Fórum

Boário. Foi restaurado em paralelo com a construção de outros

aquedutos nos anos de 144, 33 e entre 11 e 4 a.C.

Ânio Velho

Aqueduto Ânio Velho

Aqueduto construído entre 272-270 a.C. pelo censor Mânio Cúrio

Dentato e Flávio Flaco, com o botim da vitória contra Pirro. Recolhia as

águas do Aniene sobre oTívoli. O encanamento era em sua maior parte

subterrâneo, exceto em alguns pontos. Terminava perto da Porta

Esquilina.

Aqua Márcia

Fonte Aqua Marcia na via Nomentana Ruínas da Água Márcia, em Tívoli

Este aqueduto foi construído em 144 a.C. pelo pretor Quinto

Marcio Re. Captava as águas do alto da bacia do rio Aniene. Além de

numerosos restauros menores, foi em grande parte reconstruído na

sequência de um incremento da portada entre 11 e 4 a.C., sob o

reinado de Augusto. O percurso era ora subterrâneo ora sobre arcadas

(em torno de 9 km flanqueava a via Latina). Chegava a Roma na

localidade ad spem veterem, como outros aquedutos, e cruzava a via

Tiburtina sobre um arco, que mais tarde fora transformado na Porta

Tiburtina da Muralha Aureliana, terminando próximo da Porta

Viminal. A distribuição de suas águas atingia o Capitólio, enquanto um

ramo secundário (rivus Herculaneus) se dirigia para os montes Célio e

Aventino. Sob o reinado de Caracala (213) foi realizada uma

ramificação da Água Antoniniana para as novas Termas, que

atravessava a Via Ápia sobre um arco (Arco de Druso). Um outro ramo

secundário foi utilizado para alimentar as Termas de Diocleciano.

Aqua Tépula

Aqueduto construído pelos cônsules Caio Servílio Cepião e Lúcio

Cássio Longino em 125 a.C.. Recolhia água das nascentes na décima

milha da via Latina. Em 33 a.C., foi transformado para confluir no novo

canal de Água Júlia, do qual se separava novamente próximo de Roma.

Corria, portanto, num canal distinto sobre os arcos de Água Márcia,

juntamente com Água Júlia. Entrava na cidade ad spem veterem,

seguindo mais adiante o mesmo percurso de Água Márcia em direção à

Porta Viminal.

Aqua Júlia

Aqueduto Aqua Júlia

Aqueduto construído por Agripa em 33 a.C., unindo-se num único

canal com Água Tépula; foi restaurado por Augusto entre 11 e 4 a.C..

Recolhia água das nascentes na décima segunda milha da Via Latina,

perto de Grottaferrata. Chegava a Roma como os aquedutos

precedentes na localidade ad spem veterem, perto da Porta Maior,

prosseguindo pelo mesmo percurso do Água Márcia em direção à Porta

Viminal. Provavelmente uma ramificação deste aqueduto, do qual são

ainda visíveis algumas arcadas, alimentava a fonte monumental da

Praça Vitor Emanuel (Piazza Vittorio Emanuele) construída por

Alexandre Severo.

Aqua Virgem

Entrada do canal de inspeção ao aqueduto Aqua Virgem (Acqua Vergine)

na Via do Nazareno (via del Nazzareno).

Aqueduto construído por Agripa e inaugurado em 19 a.C., para

servir as instalações termais do Campo de Marte. As nascentes

situavam-se no oitavo miliário da via Colatina. O nome (Acqua

Vergine) deriva, segundo uma lenda, de uma moça que haveria

indicado aos soldados o local da nascente (embora provavelmente se

referisse à pureza da água). O percurso prosseguia pela via Colatina,

em parte sobre arcadas e culminava nas habitações do Pincio. A partir

daí, as arcadas da época Claudiana, parcialmente conservadas na Via

do Nazareno, atravessava o Campo de Marte, cruzando a atual via del

Corso (via Lata) pelo Arco de Cláudio, uma arcada do aqueduto

monumentalizada para celebrar a Conquista romana da Britânia. O

aqueduto fora constantemente restaurado e ainda alimenta a Fontana

di Trevi, a Fontana della Barcaccia, na Praça de Espanha (dando o

nome à Via dei Condotti) e a Fontana dei Quattro Fiumi, na Piazza

Navona.

Aqua Alsietina

Sucessor do fracassado aqueduto Água Augusta, foi um aqueduto

construído sob o reinado de Augusto em 2 a.C., para servir os

quarteirões além do rio Tibre (Trastevere e do local para os espetáculos

de combates navais). Um novo canal seria realizado por Trajano em

109 d.C..Este recebia as águas do lago de Martignano

Ânio Novo e Água Cláudia

Arcos de Nero, o ramo secundário da Água Cláudia

entre os montes Célio e Palatino

Aqueduto iniciado por Calígula em 38 d.C. e terminado por

Cláudio em 52. O primeiro recolhia as águas do Aniene perto dos

montes Simbruínos, enquanto o segundo captava águas do cimo do

vale do Aniene. Terminavam ad spem veterem, perto da Porta Maior:

esta última era a monumentalização dos arcos das ruas Prenestina e

Labicana, mais tarde inseridas na Muralha Aureliana. Na sétima milha

da via Latina a água era transportada por arcadas, algumas das quais

subsistiram ao tempo e encontram-se no "Parque dos Aquedutos". Na

localidade de Tor Fiscale interceptava duas vezes o Água Márcia,

formando um recinto trapezoidal (Campo Barbarico) que seria utilizado

como fortificação pelos Godos de Vitige em luta com Belisário, no ano

de 539.

Um ramo secundário, construído por ordem de Nero, (Arcus

Neroniani) destacava-se por dirigir-se para o Célio, na parte ocupada

pela Casa Dourada; este ramo foi sucessivamente prolongado por

Domiciano a serviço dos palácios imperiais no Palatino, cruzando os

vales entre este e o Célio por altíssimas arcadas.

Aqua Trajana

Aquaduto Aqua Trajano, parte subterrânea

Aqueduto construído sob o reinado de Trajano no ano 109,

recolhia águas de nascentes nos montes Sabatinos, perto do lago

Bracciano. Chegava a Roma pela colina Janículo, ao longo da margem

esquerda do rio Tibre. Destruído durante o assédio de Roma pelos

Ostrogodos de Vitige no ano 537, foi restaurado por Belisário e teve

intervenções durante o papado de Honório I durante o século VII. Pelos

danos sofridos pelos Lombardos e pelos Sarracenos, sofreu novos

restauros entre os séculos VIII e IX e foi finalmente reconstruído como

Água Paula no século XVII. Chegava à cidade por um percurso quase

totalmente subterrâneo ao longo da via Clódia e da via Triunfal e,

mais adiante, por arcadas ao longo da via Aurélia.

Aqua Alexandrina

Aqueduto Aqua Alexandrina

Aqueduto construído sob o reinado de Alexandre Severo, no

século III, recolhia água do Pântano Borghese na via Prenestina e com

um percurso quase em sua totalidade subterrâneo, com viadutos para

atravessar vales, entrava na cidade pela Porta Maior dirigindo-se ao

Campo de Marte, onde estariam as "Termas de Nero", restauradas

por Alexandre Severo no ano 226 e rebatizadas como Termas

Alexandrinas.

Aquedutos da Roma papal e moderna

Fonte da Água Feliz na Praça de São Bernardo

Sob o papado de Nicolau V, em 1453, Leon Battista Alberti foi

encarregado de restaurar o aqueduto Água Virgem, altura em que é

incrementada a portada com nove nascentes. Este terminava na

Fontana di Trevi. Uma ampliação que teve lugar em 1840 e, em

1936, criou um novo aqueduto, cuja mostra se materializou na

Fontana del Nicchione, no Píncio.

Água Feliz: um novo aqueduto seria construído a pedido do papa

Sisto V em 1586, por Domenico Fontana, reutilizando as nascentes da

Água Alexandrina. Chegava a Roma pela Porta Tiburtina (atual

"porta San Lorenzo") e terminava com a Fonte de Moisés, hoje visível

na Praça de São Bernardo.

Água Paula: reconstrução da Água Trajana, em 1605, por

ordem do papa Paulo V e obra de Giovanni Fontana e Carlo Maderno;

termina com a Fonte da Água Feliz no Janículo (1611). Foi

alimentada por este aqueduto também a Fontanone di Ponte Sisto,

também referida como Fontanone dei centro preti.

Aqueduto Pio: corresponde ao restauro da antiga Água Márcia,

cuja reconstrução foi encomendada pelo papa Pio IX a Luigi Canina. A

mostra terminal apresenta-se na Fontana delle Naiadi, na Piazza

Esedra.

Aqueduto de Peschiera: iniciado em 1937 e completado apenas

em 1949, recolhe água das nascentes de Cittaducale (Província de

Rieti). A sua mostral terminal apresenta-se na fonte da Praceta dos

Heróis (Piazzale degli Eroi).

Aqueduto Ápio-Alexandrino: potenciamento do Aqueduto Feliz,

realizado entre 1963 e 1968, capta água de outras antigas captações,

propositadamente ampliadas, como Água Ápia e Água Alexandrina e

novas reservas, perto da Borgata Finocchio e de Torre Angela. Assegura

também o fornecimento hídrico dos quarteirões a sudeste de Roma

(Borghesiana, Torre Gaia, Tuscolano,Prenestino, E.U.R-Laurentino,

Acilia e Ostia Lido).

Declínio dos Aquedutos

Com a queda do Império Romano, alguns aqueodutos foram

deliberadamente interrompidos pelos inimigos, mas a maioria caíu em

desuso devido a falta de uma manutenção organizada.

A falta de manutenção dos aquedutos teve como principal impacto

a redução da população de Roma de mais de 1 milhão nos tempos do

impérios para menos da metade na era medieval.

Nome Ano da

construção

Comprimento

(km)

Altura

fonte (m)

Altura

Roma (m)

Vazão

m3/dia

Aqua Appia 312 aC 16,561 30 20 73.000

Anio Vetus 262-269 aC 63,64 280 48 175.920

Aqua Marcia 144-140 aC 91,424 318 59 187.600

Aqua Tepula 125 aC 17.745 151 61 17.800

Aqua Julia 33 aC 21,677 350 64 48.240

Aqua Virgo 19 aC 20,697 24 20 100.160

Aqua Alsietina 2 aC 32,815 209 17 15.680

Aqua Claudia 38-52 68,681 320 67 184.280

Anio Novus 38-52 86,876 400 70 189.520

Aqua Trajana 109 32,500 - - -

Arcus

Alexandriana

226 22 - - -

Aquedutos em Roma