Trabalho 3 Amazônia(1)
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História
Trabalho indígena na Amazônia Colonial: diálogo com realidades políticas diversas
A escravidão indígena no Brasil
colonial iniciou em meados do século XVI
devido à intensificação das atividades
econômicas no litoral. A utilização da mão-
de-obra dos nativos foi predominante
durante o período colonial em locais como a
Amazônia. A instituição do modo de
produção escravista no Brasil foi
responsável por profundas alterações nas
formas de vida dos indígenas, em suas
culturas e suas relações sociais, tais como as
formas de trabalho, os hábitos de
alimentação e vestimenta, as crenças, os
casamentos, os rituais etc.
O contato entre as populações
indígenas e os europeus se deu de diferentes
maneiras: através de relações de aliança, de
troca ou por meio de guerras. Para que o
projeto colonial – que consistia no conjunto
de intenções e práticas dos europeus no
sentido de colonizar o novo território –
funcionasse bem era necessária a utilização
da mão-de-obra indígena. Entretanto, como
nem todos os nativos aceitaram
pacificamente trabalhar para os colonos, a
legislação indigenista assumiu posições
diferenciadas dependendo das ações dos
grupos indígenas.
A fim de “civilizar” e re-socializar
os nativos, os colonizadores incentivaram a
evangelização promovida pelos
missionários, que no início também era
responsável pela organização e distribuição
da mão-de-obra indígena. Os religiosos
eram, ainda, responsáveis por legitimar ou
não o aprisionamento dos nativos por meio
de guerras justas (tema ao qual voltaremos a
diante). Essas funções dos missionários
provocaram, no decorrer do tempo, embates
entre missionários e colonos. Estes últimos
desejavam ter maior controle sobre a mão-
de-obra indígena. Assim, para atenuar esses
conflitos a legislação indigenista sofreu, ao
longo do tempo, modificações em relação à
liberdade e escravização indígena.
Primeiramente, é preciso ressaltar
que o Regimento do Governador-Geral
Tomé de Sousa, de 1548 – primeiro
documento legal relativo ao Brasil –, já
estabelecia a diferença entre índios aliados e
índios inimigos, e os diferentes tratamentos
dispensados a esses grupos distintos. De
acordo com a legislação, apenas os índios
inimigos, denominados “gentios de corso”
ou “gentios bravos”, podiam ser
escravizados.
Aos índios aliados e aldeados foi
garantida a liberdade durante toda a
colonização. Além disso, a legislação
garantia também a posse de terras e o
recebimento de salários pelas atividades
realizadas para os moradores. Eles deveriam
ser bem tratados, “descidos” (retirados) de
suas comunidades tradicionais e
estabelecidos nos aldeamentos
(comunidades dirigidas por portugueses,
História
Trabalho indígena na Amazônia Colonial: diálogo com realidades políticas diversas
onde os índios trabalhavam e eram
catequizaos) por vontade própria, sem
nenhum tipo de violência. Os responsáveis
pela realização dos descimentos –
missionários ou colonos – e a localização
dos aldeamentos variaram ao longo do
período colonial.
A legislação permitia que os índios
inimigos fossem escravizados por meio da
Guerra Justa, que podia acontecer devido à
recusa dos nativos à conversão, ao
impedimento da evangelização ou à
hostilidade contra os colonos e seus aliados.
A violência, apesar de ser considerada
prejudicial à conversão, era utilizada para
“civilizar” os nativos hostis. Outra forma de
escravização permitida era aquela realizada
por meio dos resgates, que consistiam na
libertação de índios prisioneiros de outras
tribos.
No entanto , o projeto colonial
expresso nas leis nem sempre correspondia
à realidade. Os colonos cometeram diversos
abusos na conquista de terras e povos
indígenas, promovendo Guerra Justa e
“descimentos” ilegais. Tais práticas
contribuíram para o despovoamento de
várias áreas, tanto devido ao aprisionamento
de índios, quanto às epidemias que os
europeus trouxeram, contra as quais os
índios não apresentavam nenhuma
resistência natural.
Os indígenas, buscando seus espaços
de sobrevivência, autonomia e liberdade,
recorreram a diferentes estratégias para
reverter o quadro opressivo que
vivenciavam. Dentre estas estratégias
podemos destacar que eles: forneciam
escravos cativos de grupos inimigos;
planejavam fugas coletivas; buscavam
reconstituir parte da sociedade tradicional
em territórios de difícil acesso;
estabeleciam comércio paralelo ao
realizado pelos colonos; recorriam à Justiça
Colonial em busca da liberdade.
Entretanto, como a legislação sofreu
alterações devido às demandas do diferentes
interesses dos agentes coloniais, as leis ora
concediam liberdade a todos os indígenas
ora retornavam a permitir a escravidão dos
índios inimigos. Como exemplo, há o
Alvará de 28 de abril de 1688 que
reintroduziu a escravização indígena através
dos resgates e das Guerras Justas, que
esteve, primeiramente, sobre o controle do
estado e, posteriormente, foi permitida a
organização de expedições particulares.
Esse alvará estabelecia que as
Câmaras das cidades fossem responsáveis
pela repartição dos indígenas. A
escravização seria permitida em guerras
defensivas contra índios inimigos e infiéis
deflagradas devido à invasão dos índios a
aldeias e terras do Estado do Maranhão ou
no caso de os nativos impedirem a
História
Trabalho indígena na Amazônia Colonial: diálogo com realidades políticas diversas
evangelização. A guerra ofensiva também
era legalizada em caso de comprovação de
que os índios infiéis invadiriam as terras
coloniais. Essas guerras seriam legalizadas
pela apresentação de documentos e
testemunhas que comprovem a necessidade
de se fazer guerra.
O Alvará substitui a lei de 1º de
Abril de 1680 que proibiu todas as formas
de cativeiro, de resgate e de guerra justa.
Essa mudança ocorreu devido ao não
cumprimento da referida lei, que ao invés
de impedir os abusos e a violência contra os
índios acabava promovendo maiores danos
aos nativos, pois os colonos os matavam
cruelmente, já que não podiam torná-los
cativos.
Assim, a questão do trabalho
indígena na Amazônia foi definida não
somente pela imposição das ordens da
colônia portuguesa, mas constitui-se num
diálogo entre os agentes coloniais que
tinham objetivos diferentes para os
indígenas. Por isso, observa-se as alterações
que a legislação indigenista sofreu ao longo
do processo histórico de integração das
populações indígenas a nova realidade
colonial
- Glossário:
* Modo de produção escravista: forma de trabalho no qual a principal mão-de-obra são os escravos.
* Legislação indigenista: conjunto de leis que regulavam as relações sociais e de trabalho dos indígenas
* Índios aldeados: índios que viviam nas aldeias missionárias
- Referências bibliográficas:
“Alvará em forma de ley expedido pelo secretario de Estado que deroga as demais leys que se hão passado sobre os indios do Maranhão” 28 de abril de 1688. Anais da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, vol. 66 (1948), pp. 97-101.
ALMEIDA, Maria Regina. “Trabalho compulsório na Amazônia: séculos XVII-XVIII”. Revista Arrabaldes, ano I, nº 2 (set.-dez. 1998), pp. 101-117.
DOMINGUES, Ângela. “Os conceitos de guerra justa e resgate e os ameríndios do norte do Brasil”. In: SILVA, Maira Beatriz da (org.). Brasil: colonização e escravidão. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000, pp. 45-56.
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PERRONE-MOISÉS, Beatriz. “Para conter a fereza dos contrários: guerras na legislação indigenista colonial”. Cadernos Cedes, nº30 (1993), pp. 57-64.
PERRONE-MOISÉS, Beatriz. “Índios livres e índios escravos. Os princípios da legislação indigenista colonial (séculos XVI a XVIII)”. In: CUNHA, Manuela Carneiro da (org.). História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1992, pp. 115-132.