Trabalho Tony
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O pensamento europeu ocidental criou diversas maneiras, diversas
estruturas de compreensão da realidade social, com o intuito de manter a
América latina com a ideia persistente da condição de colonizado, de inferior. O
colonialismo atualmente é colocado como um sistema de dominação política
formal que a partir das estruturas de percepção “moderna” citadas por Quijano
o mesmo é justificado. Partindo desta premissa, muitos autores tentaram
desvincular a história da América latina da visão européia ocidental que ainda
hoje predomina nos discursos do senso comum.
A fim de exemplificar estas desvinculações da visão eurocêntrica,
temos o texto de Miguel León-Portilla “A conquista da América latina vista pelos
índios”, no qual podemos encontrar relatos dos povos astecas, incas e maias.
O livro se trata de uma espécie de antologia de testemunhos sobre a conquista,
com relação as mais diversas temáticas. Um deles versa sobre um embate em
forma de diálogo entre franciscanos e nativos astecas, retratando por
conseqüência como eram os ritos religiosos dos astecas e como estes se
comportavam perante o desrespeito a sua religião, julgando-a pagã. Isso nos
mostra o quanto a literatura ocidental enraigou em nossa cultura a crença do
paganismo por parte da indígena, e nos ajuda a desconstruir a visão
depreciativa construída até então. Apesar de estas desconstruções persistirem
em ocorrer é necessário lembrar, que quase sempre são livros caros e raros, e
em grande maioria conhecido somente pelo meio acadêmico.
Ainda que existam críticas a literatura que ainda produz esses discursos
preconceituosos e carregados da nossa velha conhecida hegemonia européia,
esta literatura é,ainda, a mais lida e acessada . Um texto que retrata muito bem
a construção errônea que se tem acerca da América latina, é o texto de
Francisco de Vitória que ficou conhecido por suas contribuições a teoria da
guerra justa e por ser um dos precursores do direito internacional. Vitória usa e
abusa do senso de superioridade européia em seu discurso. É possível supor
que seu discurso procura justificar o colonialismo na América latina em forma
de repressão cultural conjuntamente com o extermínio maciço do nativo. Steve
Stern trabalha essa ideia como se houvesse uma necessidade de unificar as
histórias continentais/mundiais de maneira que o eixo norte-atlântico pudesse
ascender como centro,como parâmetro para os outros.
Vitória retrata em seu texto situações e justificativas esdrúxulas para a
dominação e ocupação da América. Um deles é justamente o direito natural,
argumentando que todos tinham direito no território, usando inclusive a religião
(Deus) como justificativa de que qualquer um teria o “direito divino” de usufruir
daquela terra. Um ponto intrigante é a visão que o colonizador tinha acerca de
si mesmo e dos outros que poderiam tentar também fazer usufruto daquela
terra. Vitória como um espanhol, não se auto intitula estrangeiro, ele denomina
estrangeiro somente aqueles que chegarem posteriormente a ele naquela terra,
e o mais intrigante é o que indígena não sabe a diferença entre um e outro. Ou
seja, para o indígena ambos são “estranhos”. O espanhol sempre se refere ao
indígena como bárbaro esquecendo que quem chegou por último foi ele. Vitória
frisa que o indígena deveria aceitar a religião por ser “sem fé” e ainda justifica
que se os indígenas permitirem o evangelho não haverá necessidade de
declarar guerra ou ocupar a terra.
Durante os textos supracitados muitos são os embates entre o olhar europeu e
o olhar do indígena, se tratam de concepções de vida completamente opostas,
mundos desconhecidos um ao outro, o que dificulta definir o que foi em si a
conquista da América. Para uns fora uma coisa boa, para outros significou
perdas culturais totais. Para os indígenas significou perda de liberdade em sua
terra, para o europeu significou prosperidade, significou um passo para sua
hegemonia mundial.
Referências Bibliográficas:
LEÓN-PORTILLA, M. (Org.) A conquista da América Latina vista pelos índios:
relatos astecas, maias e incas. Petrópolis: Vozes, 1984.
QUIJANO, Aníbal. “Colonialidade e modernidade-racionalidade”. In.: BONILLA,
Heráclio (org). Os conquistados: 1492 e a população indígena das Américas.
São Paulo: Hucitec, 2006. p. 416-426.
STERN, Steve J. “Paradigmas da conquista: história, historiografia e política”.
In: Heraclio Bonilla. Os conquistados: 1492 e a população indígena das
Américas. São Paulo: Hucitec, 2006. p. 27-66.
VITORIA Francisco de. Relecciones sobre los índios y el derecho de guerra.
Madrid: ESPASA-CALPE, 1975. (terceira parte: “De los títulos legitimos por los
cuales pudieron venir lós bárbaros al dominio de los españoles”).