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Teoria Geral do Direito Civil Tratado de Direito Civil Português I Parte Geral Tomo I Capitulo I A cultura do Direito civil 1º Direito civil e parte geral 1. O Direito civil O Direito civil constitui o corpo fundamental do Direito português, na sua globalidade. Formado lenta e continuamente através de um processo complicado, o Direito civil exprime, por excelência, o modo de viver do povo que o criou e que o aplica. O Direito civil exprime, em sínteses inovadoras, o lastro tradicional da nação a que pertença, o labor quotidiano dos seus tribunais, as iniciativas dos seus legisladores e o produto da investigação e do ensino das universidades. A relativa autonomia do Direito em relação às leis mas se acentua no caso do Direito civil, torna-se difícil, perante qualquer “lei” civil, retirar dela um sentido, imediatamente útil. Em consequência do peso histórico-cultural das proposições civis, cada termo pode implicar uma riqueza significativa apreensível, apenas, através de um estudo alargado da matéria. O Direito civil surge, por tudo isto, como um domínio reservado aos iniciados. O Direito civil traduz um conjunto sistematizado de normas e de princípios jurídicos, habitualmente, esse conjunto é autonomizado com recurso à ideia de Direito privado comum : Direito que regula as relações que se estabeleçam entre pessoas iguais e que, a esse nível, trata particularmente os níveis genéricos da regulação. O Direito civil exprime uma área da Ciência do Direito: aquela que resolve casos concretos civis. 2. A experiência portuguesa O Direito – em especial o civil – para além da riqueza histórica advinda de toda a evolução, depende, sempre, de uma aprendizagem especializada. Embora assente em códigos de conduta espontaneamente transmitidos, o Direito requer instancias muito especializadas de ensino e de aplicação. 1

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Menezes Cordeiro - TGDC II

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Teoria Geral do Direito Civil

Tratado de Direito Civil PortuguêsI

Parte GeralTomo I

Capitulo IA cultura do Direito civil

1º Direito civil e parte geral

1. O Direito civil

O Direito civil constitui o corpo fundamental do Direito português, na sua globalidade. Formado lenta e continuamente através de um processo complicado, o Direito civil exprime, por excelência, o modo de viver do povo que o criou e que o aplica.

O Direito civil exprime, em sínteses inovadoras, o lastro tradicional da nação a que pertença, o labor quotidiano dos seus tribunais, as iniciativas dos seus legisladores e o produto da investigação e do ensino das universidades.

A relativa autonomia do Direito em relação às leis mas se acentua no caso do Direito civil, torna-se difícil, perante qualquer “lei” civil, retirar dela um sentido, imediatamente útil. Em consequência do peso histórico-cultural das proposições civis, cada termo pode implicar uma riqueza significativa apreensível, apenas, através de um estudo alargado da matéria.

O Direito civil surge, por tudo isto, como um domínio reservado aos iniciados.

O Direito civil traduz um conjunto sistematizado de normas e de princípios jurídicos, habitualmente, esse conjunto é autonomizado com recurso à ideia de Direito privado comum: Direito que regula as relações que se estabeleçam entre pessoas iguais e que, a esse nível, trata particularmente os níveis genéricos da regulação.

O Direito civil exprime uma área da Ciência do Direito: aquela que resolve casos concretos civis.

2. A experiência portuguesa

O Direito – em especial o civil – para além da riqueza histórica advinda de toda a evolução, depende, sempre, de uma aprendizagem especializada. Embora assente em códigos de conduta espontaneamente transmitidos, o Direito requer instancias muito especializadas de ensino e de aplicação.

Apesar de já assim o ser na Antiguidade, na Idade Media o fenómeno agravou-se, pelo que a Ciência do Direito passou a ser ensinada, apenas e na prática, nas Universidades.

O ensino universitário do Direito tem consequências inabarcaveis em toda a sua conformação, pelo que as universidades tiveram um papel decisivo na evolução do Direito civil.

O Direito civil evolui à medida que a elaboração científica permita novas composições. A Ciência não tem fronteiras. E assim o Direito civil, fenómeno essencialmente próprio de cada nação, torna-se permeável ao acolhimento de leituras, de articulações e mesmo de soluções, experimentadas por outros povos, da mesma ou de diferentes épocas históricas. Técnicas jurídicas mais avançadas, surgidas em qualquer lugar, podem ser adoptadas nas universidades. Com o tempo elas irão influenciar gerações de novos juristas que, depois, lhes darão corpo na sociedade civil.

O Direito civil português tem, hoje, uma feição romano-germânica. É um Direito vivo, reanimado por gerações de magistrados e de estudiosos universitários e, dai, vertido nas mais recentes leis civis, com relevo para o Código Civil em vigor. O labor universitário português, muito permeável a experiências estrangeiras, permitiu que o nosso moderno Direito Civil se aproxime da pureza latina, precisamente com apoios na Ciência Jurídica que mais aperfeiçoou o Direito românico: a alemã.

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Teoria Geral do Direito Civil

3. A parte geral do Direito civil

O Direito civil tem um núcleo que adveio da Historia: o Direito romano. Sobre esse núcleo incidiram séculos de estudo e de aperfeiçoamento.

Ao longo da Historia, não faltaram tentativas de substituir o Direito puramente histórico, de racionalidade por vezes discutível, por um Direito racional: mais lógico e perfeito. Entre essas tentativas, uma houve que teve consequências: a levada a cabo pelos racionalistas ou teóricos do Direito Natural, nos séculos XVII e XVIII.

Os racionalistas intentaram substituir os esquemas tradicionais romanos por classificações e definições lógicas. Daí resultou todo um corpo de matéria, com reflexos acentuados no domínio dos contratos.

O Direito civil é, hoje, um Direito codificado. O Direito civil incluiu-se em grandes diplomas legislativos, elaborados de acordo com coordenadas jurídico-cientificas aprontadas nas universidades: os códigos civis.

Em obediência à tradição jus racionalista, os códigos de tipo germânico apresentam, logo no inicio, uma “parte geral” que antecede o subsequente tratamento civil – as “partes especiais”.

E, na tradição universitária, é por essa aparte geral que se inicia o Direito civil.

2º Direito público e Direito privado

4. As origens

O Direito civil é Direito privado . A contraposição entre o Direito público e o Direito privado remonta às compilações de Justiniano.

A ideia de Direito civil é anterior à de Direito privado e, por maioria de razão, à sua contraposição ao Direito público. O Direito civil é o Direito da cidade e dos cidadãos (cives), surgindo, no final da República romana. Contrapunha-se ao ius gentium ou Direito das gentes.

Por seu turno, o Direito público surgiu não para se contrapor ao Direito civil, mas para designar o Direito de base legal, aplicável a todos. Já o Direito privado seria o proveniente de contratos entre particulares: apenas a estes diria respeito. Ou seja: o próprio Direito privado, quando legislado, seria público.

5. A evolução histórica; posições negativistas

À partida e na linha do fragmento de Ulpiano, o Direito público ocupar-se-ia do Estado, enquanto o Direito privado versaria os interesses dos particulares. Em termos de Direito romano, o Direito público perderia qualquer significado com a queda do Império e o desaparecimento da organização politica clássica. Já o Direito privado subsistiu.

Idade Moderna: surgimento do Direito público, agora com um conteúdo efectivo. Ele agruparia as normas novamente criadas para a consolidação e a disciplina do poder real. Idade Contemporânea: desenvolveram-se as doutrinas do Estado e da Administração Pública. A preocupação dos juristas passaria a ser a de conter o Estado, mantendo uma esfera livre dos cidadãos.

A diferença entre o Direito público e o Direito privado aprofunda-se: técnicas distintas; jurisdições próprias; modos de ser diferentes.

Vertentes que negam a contraposição entre o Direito público e o Direito privado:

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1. Orientações sócio-comunitárias: relevam, no Direito, o papel das organizações intermédias, das colectividades e das associações. Todas elas dariam lugar a regras de actuação irredutíveis ao mundo bipolar do público e do privado: as normas de ambos os sectores estariam interligadas.

2. Orientações normativistas analíticas: vêm dissecar, nas diversas instituições, regras estruturalmente públicas, de acordo com o critério do interesse predominante e da presença de poderes de autoridade. Chegam à conclusão de que, no seio do mais tradicional Direito privado, ocorrem situações publicas: pense-se do Direito da Família. E também o Estado actual de acordo com esquemas privados.

3. Orientações anti-liberais de cariz totalitário : orientações totalitárias de extremos opostos vieram negar a contraposição entre o Direito público e o Direito privado: modo cómodo de suprimir a defesa que este ultimo representa, no tocante aos direitos das pessoas.

Prof. Menezes Cordeiro: a existência de uma contraposição entre o Direito público e o Direito privado é um dado existência. Não pode ser negada. A explicação do fenómeno será, porventura difícil. Mas não se encontre, ai, um pretexto para a fácil saída do negativismo.

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Doutrinas que explicam a contraposição entre o Direito público e o Direito privado:

1. Teorias materiais: fazem assentar a distinção na diversa natureza das próprias regras em si.

Teoria do interesse : ao Direito privado caberiam os interesses dos particulares enquanto, por simetria, o Direito público proporcionaria o interesse público. Por seu turno, o interesse público respeitaria a uma generalidade de pessoas, podendo concretamente exigir o sacrifício dos particulares.

O respeito pelas posições dos particulares é inevitável para a preservação da comunidade: para o interesse público. Por outro lado, a tutela conveniente do interesse público acautela, em ultima instância, a posição de cada cidadão.

Teoria da importância: defende que o Direito público corresponde a um sector mais importante do que o do privado – prevalece sobre ele, havendo concurso.

Baseia-se na ideia de que o interesse público suplanta o privado.

Teoria da subordinação: diz-nos que, no Direito público, as relações jurídicas se pautam pela superioridade de uma das partes sobre a outra; no Direito privado, os participantes estão, pelo contrário, em pé de igualdade – o Direito privado é marcado pela igualdade; no Direito público domina um vector de autoridade.

Teoria da soberania: o Direito público funcionaria como um Direito especial, portador de autoridade, não se esgotando, no entanto, nas normas concretas que comportassem os inerentes poderes: haveria que prever regras de legitimação – que apelam para a soberania – e normas de conflito.

Teoria da tradição: na base de diversas orientações, certas regras vêm a ser considerados de Direito público: outras de Direito privado. Na prática corrente, acolhem-se como de Direito público aquelas que, como tal, já eram consideradas.

2. Teorias do sujeito: dirigem um apelo primordial ao tipo de sujeito da relação ou da situação jurídica.

Teoria do sujeito formal: o Direito público é o Direito do Estado ou, em rigor, também de outros organismo públicos.

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Teoria do sujeito material: haveria, no Direito público, uma actuação do Estado enquanto Estado, isto é, dotado dos seus atributos próprios.

Teoria da ordenação: vê no Direito público, um corpo especial de regras, isto é, um conjunto de normas jurídicas que só legitimam ou obrigam os sujeitos de direito que se determinam exclusivamente através de normas ou de actos do Estado.

Teoria da competência: afirma que, no Direito privado, todos são competentes para agir. Já no Direito público, apenas o poderiam fazer as pessoas indicadas por uma norma de legitimação;

Teoria da Gestão Pública: o Direito público seria a soma das normas relativas a relações nas quais um dos sujeitos, na base de uma situação legitimadora, actuaria como gestos do bem comum;

Teoria do Direito especial: o Direito privado continuaria a base aplicável a todos os sujeitos; o Direito público diferenciar-se-ia pela sua especificidade, funcionando apenas perante determinadas ocorrências ou em face de entidades especialmente legitimadas, por lei, para usar as inerentes prerrogativas.

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8. a especialidade do Direito público; diferenciação sistemática

Todas as relações susceptíveis de se estabelecerem entre os seres humanos, por iniciativa destes, são objecto de Direito privado. A organização da sociedade e os princípios a ela relativos, são privados.

O Direito privado vale por si: adere estritamente às pessoas, não carecendo de se justificar pelos fins que prossiga.

O Direito privado advém da Historia (ius romanum), estando menos dependente do legislador.

O Direito público surge como um direito especial: o Direito que regula a Administração, ou as Finanças Públicas ou quaisquer outros domínio do Estado – Direito especial do Estado.

O Direito público, enquanto Direito especial, atenderá ao denominado interesse público, dando corpo a situações de soberania e de subordinação no seu âmbito de aplicação, prevalece sobre o Direito privado.

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Direito público

Nas situações públicas, as actuações desenrolam-se segundo a

autoridade e a competência: um dos intervenientes pode,

unilateralmente, provocar alterações na esfera jurídica alheia e só lhe cabe actuar quando a norma lho

permita.

Direito privado

Nas situações jurídicas privadas, as actuações pautam-se pela igualdade

e pela liberdade: as pessoas têm iguais poderes e podem agir sempre

que não deparem com uma proibição.

Teoria Geral do Direito Civil

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O Direito civil como Direito comum

10. Generalidades

Perante qualquer situação carecida de tratamento jurídico, na ausência de regras especiais – de Direito público ou outras – quem tenha pretensão de aplicabilidade, há que recorrer ao Direito civil;

A distinção entre o Direito comum e o Direito especial – ou um direito especial – é essencialmente relativa: ambos se afirmam um perante o outro e, na medida em que um exista, consubstancia-se no outro. Pode acontecer que um mesmo complexo normativo seja, em simultâneo, especial e comum: especial em relação a um tecido mais vasto, do qual desinsira um subcomplexo normativo; geral perante áreas mais restritas, que lhe retirem conjunções particularmente adaptadas a necessidades especificas.

O Direito civil é o mais comum e o mais abstracto de todos os ramos do Direito. Constitui a base a partir da qual se vão erguendo todos os demais ramos jurídicos normativos.

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11. Função jurídico-cientifica

A elaboração geral de regras para a realização da internacionalidade normativa, o seu alcance e o seu funcionamento são tarefa do Direito civil.

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12. Aplicação subsidiária no Direito público

O Direito civil, enquanto Direito comum, tem aplicação subsidiária perante os diversos ramos jurídicos.Dependendo da situação lacunosa considerada e da sindicância operada através dos princípios do Direito

público, o Direito civil pode ser chamado a complementar ou a integrar as mais diversas situações.

Fundamento da aplicabilidade subsidiária do Direito civil no campo público:

Tese dos princípios gerais: o Direito civil daria corpo aos princípios gerais do ordenamento. Na falta de normas específicas, eles tenderiam a prevalecer.

Tese da analogia: o Direito civil seria chamado a depor quando regulasse um caso análogo ao carecido de regras públicas.

As teses não se excluem – o recurso subsidiário ao Direito civil passa pela determinação de uma lacuna no Direito público, pelo estabelecimento da analogia e pela ponderação dos princípios.

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13. Papel cultural; importância

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Teoria Geral do Direito Civil

- Direito civil é Direito positivo – traduz normas jurídicas destinadas a facultar soluções de casos concretos surgidos no seu vasto âmbito de aplicação;

- Direito civil é Ciência do Direito – fixa o caminho que vai das fontes às soluções concretas dos problemas, fazendo-o em termos previsíveis, justificáveis e controláveis;

- Direito civil é cultura jurídica – comporta a linguagem, os conceitos, os institutos e as conexões presentes em todas as disciplinas jurídicas e que foram elaboradas no seu seio.

- Direito civil tem um papel mediador, facultando, nas dimensões positiva e científica, a unidade e a identidade de um determinado Direito.

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#4 DO IUS ROMANUM AO PANDECTÍSMO

Ius romanum; as recepções

O Direito civil é Direito romano actual. Características do ius romanum:

o Direito histórico-cultural : surge como paulatina criação da Historia;o Direito existencial : ele manifesta-se na repetição de fenómenos que legitima;o Direito sistematizado : apenas em termos internos (preocupação regular o igual de modo

igual e o diferente de modo diferente). A arrumação externa das suas fontes surge caótica;o Direito Prudencial : impõe-se pela excelência das suas soluções; não deriva da imposição

autoritária de qualquer poder;o Direito problemático

Noção de recepção: adopção, por uma comunidade jurídica, de elementos próprios de outra, presente ou passada, independentemente de situações de dominação politica, económica ou social – não se trata de mera transposição de normas, de um espaço para o outro – a recepção implica antes a aprendizagem, pelos juristas de uma sociedade, da Ciência jurídica própria de outra sociedade.

Recepções do Direito romano:o Recepção do Direito comum medieval

O Direito comum medieval subsequente à fundação das universidades, secs XIII e XIV, implicou uma forte recepção do Direito romano;

Precedido por uma elaboração canonística, o Direito romano medieval passou a dominar a actividade de todos os juristas, sempre formados por universidades.

o Recepção da elaboração humanista Secs XVI e XVII – humanistas dirigem a sua atenção para a Antiguidade; Preocupação de reconstruir o verdadeiro Direito romano clássico (retorno a Platão, à

Antiguidade – aspirações universalistas).

o Recepção da pandectistica alemã Finais do séc. XVIII - intenção de facultar a aplicação actual do Direito romano,

respeitado nas suas formulas, mas enriquecido nos conteúdos, através de novas conexões – retorno às problemáticas da época.

Tópica e Sistemática

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Teoria Geral do Direito Civil

Tópica: técnica de fundamentação das soluções jurídicas. Pressupõe que os problemas, desligados entre si, encontrem uma solução extra científica, essa solução deveria, depois, ser fundamentada de modo a permitir convencer outras pessoas e, designadamente, o adversário numa discussão.

O Direito civil teve origem na tópica. As soluções para os conflitos eram alcançados caso a caso, com base em considerações de oportunidade e de bom senso: não existiam normas gerais e abstractas previas que inculcassem vias de solução.

O decurso do tempo permitiu o apuramento de certas regularidades de solução. Esta regularidade corresponde a uma certa lógica interna e faculta a formulação de regras que tornem previsíveis as soluções para os litígios futuros. Assim, a tópica que levou ao nascimento do Direito civil, foi, a nível interno, substituída por uma sistemática.

Sistemática: propõe-se a resolver os problemas recorrendo a princípios pré-elaborados. Apoia-se na existência prévia de princípios assentes, que comportariam as soluções múltiplas para os problemas possíveis. Colocada a questão restaria, por via dedutiva, obter uma saída justificada pelo modo da sua obtenção.

O Direito não se esgota no sistema interno. Como fenómeno cultural, ele exprime-se e consubstancia-se nas suas exteriorizações. O Direito depende da linguagem e das formulações utilizadas para comunicar e para promover a sua aprendizagem. Tal linguagem e tais formulações dão lugar ao sistema externo – sistema de exposição ou sistema de leccionação.

O Direito romano tinha uma particular configuração – um sistema interno evoluído, mas uma ausência de um sistema externo ou de exposição. A aprendizagem e a exteriorização do Direito seguiam, então. Moldes empíricos. Na forma, o Direito romano era tópico e, por ventura. No seu desenvolvimento, em substância, surgira a sistemática mínima necessária para se falar em Ciência Jurídica.

A evolução posterior viria a permitir, mais tarde, o estabelecimento de um sistema externo – a exteriorização do Direito passou, também, a seguir moldes racionais, concatenados entre si. Note-se que a separação entre os dois sistemas, externo e interno, é uma operação meramente artificial.

Importância do sistema externo o sistema externo não é irrelevante para o interno, para a sua própria materialidade das soluções a alcançar. O simples facto de se seguir, na exposição da matéria, uma certa ordenação, permite, de imediato, localizar lacunas, detectar desvios, corrigir assimetrias.

As alterações introduzidas no sistema externo implicam e traduzem modificações de fundo, capazes de promover novos tipos de soluções concretas.

Apreendido através de quadros linguístico-culturais, o Direito não mais se pode separar deles: tais quadros são o Direito e o pensamento jurídico.

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Teoria evolutiva dos sistemas: da jurisprudência elegante à pandectistica

Teoria evolutiva dos sistemas: intenta explicar o essencial dos avanços jurídico-cientificos dos últimos séculos através da adopção sucessiva de modeles sistemáticos diferentes na comunicação e na explicação do Direito.

SISTEMÁTICA EMPIRICA, SISTEMATICA PERIFÉRICA OU PRIMEIRA SISTEMÁTICA

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O Direito encontrava-se nas compilações romanas – Corpus Iuris Civilis e nos Digesta – matérias distribuíam-se ao sabor de clivagens histórico-culturais, sem uma preocupação científica, de tal forma que eram frequentes as repetições e as contradições; metodologia marcadamente empírica.

Humanismo Jurídico – séc. XVI – doutrina que pressupunha um pensamento centrado no Homem e modelado pela Antiguidade, sem mediações. Apesar de ter surgido em Itália, o humanismo jurídico não daria, aí, frutos intensos. A sua eficácia mais duradoura fez-se sentir em França - Jurisprudência elegante.

A matéria dispersa pelo Corpus Iuris Civilis, através de cientistas marcantes como Cujacius e Danellus, foi reagrupada já não ao sabor de meros acasos histórico-culturais, mas de acordo com preocupações globais. A ordenação processou-se reunindo os temas de acordo com certas semelhanças exteriores por eles aparentados.

Nasce a sistemática externas a sistemática humanista assumia uma feição empírica e periférica: ela reagrupada os temas em função de aludidos traços superiores.

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SISTEMÁTICA JUSRACIONALISTA, SISTEMÁTICA CENTRAL OU SEGUNDA SISTEMÁTICA

Insuficiências da primeira sistemática;

Revolução cartesiana – Decartes explica a superioridade do conhecimento unitário que, desenvolvido a partir de uma base bem determinada, seria conduzido por um só critério.

A metodologia cartesiana é transposta para as ciências humanas por Hobbes – surge a nova sistemática ocidental.

Segundo Hobbes, os diversos elementos como a sociedade, o Estado e o Poder orientam-se através de postulados fundamentais: a sobrevivência dos homens, a guerra como estado natural reinante entre eles, a insegurança daí derivada, a necessidade de a superar com recurso ao Estado e à Sociedade, o sacrifício da liberdade que isso implica, etc.

Principais juristas da segunda sistemática: - Pufendorf (Alemanha);- Domat (França);- Pothier (França.

A sistemática central é irrealista. Na verdade, não se pode esquecer a essência histórico-cultural do Direito, deduzindo-o, por inteiro, do cadinho de princípios gerais arbitrariamente fixados – impõe-se uma nova síntese, que foi levada a cabo por SAVIGNY.

SISTEMÁTICA INTEGRADA OU TERCEIRA SISTEMÁTICA

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Promovendo a autonomização do método jurídico, Savigny caracteriza a Ciência do Direito como:

o Filosófica – A Ciência do Direito deve na sua conexão interior, produzir uma unidade;o Histórica – a Ciência do Direito limita o domínio do arbítrio de cada um através da Historia.

Savigny propõe uma formação de conceitos através da contemplação intuitiva das instituições. Estas, dados pelo “espírito do povo” eram, no fundo, Direito romano.

Savigny recebeu assim, a herança jus racionalista: conserva uma articulação logicista do sistema, recorre à dedução e utiliza estruturas derivadas de postulados centrais.

Mas acolheu também a herança romanista da jurisprudência elegante: admite elementos jurídicos pré-dados, anteriores a qualquer sistema e recebidos por via histórico-cultural, através do Direito romano.

Ocorre uma verdadeira síntese: os princípios escolhidos para o núcleo do sistema não se obtêm de modo arbitrário, antes derivando da história e da cultura; os elementos existentes na periferia não têm mera origem empírica, antes se ordenando e complementando em função dos princípios gerais presentes no centro.

- Junção entre cultura e racionalidade ou sistema interno e sistema externos – Sistemática integrada;- Esta sistemática integrada foi utilizada ao longo do séc. XIX no espaço jurídico alemão, em trabalhos desenvolvidos sobre os Digesta ou Pandekten – por isso conhece-se também por Pandectistica.

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Tradicionalmente, a realização do Direito era feita com base em dois postulados: o Compartimentação das operações da realização do Direito (várias operações isoladas);o Natureza cognitiva do papel do intérprete – limita-se a conhecer as normas.

Actualmente, a realização do Direito é feita com base nos dois postulados seguintes: o Realização unitária do Direito: o intérprete/aplicador realiza o direito num grande conjunto;o Natureza volitivo-cognitivo da realização do Direito – a solução para o problema é sempre

uma decisão humana. (ex.: no preenchimento de lacunas, conceitos indeterminados, nas normas contraditórias, nas normas injustas…)

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#5 Codificações civis

O Código de Napoleão – 1804 (II Sistemática)

1ª Codificação moderna – Código civil francês ou código de Napoleão; Surge na sequencia de um trabalho intenso realizado nos séc. XVII e XVIII, levado a cabo por

juristas como CUJACIUS, DONELLUS, DOMAT e POTHIER, e que ficou conhecido como Pré-codificação francesa;

A 1ª codificação traduz apenas o ponto de chegada de uma evolução complexa, iniciada com os comentaristas, renovada pelo humanismo e pela primeira sistemática e inflectida pelo jusracionalismo – não existiram evoluções no código, pelo contrário: o Código de Napoleão pôs cobro a múltiplas inovações introduzidas durante o período revolucionário, adoptando soluções anteriores;

O Código de Napoleão veio acusar o influxo jusracionalista, apresentando-se como um produto terminal da segunda sistemática. A sua sistematização é prova disso:

Livro I – Das PessoasLivro II – Dos bens e das diversas modificações da propriedade

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Livro III – Das diferentes formas por que se adquire a propriedade

Toda a matéria se desenvolve a partir de ideias centrais simples e claras: a pessoa, enquanto individuo, carece de bens que movimenta para sobreviver e se expandir.

O código de Napoleão surgiu como um momento legislativo de primeira grandeza, ele impôs-se para além das suas fronteiras naturais, seja pela fora das armas napoleónicas, seja por livre adopção num fenómeno de recepção dos interessados.

Nuns casos ele foi simplesmente traduzido e posto em vigor. Noutros ele serviu de modelo inspirador a códigos dotados de grau variável de originalidade. Hoje o velho código civil continua em vigor, embora muito alterado.

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O Código civil alemão – 1896-1900 (III Sistemática)

Surge nos finais do séc. XIX, o Código civil alemão – BGB – assente em dados científicos mais perfeitos e avançados. Corresponde ao ponto terminal de uma intensa actividade jurídico-cientifica que se prolongou por todo o séc. XIX.

Juristas que, em destaque, prepararam ou elaboraram o BGB o Thibouto Bismarcko Windscheid

Como qualquer codificação, o BGB traduz uma recolha do já existente e não uma criação de novidades; sintetiza a Ciência Jurídica do séc. XIX, no que ela tinha de mais evoluído.

Na linha da Pandectistica, o BGB apresenta uma sistematização em cinco livros:

Livro I – Parte GeralLivro II – Direito das relações obrigacionaisLivro III – Direito das coisasLivro IV – Direito da famíliaLivro V – Direito das sucessoes

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As codificações tardias

Codificações tardias – códigos civis surgidos depôs do BGB – códigos do séc. XX.

Características das codificações tardias:

o São fruto da III Sistemática ;o Correspondem à universalização do Direito e da sua Ciência (tiveram, na sua base, estudos

científicos alargados, que não se detiveram em fronteiras nacionais ou linguísticas, eles correspondem a uma universalização do Direito e da sua Ciência, passando a actuar a uma escala europeia);

o Têm conta as criticas sectoriais feitas à primeira codificação (Código de Napoleão) e à segunda codificação (BGB), evitando erros de concepção e consagrando certos institutos novos obtidos já depois delas;

o Apresentam uma identidade própria, motivada pelas particularidades dos espaços em que surgiram.

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Classificação Germânica

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Código civil suíço – Eugen Hober – não tem parte geral Código civil Grego – 1930 – tem parte geral Código civil Italiano – 1942 – unificação entre o Direito civil e o Direito comercial.

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Recodificações dos finais do séc. XX, inícios do séc. XXI

Nos finais do séc. XX, inícios do séc. XXI, surgem três importantes códigos civis:o Código civil do Quebeque (1991)o Código civil da Holanda (1992)o Código civil do Brasil (2002)

+ Reforma do Código civil alemão de 2001/2002

Estas codificações são consideradas “recodificações” na medida em que assentam, com técnicas similares, em matéria já codificada e por codificar.

Características comum destas recodificações:

- Apoiam-se na terceira sistemática. Não precedida pela puta e simples recepção da pandectistitca, mas alcançada através da evolução integrada do estilo napoleónico;- Preocupação envolvendo, acolhendo no Código civil ora da matéria comercial (Brasil), ora da matéria do consumo (Alemanha) ora de ambas (Quebeque e Holanda)

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#6 Classificação Germânica e Parte Geral

A chamada classificação germânica do Direito civil é imputada a HUGO, HEISE e SAVIGNY:o Parte geralo Direito das obrigaçõeso Direitos reaiso Direito da famíliao Direito das sucessões

A classificação germânica do Código civil obteve um acolhimento total no civilismo português, a sua recepção não foi obra do acaso, antes tendo acompanhado os progressos do Direito civil nacional ao longo do séc. XIX.

Parte Geral

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A parte geral tem o papel de abarcar em si tudo o que é comum às “partes especiais”.

Inconvenientes da parte geral :o Por vezes omite aspectos que fazem parte da “parte geral”;o Por vezes duplica aspectos já tratados nas “partes especiais”;o Por vezes separa as matérias entre a “parte geral” e as “partes especiais”;o Inconvenientes didácticos:

As permanentes abstracções, a necessidade de antecipar matérias “especiais”, sob pena de ininteligibilidade do discurso e a própria fatalidade de formar um desenvolvimento incompleto tornam a parte geral pouco acolhedora para o estudo e de difícil ensino.

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#7 Os códigos civis portugueses

O Código de Seabra – 1867

Necessidade de elaboração de uma codificação que solucionasse a multiplicidade das fontes e facultasse a ordenação das diversas normas, que já se sentia no séc. XVII e se intensificou no final do séc. XVIII – várias tentativas de codificação que não surtiram efeito.

É confiada então essa tarefa codificadora a António Luiz de Seabra (1789-1895). O diploma é promulgado pelo rei a 1 de Junho de 1867.

O Código de Seabra assenta na tradição românica, trave-mestra do civilismo português, por isso os institutos nele consagrados são, em grande medida, os já prenunciados pelo Direito anterior.

Assenta também no pensamento jusracionalista, moldado, teoreticamente, na filosofia de Krause e, na forma jurídica, apoiado no texto napoleónico. A presença desta linha de influencia denota-se, sobretudo, ao nível da sua sistemática da qual resulta uma clara preocupação racionalista – “o mais racionalmente elaborado dos actuais” [códigos].

Como qualquer codificação, o Código de Seabra traduzia a elaboração científica que o antecedeu, com relevo para os grandes nomes da pré-codificação: Corrêa Telles e Coelho da Rocha. No entanto, na sua base, teve o labor de um único jurista – Seabra.

Em rigor, o velho diploma de 1867 poderia ter sido mantido até aos nossos dias: teria mesmo prevenido um certo positivismo de teor exegético a que se regressou após 1966.

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O Código civil de Vaz Serra

Contexto: recepção, nos meios universitários, a partir de 1900, da doutrina alemã, ou seja, da terceira sistemática.

A difusão do pensamento sistemático integrado foi progressiva e definitiva. O Direito português operou uma transposição do grupo de Direitos de estilo napoleónico para o dos Direitos de tipo germânico.

Através do ensino ministrado nas Faculdades, na direcção iniciada por Guilherme Moreira e intensificada por cientistas como Manuel de Andrade e Vaz Serra (Coimbra) e Paulo Cunha, Galvão Telles e Gomes da Silva (Lisboa), a Ciência jurídica evoluída a partir da pandectistica, veio a ser compartilhada por todos os juristas portugueses, formados pelas suas universidades.

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Teoria Geral do Direito Civil

A substituição do Código de Seabra por um novo Codigo de feição germânica teve um impulso inicial dado por Vaz Serra (1903-1989) que foi, seguramente, a pessoa que mais contribuiu para o conjunto valendo a designação do código como Código Vaz Serra.

Criticas ao Código de Seabra que precederam ao Código Vaz Serra:

Tendo 80 anos de vigência, provocara numerosas dúvidas que convinha esclarecer; Estava já alterado por diplomas extravagantes, perdendo em grande parte a característica

de verdadeiro Código; Não regulava institutos ou figuras relevantes necessários; Era de um individualismo extremo.

[…] Procedeu-se, então à elaboração de um projecto de revisão geral do código civil. As orientações

fundamentais que deviam enformar o novo código foram firmadas logo de inicio pela comissão de reforma, constituída por:

o Vaz Serra (Presidente)o Manuel de Andradeo Pires Limao Paulo Cunha

Adopção de uma sistematização germânicao Parte geral – Manuel de Andradeo Direito das Obrigações – Vaz Serrao Direito das Coisas – Pires de Limao Direito da Família – Pires de Limao Direito das Sucessores – Paulo Cunha

Colaboradores de Vaz Serra:o Ferrer Correia: domínio do Direito Internacional Privado, das associações e das

sociedades;o Rui de Alarcão: domínio do negocio jurídicoo Galvão Telles: incumbido dos contratos em especial e no domínio das sucessores;o Pinto Coelho: certas áreas do Direito das coisas;o Gomes da Silva: domínio do Direito da Família.

Trabalhos destes cientistas alterados por Pires de Lima e Antunes Varela.

Aspectos positivos do Código Vaz Serra: consagrou, ao nível das fontes e no espaço português, o pensamento da sistemática integrada, com todas as suas consequências, nos planos científicos e culturais. Agitou, ainda, a doutrina nacional, facultando-lhe um salto qualitativo, acompanhado da consagração definitiva de vários institutos.

Apreciação critica do Código Vaz Serra:

o Não conseguiu obter uma unidade cabal – assimetrias (ex.: elevado nível alcançado no Direito Internacional e contraste com o baixo nível alcançado em direitos reais)

o Nasceu, cientificamente, bastante antiquado, correspondendo ao estado da doutrina alemã dos anos vinte e trinta;

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Teoria Geral do Direito Civil

o Aceitou a classificação germânica, insensível às críticas que há muito lhe eram dirigidas (manutenção de uma parte geral);

o Mostrou-se pouco de acordo com as preocupações do seu tempo em áreas sensíveis como a da família e da mulher;

o Abusou de definições e de tomadas de posição doutrinais.

Aspecto positivo: consagração intensa de conceitos indeterminados, que tem permitido – e permitirão, a descoberta de novas e mais adequadas soluções civis.

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#8 O Direito Civil e as concepções globais

Do naturalismo à analise económica

1. O pós-guerra de 1945 foi caracterizado pelo regresso ao jus naturalismo e pela tentativa de encontrar referencias materiais – procurou-se exorcizar os excessos perpetuados pelo nazismo e pelo estalinismo.

2. Recuperação do pensamento tópico-problemático

3. Influxo analítico, de tipo utilitarista, proveniente de Inglaterra e dos Estados Unidos

Todas estas orientações não tiveram êxito porque nos lograram influenciar a solução dos casos concretos, consumando antes o divórcio que se instalou entre a Ciência do Direito e a metodologia jurídica – Período de irrealismo metodológico.

4. Quebra do irrealismo metodológico: no ultimo quartel do séc. XX novo pensamento sistemático. Os problemas e as soluções podiam ser perspectivadas através dum horizonte duplamente amplo: em dimensão histórico-valorativa e em dimensão interdisciplinar.

5. Guerra-fria (1945-1989) : levou, a prazo, à difusão de uma postura defensiva, pouco motivada, marcada pelo relativismo e pelo agnosticismo.

O termo da guerra fria e o colapso do comunismo soviético deixaram lacunas por preencher, o pensamento sistemático, só por si, nada pode resolver – oferece uma ferramenta capaz de estabelecer partes entre o método e a dogmática, mas não dá, por si, referencias materiais.

O positivismo relativista virou-se para as constituições – influxo dos direitos fundamentais e multiplicação das inconstitucionalidades. Mas essa via não facultava um sistema de valores

Surge uma ética ingénua, baseada no sentimento moral mais imediato.

6. Análise económica do Direito (Law and Economics): ultimo acontecimento metodológico do séc. XX. Com raízes em COASE e particularmente divulgada por Richard A. Posner, a análise económica do Direito explica que a conduta humana é, no essencial das suas opções, enformada por postulados de ordem económica (pensamento materialista norte-americano)

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Teoria Geral do Direito Civil

Na celebração de um contrato, no exercício das faculdades de proprietário ou na decisão que pode levar à prática de um crime, o agente determina-se em função da maior utilidade que possa retirar desses bens escassos.

A análise económica pretende ter uma efectiva projecção dogmática. Ocupa-se dos problemas e das soluções: não apenas de grandes princípios. Parece, no entanto, ter já passado de moda, perdendo o impacto inicial.

Criticas à análise económica do Direito: Desconsideração pela especificidade da Ciência do Direito; Assume um papel destrutivo dos esquemas existente, sem estar à altura de os substituir; Prejudica os mais fracos adoptando atitudes associais, em nome de putos esquemas

económicos; Põe em causa a cultura jurídica.

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Irracionalismo, ética e predomínio da cultura

Aguarda-se uma multiplicação de problemas climatéricos, ambientais, demográficos e sanitários. Apesar de prevenidos, os Governos do Ocidente não se preocupam a democracia, dobrada pelo egoísmo dos cidadãos que apenas pensam no curto prazo, demora na reacção.

A febre do imediato tem provocado, em vários níveis e com reflexos no Direito, opções irracionais – indiferença ambientar, terrorismo suicida, guerras sem projectos subsequentes e as opções voluntaristas e impensadas.

Processo do desinteresse e do nihilismo, por todo o Ocidente e, em especial, pela Europa.

A pesquisa genética e o tema complexo da dignidade humana e do respeito pela vida apelam à isenção e à representatividade das figurações éticas.

Em suma: haverá que reconstruir um edifício de referências a partir de posições cuja bondade seja pacífica e que se teça em torno da dignidade humana e dos valores naturais e ambientais.

Francis Fukuyama – trabalho sobre o papel da confiança e as estruturas sociais que a ela conduzem:

o Sociedades em que dominem relações de confiança permitem a estruturação de entidades intermédias consistentes, base de grandes empresas produtivas (como a sociedade norte-americana tradicional)

o Sociedades pautadas pela desconfiança, as relações são lassas, mal ultrapassando a família nuclear (como as sociedades italiana, francesas, portuguesa)

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Os problemas actuais

A civilística actual procura solucionar três questões fundamentais:

1. A efectiva assunção da Ciência do Direito

A influencia real do discurso metodológico nos níveis aplicativos no Direito deteve-se, a partir dos anos 30 do séc. XX – segue-se um período de letargia, durante o qual os desenvolvimentos metodológicos não tiveram influxo visível nas soluções concretas e, logo, na Ciência do Direito.

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Teoria Geral do Direito Civil

Inconvenientes:

- Na falta de uma Ciência do Direito efectiva, o discurso jurídico mantém-se no nível da jurisprudência dos interesses, havendo mesmo regressões;- Apenas a Ciência do Direito permite justificar e controlar as decisões, na sua falta ou perante a sua insuficiência, manifesta-se o sentimento, o empirismo, o arbítrio ou a actuação de cripto-fundamentação.

Conclusão: só a Ciência d o Direito faculta o desenvolvimento de soluções concretas, em consonância com os níveis culturais da actualidade; só essa mesma Ciência permite, pelo combate ao empirismo, ao arbítrio ou ao sentimento, afirmar o Direito, enquanto tal.

2. A adaptação dos códigos a situações novas

As codificações representam um ponto de chegada: elas exprimem os aspectos essenciais em que se atingiu relativo consenso, dentro dos quadros jurídico-cientificos que presidiram à sua elaboração. Uma vez em vigor, elas deparam-se de imediato com novas realidades.

Cabe aos codificadores evitar definições ou tomadas de posição doutrinárias e disseminar, com cautelas bastantes, conceitos indeterminados que facultem áreas de crescimento futuro.

Meios disponíveis à Ciência do Direito para concretizar esta adaptação:-interpretação actualista;-conceitos indeterminados;-lacunas ocultas.

3. Aprofundamento aperfeiçoado dos níveis interno e externo do sistema

As soluções paradoxais, injustas ou contraditórias são sempre uma constante no Direito, obra humana – consequente necessidade de aperfeiçoamento do sistema interno e, também, do sistema externo, dele indissociável.

As melhorias na ordenação, na exposição e na comunicação do Direito facultam, directa ou indirectamente progressos relevantes no conhecimento do sistema interno e na realização de todo o Dto.

Internacionalização da Ciência do Dto : através de fenómenos de recepção e de transferência culturais, o Dto pode ser apreendido e divulgado para além das fronteiras politicas e linguísticas – formação de grandes espaços jurídico-cientificos.

Mobilidade da Terceira Sistemática: traduzindo apenas um modelo de interaccão centro/periferia, a sistemática integrada pode evoluir nos seus princípios básicos, sendo ainda capaz de, em qualquer momento, aceitar problemas inteiramente novos, buscando para eles soluções.

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Teoria Geral do Direito Civil

#9 A REALIZAÇÃO DO DTO

Interpretação e aplicação

A leitura conceptual do processo de realização do Dto assenta em duas ideias fundamentais:

1. Compartimentação da realização do Dto – estrita separação entre: Feitura das leis (legislador); Interpretação (interprete-aplicador); Aplicação (interprete-aplicador) – puramente automática perante a norma obtida pela

interpretação.

2. Natureza cognitiva do papel do papel do intérprete-aplicador: juiz não cria nada, apenas executa a mensagem legislativa, inteligindo-a e pondo-a em prática.

Clara insuficiência para resolver casos concretos; leitura puramente positivista = não reage a fenómenos como os de conceitos indeterminados.

Leitura actual do processo de realização do Dto

1. É uma operação unitária: o interprete-aplicador realiza, em conjunto e de modo diferenciado, todas as operações que constituem o processo de realização do Dto (localização da fonte, extracção da norma, integração de possível lacuna, etc)

Quando procura a fonte, ele já tem em mente quais os factos relevantes e qual a sua “qualificação”. A busca, pela interpretação, da norma aplicável é sindicada pela solução concreta pré-apurada.

2. É uma operação alargada ao pré-entendimento e à ponderação das consequências (sinépica)

Pré-entendimento: conjunto de representações que permitem ao interprete-aplicador reconhecer o problema e apontar, de imediato, soluções provisórias que irá depois aperfeiçoar na espiral da realização do Dto. O pré-entendimento engloba os conhecimentos científicos do interprete-aplicador, a sua experiência, os casos análogos ou semelhantes que ele já tenha enfrentado, as impressões subjectivas, as valorações, as bitolas de decisão, com inclusão de elementos políticos, morais e religiosos.

A capacidade de lidar com o processo de realização do Dto como um todo unitário depende, justamente do pré-entendimento.

Sinépica: o intérprete aplicador deve projectar as consequências do que vai decidir, pode suceder que uma decisão, aparentemente correcta, tenha consequências contrárias ao projecto normativo. Ao interprete-aplicador cabe a capacidade de “pensar em consequências”.

3. é uma operação de tipo cognitivo-volitivo: uma solução jurídica não é automática: envolve, sempre, uma decisão humana, num mar de elementos que enformam a decisão dum problema complexo, nenhuma matemática permite graduar argumentos e aprontar soluções.

Apenas uma vontade livre, ponderada, a matéria gerida pelo pré-entendimento e pela Ciência, poderá apontar uma solução, decidindo-a. O processo não é arbitrário, mas o passo final é uma decisão humana.

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Teoria Geral do Direito Civil

O papel da linguagem

Os seres humanos são obrigados, pelas suas limitações, a operar através da linguagem, isto é, através de figurações fonéticas com correspondência escrita e das subsequentes combinações estudadas pela gramática e pela semântica. Um conceito jurídico é, assim, uma fórmula linguisticamente condicionada.

1. Os conceitos são viabilizados ou potenciados pela linguagem;

2. As justificações podem ser meramente linguísticas: perante um problema, pode-se encontrar uma efectiva solução material que o resolva, mas pode-se tudo deixar em aberto, recorrendo ao subterfúgio de uma (simples) composição verbal.

Ex. de solução linguística: art. 9º/1 CC remete para um ambíguo “pensamento legislativo”, não querendo optar entre uma orientação objectivista (pensamento da lei) e uma orientação subjectivista (pensamento do legislador), tudo ficou resolvido apenas na linguagem.

3. É possível um discurso que não se reporte à realidade em si, mas, apenas, às locuções que a descrevem – metadiscurso: por exemplo, uma discussão sobre “justiça” poderá fixar a complexa realidade subjacente ou centrar-se, apenas, sobre o termo “justiça”. Teremos então um metadiscurso, fonte de pseudo-soluções, todas elas meramente vocabulares.

A dogmática integrada

A Ciência do Dto é a ciência das soluções dos casos concretos. A dogmática jurídica exprime a Ciência do Dto em acção;

O Dto civil é cultura jurídica. A decisão correcta deve integrar-se no seu tempo e no meio geográfico, humano e social em que se vai tornar efectiva;

A dogmática é verticalmente integrada: não há procedimentos isolados. Uma ponderação abstracta não é Dto – a integração é necessária, abrangendo, através de esquemas apurados no domínio da realização do Dto, todas as dimensões culturais relevantes;

A dogmática é horizontalmente integrada: aos diversos problemas não se aplica uma norma isolada; é smp o Dto, no seu conjunto, que é chamado a intervir.

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Teoria Geral do Direito Civil

CAPITULO IV – O DIREITO CIVIL PORTUGUES VIGENTE

#10O Dto comercial

Actividade empresarialHistoricamente verificou-se a sua autonomia pelas exigências da actividade mercantil. Abrange áreas da

actividade económica como a Banca, Industriais, etc. ainda que não autonomizado em termos legislativos é, quanto às suas soluções, princípios e valores, dto civil.

#11 O Dto do trabalho

Relação individual/colectiva de trabalho. Condições de trabalho. É também Dto civil cuja autonomização se justifica por razões pedagógicas.

#12O Dto do consumo

Defesa do consumidor (destinatário final do circuito económico. Inclui dever geral de informação e dto ao arrependimento. É também Dto civil.

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CAPITULO V

SITUAÇÕES JURIDICAS

#20Noção e modalidades

Noção

Situação jurídica: situação humana (logo, social) valorada pelo Dto. Mais precisamente, a situação jurídica é o produto de uma decisão apropriada, correspondendo ao acto e ao efeito de realizar o Dto, que resolve um caso concreto.

A situação jurídica surge como o culminar de todo o processo de realização do Dto, integrando a localização das fontes, a interpretação e a aplicação.

Modalidades de situações jurídicas

o Situações simples: compostas por um único elemento. Quando este é retirado do seu conteúdo, tornam-se ininteligíveis.

Ex.: pretensão (poder de exigir a outrem um comportamento).o Situações complexas: compostas por vários elementos. Do seu conteúdo podem ser retiradas

realidades que, noutras circunstâncias, se arvorem em situações jurídicas autónomas.Ex.: dto de propriedade sobre um bem imóvel: engloba faculdades de construir;

faculdades de cultivar; faculdades de vender fazem sentido autonomizadas, podendo consubstancias dtos autónomos.

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Teoria Geral do Direito Civil

o Situações unisubjectivas: postula apenas um sujeito, isto é, uma única pessoa.Ex.: dever de conduta

o Situações plurisubjectivas: assenta em mais de uma pessoa.Ex.: obrigação completa (art. 397º CC) – credor e devedor Co-propriedade (art. 1403º CC) – vários proprietários

o Situações absolutas: existe por si, sem dependência de uma outra situação de sinal contrários. A situação absoluta não postula qualquer relação jurídica.

Ex.: dto de propriedade (art. 1305º CC): esgota-se numa pessoa e na coisa.o Situações relativas: consubstancia-se na medida em que, frente a ela, se equacione uma

outra, de teor inverso. A situação relativa “relaciona duas pessoas”: ela dá lugar a uma relação jurídica.

Ex.: dto de crédito (art. 397º CC): credor tem um dto de cobrar 100 porque o devedor lhe deve 100.

Prof. Menezes Cordeiro: a relação jurídica é apenas uma das várias situações jurídicas possíveis, pretender reduzir toda a realidade a relações jurídicas é irrealista e provoca distorções contínuas.

o Situações patrimoniais: tem conteúdo económico, podendo ser avaliadas em dinheiro ≠ situações regidas pelo Dto patrimonial (há situações sem conteúdo económico que são objecto de regulação patrimonial).

o Situações não patrimoniais: não têm conteúdo económico e não são passíveis, à partida, de terem uma equivalência monetária.

o Situações activas: colocam determinados efeitos sob a vontade do próprio sujeito a quem ela assista.Analiticamente, a situação activa deriva de permissões normativas ou de normas que confiram poderes.

o Situações passivas: colocam determinados efeitos na dependência de uma pessoa que não o sujeito.A situação passiva é obra de normas proibitivas ou impositivas.

As situações activas e passivas podem combinar-se entre si em medidas diversas. Ex.: a propriedade é essencialmente activa, mas no seu seio identificam-se várias posições passivas, como por ex., as adstrições de vizinhança e proibições várias de Dto público.

o Situações analíticas : obtém-se através da redução, aos factores complementares, das realidades jurídicas, apresentam-se como formular lógicas.

Ex.: poder de disposição; noção de dever.Apresentam-se como excessivamente lógicas: na sua preocupação de retratar certas conjunções idealizadas, elas simplificam, por vezes em termos redutores, aquilo que eram suposto traduzir.

o Situações compreensivas: derivam da consideração autónoma, historicamente consagrada, das mesmas realidades, abrangendo múltiplos elementos. Traduzem-se em esquemas culturais.

Ex.: Dto de propriedade (art.1305º CC) – engloba múltiplos poderes e deveres, ou seja, várias situações analíticas.

Noção de dto subjectivo.

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Teoria Geral do Direito Civil

#21O Conceito de Dto Subjectivo

O dto subjectivo corresponde a uma situação jurídica compreensiva: dado pela Historia e pela cultura do Dto, ele tem uma presença efectiva nos planos teórico e prático, englobando diversas realidades menores.

Segundo Savigny

Dto subjectivo seria um poder da vontade, tal poder deveria ser entendido como reconhecimento, ao sujeito titular do dto de um âmbito da liberdade, independentemente de qualquer vontade estranha.

O dto subjectivo não era, de forma alguma, um mero expediente técnico, destinado a exprimir soluções pontuais. Antes se assumia como um vector significativo-ideológico, destinado a melhor firmar as concepções liberais, protegendo-as contra investidas exteriores.

Segundo Rudolf von Jhering

Foi retirada à concepção de Savigny o seu nível significativo-ideológico, tendo o dto subjectivo sido remetido para o rol dos meros expedientes técnicos.

Critica à “teoria da vontade” de Savigny: um conceito de dto subjectivo assente na vontade humana postula, por definição, que em todo o dto ela esteja presente. Ora as diversas ordens jurídicas comportam dtos carecidos de qualquer vontade, e ainda a presença de dtos subjectivos em pessoas totalmente privadas de vontade (bebes, dementes) e em pessoas que, por ignorarem a existência dos dtos em causa, não podem assumir uma qualquer vontade que lhe sirva de suporte (ex.: por sorteio).

Deste modo, “não é a vontade ou o poder que formam a substância do dto, mas sim o aproveitamento”, “o conceito de dto (subjectivo) respeita à segurança jurídica do aproveitamento dos bens; dtos são interesses juridicamente protegidos”.

Interesse – 2 acepções:

o Interesse em sentido objectivo : o interesse traduz a virtualidade que determinados bens têm para a satisfação de certos necessidades.

o Interesse em sentido subjectivo : o interesse exprime uma relação de apetência que se estabelece entre o sujeito carente e as realidades aptas a satisfaze-lo.

“Protecção jurídica” o dto subjectivo confere, efectivamente, e ao seu titular, uma tutela jurídica, pelo que a ideia de protecção surge convincente e acertada.

O mais característico da posição de Jhering e da corrente de pensamento por ele simbolizada: o privar do dto subjectivo do nível significativo-ideologico que os jusnaturalistas lhe tinham associado e que Savigny introduzira nos quadros da III Sistemática.

Segundo Regelsberger

A fórmula de Jhering – o dto é uma tutela de interesses – surgiu como demasiado frontal, reduzindo um dos mais nobres instrumentos da Ciência jurídica à mera realidade subjacente.

Para Regelsberger: “o dto subjectivo existe quando a ordem jurídica faculte à pessoa a realização de um escopo reconhecido (= interesses protegido) e lhe reconhece, para isso, um poder jurídico (= poder da vontade).

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Teoria Geral do Direito Civil

Assistiu-se, tão-somente a um somatório ou justaposição desses termos, bem presentes na definição preconizada. Assim, a noção regelsbergiana não traduz um salto qualitativo, antes acumulando, em si, os inconvenientes das proposições que utilizou.

Prof. Menezes Cordeiro

Critica a Savigny:O dto subjectivo não pode se definido como um poder de vontade: há dtos sem vontade, enquanto o

termo “poder”, tendo um sentido técnico preciso não deve confundir-se com o “dto”.Toda a juridificaçao é imposta, não resultando dos sujeitos entre si. O dogma da vontade não

corresponde à verdade antropológica e existencial.

Critica a JheringNão se deve identificar dto subjectivo e interesse. Em múltiplas situações, há dtos subjectivos, validos e

eficazes, que não correspondem a interesses objectivos ou subjectivos: o proprietário de coisa deteriorada não deixa de ter esse dto e a correspondente protecção.

Critica a RegelsbergerAcumulando o essencial de Savigny e Jhering, sujeita-se às criticas a ambos dirigidas. Alem disso, deve-se--lhe censurar a natureza verbal do compromisso ensaiado e a nocividade dos desenvolvimentos linguísticos

com os quais se intentou ladear a critica em perspectiva.

Doutrinas do séc. XX:

Negativistas: intentam proscrever o dto subjectivo, substituindo-o por outra ou outras figuras. Proteccionistas: procuram reduzir o dto subjectivo à tutela proporcionada pelo Dto. Neo-empiricas: pretendem reconhecer a impossibilidade de uma definição capaz, apelando, então, à

mera descrição das figuras susceptíveis de o integrar.

Criticas:

Posição negativita: o dto subjectivo não é uma simples construção técnica: ele tem um nível significativo-ideologico profundo. No dto subjectivo joga-se um modo de pensar próprio do sistema cultural do Ocidente

e não, apenas, uma conjunção jurídica. O dto subjectivo deve ser preservado, na precisa medida em que a cultura que o suporta o deva, também, ser.

Posição proteccionista: o proteccionista postula, no Dto, sempre ou em primeira linha, medidas de protecção jurisdicional ou, pois disso no fundo se trata, de coacção. Ora, na grande maioria dos casos, tudo

se passa sem necessidade de intervenção dos tribunais e, menos ainda, sem qualquer aplicação, pela força, de sanções.

Posição neo-empirista: o neo-empirismo traduz desde logo um retrocesso. Ainda que complexa, a situação, no que toca ao dto subjectivo, não surge desesperada ao ponto de se deverem ignorar gerações de estudiosos

que dedicaram esforços à sua reformulação.

Solução preconizada

Mais importante é descobrir o sentido de uma evolução, os seus factores e a sua concatenação, passada, presente e futura.

O dto subjectivo é sentido, na nossa cultura, não como uma mera instrumentação técnica, a manipular pelos juristas, mas antes como uma vantagem pessoal, a conquistar, preservar e defender.

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Teoria Geral do Direito Civil

Dto subjectivo permissão normativa específica de aproveitamento de um bem.

o O dto subjectivo é sempre técnico: traduz a presença, no seu âmbito, de uma linguagem clara e eficiente, que permita percorrer a via que, à fonte, liga o caso concreto.

o O dto subjectivo é significativo-ideológico: traduz a projecção, também nesse âmbito, da competente fenomenologia social subjuridica.

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# 22As modalidades de dto subjectivo

Dto subjectivo comum: traduz-se numa permissão específica de aproveitamento de um bem; deriva da incidência de uma norma permissiva;Ex.: dto de propriedade

Dto potestativo: implica um poder de alterar, unilateralmente, através de uma manifestação de vontade, a ordem jurídica; é fruto de uma norma que confere um poder;Ex.: dto de aceitar proposta contratual

Modalidades quanto ao objecto (bem de cujo aproveitamento nele se trate):

Bens patrimoniais: os que tendo natureza económica, sejam avaliáveis em dinheiroo Corpóreoso Incorporeaoso Bens intelectuaiso Prestaçõeso Realidades jurídicas

Bens não patrimoniais: quando não tenha natureza económica, nem se exprimam, à partida em dinheiro.

o Pessoaiso Familiares

Modalidades quanto ao regime

Dtos de crédito Dtos reais Dtos de família Dtos das sucessões

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#23Outras situações activas

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“permissão” ideia de liberdade“normativa” resulta de uma norma permissiva“especifica” contrapõe-se com a genérica a que se aplicam as liberdade genéricas“aproveitamento de um bem” todas as vantagens que se retiram de um bem

Teoria Geral do Direito Civil

Permissões genéricas (liberdades) permissão genérica de actuação (não há um bem para aproveitar) ≠ dto subjectivo

Poderes: Gomes da silva – disponibilidade de meios para a obtenção de fins. Realidade analítica.

Faculdades: conjunto de poderes/outras posições activas unificadas sobre uma designação comum. Realidade compreensível.Ex.: art. 1305º CC – os “dtos” de uso, fruição e disposição são na verdade faculdades.

Expectativas: factos jurídicos complexos de produção sucessiva (expectativa de produção final)Têm protecção jurídica? Depende da expectativa. Nalgumas situações sim, correspondendo a dtos subjectivos; noutras situações não, em que as expectativas assentam em meras eventualidades (ex.: jogar na lotaria).

Poderes funcionais (poderes-deveres) obrigação especifica de aproveitamento de um bem (ex.: poder paternal).

Excepção: situação jurídica pela qual a pessoa adstrita a um dever pode, licitamente, recusar a efectivação da pretensão correspondente. (ex.: excepção do não cumprimento do contrato civil).

o Excepções fortes Peremptória (ex.: prescrição) Dilatória (ex.: beneficio de discussão previa)

o Excepção fraca (ex.: art. 428º CC)

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#24 Situações passivas

Obrigação: situação passiva de base, compreensiva, equivalente, de certo modo, ao dto subjectivo.o Art. 397º CC – “a obrigação é o vínculo jurídico por virtude do qual uma pessoa fica

adstrita para com outra à realização de uma prestação”

Dever de efectuar a prestação principal Dever de efectuar as prestações secundárias (prestações acordadas para

complementar a principal) Deveres acessórios

Dever: situação analítica passiva de base, o dever traduz a incidência de normas de conduta: impositivas ou proibitivas. A pessoa adstrita a um dever encontra-se na necessidade jurídica de praticar ou de não praticar certo facto. Em regras, uma obrigação pode decompor-se em múltiplos deveres.

Obrigações e deveres quanto ao seu objecto (a conduta devida ou prestação)o Obrigação de dare – o adstrito deve entregar uma coisa a outrem;o Obrigação de facere – o adstrito deve desenvolver uma actividade em prol de outrem;o Obrigação de non facere – deve-se abster de certa actuação;o Obrigação de pati ou suportação – deve-se sofrer que alguém desenvolva, na sua esfera, uma

actividade que, em principio, não poderia ter lugar.

Sujeições: situações jurídicas passivas correspondentes aos dtos potestativos. Esta numa sujeição a pessoa que possa ver a sua posição alterada por outrem, unilateralmente. Ex.: proponente contratual.

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Teoria Geral do Direito Civil

Ónus: situação na qual alguém deva adoptar certa atitude, caso pretenda obter certo efeito. O ónus não é um dever: por via dele não há que adoptar uma certa conduta, porque o resultado por ele propiciado é facultativo.O ónus assenta numa permissão: permissão essa que, a não ser actuada num certo sentido, conduz a consequências desagradáveis para o destinatário da mesma, ainda que não assimiláveis a sanções.

Deveres genéricos: deveres genéricos são situações jurídicas passivas que se traduzem em posições absolutas, isto é, sem relação jurídica. O facto de o dever genérico não ter como correspectivo um dto subjectivo explica a sua generalidade: elas não dão lugar a comportamentos que possa, exclusivamente, ser exigidos por um sujeito a outro. Uma generalidade de pessoas pode, verificadas as competentes condições, exigir a observância a uma generalidade de outras.

Deveres funcionais: traduzem situações passivas nas quais uma pessoa que se encontre, por força da sua presença, em determinada posição. Os comportamentos que o dever funcional postule podem, directamente, ser exigidos por certas pessoas.Os deveres funcionais não tem, ou não tem necessariamente, uma especifica fonte, antes surgindo com a simples ocorrência do condicionalismo funcional donde promanem.

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CAPITULO VI

#25Institutos civis

Institutos civis: conjunto de normas e princípios que permitem a formação típica de modelos de decisão.

Institutos civis mais relevantes do actual Dto positivo português:

o Personalidade e a sua tutelao Autonomia privadao Boa féo Imputação de danoso A propriedade e a transmissão

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#26 A personalidade e a sua tutela

O Dto, enquanto fenómeno histórico e cultural, é uma criação humana, no mais largo sentido dessa ideia, surge como obra humana, é utilizado por pessoas, serve os seus interesses e os seus fins e sofre as vicissitudes que Humanidade lhe queira imprimir.

Pessoa = centro de imputação de normas jurídicas.

1. Eficácia civil dos dtos fundamentaisOs dtos fundamentais são posições jurídicas atribuídas pela Constituição, com particular solenidade

– critério da fonte da sua atribuição. Diferem dos: Dtos de personalidade (critério do objecto) Dtos originários (critério da pré-positividade) Dtos do homem (critério da titularidade) Dtos pessoalíssimos (critério da intransmissibilidade)

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Teoria Geral do Direito Civil

Dtos pessoas (critério da patrimonialidade)

Adequação axiológica: os dtos fundamentais não acautelam, somente, certos valores; antes o fazem por forma adequada ou, noutro prisma, perante violações que eles consideram adequadas, apenas nessa dimensão eles podem surtir efeitos civis. Apenas nessa dimensão eles podem surtir efeitos civis. Por exemplo, a recusa em celebrar um contrato pode por em perigo a vida ou a integridade da outra parte; mas o dto à vida, como fundamental que é, não exige, aqui, a celebração do contrato (em principio) por não haver adequação axiológica em tal dimensão.

Adequação funcional: obriga a atinar as próprias violações em si: também estas podem situar-se no termo de funções estranhas ao dto fundamental considerado, quer por conflitos de deveres em que este ceda (ex.: soldade na guerra pode matar e, provavelmente, deverá mesmo faze-lo) quer por simples alheamento ou desconexão (ex.: pessoa que professasse uma religião que proibisse o trabalho não poderia, legitimamente, receber sem trabalhar, em nome da liberdade de consciência)

* * *

2. Responsabilidade patrimonial: conjunto de normas que levam que pelo incumprimento das obrigações responda o património do devedor.

Nas sociedade primitivas, perante o incumprimento de deveres, a posição mais simples consistiria em fazer sofrer o responsável, seja como modo de o levar a cumprir (efeito compulsório), seja a titulo de mera retorção (efeito retributivo). Justiça privada e suportação pessoas das consequências do incumprimento seriam pois as antigas regras vigentes na matéria.

Na actualidade prevalece o regime da responsabilidade patrimonial. O devedor que não cumpra as suas obrigações apenas se sujeita a que sejam apreendidos bens seus – os bens penhoráveis – os quais serão vendidos para satisfação dos credores. Se tais bens não existirem ou forem insuficientes, haverá rateio, ficando todos prejudicados por igual.

Ninguém pode ser fisicamente obrigado a fazer seja o que for, no Dto civil, apenas o património de cada um responde pela prevaricações – se existir e na medida das suas forças – Grande progresso histórico no domínio do reconhecimento da personalidade humana e da sua tutela.

3. Danos morais: o dano corresponde à supressão de uma vantagem, actual ou previsível, atribuída pelo Dto. O dano moral corresponderia à supressão de vantagens não patrimoniais.

A ressarcibilidade dos danos morais provocou duvidas serias ao longo da Historia. Numa evolução que pode ser seguida nas diversas ordens jurídicas, é hoje seguro que os danos morais dão lugar a indemnização, ainda que com um alcance meramente compensatório. A tutela da pessoa assim o exige.

4. A família: traduz, em Dto, um conjunto de situações relativas a pessoas ligadas entre si por casamento, parentesco, afinidade e adopção – art. 1576º CC.

A família constitui um alargamento primordial das esferas das pessoas. Um reconhecimento da personalidade humana sem o da família não seria possível; impõe-se, pois, a conexão.

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# 27A autonomia privada

Autonomia privada

o Em sentido amplo: espaço de liberdade reconhecido a cada um dentro da ordem jurídica: engloba tudo quanto as pessoas podem fazer, num prisma material ou num prisma jurídico.

o Em sentido restrito: espaço de liberdade jurígena, isto é, área reservada na qual as pessoas podem desenvolver as actividades jurídicas que entenderem.

- A autonomia privada corresponde assim a um espaço de liberdade jurígena atribuído, pelo Dto, às pessoas, podendo definir-se como uma permissão genérica de produção de efeitos jurídicos.

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Teoria Geral do Direito Civil

O acto voluntário pode enquadrar-se perante duas situações permissivas distintas:

o Liberdade de celebração : autonomia privada permite praticar ou não praticar o acto e, portanto, optar pela presença ou pela ausência de determinados efeitos de Dto, a ele associados.

o Liberdade de estipulação : autonomia privada permite optar pela prática do acto e, ainda, seleccionar, para além da sua presença, o tipo de efeitos que se irão produzir.

Acto jurídico em sentido estrito – há liberdade de celebração; não há liberdade de estipulação; Negócio jurídico – há liberdade de celebração e há liberdade de estipulação.

Autonomia privada em termos:

o Formais : corresponde à impossibilidade em que se encontra o Dto de prever todos os efeitos concretos.o Materiais : autonomia privada liga-se a certas liberdades económicas fundamentais, como sejam a de trabalho e a de empresa

Autonomia pela:

o Pela positiva: liberdade de agiro Pela negativa: defesa contra intromissões exteriores.

Áreas de incidência:o Dto das Obrigações: domínio por excelência da autonomia privada – art 405º CCo Dto da personalidade: dois limites: respeito pela ordem pública (art.81º/1), as limitações

voluntárias são smp revogáveis (art. 81º/2)o Dtos Reais: há liberdade de celebração; não há liberdade de estipulação (art.1318º CC)o Dto da Família: há liberdade de celebração; não há liberdade de estipulaçãoo Dto das Sucessões: menor influencia da autonomia privada.

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# 28A Boa Fé

O Dto romano assentava em acções. Nele, o protótipo da situação jurídica activida era protagonizado não por um dto subjectivo, mas por uma actio: a pessoa que pretendesse uma tutela jurídica dirigia-se ao pretor e solicitava uma acção. Em casos particulares o pretor veio conceder acções sem base legal expressa, assentes, simplesmentes na fides, precedida do adjectivo Bom:a Bona fides ou boa fé.

No Dto canónico era conferida á boa fé, tonalidades +éticas que se podem exprimir equiparando-a à ausência de pecaso. A boa fé não implica só ignorância: exige ausência de censura.

No espaço jurídico português , o Código de Vez Serra veio:o Consagrar a boa fé subjectiva de feição românica e tradicional;o Consagrar a boa fé objectiva, de origem românico-germanica, dinamizada pela III

sistemática e evolução subsequente;o Referenciar, expressamente, vários institutos alcançados apenas por via cientifica e

jurisprudencial, assente na boa fé.

A boa fé traduz, até aos confins da periferia jurídica, os valores fundamentais do sistema; e ela carreia, para o núcleo do sistema, as necessidades e as soluções sentidas e encontradas naquela mesma periferia.

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Teoria Geral do Direito Civil

Boa fé subjectiva: está em causa um estado do sujeito, esse estado é caracterizado, pela lei portuguesa, ora como um mero desconhecimento ou ignorância de certos factos, ora como um seu desconhecimento sem culpa ou uma ignorância desculpável, ora pela consciência de determinados factores.

Boa fé objectiva: remete para princípios, regras, ditames ou limites por ela comunicados ou, simplesmente, para um modo de actuação dito de “boa fé”: arts 3º/1, 227º/1, 272º, 334º, 437º/1 e 762º/2, respectivamente. A boa fé actual como uma regra imposta do exterior e que as pessoas devem observar.

Nalguns casos, a boa fé surge como um correctivo de normas susceptíveis de comportar uma aplicação contrária ao sistema; noutros, ela surge como a única norma atendível. Em todos eles, todavia, ela concretiza-se em regras de actuação.

A boa fé objectiva concretiza-se, essencialmente, em cinco institutos:

o Culpa in contrahendo : art. 227º/1 – Rudolf von Jhering – antes da formação do contrato, as partes já têm diversos deveres a respeitar e, designadamente, deveres de protecção, de lealdade e de informação. Tais deveres visam prevenir que, nessa fase pré-contratual, alguma das partes possa atingir a confiança da outra, provocando-lhe danos. Alem disso, eles recordam que a negociação contratual, embora livre, não deve ser usada para fins danosos, alheios às finalidades em jogo: a de procurar a eventual celebração de um contrato.

o Integração dos negócios : art., 239º - desenvolveu-se através de situação em que as regras de interpretação negocial enfrentaram uma especial escassez material expressamente subscrito pelas partes – o interprete-aplicador devera ter em conta a lógica imanente ao negocio e as exigências substanciais do sistema, de acordo com as expectativas que as partes tenham, legitimamente, depositado no processo.

o Abuso do dto : art. 334

o Modificação dos contratos por alteração das circunstancias : art., 437º/1 – este instituto permite, em certas condições, modificar ou resolver contratos que, mercê de alterações registadas após a sua conclusão, venham a assumir feições injustas para alguma das partes.

o Complexidade das obrigações: art., 762º/2 – advém da junção dos institutos da violação positiva do contrato e a ideia da obrigação como uma estrutura complexa. A complexidade das obrigações promove, a propósito de cada vinculo, um conjunto de deveres de protecção, de lealdade e de informação que asseguram, nesse nível, a tutela da confiança das partes e do principio de que, em qualquer caso, prevalecem os interesses reais protegidos do credor.

Em todos estes institutos afloram dois princípios: o principio da tutela da confiança e o principio da primazia da materialidade subjacente.

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Teoria Geral do Direito Civil

1. A tutela da confiança

No Dto português vigente a protecção da confiança efectiva-se por duas vias:

o Através de disposições legais especificas: surgem quando o Dto retrate situações típicas nas quais uma pessoa que, legitimamente, acredita em certo estado de coisas – ou o desconheça – receba uma vantagem que, de outro modo, não lhe seria reconhecida.

o Através de institutos gerais: os institutos gerais susceptíveis de proteger a confiança aparecem ligados aos valores fundamentais da ordem jurídica e surgem associados a uma regra objectiva da boa fé.

Pressupostos da protecção jurídica da confiança:

o Uma situação de confiança: traduz-se na boa fé subjectiva e ética, própria da pessoa que, sem violar os deveres de cuidado que ao caso caibam, ignore estar a lesar posições alheias.

o Uma justificação para essa confiança: requer que esta se tenha alicerçado em elementos razoáveis, susceptíveis de provocar a adesão de uma pessoa normal;

o Um investimento de confiança consistente: exige que a pessoa a proteger tenha desenvolvido toda uma actuação baseada na própria confiança, actuação essa que não possa ser desfeita sem prejuízos inadmissíveis; isto é: uma confiança puramente interior, que não desse lugar a comportamentos, não requer protecção.

o A imputação da confiança: implica a existência de um autor a quem se deva a entrega confiando do tutelado. Ao proteger-se a confiança de uma pessoa vai-se, em regra, onerar outra; isso implica que esta outra seja, de algum modo, a responsável pela situação criada

Os requisitos para a protecção da confiança articulam-se entre si nos termos de um sistema móvel – não há entre eles uma hierarquia e não são, em absoluto, indispensáveis falta de alguns deles pode ser compensada

pela intensidade especial que assumam alguns dos restantes.

2. A primazia da materialidade subjacente

O Dto visa, através dos seus preceitos, a obtenção de certas soluções efectivas; torna-se, assim, insuficiente a adopção de condutas que apenas na forma correspondam aos objectivos jurídicos, descurando-as, na realidade, num plano material. A boa fé exige que os exercícios jurídicos sejam avaliados em termos materiais, de acordo com as efectivas consequências que acarretem.

Ex. de comportamento contrario á boa fé: devedor que, obrigado a colocar determinada quantidade de tijolos num prédio do credor, os descarrega no fundo de um poço: ainda quando o local da entrega ficasse ao critério do devedor, deve entender-se que a opção não poderia ser feita em termos danosamente inúteis.

Três grandes vias de realização do principio da primazia da materialidade subjacente:o Conformidade material: no exercício de posições jurídicas têm que se realizar,

efectivamente, os valores pretendidos pelo ordenamento: não, apenas, o ritualismo exterior. o Idoneidade valorativa: sistema não admitiria qu alguém utilize a própria situações jurídica

que tenha violado para, em função do seu ilícito, tirar partido contra outrem (ex.: art. 1334º CC).

o Equilíbrio no exercício das posições: permanente necessidade de sindicar, à luz da globalidade do sistema, as diversas condutas, mesmo permitidas. Dois tipos de posturas vedadas pela boa fé:

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Teoria Geral do Direito Civil

Acto emulativo : actuação gratuitamente danosa para outrem (ex.: chaminé falsa de Colmar);

Actuação gravemente desequilibrada: conduta que, para conseguir uma vantagem mínima para o próprio, gere um dano máximo para outrem.

* * *

- arts. 437º, 239º, 762º, 227º CC – cabe ao sistema, as zonas jurídicas em que o atendimento a esses valores é defensável. E fora dessas áreas? É atendível a Boa fé? Em qualquer área do Dto civil/ Dto, é de atender

à Boa fé. Razoes:- Os valores do sistema estão presentes em cada parcela do sistema;

- Carácter transversal do art. 334º CC (abuso do dto): aplica-se a qualquer situação jurídica activa e às normas 6 proibitivas e impositivas – normas implicitamente permissivas (não se está a atribuir dtos

subjectivos) Quaisquer normas jurídicas do dto português estão sujeitas ao art., 334º CC

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#29A imputação de danos

Dano: traduz-se na supressão ou diminuição duma situação favorável que estava protegida pelo ordenamento.

o Danos morais e danos patrimoniais;o Danos lícitos e danos ilícitos;o Danos naturais e danos humanos;o Danos ressarcíveis e danos compensáveis;o Danos emergentes e lucros cessantes.

Regra básica: suportação dos danos pela própria esfera onde ocorram. Cada um corre o risco de ver suprimidas as vantagens que antes lhe coubessem. Porquê esta regra? Dupla justificação:

o Em termos práticos : corresponde á natureza das coisas e faculta uma solução rápida e eficaz para a sua problemática;

o Em termos valorativos : corresponde, em geral, á solução mais justa. Qualquer dano pressupõe a atribuição prévia de uma vantagem: fazer correr o risco por quem não tenha tido o benefício das vantagens, enquanto elas existam, seria uma fórmula maior de injustiça.

Vectores de alteração do instituto: o Passou de indicação pontual de factos que acarretam responsabilidade civil para clausulas

gerais – art. 483º CC;o Passou da associação entre responsabilidade civil e pratica de acto ilícito para a

responsabilidade civil por actos não exclusivamente ilícitos;o Passou de responsabilidade civil com cariz punitivo para responsabilidade de cariz

substitutivo/reconstitutivo.

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Teoria Geral do Direito Civil

Actuais títulos de imputação de danos

1. Imputação de danos por facto ilícito – responsabilidade subjectiva

a. Responsabilidade delitual: quando alguém, ilicitamente e com culpa, viole um direito alheio ou uma disposição destinada a proteger os seus interesses – art. 483º/1 CC

b. Responsabilidade contratual/obrigacional/por incumprimento: quando o dto violado é um dever de crédito – art. 798º CC

Ilicitude: o dano deve ser provocado em violação a normas jurídicas e sem que ocorra uma causa de justificação (por ex. a legitima defesa);Culpa: a acção deve assentar numa tal relação de meios-fins que o agente incorra num juízo de censura:

- Seja por ter pretendido directa, necessária ou eventualmente atingir as normas violadas – dolo;- Seja por não ter pretendido pautar-se pelos deveres de cuidado que ao caso caibam – negligência.

2. Imputação de danos pelo risco – responsabilidade objectivaTem lugar quando o Dto faça correr por determinada esfera a eventualidade de danos

registados em esferas diferentes; independentemente de qualquer facto ilícito, tal só sucederá em situações previstas na lei com esse efeito – art. 483º/2

Em regra, as imputações pelo risco jogam contra o beneficiário de meios perigosos.De natureza excepcional, no início, as imputações pelo risco devem hoje ser apresentadas

como desvios à regra de suportação dos danos nas esferas onde ocorram, e nada mais.

3. Imputação de danos por factos lícitos ou pelo sacrifício – art. 339º/2, 2ª parte CCEx.: art. 1322º CC

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Pressupostos da responsabilidade civil

o Acto: positivo (acção) ou negativo (omissão);o Ilicitude: desconformidade com a ordem jurídica;o Culpa: juízo de censura pelo ordenamento;o Nexo de causalidade o Dano

Ilicitude pode resultar de:o Violação de dtos subjectivoso Violação de disposições legais com vista à protecção do interesse de terceiro;o Abuso do dto – art. 334º CC

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# 30A propriedade e a sua transmissão

Noção de propriedade:o Em sentido amplo: conjunto dos dtos patrimoniais privados (ex.: art. 62º/1 CRP)

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Teoria Geral do Direito Civil

o Em sentido estrito: permissão normativa plena e exclusiva de aproveitamento de uma coisa corpórea.

Justificação da propriedade – 2 esquemaso A ocupação: faculta a apropriação a quem se aposse de bens sem dono;o O trabalho: permite-a àquele que, pelo seu labor, produza novos bens.

Faculdades clássicas atribuídas ao proprietário – art. 1305º CCo Faculdades de uso: utilização da coisa;o Faculdades de fruição: possibilidade de, sobre ela, desenvolver actividades produtivas;o Faculdades de disposição: natureza permissiva do conjunto e possibilidade da sua

transmissão.

Aspectos marcantes do dto de propriedadeo Disponibilidade: o seu exercício fica na disponibilidade do sujeito,

que pode renunciar à sua posição, remitir a dívida, abandonar a coisa…nos limites ele poderá transformar o objecto do seu dto ou mesmo destruí-lo;

o Transmissibilidade: a transmissão equivale à possibilidade de usar os bens enquanto valores de troca, fazendo-os circular na sociedade, seja onerosa, seja gratuitamente.

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PARTE II

NEGÓCIO JURÍDICO

CAPITULO I

ACÇÕES E FACTOS JURIDICOS

# 31Eficácia jurídica

Eficácia jurídica: sempre que se verifiquem determinadas consequências nas quais, através de critérios reconhecidos seja possível apontar as características da juridicidade. As consequências juridicamente relevantes são sempre respeitantes a pessoas: sem Humanidade, não há Cultura, não há Ciência e logo Direito.

Situação jurídica: resulta de uma decisão jurídica, ou seja, assume-se como o acto e o efeitos de realizar o Dto, solucionando um caso concreto.

Decisão jurídica: é uma decisão humana, em sentido congnitivo-volitivo: implica Ciência – ou seria arbitrária – implica opção – ou surgiria automática

A eficácia jurídica resulta de modelos de decisão, emergindo estes dos factores que componham um regime jurídico-positivo aplicável – a eficácia jurídica é p produto da aplicação de regras jurídicas (normas ou

princípios)

Eficácia pode ser:o Constitutiva – art. 1263º/a) CCo Transmissiva – art. 879º/a) CC

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Teoria Geral do Direito Civil

o Modificativa – art. 288º CCo Extintiva

Transmissão: verifica-se a passagem de uma situação jurídica da esfera de uma pessoas, para a de outra. Na transmissão, a situação transferida poderia sofrer certas alterações de elementos circundantes.≠Sucessão: ocorre a substituição de uma pessoas por outra, mantendo-se estática uma situação jurídica a qual, por isso, estando inicialmente na esfera da pessoa, surge, depois da troca, na de outra. Na sucessão a situação manter-se-ia totalmente idêntica.

Natureza da eficáciao Eficácia pessoal: quando a situação jurídica que se constitua, transmita, modifique ou

extinga não tenha natureza patrimonial;o Eficácia obrigacional : sempre que alguma dessas quatro vicissitudes se reporte a situação

obrigacionais;o Eficácia real : quando tal ocorra perante situações próprias de coisas corpóreas.

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#32 Factos, acções e negócios jurídicos

Facto jurídico: evento ao qual o Dto associo determinados efeitos. O facto jurídico apresenta-se como a realidade apta a, integrando uma previsão normativa, desencadear a sua estatuição – sentido amplo.

Facto jurídico stricto sensu: não tem intervenção do ser humano ou, pelo menos, não voluntária (ex.: raio)

Acto jurídico lato sensu: há vontade humana

o Acto stricto sensu: liberdade de celebraçãoo Negócio jurídico: há liberdade de celebração e há liberdade de

estipulação.

Paulo cunha: as regras aplicáveis ao negócio e ao acto jurídico são diferentes, uma vez que a liberdade de estipulação, simples no conteúdo e, sobretudo, nas consequências, conduz à aplicação de múltiplas normas e princípios jurídico.

Teoria de acção final ou finalismo: a acção humana não pode ser entendida como puramente causal, no sentido do agente provocar, de forma mecânica, determinadas alterações no mundo exterior: a acção é final porque o agente, consubstanciando previamente o fim que visa atingir põe, na prossecução deste, as suas possibilidades.Na acção humana, há uma prefiguração do fim que determina para o alcançar e os meios para tanto seleccionados: o próprio fim é a ”causa”.

Actos lícitos: o acto é licito quando se processe ao abrigo de uma permissão especifica, de uma permissão genérica ou, simplesmente, quando seja irrelevante para o Dto (ex.: exercício de um dto subjectivo)O acto lícito acabará por ser aquele que não contrarie o Dto, isto é, que não seja proibido, directa ou indirectamente.

Actos ilícitos: correspondem a comportamentos humanos desconformes com o Dto, por implicarem actuações proibidas ou por redundarem no não acatamento de atitudes prescritas.

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Teoria Geral do Direito Civil

A ilicitude pode provocar um juízo jurídico de censura: a culpa.

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#33Modalidades de negócios jurídicos

A diferença entre negócios unilaterais e os negócios multilaterais, contratos, repousa nos efeitos que venham a ser desencadeados:

o Nos negócios unilaterais, os efeitos não diferenciam as pessoas que, eventualmente neles tenham intervindo; por isso tende, neles, a haver uma única pessoas, uma única declaração ou um único interesse;

o Nos contratos, os efeitos diferenciam duas ou mais pessoas; tendem a surgir várias declarações, varias pessoas e vários interesses.

Negócios unilaterais:o Negocio conjunto: várias pessoas são titulares de posições jurídicas que só podem ser

actuadas no seu conjunto, por todas elas, em unanimidade;o Deliberação: várias pessoas são titulares de posições jurídicas confluentes que não

têm que ser unânimes, prevalecendo a posição maioritária.

Contratos:o Contratos sinalagmáticos ou não sinalagmáticos : consoante dêem lugar a obrigações

recíprocas, ficando as partes, em simultâneo, na situação de credores e devedores ou, pelo contrário, apenas facultem uma prestação;

o Contratos monovinculantes (art. 411º CC) ou bivinculates : conforme apenas uma das partes fique vinculada ou ambas sejam colocadas nessa situação.

Negócios inter vivos: destinam-se a produzir efeitos em vida dos seus celebrantesNegócios mortis causa: destinam-se a produzir efeitos depois da morte do seu autor.

Negócios consensuais: negócios que, por não caírem sob a estatuiçao de normas cominadoras de forma especial sejam susceptíveis de conclusão por simples consenso.Negócios formais: negócios para cuja conclusão a lei exija determinado ritual na exteriorização da vontade.

Negócios reais quoad constitution: negócio so existe quando há entrega de uma coisa, quando há a tradição dessa coisa (ex.: doação de um bem móvel, penhor, contrato de mutuo, contrato de deposito…)Negócios reais quoad effectum: negócios que produzem efeitos de dtos reais (ex.: contrato de compra e venda).

Negócios causais: quando tem de ser acompanhada da sua fonteNegócios abstractos: não têm que ser acompanhados da sua fonte (ex.: no dto comercial – títulos de credito)

Negócios típicos: aqueles cujos aspectos fundamentais estão na lei;Negócios atípicos: engendrados pelas partes

Negócios nominados: têm nome na lei. Normalmente é típico, mas nem sempre (art. 755º CC, não tem regime)Negócios inominados: não têm nome na lei. Atípicos.

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Teoria Geral do Direito Civil

Negócios onerosos: aqueles que implicam esforço económico para ambas as partes;Negócios gratuitos: esforço económico só para uma das partes (ex.: doação)

Negócios de administração: autor do negócio procede à modificação secundária de uma determinada situação jurídica (ex.: arrendamento)Negócios de disposição: põe em causa a situação jurídica (ex.: venda)

#34 Actos jurídicos em sentido estrito

Os actos jurídicos em sentido estrito correspondem a uma forma menos elevada do exercício da autonomia privada – ausência de liberdade de estipulação.

Aos actos jurídicos em sentido estrito aplicam-se, na medida do possível, as regras respeitantes ao negócio jurídico; tal o regime defendido pela doutrina e consagrado no art. 295ºCC.

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#35Elementos e pressupostos negociais

Orientações da escola de Lisboa

Paulo Cunha – quatro elementos dos negócio jurídico:

1. Elementos necessários: os que a lei exija para a validade de todo e qualquer acto jurídico.i. Elementos essenciais : sem os quais não há negócio;

ii. Elementos habilitantes : requeridos para a total validade do negócio.

2. Elementos específicos: requeridos para cada tipo de acto;3. Elementos naturais: a lei estabelece-os para, supletivamente, servirem os diversos tipos

negociais, de acordo com a sua natureza.4. Elementos acidentais: abrangem os introduzidos, em cada caso, pela vontade das

partesi. elementos típicos

ii. elementos variáveis.

Prof. Menezes Cordeiro: pressupostos (exteriores ao negocio) ≠ elementos (normas e princípios aplicáveis mercê da existência de negocio jurídico)

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CAPITULO II

A FORMAÇÃO DO NEGOCIO JURIDICO

#36O processo negocial

Formação dos negócios jurídicos Pressupõe uma declaração de vontade;

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Teoria Geral do Direito Civil

Decorre como se fosse um processo – sequencia de actos necessários para a obtenção de um fim; Técnica de contratação – fases eventuais:

o Obtenção de informaçõeso Borrão “draft” de projecto de contrato;o Aplicação hipotética do contrato;o Concretização de critérios de decisãoo Superação de conflitos de objectivos;o Negociações contratuais;o Instrução e aconselhamento;o Elaboração do documento contratual

Processos típicos: procedimentos com sede legal e, ainda aqueles que são habitualmente adoptados pelas partes interessadas (tipicidade social); são atípicos todos os demais.

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#37Regras nas negociações e CULPA IN CONTRAHENDO

No período anterior à da efectiva conclusão do contrato existem já algumas regras a observar ou, pelo contrário, as partes são totalmente livres?

A tendência actual vai no sentido de afirmar a existência de regras, ainda que mantendo a liberdade fundamental das partes.

Regras jurídicas de negociação:

Regras contratuais: resultantes do facto das partes terem decidido concluir pactos preparatórios – perante pactos preparatórios, as partes ficam vinculadas.

Regras legais específicas Regras legais gerais: o dever de proceder segundo as regras da boa fé – art., 227º/1 CC.

A descoberta de von Jhering: na presença de contratos nulos por anomalias ocorridas na sua formação, podem ocorrer dados cujo não-ressarcimento seja injusto. Perante tal situação, o responsável, por via das regras gerais sobre danos e culpa, deveria indemnizar pelo interesse contratual negativo, colocando o prejudicado na situação em que ele se encontraria se nunca tivesse havido negociações e contrato nulo.

O papel do instituto da culpa in contrahendo

1. Destina-se a permitir o ressarcimento de danos causados, na fase pré-contratual, a pessoas ou a bens:

Deveres de segurança : as partes devem providenciar para que, nas negociações, ninguém sofra danos, seja nas suas saúde ou integridade física, seja no seu património.

2. Visa a circulação, entre as partes, de todas as informações necessárias para a contratação: Deveres de informação pré-contratuais: as partes têm que trocas todas as informações

necessárias para a boa contratação.

3. Liga-se, de modo mais directo, à própria actuação das partes: Deveres de lealdade: as partes não pode, in contrahendo, adoptar comportamentos que se

desviem da procura, ainda que eventual, de um contrato, nem assumir atitudes que induzam em erro ou provoquem danos injustificados.

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Teoria Geral do Direito Civil

4. Assume o papel de assegurar, nos preliminares contratuais, o respeito pelos valores gerais da ordem jurídica que, no caso considerado, aspirem a uma concretização: Boa fé

a. Tutela da confiança: na fase de preparação dos contratos, as partes nam devem suscitar situações de confiança que, depois, venham a frustrar;

b. Primazia da materialidade subjacente: a negociação emulativa, dilatória, chicaneira ou, a qualquer outro titulo, estranha à autonomia privada é contraria à boa fé.

5. Protecção da parte fraca – protecção do contratante débil: o contratante que, por razoes económicas ou de conhecimento, se deva considerar inferiorizado, tem como que o dto, na fase preliminar, a um esclarecimento e a uma lealdade acrescidos; quando os correspondentes deveres não sejam acatados, há responsabilidade por inobservância da boa fé.

A violação in contrahendo , no Dto português , tem natureza obrigacional – art. 227º/1 CC comina concretos deveres de protecção, de lealdade e de informação – existe um dever especifico de cumprimento, sendo justo que, não se verificando este, ao devedor caiba explicar como e porque.

Prof. Menezes Cordeiro: A indemnização a arbitrar por culpa in contrahendo deve abranger tanto o interesse negativo (despesas e perdas provocadas pelas negociações malogradas) como o interesse

positivo em causa (ganho que derivaria do contrato)

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#38 Actos preparatórios

Actos preparatórios: todos os actos que, inserindo-se pelo seu objectivo no processo de formação do contrato, não possam reconduzir-se à proposta, à aceitação ou à rejeição.

a. Actos preparatórios materiais: implicam a alteração da realidade que nos rodeiab. Actos preparatórios jurídicos: implicam actividades de puro significado jurídico.

c. Actos preparatórios típicos: definidos na lei (arts. 223º, 218º, 228º, 410º CC)d. Actos preparatórios atípicos: estabelecidos pelas partes

Pacto de opção : uma das partes, se quiser celebrar contrato, aceita e a outra parte sujeita-se;

Mediação: intervenção de terceiro, desinteressado – mediador – que promove a aproximação de duas ou mais partes para a celebração do contrato;

Existência de concurso (para celebrar contrato) – art. 369º PNJ

* * *

Concurso

Razoes de realização de concurso para celebração de um contracto: Escolha de parceiro mais idóneo – o concurso, normalmente acompanhado por publicidade alargada,

permite um fluxo de potenciais contratantes, facultando escolas adequadas; Aproveitamento dos mecanismo de concorrência – os potenciais contratantes, para arrematar o lugar,

vão oferecer melhores condições, procurando ultrapassar-se uns aos outros; Procura da melhor gestão : os interessados são levado a concorrer apresentando propostas globais; Legitimação da escolha : fica a ideia de que foi escolhido o melhor.

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Teoria Geral do Direito Civil

Concurso contratual: todos os envolvidos num processo contratual, directamente ou a titulo de potenciais interessados, acordam previamente os termos a seguir na contratação, fixando as regras para encontrar os contratantes definitivos.Concurso unilateral: apenas o seu dono procede à competente abertura e aprova os seus termos.

Concurso indicativo: tem como finalidade construir, apenas, uma fonte de informações para o autor do concurso;Concurso vinculativo: tem como finalidade o de se integrar efectivamente num processo tendente à formação dum contrato

Contratos mitigados- Carta de intenção- Acordo de base- Acordo-quadro- Protocolo complementar

Acordo de cortesia: recai sobre matéria não patrimonial; de trato social.Acordo de cavalheiros: partes chegam a consenso, mas combinam manter acordo fora do campo do Dto – Prof. Menezes Cordeiro: isto não é possível porque o Dto não admite que alguém previamente se despoje da tutela jurídica pois estar-se-ia a despojar de um bem futuro – proibido pelo art. 809º CC

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#39 A declaração de Vontade

Acção: actuação de um ser humano; acto de comunicação – reveste-se de conteúdo jurídico – acto de validade;

o Posição objectivista: a vontade é aquilo que é exteriorizado, o que é dito e, consequentemente, o que é ouvido;

o Posição subjectivista: a vontade é aquilo que realmente se quer, o que se quis dizer, a vontade psicológica.

Indícios na lei da importância da posição objectivista:o Erro na declaração da vontade – art. 217º CCo Lei admite, em certos casos, a anulabilidade da declaração de vontade – art. 257º CCo Autonomia privada sem tutela da confiança não é possível – o que se declara é valido

porque foi dito, ouvido e tomado como certo, criando confiança. À tutela da confiança aplica-se o regime negocial.

Declaração expressa: quando feita por palavras, escrito ou por qualquer outro meio directo de manifestação de vontade – art. 217º/1 CCDeclaração tácita: quando se deduza de factos que, com toda a probabilidade, a revelem – art. 234º CC

Declaração formal: tem forma solene (não pode ser tácita – art. 217º/2 CC)Declaração consensual ou não formal: não tem forma solene

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Eficácia jurídica: em regra as partes não se obrigam a cumprir – neste caso não temos contratos definitivos, mas contratos mitigados pode a parte faltosa ser coagida ao acatamento? Tudo dependerá se o acordo mitigado tem um conteúdo suficientemente explícito ou se se limita a obrigar as partes a prosseguir nas negociações.

Teoria Geral do Direito Civil

Silencio: ausência de comunicação – não é declaração. Só pode ser considerado declaração quando o significado do silêncio foi combinado. art. 218º CC

Declaração recipienda: tem um destinatário – art. 224º CCDeclaração não recipienda: não tem destinatário

Declaração recipienda torna-se eficaz – art. 224º CC: Quando seja remetida e só por culpa do destinatário não tenha sido oportunamente recebida – teoria

da expedição; Logo que é recebida pelo destinatário – teoria da recepção; Logo que é conhecida pelo destinatário – teoria do conhecimento;

Em qualquer caso, a declaração é ineficaz quando seja recebida pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida – relevância negativa da teoria do conhecimento – art. 224º/3 CC.

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#40A formação dos contratos

Implicando duas ou mais declarações de vontade confluentes, o negócio contratual assenta num processo formativo alongado: torna-se necessário procurar o ponto de consenso entre os celebrantes, portadores, na normalidade dos casos, de interesses opostos, que cabe harmonizar.

Contrato entre presentes: não há, entre as declarações de vontade das partes, um intervalo de tempo juridicamente relevante.Contrato entre ausentes: as diversas declarações são separadas por intervalo de tempo donde emergem consequências jurídicas.

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PROPOSTA

Declaração feita por uma das partes e que, uma vez aceite pela outra ou pelas outras, dá lugar ao aparecimento de um contrato – 3 requisitos essenciais:

Deve ser completa – deve abranger todos os pontos a integrar no futuro contrato – ex.: identificação das partes, objecto a vender, o preço…

Deve ser firme – revelar uma intenção inequívoca de contratar Deve revestir a forma requerida para o negócio em jogo.

No fundo, a proposta deve surgir de tal modo que uma simples declaração de concordância do seu destinatário faça, dela, um contrato. Quando faltar um dos requisitos, está-se perante um convite a contratar.

A proposta contratual faz nascer na esfera jurídica do destinatário o dto potestativo de aceitar ou contrato, encontrando-se o proponente numa posição de sujeição.

Duração da proposta – art. 228º CC:

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Teoria Geral do Direito Civil

Ou existe um prazo fixado pelo proponente ou convencionado entre as partes; Não é fixado prazo, mas o proponente pede resposta imediata (dependera dos meios de

comunicação) Proposta a ausente, sem prazo – 5 dias depois do prazo do ponto anterior.

Desaparecimento da proposta Revogação: acto unilateral do proponente que suprime a proposta (se chegar ao destinatário antes ou

ao mesmo tempo que a proposta) Na própria proposta, o proponente declara que se reserva do dto de extinguir a proposta (desde que

anterior à aceitação) Proposta extingue-se com a aceitação ou rejeição.

Oferta ao público: modalidade particular de proposta contratual, caracterizada por ser dirigida a uma generalidade de pessoas.

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