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OBS: Na jurisprudência citada, sempre que não houver indicação do tribunal, entenda-se que é do Superior Tribunal de Justiça. Índices Ementas – excepcionais - ordem alfabética Ementas – excepcionais - ordem numérica Índice do “CD” Tese 369 DROGAS – CONSUMO PESSOAL – ARTIGO 28 DA LEI 11.343/2006 – NATUREZA JURÍDICA DE CRIME – REINCIDÊNCIA. O artigo 28 da Lei de Drogas tem natureza jurídica de crime, inclusive para o fim de reconhecimento da reincidência. (D.O.E., , p. )

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OBS: Na jurisprudência citada, sempre que não houver indicação do tribunal, entenda-se que é do Superior Tribunal de Justiça.

Índices

Ementas – excepcionais - ordem alfabética Ementas – excepcionais - ordem numérica Índice do “CD”

Tese 369

DROGAS – CONSUMO PESSOAL – ARTIGO 28 DA LEI 11.343/2006 –

NATUREZA JURÍDICA DE CRIME – REINCIDÊNCIA.

O artigo 28 da Lei de Drogas tem natureza jurídica de crime, inclusive

para o fim de reconhecimento da reincidência.

(D.O.E., , p. )

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE

DA SEÇÃO CRIMINAL DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

DE SÃO PAULO.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO

PAULO, nos autos da apelação criminal nº

0267046-42.2011.8.26.0000, Comarca da LINS

(Comarca do Estado de São Paulo), em que figura

como requerente R.L.S., e comorequerido o

MINISTÉRIO PÚBLICO, com fundamento no artigo

105, inciso III, alíneas “a” e “c”, da

Constituição da República e artigos 26 e

seguintes da Lei nº 8.038/90, vem interpor

RECURSO ESPECIAL para o Colendo Superior

Tribunal de Justiça, contra o v. acórdão defls.

34/41, pelos motivos adiante deduzidos.

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1.Resumo dos Autos

R.L.S.foi denunciado e processado pelo

juízo de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca

de Lins, pela prática do art. 33, caput, da Lei

11.343/06.

Ao final do devido processo legal,

sobreveio a r. sentença condenatória, impondo-

lhe uma pena de 6anos e 9 meses de reclusão a

ser cumprida em regime fechado.

Apelou vez que inconformado.

A Colenda Décima Terceira Câmara

Criminal deste E. Tribunal, por unanimidade, deu

parcial provimento ao recurso para reduzir a

pena privativa de liberdade ao patamar de 6

(seis) anos de reclusão e multa de 600

(seiscentas) diárias, ao fundamento de que:

“na presença de duas reincidências (fls.

83 e 84) oaumento a ser efetuado é de

1/5, resultando ao paciente a pena de

seis anos de reclusão” (fls. 268 -

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negritei), mantida no mais a respeitável

sentença.

Assim, no julgamento do recurso de

apelação, o Tribunal de Justiça houve por bem

afastar uma das circunstâncias agravantes que

implicaria no status de reincidente do

recorrente, subsistindo a outra circunstância

agravante da reincidência decorrente de outra

condenação expressada às fls. 84, pela prática

do crime previsto no art. 16 da Lei 6368/76, o

qual equivaleria, hoje, a figura penal análoga

do art. 28 da Lei nº 11.343/06.

Ingressou com revisão criminal.

O 6º Grupo de Direito Criminal do

Tribunal de Justiça de São Paulo, ao julgar a

revisão criminal, proferiu a seguinte decisão:

"POR MAIORIA DE VOTOS, DEFERIRAM O

PEDIDO PARA REDUZIR AS PENAS DO

PETICIONÁRIO A 05 (CINCO) ANOS E 10

(DEZ) MESESDE RECLUSÃO E MULTA DE

583(QUINHENTOS E OITENTA E TRÊS)

DIÁRIAS, VENCIDOS O RELATOR SORTEADO, O

REVISOR E A 8a JUÍZA. ACÓRDÃO COM O 3o

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JUIZ, DES. VIÇO MANAS.", de conformidade

com o voto do (a) Relator(a), que

integra este acórdão.

Eis o fundamento pelo qual se julgou

parcialmente procedente o pedido revisional:

“Embora não se negue que comprovada a

reincidência, impõe-se a diminuição do

aumento procedido a tal título, uma vez

que a condenação anterior noticiada à

fl. 84 deu-se por violação ao art. 16 da

Lei 6.368/76, correspondente ao atual

art. 28 da Lei 11.343/06. Na atual

sistemática, não obstante preservado o

caráter criminoso da posse de

entorpecentes para consumo próprio, não

se prevê reprimenda privativa de

liberdade em caso de condenação pela

conduta. Trata-se de reflexo da política

criminal que orientou a elaboração da

Lei 11.343/06, focada na reinserção

social do viciado em tóxicos. As penas

admitidas para o tipo (advertência,

prestação de serviços à comunidade e

medida educativa) deixam clara essa

orientação.

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Nesse contexto, viola o princípio da

proporcionalidade,bem como a lógica, a

exasperação da sançãoreclusiva de delito

posterior por conta de recidiva

originada de infração que nem ao menos

estipula essa espécie de reprimenda.

Incoerente que a repercussão penal da

condenação pelo uso de drogas seja mais

gravosa do que a condenação em si. Única

a condenação apta a ensejar o aumento,

basta a fração de um sexto.

A reprimenda, portanto, é

definitivamente estabelecida em 05

(cinco) anos e 10 (dez) meses de

reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e

três) dias-multa.”

Assim, em síntese, embora o julgado

reconheça expressamente o statusde reincidente

do recorrido (“Embora não se negue que

comprovada a reincidência, impõe-se a diminuição

do aumento procedido a tal título, uma vez que a

condenação anterior noticiada à fl. 84 deu-se

por violação ao art. 16 da Lei 6.368/76,

correspondente ao atual art. 28 da Lei

11.343/06”), optou por cancelar o agravamento

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concreto decorrente de do art. 61, I, do Código

Penal.

Dispõe o art. 61, I, do Código Penal:

Art. 61 - São circunstâncias que sempre

agravam a pena, quando nãoconstituem ou

qualificam o crime:

I - a reincidência.

A matéria foi expressamente enfrentada

no V. Acórdão combatido, razão pela qual restou

demonstrado o requisito de admissibilidade do

prequestionamento.

A propósito:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO

ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.

SÚMULA 211/STJ. REEXAME DE PROVAS.

SÚMULA 7/STJ.

1.- O prequestionamento, entendido como

a necessidade de o tema objeto do

recurso haver sido examinado pela

decisão atacada, constitui exigência

inafastável da própria previsão

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constitucional, ao tratar do recurso

especial, impondo-se como um dos

principais requisitos ao seu

conhecimento. Não examinada a matéria

objeto do especial pela instância a quo,

mesmo com a oposição dos embargos de

declaração, incide o enunciado 211 da

Súmula do Superior Tribunal de Justiça.

2.-- Diante das premissas estabelecidas

no acórdão, não há como alterar a

conclusão do tribunal de origem, pois

não houve análise das circunstâncias

fáticas alegadas pelos ora recorrentes

que pudessem demonstrar a possibilidade

de confusão por sua parte.

3 (...); 4 (...);

5.- Agravo improvido.

(STJ - AgRg no AREsp 255.871/SP, Rel.

Min. SIDNEI BENETI, 3ª T., julgado em

21/03/2013).

Transcreve-se, por oportuno, para

facilitar a análise da pretensão recursal, a

íntegra do V. Acórdão combatido:

Acórdão

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Vistos, relatados e discutidos estes

autos de Revisão Criminal n° 0267046-

42.2011.8.26.0000, da Comarca de Lins, em

que é peticionário RAEAEL LAURINDO SILVA.

ACORDAM, em 6º Grupo de Direito Criminal

do Tribunal de Justiça de São Paulo,

proferir a seguinte decisão: "POR MAIORIA DE

VOTOS, DEFERIRAM O PEDIDO PARA REDUZIR AS

PENAS DO PETICIONÁRIO A 05 (CINCO) ANOS E 10

(DEZ) MESES DE RECLUSÃO E MULTA DE

583(QUINHENTOS E OITENTA E TRÊS) DIÁRIAS,

VENCIDOS O RELATOR SORTEADO, O REVISOR E A

8a JUÍZA. ACÓRDÃO COM O 3o JUIZ, DES. VIÇO

MANAS.", de conformidade com o voto do (a)

Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos

Desembargadores VIÇO MANAS, vencedor, XAVIER

DE SOUZA, vencido, ANTÔNIO MANSSUR

(Presidente), PAIVA COUTINHO, JOÃO MORENGHI,

ANGÉLICA DE ALMEIDA, BRENO GUIMARÃES E MARIA

TEREZA DO AMARAL.

São Paulo, 27 de fevereiro de 2013.

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VICO MAÑAS

RELATOR DESIGNADO

REVISÃO N° 0267046.42.2011.8.26.0000

COMARCA: LINS

VOTO N° 23.366

R.L.S. foi condenado pelo MM. Juiz de

Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de

Lins a 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20

(vinte) dias de reclusão, em regime inicial

fechado, e ao pagamento de 500 (quinhentos)

dias-multa, no valor mínimounitário, como

incurso no art.33, "caput", da Lei

11.343/06.

Apelou e a Colenda Décima Terceira

Câmara Criminal deste E. Tribunal, por

unanimidade, deu parcial provimento ao

recurso para reduzir as penas a 06 (seis)

anos de reclusão e multa de 600

(seiscentas)diárias.

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Ainda insatisfeito, o requerente

pretende desconstituir a coisa julgada por

intermédio do presente pedido revisional,

postulando o afastamento da majoração

procedida na segunda fase de fixação das

reprimendas com base em anterior condenação

porte de droga para usopróprio.

Requisitados e apensados os autos

originais, a D. Procuradoria da Justiça

opina pelo não conhecimento ou pelo

indeferimento dopedido.

É o relatório.

1. O pleito comporta conhecimento.

Procura o requerente demonstrar que, ao

considerar anterior condenação por crime não

mais apenado com pena privativa de liberdade

para elevar as sanções, a decisão contrariou

texto expresso de lei,uma das hipóteses em

que se admite a revisão.

2. As penas efetivamente merecem

correção.

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Para majorar as básicas em um sexto, o

Magistrado levou em conta a certidão de fl.

83, relativa a condenação definitiva por

furto. Em seguida, aplicou idêntico aumento

pela reincidência, identificada com fulcro

nodocumento de fl. 84 (fl. 209).

A turma julgadora da apelação

interposta, percebendo que, na verdade, as

duas certidões citadas atestam a recidiva,

excluiu o aumento procedido na primeira fase

do cálculo e elevou em um quinto as sanções

nasegunda etapa, já que duas as condenações

configuradoras da agravante.

Embora não se negue que comprovada a

reincidência, impõe-se a diminuição do

aumento procedido a tal título, uma vez que

a condenação anterior noticiada à fl. 84

deu-se por violação ao art. 16 da Lei

6.368/76, correspondente ao atual art. 28 da

Lei 11.343/06. Na atual sistemática,não

obstante preservado o caráter criminoso da

posse de entorpecentes para consumo próprio,

não se prevê reprimenda privativa de

liberdade em caso de condenação pela

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conduta. Trata-se de reflexo da política

criminal que orientou a elaboração da Lei

11.343/06, focada na reinserção social do

viciado em tóxicos. As penas admitidas para

o tipo (advertência, prestação de serviços à

comunidade e medida educativa) deixam clara

essaorientação.

Nesse contexto, viola o princípio da

proporcionalidade, bem como a lógica, a

exasperação da sançãoreclusiva de delito

posterior por conta de recidiva originada de

infração que nem ao menos estipula essa

espécie de reprimenda. Incoerente que a

repercussão penal da condenação pelo uso

dedrogas seja mais gravosa do que a

condenação em si. Única a condenação apta a

ensejar o aumento, basta afração de um

sexto.

A reprimenda, portanto, é definitivamente

estabelecida em 05 (cinco) anos e 10 (dez)

meses de reclusão e 583 (quinhentos e

oitenta etrês) dias-multa.

Frente ao exposto, defere-se o pedido

para reduzir as penas do peticionário a 05

(cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e

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multade 583 (quinhentas e oitenta e três)

diárias.

VICO MAÑAS

Relator designado

Assim, a decisão do 6º Grupo de Direito

Criminal do Colendo Tribunal de Justiça de São

Paulo negou vigência à norma expressa pela qual

a circunstância agravante deve sempre agravar a

pena imposta (art. 61, I, do Código Penal).

2. NEGATIVA DE VIGÊNCIA DO ART. 61, I, DO CÓDIGO

PENAL

No julgamento da revisão criminal, a

Corte Paulista não deixou de reconhecer o

caráter criminoso da conduta prevista no art. 28

da Lei 11.343/06, utilizado como análogo ao art.

16 da revogada Lei 6368/76.

No entanto, ainda que tenha reconhecido

o caráter criminoso da conduta, não reconheceu a

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força do julgado para agravar a pena em razão da

reincidência:

“não se prevê reprimenda privativa de

liberdade em casode condenação pela

conduta. Trata-se de reflexo da política

criminal que orientou a elaboração da

Lei 11.343/06, focada na reinserção

social do viciado em tóxicos. As penas

admitidas para o tipo (advertência,

prestação de serviços à comunidade e

medida educativa) deixam clara essa

orientação”

e ,

“nesse contexto, viola o princípio da

proporcionalidade, bem como a lógica, a

exasperação da sançãoreclusiva de delito

posterior por conta de recidiva

originada de infração que nem ao menos

estipula essa espécie de reprimenda.

Incoerente que a repercussão penal da

condenação pelo uso de drogas seja mais

gravosa do que a condenação em si.”

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Reincidência é o cometimento de uma

infração penal após já ter sido o agente

condenado definitivamente no Brasil ou no

exterior, por crime anterior. Admite-se, ainda,

porque expressamente previsto na Lei de

Contravenções penais, o cometimento de

contravenção penal após já ter sido o autor

anteriormente condenado com trânsito em julgado.

Portanto, admite-se, para efeito de

reincidência:, o seguinte quadro: a) crime

(antes) – crime (depois); b) crime (antes) –

contravenção penal (depois); c) contravenção

(antes) – contravenção penal (depois). Não se

admite: contravenção (antes) – crime (depois),

por falta de previsão legal (Código Penal

Comentado, RT, Guilherme de Souza Nucci, 8ª

edição, p. 415).

Observa-se, pois, que sem dúvida alguma,

o recorrido é reincidente em crime doloso não

específico.

Após ter sido condenado pelo art. 16 da

Lei 6368/76, com trânsito em julgado em

13/05/2005 (fls. 84), voltou a cometer crime no

mesmo setor criminoso (drogas), em 4 de agosto

de 2009.

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Assim, a configuração da condição de

reincidente não deixa qualquer dúvida quanto a

necessidade de agravamento da pena base imposta.

A Lei Antidrogas traz em seu Título III

as atividades de prevenção do uso indevido,

atenção e reinserção social de usuários e

dependentes de drogas.

Nos capítulos iniciais (I e II) deste

Título dispõe sobre medidas de cunho

administrativo visando à profilaxia do uso

indevido de drogas.

Já o capítulo III é enunciado como “Dos

crimes e das Penas”.

O capítulo, particularmente, além da

tipificação de condutas criminosas traz

disposições relativas à aplicação das penas

cominadas aos comportamentos criminosos

relacionados ao consumo pessoal de droga.

Indubitavelmente uma das mais polêmicas

normas penais incriminadoras do atual sistema

jurídico encontra-se prevista no art. 28 da Lei

Antidrogas.

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Cuida-se da grande novidade apresentada

pela Lei nº 11.343/2006 que deu ensejo a vários

debates científicos a respeito do tema.

O dispositivo estabelece duas condutas

criminosas:

I. Artigo 28, “caput” – porte ilegal de

droga para consumo pessoal: tipificada em

cinco verbos, quais sejam: adquirir, guardar

e trazer consigo, bem como transportar e ter

em depósito; e

II. Artigo 28, § 1º – cultivo para

consumo pessoal: semear, cultivar ou colher

plantas, em pequena quantidade, para a

preparação ilegal de drogas.

Essas duas figuras criminosas são

apenadas tão somente com medidas educativas, a

saber: (a) advertência sobre os efeitos da

droga; (b) prestação de serviços à comunidade;

(c) frequência a cursos e programas de caráter

educativo.

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Inicialmente, deu-se controvérsia acerca

da natureza jurídica das figuras típicas

mencionadas (art. 28 e 28, §1º, da Lei

11343/06): se se tratavam de crimes ou qualquer

outro tipo de infração.

Para o professor Luiz Flávio Gomes (Nova

Lei de Drogas Comentada, RT, p. 109-110), houve

entendimento de que houve descriminalização da

conduta, tendo a lei retirado da conduta a

etiqueta de infração penal.

Para Guilherme de Souza Nucci (Lei

Penais e Processuais Penais Comentada, RT, p.

369), as condutas são de menor potencial

ofensivo, sem deixar de se reconhecer o caráter

criminoso do fato.

Evidentemente trata-se de crime,

inclusive com a mesma capacidade dos demais, de

gerar o fenômeno da reincidência.

O simples fatos de inexistir pena

privativa de liberdade no preceito secundário

não significa, por si só, que houve intenção do

legislador infraconstitucional em

descriminalizar o comportamento.

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Trata-se de crime de perigo abstrato.

O tipo penal prescinde de ocorrência de

dano físico ou psíquico a alguém.

Pune-se o risco à saúde pública,

representado “in casu”, pelo porte da droga.

Assim, a lei presume o perigo.

O comportamento tipificado no art. 28 é

claramente difusor, propagador do vício em

drogas e, consequentemente, atenta contra a

saúde pública, objeto da tutela da Lei

Antidrogas.

Assim, sem dúvida alguma as condutas

tipificadas nos arts. 28 e 28, §1º, da Lei

11343/06, configuram, crime, e por via de

consequência, capaz de gerar na íntegra os

efeitos da reincidência.

Tem o presente, pois, a finalidade de

fazer valer a norma insculpida no art. 61, I, do

Código Penal, procedendo-se ao necessário

agravamento de pena, tal como estabelecido pelo

juízo de primeiro grau e mantido pelo Tribunal

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por ocasião do julgamento do recurso de

apelação.

3. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL

(art. 105, III, c, da

Constituição Federal)

O Colendo Supremo Tribunal Federal,

avaliando a questão da natureza jurídica das

condutas previstas no art. 28 da Lei 11.343/06,

entendeu que se trata de crime do ponto de vista

formal e material, bem como a força jurídica

para gerar a condição de reincidente.

Transcreve-se, por ser oportuno, o

julgado, para depois proceder-se a necessária

comparação analítica:

Processo: RE 430.105

Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE

Julgamento: 13/02/2007

Órgão Julgador:

Primeira Turma

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Publicação:

Parte(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE

JANEIRO JUÍZO DE DIREITO DO

X

JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DA COMARCA DO RIO DE

JANEIRO

JUÍZO DE DIREITO DA 29ª VARA CRIMINAL DO RIO DE

JANEIRO

Interessado: MARCELO AZEVEDO DA SILVA

Ementa

I. Posse de droga para consumo pessoal:

(art. 28 da L. 11.343/06 - nova lei de

drogas): natureza jurídica de crime.

1. O art. 1º da LICP - que se limita a

estabelecer um critério que permite

distinguir quando se está diante de um crime

ou de uma contravenção - não obsta a que lei

ordinária superveniente adote outros

critérios gerais de distinção, ou estabeleça

para determinado crime - como o fez o art.

28 da L. 11.343/06 - pena diversa da

privação ou restrição da liberdade, a qual

constitui somente uma das opções

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constitucionais passíveis de adoção pela lei

incriminadora (CF/88, art. 5º, XLVI e

XLVII).

2. Não se pode, na interpretação da L.

11.343/06, partir de um pressuposto

desapreço do legislador pelo "rigor

técnico", que o teria levado

inadvertidamente a incluir as infrações

relativas ao usuário de drogas em um

capítulo denominado "Dos Crimes e das

Penas", só a ele referentes. (L. 11.343/06,

Título III, Capítulo III, arts. 27/30).

3. Ao uso da expressão "reincidência",

também não se pode emprestar um sentido

"popular", especialmente porque, em linha de

princípio, somente disposição expressa em

contrário na L. 11.343/06 afastaria a regra

geral do C. Penal (C.Penal, art. 12).

4. Soma-se a tudo a previsão, como regra

geral, ao processo de infrações atribuídas

ao usuário de drogas, do rito estabelecido

para os crimes de menor potencial ofensivo,

possibilitando até mesmo a proposta de

aplicação imediata da pena de que trata o

art. 76 da L. 9.099/95 (art. 48, §§ 1º e

5º), bem como a disciplina da prescrição

segundo as regras do art. 107 e seguintes do

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C. Penal (L. 11.343, art. 30).

6. Ocorrência, pois, de "despenalização",

entendida como exclusão, para o tipo, das

penas privativas de liberdade.

7. Questão de ordem resolvida no sentido de

que a L. 11.343/06 não implicou abolitio

criminis (C.Penal, art. 107).

II. Prescrição: consumação, à vista do art.

30 da L. 11.343/06, pelo decurso de mais de

2 anos dos fatos, sem qualquer causa

interruptiva.

III. Recurso extraordinário julgado

prejudicado. Negritei

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes

autos, acordam os Ministros da Primeira

Turma do Supremos Tribunal Federal, sob a

Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence,

na confirmadade da ata de julgamento e das

notas taquigráficas, por unanimidade de

votos, em resovendo questão de ordem, julgar

prejudicado o recurso extraordinário.

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Brasília, 13 de fevereiro de

2007.

SEPÚLVEDA PERTENCE –

RELATOR

Questão de ordem em Recurso Extraordinário

403.105-9

Rio de Janeiro

Relator: Min. SEPÚLVEDA PERTENCE

Recorrente: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO

RIO DE JANEIRO Recorrido: JUÍZO DE DIREITO

DO X JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DA COMARCA DO

RIO DE JANEIRO JUÍZO DE DIREITO DA 29ª VARA

CRIMINAL DO RIO DE JANEIRO

Interessado: MARCELO AZEVEDO DA SILVA

Relatório

O Senhor Ministro Sepúlveda Pertence – RE,

a, do Ministério Público, em

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materiacriminal, contra acórdão do Tribunal

de Justiça do Rio de Janeiro, que julgou ser

o Juizado Especial o competente para o

processo e julgamento de crime de uso de

drogas, previsto à épocva dos fatos no art.

16 da Lei 6368/76 (f. 114/120)

Alega-se violação dos arts. 2º, 5º, XL, e

98, I, todos da Constituição Federal, sob o

fundamento de que, ao contrário do afirmado

pelo acórdão recorrido, o art. 2º, p. único,

da Lei 10.259/01, nos casos de competência

da Justiça estadual, não ampliou o conceito

de crime de menor potencial ofensicvo

previsto no art. 61 da Lei 9099/95.

Dada a superveniência da lei 11343/06 (art.

28, submeto à Turma questão de ordem

relativa a eventual extinção da punibilidade

(C. Penal, art. 107, III).

É o relatório.

Parte da doutrina tem sustentado que o

art. 28 da L. 11.343/06 aboliu o caráter

criminoso da conduta anteriormente

incriminada no art. 16 da L. 6.368/76,

consistente em "adquirir, guardar ou trazer

consigo, para uso próprio, substância

entorpecente ou que determine a dependência

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física ou psíquica, sem autorização ou em

desacordo com determinação legal ou

regulamentar".

Dispõe o art. 28 da L. 11.343/06, verbis:

"Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em

depósito, transportar ou trouxer consigo,

para consumo pessoal, drogas sem autorização

ou em desacordo com determinação legal ou

regulamentar será submetido às seguintes

penas:

I - advertência sobre os efeitos das drogas;

II - prestação de serviços à comunidade;

III - medida educativa de comparecimento a

programa ou curso educativo.

§1o Às mesmas medidas submete-se quem, para

seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou

colhe plantas destinadas à preparação de

pequena quantidade de substância ou produto

capaz de causar dependência física ou

psíquica.

§2o Para determinar se a droga destinava-se

a consumo pessoal, o juiz atenderá à

natureza e à quantidade da substância

apreendida, ao local e às condições em que

se desenvolveu a ação, às circunstâncias

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sociais e pessoais, bem como à conduta e aos

antecedentes do agente.

§3o As penas previstas nos incisos II e III

do caput deste artigo serão aplicadas pelo

prazo máximo de 5 (cinco) meses.

§4o Em caso de reincidência, as penas

previstas nos incisos II e III do caput

deste artigo serão aplicadas pelo prazo

máximo de 10 (dez) meses.

§5o A prestação de serviços à comunidade

será cumprida em programas comunitários,

entidades educacionais ou assistenciais,

hospitais, estabelecimentos congêneres,

públicos ou privados sem fins lucrativos,

que se ocupem, preferencialmente, da

prevenção do consumo ou da recuperação de

usuários e dependentes de drogas.

§6o Para garantia do cumprimento das medidas

educativas a que se refere o caput, nos

incisos I, II e III, a que

injustificadamente se recuse o agente,

poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a:

I - admoestação verbal;

II - multa.

§ 7o O juiz determinará ao Poder Público que

coloque à disposição do infrator,

gratuitamente, estabelecimento de saúde,

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preferencialmente ambulatorial, para

tratamento especializado."

A controvérsia foi bem exposta em artigo dos

professores Luiz Flávio Gomes e Rogério

Cunha Sanches (GOMES, Luiz Flávio; SANCHES,

Rogério Cunha. Posse de drogas para consumo

pessoal: crime, infração penal "sui generis"

ou infração administrativa? Disponível em:

http://www.lfg.com.br. 12 dez. 2006), do

qual extrato, verbis:

"Continua acesa a polêmica sobre a natureza

jurídica do art. 28 da Lei 11.343/2006 (nova

lei de drogas), que prevê tão-somente penas

alternativas para o agente que tem a posse

de drogas para consumo pessoal. A questão

debatida é a seguinte: nesse dispositivo

teria o legislador contemplado um crime, uma

infração penal sui generis ou uma infração

administrativa? A celeuma ainda não chegou a

seu final.

Os argumentos no sentido de que o art. 28

contempla um crime são, basicamente, os

seguintes:

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a) ele está inserido no Capítulo III, do

Título III, intitulado "Dos crimes e das

penas";

b) o art. 28, parágrafo 4°, fala em

reincidência (nos moldes do art. 63 do CP e

7° da LCP e é reincidente aquele que, depois

de condenado por crime, pratica nova

infração penal);

c) o art. 30 da Lei 11.343/06 regulamenta a

prescrição da posse de droga para consumo

pessoal. Apenasos crimes (e

contravençõespenais) prescreveriam;

d) o art. 28 deve ser processado e julgado

nos termos do procedimento sumaríssimo da

lei dos juizados, próprio para crimes de

menor potencial ofensivo;

e) cuida-se de crime com astreintes (multa

coativa, nos moldes do art. 461 do CPC) para

o caso de descumprimento das medidas

impostas;

f) a CF de 88 prevê, no seu art. 5º, inc.

XLVI, penas outras que não a de reclusão e

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detenção, as quais podem ser substitutivas

ou principais (esse é o caso do art. 28).

Para essa primeira corrente não teria havido

descriminalização, sim, somente uma

despenalização moderada.

Para nós, ao contrário, houve

descriminalização formal (acabou o caráter

criminoso do fato) e, ao mesmo tempo,

despenalização (evitou-se a pena de prisão

para o usuário de droga). O fato (posse de

droga para consumo pessoal) deixou de ser

crime (formalmente) porque já não é punido

com reclusão ou detenção (art. 1º da LICP).

Tampouco é uma infração administrativa

(porque as sanções cominadas devem ser

aplicadas pelo juiz dos juizados criminais).

Se não se trata de um crime nem de uma

contravenção penal (mesmo porque não há

cominação de qualquer pena de prisão), se

não se pode admitir tampouco uma infração

administrativa, só resta concluir que

estamos diante de infração penal sui

generis. Essa é a nossa posição, que se

encontra ancorada nos seguintes argumentos:

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a) a etiqueta dada ao Capítulo III, do

Título III, da Lei 11.343/2006 ("Dos crimes

e das penas") não confere, por si só, a

natureza de crime (para o art. 28) porque o

legislador, sem nenhum apreço ao rigor

técnico, já em outras oportunidades chamou

(e continua chamando) de crime aquilo que,

na verdade, é mera infração político-

administrativa (Lei 1.079/1950, v.g., que

cuida dos "crimes de responsabilidade", que

não são crimes). A interpretação literal,

isolada do sistema, acaba sendo sempre

reducionista e insuficiente; na Lei

10.409/2002 o legislador falava em "mandato"

expedido pelo juiz (quando se sabe que é

mandado); como se vê, não podemos confiar

(sempre) na intelectualidade ou mesmo

cientificidade do legislador brasileiro, que

seguramente não se destaca pelo rigor

técnico;

b) a reincidência de que fala o §4º do art.

28 é claramente a popular ou não técnica e

só tem o efeito de aumentar de cinco para

dez meses o tempo de cumprimento das medidas

contempladas no art. 28; se o mais

(contravenção + crime) não gera a

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reincidência técnica no Brasil, seria

paradoxal admiti-la em relação ao menos

(infração penal sui generis + crime ou +

contravenção);

c) hoje é sabido que a prescrição não é mais

apanágio dos crimes (e das contravenções),

sendo também aplicável inclusive aos atos

infracionais (como tem decidido,

copiosamente, o STJ); aliás, também as

infrações administrativas e até mesmo os

ilícitos civis estão sujeitos à prescrição.

Conclusão: o instituto da prescrição é

válido para todas as infrações (penais e não

penais). Elanão é típicasó dos delitos;

d) a lei dos juizados (Lei 9.099/1995) cuida

das infrações de menor potencial ofensivo

que compreendem as contravenções penais e

todos os delitos punidos até dois anos; o

legislador podia e pode adotar em relação a

outras infrações (como a do art. 28) o mesmo

procedimento dos juizados; aliás, o Estatuto

do Idoso já tinha feito isso;

e) o art. 48, parágrafo 2°, determina que o

usuário seja prioritariamente levado ao juiz

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(e não ao Delegado), dando clara

demonstração de que não se trata de

"criminoso", a exemplo do que já ocorre com

os autores de atos infracionais;

f) a lei não prevê medida privativa da

liberdade para fazer com que o usuário

cumpra as medidas impostas (não há conversão

das penas alternativas em reclusão ou

detenção ou mesmo em prisão simples);

g) pode-se até ver a admoestação e a multa

(do § 6º do art. 28) como astreintes (multa

coativa, nos moldes do art. 461 do CPC) para

o caso de descumprimento das medidas

impostas; isso, entretanto, não desnatura a

natureza jurídica da infração prevista no

art. 28, que é sui generis;

h) o fato de a CF de 88 prever, em seu art.

5º, inc. XLVI, penas outras que não a de

reclusão e detenção, as quais podem ser

substitutivas ou principais (esse é o caso

do art. 28) não conflita, ao contrário,

reforça nossa tese de que o art. 28 é uma

infração penal sui generis exatamente porque

conta com penas alternativas distintas das

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de reclusão, detenção ou prisão simples.

A todos os argumentos lembrados cabe ainda

agregar um último: conceber o art. 28 como

"crime" significa qualificar o possuidor de

droga para consumo pessoal como "criminoso".

Tudo que a nova lei não quer (em relação ao

usuário) é precisamente isso. Pensar o

contrário retrataria um grave retrocesso

punitivista (ideologicamente incompatível

com o novo texto legal). Em conclusão: a

infração contemplada no art. 28 da Lei

11.343/2006 é penal e sui generis. Ao lado

do crime e das contravenções agora temos que

também admitir a existência de uma infração

penal sui generis."

II

A tese de que o fato passou a constituir

infração penal sui generis implica sérias

conseqüências, que estão longe de se

restringirem à esfera puramente acadêmica.

De imediato, conclui-se que, se a conduta

não é crime nem contravenção, também não

constitui ato infracional, quando menor de

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idade o agente, precisamente porque, segundo

o art. 103 do Estatuto da Criança e do

Adolescente (L. 8.069/90), considera-se "ato

infracional" apenas "a conduta descrita como

crime ou contravenção penal".

De outro lado, como os menores de 18 anos

estão sujeitos "às normas da legislação

especial" (CF/88, art. 228); e C.Penal, art.

27) - vale dizer, do Estatuto da Criança e

do Adolescente (L. 8.069/90, art. 104) -,

sequer caberia cogitar da aplicação, quanto

a eles, da L. 11.343/06.

Pressuposto o acerto da tese, portanto,

poderia uma criança - diversamente de um

maior de 18 anos -, por exemplo, cultivar

pequena quantidade de droga para consumo

pessoal, sem que isso configurasse infração

alguma.

Isso para mencionar apenas uma das inúmeras

conseqüências práticas, às quais se aliariam

a tormentosa tarefa de definir qual seria o

regime jurídico da referida infração penal

sui generis.

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III

Estou convencido, contudo, de que a conduta

antes descrita no art. 16 da L. 6.368/76

continua sendo crime sob a lei nova.

Afasto, inicialmente, o fundamento de que o

art. 1º do DL 3.914/41 (Lei de Introdução ao

Código Penal e à Lei de Contravenções

Penais) seria óbice a que a L. 11.343/06

criasse crime sem a imposição de pena de

reclusão ou detenção.

A norma contida no art. 1º do LICP - que,

por cuidar de matéria penal, foi recebida

pela Constituição de 1988 como de legislação

ordinária - se limita a estabelecer um

critério que permite distinguir quando se

está diante de um crime ou de uma

contravenção.

Nada impede, contudo, que lei ordinária

superveniente adote outros critérios gerais

de distinção, ou estabeleça para determinado

crime - como o fez o art. 28 da L. 11.343/06

- pena diversa da "privação ou restrição da

liberdade", a qual constitui somente uma das

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opções constitucionais passíveis de serem

adotadas pela "lei" (CF/88, art. 5º, XLVI e

XLVII).

IV

De outro lado, seria presumir o excepcional

se a interpretação da L. 11.343/06 partisse

de um pressuposto desapreço do legislador

pelo "rigor técnico", que o teria levado -

inadvertidamente - a incluir as infrações

relativas ao usuário em um capítulo

denominado "Dos Crimes e das Penas" (L.

11.343/06, Título III, Capítulo III, arts.

27/30).

Leio, no ponto, o trecho do relatório

apresentado pelo Deputado Paulo Pimenta,

Relator do Projeto na Câmara dos Deputados

(PL 7.134/02 - oriundo do Senado), verbis

(www.camara.gov.br):

"(...)

Reservamos o Título III para tratar

exclusivamente das atividades de prevenção

do uso indevido, atenção e reinserção social

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de usuários e dependentes de drogas. Nele

incluímos toda a matéria referente a

usuários e dependentes, optando, inclusive,

por trazer para este título o crime do

usuário, separando-o dos demais delitos

previstos na lei, os quais se referem à

produção não autorizada e ao tráfico de

drogas - Título IV.

(...)

Com relação ao crime de uso de drogas, a

grande virtude da proposta é a eliminação da

possibilidade de prisão para o usuário e

dependente. Conforme vem sendo

cientificamente apontado, a prisão dos

usuários e dependentes não traz benefícios à

sociedade, pois, por um lado, os impede de

receber a atenção necessária, inclusive com

tratamento eficaz e, por outro, faz com que

passem a conviver com agentes de crimes

muito mais graves.

Ressalvamos que não estamos, de forma

alguma, descriminalizando a conduta do

usuário - o Brasil é, inclusive, signatário

de convenções internacionais que proíbem a

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eliminação desse delito. O que fazemos é

apenas modificar os tipos de penas a serem

aplicadas ao usuário, excluindo a privação

da liberdade, como pena principal (...)."

Não se trata de tomar a referida passagem

como reveladora das reais intenções do

legislador, até porque, mesmo que fosse

possível desvendá-las - advertia com

precisão o saudoso Ministro Carlos

Maximiliano -, não seriam elas aptas a

vincular o sentido e alcance da norma posta.

Cuida-se, apenas, de não tomar como premissa

a existência de mero equívoco na colocação

das condutas num capítulo chamado "Dos

Crimes e das Penas" e, a partir daí,

analisar se, na Lei, tal como posta, outros

elementos reforçam a tese de que o fato

continua sendo crime.

De minha parte, estou convencido de que, na

verdade, o que ocorreu foi uma

despenalização, entendida como exclusão,

para o tipo, das penas privativas de

liberdade.

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O uso, por exemplo, da expressão

"reincidência", não parece ter um sentido

"popular", especialmente porque, em linha de

princípio, somente disposição expressa em

contrário na L. 11.343/06 afastaria a

incidência da regra geral do C.Penal

(C.Penal, art. 12: "As regras gerais deste

Código aplicam-se aos fatos incriminados por

lei especial, se esta não dispuser de modo

diverso").

Soma-se a tudo a previsão, como regra geral,

do rito processual estabelecido para os

crimes de menor potencial ofensivo,

possibilitando até mesmo a proposta de

aplicação imediata de pena de que trata o

art. 76 da L. 9.099/95 (art. 48, §§1º e 5º),

bem como a disciplina da prescrição segundo

as regras do 107 e seguintes do C.Penal (L.

11.343/06, art. 30).

Assim, malgrado os termos da Lei não sejam

inequívocos - o que justifica a polêmica

instaurada desde a sua edição -, não vejo

como reconhecer que os fatos antes

disciplinados no art. 16 da L. 6.368/76

deixaram de ser crimes.

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O que houve, repita-se, foi uma

despenalização, cujo traço marcante foi o

rompimento - antes existente apenas com

relação às pessoas jurídicas e, ainda assim,

por uma impossibilidade material de execução

(CF/88, art. 225, § 3º); e L. 9.605/98,

arts. 3º; 21/24) - da tradição da imposição

de penas privativas de liberdade como sanção

principal ou substitutiva de toda infração

penal.

Esse o quadro, resolvo a questão de ordem no

sentido de que a L. 11.343/06 não implicou

abolitio criminis (C.Penal, art. 107, III).

V

De outro lado, à vista do art. 30 da L.

11.343/06, que fixou em 2 anos o prazo de

prescrição da pretensão punitiva, reconheço,

desde logo, a extinção da punibilidade dos

fatos.

Os fatos ocorreram há mais de 2 anos (f. 78v

e ss.), que se exauriram sem qualquer causa

interruptiva da prescrição.

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Perdeu objeto, pois, o recurso

extraordinário que, por isso, julgo

prejudicado: é o meu voto.”

Assim, observa-se da leitura do V.

Acórdão duas conclusões inquestionáveis:

a) as condutas previstas no art. 28 da

Lei 11343/06 tem natureza jurídica de crime;

b) as condutas previstas no art. 28 da

Lei 11343/06 geram o efeito da reincidência.

No julgamento do V. Acórdão combatido,

incialmente transcrito na íntegra, ficou

consignado que a conduta do art. 28 não poderia

ser levada em consideração para efeito de

agravante da reincidência:

“Naatual sistemática, não obstante

preservado o caráter criminoso da posse

de entorpecentes para consumo próprio,

não se prevê reprimenda privativa de

liberdade em caso de condenação pela

conduta. Trata-se de reflexo da política

criminal que orientou a elaboração da

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Lei 11.343/06, focada na reinserção

social do viciado em tóxicos. As penas

admitidas para o tipo (advertência,

prestação de serviços à comunidade e

medida educativa) deixam clara essa

orientação.

Nesse contexto, viola o princípio da

proporcionalidade,bem como a lógica, a

exasperação da sançãoreclusiva de delito

posterior por conta de recidiva

originada de infração que nem ao menos

estipula essa espécie de reprimenda.

Incoerente que a repercussãopenal da

condenação pelo uso de drogas seja mais

gravosa do que a condenação em si.

negritei

No paradigma lançado pelo Supremo

Tribunal Federal:

O uso, por exemplo, da expressão

"reincidência", não parece ter um

sentido "popular", especialmente porque,

em linha de princípio, somente

disposição expressa em contrário na L.

11.343/06 afastaria a incidência da

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regra geral do C.Penal (C.Penal, art.

12: "As regras gerais deste Código

aplicam-se aos fatos incriminados por

lei especial, se esta não dispuser de

modo diverso").

Assim, se por um lado, o julgado do

Colendo Supremo Tribunal Federal entende que as

condutas previstas no art. 28 da Lei 11.343/06,

além de configurareminfração penal, gera o

efeito futuro da reincidência, o v. Acórdão

combatido entendeu que em razão da falta de

previsão legal de pena privativa de liberdade no

tipo penal em estudo, não se pode reconhecer a

força jurídica para o agravamento.

Melhor, tem-se a certeza, o entendimento

do Supremo Tribunal Federal na interpretação do

dispositivo que autoriza o agravamento da pena

em decorrência da reincidência.

Assim, a nosso ver, a interpretacão dada

à lei federal pelo Colendo Supremo Tribunal

Federal deve prevalecer.

Tratando-se de dispositivo de lei

infraconstitucional, cabe ao Superior Tribunal

de Justiça uniformizar o entendimento.

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3 - PEDIDO

Em face de todo o exposto, demonstrado o

dissenso jurisprudencial quanto ao tema

destacado, aguarda o Ministério Público do

Estado de São Paulo que seja deferido o

processamento do presente recurso especial, a

fim de que, subindo à elevada consideração do

Colendo Superior Tribunal de Justiça, mereça

provimento, cassando-se o v. acórdão recorrido

(do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo),

para que seja reconhecido juridicamente o efeito

da reincidência no tocante ao crime do art. 16

da Lei 6368/76 (atual art. 28 da Lei 11343/06),

restabelecendo-se o efeito da r. sentença de 1º

grau no tocante a essa parte.

São Paulo, 8 de abril de 2013.

MÁRCIO FERNANDO ELIAS ROSA

PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA

LEVY EMANUEL MAGNO

Promotor de Justiça Designado