Antropologia No Brasil (Alteridade Contextualizada) (PEIRANO, Mariza)
Texto afinal do que é educação contextualizada (2)
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Educação Contextualizada: contribuindo para a Convivência com o Semiárido
Você já parou para pensar se os conteúdos trabalhados na escola fazem parte do contexto de
nossa região? Já listou quanta coisa interessante existe no lugar onde vivemos? Sabe dizer o que
os educandos fazem com o conhecimento adquirido na escola? Já pensou como a sala de aula e
a realidade local podem construir juntas a educação?
Os saberes dos povos do Semiárido nem sempre são reconhecidos pelas práticas de educação
formal. Como já dissemos, o Semiárido brasileiro ao longo do tempo, foi estigmatizado como
uma região de calamidades, criando-se a ideia de um lugar ruim para se viver. Uma educação
que desconsidera a pluralidade cultural dos sujeitos, tornando o conteúdo sem significado fora
da sala de aula, pode levar ao distanciamento entre o que se discute na escola e as experiências
vivenciadas pelos educandos, desestimulando os mesmos.
No entanto, sabemos que um outro modelo de educação é possível e que podemos construir,
cada dia mais, uma pedagogia de valorização dos saberes populares, da nossa região e de nossa
cultura. Uma educação para Convivência com o Semiárido, inserida no contexto da região, e que
por isso chamamos de Educação Contextualizada ao Semiárido. Uma pedagogia que propõe a
valorização dos conhecimentos da própria localidade como um dos alicerces da construção do
saber.
O que é, afinal, Educação Contextualizada?
A educação contextualizada propõe a construção do conhecimento considerando as
características das regiões. É uma prática pedagógica que pretende integrar o contexto local a
educação. Ou seja, dialoga com as especificidades construindo conhecimento a partir da vida do
lugar. Dessa forma, a educação contextualizada traz a realidade do nosso Semiárido para o
centro do processo educativo.
Ao colocar no centro do processo de aprendizagem as vivências cotidianas, a linguagem popular,
as expressões culturais, a fauna e flora da região, e a história e a força do povo do Semiárido,
um processo educativo contextualizado cria autoestima e valoriza a realidade em que as pessoas
vivem, uma vez que se reconhecem na sala de aula.
Desta forma, a educação contextualizada pretende contribuir para formação humanizada dos
sujeitos, bem como para o aprimoramento da convivência com nossa região. Seu desafio é
construir, criar e transformar as possibilidades de viver em nossa região. Isso representa novas
formas de convívio com o clima, com a água, a terra, de maneira geral com a natureza, e ainda
formas alternativas de produção.
A proposta da educação contextualizada se articula com movimentos da sociedade civil que
através da agricultura familiar e práticas agroecológicas tem contribuído para construir a
perspectiva da Convivência com o Semiárido.
A ideia é, então, educar mantendo uma relação de valorização do campo, da cultura, do jeito de
ser, produzir e reproduzir, de lutar pela terra, colocando em evidência a importância da
agricultura na vida das pessoas e para continuidade da vida no campo. É preciso que os
conteúdos trabalhados façam sentido tanto na vida quanto no lugar onde vive uma população.
A educação para convivência com o semiárido deve trazer consigo a capacidade de contribuir
para o fortalecimento da região semiárida, construindo novos olhares e conhecimento para
melhoria da vida da população e sendo mais uma frente na luta por direitos que assegurem uma
vida digna.
ECA – o Direito de ser criança
Ao falarmos de luta por direitos, uma conquista importante foram os direitos das crianças e
jovens. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em vigor desde 1990, é considerado um
marco na proteção da infância e reforça a ideia de “prioridade absoluta” da Constituição Federal.
É um ganho para sociedade e a partir dele muitas ações já se concretizaram:
• A implantação dos Conselhos de Direitos das Crianças e dos Adolescentes em níveis
federal, estadual e municipal, na busca da implementação e do controle social de
políticas que garantam os direitos das crianças e dos adolescentes.
• As Conferências Municipais, Regionais, Estaduais e Federais de Direitos das Crianças e
dos Adolescentes, em que se debatem e se sugerem políticas que atendam aos direitos
das meninas e meninos.
• O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), que melhorou a qualidade da
escola, implantou ações complementares a ela e conseguiu tirar do trabalho
exploratório milhares e milhares de crianças.
• O posicionamento diante do debate da qualidade do ensino e da oferta universal de
vagas, determinando a escola como direito essencial e fundamental das crianças e dos
adolescentes.
• O esforço por uma educação contextualizada, que leve em conta a vida real das crianças.
Assim como a educação é um direito básico para a vida de crianças e jovens, a garantia da água
também o é. Com o ECA as crianças e adolescentes puderam ter seus direitos assegurados por
lei, além dos já citados também são garantidos: o direito a brincar, a ser criança e a frequentar
uma escola de qualidade, como atuais sujeitos de direitos.
No entanto, sabemos que garantir os direitos das crianças e dos adolescentes é uma tarefa que
passa por muitos aspectos. A questão da escolarização é um dos desafios postos. A educação
não-contextualizada para a convivência com o Semiárido e a ainda presente exploração do
trabalho infantil são aspectos que afastam as crianças, desde bem pequenas, do acesso a um de
seus direitos fundamentais, que é a educação de qualidade. E o direito de ter uma escola na
própria localidade, na zona rural, adequada com os conhecimentos do campo, é uma frente de
luta que tem sido enfrentada pela sociedade
Educação do Campo
É preciso entender que para colocar em prática essa pedagogia contextualizada uma grande luta
vem sendo travada na educação. A política de educação do campo foi decretada em 2010 e visa
a ampliação e qualificação da oferta de educação básica e superior às populações do campo.
Assegurada por lei, ela responsabiliza o Estado (nas instâncias federais, estaduais e municipais)
pela sua implementação e manutenção.
O Plano Nacional de Educação considera como princípios da educação do campo:
• O respeito à diversidade do campo em seus aspectos sociais, culturais, econômicos, de
gênero, geracional, de raça e etnia;
• Incentivo à formulação de projetos políticos pedagógicos específicos para as escolas do
campo;
• Políticas voltadas para formação de profissionais da educação visando o atendimento
das especificidades das escolas do campo;
• Valorização da identidade da escola do campo e flexibilidade do calendário escolar,
ajustando-o às especificidades de cada região;
• Controle da qualidade da educação escolar, mediante efetiva participação da
comunidade e dos movimentos sociais.
Tal política tem como objetivo superar as defasagens históricas de acesso à educação escolar
das populações do campo visando: reduzir os índices de analfabetismo; fomentar educação
básica, superior e profissionalizante; produzir material didáticos, pedagógicos, culturais e
literários que atendam as especificidades do campo; contribuir para inclusão digital; garantir
fornecimento de energia elétrica, água de consumo, saneamento básico, dentre outras
condições necessárias para funcionamento das escolas.
Apesar de já observarmos alguns ganhos nessa luta, muito ainda precisa ser feito nesse sentido.
As populações do campo (agricultores familiares, pescadores, ribeirinhos, assentados e
acampados da reforma agrária, trabalhadores assalariados, quilombolas, caiçaras, povos da
floresta e demais populações que produzam suas condições de subsistência no campo) devem
participar dessa construção coletiva de conhecimento. Hoje é direito nosso ter escolas com
projetos políticos elaborados para atender em cada contexto as demandas educacionais das
nossas regiões.
Referências:
Construindo Saberes para Educação contextualizada. 1ª edição. Feira de Santana: MOC, 2011.
124 pág. (Desenvolvimento Sustentável e Convivência com o Semiárido – Caderno 1)
Cisternas nas Escolas: Uma conquista do povo do semiárido (cartilha). 1ª edição. Recife: ASA.
48 pág.
Cristiana Cavalcanti e Mariana Reis
Recife, Janeiro de 2015.