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    VITOR MANUEL ADRIO

    A TORRE DO INFERNO

    DO

    REI DO LIXO

    Lisboa, 2012

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    A Torre do I nferno do rei do l ixo

    Vitor Manuel Adrio

    (L icenciatur a em Histr ico-Fi losfi cas (FLL )I nvestigador e escri tor )

    Dominando a paisagem circundante, altiva e estranha, a Torre do Inferno encontra-sejunto Estrada Nacional n. 10 em Coina, freguesia do Concelho do Barreiro, dentro dapropriedade do famoso e controverso Manuel Martins Gomes Jnior, o rei do lixo, que deubrado em Lisboa e na margem sul do Tejo nos primeiros decnios do sculo XX.

    A quinta onde se encontra a tambm chamada Torre de Coinafoi propriedade rural, nosculo XVIII, de D. Joaquim de Pina Manique, poltico, cavaleiro da Ordem de Cristo e irmo dofamoso intendente da rainha D. Maria I, Diogo Incio de Pina Manique, o ultra-conservador quefundou a Casa Pia de Lisboa. Ainda hoje a marca de D. Joaquim est patente na quinta, numaCruz de Cristo inscrita numa lpide incrostada no muro. Com as mudanas polticas ocorridas no

    sculo XIX e a disperso da famlia Pina Manique, a propriedade entrou numa fase de abandonoe decadncia at que, nos finais desse sculo, foi comprada pelo rei do lixo que vinhaconstruindo um imprio a partir do nada!

    A vida de Manuel Martins Gomes Jnior replete-se de contradies em lances claros-escuros onde a obscuridade maior que a clareza dos actos, facto que tem levado os seusrarssimos bigrafos a confessarem ser a mesma mais conhecida pelas maledicncias eincoerncias dos inmeros inimigos que Manuel Martins granjeou ao longo da sua vida que

    pelos factos concretos, os quais por se manterem desconhecidos impossibilitam a feitura da suabiografia com veracidade exacta.

    Manuel Gomes Jnior nasceu em 1860 no seio de uma famlia humilde em Santo

    Antnio da Charneca. Desde cedo prometera a si mesmo mudar da vida miservel e tornar-serico, e foi o que fez! Aps ter trabalhado como marano em Lisboa durante algum tempo e

    juntado algumas economias, regressou ao Barreiro e comprou o moinho de gua em frente

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    Quinta de So Vicente. Diz-se que aps assinar um contrato com uma seguradora ele prprio terateado fogo ao moinho, e como nunca se provou que no tivesse sido acidente foi indemenizadocom uma elevada quantia. Com parte desse dinheiro comprou uma pequena propriedade eentregou-se especulao agrcola, emprestando dinheiro, sob pesados juros, aos proprietriosvizinhos de Coina para cultivarem os seus terrenos. Numa poca em que as colheitas foram ms

    e os agricultores no tiveram como saldar as dvidas contradas, Manuel Gomes no lhesperdoou: anexou as parcelas dos devedores sua, formando assim uma quinta com mais de 300hectares. J em 1908 era dono da Quinta da Trindade na Azinheira, Seixal, tendo chamado a si areconstruo do edifcio apalaado e construdo ainda o castelinho, nessa que fora propriedadede D. Brites Pereira, sobrinha de D. Nuno lvares Peireira, que a fundara a ermida da Senhorada Boa Viagem para os religiosos da Ordem da Santssima Trindade, extinta em 1834. Foi assim,tambm, que a partir de 1910 a Quinta do Maniqueficou na sua posse, graas aos seus dotes deespeculador, diz a vox populi. Tornou-se um grande proprietrio, e havia que rentabilizar oterreno. Dedicou-se sunicultura aps firmar um contrato com um grande negociante eexportador de carnes de Lisboa. Alugou-lhe o espao da quinta para criao de porcos e

    participou no negcio de exportao de carnes. Pouco tempo depois o seu scio morreu e

    Manuel Gomes assumiu o controlo total do negcio, passando a ser um rico negociante decarnes. Devido sua inclinao natural para os negcios e o seu carcter empreendedor, atingiuo auge ao assegurar o controlo da recolha dos lixos em Lisboa ( altura os lixos eram apenasmatria orgnica) transportando-os para Coina nas suas cinco fragatas, para servirem de alimentoaos porcos e no gastando com isso um s tosto! Morreu em 1943 em circunstncias estranhas,cujas causas nunca foram apuradas.

    Os carros daCmara M unici pal derramando oli xo de L isboa nas fr agatas do Rei do Lixo

    Carregando fragatas com li xo no

    cais da Viscondessa

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    Aps a sua morte, a Quinta da Torre de Coina passou para o seu genro Antnio ZanoleteRamada Curto e tornou-se o principal centro agrcola da regio. Em 1957 vendeu-a a Jos Mota,irmo dos grandes proprietrios e industriais de curtumes Joaquim Baptista Mota e AntnioBaptista Mota, que mudaram o nome do imvel para Quinta de So Vicente fundando a aSociedade Agrcola da Quinta de So Vicente, transformando a propriedade numa importante

    explorao porncola. Igualmente melhorou-se o seu jardim palaciano, o labirinto de arbustos, aescadaria de pedra, o pomar e as palmeiras em volta da capela.

    Em 1972 a herdade foi novamente vendida, desta vez a Antnio Xavier de Lima,conhecido urbanizador da margem sul. Este afirmou publicamente possuir um projecto parareconverter a quinta e transformar o palcio numa pousada com cerca de 85 quartos. Mas nanoite de 5 de Junho de de 1988 o palcio foi totalmente devorado pelas chamas de um incndio,que no poucos dizem ter sido ateado de propsito. Xavier de Lima disse depois ao jornal ACapital que o restauro do imvel implicava um investimento no suportvel. Desde a o palciocom a torre e a quinta em volta encontram-se num total abandono, j tendo abatido toda a parteintermdia e o terceiro terrao do edifcio, a cada dia transformando-se mais e mais numa

    enorme runa este que o ex-librisda histrica vila de Coina cuja autarquia, sem dvida, deveriacuidar melhor do seu patrimnio, muito mais sendo este um exemplar de arquitectura nica nopas construdo com os mais ricos materiais da poca.

    Manuel Martins Gomes Jnior e a sua famlia nunca habitaram a Quinta da Torre, mas ofacto de t-la adquirido teria sido pelo aspecto realengo imponente que lhe impuseram os

    primitivos moradores ligados Casa Real, e como ele era rei (do lixo)por certo quis ter umpalcio condigno com tal ttulo, ou melhor, alcunha. Diz a vox populique foi a sua vinganarepublicana sobre o regime monrquico, pondo no lugar dos antigos cortesos lixo e porcos.

    propriedade rebaptizou-a com o novo e inquietante nome de Quinta do Diabo, com a sua Torre

    do Infernoque mandou fazer em 1910, tendo transformado a capela da quinta em armazm eestbulo, e s suas cinco fragatas transformadas em barcos do lixo deu-lhes os nomes deMafarrico, Lcifer, Belzebu, Demnio eSatans. Tratou-se de uma provocao desaforada ao

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    regime eclesistico secular que a recente Revoluo de 5 de Outubro depusera, com isso ficandocom fama de ateu e anti-desta impenitente at hoje. Figura poltica de peso na altura,republicano e laico, foi regedor de Santo Antnio da Charneca, construiu a primeira escola deensino primrio na freguesia, financiou colectividades, fundou a Companhia Agrcola Nacional e

    protegeu os pobres. Foi um apstolo do ideal de sociedade republicana justa e igualitria que

    se sonhou nos primeiros tempos do regime, o que se conformava ao ideal poltico perfilhado pelaMaonaria Portuguesa na qual Manuel Martins seria afiliado, o que no est provado mas nosendo de descartar a hiptese por quase todos os republicanos desse perodo terem de uma formaou doutra andado de ligaes com essa Ordem.

    O anti-desmo do ateu e opulento Manuel Martins ter sido mais uma blague provocatriade fachada que propriamente uma convico ntima, pois se assim fosse no teria deixado no seutestamento a doao de 143 mil contos Misericrdia local. Alm disso, o Palcio e Torre doInferno apresentam sinais claros de simbologia com fundo desta, conhecimento esse que terrecolhido junto do meio esotrico em voga na poca, ou seja, a prpria Maonaria Inicitica, noque tem mais de simbolgica e menos de poltica. Por isso, ainda hoje a vox populidiz sem saber

    que o imvel destinava-se a ser uma nova sede da Maonaria porque a anterior ardera h poucotempo, o que no verdade, pelo menos no que toca sede da Obedincia em Lisboa por sersecreta a sua localizao. Tambm no possuo informaes exactas de ter havido um incndioem alguma Loja da margem sul. Concluo que o sentido de nova sede manica ser diverso doda voz do povo: ele est no prprio simbolismo do edifcio que causa estranheza geral menosqueles que detm o conhecimento do seu significado inicitico exacto, os arquitectos maonsque edificaram o imvel e deixaram os sinais secretos da sua afiliao esotrica, por certo deacordo com a vontade expressa do proprietrio, mesmo acaso ou por certo despossudo das

    profundezas do pensamento esotrico.

    A botnica manica marcou presena determinante junto do operariato, do

    empreseriado, dos intelectuais e at dos religiosos da margem sul do Tejo. Nisso incontornvela pessoa do farmacutico Antnio Augusto Louro (Sabugal, 22.10.1870 Alcanena, 1.8.1949),cuja farmcia no Seixal foi local de encontro e debates de ideais manicos e republicanos.Maom conciliador, foi nomeado Garante da Amizadeentre os Irmos e Lojas situadas no Valedo Seixal. Em 16 de Julho de 1906 fundou no Barreiro a Loja Esperana de Porvir, e a 13 domesmo ms um Tringulo em Sesimbra, e um outro na Moita a 4 de Dezembro, tendo ambos osTringulos (compostos de 3 Mestres-Maons) se transformado em Lojas, a ltima adoptando onome de Firmeza. Seguiam o Rito Francs, cujos ideais de h muito vinham inspirando osrepublicanos portugueses at culminar no regicdio e consequente revoluo, com a Cabornria dianteira e a Maonaria por detrs.

    Antnio Augusto Louro (1870-1949)

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    O rei do lixo a ser maom ter com certeza frequentado a Loja Esperana de Porvir(a sociedade republicana), no Barreiro. Esta funcionava no primeiro andar do edifcio hojeocupado por um restaurante no Largo Alexandre Herculano. Tinha como extenso gremial aSociedade Democrtica Unio Barreirense Os Franceses. Nesta, os anarquistas, socialistas erepublicanos tinham um espao de favorecimento cultural, no s atravs do convvio mas

    tambm pelo acesso franco a bibliotecas. Este centro republicano tal como outros idnticosforam um dos veculos de infiltrao da Carbonria, organizao revolucionria armada paralelada manica de que existiram vrios ncleos ou vendas na margem sul do Tejo,nomeadamente no Barreiro, em Palmela, na Moita, em Almada, em Cacilhas, na Aldeia Galega eem Alcochete. A antecipao da proclamao da Repblica pelas 12:30 horas do dia 4 deOutubro de 1910 nos Paos do Concelho do Barreiro, sitos na antiga Rua Albers, eramcabornrias as vozes proclamadoras de Ricardo y Alberty e Joo dos Santos Pimenta, membrosda Junta Revolucionria.

    Voltando ao Palcio do Inferno, o sinal mais evidente da sua inteno esotrica est nolabirinto, tanto o floral do jardim como o ptreo do palcio, onde circular neste mostrava-se

    bastante complicado para o visitante, no s como uma demonstrao cabal de grandeza e poderpela imponncia do edifcio em si, mas tambm por ser verdadeiramente um labirinto, cujosignificado liga-se inteiramente ao mundo da Tradio Inicitica.

    A origem mitolgica do labirinto o palcio cretense de Minos, onde estava encerrado ominotauro e donde Teseu s conseguiu sair com a ajuda do fio-de-Ariadne. O minotaurorepresenta a natureza animal, o labirinto a caminho tortuoso da Iniciao a ser percorrido porTeseu, o Iniciado, e sair triunfalmente do mesmo graas ao fio de Ariadne, ou seja, ligao

    permanente sua Alma ocultada sob a veste carnal. Vencer a besta animal em si equivalia aalcanar o Centro e triunfar na Iniciao. A ver com isso e ao mesmo tempo, os labirintosesculpidos no cho de algumas igrejas medievais eram a assinatura das confrarias iniciticas deconstrutores livres, e para os que no tinham posses para viajar substituam a peregrinao

    efectiva Terra Santa. Por isto, s vezes encontra-se no centro do labirinto as figuras ou doprprio arquitecto ou do Templo de Jerusalm, representando o eleitoque chega ao Centro doMundo, assinalado pelo mesmo Templo de Salomo. Assim, o crente que no podia realizar a

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    peregrinao real percorria em imaginao o labirinto, at chegar ao ponto central, ao lugarsanto: era peregrino sem sair do lugar, fazendo devotamente o trajecto de joelhos.

    Na tradio cabalstica, retomada pelos alquimistas, o labirinto preencheria uma funomgica que seria dos segredos atribudos ao rei Salomo. por esta razo que o labirinto dascatedrais (sendo uma srie de crculos concntricos interrompidos em certos pontos de modo aformar um trajecto bizarro e inextrincvel) era chamado de labirinto de Salomo. Aos olhos dosalquimistas, tratava-se de uma imagem do trabalho inteiro da Grande Obra Hermtica com assuas dificuldades principais: o caminho estreito mas seguro que o alquimista deve percorrer paraalcanar o centro, representando a Pedra Filosofal sinnima de Iluminao ou RealizaoEspiritual, com a sua natureza superior (representada nos metais nobres, como o ouro e a prata)dando combate sua natureza inferior (assinalada nos metais impuros, como o chumbo e oferro); esses conhecimentos equivaliam a vencer e sair inclume do intrincado labirinto daIniciao. Esta interpretao ia de encontro professada na doutrina asctica de alguns msticoscristos e rabes: concentrar-se em si mesmo, em meio dos mil rumos incertos das sensaes, dasemoes e das ideias, eliminando todo o obstculo intuio pura, e volver-se Luz Espiritual

    sem deixar-se prender nos desvios das veredas sensoriais e mentais. A ida e volta no labirintoeram representativas da morte e da ressurreio espiritual.

    De maneira que o labirinto expressa o caminhar do homem para o interior de si mesmo,para uma espcie de santurio ou cripta misteriosa (representada na cave doPalcio do Inferno)expressando o que h de mais misterioso e sagrado nele. a, nessa cripta, verdadeiro templo doEsprito Santo na alma em estado de graa, que se reencontra a unidade perdida do Ser que sedispersara na multido dos desejos. A chegada ao centro do labirinto, como no fim de umaIniciao, introduz o Iniciado numa cela invisvel, que os artistas dos labirintos sempre deixaramenvolta em mistrio, ou melhor, que cada um podia imaginar segundo a sua prpria intuio ouafinidades pessoais.

    O sentido teolgico de Infernomerece tambm abordagem. Sobre este tema do Infernoou Hades, as crenas antigas egpcias, gregas e romanas variaram muito e por isso naAntiguidade eram diversificadas e numerosas. Entre os gregos,Hadesera o deus dos mortos quereinava no mundo subterrneo ocultado aos que vivem sobre a Terra, e por isso chamavam essedeus de o Invisvel. Como ningum ousasse pronunciar-lhe o nome, por temor de excitar a suaclera, ele recebeu o apodo dePluto, oRico, nome que implica um terrvel sarcasmo, mais queum eufemismo, para designar as riquezas subterrneas da Terra que fazem parte do imprio dosmortos e so guardadas por estes, oque est em conformidade com o sentido de as riquezasinfernais inalcanveis pela cobia do homem vulgar. Esse sarcasmo de o Rico, torna-se aindamais macabro quando colocada uma cornucpia da riqueza nas mos de Pluto, ainda que,

    contudo, no simbolismo tradicional o subterrneo indicativo das jazidas ricas represente o lugarsupremo das metamorfoses dos seres, das passagens da morte vida, da germinao mstica dosseres humanos e da germinao natural de toda a vida.

    As caractersticas de Hadesou o Inferno, tambm chamado Trtaro, so as mesmas portoda a parte: lugar invisvel, eternamente sem sada (salvo pela porta da reencarnao da almanum novo corpo humano, como prova da piedade divina assinalada na Virgem, aqui, NossaSenhora dos Remdios da ermida de Coina que pertencera Quinta do Manique), perdido nastrevas geladas e no lume da conscincia atormentada, assombrado por monstros e demnios quecastigam incessantemente as almas dos defuntos que nas suas vidas terrenas caracterizaram-se

    pela maldade dos seus actos. No Egipto, conforme est ilustrado no tmulo de Ramss VI emTebas, oInfernoera simbolizado por cavernas tenebrosas (as mesmas Talasdo Hindusmo ou o

    Baixo Astralda Teosofia) repletas de almas danadas, chamadaspretasouporcus, em snscrito elatim, como os mesmos kama-rupasque talvez ou por certo provocaram a morte misteriosa deManuel Martins Gomes Jnior, vtima do choque de retorno das suas prprias expresses,

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    atendendo ao princpio de que a energia segue o pensamento. Mas nem todos os mortos eramvtimas deHades: os eleitos, os iniciados, os sbios e heris conheciam outras moradas que noeram as regies tenebrosas, pois dirigiam-se para as Ilhas Venturosas, os Campos Elseos (asmesmasLokasdo Hindusmo ou o Mundo Mentalda Teosofia), onde a luz e a felicidade lheseram prodigadas.

    Alguns textos bretes da Idade Mdia mencionam o Inferno qualificando-o de an ifernyen, o inferno gelado. Esta expresso de tal modo contrria s normas usuais que deve serconsiderada como uma reminiscncia das antigas concepes clticas relativas ao no-Ser, ou ano manifestao da Vida na Forma.

    Segundo a crena dos povos turcos altaicos, chega-se perto dos espritos dos Infernosquando se caminha do Oeste para o Este, ou seja, no sentido inverso ao do percurso solar, quesimboliza, ao contrrio, o movimento vital progressivo. Essa caminhada no sentido oposto ao daluz, em vez de ir ao seu encontro, representa a regresso para as trevas, o que se representa nainverso dos valores naturais e dos smbolos tradicionais.

    Na tradio crist, a conjuno luz-treva expressa os dois princpios opostos: o Cu e oInferno. Plutarco j descrevia o Trtaro como privado de Sol. Se a luz se identifica com a Vida ecom Deus, o Inferno significa a privao de Deus e da Vida.

    A essncia ntima do Inferno o prprio pecado mortal em que os danados morreram. aperda da presena de Deus, e como j nada mais pode iludir a alma do defunto, separada docorpo e das realidades sensveis, o Inferno a sua desventura absoluta, a privao radical,tormento misterioso e insondvel. a derrota total, definitiva e irremedivel de uma existnciahumana. A converso do danado j no mais possvel; empedernido em seu pecado, ele est

    para sempre cravado na sua dor.

    Para os cristos, contudo, resta um ponto de apoio seguro para no tombar na danaoeterna, esse ponto a prpria milagrosa Maria Santssima encarnando o mistrio da MisercrdiaDivina e a sua prtica entre os homens (e a ela, Misericrdia, se encomendou o ateu ManuelMartins). Concebida como envolta na Misericrdia infinita do Pai pelo Filho e o Esprito Santo(preservada do pecado demonaco), o seu agir est assinalado pelo amor efectivo Humanidade,especialmente aos pecadores e sofredores (o que vai bem com o humanitarismo do mesmoManuel Martins). Oficialmente, a Igreja Catlica aprovou em 15 de Agosto de 1968 o formulrioda Missa Votiva Santa Maria, Rainha e Me de Misericrdia, mas a invocao Salve, Rainhade Misericrdia encontra-se pela primeira vez no bispo Adhemar de Le Puy (+ 1098), quedestaca a qualidade do olhar materno de Maria, esses vossos olhos misericordiosos a nsvolvei, e conclui com o sentido desta sua Misericrdia: clemente, piedosa, doce, Virgem

    Maria. J o ttulo Me de Misericrdia cr-se que foi dado pela primeira vez a Maria porSanto Odo (+ 942), abade de Cluny: Ego sum Mater misericordiae (Eu sou a Me deMisericrdia), Maria lhe teria dito em sonho. Na Igreja Oriental encontram-se testemunhosainda mais antigos, tendo o padre ou pope Tiago de Sarug (+ 521) aplicado a Mariaexplicitamente o ttulo de Me de Misericrdia (Sermo de transitu), o que considerado pormuitos como a sua primeira atribuio em absoluto.

    O Palcio do Infernoest disposto em trs corpos distintos: a torre sobre o edifcio (comtrs nveis, rs-de-cho, primeiro e segundo andares e a cave, o que constitui uma prefiguraosimblica das Trs Pessoas da Trindade dispostas em Planos igualmente distintos, como seja: atorre para o mais alto, o Cu ou o Mundo do Pai; o edifcio para a Terra santificada pela presena

    do Filho; a cave para o Inferno ouInfera, lugar inferior ou interior, de onde e de si mesmo oEsprito Santo d luz a Criao Universal.

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    Finalmente, tem-se a torre que uma espcie de espada cravada na cunha ou coina do

    Concelho do Barreiro. A espada cravada na rocha ou no cho, simbolismo que pessoalmente jvivifiquei ou realizei algumas vezes, e que levou alguns a vociferarem sobre o que desconhecemabsolutamente, tanto no real como no simblico, ficando-se pela impertinncia beata e simplistacaracterstica primria da ignorncia cabal das profundezas do mundo inicitico.

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    Esse o smbolo tradicional do centro axial dum enclave inicitico (ou sistemageogrfico) marcado pela espada cravada na rocha, figurando o smbolo astrolgico da Terra(um crculo ou um monte coroado por uma cruz) e igualmente a chave da Sabedoria Inicitica,que aqui em Coina e nas redondezas tero sido seus zelosos custdios os primitivos Templrios,a quem So Bernardo de Claraval regulou pela Regra de Cavalaria que lhes deu, onde cavaleirocristo demandava por essa forma dinmica a iniciao espiritual tomado de nimo e coragem nomanuseio destemido das armas sagradas, evocando sempre a proteco de Santa Maria e a forade So Miguel, como prottipos celestes do seu ideal terreno que era fazer a guerra santa, acruzada, cujo sentido maior era o de combater-se a si mesmo, aperfeioar-se humana eespiritualmente debastando as suas imperfeies ou vicissitudes mortais, derrotando os seus

    demnios interiores, e com isso no raro alm de guerreiro tambm era monge, unindo a espada f, a aco das virtudes humanas do bom cavaleiro aos dotes da santidade demandada.

    Vista como se apresenta, tem-se a espada como smbolo axial e polar que se identifica aofiel da balana. Entre os citas, o Eixo do Mundo e a Actividade Celeste eram representados poruma espada fincada no cume de uma montanha. A ideia de que a espada cravada na terra possa

    produzir uma fonte, no deixa de estar relacionada com a actividade produtora do Cu, pelaconotao existente entre o relmpago e a produo da chuva. Como a espada simboliza o fogoem forma de relmpago, este atrado pela gua da terra, e por isto a tmpera da espada expressasempre a unio dos dois elementos fogo e gua, por outras palavras, o perfeito equilbrio doEsprito e da Alma na prpria Matria.

    A espada de fogo designa, segundo Flon (in De Cherubim), o Logos e o Sol. QuandoDeus atravs de So Miguel expulsou Ado do Paraso Terreal, ele colocou diante do Jardim do

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    den os Querubins e a chama da espada flamejante para proteger o caminho da rvore da Vida(Gnesis, 3, 24). Segundo Flon, os dois Querubins representam o movimento do Universo, odeslocamento eterno do conjunto do cu, ou ainda, dos dois hemisfrios. Numa outrainterpretao do mesmo autor, os Querubins representam os dois atributos supremos de Deus: aBondade e o Poder (que se representariam depois em Santa Maria e So Miguel). A espada

    refere-se ao Sol, cujo percurso faz a volta do Universo inteiro, marcado pelos 12 signos no prazode um ano terrestre. A espada relaciona-se tambm razo, que rene a um s tempo os doisatributos de Bondade e de Poder: pela razo, Deus generoso e soberano ao mesmo tempo (DeCherubim, 21-27).

    Nas tradies crists, a espada uma arma nobre que pertence aos cavaleiros cristos. Elamuitas vezes mencionada nas canes de gesta. Rolando, Olivier, Turpin, Carlos Magno, ArturPendragon, Ganelo e o emir Baligant, todos eles possuam espadas individualizadas que tinhamnomes, a guisa de gnios mgicos encadeados s mesmas, como, por exemplo, Joyeuse(Alegre), Durandal, Excalibur ou Cabiburna, Corte, Bantraine, Musaguine, etc. Esses nomes

    provam a individualizao da espada, ademais associada ideia de luminosidade, de claridade,

    pois a lmina qualificada de cintilante.Tambm relacionada ideia de Verbo, de Sabedoria e Revelao, s vezes a espada

    designa a palavra e a eloquncia, pois a lngua, assim como a espada, tem dois gumes.

    Relacionada luz e ao relmpago, a lmina da espada brilha, ela , diziam os antigoscruzados, uma figurao da Cruz de Luz. Na ndia, a espada do sacrificador vdico o raio dodeusIndra, correlacionado ao Fogo Celeste. Em termos de Alquimia, a espada dos filsofos ofogo do cadinho. Ainda na ndia vdica, a espada apareceu associada aos deuses Assurasou daMente mas empunhada pelo Bodhisattvaou Buda de Compaixo, como smbolo do combate

    pela conquista da Sabedoria e da libertao dos desejos inferiores, pois a espada luminosa cortaas trevas da ignorncia e do pecado. Do mesmo modo, a espada do Deus Vishnu (equivalente aoFilho na Trindade crist) de fogo e expressa a Sabedoria pura e a Virtude absoluta. Quandoest dentro da bainha, esta representa a nescidade e a obscuridade, motivo pelo qual jamais um

    profano poderia tirar a espada da bainha, sob pena dos maiores castigos corporais e espirituais.

    Finalmente, a espada o smbolo do estado militar (kshatriya, em snscrito) e da suavirtude, a bravura, bem como da sua funo, o poderio. O poderio tem um duplo aspecto: odestruidor (embora essa destruio possa aplicar-se contra a injustia, a maledicncia e aignorncia, e por causa disso tornar-se positiva) e o construtor, pois estabelece e mantm a paz ea justia. Todos esses smbolos convm literalmente espada, quando ela o emblema do rei eda nobreza. Quando associada balana, ela relaciona-se mais especialmente com com a justiacom a dupla lmina: premeia o justo e castiga o prevaricador.

    Smbolo guerreiro, a espada tambm o smbolo da guerra santa(e no das conquistasarianas, tal como pretendem alguns a respeito da iconografia hindu, a menos que se trate deconquistas espirituais). Antes de tudo, a guerra santa uma guerra interior, e esta serigualmente a significao da espadatrazida pelo Cristo (Mateus, 10,34). Sob o seu duplo aspectodestruidor e criador, ela o smbolo do Verbo, da Palavra. O khitabou orador islmico costumasegurar uma espada de madeira durante a sua predicao; o Apocalipse de So Joo (1, 16)descreve uma espada de dois gumes saindo da boca do Verbo.

    Sendo a espada smbolo do Verbo, j a torre expressa aqui a de Babel, que foi onde aHumanidade comeou a falar as diversas lnguas numa babilnia em que ningum se entendia,

    depois de Deus ter sido desafiado e castigado dessa forma as suas criaturas (Gnesis, 11 :1-9).Babelou confuso tambm a que provoca a viso imediata da Torre do Infernono comum dasgentes, sejam esclarecidas ou simples, para todos os efeitos, desprevenidas e logo surpreendidas.

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    O palcio suportando a torre do rei do lixo, quer um quer outra repartem-se em trsandares, ficando a torre para o Mundo Celeste (Mental, Astral e Etrico) e o palcio para oMundo Terrestre (Agharta, Duat, Badagas), representando a cave do edifcio o ponto deintercesso entre os dois Mundos, ou seja, o Plano Fsico, a partir do qual se sobe ou se desce.Por outro lado, o imvel completo compe-se de sete andares (incluindo a cave) ou divises que

    juntas ao apodo infernoremetem para a tradio oculta da Torre de Babelcuja histria muitodiferente da citao bblica remetendo para os meados da 4. Raa-Me, a Atlante, anterior

    actual 5. Raa-Me Ariana. OPas de Mu, como era ento conhecida a Atlntida, dividia-se emsete reinos, regies ou cantes cada qual com o seu governador prprio, tendo como dirigentemximo um Governo Geral composto de uma trade imperial ou khouhabitando numa OitavaCidade (MuakramouAptalntida), separada das demais por altssimas muralhas Nessa OitavaCidade encontrava-se a representao humana da prpria Divindade na Terra, nas pessoas de

    Mu-Ka, Mu-sis eRa-Muexpressando, respectivamente, os 1., 2. e 3. Logos. A Bblia relataque numa tentativa de escalar o cu(as altssimas muralhas) foi construda a Torre de Babel, eque essa tentativa foi interrompida devido confuso advinda (castigo krmico) dos prpriosconstrutores, os quais passaram a falar lnguas diferentes (que tambm aluso velada fundao de sete Colgios Iniciticos cada qual com Tnica diferente dos outros, e assim mesmoaos sete Ramos Raciais destinados sementeira da Raa futura, cada qual dirigido por um desses

    Colgios, cujo quintolevava de nomeKurat-Avarat).Na verdade, a passagem bblica refere-se ao que ocorreu com a destruio das altssimas

    muralhas da Oitava Cidade. No sentido sentido catico BABEL significa realmente confuso(do hebraico Bavel), por os Nirmanakayas Negrosinfluindo nos Rakshasas da mesma espcie,

    por sua vez inspirando o povo clera e revolta, terem tentado derrubar a as muralhas dareferida Cidade para a destruir. E como no o conseguissem, mataram os dois Tulkus (espciesde ssias) dos Gmeos Espirituais Mu-Ka e Mu-sis, aos quais o seu filho, o sacerdote Ra-Mu,deu cobertura defensiva.

    A partir desse evento o Pas de Mu entrou em decadncia, muito mais quando aFraternidade Negra tentou e conseguiu exercer a sua terrvel influncia sobre o governante da 4.

    cidade atlante, fazendo deste um avatara sinistro liderando o movimento destruidor que varreudo mapa da face da Terra to portentosa civilizao dos finais do Perodo Tercirio e de quasetodo o Quaternrio. Nisto, vale bem o apodo sinistro Torre do Inferno

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    Mas no sentido inicitico, evolucional a Torre de Babelcomo Zigurate(Torre-Templodestinada a culto astroltrico sobretudo solar) expressava a prpria Muakramrepresentativa doCu na Terra, e por isso BAB-EL mais que tudo quer dizer Porta do Cu, tal qual o acadianoBAB-ILU (donde o termoBabilnia),Portal de Deus. O termo acadiano, passado ao sumrio, aocaldaico, ao fencio e ao hebraico, BAB-EL aparece junto a BAAL, este como Senhor,Deus, e

    aquele com a sua Morada. BAAL ou ADON (ADONAI) era um Deus Flico, isto , Gerador daVida na Forma, e por isso representava-se por uma torre elevada ou por um alto monte onde seplantava um santurio de culto solar, ou ento, posteriormente to-s uma cruz ou uma espadacravada no cimo do monte. Quem subir ao monte (o lugar elevado) do Senhor? Quem estarno lugar de seu Kadushu(Sol)? (Salmos, 24-3). BAAL vem a ser assim o SOL, e quando emcerto sentido devorado pelo ardente MOLOCH, o seu irmo sinistro que vive na cripta domundo, ou seja, o prprio Deus SATURNO, BAAL assume ento o nomitativo BAAL-TZEPHON, o Deus da Cripta, representando o SOL DA MEIA-NOITE, o Saturnino ouSubterrneo expressivo da prpria SHAMBALLAH como Sol Central da Terra. Trata-se domesmo BAAL-ADONIS dos Sds ou Mistrios Judaicos pr-babilnicos, que se converteu,graas aoMassorah, no ADONAI, o JEHOVAH posterior com vogais.

    BAAL-ADONIS tambm herana filolgica atlante por se referir a PUSH-ADONIS ouPOSEIDONIS, a Morada de Adonis, o 7. Princpio Espiritual, e que designa a parte docontinente atlante que submergiu 9.564 anos a. C. O nome dessa ilha, a que sobrou do

    primeiro cataclismo que vitimou a Atlntida h cerca de 850.000 anos, foi-nos transmitido porPlato nas suas obras Timeu(ou a Natureza) e Crtias(ou a Atlntida).

    No creio que Manuel Martins Gomes Jnior soubesse de todos esses conhecimentosiniciticos, mas possivelmente alguns dos construtores do seu palcio e torre poderiam possuirfragmentos esparsos dos mesmos, pois que a simbologia do imvel est em conformidade com aTradio Iniciticas das Idades, inclusive o Rio Tejo fazendo a vez de Mar da Atlntida em

    cuja margem se levantou a clebre Torre de Babel, que nesta de Coina servia para o rei do lixosubir ao seu topo para avistar as suas vastas propriedades no Seixal, diz a vox populisempre comexplicao simples e prtica, mas que no parece verossmil.

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    Sem dvida que esta obra foi uma demonstrao da sua grandeza e poder, e nisto poderter querido celebrar a memria do h muito desaparecido castelo de Coina, destrudo durante areconquista crist da margem sul do Tejo aos rabes, acontecimento no qual a Ordem dosTemplrios e a Ordem de Santiago tiveram primazia ainda durante o reinado de D. Sancho I.Como lugar extremo do Concelho do Barreiro, a etimologia de Coina liga-se sua posio

    estratgica. Com efeito, em documentos do sculo XII ao XIV existem registos da grafia cuinha,coinha e coina provindas de cunha, rochedo isolado cuja forma lembra um cunha.Coina tambm a vassourafeita de hastes secas para limpar o trigo do casulo e do palhio, sendo que otransitivo coinarsignifica limpar o trigo com a coina. Possivelmente ser referncia ao palhioque cresce nos sapais junto s margens pouco profundas e lodosas desta parte do Tejocomunicando com a sua bacia chamadaMar da Palha.

    Diversos fillogos do origem latina ao nome desta localidade afirmando derivar degua Boa (que tambm no deixa de ser memria ultramarina da Atlntida): Equabona,Quabona, Quouna, Counae Coina, sendo que o documento mais antigo que a ela se refere o

    Roteiro Militarde Antonino Pio, do princpio do Sculo II d. C., informando que prximo daqui

    viveu o general e estadista romano Quintus Sertorius (126 a. C.73 a. C.). Mrio de S no tomoVI das Grandes Vias da Lusitnia (O itinerrio de Antonino Pio), Lisboa, Sociedade AstriaLda., 1967, descreve:

    () Exacta a posio de Equabona em Coina-a-Velha (no Vale de Coina e junto doCastelo dos Mouros) onde houve uma remota localidade romana. Coina (a Nova) no esteiro doTejo, era o porto martimo de Equabona, que, desenvolvendo-se adentro da era portuguesa, veioa ganhar foros de vila. E foi das mais notveis da Riba Tejo, debaixo da simples designao deCoina.

    Na poca romana a via de Lisboa a Equabona era, tanto quanto possvel, terrestre, e nadeste teor que se marcam as XVI milhas de extenso do cais de Cacilhas a Coina-a-Velha porCova da Piedade, Torre da Marinha (extremidade do esteiro da Amora), Rio do Judeu, Foros doPer, Quinta da Conceio. curso para 13,26 quilmetros, na equivalncia das XVI milhas dotexto.

    Quin tus Sertor ius

    Ainda sobre Equabona ou Aquabona, o poeta e professor do Liceu de vora, AntnioMaria de Oliveira Parreira, num trabalho avulso feito em 13 de Novembro de 1882, escreveu oseguinte:

    () A situao de Equabona completamente incerta, no obstante designar-se

    unanimemente como correspondente a Coina, valendo para isso uma remota semelhana daspalavras e a circunstncia de haver perto um lugar chamado Coina-a-Velha. Alguns escritoreschamam-lheAbonae num Cdice da Biblioteca de Paris pertencente ao sculo X encontra-se a

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    denominao de Aqua Bona. Pode ser que esta povoao romana estivesse situada nesta regioda margem sul do Tejo, apesar de no se lhe poder determinar a situao precisa. O nome Aqua

    Bonas por ironia poderia convir Coina moderna, local apaulado e sezontico, mas poderiapertencer a qualquer povoao que demorasse da falda dos montes de Azeito e que desse onome a todo esse trato de terreno at ao Tejo. Em Coina-a-Velha, lugar de que fala Hubner,

    numa propriedade denominada Casal do Bispo, no cimo de um monte existem as runas de umcastelo que conserva ainda as quatro paredes da torre meridional em perfeita conservao at altura de mais de trs metros, outra torre mais arruinada do lado norte, pedaos de muralhaabatidos e uma cisterna, tudo envolto em altas moitas de carrasco. As paredes da cisterna so deuma argamassa composta de cal, areia e tijolo britado, o que lhes d o aspecto de um s tijolointeirio: s desabou a parte da abbada. Os lanos de muralha abatidos parecem ter sidodemolidos expressamente cunha e no ser a sua runa obra do tempo.

    Joaquim Pedro da Assuno Rasteiro de opinio que o castelo de Coina-a-Velha omesmo de que fala D. Afonso Henriques num documento de 1184 (in castelo caune), fazendodoao dele a Bernardo Mendes, cnego da igreja de Santa Maria de Lisboa, aparecendo tambmno testamento do seu filho D. Sancho I (constructione murorum de couna). AlexandreHerculano, na sua Histria de Portugal, fala na forte linha defensiva dos castelos de Almada,

    Coina, Palmela e Alccer do Sal, dizendo que o conquistador rabe Iacub-el-Mansur em 1191tomou o castelo de Coina arrasando-o, mas em 1195 a regio seria reconquistada por D. Sancho Io qual possivelmente mandou reconstruir a fortaleza, para todo o efeito, desaparecida h muitossculos.

    Em resumo, pode dizer-se que h 800 anos no Casal do Bispo existia uma povoao quese chamava Equabonae tinha um castelo. O povo foi mudando o nome at ficar em Coina. Oterreno que fica entre a Vala Real e a Ribeira dos Canais tambm veio a chamar-se de Coina, ade Azeito comeou a dizer-se de Coina-a-Velha e a outra de Coina-a-Nova, ou s Coina. A

    povoao de Casal do Bispo foi abandonada at que desapareceu, mas nasceu outra mais adiante,com o mesmo nome. No sculo XVIII a povoao de Coina-a-Velhafoi baptizada com o nome

    deAldeia de Nossa Senhora da Piedade, ou sAldeia da Piedade. Isto porque Diogo da Silva deCarvalho, dono da Quinta das Donas, construiu na sua propriedade uma capela privada pondo-asob o Orago de Nossa Senhora da Piedade, e depressa da capela o nome passou para a Aldeia.

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    Memria sumptuosa dos tempos idos resta a Quinta da Torre de Coina, num avanado

    estado de degradao. Se no forem tomadas medidas urgentes, este patrimnio singular doConcelho do Barreiro e nico no Pas tem morte anunciada, mandando para o lixo mais uma

    pgina da Histria de Portugal como coisa de somenos importncia. Deixo o apelo s boasvontades das conscincias da autoridade poltica e da proprietria do imvel, para que seentendam e acudam rpido a salvar e recuperar a quinta em nome do interesse cultural comum.Por enquanto se mantiver de p o palcio de Coina, por certo a memria do rei do lixo

    permanecer viva!