Teorias Contemporâneas de Aprendizagem

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0 UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSU EM EDUCAÇÃO APONTAMENTOS E RELAÇÕES ENTRE AS TEORIAS CONTEMPORÂNEAS DA APRENDIZAGEM Disciplina: Seminário Avançado – Educação Matemática: Perspectivas contemporâneas Professora: Neiva Ignês Grando Acadêmica: Cátia Pereira da Rosa

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Apontamentos e Reflexões sobre as Teorias contemporâneas de aprendizagem

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Page 1: Teorias Contemporâneas de Aprendizagem

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UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSU EM EDUCAÇÃO

APONTAMENTOS E RELAÇÕES ENTRE AS TEORIAS CONTEMPORÂNEAS DA APRENDIZAGEM

Disciplina: Seminário Avançado – Educação Matemática: Perspectivas

contemporâneas

Professora: Neiva Ignês Grando

Acadêmica: Cátia Pereira da Rosa

Passo Fundo, setembro de 2014

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APONTAMENTOS E RELAÇÕES ENTRE AS TEORIAS CONTEMPORÂNEAS DA APRENDIZAGEM

O livro Teorias Contemporâneas da Aprendizagem, organizado pelo dinamarquês

Knud Illeris, busca apresentar as principais ideias e teorias referentes à aprendizagem e de

como ela ocorre no ser humano, através de várias visões e perspectivas, a partir dos influentes

teóricos da atualidade.

A partir dos textos lidos, segue alguns apontamentos referentes às leituras e possíveis

relações entre as teorias estudadas.

1 UMA COMPREENSÃO ABRANGENTE SOBRE A APRENDIZAGEM

HUMANA – Knud Illeris

Final do século XIX, diversas propostas de teorias da aprendizagem. Construções

teóricas, em partes compatíveis ou competitivas no mercado acadêmico da época.

Aprendizagem define-se em um processo que ocasiona a mudança permanente nas

capacidades do individuo, independente de seu amadurecimento biológico.

Principais áreas de estudo da aprendizagem:

Base: Psicológica, biológica e social;

Aprendizagem em si;

Condições internas e externas;

Possíveis aplicações.

A aprendizagem é fortemente influenciada pelo processo interno (psicológico) e o

processo externo (meio social). Grande parte das teorias de aprendizagem leva em conta

somente um desses processos, o que ocasiona uma incompletude, não cobrindo todas as

dimensões do aprender. Esses processos devem estar sempre ligados, pois um complementa o

outro.

Toda a aprendizagem envolve três dimensões:

Conteúdo: aquilo que é aprendido (conhecimentos e habilidades);

Incentivo: o que direciona a energia mental do aluno (equilíbrio mental e

sensibilidade pessoal);

Interação: impulsos que proporcionam a aprendizagem (integração pessoal);

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Na vida escolar, o ideal seria que o aluno compreenda as informações de tal forma

que consiga lembrar aquilo que lhes ensinaram e em certas condições reproduzir e utilizar

esses conhecimentos em sua vida cotidiana, ocasionando/agregando novas aprendizagens.

Para que a aprendizagem ocorra de fato, depende não só do cognitivo, mas também

do interesse e do incentivo do aluno.

Na escola, o foco está no conteúdo e não na motivação e no incentivo, sendo que os

conteúdos e o incentivo são peças cruciais para uma boa interação do individuo com seu

ambiente social, cultural e material.

O modelo do triangulo (conteúdo, incentivo, interação) é baseado no construtivismo,

onde o próprio aluno constrói e interpreta suas estruturas mentais.

Essas estruturas consistem em:

Esquemas mentais: organização cerebral – “engramas” (traços de conexões

mentais que podem ser revividos/reativados quando necessário) – recordamos

e conectamos estruturas mentalmente – aplica-se a dimensão do conteúdo.

Padrões mentais: emoções e modos de comunicação são revividos quando

lembramos situações passadas – aplica-se a dimensão do incentivo e da

interação.

Existem quatro tipos de aprendizagem. São elas:

Cumulativa ou mecânica: saber isolado, sem fazer parte de outra coisa;

Assimilativa ou adição: novo elemento (saber) é ligado a outros existentes

(disciplinas escolares);

Acomodativa ou transcendente: o individuo renuncia o que já sabe e

reconstrói algo novo. Podem ocorrer limitações em aceitar essa condição;

Significativa: que produz uma mudança na personalidade ou na organização

do self.

Nesse percurso pode haver alguns obstáculos que também devem ser levados em

consideração, pois produzem uma aprendizagem distorcida, errônea, com criação de pré-

compreensões, não aceitação de novos elementos ou aceitação distorcida, além de ausência de

aprendizagem.

Defesa da identidade genuína: situações de defesa, criada pelos indivíduos quando

necessitam mudar suas concepções acerca do que já sabem ou adquirir novos conhecimentos.

Precisam passar por uma aprendizagem transformadora (processo doloroso, morte,

desemprego, etc.) para aprender e se readaptar.

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Ambivalência: quando o indivíduo não quer aprender ou fazer algo e procura

desculpas físicas ou psicológicas para não aprender.

Resistência mental: quando não conseguem realizar o que desejam ou aprender de

forma satisfatória, então reagem com algum mecanismo psicológico de defesa.

Dentre as condições internas e externas de aprendizagem também se apresentam a

influência da inteligência (Gardner – inteligências múltiplas – processo interno) e os

problemas na transferência causados pela situação imediata – espaço de aprendizagem –

cultura e sociedade (processo externo).

O importante para compreender a aprendizagem é considerar todos os aspectos

levantados por Illeris:

As dimensões da aprendizagem;

Os tipos de aprendizagem;

As possíveis defesas ou resistências;

As condições internas e externas.

2 APRENDIZAGEM EXPANSIVA – Yrjö Engeströn

Engeströn baseia-se na teoria histórico-cultural de Vygotsky/ teoria da atividade,

combinando sua abordagem com o trabalho de Bateson – teoria de sistemas.

A teoria da atividade evoluiu por três gerações de pesquisa:

Vygotsky (teoria da atividade): focado na mediação sujeito-objeto-meio;

Leont’ev (sistemas de atividade humana) focando na diferença entre uma

atividade individual e uma atividade coletiva;

Uma terceira geração que deve buscar entender o diálogo, as perspectivas

múltiplas e as redes de sistemas de atividades em interação, criando novos

instrumentos conceituais que abrangem esses aspectos.

Cinco princípios da Teoria da Atividade:

Coletivo (relações e redes com outros sistemas): mediado por artefatos e

orientado para objetos, se realizam esse reproduzem ao gerarem ações e

operações;

Vozes múltiplas: comunidade de pontos de vista, tradições e interesses

múltiplos;

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Historicidade: considerar que os sistemas de atividade tomam forma e se

transformam ao longo do tempo;

Contradições: perturbações e conflitos como fonte de mudança e

desenvolvimento do sistema;

Transformação expansiva: reconceituação dos objetivos e motivos, para

compreender novas possibilidades além do modo de atividade existente.

As teorias comuns de aprendizagem concentram-se em identificar os conhecimentos

ou habilidades que os indivíduos adquirem, considerando essa mudança duradoura, estável e

definida no sujeito, desconsiderando que as pessoas e organizações estão em constante

aprendizado, modificando as formas de atividades e aprendendo algumas que ainda não

existem.

Bateson é um dos poucos que tem essa preocupação e aborda em sua teoria três

níveis de aprendizagem:

Aprendizagem I – aquisição de respostas que parecem corretas no contexto

em questão (respostas de sala de aula);

Aprendizagem II – currículo oculto, regras e padrões de comportamento

característicos do contexto;

Aprendizagem III – questionamento da pessoa sobre o sentido e o significado

do contexto e a partir disso busca a construção/criação de novas atividades

alternativas de aprendizagem, utilizando-se de seus próprios instrumentos,

métodos e ações.

O objetivo da aprendizagem expansiva é o envolvimento do individuo em toda e

qualquer sistema de atividade que produza novos padrões de atividades, partindo da

avaliação/questionamento do contexto onde está inserido rumo à expansão das possibilidades

de melhoria de suas atividades.

No exemplo proposto no texto, percebem-se os desafios da aprendizagem, quando o

contexto sugere um novo direcionamento para a ação.

Baseando-se nas teorias da aprendizagem situada (Lave e Wenger) e cognição

distribuída (Hutchins) buscou delimitar as comunidades de prática ou sistemas funcionais a

fim de tornar todos os sujeitos envolvidos, mais cooperativos na aprendizagem, considerando

a rede heterogênea de atores no processo e as possíveis tensões e contradições que essa

diversidade ocasiona, utilizando-se delas para promover a aprendizagem.

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A aprendizagem deve ser vista numa perspectiva complementar com o

desenvolvimento e não como processos verticais que só visam elevar os níveis de

competências nos indivíduos.

3 CULTURA, MENTE E EDUCAÇÃO – Jerome Bruner

Bruner, considerado pai da psicologia cognitiva; década de 90, cenário de mudanças

fundamentais e divergentes nas concepções de como a mente humana funciona, levando seus

defensores a criar e seguir estratégias a fim de investigar qual a melhor maneira de como a

mente funciona, através da educação.

Concepções COMPUTACIONALISMO CULTURALISMO

Visão

A mente é vista como um sistema

computacional, que visa o processamento de

informações (organização, classificação,

armazenamento, analise e recuperação de

dados).

A mente não existe sem

cultura, pois ela influencia as

mentes dos indivíduos,

atribuindo significados as

coisas e as situações.

Foco

Interessa-se por qualquer forma de organizar

e utilizar as informações, independente da

razão pela qual acontece esse

armazenamento das informações.

Interessa-se em como os

indivíduos, inseridos em suas

comunidades culturais,

produzem e transformam

significados.

Pedagogia

Repetição – poder de associação e formação

de hábitos.

Diálogo socrático –

capacidade de reflexão e

discurso sobre a natureza das

verdades.

Objetivo

Redescrição dos sistemas de funcionamento

do fluxo das informações a fim de produzir

resultados sistemáticos e previsíveis (mente

humana). Regidos por regras que

determinam o que fazer com os dados

recebidos.

Criação de significados com

princípios interpretativos e

reflexivos, repletos de

ambiguidades.

Não existem regras comuns a todos os Criação de significados

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Dificuldade sistemas, principalmente se tratando de seres

humanos. As regras computacionais não

compreendem significados imprevistos.

incomensuráveis.

Uma teoria da mente, para ser interessante e aplicável à educação necessita indicar o

tipo de mundo necessário que permite utilizar a mente de modo efetivo e satisfatório.

Questões educacionais abordadas nas concepções computacionista e culturalista:

COMPUTACIONALISMO CULTURALISMO

Três estilos diferentes:

1. “Reafirmar” teorias aprendizagem

clássicas de uma forma computável

(reformulação de teorias).

2. Nova descrição, em termos

computacionais, do processo ocorrido

na mente do sujeito na resolução de

problemas ou aprendizagem de um

novo conhecimento. (análise de

protocolos e aplicação da teoria,

identificando-os para o sentido

computacional).

3. Programas computacionais

adaptativos – reduzir complexidades

para alcançar maior “encaixe” com

um critério (ideia central).

A educação não é dissociável da cultura,

possui duas tarefas principais:

1. Nível macro: cultura como sistemas

de valores, direitos, deveres,

oportunidades.

2. Nível micro: como os seres

constroem situações e se adaptam ao

sistema (custo pessoal).

Preocupação com a intersubjetividade dos

indivíduos.

As emoções e os sentimentos devem ser considerados nos processos de criação de

significados e construção da realidade, principalmente sendo parte integrante e efetiva na

educação e na construção do self.

4 A PRÁTICA DA APRENDIZAGEM – Jean Lave

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Teoria da prática cotidiana, conceituação das relações entre as pessoas em sua ação

no mundo social e suas atividades.

Os conceitos sobre o mundo social não podem ser analisados fora do contexto das

pessoas inseridas, agindo e interagindo em suas atividades.

A aprendizagem situada sempre envolve mudanças nos conhecimentos dos

indivíduos e também em suas ações, portanto essas mudanças se configuram como

aprendizagem.

As teorias convencionais de aprendizagem frequentemente descontextualizam as

formas de conhecimento e de transmissão do conhecimento, distanciam a experiência da

mente do aluno, sendo que na teoria da atividade situada essa descontextualização se torna

uma contradição de termos. Nesse caso a ação, o pensamento, os sentimentos valores e formas

histórico-culturais não se separam, mantendo a ligação entre a mente e o mundo vivenciado.

PESSOAS MUNDO SOCIAL (SOCIEDADE)

Atividades (ação e interação) Contexto (inconstante)

Mudanças no conhecimento e na ação

APRENDIZAGEM

Alguns questionamentos que preocupam as teorias cognitivas tradicionais:

Distinguir a aprendizagem humana de sua atividade, pois as relações do

sujeito com o conhecimento em atividade não mudam, exceto em períodos

especiais de desenvolvimento. Dificuldade em agrupar a prática cotidiana

com os conhecimentos institucionais, para produzir aprendizagens;

Não reconhecer atividades múltiplas com diferentes objetivos e

circunstâncias do saber em diversas ocasiões, considerando também a

dimensão emocional do individuo;

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Considerar os diferentes contextos e a heterogeneidade de atores (não se deve

generalizar, tampouco pressupor a uniformidade de opiniões e conhecimentos

– desafios à pesquisa que depende da homogeneidade);

O fracasso em aprender é visto nas teorias cognitivas como uma recusa por

parte do individuo em se envolver com a aprendizagem. Na visão alternativa

o erro e o fracasso são vistos como processos sociais normais e ativos,

dependendo do ponto de vista social que se adota ocorrendo devido a

embaraços, ansiedade entre outros fatores.

Aprendizagem situada caracteriza-se pela inteligência em constante estado de

mudança, no âmbito social, cultural e histórico, envolvendo pessoas múltiplas, com diferentes

posições sociais, razões e interesses onde a produção do fracasso faz parte de uma ação

coletiva rotineira e responsável pela produção de um conhecimento comum.

5 UMA TEORIA SOCIAL DA APRENDIZAGEM – Etienne Wenger

Constitui um nível coerente de análise e requer um modelo conceitual de princípios

para compreender e propiciar a aprendizagem.

Teoria social da aprendizagem

Processo individual

Participação social

Significado – prática – comunidade – identidade

Processo de aprender e de conhecer:

Comunidades de prática – todos pertencem a diversas delas (casa, trabalho, amigos,

família), fazem parte do nosso cotidiano (informal).

Benefícios do foco na participação – aprender significa:

Indivíduos: se envolver e contribuir com as práticas;

Comunidades: refinar a pratica e garantir novas gerações de membros;

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Organizações: manter as comunidades interconectadas;

Aprendemos sempre:

Em momentos da vida (família);

Em questões sociais que exigem nosso foco (escola);

Momentos que ocorrem resultados concretos (reconhecimento social -

sociedade);

A teoria deve servir como um guia para atentar aos aspectos relevantes como

dificuldades e problemas.

Envolver os estudantes em praticas significativas, acesso aos recursos e promover a

participação em comunidades, bem como estimular a contribuição de práticas inventivas dos

sujeitos das comunidades, valorizando o trabalho em construção e a promoção da

aprendizagem nesses espaços.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das leituras e da análise dos respectivos textos sobre as teorias de

aprendizagem, é possível considerar que todas elas carregam em sua essência algo

semelhante, algumas em maior grau, outras em menor, mas todas com algum sentido de

ligação.

Falar sobre os processos cognitivos do ser humano não é tarefa fácil, mas todos os

pesquisadores, de uma forma ou de outra conseguem contemplar em suas teorias, as

especificidades inerentes ao sujeito, no que se refere aos seus sistemas de desenvolvimento da

aprendizagem e na produção de conhecimento.

É fundamental salientar que baseado nessas teorias, é possível identificar que as duas

maiores dimensões que regem a aprendizagem humana são os aspectos social e o psicológico,

pois é através dessas duas correntes que se produz e se transformam conhecimentos advindos

de inúmeras fontes.

Além disso, também se faz possível observar que há uma ligação forte entre as

teorias, quando estas se direcionam em algum momento para os aspectos histórico-culturais

dos indivíduos, mostrando a importância de voltar o olhar e considerar o sujeito em sua

filogênese, ontogênese e sociogênese, salientando a importância do contexto e principalmente

das interações que esse sujeito tem e produz ao longo de sua existência.

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Esses aspectos é que configuram a subjetividade dos indivíduos e norteiam as

mudanças necessárias para a evolução e desenvolvimento da espécie, provocando a

aprendizagem em diversas esferas da vida humana.

No entanto, se faz necessária, a partir dessa reflexão, ter uma visão mais

emancipadora dos sujeitos, promovendo sua autonomia frente às questões cotidianas e

principalmente na construção de suas convicções e conceitos, com vistas à obtenção de uma

aprendizagem mais significativa e comprometida com o desenvolvimento integral dos

educandos.

7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Teorias contemporâneas da aprendizagem/Organizador, Knud Illeris; tradução: Ronaldo

Cataldo Costa; revisão técnica: Francisco Silva Cavalcante Junior. – Porto Alegre: Penso,

2013.