Terra Livre 36

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TERRA LIVRE PARA A CRIAÇÃO DE UM COLECTIVO AÇORIANO DE ECOLOGIA SOCIAL BOLETIM Nº 36 SETEMBRO DE 2011 Lagoa (eutrofizada) das Furnas, Agosto de 2011 Luís Leitão: as touradas, a caça e o vegetarianismo Desenvolvimento sustentável? Não, Obrigado! OS porquês da fome

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Boletim ecologista

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TERRA LIVRE PARA A CRIAÇÃO DE UM COLECTIVO AÇORIANO DE ECOLOGIA SOCIAL

BOLETIM Nº 36 SETEMBRO DE 2011

Lagoa (eutrofizada) das Furnas, Agosto de 2011

Luís Leitão: as touradas, a caça e o vegetarianismo

Desenvolvimento sustentável? Não, Obrigado!

OS porquês da fome

Lagoa (eutrofizada) das Furnas, Agosto de 2011

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Quem um dia escrever a história do

movimento de protecção dos animais,

nos Açores, não poderá esquecer o

nome do escritor e jornalista Luís

Albino da Silva Leitão que foi

colaborador de Alice Moderno, no

jornal “A Folha”.

Luís Leitão, que nasceu em Elvas em

1866 e faleceu em Lisboa em 1940,

trabalhou nos Correios, foi o introdutor,

em Portugal, da “Festa da Árvore”,

colaborou em centenas de jornais quer

de Portugal quer do Brasil, onde

escreveu sobre temas “como o combate

ao crime, à guerra, ao alcoolismo, ao

tabagismo, e à tauromaquia, defendeu a

educação feminina, os direitos da

criança, os direitos dos animais e o

vegetarianismo” (Wikipédia). A

corroborar o mencionado, para Alice

Moderno, Luís Leitão como

propagandista, escritor e educador

social, tinha como missão “o

nivelamento das classes sociais, a paz

universal, a emancipação da mulher, a

protecção à criança, aos velhos, aos

animais (tão úteis e sofredores) ”.

A colaboração de Luís Leitão no jornal

micaelense “A Folha” começou no dia

21 de Novembro de 1909, com um texto

sobre asilos para animais. No seu texto

sobre um existente em Berlim, o autor

destaca o modo como eram bem

tratados os animais e deu o exemplo de

um cavalo que foi lá entregue com a

recomendação para que lá permanecesse

até à sua morte, como recompensa pelo

que ele fez enquanto pôde trabalhar.

A propósito do asilo berlinense, Luís

Leitão mencionou o facto do estado

alemão colaborar com todos projectos

dos amigos dos animais, o que não

acontecia em Portugal.

Luís Leitão: as touradas, a caça e o vegetarianismo

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Passados 100 anos, o estado português

(nos Açores, a “Região” e as autarquias)

ainda não reconheceu a importância do

apoio, digno deste nome e não apenas

migalhas para “ficar bem na fotografia

ou no televisor”, que deveria dar às

associações de protecção dos animais

existentes e ainda não mandou para o

caixote de lixo da história a politica de

abate nos pomposamente chamados

Centros de Acolhimento (Canis) (1)

.

Hoje, considero que são actuais as

causas apontadas, em 1915, por Luís

Leitão para os maus tratos de que são

vítimas os animais. Assim, para o autor

referido é “a deficiente educação dos

humildes e a errada orientação mental

de alguns grandes” a causa da maioria

dos maus tratos aos animais.

De igual modo, penso que pouco se

evoluiu no que diz respeito ao

sofrimento animal pois, tal como há

quase um século, as pessoas mostram-se

muito carinhosas com o seu animal de

estimação, mas envenenam o do

vizinho, preocupam-se com uma vaca

acorrentada pelo pé, mas nada têm a

opor a um touro fechado numa “gaiola”

ao Sol durante alguns dias ou espetado

com ferros numa tourada de praça. A

razão apontada para a continuação dos

maus tratos é pura e simplesmente só

uma: os animais não sentem (2)

.

Luís Leitão, num texto de 1913, a

propósito do pretenso não sofrimento

animal escreve: “Sentem eles as

pancadas? Não se lhes dever bater; não

as sentem? Bate-se-lhes então por

desfastio, visto que as nossas mãos não

podem estar quedas…”

Num texto de 1914, Luís Leitão

menciona o facto de haver vantagem no

estreitar de relações entre crianças e

animais e faz referência ao facto de um

determinado autor considerar que “os

pais endurecem o coração dos filhos

mandando-os bater nos animais ou

batendo-lhes eles próprios diante

daqueles” e termina mencionando a

necessidade de ir “elucidando os

pequenitos sobre o mérito absoluto e

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relativo dos animais, quando não para

evitar picardias no presente, para não

dar lugar à brutalidade com que muitos

irão tratá-los quando adultos, por terem

crescido na ignorância da verdade”.

Luís Leitão, que tal como Alice

Moderno, era contra as touradas, em

vários textos publicados no jornal A

Folha, aborda a questão da sua

proibição e num deles, datado de 1910,

cita o escritor espanhol Navarro Murilo

que escreveu o seguinte: “se aplicarmos

as leis históricas às corridas de touros é

fácil deduzir que o sentido moral as

abolirá fatalmente ante o juízo dos

povos cultos, ante as grandes

transformações sociais e em virtude das

exigências do direito humano e do

aperfeiçoamento agrícola e industrial”

(3).

Quantos anos ou séculos mais vamos ter

de esperar para que deixe de haver

sofrimento animal para gozo de alguns

humanos?

Como há alguma semelhança entre os

defensores das touradas/toureiros e

caçadores, pois no dizer do veterinário

Julio Fraile, ambos dizem amar as suas

vítimas, Luís Leitão, também, por

diversas vezes mostrou a sua oposição à

caça.

A propósito dessa actividade, escreveu

ele, em 1914:

“Se não temos o direito de

espicaçar um boi para nos

divertirmos, havemos de tê-lo

para crivar de bagos de

chumbo qualquer ave, com o

mesmo intuito de fruir um

prazer.

É certo que os caçadores

matam às vezes animais

considerados nocivos.

Em absoluto não há animais

nocivos, mas suponhamos que

nos enganamos, e os há

realmente.

Não seria mais acertado, nesse

caso, procurar exterminá-los

de uma vez, sem associar a tal

acto a mais pequena ideia de

gozo?

Mas não se faz isto, e, ainda

por cima se promove a

reprodução desses animais e se

repovoam deles os sítios de

onde a caça os elimina”.

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A extrema coerência de Luís Leitão fez

com que fosse vegetariano, tendo sobre

o assunto escrito o seguinte:

"Considerada em absoluto, a

alimentação animal é nociva

debaixo de todos os pontos de

vista.

Mas sob o ponto de vista moral?

Principalmente sob esse, e tanto

assim que Tolstói afirma ser

indispensável a todo o homem

que procura aperfeiçoar-se

moralmente, privar-se de

semelhante espécie de alimento.

[…]

Acreditamos na sinceridade e

boa fé das pessoas que afirmam

ser natural a ingestão de carne,

mas nada impede que essas

pessoas se enganem

conjecturando assim.

Pensamos que se é

rigorosamente imoral, como de

facto é para os espíritos

meticulosos, o homem valer-se

da inferioridade relativa de

outros homens para os arvorar

em seus criados, impondo-lhes

obrigações vexatórias, bem mais

imoral é comer os nossos

semelhantes de quatro e duas

patas, simplesmente porque eles

não podem opor-se a tal

violência, e porque nos aprouve

classificar de agradável a sua

carne.

Não, mil vezes não! “

T.B.

* Uma versão mais curta deste texto foi

publicada no jornal Correio dos Açores, do

passado dia 10 de Agosto de 2011.

(1) É de todos conhecido o apoio dos

governantes aos mais diversos níveis às

touradas e mais recentemente aos caçadores

através da isenção do pagamento de taxas

prevista numa campanha de vacinação e

identificação electrónica de cães de caça.

(2) É este precisamente o argumento mais

utilizado recentemente pelos apoiantes ou

beneficiários das touradas, socorrendo-se

para isso de umas investigações sem

qualquer credibilidade científica de um tal

Dr. Illera. Para saber mais sobre o assunto

consultar o site:

http://www.portugalzoofilo.net/noticia.jsp?

noticia_id=119

(3) Discordo com esta afirmação, a

tauromaquia não desaparecerá por si tal

como as mudanças sociais nunca ocorreram

de forma espontânea. Temos de agir no dia-

a-dia de modo a precipitar os

acontecimentos, o nosso silêncio ou inacção

acaba por ser colaboração com os amantes

da tortura animal já que estes não perdem

qualquer oportunidade para influenciar as

outras pessoas, nomeadamente as crianças.

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1- Extractos

O que é isto de desenvolvimento

sustentável?

Abaixo, apresento diversos extractos de

textos onde há referência ao conceito,

por vezes com significados e intenções

bastante diferentes. Na segunda parte,

farei uma breve referência ao mesmo e à

contestação de que é alvo.

“Pergunte-se se a pecuária nos Açores é

sustentável e a resposta é que não,

sendo essencialmente sustentada.

Falhem os subsídios, falhem as quotas e

lá se vai o símbolo da nossa economia

não sustentável, porque não

diversificada e de dependência frágil de

conjunturas volúveis”. (Veríssimo

Borges, 2006)

“Neste diálogo fez-se um balanço das

actividades desenvolvidas, bem como as

preocupações e o papel do poder local

no apoio ao associativismo. Ambos

concordaram com a relevância desta

profissão para o desenvolvimento

sustentável das entidades, bem como o

grande desafio que teremos pela frente

quanto à desmistificação da actual

imagem das Relações Públicas” (Blogue

da Associação de Relações Públicas dos

Açores”, 7 de Setembro de 2009).

“… a existência de uma maioria

absoluta do Partido Socialista, não

permitiu dar os passos necessários para

inverter essa situação, e permitiu ao

governo Regional continuar a exercer

uma política que objectivamente nos

tem afastado da coesão e de um modelo

de desenvolvimento sustentável”

(Aníbal Pires, 27 de Novembro de

2009).

Desenvolvimento Sustentável? Não, Obrigado!

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“Empenhei-me, com o apoio

incondicional do Grupo Parlamentar do

Bloco de Esquerda, em lutas específicas

do Faial, mas sempre com o objectivo

dum desenvolvimento sustentado para

os Açores, repudiando bairrismos

doentios” (Mário Moniz, 27 de

Fevereiro de 2011).

“A protecção e a gestão integrada do

ambiente são aspectos que têm

merecido, ao longo dos anos, uma

atenção especial por parte do Partido

Socialista, constituindo um factor

fundamental para o desenvolvimento

sustentável dos Açores” (Bárbara

Chaves, 13 de Abril de 2011).

“Berta Cabral revelou que tem “a

determinação de defender a autonomia

acima dos interesses partidários, a

preocupação com o desenvolvimento

integral das ilhas num plano regional e a

opção de apostar num desenvolvimento

sustentável com respostas locais”

(Lusa/AO online, 2 de Julho de 2011).

2- O conceito

O conceito de desenvolvimento

sustentável, aquele que se refere a um

desenvolvimento que é “capaz de

satisfazer as necessidades da geração

actual sem comprometer a capacidade

de atender as necessidades das gerações

futuras”, serve para justificar tudo,

mesmo os maiores atentados e crimes

ambientais.

Se é certo que o conceito em si não é o

responsável pelos actos cometidos pelos

mais diversos tiranos e tiranetes, não é

menos certo que se trata de um conceito

que, servindo para tudo, para nada serve

por ser vago ou mesmo vazio, como se

verá a seguir:

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- O que se entende por

desenvolvimento? O crescimento

desenfreado e infinito da produção e de

bens muitos dos quais são verdadeiro

lixo que nos é impingido pela

publicidade enganosa, num planeta que

não é infinito?

- Quais são as necessidades da geração

actual e quem as define? As dos

produtores e dos consumidores ricos

dos países ricos ou as dos mais pobres

dos países pobres?

Parafraseando o pai da educação

ambiental em Portugal, o Dr. José de

Almeida Fernandes, e substituindo a

palavra ambiente por desenvolvimento

sustentável diria que “A „muleta‟

desenvolvimento sustentável é hoje

indispensável à „solidez‟ do discurso

político, seja ele do poder ou do contra-

poder. Com tal usura perdeu a força que

deveria ter, dominada que foi pelo joio

dos interesses, da mentira, da pseudo

preocupação pela adequada „gestão

solidária‟ dos bens da terra”.

Outro autor, Tabacow, corrobora o que

atrás foi mencionado, tendo afirmado

que o desenvolvimento sustentável não

serve mais do que “para emprestar

status àquilo que rotula, ainda que de

forma leviana, inadequada, equivocada

ou mesmo mal intencionada”.

Para o teólogo da libertação brasileiro,

Leonardo Boff, teimar em aplicar o

conceito de desenvolvimento

sustentável que “não é uma panaceia,

mas um placebo” “é enganar o paciente,

talvez, matá-lo”.

Teófilo Braga

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"Vivemos num mundo de abundância.

Hoje ele produz alimentos para 12 000

milhões pessoas, segundo a

Organização das Nações Unidas para a

Alimentação e Agricultura (FAO),

quando o planeta habitado 7.000.

Alimentos, há. Então, por que uma em

cada sete pessoas no mundo passa

fome?

A emergência alimentar que afecta mais

de 10 milhões de pessoas no Corno de

África voltou a colocar na actualidade a

fatalidade de uma catástrofe que nada

tem de natural. Secas, inundações,

guerras ... contribuem para o

agravamento de uma situação de

extrema vulnerabilidade alimentar, mas

não são os únicos factores que a

explicam.

A fome no Corno da África não é

novidade. A Somália está a enfrentar

uma situação de insegurança alimentar

há 20 anos. E, periodicamente, os meios

de comunicação lembram-nos, nos

nossos confortáveis sofás, o impacto

dramático da fome no mundo. Em 1984,

quase um milhão de pessoas morreram

na Etiópia; em 1992, 300.000 somalis

morreram de fome; em 2005, quase

cinco milhões de pessoas à beira da

morte no Malawi, citando apenas alguns

casos.

A fome não é uma fatalidade inevitável

que afecta certos países. As causas da

fome são políticas. Quem controla os

recursos naturais (terra, água, sementes)

que permitem a produção de alimentos?

A quem beneficiam as políticas

agrícolas e alimentares? Hoje, os

alimentos converteram-se numa

mercadoria, e sua principal função, a

alimentação, ficou em segundo plano.

Se aponta a seca, com a consequente

perda de colheitas e gado como um dos

principais desencadeantes da fome no

Os porquês da Fome

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Corno de África, mas como é que países

como os Estados Unidos e a Austrália,

que sofrem severas secas periódicas,

não sofrem de fome extrema?

Evidentemente, os fenómenos

meteorológicos podem agravar os

problemas de alimentação, mas não o

suficiente para explicar as causas da

fome. No que respeita à produção de

alimentos, o controle de recursos

naturais é a chave para compreender

quem e para quê se produz.

Em muitos países do Corno de África, o

acesso à terra é um bem escasso. A

compra massiva de solo fértil por

investidores estrangeiros (agro-

indústria, governos, fundos

especulativos...) provocou a expulsão de

milhares de camponeses de suas terras,

diminuindo a capacidade desses países

para se alimentarem. Assim, enquanto o

Programa Alimentar Mundial tenta

alimentar milhões de refugiados no

Sudão, ocorre o paradoxo de que os

governos estrangeiros (Kuwait,

Emirados Árabes Unidos, Coreia ...)

estão a comprar as suas terras para

produzir e exportar alimentos para as

suas populações.

Além disso, há que recordar que a

Somália, apesar das secas recorrentes,

foi um país auto-suficiente na produção

de alimentos até o final dos anos

setenta. A sua soberania alimentar foi

arrebatada em décadas posteriores. A

partir dos anos oitenta, as políticas

impostas pelo FMI e pelo Banco

Mundial para o país pagar sua dívida ao

Clube de Paris, forçaram a

implementação de um conjunto de

medidas de ajuste. No que se refere à

agricultura, estas implicaram uma

política de liberalização comercial e

abertura dos seus mercados, permitindo

a entrada massivo de produtos

subsidiados, como arroz e trigo de

multinacionais agro-industriais norte-

americanas e europeias, que começaram

a vender os seus produtos abaixo do

preço de custo e fazendo concorrência

desleal aos produtores locais.

Desvalorizações periódicas da moeda

somali também provocaram o aumento

dos preços das matérias-primas e

fomentaram uma política de

monoculturas para exportação,

forçando, paulatinamente, ao abandono

do campo. Histórias parecidas não

ocorreram apenas em países de África,

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mas também na América Latina e na

Ásia.

O aumento do preço dos cereais básicos

é outro dos elementos identificados

como detonador para a fome no Corno

de África. Na Somália, os preços do

milho e do sorgo vermelho aumentaram

106% e 180%, respectivamente, em

apenas um ano. Na Etiópia, o custo do

trigo subiu 85% em relação ao ano

anterior. No Quénia, o milho atingiu um

valor 55% superior ao de 2010. Uma

escalada que tornou esses alimentos

inacessíveis. Mas, quais são as razões

para a escalada de preços? Vários

indícios apontam para a especulação

financeira com matérias-primas

alimentares como uma das principais

causas.

O preço dos alimentos é determinado

nas bolsas de valores, a mais importante

das quais, em todo o mundo, é a de

Chicago, enquanto na Europa os

alimentos são comercializados nas

bolsas de futuros em Londres, Paris,

Amesterdão e Frankfurt. Mas hoje em

dia, a maior parte das compras e vendas

desses bens não corresponde a fluxos de

comércio real. Estima-se que, nas

palavras de Mike Masters, do Hedge

Fund Capital Management Masters,

75% do investimento financeiro no

sector agrícola é especulativo.

Compram-se e vendem-se matérias-

primas com o objectivo de especular e

fazer negócios, que se repercute,

finalmente, no aumento do preço dos

alimentos no consumidor final. Os

mesmos bancos, fundos de alto risco,

companhias de seguros, que causaram a

crise das hipotecas subprime são

aqueles que hoje especulam com os

alimentos, aproveitando-se de um

mercado global profundamente

desregulado e altamente rentável.

A crise alimentar à escala global e a

fome no Corno de África em particular,

são o resultado da globalização dos

alimentos ao serviço de interesses

privados. A cadeia de produção,

distribuição e consumo de alimentos

está nas mãos de algumas

multinacionais que colocam seus

interesses particulares à frente das

necessidades colectivas e ao longo das

últimas décadas e, com o apoio das

instituições financeiras internacionais,

têm corroído a capacidade os Estados

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do sul para decidir sobre as suas

políticas agrícolas e alimentares.

Voltando ao início, por que há fome

num mundo de abundância? A produção

de alimentos triplicou desde os anos

sessenta, enquanto que a população

global apenas se duplicou desde então.

Não enfrentamos um problema de

produção de alimentos, mas um

problema de acesso. Como disse o

relator da ONU para o direito à

alimentação, Olivier de Schutter, numa

entrevista ao El País: "A fome é um

problema político. É uma questão de

justiça social e políticas de

redistribuição."

Se queremos acabar com a fome no

mundo é urgente apostar noutras

políticas alimentares e agrícolas que

coloquem no seu foco as pessoas, as

suas necessidades, aqueles que

trabalham a terra e o ecossistema.

Apostar naquilo que o movimento

internacional La Via Campesina chama

de "soberania alimentar" e recuperar a

capacidade de decisão sobre aquilo que

comemos. Tomando de empréstimo um

dos lemas mais populares do

Movimento 15-M, é necessária uma

"democracia real, já" na agricultura e na

alimentação."

Esther Vivas, do Centro de Estudos

sobre Movimentos Sociais da

Universidade Pompeu Fabra, e autora

de "Del campo al plato. Los circuitos de

producción y distribución de alimentos"

Esther Vivas

Fonte:

http://sustentabilidadenaoepalavraeacca

o.blogspot.com/