Trajetória Da Literatura Infantil_Ana Luiza

download Trajetória Da Literatura Infantil_Ana Luiza

of 15

Transcript of Trajetória Da Literatura Infantil_Ana Luiza

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    1/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    135

    UNIVEM Centro Universitrio Eurpides de Marlia

    TRAJETRIA DA LITERATURA INFANTIL: DA ORIGEMHISTRICA E DO CONCEITO MERCADOLGICO AO

    CARTER PEDAGGICO NA ATUALIDADE1

    Aline Luiza da Silva2(Licenciatura em Letras/UNIVEM)

    Resumo

    O presente trabalho procurou percorrer a trajetria da literatura infantil desde suaorigem histrica, observando o conceito mercadolgico, sob o qual esta literatura foi ob-servada e rotulada, chegando ao carter pedaggico na atualidade, verificando, assim, asquestes que implicam a crise presente neste campo literrio.

    Palavras-chave:1. literatura infantil 2. Conceito mercadolgico 3. Carter pedag-gico.

    AbstractTHE TRAJECTORY OF CHILDRENS LITERATURE: FROM HISTORICAL ORIGN AND

    THE MARKETING CONCEPTS TO ITS PEDAGOGICAL ASPECT IN THE PRESENT

    The present work searched through the trajectory of childrens literature from itshistorical origin, looking at the merchandising concept, under which this literature waswatched and labeled, arriving to pedagogic nature in the actuality, verifying, that way, thequestions involving the present crisis in this literary field.

    Key-words: 1. Childrens literature 2. Merchandising concept 3. Pedagogic nature.

    1 Artigo resultado de Iniciao Cientfica realizada em 2008 (UNIVEM - Marlia/SP).2 Licenciada em Letras (UNIVEM - Marlia/SP). E-mail: [email protected]

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    2/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    36

    Centro Universitrio Eurpides de Marlia UNIVEM

    INTRODUO

    A literatura infantil, apesar de seruma vertente da literatura geral que prima,

    na maioria das vezes, pela escrita direcio-nada determinada faixa etria, possuiobras com contedos capazes de lapidar oimaginrio humano e auxiliar a compreen-so e a resoluo de conflitos internos decada indivduo em particular.

    Partindo do pressuposto de que a li-teratura infantil est em crise de valores,conceitos e funes, observou-se a im-portncia de pesquisar acerca do referidotema almejando percorrendo a trajetria daliteratura infantil desde sua origem histri-

    ca, observando o conceito mercadolgico,sob o qual esta literatura foi observada erotulada, chegando ao carter pedaggicona atualidade, verificando, assim, as ques-tes que implicam a crise presente nestecampo literrio.

    Organizado em trs captulos, o tra-balho apresenta suas subdivises com osttulos Concepo de criana e a origemda literatura infantil, que trata dos pri-mrdios da literatura infantil e de conside-raes em relao questo da concepo

    de criana ao longo dos sculos; Crise naliteratura infantil, que discorre acerca doconceito mercadolgico da literatura emquesto e seu carter pedaggico atual;e Algumas consideraes sobre a leituracomo ferramenta em prol da familiariza-o com a literatura infantil, no qual seobserva as diversas concepes de leiturae discuti-se a importncia desta na escolae na sociedade, como tambm o papel doprofessor no desenvolvimento do hbito daleitura.

    O presente trabalho apresenta con-tribuies para os estudos acerca dessecampo literrio, como a compreenso e oesclarecimento de que, enquanto produ-o esttica-literria, que mobiliza o pen-sar criativo, a literatura infantil no deveser rotulada e mal interpretada, mas simconsiderada mais uma das instncias cria-tivas do ser.

    1 CONCEPO DE CRIANA

    E A ORIGEM DA LITERATURAINFANTIL

    A histria da literatura infantil inicia-se em meados do sculo XVIII, de acordocom o desenrolar da concepo de crianaque se tinha na poca, sendo que a origem

    dessa literatura tem uma ligao estreitacom a Pedagogia; dessa forma, confunde-se muito seu carter artstico com sua fun-o didtico-pedaggica.

    Observa-se, ento, mais profunda-mente a concepo de criana e a origemdessa literatura to desvalorizada artisti-camente desde seu nascimento at os diasatuais.

    1.1 Concepo da criana

    Para pensar a literatura infantil, necessrio pensar no seu leitor: a criana.At o sculo XVII, as crianas conviviamigualmente com os adultos, no havia ummundo infantil, diferente e separado, ouuma viso especial da infncia. No se es-crevia, portanto, para as crianas.

    Segundo Regina Zilberman,

    [...] a concepo de umafaixa etria diferenciada, cominteresses prprios e necessi-

    tando de uma formao espe-cfica, s acontece em meio Idade Moderna. Esta mudanase deveu a outro acontecimen-to da poca: a emergncia deuma nova noo de famlia,centrada no mais em amplasrelaes de parentesco, masnum ncleo unicelular, preo-cupado em manter sua pri-vacidade (impedindo a inter-veno dos parentes em seusnegcios internos) e estimular

    o afeto entre seus membros.(1985, p.13)

    Sabe-se que, at este sculo, ascrianas no eram percebidas socialmentecomo seres diferentes dos adultos, com-partilhavam o mesmo tipo de roupa, am-bientes caseiros e sociais como tambmo trabalho.

    A partir do sculo XVIII, a crianapassa a ser considerada um ser diferentedo adulto, com necessidades e caracters-

    ticas prprias, havendo ento o distancia-mento da vida adulta e recebendo umaeducao diferenciada, que a preparasse

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    3/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    137

    UNIVEM Centro Universitrio Eurpides de Marlia

    para essa vida.Nesse momento, a criana vista

    como um indivduo que precisa de atenoespecial que demarcada pela idade. O

    adulto passa a idealizar a infncia. A crian-a o indivduo inocente e dependente doadulto devido sua falta de experinciacom o mundo real. At hoje, muitos aindatm essa concepo da infncia como o es-pao da alegria, da inocncia e da falta dedomnio da realidade. Os livros que trazemessa concepo so escritos, ento, com oobjetivo de educar e ajudar as crianas noenfrentamento da realidade.

    J com a Psicologia da Aprendiza-gem, a infncia tratada como uma etapa

    de preparao do pensamento para a vidaadulta. O pensamento infantil no tem ain-da uma lgica racional. A literatura infantil, nesta concepo, adequada s fases doraciocnio infantil, entendido como idadecronolgica. Essas concepes convivem,at a nossa atualidade, possveis de serempercebidas at no modo como os livros soselecionados e catalogados pelas editoras.

    No entanto, outra concepo de in-fncia tem sido defendida e, com ela, umanova postura da literatura infantil. preci-

    so entender que a criana tambm cheiade conflitos, medos, dvidas e contradi-es, no por desconhecer a realidade,mas por trazer em si a imagem projetadado adulto:

    Se a imagem da criana contraditria, precisamen-te porque o adulto e a socie-dade nela projetam, ao mes-mo tempo, suas aspiraes erepulsas. A imagem da criana

    , assim, o reflexo do que oadulto e a sociedade pensamde si mesmos. Mas este refle-xo no iluso; tende, ao con-trrio, a tornar-se realidade.Com efeito, a representao dacriana assim elaborada trans-forma-se, pouco a pouco, emrealidade da criana. Esta diri-ge certas exigncias ao adultoe sociedade, em funo desuas necessidades essenciais.(ZILBERMAN, 1985, p. 18)

    1.2 Origem histrica da literaturainfantil

    A literatura infantil surgiu no sculo

    XVII com Fenlon (1651-1715), justamen-te com a funo de educar moralmente ascrianas. As histrias tinham uma estrutu-ra maniquesta, a fim de demarcar clara-mente o bem a ser aprendido e o mal aser desprezado. A maioria dos contos defadas, fbulas e mesmo muitos textos con-temporneos incluem-se nessa tradio.

    Naquele momento, a literatura in-fantil constitui-se como gnero em meio atransformaes sociais e repercusses nomeio artstico. Em 1697, Charles (1628-

    1703) Perrault traz a pblico Histrias oucontos do tempo passado, com suas morali-dades: Contos de Mo Gansa. Ganham, en-to, forma editorial as seguintes histrias:A Bela Adormecida no bosque, ChapeuzinhoVermelho, O Gato de Botas, As Fadas, A GataBorralheira, Henrique do Topetee O PequenoPolegar.

    Os contos de fada conhecidos atu-almente surgiram na Frana, ao final dosculo XVII, com Perrault, que editou asnarrativas folclricas contadas pelos cam-

    poneses, retirando passagens obscenas decontedo incestuoso e canibalismo. Assim,acredita-se que, antes do cunho pedaggi-co, houve o objetivo de leitura e contem-plao pela mente adulta. Acredita-se tam-bm que a mitologia grega j possua ummodo particular de transmitir o contextoda histria de Chapeuzinho Vermelho.Posteriormente, Charles Perrault trouxea histria moralizadora e mais adequadaaos ambientes sociais que conviviam napoca. A histria da menina e do lobo so-freu ainda alteraes por Hans ChristianAndersen e pelos Irmos Grimm.

    Segundo Cunha (1987), no Brasil,como no poderia deixar de ser, a literatu-ra infantil tem incio com obras pedaggi-cas e, sobretudo, adaptadas de produesportuguesas, demonstrando a dependn-cia tpica das colnias (p. 20). Pode-se di-zer que a literatura infantil brasileira teveincio com Monteiro Lobato, com uma lite-ratura centralizada em algumas persona-

    gens em especial.

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    4/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    38

    Centro Universitrio Eurpides de Marlia UNIVEM

    2 CRISE NA LITERATURAINFANTIL

    Desde o seu surgimento, em meados

    do sculo XVIII, a literatura infantil vemsendo permeada de preconceitos, rtulose banalizaes acerca de sua importncia,funo pedaggica e/ou artstica, entreoutras eventuais questes.

    Por seu carter singular, nasce umacomparao hierarquizada com a literatu-ra no infantil, a canonizada, a aceita pelaacademia, a lida e praticada pelo pbli-co adulto. Devido a essa classificao, aliteratura infantil j nasce com o peso damenoridade, pois atrelada a um projeto

    educacional (poltico-pedaggico) e a seupblico, que a criana, sem mencionara predestinao mercadolgica que em siest embutida.

    Candido (1995) traduz em poucaspalavras o que h de se compreenderquanto literatura infantil, bem como aliteratura como um todo: toda obra liter-ria antes de mais nada uma espcie deobjeto, de objeto construdo; e grande opoder humanizador desta construo (p.245).

    Acerca da crise na literatura comoum todo e tambm em seu ensino, Perro-ne-Moiss (2000) afirma que:

    Os problemas atuais[...] da literatura decorrem dasituao incerta em que se en-contra a prpria literatura nes-te fim de sculo, poca que seconvencionou chamar de ps-moderna. No momento atual,a literatura est sendo ques-

    tionada em sua produo e emsua recepo, encontrando-seameaada em seus prpriosfundamentos. (p. 345)

    A literatura infantil est em crise,principalmente pela dvida que paira emrelao prpria literatura em questo.Surgem, ento, duas hipteses claras parao crescimento desse problema: o conceitomercadolgico e o carter pedaggico naatualidade.

    2.1 Conceito mercadolgico

    Por meio das leituras realizadasacerca das questes que envolvem a lite-ratura infantil e a crise que permeia essecampo literrio, percebe-se que o ensino,

    bem como a produo da literatura infan-til, so observados como parte da sistem-tica mercadolgica venda e consumo, pois produzida para ser veiculada a um pro-jeto poltico ligado educao e, conse-qentemente, escola. Com isso, as obrasproduzidas perdem o seu valor estticode observao do mundo, de plasmar asidias do cotidiano e de transformar o serno seu ntimo, e nascem marcadas porum destino outro que no o gosto e a arte.

    De acordo com Sodr (1985), o

    preconceito que envolve a literatura estpresente e pode ser observado em umasimples visita a alguma livraria, local ondepode ser notada certa organizao precon-ceituosa:

    Quem visita uma livrariaorganizada maneira norte-americana no pode deixar deperceber que a arrumao dasprateleiras atende a uma certadiscriminao literria. De umlado, esto romances de auto-res como Thomas Mann, Mal-colm Lowry, Jorge Luis Borges,Guimares Rosa, Machado deAssis e outros, reconhecidoscomo clssicos ou grandesescritores, produtores de Li-teratura (com maiscula). Nooutro, misturam-se figurascomo Dashiell Hammett, IssacAsimov, Agatha Christie, RayBradbury, Michael Moorcock,Karl May, em meio a manuais

    de emagrecimento, de comofazer sucesso ou subir na vida,etc. Neste caso, lida-se comprodutores de best-seller ou,mais especificamente, quandose trata do gnero narrativo,com autores de literatura demassa (desta vez, com mins-cula). (p. 5)

    A literatura infantil , muitas vezes,considerada uma literatura de massa, demenor qualidade, produzida em grande es-

    cala e pouco elaborada, pois o que o mer-cado deseja, nesse mbito, a venda e oconsumo, a quantidade, no a qualidade.

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    5/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    139

    UNIVEM Centro Universitrio Eurpides de Marlia

    Dessa forma, pode-se compreendera colocao de Sodr (1985) em relao sregras de produo e de consumo no meioliterrio de massa:

    importante ter emmente o seguinte: o circuitoideolgico de uma obra nose perfaz apenas em sua pro-duo, mas inclui necessaria-mente o consumo. Em outraspalavras, para ser artstica,ou culta, ou elevada, umaobra deve tambm ser reco-nhecida como tal. Os textosque estamos habituados aconsiderar como cultos ou

    de grande alcance simblicoassim so institucionalmentereconhecidos (por escolas ouquaisquer outros mecanismosinstitucionais), e os efeitosdesse reconhecimento reali-mentam a produo. A litera-tura de massa, ao contrrio,no tem nenhum suporte es-colar ou acadmico: seus est-mulos de produo e consumopartem do jogo econmico daoferta e procura, isto , do pr-

    prio mercado. A diferena dasregras de produo e consumofaz com que cada uma dessasliteraturas gere efeitos ideol-gicos diferentes. (p. 6)

    O que pode ser observado atual-mente que as obras e os livros infanto-juvenis so feitos a partir das medidas domercado, produzidos para um consumidormdio. So utilizados moldes e frmulasprontas, sem diferenciaes.

    No mercado atual, encontram-se li-vros de pssima qualidade em impresso,ilustraes fora de contexto e tambm semqualidade vivel ao leitor e, principalmen-te, falhas no diz respeito ao contedo. Amaior parte dos livros destinados ao pbli-co infantil possuem temas piegase apre-sentam textos empobrecidos em busca doconsumo desenfreado do mercado atual,que muitas vezes no procura a qualidade,mas sim um produto qualquer.

    Geralmente h indicaes de faixas

    etrias que comprometem a literatura,reduzindo-se a determinado grupo de lei-tores, ignorando a capacidade intelectual

    e o desejo dos consumidores dessa litera-tura to vitimada pela relao de venda econsumo.

    Em relao literatura infantil, sen-

    do esta considerada como de menor qua-lidade e como cultura de massa, e ao con-ceito mercadolgico, Zilberman e Lajolo(1986) consideram a seguinte questo:

    Da mesma forma queno mundo moderno a cidade ,por excelncia, o espao ondeeclodem conflitos sociais e in-dividuais, crises e desajustes, l tambm o espao privile-giado da produo e consumoda cultura de massa, com a

    qual a literatura mais contem-pornea guarda no poucospontos de contato. A simbio-se entre a literatura e a cul-tura de massa no afeta ape-nas suas formas de produoe circulao, como, no casoda literatura infantil, sugerea regularidade de lanamen-tos, a redundncia de temas,a proliferao de sries quetrabalham sempre no mesmohorizonte de expectativa dos

    leitores, a destinao prvia decada texto a esta ou quela fai-xa-etria ou discusso desteou daquele tema. Alm disso,a literatura infantil manifestaalguns procedimentos de com-posio que, diluindo e rebai-xando o padro culto no qualeventualmente se espelham,acabam por configurar os ris-cos de massificao dos livrospara crianas: os ganchos nar-rativos ingnuos, a meno apersonagens divulgadas porbest-sellers e revistas, a alusoa fatos verdicos e contempo-rneos veiculados pelo notici-rio de jornal. (p. 84)

    Assim, o conceito mercadolgicose apresenta como um grande vilo paraa literatura infantil, que luta pelo reconhe-cimento como produo esttico-literria,como arte, como literatura de igual valordentro do mbito cultural.

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    6/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    40

    Centro Universitrio Eurpides de Marlia UNIVEM

    2.2 Carter pedaggico naatualidade

    Partindo do pressuposto de que a

    literatura infantil est sempre em desvan-tagem em relao questo literria comoum todo, observa-se o adjunto infantilcomo articulador de certa carga preconcei-tuosa ao se olhar essa literatura, quandoa mesma deveria ser observada enquantomais uma das diversas manifestaes dofazer esttico arte do ser humano.

    Atualmente a literatura infantil per-meada, alm do conceito mercadolgico,tambm pelo carter pedaggico. ReginaZilberman aponta as relaes histricas

    que devem ser consideradas acerca destaquesto:

    Os primeiros textospara crianas so escritos porpedagogos e professores, commarcante intuito educativo. E,at hoje, a literatura infantilpermanece como uma colniada pedagogia, o que lhe causagrandes prejuzos: no aceitacomo arte, por ter uma finali-dade pragmtica; e a presenadeste objetivo didtico faz comque ela participe de uma ati-vidade comprometida com adominao da criana. (1985,p. 13-14)

    Talvez pela histria e pela trajetriada literatura infantil ter sido to conturba-da, e inicialmente apresentando claros finspedaggicos, sua conceituao ainda hojeno seja to respeitada como deveria serno meio literrio. O intuito educativo que

    marca o surgimento desta literatura prova-velmente sugeriu e inculcou no meio aca-dmico a viso da literatura infantil comoa no representao da arte, a funo di-dtico-pedaggica e a produo de menorqualidade.

    Segundo Afrnio Coutinho (1978),

    A Literatura um fe-nmeno esttico. uma arte,a arte da palavra. No visa ainformar, ensinar, doutrinar,

    pregar, documentar. Acidental-mente, secundariamente, elapode fazer isso, pode conter

    histria, filosofia, cincia, reli-gio. O literrio ou o estticoinclui precisamente o social, ohistrico, o religioso, etc., po-rm transformando esse mate-

    rial em esttico. (p. 8)

    Pensando dessa forma, a utilizaoda literatura infantil nos meios escolarestem sido amplamente errnea, pois estaliteratura no procura ser pretexto paraensinar contedos didticos, o que temocorrido com freqncia no mbito educa-cional, mas sim representar a Arte, a est-tica literria.

    Com referncia a esta questo, concepo de literatura e sua criao, Cou-tinho (1978) esclarece que:

    A Literatura, como todaarte, uma transfigurao doreal, a realidade recriadaatravs do esprito do artistae retransmitida atravs da ln-gua para as frmas que soos gneros e com os quais elatoma corpo e nova realidade.Passa, ento, a viver outravida, autnoma, independente

    do autor e da experincia derealidade de onde proveio. Osfatos que lhe deram s vezesorigem perderam a realidadeprimitiva e adquiriram outra,graas imaginao do artis-ta. So agora fatos de outranatureza, diferentes dos fatosnaturais objetivados pela ci-ncia ou pela histria ou pelosocial. (p. 9)

    Complementando a citao anterior,

    sobre a literatura como manifestao ar-tstica, Afrnio Coutinho (1978) coloca queela tem existncia prpria, ela e nadamais, e seu campo de ao e seus meiosso as palavras e os ritmos usados por simesmos e no como veculos de valoresextra-literrios (p.10).

    No h como desvincular a literaturainfantil do mbito educacional, nem esseo objetivo pretendido pelo presente traba-lho. Desse modo, h que se encontrar ummeio para trabalhar esta literatura sem

    que seja como pretexto para ensinar oscontedos previstos didaticamente, mas

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    7/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    141

    UNIVEM Centro Universitrio Eurpides de Marlia

    sim como leitura literria, em busca dafamiliarizao entre leitor e produo ar-tstica, da compreenso dessa expressoliterria como arte e, conseqentemente,

    do seu reconhecimento como mais umadas instncias criativas do ser.Sintetizando a essencialidade que

    h no ato pedaggico de se ensinar a leitu-ra literria, Perrone-Moiss (2000) colocaque:

    A literatura, tal comoa entendemos desde o incioda modernidade, no ensi-nvel. Mas a leitura literriano apenas pode ser ensinadacomo necessita de uma apren-

    dizagem, e por isso que osprofessores de literatura aindaexistem. [...] Se os professo-res negligenciarem a tarefa demostrar aos alunos os cami-nhos da literatura, estes serodesertados, e a cultura comoum todo ficar ainda mais em-pobrecida. (p. 351)

    J Zilberman (1985), contundentequando trata da funo pedaggica que a

    literatura infantil tem assumido atualmen-te no mbito escolar:

    A literatura infantil, porsua vez, outro dos instru-mentos que tem servido mul-tiplicao da norma em vigor.Transmitindo, via de regra,um ensinamento conforme aviso adulta de mundo, ela secompromete com padres queesto em desacordo com os in-

    teresses do jovem. (p. 20)

    Em sntese, observa-se que a litera-tura infantil continua intimamente ligada questo pedaggica e a escola a trata deforma a banalizar sua funo literria e ar-tstica, o que interfere profundamente namudana de concepes que a sociedadetem desse campo literrio.

    3 ALGUMAS CONSIDERAESSOBRE A LEITURA COMO

    FERRAMENTA EM PROL DA

    FAMILIARIZAO COM ALITERATURA INFANTIL

    De acordo com Abramovich, im-

    portante para a formao de qualquercriana ouvir muitas, muitas histrias...Escut-las o incio da aprendizagem paraser um leitor, e ser leitor ter um caminhoabsolutamente infinito de descoberta e decompreenso do mundo... (1991, p. 16).

    Surge, ento, a importncia do h-bito da leitura para que a literatura infan-til seja apreciada e passe a ser respeitadae considerada como arte, sem pretextospara sua utilizao como mera fonte did-tico-pedaggica. Porm, outro problema

    em relao a esta questo que, em geral,tanto no mbito escolar quanto em outrasesferas da sociedade, considera-se comoleiturao simples ato de decodificar letras epronunci-las em disjuno com a compre-enso do que est sendo lido.

    A leitura, muitas vezes, no con-siderada atividade que abrange o ato dacompreenso e da interpretao de texto,mas sim o mero reconhecimento das letrasque formam palavras, que, por sua vez, po-dem estar em comunho, constituindo fra-

    ses e compondo algum tipo de texto.Faz-se necessrio, assim, um estudo

    acerca dessas consideraes, apontandoalgumas concepes, o papel dessa ha-bilidade no meio escolar e na sociedade,como tambm o papel do professor no de-senvolvimento do hbito de ler.

    3.1 Concepes de leitura

    Quando se pensa em leitura, vem

    mente a capacidade de ou aptidopara decodificar letras, palavras e/oufrases que constituem um texto escritoe, num segundo momento, pronunci-lascorretamente de acordo com a norma pa-dro da Lngua Portuguesa. A partir dessaforma de pensar a leitura, observa-se umsignificado com bases fundamentadas nacapacidade de ser um bom locutor das pa-lavras que so lidas e pronunciadas. Essa a concepo de leitura que pode ser ob-servada dentro da sociedade atual e que

    permeia muitas das atividades escolares.Fruto de uma tradio enraizada nosmtodos e nas teorias educacionais, o en-

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    8/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    42

    Centro Universitrio Eurpides de Marlia UNIVEM

    sino e o aprendizado da leitura, que se es-gota em uma pronncia perfeita, precisamser desmantelados. Avanar rumo s novastendncias e concepes de leitura signifi-

    ca priorizar a interao do sujeito com oobjeto de conhecimento, ou seja, aluno etexto.

    O que ler? O termo leitura apre-sentado com diversos conceitos dicionari-zados muito diferentes das conceituaesque lhe so atribudas socialmente, princi-palmente dentro da escola.

    Segundo definio encontrada noDicionrio Houaiss da Lngua Portuguesa,leitura significa 1. O ato ou o hbito deler; 2. O que se l. 3. Maneira de compre-

    ender um texto, uma mensagem, um fato(2004, p. 451). Tem-se, ento, a questodo simples ato ou ao de ler, algo quepode ser subjetivamente compreendido einterpretado; o hbito que vai alm dessaconcepo apontando a idia de freqn-cia do ato mencionado anteriormente e,por fim, a maneira de compreender o textolido, em que se subentende as diversas for-mas de interpretao.

    Faz-se necessrio, dessa forma, ob-servar a definio do termo ler, que, ain-

    da de acordo com a definio do Dicion-rio Houaiss da Lngua Portuguesa, significa1. Percorrer com a vista (texto, palavra,sintagma), interpretando-o, decifrando-o,falando em voz alta ou no; 2. Examinar,estudar [...]; 3. Interpretar, compreender[...]; 4. Atribuir significado, sentido ou for-ma a; interpretar. 5 perceber a partir deindcios; deduzir [...] (2004, p. 453).

    Nota-se, portanto, o salto entre osingelo significado que resume leituraemmera decodificao e a amplitude de com-

    preend-la, ou compreender o vocbuloler, como conhecer e estudar, aes maisprofundas, e interpretar o sentido, que en-volve e assume toda essncia desse ato,por vezes entendido como arte.

    H algum tempo, tem-se percebidoque a escola trata da leitura como umaatividade estanque, como se esta pudes-se ser separada, engavetada, afastada dacompreenso de mundo, da leitura viva,mas apenas uma decodificao sem atri-buio do verdadeiro sentido e significadodas palavras.

    O processo de leitura tem se tornado

    um ato cansativo e digno de obrigatorieda-de dentro das salas de aula, o desprazerdos alunos, algo enfadonho e sem signifi-cado para a maioria dos estudantes.

    Retomando o sentido ldico e arts-tico atribudo leitura e relacionando-o aorepdio que as crianas muitas vezes sen-tem por essa atividade escolar, observa-sea afirmao de Suzana Vargas em seu li-vro Leitura: uma aprendizagem de prazer(2000), que aponta para a mesma questoem que Tratar a leitura como uma ativi-dade artstica. Talvez esta seja a forma deno vacinar as crianas contra ela (p. 14).

    A afirmao anterior , ainda, me-lhor compreendida quando se percebe que

    leitura tem sido encarada como um exerc-cio mecanizado, muitas vezes sem senti-do real para os alunos de todas as idades.Porm, ler atribuir significado ao que sel, no apenas pronunciar uma palavraou uma frase corretamente; ler envolve acompreenso do que se l.

    No livro Formando crianas leitoras(1994), Josette Jolibert tem uma visoconcisa e de grandiosa significao quan-do se trata da concepo do ato de ler:Ler atribuir diretamente um sentido a

    algo escrito (p. 15).Partindo desse pressuposto, pode-se

    compreender a leitura e tambm a literatu-ra, como a atividade de ligao entre doismundos: o que est no material escrito eque pode ser lido e o mundo em que vive-mos.

    A considerao anterior fundamen-ta-se no conceito de intertextualizaocontemplada por Suzana Vargas, estudio-sa que defende a leitura como um ato deprazer.

    De acordo com Vargas (2000), ler intertextualizar o mundo do leitor com oconhecimento que a leitura realizada ofe-rece, transformando, assim, sua prpriapercepo de mundo:

    Ler, portanto, significacolher conhecimentos e o co-nhecimento sempre um atocriador, pois me obriga a re-dimensionar o que j est es-tabelecido, introduzindo meu

    mundo em novas sries de re-laes e em um novo modo deperceber o que me cerca. (p. 6)

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    9/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    143

    UNIVEM Centro Universitrio Eurpides de Marlia

    Ler transgride o ato de reconhecere pronunciar letras e palavras, enraza-sena questo da compreenso do que se l,

    da interpretao e da intertextualizao, oque a escola talvez no ensine, mas quese aprende com a experincia, a vivncia,a leitura de mundo, antes defendida porPaulo Freire em sua obra A importncia doato de ler: em trs artigos que se comple-tam (2000):

    [...] a leitura do mundoprecede sempre a leitura dapalavra e a leitura desta im-plica a continuidade da leituradaquele. [...] este movimentodo mundo palavra e da pa-lavra ao mundo est semprepresente. Movimento em quea palavra dita flui do mundomesmo atravs da leitura quedele fazemos. De alguma ma-neira, porm, podemos ir maislonge e dizer que a leitura dapalavra no apenas precedi-da pela leitura do mundo, maspor uma certa forma de es-crev-lo ou de reescrev-lo,quer dizer, de transform-loatravs de nossa prtica cons-ciente. (p. 20)

    Dessa forma, uma das considera-es mais plausveis de exposio e decompreenso do ato de ler est no racioc-nio de Foucambert, em A leitura em questo(1994), com a seguinte reflexo:

    Todos sabem que h di-ferena entre ver e olhar, ouvire escutar... Ler no apenas

    passar os olhos por algo es-crito, no fazer a verso oralde um escrito. Quem ousariadizer que sabe ler latim sporque capaz de pronunciarfrases escritas naquela lngua?Ler significa ser questionadopelo mundo e por si mesmo,significa que certas respos-tas podem ser encontradasna escrita, significa poder teracesso a essa escrita, significaconstruir uma resposta que in-tegra parte das novas informa-es ao que j se . Um poema

    ou uma receita, um jornal ouum romance, provocam ques-tionamentos, explorao dotexto e respostas de naturezadiferente; mas o ato de ler, em

    qualquer caso, o meio de in-terrogar a escrita e no toleraa amputao de nenhum deseus aspectos. (p. 5)

    Em sntese, a leitura est em totalconjuno, num processo de reconheci-mento de letras, pronncia de palavras,interpretao do que se l e intertextuali-zao entre o material lido e o mundo comsuas peculiaridades. Logo, a literatura in-fantil seria amplamente valorizada artisti-

    camente se trabalhada no mbito escolarcom fins educativos que buscassem a lei-tura prazerosa, a leitura literria, a apre-ciao da arte pela arte.

    3.2 O papel da leitura na escola ena sociedade

    Vivemos em uma sociedade letradae a leitura exerce importante papel dentrodessa sociedade. A leitura de out-doors,

    cartazes, jornais, anncios em geral, revis-tas, livros, panfletos, documentos, recei-tas, comerciais televisivos, placas e outrostextos de considervel importncia paraa comunicao e a compreenso do mun-do, seja dentro da escola, na casa do alunoou na sociedade em geral.

    Apesar disso, as escolas ainda trans-formam a leitura num processo maanteao reduz-la em exerccios que no con-templam nem exploram a verdadeira com-petncia de ler, com os quais os alunos

    sentem-se aborrecidos e perdem o interes-se pela leitura antes mesmo de conhecertodas as suas potencialidades.

    Esta relao se d, conforme Colo-mer (2002):

    Assim, apesar do re-conhecimento espontneo daafirmao, ler entender umtexto, a escola contradiz, comcerta freqncia, tal afirmaoao basear o ensino da leituraem uma srie de atividadesque supe que mostraro aosmeninos e s meninas como

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    10/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    44

    Centro Universitrio Eurpides de Marlia UNIVEM

    se l, mas nas quais, parado-xalmente, nunca prioritrio odesejo de que entendam o quediz o texto. (p. 29)

    De acordo com Colomer (2002), osindivduos que no dominam a prtica daleitura consciente e significativa no socapazes de se comunicar com eficinciadentro da sociedade. Ainda, de acordocom a mesma autora, o conhecimento demundo dos indivduos que no tm acessoadequado lngua escrita pode ser con-sideravelmente prejudicado, j que norealizaro o confronto de idias nem seapropriaro da cultura social escrita histo-ricamente acumulada.

    Acerca desse assunto, Colomer(2002) afirma mais claramente que:

    O acesso lngua escri-ta tambm tem conseqnciasno desenvolvimento intelec-tual dos indivduos, pois asmensagens escritas podemser analisadas e confrontadascom nossas idias ou com asde outros textos. Isso favorecea apropriao da experincia

    e do conhecimento humano,pois permite transformar asinterpretaes da realidade fei-tas por outros, ou mesmo porns, em algo material e articu-lado que pode ser desfrutado,contrastado, conceitualizado eintegrado em nosso conheci-mento do mundo. (p. 124)

    A esse respeito, Foucambert (1994)considera em seu livro que a desigual-dade na utilizao da escrita constitui oponto de estrangulamento de toda a vidademocrtica (p. 25). Assim, reitera-se aafirmao que considera a deficincia doindivduo que no l, de acordo com asconcepes de leitura apontadas nessapesquisa, em sua atuao dentro de umasociedade democrtica e seletiva.

    Em relao ao desenvolvimento dosalunos no mbito escolar, muitos profes-sores afirmam que os estudantes que nopossuem a habilidade da leitura, conforme

    j anotado, apresentam dificuldades emtodas as disciplinas, visto que, em qual-quer uma delas, o aluno precisa ler para

    compreender o que est sendo estudado.Na sociedade no diferente: o in-

    divduo, seja ele estudante ou no, preci-sa recorrer s suas habilidades de leitura

    (que abrangem a decodificao, compre-enso, intertextualizao e exposio depensamentos) para compreender o univer-so sua volta.

    Porm, o que pode ser observado que, na formao desses indivduos, ouseja, no processo de ensino e aprendiza-gem dentro das escolas, a leitura ainda considerada de acordo com a concepotradicional: pronunciao ou oralizaodas palavras sem qualquer significado realpara o aluno.

    Segundo Foucambert (1994), a es-cola e a sociedade continuam preparandoas crianas e os adolescentes, como sealgo fosse realmente acontecer, no na-quele momento palpvel para os estudan-tes, mas num futuro que, em geral, im-possvel de ser visualizado pelos prpriosalunos.

    A escola, em consonn-cia com a sociedade, atribui criana o estatuto de tutelado,

    de irresponsvel. claro que,para aprender a falar, ela devefalar; mas o que diz no temimportncia. Para aprender aescrever, deve escrever; maso que escreve no serve paranada. Suas produes serovistas com simpatia, como ga-rantia de sua futura eficcia ecomo incentivo para que pros-siga; basicamente, porm, oque ela produz no pode mu-dar nada no presente o que

    normal, pois so produesde algum que ainda no age,por estar aprendendo a agir.(p. 100)

    Ento, se a escola e a sociedade noenxergam os alunos, sejam eles crianasou adolescentes, como cidados, agentesda prpria aprendizagem e com posio efuno social nicas, como eles mesmosse enxergaro dessa forma?

    Tanto escola quanto sociedade, por-

    tanto, colaboram para que os estudantesse eximam da responsabilidade de atuarcomo sujeitos ativos no meio escolar/so-

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    11/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    145

    UNIVEM Centro Universitrio Eurpides de Marlia

    cial.Com referncia a esta questo, Afr-

    nio Coutinho (1978) considera que a leitu-ra literria auxilia o aluno no descobrimen-

    to do mundo e, conseqentemente, em suaatuao na sociedade em questo:

    Em primeiro lugar, deveservir para ensinar a leitura:leitura expressiva, leitura in-terpretativa, leitura dialogada.Pondo, desde o incio, o alunoem contato direto com o textoliterrio, faz-lo adquirir a fa-miliaridade com a lngua e acoisa literria, levando-o a ad-quirir o gosto da literatura, a

    justa compreenso de seu va-lor e significado. [...] A leiturainteligente, e inteligentementeconduzida, tem por funo jus-tamente abrir o vu sobre essemundo. (p. 14)

    Se a leitura tem seu papel na escolae na sociedade, ela tem tambm seu pa-pel na formao do indivduo atuante etransformador da realidade social. Porm,ambas continuam desconsiderando a im-

    portncia do processo de formao dessacriana e/ou adolescente.De acordo com Foucambert (1994),

    O que a criana faz notem importncia: o importante o que ela vai se tornar pormeio do que faz. Mas, o queela ir se tornar enquanto es-tiver fazendo essas coisas semimportncia? Pois, queira-seou no, ela se torna algo! Acriana, irresponsvel, porque

    ainda em desenvolvimento,aprende a ser fazendo de con-ta. (p. 100)

    H de se transformar essa concep-o para ento compreender melhor a rela-o entre aluno, escola, sociedade, leiturae escrita, com toda a riqueza que permeiao encadeamento de funes nessa teia or-ganizacional.

    A escola precisa parar de prepararos alunos e comear a trabalhar de forma a

    colocar os estudantes nos lugares que lhesso de direito: agentes transformadores dasociedade. Uma escola que considera esta

    como a posio ideal para seus alunos capaz de lhes mostrar o verdadeiro sentidoda leitura e da escrita tanto no mbito es-colar quanto na sociedade como um todo.

    Em sntese, observa-se a importn-cia da leitura de literatura infantil dentro efora da escola, no meio social, no apenaspara que o indivduo se aproprie do conhe-cimento historicamente acumulado, maspara que seja capaz de agir compreenden-do, interpretando e transformando a rea-lidade sua volta, ampliando, assim, seuprprio conhecimento de mundo.

    3.3 O papel do professor nodesenvolvimento do hbito da

    leitura

    Primeiramente, o professor, sendoele um exemplo para os alunos, precisademonstrar o gosto que tem em realizarleituras, o prazer que sente em se comu-nicar por meio de textos escritos, ser umexemplo de leitor assduo e escritor com-petente.

    As crianas tm a tendncia de ob-servar e imitar seus modelos, sejam eles

    adequados ou no. Assim, o professordeve transparecer esse gosto pela leitura epela produo de textos por meio de aesevidentes percepo dos alunos.

    Complementando a questo do pa-pel do professor no ensino da leitura liter-ria, observou-se que:

    Para que o ensino liter-rio continue dando seus frutos, necessrio que o professor,antes do aluno, continue acre-ditando nas virtudes da lite-ratura. Se o prprio professorno confia mais no objeto deseu ensino, e no faz deste umprojeto de vida, melhor queescolha uma profisso maisatual, menos exigente e maisrentvel. (PERRONE-MOISS,2000, p. 351)

    dever da escola promover o encon-tro do aluno com os diversos portadoresde texto e primar pelo bom relacionamento

    entre eles, para que atividades de leiturae escrita sejam bem recebidas dentro dasala de aula e apresentem frutos fora do

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    12/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    46

    Centro Universitrio Eurpides de Marlia UNIVEM

    ambiente da instituio escolar.Kaufman e Rodrguez (1995) consi-

    deram que:

    [...] os professores de-vem propiciar um encontroadequado entre as crianase os textos. Se alguns alunoschegassem a ser escritoresgraas interveno escolar,a misso do professor estariacumprida com lucro. Caso issono ocorra, dever indubit-vel da escola que todos queegressem de suas aulas sejampessoas que escrevem, isto, sejam pessoas que, quan-

    do necessrio, possam valer-se da escrita com adequao,tranqilidade e autonomia. (p.3)

    H os profissionais que trabalhamcom a escrita e sobrevivem dela, como osescritores, poetas, compositores, pesqui-sadores, professores, entre outros. Porm,a escola no precisa almejar a formaode profissionais da escrita, mas garantiros direitos de seus alunos de sarem do

    mbito escolar com as competncias lei-tora e escritora.Esta competncia no luxo nem

    direito particular da elite social ou dosalunos que se destacam dentro da escola,mas de todas as crianas em idade esco-lar.

    Os inmeros portadores de texto,alm de possurem organizaes e apre-sentaes de idias de formas diferentes,possuem peculiaridades internas, palavrase oraes nicas consideradas dentro do

    contexto a que pertencem. A literatura in-fantil um portador de texto envolvente ecapaz de apresentar a arte de forma hu-manizadora.

    Jolibert (1994) considera que:

    lendo que nos torna-mos leitores e no aprendendoprimeiro para poder ler de-pois: no legtimo instauraruma defasagem, nem no tem-po, nem na natureza da ativi-dade, entre aprender a ler eler. Colocada numa situaode vida real em que precisa ler

    um texto, ou seja, construir seusignificado (para sua informa-o ou prazer), cada crianamobiliza suas competnciasanteriores e deve elaborar no-

    vas estratgias para concluir atarefa. [...] No se ensina umacriana a ler: ela quem seensina a ler com a nossa aju-da (e a de seus colegas e dosdiversos instrumentos da aula,mas tambm a dos pais e detodos os leitores encontrados).(p. 14)

    Mesmo que a aprendizagem tenhaincio, na maioria das vezes, pela imitao

    de modelos, cada criana e/ou adolescen-te tem sua maneira particular de avanarneste processo. Cada aluno atribui signifi-cados diferentes para letras, palavras, fra-ses e textos. Cada um tem o seu tempopara desenvolver sua competncia leitora eda mesma forma ocorre com a competn-cia escritora: cada aluno parte de um prin-cpio ou idia para formular pensamentoscoerentes e escrever. inerente a particu-laridade de leitura e escrita de cada aluno,eles tm seu prprio processo de aprendi-

    zagem e reconhecimento textual.Partindo desse pressuposto, muitospodem pensar que, dessa forma, o papeldo professor nulo e invlido, j que cadaaluno aprende a seu tempo e sua ma-neira. O que ocorre que o professor abrecaminhos e indica maneiras de como fazere sua funo se intensifica medida que reconhecido como mediador e facilitador,promotor de situaes e oportunidades deleitura e escrita efetivas e diversificadas.

    A maior faanha do professor com-

    petente est em transformar o contedo aser ensinado em atividades significativaspara seus alunos, para que esses, por suavez, percebam a relao que h entre es-sas atividades realizadas em sala de aula eo seu universo dirio, podendo, assim, sen-tir interesse pela proposta a ser realizada.

    Dentro dessa proposta de trabalho,a literatura infantil seria um elemento cru-cial na elaborao da sensibilidade do lei-tor.

    Considerando ainda o professor

    como modelo, alm dele precisar demons-trar o gosto pela leitura e escrita, deve re-

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    13/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    147

    UNIVEM Centro Universitrio Eurpides de Marlia

    alizar pesquisas para escolher material dequalidade ao planejar suas aulas. Dessamaneira, o aluno ter dois pontos positivose norteadores em sua formao como lei-

    tor e escritor competente: modelo adequa-do de leitor/escritor e textos de qualidadepara trabalhar.

    A princpio, o professor precisa terfinalidades e objetivos claros ao pesquisare apresentar propostas de leitura e escri-ta aos seus alunos. Dessa forma, podernortear o trabalho de seus alunos, que sesentiro seguros, interessados e conscien-tes de sua aprendizagem.

    Isabel Sol, em seu livro Estratgiasde leitura(1998), explica que:

    A interpretao quens, leitores, realizamos dostextos que lemos depende, emgrande parte, do objetivo danossa leitura. Isto , ainda queo contedo de um texto per-manea invarivel, possvelque dois leitores com finali-dades diferentes extraiam in-formao distinta do mesmo.Assim, os objetivos da leituraso elementos que devem ser

    levados em conta quando setrata de ensinar a criana a lere a compreender. (p.22)

    Sabendo-se da necessidade do pro-fessor apreciar a leitura e a escrita e dedemonstrar seu apreo por essas habili-dades, ter finalidades e objetivos claros aopesquisar e apresentar propostas de leitu-ra e escrita, sua funo, como profissionalda rea da educao, tambm apontar ocarter social que essas atividades repre-

    sentam. sua a responsabilidade de sus-citar nos alunos o desejo de aprender, deconhecer atravs da leitura.

    [...] no devemos es-quecer que o interesse tam-bm se cria, se suscita e seeduca e que, em diversas oca-sies ele depende do entusias-mo e da apresentao que oprofessor faz de uma determi-nada leitura [...] (SOL, 1998,p.43)

    Considerando as concepes de lei-

    tura j mencionadas e a amplitude dasatividades que envolvem essa habilidade,acredita-se que o professor deva reconhe-cer a complexidade que h na realizao

    do ato de ler.Segundo Sol (1998):

    O professor deveria pen-sar na complexidade que o ca-racteriza e, simultaneamente,na capacidade que as crianastm para enfrentar de seumodo essa complexidade.Assim, sua atuao tender aobserv-las e a lhes oferecerajudas adequadas para quepossam superar os desafios

    que sempre deveriam envolvera atividade de leitura. (p.91)

    O trabalho de observao, no que dizrespeito ao trabalho de um professor, sefaz fundamental para que este seja reali-zado com destreza. A observao que elefaz de seus alunos durante as aulas servede orientao para suas aes, para quepossa conhecer os limites, respeitar a vi-vncia de cada um e nortear o ensino ea aprendizagem de sua turma. Assim, os

    alunos certamente podero atribuir senti-dos para as atividades de leitura e escritae suas ramificaes.

    Com referncia ao ensino da leitura,Frank Smith, em seu livro Leitura significati-va(1999), pondera que:

    A leitura no pode serensinada, mas, apesar disso,os professores e outros adul-tos tm um papel decisivo adesempenhar e deles a gran-

    de responsabilidade de tornarpossvel a aprendizagem daleitura. (p.15)

    De acordo com a afirmao anterior,o professor no pode ensinar a leitura,porm, tem papel fundamental para queo aluno reconhea essa habilidade comopossvel, necessria e significativa parasua vivncia.

    Reunindo todas as consideraes,observa-se que o papel do professor

    essencial na formao de um leitor e es-critor competente, sendo ele um modelo,um mediador, facilitador ou leitor/escritor

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    14/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    48

    Centro Universitrio Eurpides de Marlia UNIVEM

    mais experiente.Em sntese, pode-se dizer que o pro-

    fessor semeia, cultiva e realmente trabalhapara fazer brotar em cada um de seus alu-

    nos o gosto e a competncia ou habilidadesignificativa para a leitura e escrita, de-monstrando, principalmente, sua funosocial (a leitura de mundo) e seu poder natransformao da realidade.

    CONSIDERAES FINAIS

    O presente trabalho teve como prin-cipal objetivo pesquisar a questo da crisena literatura infantil atual, rotulada e con-siderada de menor qualidade dentro de

    um campo literrio geral.Observou-se as produes literrias

    destinadas ao pblico infantil e literaturano infantil, examinando minuciosamentea questo mercadolgica e o carter peda-ggico presente nesse campo literrio.

    Compreendeu-se que a literatura in-fantil, por ser alvo de preconceitos e ba-nalizaes, no reconhecida e utilizadade maneira correta. Dessa forma, pde serconcludo que a leitura, vivenciada da ma-neira correta dentro e fora da escola, pode

    auxiliar na familiarizao com a literaturainfantil em prol do reconhecimento e dorespeito que a literatura em questo me-rece receber.

    O trabalho reafirmou a questo ini-cial que a literatura infantil, possuindo omesmo carter literrio e plasmador da re-alidade, bem como o princpio de catarsesobre o humano, deve ser considerada erespeitada como parte de uma literaturauniversal, como tambm a necessidade dese discutir a literatura infantil nos meiosacadmicos, para que esta seja atenta-mente observada e compreendida em rela-o sua relevncia.

    Reitera-se, ainda, a proposta inicialdeste estudo, de que a literatura infantilmerea fazer parte do currculo obrigat-rio dos cursos de Licenciatura em Letras ePedagogia, uma vez que exatamente paraesse pblico que esse gnero produzido.

    REFERNCIAS

    BIBLIOGRFICAS

    ABRAMOVICH, F. Literatura infantil: gosto-

    suras e bobices. 2. ed. So Paulo: Scipio-ne, 1991.

    COLOMER, Teresa; CAMPS, Anna. Ensinar

    a ler, ensinar a compreender. Traduo F-tima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2002.

    CANDIDO, A. O direito literatura. In:______Vrios escritos. 3. ed. revista e am-pliada. So Paulo: Duas Cidades, 1995. p.235 - 263.

    COUTINHO, Afrnio. Que literatura ecomo ensin-la. Notas de teoria literria.2. ed. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira,1978. p. 8 -15.

    CUNHA, Maria Antonieta Antunes Cunha.Literatura Infantil: teoria e prtica. 6 ed.So Paulo: tica, 1987.

    DICIONRIO HOUAISS da lngua portugue-sa. Instituto Antnio Houaiss de Lexicogra-fia e Banco de Dados da Lngua PortuguesaS/C Ltda. (Org.). 2. ed. Revisto e aumenta-do. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.

    FOUCAMBERT, Jean. A leitura em questo.

    Trad. Bruno Charles Magne. Porto Alegre:Artes Mdicas, 1994.

    FREIRE, Paulo. A importncia do ato deler: em trs artigos que se completam. 39.ed. So Paulo: Cortez, 2000.

    JOLIBERT, Josette. Formando crianas lei-toras. vol. 1. Trad. Bruno Charles Magne.Porto Alegre: Artes Mdicas, 1994.

    KAUFMAN, Ana Maria; RODRGUEZ, Mara

    Elena. Escola, leitura e produo de tex-tos. Trad. Inajara Rodrigues. Porto Alegre:Artes Mdicas, 1995.

    PERRONE-MOISS, Leyla. Consideraointempestiva sobre o ensino da literatu-ra: Intil poesia e outros ensaios breves.So Paulo: Companhia das Letras, 2000.p. 345-351.

    SEVERINO, A. J. Metodologia do trabalhocientfico. 22 ed. So Paulo: Cortez, 2002.

    SMITH, Frank. Leitura significativa. Trad.

  • 7/25/2019 Trajetria Da Literatura Infantil_Ana Luiza

    15/15

    REGRA

    D-

    RevistaEletrnicadeGraduao

    doUNIVEM

    ||

    v.

    2-n.2

    -jul/dez-2009

    www.univem.e

    du.br

    149

    Beatriz Affonso Neves. 3. ed. Porto Alegre:Artes Mdicas Sul Ltda, 1999.

    SODR, Muniz. Best-seller: a literatura de

    mercado. So Paulo: tica, 1985.SOL, Isabel. Estratgias de leitura. Trad.Cludia Schilling. 6. ed. Porto Alegre: Art-Med, 1998.

    VARGAS, Suzana. Leitura: uma aprendiza-gem de prazer. 4 ed. Rio de Janeiro: JosOlmpio, 2000.

    ZILBERMAN, Regina. A literatura infantilna escola. 4 ed. So Paulo: Global, 1985.

    ______; LAJOLO, Marisa. Um Brasil paracrianas: para conhecer a literatura infan-til brasileira: histrias, autores e textos.So Paulo: Global, 1986.