Tc sem titulo sem gênero sem preconceito priscila setter froes
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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL – ULBRA CANOAS / RS
UNIDADE ACADEMICA DE GRADUAÇÃO
CURSO DE LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS
Priscila Setter Fróes
S/ título, S/ gênero, S/ preconceito
Canoas, 11 de Junho de 2014
Priscila Setter Fróes
S/ título, S/ gênero, S/ preconceito
Trabalho de curso apresentado como pré-
requisito parcial para a obtenção de título
acadêmico de Licenciado em Artes Visuais,
pelo curso de Licenciatura em Artes Visuais,
pelo Curso de Licenciatura em Artes Visuais da
Universidade Luterana do Brasil, sob
orientação dos professores Dr. Celso Vitelli,
Me. Ana Lucia Beck e Me. Renato Garcia
Canoas, 11 de Junho de 2014
Universidade Luterana do Brasil - ULBRA/Canoas/RS. Curso de Licenciatura em Artes Visuais Estágio em Artes Visuais IV
ATA Nº 100/2014
Ao décimo primeiro dia de Junho de dois mil e quatorze, no horário das 19:40
horas, fez-se a apresentação pública do Trabalho de Curso intitulado “S/ TÍTULO, S/
GÊNERO, S/ PRECONCEITO”, nível de Graduação — da prática de Ensino em Arte
desenvolvida no Ensino _____________________ pela acadêmica Priscila Setter
Fróes, aluna do Curso de Licenciatura em Artes Visuais da Universidade Luterana
do Brasil, sendo a mesma avaliada pelos professores: Ma. Marina Reidel e Me.
Renato Garcia dos Santos.
Realizada a apresentação, a Comissão de Avaliação conferiu à mesma NOTA
____. Esta nota será confirmada como grau final da disciplina de Estágio em Artes
Visuais IV, mediante a realização das correções indicadas pela Comissão de
Avaliação e a entrega da versão final impressa do Trabalho de Curso.
___________________________________________________________________
Me. Renato Garcia dos Santos – Prof. Orientador do Estágio em Artes Visuais IV
___________________________________________________________________ Ma. Marina Reidel – Professora Examinadora
___________________________________________________________________ Me. Renato Garcia dos Santos – Coordenador do Curso
de Licenciatura em Artes Visuais
Quero agradecer a D’us por ter permitido eu chegar aonde cheguei. Quero dizer as pessoas que são contra o fato de eu ser transexual: se eu cheguei aqui, diante de tantas adversidades, é porquê D’us está do meu lado e minha vitória nesta etapa de minha educação é a prova disto. Eu faço parte deste mundo e sou igual a qualquer outro Ser Humano.
Nasci cromossomicamente XY. Tornei-me mulher. Mulher, moça, menina, fêmea, feminina; sempre tive interesse por tudo que envolvesse esse universo, o meu universo... (Flavia Leme de Almeida, com adaptação).
RESUMO
O presente trabalho foi desenvolvido a partir da pesquisa e aplicação do projeto educativo de ensino “S/ título; S/ gênero; S/ preconceito” envolvendo alunos do primeiro ano do ensino médio na Escola Estadual Presidente Arthur da Costa e Silva pertencente a rede publica do Rio Grande do Sul, no município de Porto Alegre. O tema a ser desenvolvido no projeto foi “corpo como escultura”, ou seja, uma reflexão baseada em autores como H. W. Janson, E. H. Gombrich e Umberto Eco, sobre a forma como a figura humana é representada ao longo dos séculos. Este tema foi escolhido através de uma preocupação com a educação como base principal para a formação de cidadãos ativos e reflexivos dentro da sociedade brasileira. O objetivo foi desenvolver a capacidade de reflexão dos alunos frente ao preconceito social contra as diversas manifestações corporais, disseminando dentro de nossa sociedade o respeito ao próximo e a igualdade de gêneros. A metodologia de ensino foi propor a reflexão sobre o que vivemos na contemporaneidade com reproduções de imagens de séculos atrás, dentro das artes visuais, procurando desenvolver a capacidade imaginativa e critica dentro de aulas teóricas e praticas. Além disso, diversos outros autores, como Ana Mae Barbosa e Libâneo deram base para o planejamento das aulas ministradas. Resultaram da pratica de ensino diversas respostas comportamentais dos alunos que não estavam previstas inicialmente. Importante foi que esse comportamento inesperado levou ao tom correto de um projeto que parecia não estar bem definido. Isso me levou a pensar no real papel que um educador de artes visuais tem dentro de uma sala de aula.
Palavras-chave: Preconceito. Corpo. Gênero
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................ 8
1. ESCULTURA DA FIGURA HUMANA ............................................................................................. 15
1.1. ESCULTURA GREGA ................................................................................................................................ 15
1.2. ESCULTURA MEDIEVAL A GÓTICA. ......................................................................................................... 18
1.3. ESCULTURA RENASCENTISTA ................................................................................................................. 21
1.4. ESCULTURA BARROCA ............................................................................................................................ 25
1.5. ESCULTURA ROMÂNTICA A REALISTA. ................................................................................................... 32
2. RECONHECIMENTO DO ESPAÇO ESCOLAR. ............................................................................ 38
2.1. DADOS GERAIS DA ESCOLA OBSERVADA .............................................................................................. 38
2.2. OBSERVAÇÕES SILENCIOSAS. ................................................................................................................. 38
2.3. ANÁLISE DAS OBSERVAÇÕES SILENCIOSAS .......................................................................................... 42
2.4. ANÁLISE DO QUESTIONÁRIO RESPONDIDO PELA PROFESSORA ............................................................ 44
2.5. ANÁLISE DO QUESTIONÁRIO RESPONDIDO PELOS ALUNOS. .................................................................. 46
3. PROJETO E PRÁTICAS DE ENSINO EM ARTES VISUAIS. ........................................................ 49
3.1. DADOS GERAIS DA ESCOLA. ................................................................................................................... 49
3.2. DADOS GERAIS DO PROJETO DE ENSINO. .............................................................................................. 49
3.2.1. Justificativa .............................................................................................................................. 50
3.2.2. Objetivo geral. ......................................................................................................................... 50
3.2.3. Conteúdos ................................................................................................................................ 51
3.2.4. Metodologias ........................................................................................................................... 51
3.3. DENTRO DA SALA DE AULA. ................................................................................................................... 51
3.3.1. Primeiro encontro .................................................................................................................. 51
3.3.3. Terceiro encontro ................................................................................................................... 69
3.3.4. Quarto encontro ..................................................................................................................... 76
3.3.5. Quinto encontro ...................................................................................................................... 84
3.3.6. Sexto encontro ........................................................................................................................ 89
3.3.7. Sétimo encontro ................................................................................................................... 100
3.3.8. Oitavo encontro .................................................................................................................... 112
3.3.9. Nono encontro ...................................................................................................................... 120
3.3.10. Décimo encontro .................................................................................................................. 127
3.3.11. Décimo primeiro encontro ................................................................................................. 133
3.3.12. Décimo segundo encontro................................................................................................. 141
3.3.13. Décimo terceiro encontro .................................................................................................. 150
4. CONCLUSÃO ................................................................................................................................ 162
REFERÊNCIAS ................................................................................................................................... 170
APÊNDICES ........................................................................................................................................ 174
8
Introdução
Muito prazer, meu nome? Priscila Setter Fróes.
A experiência que irei relatar ao longo deste trabalho ocorreu em uma escola
estadual de ensino médio chamada de Colégio Estadual Presidente Arthur Costa e
Silva, localizada no bairro Sarandi, na cidade de Porto Alegre, no estado do Rio
Grande do Sul. A turma contava com aproximadamente 30 alunos com idades entre
13 a 16 anos. Por ser uma escola estadual, contava com alguns alunos de baixa
renda. Foi observado que a própria professora comprava os materiais em artes a
serem utilizados devido a esta dificuldade.
A partir das observações efetuadas ao longo dos estágios no ensino
fundamental e médio, percebi que muitas vezes a escultura era deixada de lado,
talvez pelo alto custo e tempo de dedicação e execução que as mesmas exigem, ao
contrário de desenhos ou pinturas, que são mais rápidas de se realizar, isso se
refletiu até mesmo nos questionários. Os alunos preferiam trabalhos em pintura ou
desenhos à escultura. Alguns alunos pediram algo na linguagem tridimensional,
como forma de ter algo novo a se fazer nas aulas de artes, então me baseando
nesses pedidos determinei a linguagem que seria trabalhada dentro da sala de aula.
A escolha do tema de pesquisa surgiu do fato de eu ser uma mulher
transexual, ou seja, de antes vir a me tornar Priscila ser José Carlos Fróes. Nós
transexuais levamos a moldagem do corpo muito a sério, e dentro do universo
artístico, a escultura é o que chega mais próximo desse desejo.
O tema consiste em pesquisar as diferentes formas de representação da
figura humana durante a história da arte até o século dezenove. Pesquisei e
apresentei quais eram os pensamentos que se tinha a respeito da figura humana
naquela época e porque tais representações eram realizadas. Desde a visão de
saúde e corpo malhado dos gregos. Comecei pesquisando a partir da arte grega,
chegando até o Realismo no final do século dezenove. Utilizei E. H Gombrich e
Janson para dar base ao cenário artístico e político de casa época, usei
conhecimentos de Umberto Eco para tratar sobre o belo em cada período e Georges
9
Duby entre outros autores para falar especificamente da escultura ao longo da
história ocidental.
Os principais artistas citados foram Michelangelo e Gian Lorenzo Bernini, dois
escultores que podem ser equiparados em qualidade artística. O desenvolvimento
básico de todo trabalho partiu da figura humana, aliada a linguagem tridimensional.
Esse trabalho surgiu a partir da existência de José Carlos Fróes, enquanto ele
estava em um processo chamado de Crisálida. Os eventos relatados nos realizados
são todos frutos da experiência de Priscila Fróes, sua forma madura e adulta.
Houve dois projetos de ensino, o primeiro foi aplicado no ensino fundamental,
no qual pretendi trabalhar com a figura humana, baseando justamente no tema de
pesquisa. Apliquei esse projeto, pois pouco se conversava e trabalhava com
escultura em sala de aula, os alunos não possuíam, em sua maioria, a experiência
com o desenho ou escultura da figura humana. Meu projeto tinha como objetivo
desenvolver nos alunos a expressividade e os retorcidos movimentos dentro da
escultura barroca.
O segundo projeto de ensino foi aplicado no ensino médio. O projeto trabalha
com a comunidade escolar a partir da reflexão dos alunos, de que o preconceito
social contra as diversas formas de manifestações corporais estão equivocadas e
que nossa cidade poderá ser um local melhor de conviver se este tema forma
abordado. Tem como objetivo criar desenvolver reflexões dentro da mente dos
alunos e que os mesmos por sua vez, possam disseminar isso aos seus pares.
A explicação para dois projetos de ensino tão distintos é de que, no ensino
fundamental, não senti necessidade de trabalhar em cima do preconceito, primeiro,
porque a professora titular de artes, chamada Marina Reidel é uma professora
atípica, ela é transexual assim como eu. Durante minhas idas a escola percebi que
ela usava as aulas de artes mais como uma forma de desenvolver nos alunos uma
reflexão de que preconceito não é uma atitude que deva ser perpetuada. Então
como ela tratava deste tema em sala de aula, acreditei que poderia ficar distante
disto e desenvolver outro trabalho no estágio que não me expusesse tanto. Não
pretendia ser identificada como uma professora transexual.
10
Por fim, foi no ensino médio que percebi que não devia me esconder.
Consegui enxergar que há necessidade de se trabalhar sobre o corpo e não a figura
humana. Percebi que devido a minha transexualidade e o preconceito que sofro em
nosso país, estava na hora de eu erguer uma bandeira, e esta seria a desconstrução
das diversas faces do preconceito. As aulas trataram do negro, do gordo, do travesti
e etc., pois vivemos em uma sociedade em que muito se vê, mas pouco se comenta,
e quando é realizado um comentário é através de pequenas ofensas.
Então será possível notar a diferença entre o capitulo de pesquisa e o projeto
de ensino para o ensino médio. Justamente pela mudança de gênero social que
José sofreu. Nisto, entrará Priscila que se esqueceu da figura humana e passou a
falar de corpo com seus alunos, mudança esta que deve-se a uma concretização de
sua própria figura, na qual ele deixa de apenas idealizar e passa a vivenciar.
Para Priscila, a figura deixa de ter importância, pois agora, tem autonomia
sobre seu corpo e quer entendê-lo de outras maneiras. Ele se torna ela, e ao mesmo
tempo se materializa como a figura outrora admirada, como uma escultura. Aquele
ser distante, em pedra, frio e intocável, passa a ser de carne.
Foram ministradas aulas em Artes Visuais no Ensino Fundamental e Médio. A
escola escolhida para ministrar no ensino fundamental foi a Escola de Ensino
Fundamental Rio de Janeiro, situada no bairro Cidade Baixa em Porto Alegre no ano
de 2012. A turma era de oitava série no turno da manhã, contava com a professora
titular chamada Marina e possuía 18 alunos. Possuíam em média 18 anos. Como
estavam em uma escola estadual sua situação econômica não era muito favorável,
sendo assim foi necessária a compra dos materiais para os alunos.
No ensino fundamental, através de aulas expositivas, dialogadas e práticas,
desenvolvi conteúdos, tais como desenho e escultura da figura humana, nas quais
tinham como principais objetivos, preparar à partir de desenhos de observação, o
olhar dos educandos para quando fossem desenvolver um trabalho em escultura.
Para que os objetivos fossem alcançados, realizamos uma série de trabalhos
práticos. Começando com uma atividade em escultura de observação, à partir de um
modelo vivo, no qual muitos alunos sentiram dificuldades, mas apresentaram bons
11
resultados. Já que, segundo eles, este exercício havia sido o primeiro exercício de
observação em artes que eles haviam realizado em suas vidas.
Após esse exercício prosseguimos com outras atividades como desenho de
observação, no qual muitos alunos se surpreenderam com o que eles conseguiam
realizar. Outros alunos já não se sentiam a vontade de realizar tal atividade, diziam
que ela era massacrante, difícil de ser realizada.
Em outra aula a ser mencionada foi a de recorte e colagem, na qual criaram
personagens, que intimamente estavam ligados a eles, como um alter ego. Eles se
divertiram nesta atividade e diferente das aulas de observação, se sentiram mais
livres e os resultados foram ótimos. Após a realização da atividade, eles falaram um
pouco sobre quem eram esses personagens. Um trabalho que marcou muito foi o
trabalho de um aluno que juntou figuras de um corpo masculino com o feminino,
uma pena ele não ter conseguido falar sobre seu trabalho, ficou com vergonha.
Como trabalho final, eles realizaram uma escultura em argila, na qual
deveriam transformar seus personagens bidimensionais em tridimensionais. No
inicio os alunos tiveram dificuldade, mas trabalhando em conjunto conseguiram obter
bons resultados, além do que esperavam deles.
Ao final realizamos uma grande conversa sobre sua evolução no trimestre.
Ficaram surpresos ao ver o quão bons eles eram com o desenho e escultura. Uma
aluna em especial se disse surpresa e que nunca pensou que tivesse talento para
atividades que envolvessem artes.
Ao final do projeto, pude perceber que embora alguns não tenham atingido os
objetivos propostos, muitos deles evoluíram rapidamente em apenas meio trimestre.
Como prova disso, ao final foi realizada uma pequena exposição dentro da
sala de aula na qual os alunos puderam fazer uma retrospectiva de sua evolução
dentro das aulas de artes e depois uma aula em que falamos sobre o corpo dentro
da arte e o que ele poderia representar para a sociedade na qual vivemos.
Já a escola de ensino médio se localiza no bairro Sarandi e se chama Colégio
Estadual Presidente Arthur Costa e Silva, o nome da professora titular em arte é
Claudia e os alunos possuíam em média de 13 a 16 anos. Assim como a turma do
12
ensino fundamental, a escola por ser estadual, contava com alguns alunos de baixa
renda. Foi observado que a própria professora comprava os materiais em artes a
serem utilizados.
Por fim, no ensino médio, através de aulas expositivas, dialogadas e práticas,
desenvolvemos conteúdos como, diálogos sobre o corpo na arte, preconceito social,
desenho e escultura do corpo humano. Nas quais tinham como principais objetivos
desenvolver ou mesmo aprimorar o pensamento dos alunos sobre o preconceito
social ligado o corpo.
Para que os objetivos fossem alcançados realizamos uma série de atividades
dialogadas, interrogativas, e práticas, partindo de uma atividade, em que exibi
imagens de diversas reproduções de obras de arte. Na qual eu esperava que os
alunos comentassem bastante e pudéssemos falar sobre corpo, então um aluno fez
um (in)feliz comentário acerca da mulher negra. Foi a partir desta atividade que pude
ter certeza de estar no caminho certo do meu projeto de ensino.
Após essa atividade, tudo ficou mais claro, por isso, em outra aula realizamos
atividade em recorte e colagem, no qual deviam retratar corpos que sofrem com o
preconceito. Os resultados foram pouco criativos, tendo em vista que tiveram 3 aulas
para desenvolvê-los.
Mesmo a atividade anterior tendo obtido um mau resultado, em outra
conseguimos desenvolver um diálogo em que pude interligar diretamente arte, corpo
e preconceito. Diferente das outras atividades, a maioria dos alunos tiveram
participação. Falaram sobre o que pensavam sobre arte, sexo, sexualidade e
preconceito.
Depois realizamos uma atividade na qual deviam desenvolver um corpo
tridimensional, este corpo devia se relacionar com o tema preconceito, ou seja,
retratar o negro, o homossexual, o deficiente, enfim, qualquer pessoa dentro da
sociedade que sofra com preconceito devido ao seu corpo.
Infelizmente durante o estágio não foram atingidos resultados relevantes
conforme o proposto nos planejados, diferente do projeto de ensino no ensino
fundamental.
13
Então através deste trabalho, será possível identificar as dificuldades pelas
quais Priscila Fróes passou. Sua transexualidade foi fator fundamental para o
processo de aprendizagem. É partir disto que foi possível identificar o quanto a
transexualidade e traumas passados influem no presente e consequentemente no
modo como as aulas eram ministradas, com medo, receio. Quando menciono
sucesso, não significará que os objetivos propostos para o projeto foram alcançados,
pelo contrário, as marcas que foram gravadas a fogo e ferro na pele de José Carlos
ainda permanecem em Priscila, embora pareçam diminuir com o tempo.
14
CAPÍTULO 1
ESCULTURA E FIGURA HUMANA
15
1. Escultura da Figura Humana
1.1. Escultura Grega
“Nosso instinto primitivo está ligado a criar corpos irreais, nos compelem a
exagerar e suprimir parte dos corpos” (Como a Arte Fez o Mundo – Mais Humano
que Humano; BBC, 2005).
Estudado de forma infindável por milênios, o corpo humano talvez seja a
maior forma de representação na arte. Por onde quer que passemos pela história da
arte, ali esta ele, implacável, colossal e humano. Mas por que tanta vontade de se
representar? Talvez a resposta para tamanha vontade seja obviamente a
curiosidade humana, amamos nossos corpos e de outros, e é impossível conceber a
arte sem essa representação. Para não estender muito esse trabalho, é necessário
começarmos por onde grande parte da arte ocidental se fundamentou, a arte grega.
A Grécia para o Ocidente foi a fundação de nossas instituições, consideramos
a cultura clássica como nossa fundação . Segundo Gombrich (1999, p. 78) “os
egípcios tinham baseado sua arte no conhecimento. Os gregos começaram a usar
os próprios olhos”, ou seja, os gregos começaram a observar mais como era
realmente o corpo humano e a partir de formulas pré existentes oriundas dos
egípcios e dos assírios eles começaram a desenvolver uma nova forma de
representação do corpo humano.
16
Kouros, 615-590 a.c
Disponível em < http://historiarte.ning.com/photo/kouroirmaos-cleobis-e?context=user > acesso em 28/05/2014
Na imagem acima podemos observar que partes que ligam o corpo, como
joelhos e cotovelos estão em ênfase, comparando com os egípcios, essa linha
divisória não existia. Obviamente a obra ainda se assemelha muito com uma
escultura humana vinda do Egito, pesada, densa, mas com o diferencia de
movimento nas pernas, como se ela quisesse andar sozinha por ai, esta atitude não
parecia existir na escultura egípcia.
Então a partir dessa observação a arte grega não pode mais ser contida. A
cada nova descoberta que um escultor fazia era logo adotada por outro, uns
aprendiam como deixar a escultura mais viva ou então outros como criar um sorriso.
Lógico que muitas falhas em busca dessa representação perfeita aconteceram.
Diferente da arte grega que era mais por experimentação, a arte egípcia, por certo,
era mais segura de se seguir, mas os gregos não pararam, aprendiam com seus
erros e logo tentavam novamente. As antigas fórmulas de retratar toda a estrutura
do corpo fez com que os artistas gregos se empenhassem muito na exploração da
17
anatomia humana, conhecendo suas articulações, ossos, músculos para assim criar
imagens fidedignas (GOMBRICH, 1999).
É engraçado pensarmos que o que vemos hoje das antigas estatuas gregas
não passam de replicas, pois devido a ascensão do Cristianismo no século III d.C
muitas esculturas foram destruídas em nome de um novo Deus. Mesmo as réplicas
podem enganar nosso olhar, podemos olhar a arte grega como fria e sem vida
quando na verdade não eram assim. Existem algumas descrições de como seriam
tais esculturas, como por exemplo a estátua de Atena: possuía 11 metros de altura,
coberta por pedras preciosas, com sua armadura e vestes de ouro, sua pele de
marfim. Sem esquecer seus olhos feitos com pedras preciosas e sua armadura toda
incrementada de joias coloridas (GOMBRICH, 1999). O Partenon é um símbolo do
povo clássico, foi muito documentado e demasiadamente adornado por estatuárias
figurativas. Na visão do artista naquela época, a obra que encarnasse o ideal
deveria ser aceita a seguida por outros.
Antiga copia em pequena escala de Atena do Partenon. Antigo Museu Nacional de Atenas.
(Fonte: DUBY, 2006, p. 27)
18
Para Fullerton (2002, p.16) “a arte grega é idealista, ao mesmo tempo em que
se preocupa com a variabilidade da experiência humana”. Na antiga Grécia as
estatuas eram criadas a partir de encomendas, de cunho particular ou público, mas
todas possuíam algum propósito bem definido, seja na arquitetura, na funerária ou
de forma votiva. Infelizmente não existem muitas informações escritas sobre a
escultura grega e ainda sim os poucos textos encontrados revelam pouca
informação. Diferentemente de outras culturas os gregos não faziam diferença entre
a escultura de um Deus ou de um mortal1. Então, para diferenciá-los, é preciso saber
em que ambiente elas se encontram, somente assim podemos saber o que ela
supostamente pode representar (Philippe Bruneau, 2006).
1.2. Escultura Medieval a Gótica.
Foi no ano de 311 D.C que o imperador Constantino oficializou a Igreja Cristã
como um poder no Estado. Quando a Igreja alcançou o poder, ela começou a
repensar o modo de como retratar a arte para os fiéis. Durante este período a
escultura fora deixada de lado dos novos templos (denominados basílicas) para não
confundir os novos fiéis de que o Deus Cristão era o mesmo deus supremo grego.
Durante um bom período, a pintura foi a melhor forma de passar o evangelho para
os analfabetos. O conhecimento clássico não havia se perdido. Mesmo assim,
segundo Gombrich (2006, p.131),
Parecia serem poucos os artistas que se importavam com o que fora a
glória da arte grega, seu refinamento e harmonia. Os escultores já não
tinham paciência para trabalhar o mármore com o cinzel e para tratá-lo com
a delicadeza e o gosto que foram o orgulho dos artífices gregos.
Está mais do que claro que a simplicidade e clareza começavam a superar a
cópia fiel da natureza e ainda sim os artistas se esforçavam para objetivar a
mensagem. Isso aconteceu graças à herança grega, de retratar as atividades do
1 Diferente de outras culturas como a Egípcia em que os deuses eram representados com cabeças de animais no
qual previne a confundir Horus com o Faraó, ou a aureola do Cristianismo.
19
espírito, mesmo que de uma forma muito diferente dos gregos, a Igreja jamais seria
capaz de utilizar imagens para seus próprios fins se não fosse essa herança.
Observando uma das primeiras esculturas de Jesus2 não notamos a figura
barbada e adulta que estamos acostumados a enxergar nas obras renascentistas, ali
está um Cristo jovem, tenaz, ao lado de São Pedro e São Paulo. Podemos notar o
quanto de tradição grega está impregnada nessa imagem, a forma como representa
os apóstolos é a forma como se representa os filósofos e para destacar que Jesus é
uma figura divina, seus pés tocam o firmamento da Terra que é sustentado por uma
outra figura, isso se deve pois mesmo na Idade Média o conhecimento clássico não
havia se extinguido, embora apenas depois do séc. XIII é que podemos ver
esculturas monumentais.
Detalhe do sarcófago de Junio Basso, séc. 4 d.c
(Fonte: DUBY, 2006, p. 250)
Deve-se lembrar que segundo Wittkower (1989, p. 34), “na Idade Média
quase não se conhecia o termo escultor com o significado de artista que trabalha em
três dimensões” e dificilmente havia distinção dessas profissões. O melhor termo
que se pode encontrar é o artifex, para artistas em geral ou operarius, para
2 Cristo com São Pedro e São Paulo, 389 d.C. Relevo em mármore do sarcófago de Junius Bassus; Cripta de São
Pedro, Roma.
20
trabalhadores. Foi somente a partir do séc. XVI que os artistas começaram a desejar
que sua classe foi separada das demais, em que arte e oficio ocupassem lugares
distintos.
“Ao estudarmos a Idade Média, teremos que voltar muitas vezes para a
Antiguidade Clássica, pois o cordão umbilical que unia os artistas medievais aos
antigos nunca chegou a se romper” (WITTKOWER, 1989, p.27). Foi a partir de 1100
que junto com o redescobrimento da Antiguidade feito no período Românico que a
escultura Românica começou a se tornar monumental. A expansão desse tipo de
escultura se deu através da decoração de fachadas das igrejas. No séc. XII os
escultores românicos começaram a seguir este estilo que não se limitava apenas
aos tímpanos, se tornaram uma complexa composição de imagens ao redor de toda
fachada. Isso não foi nenhuma inovação iniciando no Românico, mas foi apenas
olhando para o passado que os artistas puderam “re-inventar” os modelos
monumentais. Os temas, ainda eram religiosos e talvez possamos falar de uma
liberdade maior no fazer artístico deste período, pois ainda os estudos de anatomia
não eram levados a sério como seria uns séculos após. Interessante notarmos que
Após a praga ter se extinguido pela Europa, a arte adotou uma visão menos
pessimista, “a escultura expressou essas ansiedades pela grande analise da
realidade do corpo” (Altet, 2006, p. 406):
Precisamente o século quatorze é marcado pelo estudo do nu, pela
pesquisa do realismo na imagem, e pelo progresso de investigação
anatomica que levou a representação de corpos secos e guardou
andamento com o progresso dentro do estudo anatômico universitário e a
cirurgia e com o profundo avanço de conhecimento do corpo.
As buscas pelo realismo do definhamento do corpo podem ser observadas na
figura de Jesus Cristo que está em agonia. A sua crucificação demonstra com um
irresistível realismo sua dor, seu sofrimento. Toda essa preocupação durou até o
final do século com representações realísticas de cadáveres, pois até então as
pessoas mortas eram representadas de forma vigorosa, uma imagem idealizada a
respeito da morte no qual a pessoa não parecia morta e sim adormecida.
21
Corpo de Cristo na Capela de Wroclaw, primeira metade do séc. 14 d.c
(Fonte: DUBY, 2006, p. 406)
1.3. Escultura Renascentista
Renascença significa renascer, ressurgir, todo o conhecimento clássico que
havia sido destruído devido aos bárbaros devia ser restaurado, desde a arte até a
ciência. Foi nesta mesma época em que o artista não era mais considerado um
mero artesão, “para Alberti e Leonardo o artista eram um estudioso e a arte era um
trabalho de pesquisa dentro dos mistérios da natureza.” (CEYSSON, BRESC-
BAUTIER, p..561)
Podemos utilizar a leitura de Gombrich (1999, p..230) a respeito da escultura
de S. Jorge (fig. 5) que, diferente das esculturas de santos medievais o artista,
Donatello, se preocupou assim como os artistas gregos ao estudo do corpo
humano, da observação e não dos modelos tradicionais implantados na Idade
Média. Donatello, um dos grandes escultores no início da Renascença “deixou
22
tantos trabalhos pelo mundo que seria correto afirmar que nenhum artista trabalhou
tanto quanto ele” (CEYSSON, BRESC-BAUTIER, p.. 578). Foi através de trabalhos
como David (fig. 6) que ele desenvolveu as primeiras esculturas que não se ligavam
à arquitetura e à decoração do local.
Donatello pode-se comparar apenas com Michelangelo3, ele foi o um dos
precursores da escultura renascentista e de grande importância Assim como
Brunelleschi foi para a arquitetura, na sua escultura de São Jorge, Donatello
desenvolve a representação de um adolescente que mostra os novos atributos que
deviam ser encontrados no novo homem.
Donatello: São Jorge, 1415-1417
(Fonte: DUBY, 2006, p. 556)
3 Ou Miguel Ângelo dependendo da bibliografia estudada.
23
Donatello: Davi, 1440-1442
(Fonte: DUBY, 2006, p. 573)
O estudo da figura humana vai incorporando o estudo das proporções
clássicas e o desenvolvimento da perspectiva. A escultura, aos poucos, vai se
desvinculando das decorações arquitetônicas, podendo ser vista de diversos
ângulos. As proporções do corpo deveriam ser perfeitas e as esculturas geralmente
se sustentavam sobre uma base.
Em um mundo em que a filosofia era muito estudada, a realidade não era
necessariamente uma reprodução fiel da realidade. Era também indispensável para
os artistas que estudassem com afinco a anatomia humana, tanto que os artistas
colaboraram com médicos na produção de ilustrações do corpo. Michelangelo
praticava a dissecação de cadáveres para descobrir mais sobre as partes do corpo.
A Academia de Florença também fazia o mesmo, tanto que em 1567, Allori e
Vicenzo Danti desenvolveram um “Tratado da Proporção”, que afirmava que a
harmonia do corpo, tal qual sua beleza estava ligada não apenas a regras
matemáticas, mas também a Deus. O corpo humano, criado por Deus, obtém parte
24
dessa divindade e assim como Deus é perfeito e belo, o ser humano também
carrega parte desta herença (Bresc-Bautier, 2006).
No início do Quattrocento era muito comum o nu masculino, ainda que muitas
Vênus fossem produzidas e encomendadas no séc. XV, o nu masculino era o que
mantinha as oficinas ocupadas, embora o nu masculino seja androginamente
angelical. A perfeição do corpo era visto como uma extensão de Deus, para Alberti a
perfeição da beleza só podia ser adquirida através “da harmonia e concordância de
todas as partes da forma que era construída a um numero invariável, e a uma clara
relação de ordem, como simetria, como manda a mais alta e perfeita lei da
natureza.” (CEYSSON, BRESC-BAUTIER, p.614).
Indo além de suas palavras, Albertini dizia que se devia superar a natureza,
escolhendo as melhores partes de um corpo e deixando as imperfeições de lado, ou
seja, o artista devia corrigir os “erros” da natureza. Assim como Albertini, Leonardo
da Vinci também acredita que a imitação da natureza é indispensável, mas ao
contrário de seu contemporâneo, Leonardo era menos insistente com relação a
questão da teoria da proporção. A Renascença possuía uma dupla tendência, que
combina o conhecimento com experiência e que virtualmente afirma dialeticamente.
A vontade para criar a beleza perfeita move o artista a imitar e estudar gregos e
romanos, mas ao mesmo tempo constrói um sistema de proporções ideais próprio.
(CEYSSON, BRESC-BAUTIER, 2006).
Entendemos melhor o que caracteriza este momento, a intenção de definir o
ideal perfeito, mas naturalisticamente a representação do corpo humano devido ao
novo modo de pensar de Florença no período Quattrocento. A cidade era um grande
centro e atraía não apenas italianos, mas outros europeus. A arte Gótica era
rechaçada pelos florentinos, pois não era algo nacional, então como forma de
combater esse estilo, foi desenvolvida uma arte mais sóbria, rigorosa, que não
imitou apenas a arte grega, mas a superou. O conhecimento se tornou parte da
preocupação diária, aquilo que restou dos gregos e romanos não eram mais vistos
com curiosidade, mas sim como uma forma de estudo profundo (CEYSSON,
BRESC-BAUTIER, 2006). Deve-se entender que no Renascimento os escultores
não reviveram ou copiaram a figura humana de forma direta, esse período foi mais
25
cristão que pagão, foi também uma nova forma de intelecto, espiritual e literário
(FULLERTON, 2002).
1.4. Escultura Barroca
Ao final do séc. XVI a arte parecia ter chegado ao limite, Grandes mestres
como Michelangelo, Donatello e Leonardo pareciam insuperáveis. Os aprendizes
ainda seguiam a norma de copiar os artistas clássicos até chegarem ao nível de
seus mestres. Ainda sim havia artistas que acreditavam que nem tudo estava feito,
assim como Michelangelo, que em particular desprezava convenções, fora ele que
despertara no público a admiração por caprichos do artista, suas loucas invenções
e, conseqüentemente, isso deu carta branca para que jovens artistas
surpreendessem o público com seus trabalhos únicos.
Para Dell’ Arco (2006, p. 708) a “escultura naquele tempo teve quase um
papel triunfante, pois ocupou uma posição retórica na filosofia do século”. A idéia de
poder induzir o pensamento através de imagens empurrou os artistas da época e
outros intelectuais a redescobrir o poder da Retórica. Outros meios recorridos na
época são as hipérboles e os oximoros:
Hipérbole consiste em exagerar uma idéia para se obter, através, a
cumplicidade do espectador. Os escultores usavam a hipérbole através da
distorção das proporções, salientando os materiais, refinando a qualidade
de suas técnicas até realçar o maneirismo, adicionando elementos
decorativos que frequentemente contrastavam, e pela intenção de aumentar
a energia. O oximoro é normalmente presente na poesia. Consiste em
combinar dois termos contraditórios, para ganhar um efeito mais expressivo
[...]. os escultores praticavam algo deste tipo: uma calculada descontração,
um caos controlado e uma fúria dinamicamente mal contida. (DELL’ ARCO,
2006, p. 710)
Os escultores no período Barroco demonstraram toda habilidade possível na
representação da complexa anatomia estudada desde o final do Gótico, na
26
demonstração de sentimentos através de expressão facial. Os escultores também
misturavam diversas técnicas para chegar ao resultado esperado. Mesmo em obras
de pequeno porte, como no busto do “Cardeal Mazarino” talhado por Antoine
Coysevox, foi esculpido de forma clássica em mármore vermelho, encontrado
também na Igreja de São Sulpício em Paris. O que interessa nessa obra é a forma
como o artista usou da técnica da Antiguidade para chegar ao resultado de
naturalidade, em que utilizou dois tipos de mármore, no qual o vermelho serviu para
a criação da mozzeta4 do cardeal assim como a touca.
Antonio Coysevox: Cardeal Mazzarino
(Fonte: DUBY, 2006, p. 750)
Santo e profano andam de mãos dadas no séc. XVI. A figura humana é
exaltada de forma plena no séc. XVII pode-se encontrar isso nos escritos de
Giordano Bruno e Tommaso Campenella, Epicurinismo5 que trata do Homem e seu
4 Mozzeta é o nome que se dá ao traje que padres, bispos, cardeais, papas e outras pessoas pertencentes ao cléro
Católico usam, é um traje que cobre os ombros e é abotoado por cima do peito. 5 Filosofia desenvolvida por Epicuro de Samos, filósofo ateniense do séc. IV a.c que prega o prazer ao invés da
dor para a obtenção da elevação espiritual.
27
corpo. Para o entendimento desse período Dell’ Arco (2006, p. 771) cita um pequeno
trecho escrito por S. Francis de Sales.
Os corpos humanos são como taças de cristais, que não podem ser
carregados juntos porque assim correm o risco de bater uns contra os
outros e assim quebrarem-se. Eles são como frutas que, se intactas e bem
preparadas, irão estragar se baterem uns nos outros. Água por sí só,
contudo é pura dentro do recipiente que a guarda e que não pode mais reter
sua pureza se tocada por qualquer outro animal. Então, Philothea, permita
não permita que a toquem de maneira vulgar, nem por diversão ou nem por
gentileza [...]
Esse pequeno trecho nos remete a uma das obras de Gian Lorenzo Bernini
(1598-1680), intitulada de “O Rapto de Perséfone”. Bernini, como sempre, enfatizou
outro lado do mito, nesse caso a melancolia, Plutão a vê e tenta carregá-la à força.
Ela, por sua vez, tenta escapar. Observamos como as mãos de Plutão mergulham
dentro de sua pele macia, também observamos a tristeza da jovem mulher ao
notarmos que ela está chorando. Podemos também fazer uma leitura mais chocante.
Na mitologia, a deusa é raptada pelo deus do mundo subterrâneo e levada para se
tornar sua rainha. A violência com que essa escultura é retratada contrasta com a
beleza da mesma, é tão vivido, tão dramático, belo e ao mesmo tempo triste.
Podemos sentir a força do deus segurando a deusa com toda sua força. A sensação
ao se olhar essa imagem é ver uma mulher sendo estuprada e ficar maravilhado
com essa visão, algo voyer.
28
Gian L. Bernini: O rapto de Perséfone, 1621-1622
(Fonte: DUBY, 2006, p. 772)
29
Gian L. Bernini: O rapto de Perséfone, 1621-1622 (detalhe)
Gian L. Bernini: O rapto de Perséfone, 1621-1622 (detalhe)
30
Para alguns, o Barroco exprime o espírito da contra-reforma, e a Igreja foi o
principal patrocinador deste período. Os nobres católicos foram exaltados por suas
excentricidades ao invés de seu fervor religioso. Roma foi o centro do Barroco.
Patrocinada pelo Papa, foi um modo de fazer Roma a cidade mais bela do mundo6,
em nome de Deus. Um de seus escultores mais famosos, Bernini, trabalhou durante
a maior parte de sua vida para a Igreja (fora incumbido de decorar a Basílica de São
Pedro). Uma de suas obras, o tabernáculo fundiu a arquitetura com a escultura, no
qual existe “quatro colunas salomônicas, profundamente decoradas [...] no canto há
estátuas de anjos e volutas acentuadas com vigor que erguem bem alto o símbolo
da vitória do cristianismo sobre o mundo pagão”, tudo é tão retorcido e magnífico
que resume o barroco. Se olharmos para o passado, em Roma antes da ascensão
dos cristãos, as mesmas colunas eram utilizadas (em menor escala). A escultura
barroca não ocupa o espaço de forma isolada como no Renascimento, ela cria a
ilusão, existe um comportamento quase que teatral por parte das estatuas
(JANSON, 2007).
Segundo Dell’ Arco (2006, p.762) “Bernini foi o primeiro escultor a introduzir o
fogo na escultura”, o fez na escultura que dá o titulo de “Martirio de São Lourenzo”,
um trabalho que representa seu santo patrono. Ele também é o criador da escultura
chamada “O Êxtase de Sta. Tereza”, nela podemos ver dois corpos sutilmente
deslocados, em que num movimento gracioso o anjo-sátiro retira a flecha que estava
cravada no peito da santa, capturado num momento antes dela cair para trás. No
centro disso tudo a santa caindo e o sátiro se move para frente para segurá-la.
Em outra escultura de Bernini, conhecida como “Apólo e Dafne”, podemos
observar um sentimento esquematizado pela coreografia. Bernini reinterpreta o mito
de Apólo e Dafne. Apolo assume uma forma Católica, a figura da mulher esconde de
forma discreta sua nudez, seus dedos começam a se transformar em galhos.
6 Assim como na Idade Média a arte foi usada para transformar Roma novamente na capital do mundo.
31
Gian L. Bernini: O êxtase de Santa Tereza, 1621-1622
(Fonte: DUBY, 2006, p. 735)
Gian L. Bernini: Apolo e Dafne, 1621-1622
(Fonte: DUBY, 2006, p. 732)
32
1.5. Escultura Romântica a Realista.
Junto com a Revolução Francesa, a Arte começou a romper com conceitos
que até então eram tidos como absolutos e inalteráveis. A Revolução Industrial
acabava com o artesanato e junto com isso quase “acabou” com a arquitetura. As
construções realizadas nesse período não seguiam um estilo próprio, e sim diversos
estilos:
As igrejas tinham sempre o estilo gótico, porque este predominara no
período conhecido por Era da Fé. Para teatros e casas de óperas, o estilo
barroco, com todo seu aparato, era considerado, o mais próprio, e também
se acreditava que palácios e ministérios adquiriam um aspecto mais digno
se edificados nas suntuosas formas da Renascença italiana.”. (GOMBRICH,
p. 499).
Nunca na história da Arte os artistas sentiram tanta necessidade de se auto
afirmar como artistas quanto no século XIX. Isso se deve à ruptura (para não dizer
quebra total) com a tradição clássica, sem idealismos. Entretanto a liberdade de
temas e “estilos” gerou atrito entre os artistas e seus clientes. Mais do que nunca, o
artista não estava preso ao cliente, ele não se via mais na obrigação de satisfazer o
que seu cliente desejava. Entretanto, essa nova prerrogativa podia lhe custar o
dinheiro do aluguel, da compra dos materiais e comida. Junto a essa nova liberdade
a classe artista se dividiu entre os que obedeciam “as convenções do público e os
que se orgulhavam de seu isolamento auto-imposto”. (GOMBRICH, p. 501). Para
Gombrich, estilo é como uniforme, e o número de uniformes disponíveis no século
XIX era grande o suficiente para que os artistas pudessem se expressar da forma
que achassem melhor. Quando ele compara Rembrant e Vemeer Van Delft, nos diz
claramente que ambos eram pessoas com histórias de vida e personalidade
diferentes, mas não possuíam a escolha para se expressarem artisticamente devido
ao tempo em que se encontravam.
No século XIX a escultura começa a tomar outro rumo, não apenas como um
objeto decorativo de igrejas, demonstração do poder real ou mesmo para enfeitar as
cidades. A escultura foi, segundo Joseph Beuys, descrita como pensamento, que
33
segundo Schneckenburger, “colocou a arte tridimensional numa esfera de reflexão
intelectual perto do domínio do sonho” (pintura). Foi no século que XIX que a
escultura começou a se expandir (embora tenha sido no final do século XIX e início
do século XX que ela tenha se libertado completamente das amarras gregorianas).
O centro de todo este desenvolvimento aconteceu em Paris, tornando-a assim
a capital da cultura no século XIX, tirando a Italia de vista.
No Neoclassicismo, o mármore era ainda muito utilizado pelos artistas,
embora os esboços fossem feitos de argila. Podemos resumir o Neoclassicismo com
os trabalhos de Antônio Canova, que foi comprado a Bernini. Diferente de Bernini
que se inspirava em mitos e na emoção através da luz e sombra, Canova, tinha
como inspiração a Grécia Antiga, embora tivesse sido treinado no estilo Barroco.
Mas o interesse da Canova pela antiguidade se deu através da arqueologia e teoria.
Canova esculpiu diversas figuras feminina ao longo de sua carreira, entre elas,
Hebe. Outro precursor do Neoclassicismo é Bertel Thorvaldsen. As esculturas de
Canova e Thorbaldsen diferem muito uma da outra, pois Thorvaldsen se assemelha
mais aos gregos, com corpos menos tencionados do que os de Canova que “sugere
um refinamento da arte Helenística, como faz com os detalhes dourados que
ornamentam a figura” (NORMANDO-ROIMAIN, 2006, p 855).
Canova se beneficiou muito da proteção de Napoleão, se tornando muito
conhecido na França. Napoleão se apoiou na arte para se manter no poder, fazendo
de sua imagem sua propaganda, tal quais reis e papas fizeram durante o Barroco,
com a propaganda da Fé e Poder. Muitos bustos de Napoleão sugerem uma
retomada da arte romana, com feições dos antigos Cesares romanos. Juventude
estampada em sua face, imperativísmo são algumas dessas características. Canova
foi o responsável pela obra Napoleon as Peace-Bringing Mars, que o retratava nu,
como o deus Marte, deus da guerra, Napoleão não se preocupava, mas na França,
naquela época, não foi permitida a exibição.
No Romantismo os artistas usaram suas habilidades para se sobreporem ao
modo como à figura humana idealizada deveria ser representada desde o
Renascimento, que mesmo diante de todas as curvas do Barroco este ainda
mantinha um ideal sobre as esculturas. Para se afastarem do Neoclassicismo os
artistas buscaram inspiração em obras literárias ou pela cultura de outros países.
34
Algumas obras do início desse novo estilo são “Os Goblins”, de Antonin Moine,
“Loki”, de Ernst Freund e a famosa obra “O Pensador”, de Rodin. Todas essas obras
foram inspiradas em autores como Shakespeare, Dante, Tasso e outros autores
românticos contemporâneos a sua época.
Ernst Freund: Loki, 1822
(Fonte: DUBY, 2006, p. 876)
Foi a partir de 1880 que o Realismo começou a se firmar, no qual esculturas
mostram homens e mulheres proletariados. O Realismo mostrava que uma nova Era
se aproximava, enquanto no passado santos, mártires olhavam para o Céu os
artistas realistas não permitiram que a religião interferisse em suas obras. Um
escultor neste período, chamado Vincenzo Vela, criador da obra “As vítimas do
trabalho”, espelha bem o que o Realismo queria mostrar ao público. Esta obra reflete
as mulheres mortas na construção do túnel de São Gotthard (o terceiro mais longo
do mundo).
35
Augusto Rodin: O Pensador, 1904
Disponível em < http://classicos-e-cia.blogspot.com.br/2013/04/auguste-rodin-o-pensador.html > acesso em 28/05/2014
Vincenzo Vela: Vitimas do trabalho, 1882
(Fonte: DUBY, 2006, p. 921)
36
Outra obra desse período que pode ser citada é a “Explosão da mina” em
que a mulher que olha para o morto parece uma nova Pietá pelo modo em que sua
cabeça está inclinada e demonstra compaixão pelo morto. O estilo realista estava
para se tornar um dos estilos que participaria da vida pública, ou seja, monumentos
públicos, retratando pensadores, revolucionários ou mesmo pessoas comuns ou
com algum certo prestígio. O realismo tratava de mostrar o novo homem, uma
sociedade que estava se industrializando e consequentemente um povo que sofria
com o trabalho pesado. Ainda que o homem fosse retratado quase da mesma forma
anatômica como era no Renascimento, no Barroco, Neo Classicismo, mas manteve-
se original pelo modo quase que inacabado de algumas obras e pela utilização do
bronze ao mármore e pela não idealização do Homem.
37
CAPÍTULO 2
RECONHECIMENTO DO ESPAÇO ESCOLAR
38
2. Reconhecimento do Espaço Escolar.
2.1. Dados Gerais da Escola Observada
O estágio foi realizado na Escola Estadual Presidente Arthur da Costa e Silva,
localizada na Rua Baden Powell, 409, bairro Sarandi, na cidade de Porto Alegre.
A escola possui sua data de fundação em 07 de janeiro de 1970, como escola
de 1º Grau, pelo decreto 20.053 da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul e
em 22 de Dezembro de 1975, através do decreto 24.329 do mesmo órgão, passa a
ser reconhecida como escola de 1º e 2º Graus. Com 46 turmas, distribuídas pelos
três turnos de funcionamento da instituição, a saber: manhã, tarde e noite, possui
um quadro funcional constituído por 10 funcionários e 62 professores.
O corpo discente é constituído de aproximadamente 950 alunos,
predominantemente integrantes de uma classe social mais carente do que alunos da
rede privada.
O espaço físico é caracterizado por três prédios, no qual se distribuem as
dezesseis salas de aula, a biblioteca, os laboratórios de informática, química, física e
biologia, auditório, o refeitório, a cozinha e o bar, bem como a área destinada a
administração escolar: direção, vice-direção, conselho escolar, coordenação
pedagógica e supervisão escolar.
Sua área externa é contemplada com duas quadras esportivas, um play
ground em um galpão crioulo.
2.2. Observações silenciosas.
Primeira Observação Silenciosa
Data: 21/08/2012
1 Período
Alunos Presentes: 22
Assim que cheguei à sala de aula, os alunos se mostraram bastante ativos e
questionadores, faziam-me perguntas pessoais e esperavam que eu cooperasse nas
respostas. A professora pediu a atenção deles e explicou o porque de eu estar ali
presente. Após isso pediu para cessarem com o barulho e a bagunça e prestassem
atenção na atividade.
39
A primeira aula observada silenciosamente consistiu em desenhos abstratos
a tinta nanquim. A professora me informou que seus alunos estavam trabalhando
durante o trimestre com diversas possibilidades de explorar materiais de pintura,
pois, no final do trimestre anterior aprenderam sobre o Abstracionismo.
Os alunos não pareciam cooperar com a professora e se mostravam muito
ativos. Um bom sinal a meu ver, pois assim será melhor de trabalhar meu projeto de
ensino, penso eu.
Observei que os meninos mais agitados não estavam realizando a atividade
proposta e sim realizavam outro tipo de desenho. Os mesmos possuíam maior
habilidade com o desenho. Possuíam noção de espaço, volume, linha. Um aluno em
especial, o mais agitado aquele dia, chamado Marciano, possuía uma habilidade
muito boa e me chamou a atenção, pois ele conseguia convocar toda a turma para a
desatenção com a atividade proposta com a professora.
A todo instante a professora pedia para eles fazerem menos barulho. Os
alunos estavam muito agitados. Ela se desculpava comigo a todo instante e dizia
que nem sempre era assim. Informava-me que eles eram educados e que estavam
agitados, pois eu era “carne nova” na escola e que nas próximas aulas o
comportamento deles iria melhorar.
Logo a aula acabou, pois temos apenas um período. Segui em direção a
professora a mesma disse que as vezes usava o período de Religião para seguir
com os trabalhos em artes, pois sabe que um período para atividades praticas é
quase impossível, ainda mais com uma turma hiperativa como aquela.
Segunda Observação Silenciosa
Data: 28/08/2012
1 Período
Alunos Presentes: 18
É a segunda aula em que os observarei. Dei-me conta de que as aulas de
artes ocorrem depois do intervalo e que isso os deixa mais agitados ainda. A
professora pedia gentilmente para eles se acalmarem e que agora já não era mais
intervalo.
40
Os alunos nesta aula se acomodaram e ficaram em silencio enquanto a
professora informava que na aula de hoje eles trabalhariam com aquarela. A
professora então distribuiu as folhas A3 para cara aluno e pediu para que eles
cuidassem da margem da mesma ao fazer a pintura.
Em silencio, os alunos se colocaram a produzir as pinturas abstratas. Aos
poucos eles iam trocando diálogos entre eles e fui percebendo que haviam grupos
dentro da sala de aula que trabalhavam melhor que outros. Uns ficavam só de
brincadeira, enquanto outros produziam, embora, de forma empobrecida.
Dois alunos discutiam entre si, Guilherme e Alisson, um provocava o outro,
até que Alisson saiu de seu assento para tentar agredir Guilherme e então a
professora interveio e os dois alunos pararam de trocar tapas e ofensas. Nisso a
turma já se agitou novamente e a professora não conseguiu mais controlá-los.
Continuando a observação, embora a agitação fosse geral, alguns alunos
estavam trabalhando e percebi que suas composições, embora abstratas, não
possuíam vinculo algum com as artes e sim era um trabalho em que podiam fazer o
que queriam que a professora ia achar bom.
Enquanto observava alguns trabalhos sendo realizados a professora
chamou a atenção da turma para a pasta de artes. Nesse momento soube que os
alunos tinham uma pasta de artes individual em que guardavam seus trabalhos
produzidos em artes naquele trimestre, seja pintura ou desenhos. A professora
informava que havia pastas que não estavam completas e que os alunos deviam
completar até o meio daquele mês que ela precisava fechar as notas deles do
trimestre anterior.
Após sua fala, o sinal tocou e ela foi se organizando para sair da sala de
aula.
Terceira Observação Silenciosa
Data: 04/09/2012
1 Período
Alunos Presentes: 12
41
Foi um dia chuvoso e relativamente frio. Fui ao encontro da turma para
observá-los uma ultima vez. A professora estava mais tranqüila que a aula anterior.
Os alunos também estavam mais tranqüilos.
Das três aulas observadas esta me pareceu ser a mais tranqüila. Em grande
parte ela foi assim, pois, estava chovendo e muitos alunos não foram à aula.
Quando falo dos alunos que não foram à aula eu falo dos alunos que deixam a
turma mais agitada. Nesta aula pude observar mais atentamente o modo como
outros alunos desenvolvem suas atividades em sala de aula.
Consegui observar nesta aula que havia um casal de alunos na turma,
também pude observar mais atentamente um trio de alunos que sempre sentavam
juntos, Juliano, Esther e Amanda. Esses alunos em especial trabalharam em todas
as aulas, não eram demasiadamente agitados como os outros e se concentravam
nas tarefas propostas pela professora.
A atividade de hoje consistia basicamente de reunir todas os trabalhos
realizados ao longo do semestre anterior e entregar para a professora em uma
forma de pasta. Alguns alunos não possuíam todos os trabalhos e então a
professora informou que deveriam acabar hoje.
Como o tema era o abstracionismo, muitos materiais foram explorados, lápis
de cor, giz de cera, carvão, tintas nanquim, recortes e colagens. Então como
faltavam certos trabalhos, a professora forneceu alguns materiais que possuía a
Mao para que assim os alunos pudessem terminar o trimestre com boas notas.
As alunas Esther e Amanda não haviam terminado seus trabalhos. Esther não
tinha um trabalho em carvão e Amanda não havia terminado os recortes e colagens.
Observando, notei que ambas estavam cooperando uma com a outra, pediam
observações, o que uma achava o que deveriam fazer.
Ao final da aula, os alunos entregaram a pasta de artes para a professora e
ela agradeceu e nos retiramos da sala de aula.
42
2.3. Análise das Observações Silenciosas
Com base nas observações, posso enfatizar que o que mais surpreendeu foi
o comportamento extremamente agitado dos alunos. Mas se por um lado eles eram
agitados, por outro eles produziam. Acredito que se a energia deles for direcionada
da forma correta poderão elaborar grandes observações durante o estágio.
Como a base é a observação, acredito que, esteticamente, os alunos estão
no estágio adequado para suas respectivas idades, que vão dos 13 até os 15 anos.
Conforme Jean Piaget eles estão na fase Pseudo Naturalismo, embora eu prefira as
classificações de Viktor Lowenfeld (1974), que são mais completas. Segundo o autor
os alguns alunos estariam na fase Pseudo Naturalista e outros na Fase de Decisão,
que é quando o jovem decide se continua a buscar seu aperfeiçoamento no fazer
artístico ou deixa de lado por falta de encorajamento.
Segundo o mesmo autor, Lowenfeld é importante que crianças, jovens
exercitem artes para que assim desenvolvam pensamentos sobre si mesmos, e do
ambiente que os circunda. Segundo este autor, “um dos mais importantes atributos
de qualquer atividade criadora é o de nos tornarmos mais sensíveis as coisas com
que lidamos (1974, p. 17)”.
Como a escola é Publica, alguns problemas devem ser apontados, como por
exemplo, a fala de uma sala especifica para artes. Com uma sala especifica para
artes é possível trabalhar com diversas outras linguagens, experimentação de novas
técnicas sem o medo que o relógio impõe geralmente ao docente de Artes, em que
deve deixar tudo arrumado para o próximo professor.
Outra questão a ser apontada não está na escola e sim um pouco nas
famílias que compõe a comunidade escolar. Em que dão prioridade para objetos
como roupas, celulares, sapatos ao invés de fornecer materiais básicos como
tesoura, tinta guache. Conforme Art. 12º da LDB a escola publica deve fornecer
esses materiais conforme o que recebe de recurso pelo Estado, mas é necessário
que a própria comunidade tenha consciência de que o Ser é mais importante do o
Ter. Então se há condições de se comprar um tênis Nike para o filho, há de se ter
condições também para se comprar lápis de cores, tesouras, pinceis e etc. Nesse
caso não devemos apelar para o que é por Direito, mas do bom senso.
43
A ultima aula observada me levou a crer que há alunos específicos que
comovem os outros e os levam a fazerem bagunça. Não os identifiquei, pois nessa
ultima aula, estava chovendo e pouquíssimos alunos foram para a escola.
Importante enfatizar que esses alunos que faltaram não moram em regiões de alto
risco e costumam usar o transporte publico para voltar para casa. Acredito que aqui
posso salientar mais uma vez a importância da comunidade escolar, da família na
educação de seus filhos e que as mesmas sirvam de incentivo para que persigam
com o caminho da educação.
Percebi que professora tenta ao máximo trazer para os alunos técnicas
novas, novas formas de explorar a linguagem da arte. Notei que embora ela tenha
se estressado com os alunos diversas vezes, ao final ela sempre saia da sala de
aula aliviada de ter feito seu trabalho, é carinhosa com os alunos, e parece carregar
a esperança de que algum dia eles terão um brilhante futuro a sua frente. Com esse
parágrafo posso encerrar a analise das observações com a citação de Libâneo,
Oliveira e Toschi (2012) em que os autores afirmam que
a educação deve ser compreendida como um direito universal básico e como um bem social publico, condição para a emancipação social. Deve ser concebida, portanto, no contexto de um projeto amplo de inclusão social, em que são contemplados os interesses da maioria da população, implicando a conquista da democracia e da qualidade social.
44
2.4. Análise do Questionário Respondido pela Professora
A professora Claudia é Licenciada em Artes Visuais há 20 anos pela UFRGS
e desde então sempre trabalhou como educadora em Artes, atualmente também a
mesma desempenha papel de educadora na disciplina de Religião.
A mesma informa que ela compra os materiais escolares para a sua
disciplina, que incluem, tesouras, lápis de cor, cola e etc. Ela informa que quando o
material é mais caro, como por exemplo em uma aula em que ela usou madeira em
MDF para os alunos comporem um trabalho, a escola ajudou financeiramente.
Claudia diz também que pede ajuda dos alunos, sempre que podem eles doam algo
para ela, mas que é difícil.
Lowenfeld (1974) diz que muitos materiais ao mesmo tempo disponíveis
para os jovens os deixa confusos e ao invés de estimular, dificulta, levando a um
resultado medíocre. A solução ao que parece, é dispor materiais em quantidades
suficientes para que a mesma consiga estimular sua expressão criativa. Importante
haver esse estimulo de materiais na escola pois o aluno precisa das ferramentas
corretas para poder se expressar, negar o acesso a isso é a mesma coisa que o
desestimular.
Conforme suas respostas nos questionários, a mesma prefere as atividades
praticas, pois acredita que assim os alunos podem ter a oportunidade de explorar
outros materiais além do caderno e livro. Embora a mesma admita que suas aulas
sempre possuem um embasamento teórico antes de passar para as atividades
praticas. Libâneo nos dirá que “o caráter pedagógico da pratica educativa se verifica
como ação consciente, intencional e planejada no processo de formação humana,
através de objetivos e meios estabelecidos por critérios socialmente determinados
(1994, p.24)”
A mesma diz que estimula seus alunos a desenvolverem um pensamento
critico sobre seus próprios trabalhos, incentiva os alunos a desenhar, modelar,
pintar, não acredita quando dizem: professora, não sei desenhar. Claudia crê que
todo aluno é capaz de se desenvolver artisticamente.
O professor não deve apenas produzir trabalhos e mais trabalhos se não há
uma reflexão a ser feita, não é ensinando diversas técnicas que o aluno irá ter
45
interesse em aprender, para aprender o aluno deve ser instigado a querer investigar
o mundo a sua volta e é investigando que ele irá refletir sobre as coisas que o
cercam, ultrapassando assim, o senso comum, em Artes damos o nome de
educação estética em que “deverá articular-se com esse “fazer”, partindo do
contexto da percepção, do uso, conhecimento, apreciação e critica artística”
(FUSARI e FERRAZ, 1992, p.56), para isso o professor de Artes deve mobilizar
reflexões a partir da história da arte, criando pontes entre o passado e o presente.
A professora não gosta de usar a arte para decorar, embora a mesma tenha
habilidades artesanais e goste muito de pintura e em casa desenvolva esse lado, ela
pensa não ser essa a função da sua formação e da disciplina que leciona.
Lowenfeld dirá que o melhor professor de artes seria o “artista que tivesse
ao mesmo tempo, profunda compreensão dos problemas humanos e grande desejo
de ajudar as crianças e jovens em seu crescimento e desenvolvimento (1974,
p.219).” Lowenfeld (1974) felizmente nos dirá que para ser um bom professor de
artes não há necessidade de ser de fato um artista, mas é essencial que ele seja
dotado sim, de habilidades como desenho, pintura, escultura e etc.
46
2.5. Análise do Questionário respondido pelos Alunos.
Todos os alunos responderam os questionários, possuem idade entre 12 e
16 anos. A grande parte dos alunos gosta da disciplina de Artes, principalmente das
atividades praticas, dizem que não aprendem nada com a teoria em artes. Talvez
esse pensamento perpetuado pelos alunos, anos após anos esteja enraizado no
mito de que apenas a disciplina da artes só tem poder e objetivo quando esta
desenvolve atividades praticas, como desenho, escultura, pintura e é a disciplina
que deve trabalhar com a criatividade do alunos (Fayga, 2009). Por isso trabalhos
práticos se tornam muito importantes nessa etapa, pois em outras disciplinas eles já
são massacrados por teorias e decorebas. É claro que o trabalho prático não deve
ministrado de forma leviana, é necessário trabalhar em conjunto com a leitura de
imagens, trabalhos teóricos oriundos da estética, critica e história da arte.
Fora do campo artístico, a arte poderá ser importante auxiliar como elemento mediador de conhecimento, em carreiras cientificas, comerciais ou técnicas através de filmes, fotografias, vídeos, rádio, TV etc., que informam e, ao mesmo tempo, recriam ambientes e componentes estáticos (FUSARI e FERRAZ, 1992, p. 59).
Devemos parar de pensar que apenas cabe a disciplina de Arte
trabalhar a imaginação e a criatividade do sujeito, essa idéia foi deformada com o
passar dos anos, responsabilizando dessa forma o campo das Artes por formar
pessoas criativas, e essa mesma criatividade é cortada quando se entra no mercado
de trabalho, ela também é desviada para objetivos desumanos, tais como
manipulação de massas. O profissional vende seu potencial imaginativo e criativo
por dinheiro, não se importando com os efeitos colaterais de seu trabalho, Fayga
(2009) diz que somos responsáveis por isso, que o artista (num sentido mais amplo
e não restrito ao campo de Artes) é responsável pelas obras que cria. Por isso é
importante que o professor faça seus alunos refletirem desde cedo as coisas que
eles vêem e lêem. Conforme Fussari e Ferraz (1992, p.67),
47
por intermédio da explicação, da analise e da apreciação de trabalhos de arte (dadas a partir dos conceitos gerais de valores estéticos), o jovem pode chegar a entender e refletir sobre as principais correntes de critica de arte contemporânea. [...]É por isso que é importante fazer a classe chegar concomitantemente à produção de trabalhos em Arte. Através do “fazer artístico” torna-se mais fácil a compreensão de conceitos teóricos e da própria linguagem artística.
Muitos alunos sabem realizar uma leitura de imagem. Gostam de atividades
como desenho, pintura, gravura. Possuem interesse em desenvolver mais atividades
com desenho e pintura, outros respondem que desejam escultura por ser algo pouco
trabalhado em sala de aula.
Alguns alunos se preocupam com o vestibular e acreditam que artes deva
ser substituída por disciplinas que realmente os ajudem a passar no ENEM e no
vestibular. É muito positivo que alguns alunos se preocupem com isso, em
contrapartida a maioria não respondeu isso nos questionários. Não que eu acredite
que artes deva ser substituída e seja menos importante que outras disciplinas, mas
é importante que os alunos tenham noção da sua importância e de desejarem um
futuro melhor para si e quando se nasce pobre, um bom futuro começa em boa
formação educacional, o ensino superior. Para esses jovens, o ensino superior não é
apenas um estágio como alunos da rede particular vêem, mas a oportunidade de
mudarem suas vidas.
48
CAPÍTULO 3
PROJETO E PRÁTICAS DE ENSINO EM ARTES VISUAIS
49
3. Projeto e práticas de ensino em artes visuais.
3.1. Dados Gerais da Escola.
O estágio foi realizado na Escola Estadual Presidente Arthur da Costa e Silva,
localizada na Rua Baden Powell, 409, bairro Sarandi, na cidade de Porto Alegre.
A escola possui sua data de fundação em 07 de janeiro de 1970, como escola
de 1º Grau, pelo decreto 20.053 da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul e
em 22 de Dezembro de 1975, através do decreto 24.329 do mesmo órgão, passa a
ser reconhecida como escola de 1º e 2º Graus. Com 46 turmas, distribuídas pelos
três turnos de funcionamento da instituição, a saber: manhã, tarde e noite, possui
um quadro funcional constituído por 10 funcionários e 62 professores.
O corpo discente é constituído de aproximadamente 950 alunos,
predominantemente integrantes de uma classe social menos abastada do que o
grupo da rede privada.
3.2. Dados Gerais do Projeto de Ensino.
Titulo do Projeto: S/ título; S/ gênero; S/ preconceito
Escola: Escola Estadual Presidente Arthur da Costa e Silva
Endereço da escola: Rua Baden Powell, 409, Bairro Sarandi, Porto Alegre
Turma: 104 – 1º ano do ensino médio
Professora Titular: Claudia Castello Costa de Medeiros
Tema de Pesquisa: O tema de pesquisa inicial tomou como ponto de partida o tema
escultura da figura humana dentro da história da arte, desde o período grego A.C até
o século XIX D.C. Partindo de autores como Janson e Gombrich que exibem o
cenário político e econômico das artes visuais em cada período com o significado de
beleza de Umberto Eco em cada um desses períodos e usando o autor Philippe
Bruneau como principal locutor a falar sobre a linguagem escultórica. A pesquisa
50
buscou apresentar as diferenças e semelhanças sobre a construção da figura
humana dentro da linguagem tridimensional ao longo dos séculos nas artes visuais.
Tema do Projeto de Ensino: O projeto buscou em conjunto com o tema de pesquisa
abordar o tema preconceito social através do corpo. Após reflexões realizadas no
estágio II e de minha vida pessoal, resolvi que em conjunto com o tema de pesquisa
iria tratar do corpo humano e os tabus que o envolve, sobre o preconceito em geral.
3.2.1. Justificativa
Segundo o site da Secretaria de Direitos Humanos houve um aumento de
46,6% sobre a violência contra a comunidade LGBT do ano de 2011 para 2012,
assim como em uma pesquisa em 2013 disponível no site do Senado, demonstra
que cerca de 32% das mulheres brasileiras, não buscam a delegacia da mulher para
registrar queixas de maus tratos.
Baseando-se nesses dados acredito que seja pertinente ao ensino das Artes
Visuais usar de seus conteúdos para desenvolver a reflexão acerca dos
preconceitos sociais que se comentem contra mulheres, gordos, LGBT, negros e
etc.
Como representante transexual acredito que seja importante falar sobre o
corpo dentro da sala de aula e a partir de reproduções de imagens desenvolver a
reflexão sobre as variadas manifestações corpóreas que existem dentro de nossa
sociedade, desde o corpo feminino, da cor de ébano dos negros até mesmo da
distorção de imagem que nossa sociedade produz sobre nossos adolescentes,
mostrando pessoas extremamente magras, brancas, loiras e felizes.
3.2.2. Objetivo geral.
Desenvolver a capacidade de reflexão dos alunos frente ao preconceito social
contra as diversas manifestações corporais, disseminando assim, um outro
51
pensamento dentro de nossa sociedade, se baseando no respeito ao próximo e a
igualdade de gêneros.
3.2.3. Conteúdos
Figura Humana
Corpo Humano
História da Arte
Preconceito
3.2.4. Metodologias
Expositiva e Dialogada
Pratica
3.3. Dentro da Sala de Aula.
3.3.1. Primeiro encontro
Numero da aula: 01.
Data: 25/09/2012
Duração: 1 hora.
Serie: 1º ano Ensino Médio.
Conteúdo: linha no desenho, mistura de cores, uso de tons com tinta ou lápis figura
humana, pintura
52
Lista de atividades:
Apresentação à turma de mim como sua professora ao longo do
trimestre.
Apresentação sobre o tema que iremos trabalhar ao longo do trimestre.
Exibição de algumas imagens de figura humana.
Instrução da atividade a ser realizada nesta aula.
Realização da atividade plástica em pintura ou desenho.
Auxilio aos alunos durante a atividade plástica.
Organização da sala de aula para o próximo período.
Encerramento da aula.
Objetivos específicos:
Utilizar conhecimentos prévios da figura humana para a construção da
mesma.
Desenvolver melhor a composição da figura humana, através da
proporção, ângulo, composição das partes do corpo.
Pensar a respeito de como poderão construir a figura humana.
Metodologia: Prática dialogada.
Materiais:
Tintas guache, pinceis, potes, panos, folhas A3 e lápis 6B.
Avaliação:
Avaliarei como eles irão construir o corpo humano, como estas imagens serão
construídas, como serão os corpos desenhados ou pintados pelos alunos. Também
será avaliado o uso das cores, caso o aluno tenha escolhido trabalhar com cor,
linhas, no caso do desenho e uso das tonalidades se for pintura ou desenho. Será
avaliada a originalidade do trabalho, ou seja, sem quer as imagens artísticas
apresentadas não sejam as únicas referências para os trabalhos desenvolvidos.
Planejado:
53
Irei me apresentar aos alunos como sua professora, Priscila Fróes, ao longo
do ultimo trimestre. Após essa apresentação, irei começar a aula com uma breve
apresentação em PowerPoint com algumas imagens das infinitas possibilidades de
representações da figura humana. Direi a eles que durante esse trimestre iremos
trabalhar com o corpo humano na Arte e para exemplificar isso mostrarei imagens
de pinturas no qual o corpo humano é o tema central. Começarei a distribuir folhas
A3 para cada um deles e pedirei que cada um deles, em uma folha A3, desenvolva
um trabalho plástico ao qual o corpo humano deve ser o tema central. Informarei que
as linguagens plásticas que poderão ser usadas serão o desenho e a pintura.
Poderão utilizar o material disponível na sala de aula como tinta guache e lápis 6b,
também poderão se possível e desejarem a misturar cores que por ventura eles
possuam prévio conhecimento. Quanto a utilização do lápis, irei avaliar o uso das
escalas de cinza, modo como seguram o lápis. Após as instruções, irei circular na
sala de aula auxiliando os alunos caso necessitem de ajuda. Ao final da aula pedirei
que assinem seus trabalhos e direi que na próxima aula iremos discutir a respeito de
imagens produzidas ao longo da história da arte.
54
Realizado
A aula iniciou na sala de vídeo da escola na qual a professora titular me
apresentou à turma como a professora estagiaria e que este trimestre eu daria as
aulas de arte. Após essa breve apresentação, iniciei informando a eles que durante
minhas observações sobre a turma percebi que a professora havia trabalhado
diversas técnicas em que o estilo abstracionista predominava, mas que nesse ultimo
trimestre trabalharíamos com figuração, mais especificadamente a figuração
humana.
Então, no Datashow, comecei apresentando a primeira imagem chamada, No
Woman No Cry de Chris Ofili de 1998 em que retratava o busto de uma mulher
negra chorando e duas pedras sustentando o quadro e mais outra como adorno no
pescoço da mulher. Discursei um pouco mais nessa obra tendo em vista que há
alguns alunos negros na turma e outros ficaram se questionando o porquê da mulher
no quadro estar chorando. Nesta obra, o artista retrata a mãe de um cidadão negro
britânico assassinado por motivos racistas em 1993. O caso nunca foi solucionado e
embora o quadro usasse cores quentes que dariam a sensação de alegria, o quadro
em si não tem nada de alegre. Informei que essa obra era na realidade uma
denuncia ao descaso da policia, por se tratar de um negro e que na arte conforme
Anamélia Bueno Bouro (2002, p.54): “o artista, ao construir seu objeto, torna visíveis
seus pensamentos, emoções, e sentimentos, organizando-os num texto visual
prenhe de significados”. Deste modo, o artista atingiu seu objetivo de tornar este
trabalho uma denuncia para que jamais se repetisse. Mas tendo em vista que
trabalharíamos com tinta, era importante que eles observassem que poderiam usar a
cor para construir suas figuras e não ficar apenas utilizar a cor preta para realizar
seus trabalhos.
55
Chris Ofili - No Woman, No Cry, 1998
Disponível em < http://www.google.com/culturalinstitute/project/art-project?hl=pt-br > acesso em 10/08/2012
Após verem essa imagem apresentei brevemente outras três: Perseu Liberta
Andrômeda de Peter Paul Rubens em 1638. Após o retrato de Maria Dyacova de
Dmitry Levitsky de 1778 e finalmente, Sem Titulo de Os Gêmeos de 2010. Falando
dessas outras três obras, informei que o corpo poderia ser retratado por inteiro como
em Perseu Liberta Andrômeda, uma forma mais clássica de representação da figura
humana ou com auto retrato em Maria Dyacova e até mesmo de uma forma mais
lúdica, no qual os elementos presentes nos remetem a lembrar do movimento
Surrealista, surgido no inicio do século XX, como a obra Sem Titulo de Os Gêmeos.
Quando fui apresentar a obra de Os Gêmeos, a professora titular me
interrompeu, pois queria falar deles, já que sua filha, por ser grafiteira trazia muito
material a respeito deles. Ela comentou que eram dois irmãos que começaram
realizando trabalhos em grafite aqui no Brasil, em São Paulo, que vinham da cultura
do Hip Hop e que hoje em dia realizavam grafites em muitas cidades ao redor do
mundo, que suas obras valiam muito dinheiro.
56
Os Gêmeos - S/Titulo (detalhe) – 2010
Disponível em < http://www.google.com/culturalinstitute/project/art-project?hl=pt-br > acesso em 10/08/2012
Após a fala dela, eu complementei dizendo que havia trazido parte desta obra,
pois diferente das outras pinturas, nessa havia uma nova forma de concepção da
construção da figura humana, podíamos observar a cabeça maior que pendia para o
lado, formas humanóides, como a do grande sapo em que varias pequenas cabeças
ficavam grudadas em seu torso e as outras formas mais autônomas de se construir o
corpo. Falei também que na realidade, a obra é muito maior do que aparenta ser e
que na próxima aula iria trazê-la completa. Concluindo minha fala, disse que eles
deviam observar as obras e ver as diversas formas como o corpo poderia ser
representado, como usar uma parte do corpo e que a cor era importante para trazer
mais vida aos trabalhos que eles iriam produzir após a exibição destas imagens.
Após a exibição, informei a todos que iríamos nos dirigir de volta à sala de
aula e que lá realizaríamos um trabalho pratico. Eles deveriam em uma folha A3
compor uma imagem, em que a figura humana seria o tema central, eles poderiam
se ater numa parte especifica do corpo ou nele todo e com isso construir um
trabalho plástico. Iriam utilizar tintas guache e poderiam misturar cores para criar
novas tonalidades e assim deixar o trabalho mais vivo. Os aconselhei a não usarem
muita tinta, que pouco seria muito, já que a folha era fina, poderia estragar um
trabalho que eles realmente gostaram de fazer e iria demorar a secar.
Chegando à sala de aula os alunos começaram a ficar agitados e então a
professora titular disse que ela não iria tolerar que o estágio sofresse pela falta de
educação de alguns e que ela enviaria para a supervisão quem não se portasse
57
bem. Então todos se acalmaram e expliquei de novo a atividade que iríamos realizar
e disse que não havia tintas e pincéis disponíveis na escola para todos e que
deveriam ser solidários com seus pares para desenvolver o trabalho.
Então os alunos começaram a realizar a tarefa. Uma das alunas, chamada
Esther, me perguntou se ela poderia fazer uma mão e um pé, afirmei que sim e que
não haveria problema, só pedi que ela não fizesse o contorno da mão dela. Observei
que alguns alunos, após ela ter feito a mão, começaram a fazer o mesmo. Alguns
alunos demoraram a começar seus trabalhos, pois dependiam do seu colega ao lado
para emprestar os pincéis.
Um grupo de rapazes à frente da sala pareciam apreciar melhor a atividade,
pois ao contrário dos outros, eles não se dispersaram em momento algum, se
concentrando na atividade até o final da aula. Um aluno em especial, me chamou
atenção, por ser muito ativo dentro da sala de aula, durante minhas observações,
seu nome é Marciano. Durante toda a aula ele se concentrou no que estava
produzindo e não dispersou a aula como costumava fazer. Ele e seus colegas ao
lado trabalhavam em silêncio e usavam os pincéis com muita prática, mesmo os
mesmos estando avariados. O tipo de desenho que eles faziam era o Grafite, já
havia observado nas aulas que as fontes que esses alunos usavam remetiam a
fonte usada pelos Grafiteiros profissionais.
Outros trabalhos que me chamaram a atenção foram os de duas alunas que
fizeram a mesma posição em que a imagem exibida de Andrômeda de Peter Paul
Rubens. No inicio uma apenas havia feito esse trabalho e ao final da aula outra
aluna copiou e para não deixar tão claro que era uma cópia do trabalho da colega
colocou outros elementos como um olho no lugar em que deveria ser a face do
corpo. Talvez para elas tenha sido mais fácil realizar a cópia, tendo em vista que é
mais difícil criarmos algo que não esteja impregnado de realidade. Embora
estejamos trabalhando com a figura humana, é possível a alterá-la sem que isso
desmereça seu trabalho, pois se analisarmos, dentro de um possível trabalho
escolar, um trabalho em que não possuímos conhecimento de suas formas,
posições, proporções ou etc. e as jogarmos de forma aleatória em uma folha, por
exemplo, não terá sentido algum, esse “criar fácil”, um criar gratuito, é desprovido de
58
sentimento, pensamentos e etc. ele é o que é, um vazio sem sentido (Ortega y
Gasset, 2005).
Peter Paul Rubens - Perseu Liberta Andrômeda, 1638.
Disponível em < http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Peter_Paul_Rubens_-_Andromeda_-_Google_Art_Project.jpg > acesso em 11/09/2012
A aluna Esther acreditava que seu trabalho com mãos e pés não estava bom
o suficiente. Aconselhei-a para que não usasse apenas uma cor de tinta como
estava fazendo e sim utilizar outras, como o amarelo para dar destaque ao seu
trabalho, para que trouxesse à frente as mãos e os pés que ela havia pintado.
Passando ainda pela sala uma aluna disse não ter gostado do trabalho que realizou
e queria saber se podia fazer outro. Afirmei que sim e ela então pintou uma perna
calçando um tênis All Star.
No meio da aula, notei que um dos alunos não estava produzindo por não
querer produzir nada em sala de aula. Como eu já havia sido alertada pela
professora titular, sabia que esse aluno nunca trabalhava nas aulas de artes e
59
sempre atrapalhava o grande grupo. Com o passar da aula, quase ao final ele
estava produzindo, provavelmente, porque todos estavam concentrados em suas
60
3.3.2. Segundo Encontro
Numero da aula: 02.
Data: 02/10/2012
Duração: 1 hora.
Serie: 1º ano Ensino Médio.
Conteúdo: Escultura, pintura, corpo humano.
Lista de atividades:
Apresentação de imagens da figura humana em PowerPoint para a turma.
Discussão professor-aluno e aluno-professor a respeito da imagem do corpo
humano ao longo da história da arte e comparado a hoje em dia.
Elaboração de um resumo sobre o que foi discutido em sala de aula e a
opinião dos alunos acerca do assunto debatido em aula.
Encerramento da aula.
Objetivos específicos:
Discutir a respeito da importância da figura humana na arte.
Estabelecer comparações a respeito das figuras construídas ao longo da
história da arte.
Desenvolver a reflexão através do debate a respeito da imagem do corpo
humano na arte e na atualidade.
Metodologia: expositiva dialogada.
Materiais:
PowerPoint.
Avaliação:
Será avaliado o diálogo estabelecido na sala de aula entre alunos e alunos ou
professor e aluno. Os pensamentos desenvolvidos a cerca do corpo, e da arte pelos
alunos também serão avaliadas finalizando com um trabalho escrito.
61
Planejado:
Começarei a aula fazendo uma apresentação de imagens de esculturas e
pinturas da figura humana ao longo da história da arte e a imagem dos trabalhos
produzidos na aula anterior. Com as imagens que eles produziram, espero poder
estabelecer relações com as imagens artísticas, e assim os questionarei sobre o que
pensam a respeito da figura humana na arte e porque nos representamos tanto. Que
pensamento os antigos poderiam ter a respeito do corpo humano e que
pensamentos temos hoje em dia? Irei fazer apontamentos sobre como os corpos
humanos estão sendo apresentados, desde a questão física até emoções que
pudessem ser expressas através do movimento corporal, então pedirei que eles
falem o que pensam a respeito destas imagens. Faltando dez minutos para o
término da aula, pedirei que elaborem um resumo sobre o que discutimos nesta aula
e o que eles pensam individualmente a respeito da imagem do corpo humano hoje
em dia.
62
Realizado
A aula iniciou com os alunos entrando um pouco agitados, pois como é o
quarto período, eles voltam do recreio mais agitados. Todos se sentaram na sala de
vídeo com um caderno e lápis em suas mãos. Informei que nesta aula iríamos olhar
algumas imagens e discutir a respeito delas e que eles deveriam anotar o que fosse
dito tanto por mim como por seus colegas. Informei que iríamos discutir a respeito do
corpo humano.
Comecei questionando o porquê do fascínio do ser humano em se retratar, e
eles ficaram calados. Insisti novamente, mas eles não responderam. Então eu disse
que, pessoalmente, eu acreditava que nos retratamos, pois somos curiosos a
respeito de nossos corpos, tanto do meu quanto do outro, e essa curiosidade em se
auto descobrir e pensar a respeito de qual nosso objetivo no mundo, qual nosso
lugar, são algumas das hipóteses que podemos levantar a respeito do fascínio que a
figura humana possui sobre nós.
Comecei mostrando uma imagem de Henry Moore, em que os alunos ficaram
desconcertados, pois a figura aqui retradada é muito diferente de obras clássicas.
Escolhi essa imagem por ser uma figura construída fora desses moldes e que
instigaria a visão deles a respeito de como o corpo pode ser retratado nas artes
visuais e que isso poderia se refletir em seus trabalhos, em que o academicismo não
seria a única alternativa.
A leitura que os alunos fizeram dessa obra foi de um homem realizando sexo
oral com sua parceira. Essa leitura me surpreendeu, pois eu nunca havia visto desta
forma. Sabemos que Henry trabalhava muito com a figura feminina, mas nunca
havia parado pra pensar nessa possibilidade. Tentei argumentar que não
conseguíamos enxergar o resto da escultura, mas mesmo assim todos concordaram
que era um casal mantendo relações sexuais.
63
Henry Moore, Reclining Figure: Hand, 1979
Disponível em < http://www.henry-moore.org/works-in-public/world/germany/hamburg/moorweide/reclining-figure-hand-1979-lh-709 > acesso 24/09/2012
Prossegui a aula mostrando outras imagens e, quando apareciam nus
masculinos todos riam por ficarem constrangidos, comentavam da sexualidade,
como se o homem exposto nu fosse sinal de homossexualidade, o que por sinal
contrasta totalmente quando viam um nu feminino. Como quando apareceu a Venus
de Urbino, em que todos pediram para parar ali e ficaram admirando, mesmo
algumas meninas fizeram comentários negativos a respeito dessa imagem.
A aula prosseguiu com muitos comentários desnecessários, principalmente
por um aluno em especial chamado Guilherme que fazia comentários inapropriados,
com teor sexual exacerbado, ou mesmo comentários preconceituosos, dispersando
todos da turma. Ele falava mal das esculturas, ficava batendo numa colega. Não o
expulsei da sala por não querer perder muito tempo com ele já que teriamos apenas
um período por semana.
64
Vênus de Willendorf, 24.000 e 22.000 a.C.
Disponível em < http://www.infoescola.com/arqueologia/venus-de-willendorf/ > acesso em 05/08/2012
Enquanto passávamos por imagens de mulheres nuas, tanto na pintura
quanto na escultura, esta imagem surgiu na tela e as reações não foram positivas.
Perguntei por que e uma aluna disse que ela era gorda demais. Outro aluno apontou
para os seios que para ele pareciam seios de mulher velha. Respondi prontamente
que a idade chegaria para todos e que analisando essa pequena escultura dentro do
seu tempo, os seios representavam alimento, os quadris largos, fertilidade.
Complementei que esses eram símbolos de feminilidade na época, não que os
corpos devessem ser assim, mas que espiritualmente a mulher era retratada assim,
tal como o homem era retratado com um grande falo. A mesma aluna que disse ela
estar gorda dizia: “Mas ela ainda sim é gorda”. E eu respondi: “E qual é o problema
dela ser gorda? E a aluna não soube responder. Fiquei surpresa por ouvir esse
comentário ter vindo de uma aluna que não se enquadra nos padrões de beleza
vigentes de nossa época. Disse a eles que a mulher era adorada justamente por ser
portadora da vida, que a concepção era um mistério e a mulher era a única que
detinha esse poder, ela dava a vida e alimentava.
65
Ticiano Vecellio - Venus de Urbino 1538
Disponível em < http://www.backtoclassics.com/gallery/vecelliotiziano/thevenusofurbino/ > acesso em 05/08/2012
Fiquei impressionada com esse pensamento, pois a mesma já vinha
apontando para as saliências nas barrigas femininas como na Venus de Urbino de
Tiziano, A Primavera de Botticelli e Alegria de Viver de Matisse. Ela apontava para
estas imagens como se fosse uma desfiguração total do corpo da mulher, quando na
realidade esse é o corpo feminino em toda sua naturalidade e não o esqueletismo
que pregamos desde o século XX, quando, conforme Sandra dos Santos Andrade
(2002, p.25) tornamos o corpo um artefato do mercado econômico/sócio/cultural.
Gian L. Bernini – Hermafrodite, 1516
Disponível em http://expo-escultura.blogspot.com.br/2010_05_01_archive.html > acesso em 19/08/2012
66
Quando esta imagem apareceu na tela, chocou a todos, uns riram para
disfarçar o constrangimento e só conseguiam ver o pênis de Hermafrodite. Perguntei
se eles sabiam quem essa escultura representava e uns falaram a palavra travesti,
“outros Hermafrodite”. O fato é que essa imagem, embora planejada para aparecer
num momento mais tardio nesta aula, apareceu em um momento aleatório em
estávamos vendo nus femininos e eu estava explicando que muitas vezes o seio é
mais representado na arte por ser uma parte do corpo da mulher que exala
feminilidade, muito mais que a genitália feminina e que no caso do homem é o pênis,
e quando troco de imagem, aparece esta.
Devido ao choque achei melhor não analisar profundamente esta imagem.
Arrependi-me muito, depois, pois poderíamos falar naturalmente sobre algo que
existe na natureza. Mas já que os alunos não sabem que estão tendo aula com uma
professora transexual, pretendo levar esta imagem novamente, junto com outros
trabalhos mais contemporâneos como os que encontrei de Diogo Dourado em que
ele trabalhou a imagem da travesti.
Quando apresentei a próxima imagem para a turma, os alunos negros da sala
gostaram. Informei que essa era a representação de uma Vênus, pois diferente das
mulheres santas, esta não estava coberta, tão pouco acompanhada de Jesus. Um
aluno chamado Guilherme (em especial), realizou um comentário afirmando que seu
pai disse que mulheres negras “não possuíam fundo” e rira disso. Após dizer estas
palavras, os alunos negros da sala de sentiram extremamente ofendidos e eu
censurei o aluno Guilherme. Afirmei que achava esta imagem muito bonita, pois
durante muito tempo e pelas imagens que vimos, apenas observávamos que as
Venus eram brancas de cabelos e olhos claros. Continuando minha opinião pessoal,
achava que a cor negra nesta imagem mostra que mesmo naquele tempo, quando a
escravidão de pessoas negras começou, o preconceito contra a cor negra ainda não
estava tão enraizado, ainda mais na Europa.
67
Antico - Venus Felix , 1495
Questionei a turma sobre o que eles achavam desta imagem, tão antiga e
ainda representando uma mulher de pele negra. Os alunos disseram que gostaram
da imagem, que diferente das outras esta não estava tentando esconder seu corpo,
sua genitália.
Devido ao comentário infeliz do aluno e diante de alguns comentários
negativos a respeito dos corpos femininos eu pedi que para a próxima aula todos
trouxessem imagens dentro das artes visuais nas quais pessoas que sofrem
preconceitos estejam retratadas, negros, índios, travestis, mulheres, idosos, gordos
e etc.
Esta aula não atingiu os objetivos propostos, pois eu tentava instigar os
alunos a falarem das imagens que viam, mas eles ficavam mudos e não era essa a
proposta dessa aula. Embora os alunos não tenham se manifestado muito, tenho
certeza que foi meu erro não ter instigado mais profundamente, pois queria que eles
percebessem e discutissem a respeito das imagens. Após o comentário racista,
consegui enxergar o caminho a seguir dentro da sala de aula para tratarmos do
68
corpo humano. Acredito que uma aula em que eles exponham tais imagens e falem
o porquê da escolha delas abrirá uma discussão melhor acerca do corpo humano na
arte e na vida deles. Usando as artes visuais para tratarmos de questões como
racismo, disformia corporal, identidade de gênero, papel social entre outros diversos
tipos de preconceitos existentes na sociedade e que através da escola podemos
tentar melhorar isso.
69
3.3.3. Terceiro encontro
Numero da aula: 03.
Data: 09/10/2012
Duração: 1 hora.
Serie: 1º ano Ensino Médio.
Conteúdo: figura humana, pintura.
Lista de atividades:
Grudar imagens no quadro negro.
Seleção de algumas imagens a serem conversadas.
Explicações pelos alunos sobre as imagens escolhidas.
Debate entre a turma sobre os corpos das imagens.
Proposta de reflexão de uma atividade plástica para as próximas aulas.
Encerramento da aula.
Objetivos específicos:
Desconstruir e construir um outro pensamento sobre o preconceito.
Usar a arte como artifício para discutir o corpo humano.
Apresentar corpos que sofrem com o preconceito na sociedade.
Metodologia: expositiva e dialogada, debate e reflexão
Materiais:
Imagens que os alunos trarão.
Avaliação:
Avaliarei o cumprimento da atividade proposta ao final da aula anterior e do
dialogo planejado para esta aula. Avaliarei a fala de cada aluno a respeito das
imagens que trouxerem, o que pensam a respeito das mesmas e como se
expressam em suas falas.
70
Planejado:
A partir dos comentários a respeito do corpo na aula passada, irei pedir para
que todos os alunos grudem no quadro negro as imagens que pedi para trazerem
retratando na arte os corpos de pessoas que sofrem algum tipo de discriminação
social. Após eles grudarem as imagens, vou olhá-las e selecionar silenciosamente
três imagens que sejam distintas e pedir que quem pesquisou e trouxe aquela
imagem venha falar sobre ela, do porque selecionou esta imagem, o que podemos
discutir em cima dela. A partir do que o aluno falar, irei relacionar com os tempos
que vivemos atualmente e apresentar algum artista que tenha trabalhado com esse
assunto. Como no caso de Diego Dourado que trabalhou com imagens das travestis
e a prostituição ou mesmo Heitor dos Prazeres que trabalhou a cultura negra
enquanto estava vivo. Ao final da aula, pedirei que eles escolham uma das imagens
debatidas e reflitam a respeito dessas e como eles poderão tratar o assunto de
forma plástica para as próximas aulas.
71
Realizado
A aula iniciou agitada, como os alunos estavam voltando do recreio creio que
é mais difícil eles voltarem a se concentrar, ainda mais em uma disciplina que não
tem como foco usar a racionalidade apenas. Isso os confunde, não deixando que
desenvolvam um bom trabalho na disciplina de artes, que tende a ser uma disciplina
mais “livre” em pensamentos e atitudes. Isso os faz relaxar para a próxima disciplina,
que uma disciplina exaustiva, matemática.
Assim que cheguei à mesa do professor, o aluno Wellington veio até mim e
questionou se havia algum problema em ele ter desenhado a imagem que eu pedi
que imprimissem. Pedi que trouxesse e disse a ele que não havia problema algum e
que eu havia gostado do seu desenho. Fiquei realmente fascinada pelo seu
desenho, no qual ele havia trabalhado com sombreamento através do esfumaçado,
embora tenha abusado da técnica no topo da cabeça, e linhas que deram volume à
roupa que a mulher vestia.
Outro aluno chamado Carlos, havia selecionado uma imagem do final do
século XIX de Paul Gauguin. Perguntei se mais alguém havia realizado a atividade
que pedi na aula anterior e que havia sido reforçada no dia anterior pela professora
titular da disciplina de artes. O restante da turma disse não. Então resolvi continuar o
que havia planejado e pedi que os dois alunos viessem à frente e comentassem
porque escolheram tal imagem.
O primeiro a falar foi o aluno Wellington, dizendo que foi a primeira imagem
que conseguiu localizar. Disse a ele que esta não era uma resposta aceitável, pois
ele havia se dado ao trabalho de desenhá-la. Então ele fez um novo discurso
dizendo que havia gostado das formas da mulher e que seria algo legal de
desenhar, e que, assim, faria um desenho fora do universo japonês que ele estava
acostumado a desenhar. Então ele disse que como o exercício consistia em
selecionar uma imagem de uma pessoa que sofre preconceito em nossa sociedade,
ele resolveu pegar a imagem de uma mulher negra. Nisso o aluno Guilherme mais
uma vez tentou desvirtuar a aula falando mal do trabalho do colega, questionando
porque ele não pintou ela de preto já que era uma mulher negra. Cortei sua fala
dizendo que eu havia gostado muito do trabalho do Wellington e que ele fez o
melhor que podia, diferente dele, Guilherme, que não havia realizado a tarefa e
72
ainda por cima debochava do trabalho alheio. Ainda frisei que sua atitude estava
errada, que deveria ter mais sensibilidade com os outros.
Trabalho do Aluno Wellington
FONTE: FROES, 2012
Após a apresentação de Wellington, o outro aluno que trouxe a imagem,
Carlos, mostrou uma reprodução na qual uma mulher de pele escura estava deitada
de bruços numa cama e olhava para o espectador. Pedi para ele falar a respeito da
imagem que escolheu, mas ele estava tímido demais para se apresentar na frente
de todos os seus colegas. Então, peguei a reprodução que ele imprimiu e trouxe e
perguntei a ele quem havia feito ela. Ele disse que não sabia de quem era, que
apenas procurou na internet e veio esta imagem. Informei a ele que quando ele
havia me mostrado essa imagem eu já havia visto em outros lugares. Disse que não
poderia dizer o nome correto dela naquele momento, mas que o artista que a
compôs era chamado de Paul Gauguin, um artista que retratou diversas mulheres
nativas, não do Brasil, mas de outro lugar do mundo. Continuando minha fala, disse
que embora a imagem seja bem antiga, podemos esquecer por um momento esses
dados e nos focarmos apenas na imagem. Perguntei à turma o que eles estavam
enxergando na composição. Os alunos falaram da mulher que estava deitada e
73
dormindo de forma bem sensual e de uma figura atrás desta que lembrava a morte.
Ficaram brincando com a figura da morte, como algo terrível e engraçada ao mesmo
tempo. Pronta a matar a pobre mulher que estava deitada e dormindo, davam
risadas pois, segundo eles, a forma como a morta olhava era engraçada, seus olhos
pareciam saltar para fora e ela não era bonita. Lembraram também que a morta
tinha pele escura, tal qual a mulher deitada. Os alunos ficavam brincando com o fato
da mulher deitada estar nua e de bruços. Fiquei questionando se a mulher estava
mesmo dormindo (pois na pintura ela está olhando o espectador) e eles afirmaram
que sim. Questionei isso diversas vezes, mas elas não conseguiam perceber que ela
esta acordada. Talvez pela impressão não possuir uma boa qualidade não
conseguiram perceber que os olhos dela estavam abertos.
Paul Gauguin - O espírito da morte espreita, 1892
Disponível em < http://www.pinturasdoauwe.com.br/2013/01/obras-de-gauguin.html > acesso em 10/08/2012
Então após a leitura da imagem, perguntei à turma se a arte não contribuía
para alguns estereótipos sobre os corpos humanos, e não obtive respostas.
Tentando trazer isso à tona questionei sobre pessoas negras não estarem muito na
mídia. Como exemplo, citei que pessoas negras na televisão brasileira, até bem
pouco tempo, interpretavam somente papeis de pobres, marginais, ou empregadas
domesticas. Então os alunos deram nomes como Beyonce, Jay-z, Tais Araujo que
estavam na mídia, mas concordaram que o número é bem menor quando
74
comparamos com atrizes e cantoras de pele clara. Depois, questionei sobre pessoas
acima do peso e perguntei porque delas não estarem na mídia. Então o aluno
Guilherme começou a falar nomes de pessoas na mídia gordas, como Gilberto
Barros, Faustão, Jô Soares e eu disse: “Ok, mas todos esses que tu me citou são
homens, e as mulheres?”. Então a aluna Ester disse que era machismo, embora
existisse a Adele, a mesma havia emagrecido desde que atingiu o sucesso. Os
meninos nessa hora começaram a ficar agitados, falavam muitos nomes de
pessoas, outros ficavam desvirtuando o propósito da aula, mas o que era
importante, enfatizava, era perceberem como a arte, desde os primórdios, reflete
aspectos que são comuns em outras linguagens como a poesia, musica ou literatura
para o que é belo no corpo e o que não éEu disse que podíamos enxergar, como
durante as exibições das imagens na aula passada, diversas formas de como a
mulher foi e é representada na arte, principalmente a representação mais clássica,
em que o corpo passa a ser um objeto de deleite, separa a mulher de bem, casta,
virgem, mãe e a mulher mais sexual. Com essa afirmação pedi que pensassem a
respeito de algo que, à primeira vista, pode parecer supérfluo, mas não é, como por
exemplo a imagem feminina quase sempre estar ligada a algum tipo de erotismo,
isso quando a imagem não se torna obscena.
A aluna Esther fez um comentário pertinente ao que quero trabalhar com
eles, em que ela estabelece diferenças entre a beleza americana e a beleza
brasileira. Segunda ela, lá fora mulher magra é sinal de beleza, enquanto que aqui o
padrão é a “gostosa”, com curvas, quadril, cintura fina e busto. Falou também que
era preconceito dos homens não gostarem de mulheres gordinhas e que como
ninguém quer ficar sozinho, as mulheres se submetem muitas vezes a emagrecer
muito para tentar conquistar alguém. Um dos meninos lembrou de coisas que eu li
na internet sobre as mulheres mais bonitas e com melhor aparência gerarem filhos
melhores. De fato, essas características são marcantes, mas os lembrei de que
padrão de beleza é mais cultural do que biológico. Ora, como? Nós nos cobrimos,
criamos jogos de esconder ou mostrar, usamos maquiagem, cortes de cabelo, tudo
isso com o intuito de agradar o olhar daqueles que pretendemos seduzir. A biologia
explica a grosso modo certos padrões universais, mas ela não explica o porque de
certos padrões se alterarem em certas civilizações (Castilho, 2001). Como no caso
do Brasil e Estados Unidos, que possuem padrões de beleza diferentes.
75
Minha conclusão a respeito dessa aula foi de que, houve muito transtorno nas
aulas. Muitos alunos falaram comentários desnecessários e quase uma briga
quando fui falar com eles sobre a imagem de Paul Gauguin, quando, pois o aluno
Guilherme novamente havia feito um comentário racista e isso irritou seu colega
Bruno. Pedi que todos se acalmassem e disse que ser negro não era motivo de
vergonha ou deboche, que apenas pessoas pequenas possuíam este pensamento e
que certamente esse não era o pensamento real de Guilherme, que só queria
chamar a atenção sabe-se lá porque. Com essa resposta ele ficou quieto e a turma
riu dele.
O tempo foi realmente curto nesta aula, os alunos demoraram em se
organizarem, ficaram de conversas paralelas. Tive que interromper diversas vezes a
aula para fazê-los voltar à aula de arte. Começo a perceber que terei que trabalhar
de uma forma mais incisiva, muito além da representação da figura humana e sim
considerando na conversa com os alunos, discussões sobre do corpo, identidade e
do preconceito social, apresentar artistas que sofrem com alguma deficiência ou
mesmo são diferentes dos demais sem nenhuma necessidade especial. Não
consegui apresentar os artistas que pretendia trabalhar nesta aula, pois eles não
deixaram devido a tanta bagunça, espero poder usá-los nas próximas aulas, pois
além do tempo ser curto, há assuntos básicos que eles não conseguem discutir,
como a cor da pele do próprio colega ou o sobre peso do outro ou mesmo diferenças
de gênero feminino ou masculino. Provavelmente há muitas questões que gostaria
de levantar com eles e fiquei confusa ao propor muitas reflexões de diversos
gêneros ao invés de me ater ao básico e ir trazendo para eles, de forma gradual,
outras informações.
Ao final posso afirmar que os objetivos foram atingidos parcialmente, utilizei a arte
como artifício para debatermos questões de preconceito social, acredito que mesmo
que todos os alunos não tenham participado, o tema tratado nesta aula tenha ficado
dentro da memória de algum deles. É importante frisar que o que proponho com os
objetivos da aula talvez não levem a um resultado imediato.
76
3.3.4. Quarto encontro
Numero da aula: 04
Data: 16/10/2012
Duração: 1 hora
Serie: 1º ano do ensino médio
Conteúdo: Figura humana, recorte e colagem.
Lista de atividades:
Informar como será a atividade planejada para esta aula.
Informar como devem efetuar a seleção de imagens para um trabalho mais
proveitoso.
Levantar questões enquanto realizam o trabalho plástico sobre o corpo na
arte, hoje em dia e etc.
Auxiliar os alunos quanto aos recortes, que intervenções poderiam realizar.
Organização da sala de aula.
Objetivos específicos:
Preparar o olhar sobre o fazer artístico para a construção de uma figura
tridimensional.
Desenvolver a imaginação.
Desenvolver uma nova concepção social a respeito do corpo humano.
Metodologia: Pratica Artística, Debate e Reflexão.
Materiais: Revistas, tesoura e cola.
Avaliação:
Irei avaliar a partir de como se dará a construção do trabalho de recorte e
colagem. Será avaliada a qualidade plástica do trabalho, as características
individuais de cada um, como interferências, se ficou bem recortado e colado.
Avaliarei também o que eles irão verbalizar a respeito de seus próprios trabalhos e
de seus colegas e que sentido eles darão para os corpos construídos.
77
Planejado:
Conforme foi solicitado no final da aula anterior, os alunos deveriam em casa,
selecionar varias imagens de pessoas e pensar em como poderiam reproduzir isso
de forma plástica. Os mesmos deveriam trabalhar em cima de pessoas tidas como
marginalizadas pela sociedade, ou seja, pessoas que são discriminadas justamente
pelos corpos que possuem.
No inicio da aula, irei informá-los de que irão trabalhar com recorte e colagem
e que terão esta aula (16/10/2012) e outras duas (30/10/2012) para desenvolverem
o trabalho, já que este consiste em, primeiro, procurar as imagens que desejam
transportar para o papel, depois recortá-las, montar a imagem que eles desejam
compor, analisar se foi uma escolha correta ou não e finalmente efetuar a colagem.
Informarei que poderão utilizar intervenções como lápis, canetas
esferográficas, hidrográficas, tinta, lápis de cor entre outros materiais que queiram
utilizar. Após a explicação sobre a atividade de recorte e colagem, informarei que
essa atividade deverá servir como auxilio para eles pensarem a respeito do corpo na
arte, sobre como este pode ser representado, de que forma ele será representado
(gordo, magro, amarelo, homem, mulher e etc.) e porque foi representado de tal
forma. Ao longo da aula, irei passar entre os alunos para observar o que estão
realizando. Ao final da aula irei solicitar que entreguem os trabalhos e que irei levá-
los e trazer novamente na próxima aula.
78
Realizado
Antes de a aula iniciar pedi à professora que me auxiliasse a buscar as
revistas para os alunos realizarem a seleção de imagens para depois recortarem as
mesmas. A aula iniciou novamente de forma agitada, mas pouco a pouco os alunos
foram se organizando. Após se organizarem, perguntei quem havia realizado a
tarefa que eu havia solicitado na aula anterior, somente um aluno respondeu
positivamente, Carlos.
Já pensando na possibilidade dos alunos não levarem imagem alguma, eu
havia planejado esta aula para que eles começassem a selecionar imagens da figura
humana em revistas. Mas caso já as trouxessem poderiam começar a pensar em
como reformulá-las no espaço da folha A3. Como não levaram as imagens
solicitadas, resolvi não distribuir as folhas e pedi para eles que somente
selecionassem as imagens de corpos humanos, e que depois iriam realizar outra
tarefa: a de dar um novo corpo para os corpos que escolheram a partir das imagens
nas revistas. Uma aluna perguntou se era pra escolher apenas uma imagem, eu
disse que não, mas sim várias imagens.
Após essas instruções, os alunos foram pegando as revistas que estavam
sobre uma mesa para trabalharem. Logo em seguida, notificaram-me que eram
revistas apenas de decoração. Pedi calma para a turma e que fossem olhando as
revistas lentamente à procura de representações da figura humana. Percebi que isso
transtornou a aula, pois as revistas disponíveis na escola eram de decoração e não
revistas em que figuras humanas fossem o foco, tais como Boa Forma, Capricho,
Vogue e etc. os alunos tiveram que ficar catando figuras, o que tolheu boa parte do
exercício original, pois não havia uma liberdade sobre as escolhas das figuras. Errei
em pensar em que escola teria esses recursos, por minha culpa, meu planejamento
iria atrasar. Seria necessário levar na próxima aula revistas que contenham
bastantes figuras. Muitos alunos não se concentraram na atividade e ficaram
realizando o trabalho de outra disciplina. Fiquei então circulando pela sala de aula e
haviam alguns alunos que ficavam mexendo no celular ou dormindo. Não enxergo
isso de forma positiva, pois parte destes alunos são os que dispersam a turma, não
realizam tarefas, não participam das aulas e menosprezam as artes em suas vidas.
79
Por outro lado, parte dos alunos estavam procurando o máximo de imagens
da figura humana. Enquanto trabalhavam, escrevi no quadro uma pergunta que
deveria guiá-los durante a execução do trabalho. Disse também que deveriam
pensar a respeito dela, pois, no final do trabalho, iriam escrever uma resposta para a
pergunta. A pergunta foi: “A arte é vitima, culpada ou cúmplice sobre o preconceito
que temos pelas formas dos corpos?”. Essa pergunta foi baseada nas minhas
leituras, nas quais Jeudy (2002) traz esta questão dentro de seu livro “O corpo como
objeto de arte”. Enquanto discutia a respeito dos padrões de beleza do corpo, em
que muitas vezes o feio nos parece belo, pois dependerá dos sentimentos que
colocamos diante daquele corpo em nossa frente, e que isso cabia diretamente com
o que falamos brevemente na aula anterior, na qual discutimos sobre certos padrões
de beleza impostos pela sociedade brasileira e o que eles achavam ou não bonito.
Após terminar de escrever no quadro, os alunos me perguntaram o porquê da
pergunta e respondi que deveriam lê-la, pensar e refletir a respeito da questão
durante a execução da atividade, e que como exercício final iriam escrever a
respeito do que pensavam da arte na cultura do corpo em que vivemos atualmente,
que conforme Romais (2001, p.66) “a grande aceitação e consumo da imagem
erótica [...] fizeram da imagem sedutora do corpo [...] uma atividade mercantil de
ponta”. Queria saber qual a opinião que eles têm a respeito da responsabilidade que
a arte carrega quando tratamos do corpo, relembrando as imagens que vimos
algumas aulas anteriores, o que podiam falar a respeito disso. Alguns alunos ficaram
incrédulos, pois teriam que escrever numa aula de arte e eu respondi que sim, que
estávamos já discutindo isso e eu queria saber o que eles pensavam na forma
escrita, já que como havia observado na aula anterior eles não se concentravam
para conversar, distorcendo o foco da aula o tempo todo. Esse comportamento
talvez se deva a própria vergonha de falar abertamente sobre o corpo e as gracinhas
ditas por alguns alunos vem a tolher colegas, evitando que eles construam um
pensamento mais maduro além daqueles ensinados em aulas de biologia ou na
própria internet. Eles são muito jovens ainda, é normal que sintam vergonha. É um
momento de descoberta da sua identidade, de brincar com ela, descobrir quem se é
o que gosta e o que não gosta. É uma fase complicada para os adolescentes. Por
isso acredito que meu tema é interessante para eles, pois trata disso, do corpo, das
diferentes tribos que existem em nossa sociedade e o que podemos fazer para
80
melhorar nossa visão sobre tribos que as vezes não parecem estar de acordo com a
nossa realidade, mas são reais.
Acredito na importância do trabalho escrito também como outra forma de
construção do conhecimento. A tarefa da escrita não deve se restringir apenas às
aulas de Literatura ou Português. Os alunos já não estão no ensino fundamental e
soube através deles mesmos que muitos já trabalham, um motivo a mais para
afinarem seus conhecimentos, e a arte pode auxiliar na construção do
conhecimento, já que nela podemos abordar diversos assuntos, muito além de
técnicas, artistas e períodos históricos, mas ao mesmo tempo englobando tudo isso.
No caso das nossas aulas, trabalhamos a imagem do corpo, não como forma de
enfatizar preconceitos, mas também de desconstruir ideias que para eles existem
por existir. Eles não estão acostumados em debater em busca de hipóteses e sim
crêem ser verdade coisas ditas pelos meios de comunicação como a televisão, o
radio, as revistas ou outros veículos de comunicação que imputam “verdades” sobre
o corpo e a representação dele dentro do nosso mundo. Os alunos aceitam os
modelos pré fabricados do corpo em nossa sociedade como se estar gordo fosse
errado, ser uma figura andrógina também, ou mesmo a cor da pele como forma de
catalogar uma pessoa.
Prosseguindo com a aula os alunos ainda estavam tendo dificuldades para
desenvolverem a atividade. Passando pela turma fui conversar com Carlos, um dos
meninos da turma que gostam de ficar desenhando em sala de aula e que por sinal
havia trazido imagens que ele achou na internet. Ele havia impresso varias imagens
de corpos seminus de mangá. Fiquei impressionada e disse a ele que ele poderia
trabalhar como intervenção do corpo, tatuagens, que são figuras impressas no corpo
e que denotam muita autonomia. Talvez por isso o preconceito com o corpo em
relação às pessoas tatuadas, pois elas assumem em seu próprio corpo sua
identidade. Demonstram, em figuras quem são, e isso intimida muitas pessoas ao
mesmo tempo em que é algo um tanto sedutor. Ele ficou olhando para a imagem
sem entender como poderia realizar. Na próxima aula irei levar para ele imagens
que mostrei na segunda aula em que dois artistas, Laura Spector e Chadwick Gray
usam o corpo como tela para realizarem suas pinturas.
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Não fiquei analisando muito as imagens que os alunos selecionavam, tendo
em vista a dificuldade que tinham em achar figuras humanas. Um dos recortes
efetuados foi a escolha da cabeça de mulher, uma boca e um bebe que
provavelmente a aluna Ester irá usar na sua composição, pois não é possível
perceber que a imagem possui olhos (embora esteja usando um binóculos), o
contraste de cores do cabelo vermelho e o binóculos verde, o tamanho da imagem
em que há uma boca recortada é maior do que a da cabeça da mulher me dando a
impressão de que será uma composição interessante devido a esses contrastes de
tamanho e formas. O aluno Guilherme ficou mais concentrado nessa aula, diferente
das anteriores em que ele se dispersava bastante, ficou concentrado em realizar a
tarefa. Olhando para o que os outros alunos estavam fazendo, o aluno Alisson
estavam desenhando ao invés de procurar imagens, ao contrario dos alunos que
não estavam trabalhando devido a falta de imagens, Alisson estava desenvolvendo
algo que faz parte de uma aula de artes, o desenho e por isso não havia motivo para
pedir a ele que realizasse o que eu havia proposto inicialmente. Logo após observá-
lo, o aluno foi até a mesa do colega Carlos e começou a reproduzir o desenho.
Estava tendo dificuldades e ap.ando muito seus traços, dei a ele um lápis 6b, pois
queria que ele tentasse desenhar com outro tipo de grafite, um grafite mais macio,
ao contrario do HB que é mais duro, e disse para evitar ap.ar, pois isso só marcaria
a folha e estragaria o desenho final.. Que realizasse o esboço de forma bem leve
com o 6B, em que trabalhasse com tons de cinza e aos poucos fosse escurecendo o
traço conforme estivesse seguro das proporções da figura e que também
começasse a firmar mais as linhas do corpo que estava a desenhar. Outro aluno que
fiquei observando foi o aluno Bruno, que ficou muito concentrado na atividade.
Assim como todos estavam tendo dificuldades, ele estava a procura de alguma
imagem com corpo, e ficou recortando meticulosamente esta imagem, para que seu
recorte no contorno do corpo ficasse perfeito. Eu espero um bom trabalho dele,
tendo em vista ser um aluno que participa da aula de forma positiva. Por fim, a aluna
Alexandra realizou a tarefa e disse que já havia selecionado as imagens que queria
colar. Informei a ela que então, na próxima aula, ela iria colá-las. Mas pedi também
que na próxima aula desse uma olhada em outras figuras para ter certeza de que
eram apenas essas imagens que ela iria trabalhar. Faltando alguns minutos para o
final da aula, pedi que recolhessem o lixo que ficou no chão devido aos recortes e
colocassem na lixeira. Pedi também que ajudassem a organizar as revistas pegas
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pelos alunos e as empilhassem a fim de levá-las de volta ao local de origem.
Finalizei a aula informando que levaria mais revistas na próxima aula e que
continuaríamos a realizar a atividade.
Trabalho da Aluna Ester
FONTE: FROES, 2012
Trabalho do Aluno Bruno
FONTE: FROES, 2012
Acredito que o inicio desta atividade foi proveitoso, pois consegui analisar
melhor os alunos que trabalham dentro das atividades propostas e os que não estão
nem ai para a aula. Fico temerosa em chamar a atenção destes alunos que não
83
trabalham tendo em vista que como são alunos de escola publica possam encarar
como algo de forma pessoal e não conseguirem entender a importância de terem
aula, de terem a oportunidade de estarem em uma escola.
Visto que eles terão dificuldades em
compor as imagens ou mesmo seleciona-las, levarei imagens de recorte e colagem
desenvolvidos por outros alunos com a mesma temática, corpo humano, para a
próxima aula bem como mais revistas. Percebi que a escola carece de recursos
básicos como tesouras, cola, materiais essenciais para o desenvolvimento da
atividade proposta. Também sei que será muito delicado conversar com eles a
respeito do corpo, tendo em vista suas idades e receios, que por sinal devem
embaraçar a mente. Ainda penso em uma forma de chamar a atenção dos alunos
que não participam das aulas, pois é muito importante que falem sobre o corpo sem
medo, pois este assunto, corpo, irá acompanhá-los por toda vida. É uma forma de
desenvolver introduzir na escola algo diferente do usual, trabalhar com uma reflexão
sobre as diferenças, sejam étnicas, de gênero, físicas e etc. diferenças que eu
acredito que devam ser trabalhadas na escola afim de aos poucos construirmos uma
sociedade mais justa e igualitária para todos. Pois sabemos que muitas
oportunidades não são dadas as pessoas não pela sua pouca formação, mas pela
cor de pele, de uma cicatriz, orientação sexual, gênero e etc. A partir da arte,
podemos começar a estudar aos poucos as diferenças e formular um outro
pensamento, em que o mais importante é o Ser humano e seu caráter e não apenas
seu exterior.
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3.3.5. Quinto encontro
Numero da aula: 05
Data: 23/10/2012
Duração: 1 hora
Serie: 1º ano do ensino médio
Conteúdo: Figura humana, recorte e colagem.
Lista de atividades:
Informar como será a atividade planejada para esta aula.
Informar como devem efetuar a seleção de imagens para um trabalho mais
proveitoso.
Levantar questões enquanto realizam o trabalho plástico sobre o corpo na
arte, hoje em dia e etc.
Auxilio nos alunos quanto aos recortes, que intervenções poderiam realizar.
Organização da sala de aula.
Objetivos específicos:
Preparar o olhar sobre o fazer artístico para a construção de uma figura
tridimensional.
Desenvolver a imaginação.
Desenvolver uma nova concepção social a respeito do corpo humano.
Metodologia: Pratica Artística, Debate e Reflexão.
Materiais: Revistas, tesoura e cola.
Avaliação:
Irei avaliar a partir de como se dará a construção do trabalho de recorte e
colagem. Será avaliada a qualidade plástica do trabalho, as características
individuais de cada um, como interferências, se ficou bem recortado e colado.
Avaliarei também o que eles irão verbalizar a respeito de seus próprios trabalhos e
de seus colegas e que sentido eles darão para os corpos construídos.
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Planejado:
No inicio da aula irei entregar os trabalhos realizados na aula anterior para
que os alunos possam continuá-los. Lembrarei a eles que esta será a penúltima aula
em que poderão finalizar o trabalho e que o mesmo deve continuar sendo bem
pensado, que não deixem colar imagens “por colar”.
Continuarei informando que poderão utilizar intervenções como lápis, canetas
esferográficas, hidrográficas, tinta, lápis de cor entre outros materiais disponíveis na
sala de aula. Novamente irei explicar sobre a atividade de recorte e colagem,
informarei que essa atividade deverá servir como auxilio para eles pensarem a
respeito do corpo na arte, como este pode ser representado, de que forma ele será
representado (gordo, magro, amarelo, homem, mulher e etc) e porque foi
representado de tal forma. Ao final da aula, irei solicitar que entreguem os trabalhos
e que pensem a respeito do que realizaram e escrevam sobre porque selecionaram
tais imagens, porque este tipo de ser humano foi representado, que importância ele
tem para a sociedade e o que a arte tem a ver com ele.
86
Realizado
O inicio desta aula foi diferente das anteriores, eles não estavam tão agitados.
O que me lembrou da conversa que tive anteriormente a aula com a professora
titular. Ela disse que eles estavam menos agitados. Talvez o fato de ser o ultimo
trimestre e terem tirado notas abaixo da media os tenham levado a encararem com
mais seriedade as aulas. Ao menos em realizar as tarefas e entregá-las.
Cheguei e cumprimentei alguns alunos e fui a minha mesa retirar as revistas
que havia trazido para esta aula. Comecei colocando-as em cima de outra mesa e
informei aos alunos que nesta aula não haveriam problemas com a falta de figuras
humanas. Pedi que prosseguissem com a seleção de imagens tal como estavam
realizando desde a aula anterior.
Prosseguindo com a aula os alunos já não estavam tendo o mesmo problema
da aula anterior, o de ficar catando imagens de figura humana nas revistas.
Passando pela turma fui conversar com a aluna Esther, uma das meninas, que por
sinal, tem participação em aula fez um comentário a respeito da revista que tinha um
teor evangélico. A primeira vista disse a ela que era o que havia conseguido trazer,
mas ai ela percebeu que talvez estivesse criticando e reformulou suas palavras
dizendo que gostava do pastor da revista. Fiquei mais aliviada, pois não queria criar
uma tensão, já que sei que existem alunos evangélicos em sala de aula e já que
tratávamos sobre preconceito, por mais limitado que esteja ao corpo, é importante
respeitar a crença alheia, mas sem deixar que isso limite o tema abordado nas aulas
de artes.
Continuando a aula, diferente da anterior, fiquei mais focada em que tipo de
imagens os alunos selecionavam e como eles recortavam as mesmas, para evitar
que o trabalho ao final ficasse ruim. Cheguei aos alunos Vanderlei e Ashley e
informei a eles que podiam recortar melhor suas imagens, respeitando o contorno do
tecido e corpo da figura, para que quando fossem efetuar a colagem não ficassem
bordas. Assim o trabalho teria maior qualidade plástica, não ficaria com “cara de mal
feito”.
A aula seguiu, de um certo modo, tranquila. Isso permitiu que os alunos que
faltaram na aula anterior tivessem a chance de realizar o trabalho sem pressa e da
87
forma pensada para esta aula. Alguns alunos que já não trabalharam na aula
anterior continuaram sem trabalhar. Um aluno em especial me chamou atenção: seu
nome é Elton. Cheguei em sua mesa e pedi que iniciasse seu trabalho. Ele disse
que estava sem tesoura, disse a ele que então pedisse emprestado para um de seus
colegas, pois muitos estavam conseguindo trabalhar, mesmo com poucas tesouras
em sala de aula.
Nesse meio tempo o aluno Alisson também reclama sobre tesouras e eu
disse que material básico eu não iria fornecer. Disse que eles sabiam que iriam
continuar trabalhando com recorte e colagem desde a aula anterior, então não havia
desculpas para não ter o material. Nisso o aluno Elton pediu para sair da sala para
pegar tesouras com a professora titular, e neguei veemente. Então ele saiu e foi
buscá-las sem meu consentimento. Quando ele voltou com os materiais, os deixou a
disposição da turma. Não consegui notar nenhuma diferença nessa atitude, pois
embora o aluno Elton tenha ido buscar os materiais o mesmo não trabalhou, nem
sequer pegou uma tesoura para começar a recortar. Essa sua atitude me deixou
com muita raiva, não apenas pelo constrangimento que me causou, mas pela falta
de razão em reclamar e não fazer nada para mudar sua situação de seu trabalho.
De que adianta reclamar da falta de tesouras, ir buscá-las se o mesmo não
trabalha?
Seguindo a aula percebi que o aluno Guilherme estava mais calmo, ou seja,
não estava bagunçando em sala de aula. Ele estava recortando figuras e estava
mais concentrado na atividade, conversava com seus colegas, é claro, mas
mantinha o foco da aula de artes. Senti uma mudança de atitude, uma mudança
para melhor. O que é muito bom para ele do ponto de vista pedagogico. Alunos que
pareciam desinteressados como na segunda e terceira aula (só ficaram de
conversas paralelas) estavam trabalhando. Observei isso nos alunos Rafaela e
Douglas. Ambos por sinal sao um casal de namorados.
Passei a observar que os alunos que não trabalhavam em sala de aula
ficavam ouvindo musica em seus celulares ou dormindo ouvindo musica. É dificil
aceitar que para eles é mais prazeroso o ocio do que o trabalho. Eu não consigo
atingi-los e não sei como poderei fazer essa tarefa, que por sinal é minha..
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Um dos objetivos desta aula é trabalhar de forma plástica o preconceito, a
todo instante passava pela sala de aula e avisava os alunos disso. Que eles
procurasse imagens que pudessem interferir e de que alguma forma retratassem
pessoas que sofrem com preconceito físico. Chamado de investigação e solução de
problemas, José Carlos Libâneo (2001) propõe que se coloque um “problema” e os
alunos busquem uma solução. No caso da aula de artes, a solução se dá através de
formas plástica, isso os incentivará no processo criativo e os estimulará a serem
mais críticos perante a sociedade.
Ao final, essa aula foi mais proveitosa que a anterior devido ao acesso mais
fácil a imagens do corpo humano. Os alunos conseguiram atingir certos objetivos
como a imaginação e pensar sobre corpo e preconceito. Consegui ensinar alguns
como recortar de forma correta suas imagens, de modo que construam, na próxima
aula, um trabalho plástico melhor. O comportamento dos alunos me agradou pois
estão menos dispersos. Conversam, brincam entre si, mas não deixaram de realizar
a atividade proposta. Segundo Ferraz e Fusari (1999) é importante que a disciplina
não trabalhe com o que eu pessoalmente chamo “desenho livre”, tudo deve se
vincular ao que chamamos de projeto escolar, ou seja, meu projeto possui objetivos
e atividades para que esses objetivos sejam alcançados, não é uma atividade
gratuita, livre como erroneamente alguns docentes confundem o ensino da
expressão em artes.
Fiquei pensando na possibilidade de levar materiais para a próxima aula, mas
ao mesmo tempo me pergunto se não é importante além do meu trabalho como
professora de artes ensiná-los a ter mais responsabilidade dentro do ambiente
escolar. Eles não são alunos carentes, muitos trabalham, então é necessário
mostrar a eles que no atual momento, suas educações devem vir em primeiro lugar.
Equipamentos sao meios de ensino gerais, necessarios para todas as materias, cuja relaçao com o ensino é indireta. [...] Cada disciplina exige tambem seu material especifico, como ilustraçoes e gravuras, filmes, mapas e globo terrestre, discos e fitas [...] (LIBÂNEO, 2001, p. 173)
89
3.3.6. Sexto encontro
Numero da aula: 06
Data: 06/11/2012
Duração: 1 hora
Serie: 1º ano do ensino médio
Conteúdo: Figura humana, recorte e colagem.
Lista de atividades:
Informar como será a atividade planejada para esta aula.
Informar como devem efetuar a seleção de imagens para um trabalho mais
proveitoso.
Levantar tópicos enquanto realizam o trabalho plástico sobre o corpo na arte,
hoje em dia e etc.
Auxilio aos alunos quanto aos recortes, que intervenções podem realizar.
Organização da sala de aula.
Objetivos específicos:
Preparar o olhar sobre o fazer artístico para a construção de uma figura
tridimensional.
Desenvolver a imaginação.
Refletir sobre o corpo dentro da arte.
Desenvolver uma consciência social a respeito do corpo humano.
Metodologia: Pratica Artística, Debate e Reflexão.
Materiais: Folhas A3, giz de cera, lápis 6B, figuras, revistas e cola.
Avaliação:
A partir de como se dará a construção do trabalho de recorte e colagem,
assim como também será avaliada a qualidade plástica do mesmo, as
características individuais de cada um como interferências, se ficou bem colado, o
que eles irão verbalizar a respeito de seus próprios trabalhos e de seus colegas e
que sentido eles darão para os corpos construídos.
90
Planejado:
No inicio da aula, irei entregar os trabalhos realizados na aula anterior para
que os alunos possam continuá-los. Lembrarei a eles que esta será a ultima aula em
que poderão finalizar o trabalho e que o mesmo deve continuar sendo bem pensado,
que não colem imagens sem que as mesmas tenham sido bem pensadas.
Continuarei informando que poderão utilizar intervenções com lápis, canetas
esferográficas, hidrográficas, tinta, lápis de cor entre outros materiais disponíveis na
sala de aula. Novamente irei explicar sobre a atividade de recorte e colagem,
informarei que essa atividade deverá servir como auxilio para eles pensarem a
respeito do corpo na arte, como este pode ser representado, de que forma ele será
representado (gordo, magro, amarelo, homem, mulher e etc) e porque foi
representado de tal forma. Ao final da aula, irei solicitar que os alunos me entreguem
os trabalhos e que pensem a respeito do que realizaram e escrevam sobre porque
selecionaram tais imagens, porque este tipo de ser humano foi representado, que
importância ele tem para a sociedade e o que a arte tem a ver com ele.
91
Realizado
O inicio desta aula foi diferente da anterior, pois voltei a dar aula para eles
após o intervalo, então eles voltaram agitados e estava complicado de iniciarem as
atividades. Cheguei e cumprimentei alguns alunos e fui a minha mesa retirar os
materiais como folhas A3 e giz de cera para distribuição dos mesmos. Comecei a
distribuir para os alunos as folhas em tamanho A3, informando a eles que esta seria
a ultima aula para finalizarem o trabalho de recorte e colagem. Disse, também que
havia trazido lápis e giz de cera para eles, caso quisessem realizar alguma
interferência nas imagens produzidas.
Após a distribuição das folhas e dos avisos, comecei a entregar as imagens
recortadas para os alunos que haviam realizado a atividade na aula passada, de
recortar imagens que iriam utilizar. Então prontamente eles começaram a distribuir
as imagens nas folhas de papel. O aluno Elton veio até mim pedindo uma folha e
revistas para poder fazer o trabalho. Disse que as revistas que havia trazido eram
para auxiliar aqueles alunos que já possuíam imagens e poderiam querer
acrescentar e não para alguém que não se mexeu durante todas as aulas. Ainda o
lembrei de quando ele foi buscar os materiais para recortar as imagens das revistas
com a professora titular, me fazendo passar vergonha e o mesmo nem sequer se
deu ao trabalho de realizar a tarefa. Ele prosseguiu perguntando o que era para ser
feito e eu disse que não falaria novamente, pois já era a terceira aula dedicada ao
trabalho e eu não iria gastar meu tempo com ele. Depois percebi que essa atitude
não foi profissional e sim mesquinha, não devia ter perdido a oportunidade de
permitir que um aluno realizasse o trabalho simplesmente por ter meu orgulho ferido
e sentido raiva naquele momento.
Alguns alunos que haviam realizado recortes acabaram não trazendo os
recortes da aula passada. Para esses eu distribui as revistas novamente para que
realizassem o trabalho. A aluna Alexandra era a que estava mais adiantada. Embora
tenha achado seu trabalho simples demais, ela se propôs a falar de forma pertinente
nas aulas e realizar as tarefas. Comparado a outros trabalhos o dela é comum, uma
mulher branca e loira sentada, ela desenhou a casa onde essa mulher
supostamente morava.
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Trabalho da aluna Alexandra
(FONTE: FROES 2012)
Um aluno, chamado Wagner, em especial me chamou atenção, não apenas
pelo resultado, mas pelo trabalho que estava desenvolvendo. Na primeira aula ele
mal trabalhou, selecionou algumas imagens por selecionar e ficou batendo papo
com “alunos problema”. Depois na segunda aula, o aluno começou a levar o trabalho
mais a sério e não estava tão desligado da atividade como na aula anterior. Acredito
também que por influencia do colega ao seu lado, Diego, que por sinal estava
interessado na atividade.
Detalhes do trabalho do Aluno Wagner
(FONTE: FROES 2012)
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Detalhes do trabalho do Aluno Wagner
(FONTE: FROES 2012)
Gostei da disposição das imagens do trabalho do aluno Wagner, em uma
posição diagonal, deixando assim o olhar menos pesado, para as figuras em
destaque em que uma mulher está vestida com trajes masculinos e um homem com
trajes femininos. Apreciei a pequena interferência que o aluno Wagner fez com os
contornos do corpo, misturando desenho ao recorte. As imagens me parecem bem
recortadas, embora seja possível ver alguns pequenos defeitos, mas nada que
atrapalhe a visão. O que é um contraponto a imagem produzida por outro aluno,
Alisson, que apenas se deu ao trabalho de recortar uma imagem e colar, sem
trabalhar seus contornos e retirar o desnecessário dela. Talvez ele tenha tentado
retratar o louvor religioso, mas acredito que haveria outras possibilidades de
realização para a tarefa, sem contar que ele estava mais interessado em finalizar um
trabalho de outra disciplina do que este.
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Trabalho do aluno Alisson
(FONTE: FROES 2012)
Seguindo com a aula, fiquei observando os alunos que estavam produzindo e
os que não estavam, alguns alunos como Rafaela e Vinicius que ficavam
reclamando da falta de tesoura. Disse a eles para aguardarem um colega usar e
pedir emprestado. Como eu havia dito na aula anterior, material básico eu não
forneceria.
Eu Estava realizando a chamada de alunos quando a professora entrou
sorrateiramente na sala de aula sem que eu percebesse. Quando ela percebeu que
eu a notei, disse que estava observando minha aula. Eu não senti problema algum
nisso e disse que podia ficar à vontade. Então, vendo a dificuldade de certos alunos
ela sugeriu vir entregar tesouras que ela possuía para que eles conseguissem
realizar o trabalho. Eu disse que eu já havia dito que material básico como lápis,
borracha, tesoura e cola eu não forneceria até porque eles tem que possuir estes
materiais. Já estávamos no mesmo trabalho há 3 aulas e mesmo assim quem
reclamava da falta de material nem sequer estava realizando quando os materiais
foram trazidos na aula anterior. A professora tentou argumentar e disse que eles
haviam feito uma vaquinha para comprar os materiais. Então eu disse que por mim
tudo bem.
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A minha opinião a respeito deste assunto é de que não há necessidade de
comprar materiais como estes, pois não era obrigação minha como professora
gastar com tesouras. Existe o Estado para fazer isso. Outra coisa, como comprar
materiais como estes, quando mais da metade da turma possui smartphones,
Tablets e alguns trabalham? O que é prioridade para as famílias e para eles? Talvez
não seja o ensino.
O que faz com que alguns da própria sala de aula tenham cola e tesoura e os
outros não? Não acredito que fornecer materiais, como a professora fez, seja o
correto. Obvio que levaria certos materiais mais “exóticos.
Por mais que a aula planejada não saia como eu queria, não posso me
conformar com isso dando materiais. É fato que isso atrasou alguns alunos? Obvio,
mas eles têm que desenvolver certas responsabilidades nesse estágio e no mínimo
a dos materiais, pois o resto já é fornecido pelo governo. Eles possuem uma sala de
aula, um quadro, uma sala de vídeo, uma quadra de esportes, livros e etc. Não
estou dando aula em uma comunidade carente para comprar materiais, sendo que
uns 35% (baseado nos 17 trabalhos entregues, de 26 alunos em sala de aula) não
produzem durante as aulas de artes.
Elton, Vinicius, Larissa, Lilian (que falta muito às aulas), Guilherme e outros
não realizaram a atividade, não pela falta de material, mas por não se interessam.
Ao final da aula, percebi erroneamente que a única deles que realizou foi à aluna
Lilian e isso porque entreguei uma tesoura que a professora titular trouxe. Ela nem
sequer se levantou para buscar esse material, mas a mesma realizou a atividade.
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Trabalho da aluna Lilian
(FONTE: FROES 2012)
Eu não havia prestado atenção no trabalho dela devido ao seu histórico de
faltas e por ela não realizar as atividades e nem falar durante as aulas. Mas quando
fui analisar os trabalhos de forma mais profunda em casa, percebi que ela atingiu
todos os objetivos propostos, sendo o principal para mim o de retratar uma mulher
com corpo gordo. Analisei de novo e percebi que as setas apontavam para esta
região do corpo. O rosto bonito talvez seja uma forma da aluna se auto avaliar:
embora gorda, tenho um rosto bonito. A tiara talvez represente também a
supremacia do corpo mais gordo sobre os demais. Essas questões certamente irão
ser levantadas futuramente quando realizarmos uma reflexão sobre os trabalhos
produzidos. Concluindo, gostei da simplicidade e objetividade do seu trabalho. Um
trabalho muito diferente dos demais, que retrataram em sua maior parte a
ambiguidade sexual humana.
Esse trabalho realizado pela aluna Lilian me remete à representação das
Venus antigas, antes da dominação masculina sobre o corpo da mulher, quando ela
era muito mais que uma provedora de descendentes; era responsável pela
manutenção da vida de forma sagrada e não era obrigada a usar seu corpo para
reproduzir, ela seguia o próprio fluxo da sua natureza (ALMEIDA, 2010).
Prosseguindo com a aula, observei que o restante dos alunos estavam
empenhados em realizar a atividade. Ainda mais sabendo que era o ultimo dia para
a realização da atividade proposta. Aproveitei e dei uma volta pela sala de aula e
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pude observar alunos, como Diego, comporem imagens que no fim se tornam
engraçadas ao olhar dos outros. Tudo porque ele recortou uma mão que apontava o
dedo indicador para a bunda de um menino, talvez se possa levantar questões de
saúde, ou mesmo sexo como tabu. Outro trabalho que observei e para o qual fiquei
sem palavras foi a composição da aluna Amanda, em que ela mistura diversas parte
de um corpo e cria um novo, representando um ser hibrido, composto de partes
femininas como cabelo e pernas e masculinas como a face e o tronco.
Trabalho do aluno Diego
(FONTE: FROES 2012)
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Trabalho da aluna Amanda
(FONTE: FROES 2012)
Minha avaliação final desta aula é de que os objetivos técnicos ligados a
disciplina de artes foram atingidos, pois permitiu que os alunos desenvolvessem sua
imaginação e trabalharam com seu olhar no sentido do fazer artístico. Quanto aos
objetivos cognitivos, espero que tenham sido atingidos também, e que tenham
compreendido a importância de se trabalhar com as diferenças, pois somente assim
construiremos uma sociedade mais igualitária e consequentemente melhor. Ainda há
um longo caminho a se percorrer dentro das próximas aulas de artes. Espero poder
levantar questões sobre arte e corpo utilizando estas imagens e discutir a respeito
da diversidade que possuímos no nosso planeta, de como somos diferentes. E que
com isso passemos a tratar as pessoas com mais respeito.
Não gostei da aula ter sido invadida da forma como foi, pois isso não alterou
muito a disciplina e empenho da turma. O que eles precisam é, adquirir certas
responsabilidades e enquanto alguns professores ficarem passando a mão em suas
cabeças eles não vão compreender a importância de se estar dentro de uma sala de
aula. Com a próxima aula espero poder conseguir me integrar mais a turma, pois
99
também percebo que embora eles sejam agitados eu preciso conquistá-los mais,
sorrir mais para eles. Para que assim possam confiar em mim e possamos
desenvolver um trabalho melhor durante as aulas de artes.
100
3.3.7. Sétimo encontro
Numero da aula: 07
Data: 13/11/2012
Duração: 1 hora
Serie: 1º ano do ensino médio
Conteúdo: corpo humano, arte renascentista, arte barroca, arte moderna e
preconceito racial e sexual, mulher.
Lista de atividades:
Informar como será a atividade planejada para esta aula.
Se dividirem em grupos e se organizarem num semi circulo.
Cada grupo deverá selecionar uma imagem posta em cima das mesas e em
cada imagem estará escrita atrás uma palavra.
A partir da palavra o grupo deverá construir um pensamento e a partir dessas
os outros grupos podem se manifestar contra ou a favor e o professor será o
mediador dessa conversa.
Organização da sala de aula.
Encerramento da atividade.
Objetivos específicos:
Discutir a respeito da importância da figura humana na arte.
Apresentar corpos que sofrem com o preconceito na sociedade.
Reorganizar o pensamento sobre o preconceito.
Refletir sobre o corpo dentro da arte.
Desenvolver uma consciência social a respeito do corpo humano.
Metodologia: Expositiva e Dialogada, Debate e Reflexão.
Materiais: Folhas A4, imagens de reproduções artísticas.
Avaliação:
Será avaliado o dialogo estabelecido na sala de aula entre alunos e professor
e alunos com alunos, bem como as observações pertinentes ao objeto de estudo. As
101
comparações realizadas pelos alunos também serão avaliadas e assim como os
pensamentos desenvolvidos ao longo do período.
Planejado:
No inicio da aula pedirei para a turma se dividirem em cinco grupos de
aproximadamente cinco membros e formem um semicírculo na sala de aula, darei
cinco minutos para que realizem esta atividade. Enquanto se organizam, irei juntar
algumas mesas e colocarei algumas imagens artísticas viradas para cima da mesa,
de forma que eles possam enxergar essas imagens. Atrás de cada imagem estará
alguma palavra chave, em que cada grupo terá que desenvolver um pensamento a
respeito da palavra.
Estas palavras chave serão: arte, sexo, sexualidade, corpo e discriminação.
As imagens artísticas terão como finalidade guiar o pensamento dos alunos, para
que não fiquem desnorteados quando forem construir algum tipo de pensamento. As
palavras chave e imagem deverão nortear o pensamento de cada grupo, mas elas
não estarão isoladas, embora cada grupo levantará um pensamento a respeito da
palavra que pegou, os outros grupos poderão complementar com as outras palavras
que retiraram o pensamento dos outros grupos.
Ficarei mediando o pensamento de cada grupo, colocando algumas questões
em cima do que for dito, tentando responder duvidas que tenham a respeito das
palavras, tentar desconstruir pensamentos preconceituosos, tentando criar um
dialogo entre o que alguns alunos pensam com pensamento de outros colegas.
Faltando cinco minutos para o termino da aula, pedirei que voltem a seus lugares e
que semana que vem eles começarão a realizar uma atividade plástica em grupos
de cinco.
102
Realizado
A aula iniciou como sempre muito agitada. Assim que cheguei à sala de aula,
larguei meus materiais em cima da mesa e fui ao quadro escrever uma frase que
dizia para eles se organizarem em grupos de cinco alunos. Aguardei um cinco
minutos para eles perceberem que eu estava em sala de aula. Quando perceberam,
pedi para realizarem o que estava pedindo no quadro. Que primeiro, eles deveriam
se organizar em sala de aula, e depois realizaríamos um trabalho em cada grupo.
Um aluno me perguntou se podia formar um grupo com seis componentes,
neguei seu pedido, já que o máximo permitido seria cinco alunos. Mais que isso
dispersaria a turma. Com a ajuda de um dos alunos contamos os que estavam em
sala de aula e reduzi o numero de cinco para quatro alunos em cada grupo. Pedi
então novamente que se reunissem em grupos de quatro membros. Eles ficavam
relutando em se encaixar nos grupos. Um aluno chamado Juliano disse que suas
colegas de grupo não haviam vindo no dia, disse a ele que se reunisse com outros
para a execução da tarefa.
Posso afirmar que levei quinze minutos desde que entrei em sala de aula,
escrevi no quadro, determinei o numero de alunos em cada grupo e eles começarem
a se mexer para formarem os grupos. Somando a isso, tive que elevar meu tom de
voz para que fizessem os grupos e que a aula de hoje não era brincadeira. Após
isso, se reuniram e pude dar inicio à segunda parte da atividade planejada para esta
aula.
A segunda parte consistia em colocar imagens produzidas na história da arte,
tanto de esculturas como pintura em cima de mesas e pedir que cada grupo
escolhesse uma imagem de sua preferência. As imagens escolhidas por mim para a
aula foram: A Primavera de Sandro Botticelli, Davi de Michelangelo, Hermafrodite de
Gian Lorenzo Bernini, O Rapto de Persefone de Gian L. Bernini e The Seed of the
Areoi de Paul Gauguin. Escolhi a maior parte dessas imagens clássicas (com
exceção de Gauguin) devido a sua fácil visualização e interpretação sobre o que
viríamos a discutir em aula naquele dia.
Assim que cada grupo selecionou uma imagem, pedi que se virassem a folha
contendo a imagem e falassem em voz alta a palavra que estava escrita no verso.
103
Cada um dos grupos pronunciou uma palavra: arte, discriminação, sexo,
sexualidade e corpo. Comecei perguntando ao primeiro grupo, composto por alunos
em que com os quais eu não consigo ter intimidade profissional, já que nunca
querem trabalhar em sala de aula, não falam nada, o que vinha a significar para eles
a palavra “arte”. Esses alunos relutaram demais em falar, queriam passar a vez para
outros grupos. Insisti que queria a definição deles de arte e não a dos outros grupos.
Então falaram que “arte servia para expressar sentimentos, era desenho, pintura,
escultura e que eles não tinham nada a ver com a arte”.
Sandro Botticelli - A Primavera, 1482
Disponível em < http://www.google.com/culturalinstitute/project/art-project?hl=pt-br > acesso em 10/08/2012
Perguntei aos outros grupos o que vinha a ser arte para eles e eles
responderam também sobre a expressão de sentimentos, questionei a todos se era
apenas isso que a arte representava e se qual era o papel dela nas nossas vidas.
Nenhum deles soube responder. O primeiro grupo estava com a clássica imagem de
Sandro Botticelli, intitulada A Primavera. Vendo que eles estavam com essa imagem
perguntei se ela representava a expressão de sentimentos do artista. Eles afirmaram
que a imagem, tinha sentimentos como alegria, prazer e curiosidade. Perguntei a
todos os alunos se eles concordavam com isso e disseram que sim. Então tentei
argumentar que a imagem não expressava o sentimento do artista e sim das figuras
mitológicas ali presentes, já que também a obra era uma encomenda feita por um
104
dos membros da família Medici. Talvez se eu tivesse selecionado uma imagem
expressionista poderiam falar muito mais de sentimentos do que dessa imagem do
inicio do renascimento. Mas já havia pensado na resposta que eles dariam, então
selecionei uma obra que usasse mais a racionalidade que a emoção.
Continuando a aula, pedi ao segundo grupo que falasse sobre a palavra que
eles pegaram. A palavra foi “corpo”. Perguntei a eles qual era a definição de corpo
para eles, e qual a utilidade do mesmo. Esse grupo respondeu diversas coisas como
servir para fazer exercícios físicos, se reproduzir, criar arte, pensar, amar. Com
essas respostas, perguntei o que era o corpo e responderam que era uma matéria
dotada de vida, de história, sentimentos e pensamentos. Questionei aos outros
grupos de alunos e eles afirmaram que as definições estavam boas e não tinham o
que acrescentar.
Michelangelo - Davi, 1504
(Fonte: DUBY, 2006, p. 617)
Partindo disso, pedi que virassem a folha e dissessem que imagem era a que
seguravam. Falaram que era um homem segurando uma pedra e ele estava nu.
Perguntei se sabiam quem era, disseram que não. Então disse que a escultura se
chamava Davi, criada por Michelangelo, o maior escultor que o mundo já havia visto.
105
Nesse meio tempo de aula senti muita dificuldade em falar e ao mesmo tempo
em ouvir o que os alunos falavam. Já estava estressada pelo fato de ter entrado em
sala de aula e eles terem demorado para se organizarem e mesmo enquanto os
colegas falavam, uns que não estavam com interesse na aula, E atrapalhavam. O
aluno David sempre levantava de seu lugar para mostrar alguma musica para outro
colega. Ou quando o primeiro grupo tinha terminado de falar e passamos para o
segundo, o grupo um ficou de conversa na turma. Tive que alterar meu tom de voz
novamente e pensava que não era possível haver tanta falta de educação nesses
jovens, não é normal, não é aceitável isso.
Depois que a aula foi interrompida pelos mesmos alunos de sempre, pedi que
o terceiro grupo falasse a palavra que haviam pego e definissem para a turma. A
palavra era “sexo”. Juliano, e Esther foram os únicos do grupo a falarem, os outros
dois ficavam calados. Juliano começou a falar palavras como masculino e feminino,
casual, homem, mulher. Esther também falou força e delicadeza. Complementei
suas palavras dizendo que sexo estava muito além do exterior e das genitais, que
podíamos falar de sexo cromossômico, gonodal (genitais), endócrino (hormonal),
fenótipo, ou seja, como o sexo externo se apresenta. Falei também sobre as
diferenças entre homem e mulher. Então me lembrei das palavras de Esther, que
falou em força e delicadeza.
Perguntei ao terceiro grupo que imagem eles tinham pego, eles me
mostraram e eu informei que era a imagem de uma escultura Barroca feita por Gian
Lorenzo Bernini que representava o mito de Persefone. Esther e Juliano ficaram
comentando do físico do homem, no qual seus músculos estavam muito ressaltados.
Questionei a respeito dos músculos da mulher e Esther disse que não estavam
ressaltados como no homem e era mais suave. Podia-se notar a diferença da pele
masculina e feminina. Juliano comentou de a mulher estar sendo abraçada, então
perguntei se parecia um abraço mesmo ou ela estava sendo agarrada. Ele
respondeu que realmente ela estava sendo agarrada e não estava gostando, tanto
que chorava. Foi então que este aluno fez o melhor comentário que já ouvi a
respeito dessa escultura. Algo que sempre quis que percebessem quando exibia a
imagem desta escultura.
106
Gian L. Bernini: O rapto de Perséfone, 1621-1622
(Fonte: DUBY, 2006, p. 772)
Juliano falou que essa cena retratada na escultura de Bernini parecia um
estupro. Ouvindo a resposta dele, tive que concordar com sua observação. Elogiei-o
e disse que sim, essa obra por mais linda que fosse, retratava a violência contra a
mulher, legitimada pela visão masculina e reproduzida na arte como algo a ser
admirado. O que percebemos é um homem que agarra com força a mulher
(Perséfone) e mesmo aos prantos e implorando para que não a machuque, ele a
toma para si, como se ela fosse sua propriedade. Contei o mito de Perséfone e
como ela foi raptada por Hades e no final se apaixonou pelo seu violentador. Disse
que era uma versão clássica do que alguns pregam até hoje, a submissão feminina,
na qual inclusive poderíamos falar sobre o que alguns senhores falam sobre a
mulher não abortar mesmo em caso de estupro. Sei que esse tema é muito delicado,
mas quis demonstrar para eles até que lugar pode ir o pensamento patriarcal sobre
a mulher, em que ela não tem o direito de escolher sequer o homem com quem
dividirá seu leito. Encerrei o assunto elogiando a participação dos alunos.
107
Mais que admirar a imagem que trouxe, meu objetivo era promover uma
reflexão sobre ela:
O ato de ver e interpretar as produções das artes visuais perde, de alguma maneira, certa inocência e a crença da neutralidade das imagens artísticas. A partir dessas perspectivas teóricas e seus desdobramentos, a visão começa a ser concebida como uma construção social fortemente implicada na construção de subjetividades e identidades [...].(Icle, 2010, p. 152)
Passei a voz então para o quarto grupo que estava com a palavra
“sexualidade”, perguntei a eles qual o significado da palavra sexualidade na visão
deles. Para eles, a sexualidade estava relacionada à preferência sexual do individuo,
seja ele homossexual, bissexual ou heterossexual e servia para expressar o amor.
Informei que eles estavam parcialmente certos, mas, porém, essa não era a única
resposta possível para sexualidade.
Disse que podíamos falar sobre identidade de gênero, ou seja, a pessoa se
sentir homem ou mulher de forma psicológica e biologicamente ser de outro gênero.
Também informei que diferente da palavra “sexo”, a sexualidade era muito mais
abrangente, não esta ligada apenas ao exterior, ao nu cru do corpo. Estava na sua
essência, na verdadeira natureza do ser humano. Disse a eles que existiam formas
sadias de expressar a sexualidade humana e outras erradas e puníveis como no
caso da pedofilia e estupro. Pedi então que o grupo olhasse para a imagem na folha
e dissessem o que observavam. A aluna Alexandra disse que não sabia identificar,
já que a escultura parecia uma mulher, mas tinha pênis. Ela ficou confusa ao tentar
dar um nome para a figura, então disse a ela que essa era aquela mesma imagem
que vimos em nossa segunda aula e da qual eles haviam rido. Ela ainda continuou
confusa, pois não sabia se falava hermafrodita ou travesti, essas palavras tentavam
sair de sua boca, mas ela não conseguia definir.
Quando chegamos na escultura de Hermafrodite, disse que essa imagem se
tratava simplesmente de um ser hermafrodita. Então ela perguntou se pessoas
assim realmente existiam e eu disse que sim, existem até hoje pessoas que nascem
com essa condição biológica. Não apenas os cromossomos vão determinar o sexo
ou mesmo as genitais, mas a mente. Ela ficou espantada e achava que
hermafroditas eram mito.
108
Disse a ela que os gregos retrataram muito sobre as condições sexuais do
que vemos ainda hoje e achamos um absurdo. Mas também lembrei a ela e à turma
que pessoas ambíguas não são bem vistas hoje em dia devido à herança grega e
cristã de inferiorizar a mulher e tudo aquilo que pende para a feminilidade, como se
ser mulher fosse motivo de vergonha. Disse que não era a toa que travestis,
transexuais ou mesmo os intersexuais são vistos como anormais, pois fogem
daquilo que se estabeleceu como comum na sociedade. A aluna Esther fez um
comentário à turma de que os gregos eram gays e eu concordei, nisso o aluno
Alisson me corrigiu dizendo que a palavra correta era homossexual, argumentei que
“gay” não era errado, que a verdadeira discriminação está na forma como tu te dirige
à pessoa e não na palavra em si. Disse que gays e lésbicas eram denominações
para homossexuais, que não estava errado falar assim.
Gian L. Bernini – Hermafrodite, 1516
Disponível em http://expo-escultura.blogspot.com.br/2010_05_01_archive.html > acesso em 19/08/2012
Partindo para o quinto e ultimo grupo, pedi que lessem a palavra que tiraram
e a palavra foi “discriminação”. Perguntei a eles o que significava para eles
discriminar alguém. Responderam-me que era o ato de impedir alguém de fazer algo
só por acharem que ela não é capaz devido a sua, cor, sexo e orientação sexual.
Perguntei aos outros se concordavam com isso e todos assentiram e acrescentaram
que também é o ato de xingar alguém, fazê-la passar vexame só por ser quem é,
sem que essa pessoa seja ruim de fato.
109
Perguntei que imagem eles estavam segurando e me mostraram a imagem
de uma nativa retratada por Paul Gauguin, artista pós-impressionista frances.
Perguntei se eles imaginavam porque eu havia trazido essa reprodução de Paul
Gauguin, eles não souberam responder, os únicos alunos que realmente falaram no
grupo foram Diego e Vanderlei, os outros dois ficaram ouvindo musica e passeando
pela sala e aquilo me estressava. Depois de um tempo, Vanderlei disse que talvez
pela cor dela, eu afirmei que sim, já que estamos no Brasil, poderíamos usar esta
reprodução como um exemplo sobre como pessoas de pele mais escura são
tratadas de forma diferenciada. Os informei que a imagem não retratava uma negra
africana, tão pouco uma mulher brasileira, mas que era um exemplo que queria
trazer a eles sobre a retratação de pessoas de cor (além do tom claro das pinturas
Europeias sobre europeus) na arte. Perguntei quantas obras de pessoas assim eles
já viram retratadas. Eles responderam que nenhuma. Disse que existiam, mas era
um percentual tão pequeno se compararmos ao que já foi produzido em artes,
principalmente à ocidental, européia. Tanto é que as imagens clássicas trazidas por
mim retratavam pessoas brancas, traços europeus, nada de exótico como na nativa
de Gauguin.
Paul Gauguin - The Seed of the Areoi, 1892
Disponível em < http://www.zazzle.com.br/paul_gauguin_a_semente_do_areoi_cartao_postal-239805983445697714 > acesso em 19/08/2012
110
Percebendo que faltavam dez minutos para o final da aula, voltei minha
atenção para o segundo grupo e perguntei como Davi de Michelangelo estava sendo
exibido. Os meninos do grupo informaram que era um homem aparentemente alto,
com os músculos bem definidos, um rosto bem esculpido, embora a pose para eles
fosse homossexual. Então pedi que o segundo grupo e o terceiro levantassem as
imagens e perguntei à turma que diferenças eles observavam entre a escultura de
homem de quinhentos anos atrás e o corpo de um homem nos dias atuais. Eles
disseram que não havia muitas diferenças, que manter o corpo era importante, tanto
pra conquistar mulheres quanto pra se acharem mais bonitos e confiantes.
Questionei sobre a cultura do culto ao corpo que temos hoje. Exemplifiquei sobre
pessoas obesas, mais gordinhas, com deficiências e pedi para olharem para Davi de
Michelangelo e tentarem ver alguma diferença entre o homem ideial do
renascimento e o de hoje, as respostas foram que nada mudou, fisicamente falando.
O homem deveria continuar viril, com músculos bem definidos e jovem.
Cheguei à conclusão com essa aula de que sim, tenho minhas falhas
enquanto educadora, mas que a turma em si é muito mal educada, a todo o instante
tive que parar de falar simplesmente por educação e deixar aqueles que “não
queriam nada com nada falar abobrinhas”. Tentei fazer minha parte como professor,
tentando trazer uma nova abordagem das artes dentro da sala de aula, sair do
ensino de técnicas com materiais diversos para trazer um campo que é pouco e mal
explorado no Brasil (Icle, 2010).
Se fosse colocar neste relatório o tempo todo em que a aula sofreu
interrupções por causa desses alunos, iria haver muito mais p.inas e eu não quero
escrever daqueles que estão errados e sim daqueles que querem aprender e
querem participar da aula. Esses alunos que participaram da aula conseguiram
conversar comigo, até mesmo trocamos sorrisos, como quando disse sem querer: os
gays gregos que eram mesmo gays. Quando na verdade queria falar: os homens
gregos que tinha uma cultura de se deitar com outros homens. Isso foi valido, pois
consegui me aproximar de alguns alunos como Juliano, Esther, Rafaela, Alexandra,
o problemático Guilherme, que nesta aula foi muito educado e conseguiu falar bem
em sala de aula, sem causar muita agitação. Enfim, são esses os alunos que valem
a pena ser mencionados neste relatório. Esses alunos sim conseguiram atingir os
111
objetivos propostos por esta aula. Dando opiniões, fazendo observações sobre as
imagens e tentando construir um dialogo.
Pessoalmente sai da sala ao mesmo tempo feliz, mas com um nível de
estresse enorme por esses alunos que dificultaram a aula planejada, não me
deixando mediar como havia planejado todos os assuntos. Foi difícil interligar as
palavras e as imagens quando dois grupos, o primeiro e o quinto possuíam alunos
que só tumultuavam a aula. O mais importante nessa aula era ajudá-los a formar
novos conceitos, desenvolver o pensamento, usando a arte como artifício principal.
O professor trás conhecimentos e experiências mais ricos e organizados; com o auxilio do professor, a conversação visa levar os alunos a se aproximarem gradativamente da organização lógica dos conhecimentos e a dominarem métodos de elaborar as suas ideias de maneira independente (Libâneo, 1990, p. 168)
112
3.3.8. Oitavo encontro
Numero da aula: 08
Data: 19/11/2012
Duração: 1 hora
Serie: 1º ano do ensino médio
Conteúdo: figura humana, escultura.
Lista de atividades:
Informar como será a atividade planejada para esta aula.
Distribuir os materiais necessários para a realização da atividade.
Demonstrar como devem realizar a atividade e auxiliá-los quando necessário.
Realização da atividade.
Organização da sala de aula.
Encerramento da atividade.
Objetivos específicos:
Desenvolver a imaginação.
Pensar a respeito de como poderão construir a figura humana.
Pôr em pratica as reflexões acerca do corpo como uma construção social e
individual.
Metodologia: Pratica artística, Reflexão.
Materiais: papel comum A4, cola e fita adesiva.
Avaliação:
Será avaliada a construção das esculturas por parte dos alunos. Cada aluno
será avaliado individualmente, todos devem participar da criação da estrutura do
corpo. Será avaliada a conclusão do trabalho bem como a qualidade plástica do
mesmo.
113
Planejado
No inicio da aula, irei começar a distribuir quatro folhas de papel comum,
como as de oficio, para cada aluno. Após a distribuição das folhas, irei informar que
trabalho eles farão e como eles irão realizar o mesmo.
Primeiro direi que, antes de começarem a escultura como havia dito na aula
passada, eles irão criar um esqueleto para ela, pois com o material que eles
utilizarão se fará necessário um suporte para pôr o papel machê. Após essa
explicação, passarei à segunda fase que, será mostrar para eles como deve ficar o
protótipo que começarão a realizar.
Prosseguindo com a aula, irei demonstrar para eles como deverão enrolar os
papeis comuns e fazer canudos com eles. Direi para enrolarem na diagonal e depois
colarem a ponta com cola. Após realizarem três canudos de papel, pedirei que com
a ultima folha façam um tubo mais grosso. Após terem feito três canudos finos de
papel e um tubo pequeno com a outra folha, direi que agora eles irão começar a
juntar as partes.
Primeiro deverão dobrar ao meio um canudo para que este sirva como
suporte para os braços e pernas do boneco. Depois deverão colocar um canudo
dentro do tubo, de forma que forme o tronco do corpo. Em seguida pedirei que
encaixem entre o vão do primeiro canudo os outros dois, um na parte superior
representando as pernas e outro por cima do tubo, representando os braços. E, por
ultimo, solicitarei que usem a fita adesiva para imobilizar os membros, como as
penas e braços do protótipo de modo que fique assim:
114
(Fonte: FROES, 2012)
115
Realizado
A aula começou super tranquila, até achei que estava entrando em outra
turma. Com certeza o efeito pós recreio faz uma diferença tremenda em como os
alunos se portam quando eu chego. Todos eles estavam sentados e em silencio. A
professora da aula anterior ainda estava na sala de aula e me pediu um curto
espaço de tempo para recolher os trabalhos dos alunos, consenti pois não havia
nenhum problema nisso.
Foi planejado para esta aula algo extremamente simples e fácil para todos
eles realizarem. Comecei me organizando e distribuindo quatro folhas para cada um
dos alunos. Eles me perguntavam o que iriam fazer com aquelas quatro folhas, disse
para aguardarem que logo saberiam. Então após distribuir as folhas de oficio, tirei de
dentro da minha bolsa três canudos finos feitos com folhas de oficio e depois um
esqueleto de um corpo humano feito com esses canudinhos. Então informei a eles
que iríamos realizar uma atividade que iria levar quatro aulas para ser concluída. A
primeira parte seria essa, eles iriam construir uma estrutura com o formato de um
corpo humano feito em papel comum e na próxima aula iriam preencher com papel
machê.
Eles pareceram gostar da ideia e logo queria saber como realizariam a
atividade. Então primeiro disse a eles que deveriam enrolar três das quatro folhas no
sentido diagonal e depois deveriam colar a ponta com cola. Então fui à mesa de um
aluno, Juliano, e disse como ele deveria enrolar, a fim de deixar o canudo fino e não
tão grosso. O método utilizado nesta aula foi a exemplificação descrita por Libâneo
(2001): ensinei aos alunos, passo a passo como desenvolverem o trabalho da
melhor forma possível.
Por mais que a atividade fosse simples, eu imaginei que eles iriam levar a
aula toda. Sozinha, eu consegui fazer o boneco em quinze minutos, mas
conhecendo a turma, já sabia que iriam levar mais tempo que o necessário.
Prosseguindo com a aula, fiquei andando na sala de aula ajudando os alunos que
me pediam ajuda. Quando percebia que um aluno estava deixando o canudo grosso
demais, eu ia até ele e pedia que desfizesse o rolinho e começasse novamente e
mostrava como deveria proceder.
116
Fiz isso mais com os alunos do fundo da sala de aula, que normalmente não
fazem nada. O aluno Guilherme estava realizando a atividade e fiquei satisfeita, já
que o mesmo demonstrou dificuldades, no inicio do projeto, já relatadas nos
relatórios anteriores.
Enquanto todos realizavam a atividade, percebi que um aluno não estava
conseguindo. O aluno em questão estava apresentando dificuldades ao longo da
disciplina, seu nome era Elton. Ele é um dos alunos problemas, muito querido, mas
não produz absolutamente nada. Perguntei a ele qual era a sua dificuldade, ele
disse que não conseguia enrolar os papeis como eu havia ensinado. Neste
momento, ele me fez uma expressão de provocação e eu bem calma disse que
aquela atividade não era difícil, que ele devia tentar que ele era capaz. Ele me
desafiou com o olhar dizendo não saber, peguei um pedaço de papel e mostrei na
sua frente como deveria realizar, não fiz o trabalho por ele, apenas quis mostrar que
não havia dificuldade e que estava ali para auxilia-lo. Ele disse que era muito difícil e
eu educadamente disse: Elton, eu consegui realizar esse trabalho quando tinha dez
anos de idade, por que tu não consegues tendo em vista possuir vinte anos de
idade? A partir dessa pergunta todos os seus colegas riam dele e então ele baixou a
cabeça e parou de me desafiar. Ele não realizou a tarefa, mas também não ficou
importunando seus colegas.
Seguindo com a aula, após eles enrolarem as três folhas de oficio, disse a
eles que eles deveriam pegar um canudo e dobrar ao meio, que essa estrutura seria
semelhante à coluna vertebral do boneco, é a partir dela que os outros membros
como braços e pernas iriam se ligar. Após eles dobrarem ao meio um canudo
comecei a distribuir entre eles fitas crepes para que colassem as pontas dessa
estrutura.
Para aqueles que estavam atrasados, eu pedia que os alunos que estavam
adiantados ajudassem seus colegas, não apenas para agilizar a aula, mas para eles
compartilharem conhecimento, por mais pratico e simples que este seja, ajudando
uns aos outros.
117
(Fonte: FROES, 2012)
Durante todo o tempo, fiquei lembrando os alunos de que eles estavam
criando uma estrutura para poderem trabalhar no outro dia com o papel machê.
Lembrava também que deveriam representar um ser humano que sofre preconceito
no sociedade devido ao seu corpo, e junto a isso já pedi que pensassem na posição
em que seu boneco iria ficar, pois depois de colocarem o papel machê na estrutura
realizada em aula, não seria mais possível o esqueleto.
O mais importante para esta aula é que eles comecem a pensar em que
corpos farão. Desde o começo das aulas falamos de corpo e depois de preconceito.
Algo que deve ser trabalhado dentro da escola. É importante que eles aprendam
porque é errado discriminar e não apenas serem politicamente corretos, ou seja, não
discriminar porque é errado, é necessário discutirem porque é errado discriminar.
Esse é um dos meus papeis, pois “requerem do professor uma compreensão clara
do seu significado social e político do seu trabalho, do papel da escolarização no
processo de democratização da sociedade [...] (Libâneo, 2001, p. 74)”.
Logo que finalizaram essa parte, solicitei que com a quarta folha eles
fizessem um tubo mais grosso, que representaria o tronco do boneco, em que eles
iriam fazer a barriga e o peito quando fossem trabalhar com o papel machê. Então,
quando terminaram de fazer o tubo, pedi que colocassem o primeiro canudo que
dobraram por dentro do tubo e logo em seguida com o segundo canudo colocassem
na parte de baixo do primeiro canudo a fim de segurar o tubo. Depois de realizarem
essa parte, pedi que o ultimo canudo colocassem acima do tubo a fim de segurar ele
por cima também.
118
(Fonte: FROES, 2012)
Terminada essa primeira parte da atividade, pedi que, com a fita crepe, ele
passassem por volta dos braços e pernas, a fim de imobilizar essas partes para
depois conseguirem trabalhar melhor com seus bonecos. Aos poucos cada um foi
fazendo a atividade. Enquanto alguns já estavam concluindo o boneco, percebi que
outros alunos ainda estavam com dificuldades, pois seus rolos estava muito grossos.
Fui até eles, Larissa e Vinicius, e comecei a explicar desde o começo e, vendo que
faltavam poucos minutos para o termino da aula, fiz o trabalho de passar a fita
crepe.
Terminado o trabalho e faltando muito pouco para o termino da aula, uma
aluna em especial fez um comentário positivo em relação ao que havia realizado, ela
havia feito também um chapéu para o boneco. A aluna foi Ashley, uma das meninas
desinteressadas nas aulas de artes. Fiquei muito contente porque de alguma forma
consegui atingi-la de forma positiva. Lembro de que na nossa primeira aula ela
reclamou que não sabia pintar nem desenhar e nessa ela ficou contente com o
trabalho tridimensional que estava realizando e de fato havia realizado. Disse a ela
que estava muito bem construído e que ela podia começar a pensar no que faria
com ele amanha, quando começassem a preenchê-lo de papel machê.
119
(Fonte: FROES, 2012)
Após a aula fiquei refletindo sobre a atitude do aluno Elton. Fica claro para
mim que alguns alunos não possuem a maturidade exigida para suas idades,
dezesseis a vinte anos, e para a série que estão atualmente (primeiro ano do ensino
médio). Pois na minha experiência de vida, a melhor fase é a escola, depois que
você sai dela, a vida te mostra que o mundo não é feito de boas pessoas, que a vida
é cruel, vão haver momentos bons, obvio, mas muito mais momentos ruins se eles
não adquirirem conhecimento e tiverem maturidade para entrar no mercado de
trabalho ou seguir a vida acadêmica. Libâneo (2001) nos lembra que é preciso
observarmos bem os alunos e tentar construir atividades que estejam no nível de
maturidade e idade deles, pois não é possível o aluno chegar a um determinado
objetivo se ele não tiver condições mentais mais tal, no final das contas o problema
da aula não funcionar se deve a um erro de observação do professor e não dos
alunos.
Mas por outro lado devemos lembrar também que a idade biológica deles já
corresponde ao nível de exigência que eu trago, se eles não estão no nível que se
exige normalmente não sou a única responsável, tão pouco eles que nada tem a ver,
mas sim a toda uma sociedade que apenas pensa em números e não em qualidade
de ensino. Local em que o importante é passar de ano, independente se assimilou
os conteúdos ou não.
120
É isso que me preocupa, por isso adoto uma postura rígida em relação a eles.
A academia não me ensinou a educá-los e sim a ensinar, não sou mãe, nem pai,
nem tio e tia para dizer que se deve respeitar o professor em sala de aula. Se eu
adoto a rigidez e rispidez é para mostrar a eles que não estou ali para passar a mão
na cabeça como os outros professores fazem para não se estressarem e sim para
ser justa e imparcial. Esse é meu trabalho, sinto que esse é meu modo de conduzir
uma aula.
Lembro das palavras da professora Tânia na disciplina de Fundamentos da
Ação Pedagógica I, em que ela exemplificava diversas maneiras de ser professor,
de como conduzir. Ela repetia que sempre deveríamos ser verdadeiros no modo de
trabalhar, se é para ser um professor tradicional, que o seja da melhor forma
possível, bem como se é para ser construtivista, mas evitar de não ter alguma
identidade, pois isso iria refletir nos alunos e eles se sentiriam confusos.
Talvez eu esteja equivocada, ou tão cega sobre como dar aula, pois estou
muito estressada, não sinto tesão de estar em sala de aula. Eles conseguem me
irritar profundamente, pois queria muito que as aulas dessem ao menos certo como
essa, mas sei que não é uma realidade. Eu errei no inicio ao não querer levar
materiais e exigir que eles levassem materiais básicos. Errei em forçar isso neles,
mas não sei qual o meu erro, não sei quando acerto. Esse estágio esta muito mais
difícil do que o do ensino fundamental, pois no ensino médio a maioria não produz.
Concluindo, quase todos os alunos, com exceção de dois (Elton e Iago),
conseguiram atingir os objetivos propostos em sala de aula. Pela primeira vez mais
de noventa por cento da turma conseguiu realizar a tarefa e ficaram satisfeitos com
o que haviam realizado. Senti que estavam contentes, talvez a atividade por exigir
menos mentalmente do que as outras aulas os tenha feito relaxar um pouco mais.
Minha avaliação dos trabalhos foi muito positiva, construíram os bonecos como eu
havia proposto. Fiquei contente com os resultados obtidos. Encerrei a aula pedindo
para que trouxessem os bonecos no outro dia para começarmos a trabalhar com o
papel machê.
3.3.9. Nono encontro
Numero da aula: 09
121
Datas: 20/11/2012
Duração: 1 hora
Serie: 1º ano do ensino médio
Conteúdo: figura humana, papel machê, escultura.
Lista de atividades:
Informar como será a atividade planejada para esta aula.
Se dividirem em grupos de cinco pessoas.
Cada grupo deverá eleger um preconceito social para retratar na forma da
figura humana na linguagem tridimensional.
A partir dessa escolha, deverão pensar em como poderão realizar o trabalho
tridimensional.
Após decidirem a etapa anterior, deverão começar o trabalho de modelagem
com o papel machê.
Após o termino da modelagem deverão deixar a escultura secar longe da
umidade para que possam trabalhar em cima dela nas próximas aulas.
Organização da sala de aula.
Encerramento da atividade.
Objetivos específicos:
Desenvolver a imaginação.
Desenvolver a criatividade.
Pôr em pratica as reflexões acerca do corpo como uma construção social e
individual em uma linguagem tridimensional.
Desenvolver uma consciência social a respeito do corpo humano.
Metodologia: Pratica artística, debate e reflexão.
Materiais: papel machê.
Avaliação:
Será avaliada a construção da figura humana na linguagem tridimensional por
parte dos alunos. Cada aluno será avaliado individualmente, todos devem participar
da concepção das suas esculturas. Avaliarei a imaginação, o desenvolvimento do
122
processo criativo e como eles tratarão a escolha do assunto a ser abordado na
escultura.
Planejado:
No inicio da aula, pedirei para a turma se dividir em cinco grupos de
aproximadamente cinco membros e então começarei explicando que eles irão
desenvolver uma escultura com a técnica de papel machê. Explicarei a breve
história da técnica, onde ela surgiu e o que podemos fazer com ela. No quadro
colocarei a receita para o desenvolvimento do papel machê, que consiste em rasgar
tiras finas de papel de jornal, recipiente com água e cola branca.
Explicarei para eles que é um material que demora para ser produzido, pelo
menos vinte e quatro horas entre o processo de rasgar as tiras de papel e coloca-las
no recipiente com água. Depois é necessário coar o papel e retirar bem a água
absorvida, após, esmiuçar o papel em pequenos pedacinhos, quase que esfarelar e
finalmente misturar com cola branca e obter uma massa consistente para efetuar o
trabalho.
Como não teremos este tempo em aula, já levarei a massa pronta para os
alunos começarem a trabalhar. Levarei garrafas pet para eles usarem como suporte
da escultura que irão criar. O exercício vai consistir em modelar com a técnica de
papel machê uma figura humana. O preconceito, seja ele racial, de biótipo físico,
sexo, gênero, idade, deficiência e etc., será o tema principal da escultura.
Ao faltarem cinco minutos para o termino da aula, pedirei a todos que voltem
a se organizar e deixem as esculturas secando, longe da umidade. Este
planejamento prevê duas aulas para a modelagem das esculturas, sendo que a
segunda aula será a continuação da primeira.
123
Realizado
Passado um dia desde a última aula, cheguei como de costume na aula e já
esperava que eles estivessem agitados, já que hoje a aula seria dada após o
intervalo. Dito e feito. Eles chegaram agitados e eu escrevi no quadro que se
organizassem em seus respectivos grupos para darmos inicio ao trabalho com papel
machê.
Após falar isso, a maior parte da turma disse que não havia trazido os
bonecos feitos na aula anterior. Apenas dezesseis por cento da turma trouxe os
bonecos, ou seja, de trinta alunos, apenas cinco trouxeram. Isso me irritou
profundamente, pois não havia desculpas para terem esquecido. Então pedi
gentilmente que se reunissem nos grupos e que pelo menos desses grupos tivesse
um membro que tivesse o esqueleto construído na aula anterior.
Os alunos que haviam trazido eram Rafaela, Douglas, Carlos, Filiphi e
Vanderlei. Pedi para aqueles que não tivessem trazido ou haviam faltado a aula
anterior que fizessem um novo esqueleto. Então os alunos não se reuniram como eu
havia solicitado tão pouco fizeram o que pedi. Na realidade pouco me importei, a
partir daquela aula combinei comigo mesmo que daria aula apenas para aqueles
que quisessem aprender. Ou seja, daria as instruções sobre como proceder com o
trabalho de papel machê apenas para quem tivesse trazido o esqueleto que eu havia
ensinado na aula anterior.
Então comecei a distribuir bolas de papel machê para cada um dos alunos
que trouxeram e pedi a eles para ficarem próximos uns aos outros, já que eram
poucos, de forma que eu pudesse ajudá-los da melhor forma possível. Com exceção
do aluno Vanderlei, os outros alunos se reuniram. Comecei instruindo que
começassem preenchendo os esqueletos a partir do pescoço e aos poucos irem
seguindo para os outros membros do corpo.
O aluno Vanderlei achou a bola de massa de papel machê que entreguei a
ele estranha e nojenta, me perguntou como eu havia produzido ela. Expliquei ao
aluno que aquela massa era feita de papel higiênico úmido e picotado mais a adição
de cola branca. Então comecei a explicar pessoalmente como deveria começar a
realizar sua escultura em papel machê. Peguei o primeiro pedaço de papel machê
124
nas mãos para demonstrar a ele que, primeiro, ele não deveria ter medo ou nojo da
matéria que seria usada para a modelagem. Segundo, a quantidade que ele ia
precisar de papel para por pôr cima do esqueleto para cobrir de forma satisfatória.
Ele começou a cobrir, mas logo me apontou algo que estava ocorrendo e eu não
previa, o papel desgrudava. Fiquei analisando como ele estava realizando o trabalho
antes de apontar alguma solução e percebi que ele estava mexendo bruscamente o
esqueleto, virando de um lado pro outro. Disse então que não podia ser assim, que
fosse mais delicado e seguisse do pescoço pros braços e depois um pouco do busto
e assim seguindo até chegar às pernas. Nisso fiquei entretida com ele e acabei
esquecendo dos outros. Confesso que foi errado de minha parte, mas é que
atividade pratica me deixa tão eufórica que sinto vontade de fazer junto com o aluno
e acabo esquecendo todos a minha volta.
De repente enquanto estava conversando com Vanderlei e ajudando ele com
sua escultura, os alunos da outra ponta da sala de aula me haviam chamado e
haviam dito que estavam com dificuldade de grudar o papel machê. Pedi um minuto
para o aluno Vanderlei dando as ultimas instruções para que continuasse seu
trabalho.
Chegando ao outro lado da sala de aula, a aluna Rafaela e o aluno Douglas
reclamavam que o papel machê não estava grudando. Disse a eles que deviam
começar pelo pescoço e então peguei o esqueleto da aluna Rafaela mais um
punhado de papel machê e comecei passando em volta do que deveria ser o
pescoço do mesmo. Disse que deveriam usar muito papel e não pouquinho como
estavam fazendo. Nisso me sentei e comecei a ajudar a aluna Rafaela no seu
trabalho. Ela conseguiu entender como deveria proceder e seguiu seu trabalho.
Nesse meio tempo em que fiquei ajudando a Rafaela percebi que o aluno
Feliphi estava distante e não estava realizando a tarefa, perguntei qual era o
problema e ele me respondeu que também não estava conseguindo grudar o papel.
Nessa hora fiquei pensando se não foi erro meu na hora de realizar a receita que eu
havia aprendido com minha colega. Pois a principio foi-me dito que estava correto.
Refleti e pensei em revisar o que havia feito em casa e ver se o problema era o
papel ou a forma como eles estavam utilizando ele. Para isso iria precisar aguardar
até a próxima aula quando o papel deveria estar seco em volta do esqueleto.
125
Percebendo que talvez pudesse ter cometido um erro, fui a cada um deles e
disse que continuaríamos na próxima aula e que eu iria analisar se havia preparado
o papel machê errado. Que por enquanto, para o papel não soltar, deveriam cobrir a
metade do corpo do boneco e deixar a outra sem nada, afim de que uma parte
secasse primeiro para depois realizar a outra, evitando assim que o papel
desgrudasse.
Nisso fiquei ajudando a aluna Rafaela a fazer a escultura dela já que ela
apresentava muita dificuldade na hora de por o papel machê. Enquanto íamos
modelando o corpo, percebi que talvez a falha poderia ser das duas partes. A
qualidade do papel machê não estava suficientemente boa, mas por outro lado
enquanto eu colocava papel na escultura, ele não soltava como quando Rafaela o
fazia. Foi quando ela fez o comentário: “quando a sora põe o papel no esqueleto, ele
fica grudadinho, agora comigo ele solta”. Com esse comentário disse pra ela ter
mais firmeza na mão e usar o papel como eu estava usando. Nisso ela seguiu o que
eu estava fazendo e prosseguiu.
A aula foi tranquila e agitada, tranquila, pois eram poucos os alunos que eu
precisava auxiliar e agitada também pois a todo instante tinha que me deslocar de
um ponto da sala de aula a outro e dar atenção para cada um deles, de forma
individual. Eu gosto muito desse tipo de atividade, pois posso falar um pouco com
cada um deles e ficar mais próxima. Poder provar a eles que eu como professora de
arte sou capaz de ensiná-los sobre esse tipo de atividade plástica. É um desgaste
dentro da profissão como professora que vale a pena. É um estresse benéfico.
Quanto aos alunos que não trouxeram os esqueletos realizados no dia
anterior, não me estressei como fiz nas aulas anteriores. Eu tentei trabalhar com
todos e havia conseguido na aula anterior e me decepcionou e muito ver que eles
não estão nem ai para o meu trabalho durante esta aula. Os deixei conversando, a
atividade foi passada, mas não sou o tipo de profissional que vai obrigar um aluno a
realizar a atividade se ele não quer. Nem lembrar do básico (notas) eu lembrei a eles
para não parecer uma ameaça, apenas olhava para uns e pensava: o que vai ser
dessa pessoa no futuro?
Não que a disciplina de arte seja a mais importante do mundo, não é e nunca
será, mas será que a atividade que eu propus foi tão maçante? Mesmo eu tendo
126
levado o papel machê, mais folhas, enfim, todo o equipamento necessário para eles
realizarem a tarefa com sucesso? Após o final da aula tive, uma conversa breve com
a professora titular e parece que ela agora está do meu lado, percebendo que não
se trata apenas de levar ou não o material. Ela mesma estava reclamando de que
levou pequenos tabletes de MDF e a turma em que estava dando aula não produziu
quase nada, até quebrou uns dos tabletes.
O maior ponto positivo de uma aula pratica é que você consegue perceber o
que o aluno sabe e o que ele precisa desenvolver mais. Diferente das aulas teóricas,
é na pratica que é possível instigar o pensamento do aluno ao mesmo tempo em
que lapida a habilidade plástica dele. É nesse tipo de atividade que o processo
criativo surge de forma mais intensa, a partir do trabalho, das limitações e da forma
como irão transcender essas limitações. Não estou trabalhando com eles de forma
plástica para eles se tornarem artistas, como é citado num livro:
“[...]Não é para isso que estão trabalhando. Mas a experiência de agora servirá onde quer que estejam amanha, como artistas, artesãos, industriais, técnicos, doutores, não importa. Ela lhes Dara um estação precioso para julgar e apreciar, sem desajustes e prejuízos, tornando-os aptos ao fazer e ao agir, ao pensar e ao sentir [...] (FERRAS E FUZARI, 1999, p. 78)”.
Ao final posso dizer que a aula foi um sucesso para os alunos que a realizaram.
O desenvolvimento da imaginação foi possível, assim como a criatividade. Para
incentivar as reflexões que deviam realizar, fiquei relembrando eles que este
trabalho não era gratuito e que eles deviam pensar a respeito do que iriam criar.
127
3.3.10. Décimo encontro
Numero da aula: 10
Datas: 27/11/12
Duração: 1 hora
Serie: 1º ano do ensino médio
Conteúdo: figura humana, papel machê, escultura.
Lista de atividades:
Informar como será a atividade planejada para esta aula.
Se dividirem em grupos de cinco pessoas.
Cada grupo deverá eleger um preconceito social para retratar na forma da
figura humana na linguagem tridimensional.
A partir dessa escolha, deverão pensar em como poderão realizar o trabalho
tridimensional.
Após decidirem a etapa anterior, deverão começar o trabalho de modelagem
com o papel machê.
Após o termino da modelagem deverão deixar a escultura secar longe da
umidade para que possam trabalhar em cima dela nas próximas aulas.
Organização da sala de aula.
Encerramento da atividade.
Objetivos específicos:
Desenvolver a imaginação.
Desenvolver a criatividade.
Pôr em pratica as reflexões acerca do corpo como uma construção social e
individual em uma linguagem tridimensional.
Desenvolver uma consciência social a respeito do corpo humano.
Metodologia: Pratica artística, debate e reflexão.
Materiais: papel machê.
Avaliação:
128
Será avaliada a construção da figura humana na linguagem tridimensional por
parte dos alunos. Cada aluno será avaliado individualmente, todos devem participar
da concepção das suas esculturas. Avaliarei a imaginação, o desenvolvimento do
processo criativo e como eles tratarão a escolha do assunto a ser abordado na
escultura.
Planejado:
No inicio da aula, pedirei para a turma se dividir em cinco grupos de
aproximadamente cinco membros e então começarei explicando que eles irão
desenvolver uma escultura com a técnica de papel machê. Explicarei a breve
história da técnica, onde ela surgiu e o que podemos fazer com ela. No quadro
colocarei a receita para o desenvolvimento do papel machê, que consiste em rasgar
tiras finas de papel de jornal, recipiente com água e cola branca.
Explicarei para eles que é um material que demora para ser produzido, pelo
menos vinte e quatro horas entre o processo de rasgar as tiras de papel e coloca-las
no recipiente com água. Depois é necessário coar o papel e retirar bem a água
absorvida, após, esmiuçar o papel em pequenos pedacinhos, quase que esfarelar e
finalmente misturar com cola branca e obter uma massa consistente para efetuar o
trabalho.
Como não teremos este tempo em aula, já levarei a massa pronta para os
alunos começarem a trabalhar. Levarei garrafas pet para eles usarem como suporte
da escultura que irão criar. O exercício vai consistir em modelar com a técnica de
papel machê uma figura humana. O preconceito, seja ele racial, de biótipo físico,
sexo, gênero, idade, deficiência e etc., será o tema principal da escultura.
Ao faltarem cinco minutos para o termino da aula, pedirei a todos que voltem
a se organizar e deixem as esculturas secando, longe da umidade. Este
planejamento prevê duas aulas para a modelagem das esculturas, sendo que a
segunda aula será a continuação da primeira.
129
Realizado
Hoje é 27/11/2012, falta apenas uma semana para o termino do estágio.
Cheguei à sala de aula e como de costume eles estavam agitados. Mas eu estava
calma, pois sabia que alguns alunos já estavam trabalhando nas suas esculturas e
eu havia pedido para outros trazerem mais esqueletos para usarmos com o papel
machê. Antes de começar a aula, escrevi no quadro o dia de nossas ultimas aulas,
que ocorreriam na mesma semana seguinte nos dias 03/12/2012, numa segunda-
feira, e dia 04/12/2012, numa terça-feira.
Como era de se esperar, isso não ocorreu, somente os alunos que
trabalharam na aula anterior iriam trabalhar nesta aula também. Houve alguns
alunos como Esther e Amanda que me perguntaram o que deveria ser realizado na
aula e eu disse a elas que deveriam realizar um esqueleto para então poderem
trabalhar com o papel machê. Entreguei as folhas para elas e ensinei como
deveriam realizar os rolinhos de papel. Mesmo as ensinando não tomaram atitude
alguma, no final, não realizaram a tarefa.
Assim como na ultima aula, pedi que os alunos que já estavam realizando
suas esculturas se aproximassem para poderem finalizar a modelagem com o papel
machê na aula de hoje. Pois semana que vem iriam finalizar as esculturas através
da pintura. Essa atividade era a atividade final, todas as outras (desenho, recorte e
colagem, debates e exibição de imagens) deveriam capacitá-los para modelarem
uma escultura da figura humana da melhor forma possível, sem contar que estava
agregado todo um debate estabelecido algumas aulas anteriores:
Todas as atividade avaliadas concorrem para o desenvolvimento intelectual, social e moral dos alunos, e visam diagnosticar como a escola e professor estão contribuindo para isso. O objetivo do processo de ensino e de educação é que todas as crianças desenvolvam suas capacidades físicas e intelectuais, seu pensamento independente e criativo, tendo em vista tarefas teóricas e praticas, de modo que se preparem positivamente para a vida social (LIBÂNEO, 1994, p. 201).
Então prossegui com a aula normalmente. Caso algum aluno viesse me
procurar para fazer a atividade, que ainda dava tempo para concluir, eu não negaria
130
ajuda. Lembrando- me da falha na aula passada, a respeito do papel machê, para
evitar que o papel ficasse com uma qualidade ruim, coloquei mais cola à mistura do
papel. Os alunos mais uma vez me perguntaram como se fazia esse papel. Então
novamente informei que era uma mistura de papel higiênico molhado e picotado com
cola.
Os alunos que trabalharam com o papel machê na aula anterior ficaram
maravilhados em ver como a escultura estava dura, segundo eles. Expliquei que o
papel havia secado bem e agora eles poderiam fazer a outra metade que não estava
preenchida com papel machê. De todos os trabalhos, o que mais me chamou a
atenção foi o do aluno Vanderlei que ficou liso como deveria ficar para um bom
resultado plástico do trabalho. O que contrastou e muito com o trabalho da aluna
Rafaela que ficou muito poroso, dando um aspecto grosseiro.
Trabalho da aluna Rafaela
FONTE: FROES (2012)
Plasticamente eu não achei o resultado bom, podia ter sido melhor se tivesse
trabalhado com mais calma com o papel machê. Outra coisa que não me agradou foi
o fato da escultura não estar em uma posição que a aluna tenha escolhido. A
posição em que a escultura se encontra é o resultado do papel machê, a aluna em
outras palavras se deixou dominar pela parte negativa do material e a escultura ficou
sem expressão, sem movimento. Sei que ela se esforçou e muito para realizar este
131
trabalho, ela brigava intensamente com o papel machê e eu ia lá, sempre tentando
ajudá-la. Mas ao mesmo tempo em que eu mesma ia ajuda-la a colocar o papel
machê e modelar, não podia dar atenção exclusiva para ela.
Outro aluno que estava enfrentando o mesmo problema era o aluno Douglas,
mas seu trabalho estava pior, pois o papel machê, como não havia sido bem
colocado e moldado junto ao esqueleto, pequenos pedaços começaram a cair. Ele
tentava consertar sem obter muito sucesso, disse para ele tentar usar mais papel
machê para tentar “emendar” a escultura. Minha avaliação final de seu trabalho por
enquanto é que está ruim justamente pela porosidade, pelos relevos que não deviam
existir na escultura. Faltando alguns minutos para a aula acabar, pedi para todos se
organizarem e quem trabalhou ir lavar as mãos. Um detalhe importante que observei
após a conclusão desta aula, foi que a aluna Alexandra junto com o aluno Vanderlei
colocaram nádegas para a escultura do Vanderlei. Eu fiquei maravilhada com essa
escultura, pois parece que ao menos dois deles tiveram uma ideia para dar mais
volume a escultura, para eles pode ter sido algo sério e engraçado mesmo tempo.
Mas, para mim, isso é o resultado de um esforço mental muito grande, pois se
apenas eles tiveram essa ideia, é porque os outros não estão no mesmo nível
plástico deles.
Trabalho do aluno Douglas
FONTE: FROES (2012)
132
Acabei percebendo que todas as esculturas estão numa fase de realismo
conforme pude interpretar a partir da leitura de Ferraz e Fuzari (1999), embora ela
fale de desenho, isso também se pode- aplicar à escultura. Todas as aulas eram a
mesma coisa, eles demonstraram o mesmo comportamento. Fiquei refletindo se o
problema estava realmente em mim como professora, se antes eu era a culpada por
não levar materiais básicos, nas ultimas aulas eu levei todos os materiais possíveis.
Fiquei refletindo nas palavras da minha orientadora, mas não consigo enxergar mais
falhas. Tento me abrir com eles, elogiar o talento que alguns possuem para artes,
mas não adianta. Eles não mudam. Eu não quero que eles sejam mudos, ainda mais
realizando uma atividade pratica, mas queria que eles fizessem. E entendessem
que, se ao menos pra eles o que tento ensinar não tem valor, que façam para passar
de ano. Muitos foram mal na disciplina de artes no trimestre anterior e uns
continuam no mesmo embalo. É como se tivessem desistido de lutar, de avançar. Os
alunos que realizaram a atividade atingiram o objetivo da aula, e fico feliz, mas me
entristeceu que é apenas a minoria da turma.
133
3.3.11. Décimo primeiro encontro
Numero da aula: 11
Data: 03/12/2012
Duração: 1 hora
Serie: 1º ano do ensino médio
Conteúdo: escultura, figura humana, pintura.
Lista de atividades:
Informar como será a atividade planejada para esta aula.
Se dividirem em grupos de cinco pessoas.
Distribuir as esculturas para cada um dos grupos.
Após, será realizada a distribuição dos materiais para a finalização das
esculturas.
Cada grupo deverá pensar em como irão trabalhar em cima de suas
esculturas se baseando no preconceito social que elegeram, que cores
utilizar, que adereços colocar caso seja necessário e etc.
A partir dessa escolha, deverão começar dar vida a suas esculturas em papel
machê.
Irei circular pela sala auxiliando os alunos com suas esculturas.
Organização da sala de aula.
Encerramento da atividade.
Objetivos específicos:
Desenvolver a imaginação.
Desenvolver a criatividade.
Pôr em pratica as reflexões acerca do corpo como uma construção social e
individual em uma linguagem tridimensional.
Desenvolver uma consciência social a respeito do corpo humano.
Trabalhar com cores.
Metodologia: Pratica artística, debate e reflexão.
Materiais: Tinta guache, pano, copos, materiais de artesanato, cola e pincel.
134
Avaliação:
Será avaliada a construção da figura humana na linguagem tridimensional por
parte dos alunos. Cada aluno será avaliado individualmente, todos devem participar
da concepção das suas esculturas. Avaliarei a imaginação, o desenvolvimento do
processo criativo e quais os materiais que eles utilizarão na finalização da escultura.
Levarei em consideração o uso de cores para a construção da figura humana, bem
como suas misturas para a criação de novos tons.
Planejado:
No inicio da aula irei pedir aos alunos que se organizem em seus grupos e
começarei a distribuir as esculturas que eles realizaram nas aulas anteriores. Após a
entrega das esculturas, irei explicar a atividade que eles deverão realizar, que
constituirá em pintarem suas esculturas. Deverão levar em consideração quem eles
estão retratando socialmente.
Após a explicação, irei deixar à disposição dos grupos potes de guache com
as cores primarias, alguns materiais usados na confecção de artesanatos, panos e
copos para eles limparem seus pinceis. Irei dizer aos alunos como que eles deverão
trabalhar com misturas de tintas para a obtenção de novas cores. Irei escrever no
quadro o que a mistura de cada cor primaria resultará, como forma de guiá-los no
seu trabalho. Irei também dizer que eles possuem materiais de artesanato a sua
disposição para incrementar suas esculturas, e que qualquer duvida eles poderão vir
me consultar. Durante a aula irei passar entre os grupos e vou auxiliá-los no que for
possível, tirando suas duvidas ou dando dicas sobre como podem melhorar seus
trabalhos.
135
Realizado
Antes de começar a escrever os relatos, direi antes como essa aula foi
planejada primeiro e o que ocorreu, tive que usar muito o improviso. Primeiramente
essa aula levou dois dias para ser concluída, mas contei como um período apenas.
Essa foi à gota d´água com a turma 104 do primeiro ano do ensino médio do Colégio
Costa e Silva.
Comecei chegando à escola com o material necessário para a composição
final das esculturas, levei tintas para eles começarem e finalizar suas esculturas.
Aqueles que não haviam realizado a atividade nas aulas anteriores teriam a chance
de trazer o esqueleto novamente e através da papietagem que eu os ensinaria, eles
iriam dar corpo à escultura e me trazer na ultima aula elas finalizadas. Ainda na aula
anterior, dia 27/11/2012, eu havia escrito bem grande no quadro que nossas ultimas
aulas seriam esta semana, nos dias 03/12/2012 e 04/12/2012 e que deveriam trazer
os esqueletos no dia 03/12/2012 para eu ajuda-los.
Cheguei à sala de aula e os alunos não haviam trazido o esqueleto (com
exceção daqueles que já estavam produzindo, é claro). Nisso argumentaram que
não sabiam de nada e eu não tinha avisado. A professora titular se enfureceu com
eles, pois eu mesma havia combinado isso com ela na aula anterior, até mesmo a
pedido dela para agilizar a finalização do estágio e ela fechar seus diários de classe.
Ela disse que era uma vergonha eles não terem responsabilidade, e num tom de
ironia, que eles nunca sabiam de nada, eram sempre os inocentes. Nisso ela avisou
que quem iria avaliar e dar as notas finais era a professora Priscila e não ela, ou
seja, que se entendessem comigo para poderem recuperar o trabalho perdido, pois
teriam apenas mais uma aula.
Após esse episodio, alguns alunos vieram me perguntar o que deveriam
fazer, eu olhei para a cara deles e disse que deveriam começar pelo esqueleto e que
depois iríamos conversar. Um aluno, Marciano, disse que não ia fazer, pois segundo
suas palavras: “Era muita mão”. Olhei pra ele e disse que tudo bem, era uma
decisão dele. Nenhum aluno me procurou para começar a fazer o trabalho, com
exceção de duas alunas de quem falarei abaixo.
136
Nisso as alunas Ashley e Alexandra vieram até mim e perguntaram como se
fazia o esqueleto, pois segundo Ashley ela havia esquecido e Alexandra, havia
faltado no dia em que dei aula e ela estava perdida. Nisso pedi para elas sentarem
próximas uma da outra e começarem a fazer os rolinhos com uma folha de caderno.
Nisso Ashley se sentou numa mesa e começou a fazer os quatro rolinhos que eu
havia ensinado na aula anterior, deixei para ela um tubo de cola.
Já com a aluna Alexandra, ela perguntou se podia continuar a ajudar seu
colega Vanderlei, já que ela fez isso na aula anterior e que me traria o esqueleto já
pronto amanha. Com base nessa informação, eu consenti. Então, nesse meio
tempo, a aula ficou bem agitada, pois por um lado tinha que dar atenção para
aqueles que já estavam fazendo há três aulas, mas não podia esquecer daqueles
que tinham que fazer a escultura desde o inicio.
Outro aluno que faltou na aula anterior foi o aluno Diego, nessa aula ele
chegou e pediu desculpas pelas faltas, mas o que ele deveria fazer. Então fui a
minha pasta e peguei um jornal e pedi para ele prestar atenção no que eu faria, não
só pedi atenção dele, como também pedi para a aluna Ashley que estava ao lado
dele, dizendo que ela deveriam fazer o mesmo após terminar o esqueleto. A
instrução foi de recortar o jornal numa tira de espessura mediana e que colasse
sobre o corpo do esqueleto, de forma que fosse cobrindo ele através das camadas
de jornal e o deixasse mais encorpado. Então o aluno Diego, entendendo como
deveria proceder agradeceu e começou a fazer como eu o havia instruído. Perguntei
a Ashley se ela tinha alguma duvida e ela disse que já tinha feito os rolos mas havia
esquecido como juntar as partes, então dei a mesma instrução que passei nas aulas
anteriores sobre como juntar os membros para fazer o esqueleto. Então ela
começou a fazer.
Nisso fui ao outro lado da sala de aula, no qual os alunos Vanderlei, Douglas,
Rafaela, Alexandra e Filiphe estavam trabalhando e disse que eles deveriam agora
começar a pintar suas esculturas, podiam misturar tintas para criar novos tons, criar
texturas com isso também, enfim, ficaria a critério deles, contanto que retratassem
alguém que sofresse de preconceito em relação a seu corpo.
137
Trabalho da aluna Rafaela
FONTE: FROES (2012)
Como esses alunos já estavam adiantados e apenas precisavam finalizar, os
deixei mais livres e fiquei dando atenção aos alunos Diego e Ashley que estavam
mais atrasados. Mas percebi que eles estavam trabalhando de uma forma bem
meticulosa, usando as cores para criar roupas, como podemos ver no trabalho de
Rafaela (acima) ou mesmo dando cor à pele da escultura como podemos observar
no trabalho de Vanderlei (abaixo)
.
Trabalho do aluno Vanderlei
FONTE: FROES (2012)
138
Enquanto ajudava os alunos, quatro alunos vieram me perguntar como eles
deveriam fazer o boneco. Esses eram Esther, Amanda, Carlos e Viviane. Disse que
eles podiam fazer em duplas para podermos atingir a conclusão do trabalho de
forma mais rápida. Para as alunas Amanda e Esther eu pedi que pedissem ao seu
colega e amigo Juliano para as ensinarem, já que ele não faltou em nenhuma aula.
Com isso as meninas começaram a fazer sem obter muito sucesso, pois enquanto
estava orientando a dupla Carlos e Viviane eu vi que o aluno Juliano não estava
ajudando suas colegas como eu havia pedido para ele. Nisso as meninas vieram me
perguntar se dava pra por o nome do Juliano no grupo e eu disse que não, que essa
chance seria dada a elas, já que, elas faltaram quando o esqueleto foi feito, elas
então concordaram e foram fazer seu esqueleto.
Após isso a aluna Ashley veio me perguntar como ela colaria o jornal por cima
do esqueleto, então pedi que observasse seu colega do lado, Diego, e o aluno Diego
a ajudou, dizendo que ela deveria cortar tiras e cobrir o esqueleto, tal como ele fez.
Nisso percebi que Diego já estava avançado em seu trabalho, mas achei que ele
usou poucas camadas de jornal e pedi para ele usar mais camadas, pois assim seu
trabalho teria mais volume, ele disse que não precisava pois sua escultura seria
assim, bem magra e estreita. Então disse que ele deveria tentar ao menos, pois o
trabalho dele estava muito bom, só precisava de mais camadas.
Nisso voltei para os alunos Carlos e Viviane, pedindo a eles que fizessem o
mesmo que Diego estava fazendo com o jornal. Eles perguntaram como e então
levei um jornal para eles fazerem as tiras e colarem sobre o esqueleto que já estava
concluído. Percebi que a aula estava acabando. Nisso os deixei e fui dar uma nova
olhada nos alunos que estavam mais adiantados conforme o planejamento. Pedi a
eles que parassem de pintar e se organizassem. Pedi a uma aluna que fosse lavar
os pinceis e comecei a liberar aos poucos os alunos que usaram tinta e cola para
irem ao banheiro lavar suas mãos.
139
Trabalho do aluno Diego
FONTE: FROES (2012)
Enquanto toda essa agitação positiva ocorria, acabei me esquecendo de um aluno e
fiquei mal por isso. Ele apresentou dificuldades no manuseio do papel machê. Estou
falando do aluno Filiphe. Filiphe parecia desanimado desde a aula com o papel
machê quando ele não conseguia grudar o papel no seu esqueleto. Então fui até ele
e perguntei se ele precisava de ajuda. Ele disse que estava tudo bem, então eu falei
para ele que a aula já estava acabando, mas que amanha eles iriam continuar o
trabalho e que se ele quisesse poderia me trazer ele coberto por tiras de jornal e ai
começar a pintar sua escultura. Nisso ele se interessou e perguntou como deveria
fazer. Fui mais uma vez a minha mesa e tirei uma folha de jornal para ele e dei a
mesma instrução que passei para a aluna Ashley e Diego.
Nesse meio tempo as meninas Esther e Amanda vieram perguntar se o boneco
delas estava certo, disse que sim, que a estrutura dele estava correta e então uma
delas disse: “Então agora é só pintar né sora?!”. E eu respondi que sim, mas não
para esta aula, pois não daria tempo, mas poderiam me trazer amanha sem falta.
Nisso liberei elas para lavarem suas mãos e fui guardando meus materiais de
trabalho, pois faltavam menos de cinco minutos para o termino do período. Então,
quando o sinal bateu, me despedi de todos e disse que amanha iríamos concluir o
140
trabalho e se alguém ainda quisesse trazer o esqueleto no próximo dia, não sofreria
penalidades na avaliação.
Trabalho do aluno Filiphe
FONTE: FROES (2012)
141
3.3.12. Décimo segundo encontro
Numero da aula: 12
Data: 04/12/2012
Duração: 1 hora
Serie: 1º ano do ensino médio
Conteúdo: escultura, figura humana, pintura.
Lista de atividades:
Informar como será a atividade planejada para esta aula.
Se dividirem em grupos de cinco pessoas.
Distribuir as esculturas para cada um dos grupos.
Após, será realizada a distribuição dos materiais para a finalização das
esculturas.
Cada grupo deverá pensar em como irão trabalhar em cima de suas
esculturas se baseando no preconceito social que elegeram, que cores
utilizar, que adereços colocar caso seja necessário e etc.
A partir dessa escolha, deverão começar dar vida a suas esculturas em papel
machê.
Irei circular pela sala auxiliando os alunos com suas esculturas.
Organização da sala de aula.
Encerramento da atividade.
Objetivos específicos:
Desenvolver a imaginação.
Desenvolver a criatividade.
Pôr em pratica as reflexões acerca do corpo como uma construção social e
individual em uma linguagem tridimensional.
Desenvolver uma consciência social a respeito do corpo humano.
Trabalhar com cores.
Metodologia: Pratica artística, debate e reflexão.
Materiais: Tinta guache, pano, copos, materiais de artesanato, cola e pincel.
142
Avaliação:
Será avaliada a construção da figura humana na linguagem tridimensional por
parte dos alunos. Cada aluno será avaliado individualmente, todos devem participar
da concepção das suas esculturas. Avaliarei a imaginação, o desenvolvimento do
processo criativo e quais os materiais que eles utilizarão na finalização da escultura.
Levarei em consideração o uso de cores para a construção da figura humana, bem
como suas misturas para a criação de novos tons.
Planejado:
No inicio da aula irei pedir aos alunos que se organizem em seus grupos e
começarei a distribuir as esculturas que eles realizaram nas aulas anteriores. Após a
entrega das esculturas, irei explicar a atividade que eles deverão realizar, que
constituirá em pintarem suas esculturas. Deverão levar em consideração quem eles
estão retratando socialmente.
Após a explicação, irei deixar à disposição dos grupos potes de guache com
as cores primarias, alguns materiais usados na confecção de artesanatos, panos e
copos para eles limparem seus pinceis. Irei dizer aos alunos como que eles deverão
trabalhar com misturas de tintas para a obtenção de novas cores. Irei escrever no
quadro o que a mistura de cada cor primaria resultará, como forma de guiá-los no
seu trabalho. Irei também dizer que eles possuem materiais de artesanato a sua
disposição para incrementar suas esculturas, e que qualquer duvida eles poderão vir
me consultar. Durante a aula irei passar entre os grupos e vou auxiliá-los no que for
possível, tirando suas duvidas ou dando dicas sobre como podem melhorar seus
trabalhos.
143
Realizado
Chegando à sala de aula no outro dia, 04/12/2012, que por sinal deveria ter sido a
ultima, a professora titular chegou e disse aos alunos que essa seria a ultima aula,
mais uma vez ela ficou braba, pois eles não haviam levado o esqueleto e isso iria
prejudica-los em sua media final. Então ela me perguntou se essa seria a ultima aula
mesmo e eu disse a ela na frente da turma que isso dependia dela. Nisso a aluna
Ashley pediu que eu desse mais uma aula. Percebendo a necessidade de dar mais
uma aula para acabar com o projeto de uma forma satisfatória, decidi que daria mais
uma aula, então combinei com a professora titular que eu consideraria a aula
anterior e esta como uma única aula, ela concordou e me deixou com os alunos para
concluirmos.
Nisso eu avisei a todos em alto e bom som, que, primeiro, essa seria a ultima
aula para concluírem a tarefa, e segundo, que todas as aulas eram avaliadas, que
ainda havia tempo de recuperarem o tempo perdido, pois teríamos essa e a ultima
aula para terem tudo concluído.
Nisso pedi a todos que estavam trabalhando desde a aula anterior, que se
reunissem em uma parte da sala de aula para que assim o material ficasse ao
alcance de todos. Pedi a alguns alunos que trouxessem os trabalhos dos outros para
dentro da sala como de costume e então quando trouxeram, demos inicio a
finalização.
Enquanto os alunos trabalhavam, o aluno Filiphe me chamou e me mostrou o
esqueleto dele preenchido. Quando olhei eu não acreditei no trabalho maravilhoso
que ele havia realizado. Ele disse que misturou cola e papel higiênico, mas que
ainda estava úmido, pois havia feito no dia anterior. Eu disse que estava tudo bem e
que estava perfeito, só faltava concluirmos. Elogiei muito seu trabalho, pois daquele
esqueleto magrinho, raquítico, ele havia dado vida, transformado o mesmo em uma
escultura, só faltavam os retoques finais.
Nisso os alunos Wellington e Diego viram o que ele havia feito e ficaram
surpreendidos, não por Filiphe ter realizado um bom trabalho, mas pelo resultado ter
ficado muito bom, bem preenchido. Até mesmo o pescoço estava bem moldado a
cabeça e ao resto do corpo.
144
Trabalho do aluno Filiphe
FONTE: FROES (2012)
Durante a aula, a aluna Alexandra veio me falar que seu esqueleto estragou e
queria saber se podia concluir o trabalho do aluno Vanderlei que não havia vindo
nesta aula em particular (raramente faltava). Disse que tudo bem, já que ela estava
ajudando ele desde a aula com o papel machê eu não via problema algum nisso. Só
pedi que concluísse hoje para semana que vem eles poderem apresentar.
Ouvindo isso, o aluno Juliano veio até mim para me perguntar se as meninas
Esther e Amanda não podiam colocar o nome dele no trabalho delas. Eu disse que
não poderiam, então ele perguntou porque e eu disse que ele não havia faltado
nenhuma aula como havia ocorrido com as meninas. Nisso ele se alterou e começou
a falar de uma forma que nunca vi falar com ninguém. Ele parecia desesperado para
ter seu nome incluso no trabalho delas. Tentou argumentar comigo que roubaram
seu esqueleto naquele dia e por isso não havia trazido. Então eu contra argumentei
que isso não era responsabilidade minha, que eu havia ensinado eles a fazerem um
esqueleto e que eles não haviam levado na aula seguinte (tiveram aula dia
19/11/2012 e 20/11/2012). Nisso ele ficou furioso, mas eu fui calma e firme e disse
que não seria possível, pois estávamos na quinta aula e ele não se mexeu para
fazer como alguns fizeram (no caso de Ashley e Diego), que se ele não correu atrás
do prejuízo, não seria justo com os outros que correram. Ele não conseguiu nem
145
perceber que poderia ainda fazer nesta aula a escultura, mas estava cego e não
conseguiu enxergar isso. Foi a sua mesa e ficou la, de cabeça baixa e brabo.
Prosseguindo com a aula, comecei misturando tintas de cor vermelha e
branca para dar um tom rosado. Caso alguém quisesse fazer a pele, pois eu disse a
eles que hoje não seria permitido fazer negros, pois dois alunos já haviam realizado,
Vanderlei e Douglas. Então Alexandra começou a terminar de pintar a escultura de
Vanderlei e fez uma sunga de tinta branca para, a escultura vestir.
Trabalho do aluno Vanderlei
FONTE: FROES (2012)
146
Trabalho do aluno Vanderlei
FONTE: FROES (2012)
As meninas Esther e Amanda, num momento de desespero, começaram a
usar as mãos para pintarem suas esculturas. Eu ria junto com elas, pois elas diziam
que era algo nojento. Tentava acalma-las dizendo que depois elas iriam lavar as
mãos no banheiro. Na verdade, elas usaram as mãos pois não haviam pinceis
suficientes para todos e eu sugeri que usassem os dedos, para não pararem seus
trabalhos e atrasar mais ainda.
Eu sentia que esta aula estava sendo bem proveitosa para aqueles que
estavam realizando as atividades propostas. Fiquei tentada ao tirar uma foto do
resto da turma que não estava trabalhando, mas achei melhor não, seria
constrangimento demais para eles. Fiquei muito chateada por eles não levarem nem
mesmo a sério sua avaliação. O aluno Juliano me fez perceber que eles não tinham
razão alguma em reclamar de mim, pois nessas ultimas aulas eu levei todo material
e mesmo assim eles não assumiram a sua parte, a de alunos. Isso incomoda muito,
pois eles mesmos se sabotam e depois vem até mim para reclamar sobre suas
notas. Esse trabalho que eu propus nada mais é do que uma “prova final” de tudo
aquilo que conversamos durante o trimestre. Como Libâneo (1994) relata que provas
são necessárias, embora não devam ser os únicos meios de avaliação do conteúdo
escolar. Como Ferraz e Fuzari (1999) falam, também é possível afirmar que é muito
147
complicado estabelecermos uma avaliação pratica em artes. Por isso escolhi avaliar
todas as aulas.
Trabalho das alunas Esther e Amanda
FONTE: FROES (2012)
Ao mesmo tempo em que tudo isso ocorria, os meninos Filiphe e Diego
estavam pintando também suas esculturas. Quanto ao Diego pedi que como ele não
havia usado camadas de jornal, que usasse ao menos camadas de tinta, pois como
a cor de pele era muito clara, ainda era possível ver o jornal por de trás da tinta. Ele
compreendeu e fez o que solicitei. Quanto ao aluno Filiphe eu não tinha o que falar,
pois sua escultura em si já estava ótima, não fiquei interferindo muito em seu
trabalho, só pedi um pincel emprestado para um dos alunos para que ele pudesse
dar um melhor acabamento em seu trabalho.
148
Trabalho do aluno Diego
FONTE: FROES (2012)
Trabalho do aluno Filiphe
FONTE: FROES (2012)
Os objetivos desta aula foram alcançados por aqueles que trabalharam,
cerca de 20% da turma no total. Não foi um sucesso total, mas como não havia mais
jeito com os outros, só me resta sentir pena deles, pois minha avaliação não será
outra a não ser um zero bem grande para estas ultimas aulas. Existem alunos que
estão abaixo de 5 na media final. Conversei após a aula com a professora titular e
ela ficou decepcionada também, pois isso ocorria com ela também, eles não tinham
149
responsabilidade com seus trabalhos. Eu me senti muito mal por não ter atingido
eles, mas como conforto é possível citar Libâneo (1994, p. 200) que diz, “por mais
que o professor se empenhe na motivação interna dos alunos, nem sempre
conseguirá deles o desejo espontâneo para o estudo”. É triste isso, mas ao mesmo
tempo uma realidade, ela só se torna cruel quando não conseguimos atingir um ou
dois alunos, mas sim mais de 50% da turma. O ano já esta acabando e eu deverei
fechar as notas na próxima aula e doze alunos estão abaixo da media, de vinte e
nove alunos. Eu acho um numero muito alto, ainda mais numa disciplina que deveria
ser “fácil”, prazerosa. Eles só deviam me entregar os trabalhos, eu não estava
exigindo muito além disso, mas nem para isso eles se mexeram e eles tiveram duas
aulas, sendo que isso não estava planejado originalmente. Eu como cidadã
brasileira fico pensando: “O que será dessas pessoas num futuro próximo?”. Minha
exigência com eles é que não se tornem aquilo que uma parcela da sociedade quer:
pessoas ignorantes para explorar.
150
3.3.13. Décimo terceiro encontro
Numero da aula: 13
Data: 11/12/2012
Duração: 1 hora
Serie: 1º ano do ensino médio
Conteúdo: escultura, figura humana.
Lista de atividades:
Informar como será a atividade planejada para esta aula.
Breve conversa sobre a avaliação final.
Cada aluno deverá apresentar sua escultura.
Avaliação da turma a respeito da escultura do colega.
Avaliação da professora sobre a escultura criada.
Organização da sala de aula.
Encerramento da atividade.
Objetivos específicos:
Analisar os trabalhos criados.
Refletir a respeito do preconceito.
Avaliar e refletir a respeito dos trabalhos desenvolvidos pelos seus pares.
Metodologia: expositiva, debate e reflexão.
Materiais: Esculturas feitas pelos alunos.
Avaliação:
Será avaliado de forma individual cada objeto tridimensional apresentado na
frente da turma. Os alunos que desenvolveram a mesma em grupo, deverão falar
sobre a figura representada, se a mesma possui um nome, qual segmento da
sociedade esta figura representa, o porque de terem escolhido esse tema, como foi
realizar este trabalho e etc. Irei avaliar não só apresentação dos alunos como
151
também avaliarei a avaliação dos seus colegas sobre o trabalho dos outros e as
reflexões que farão.
Planejado:
No inicio da aula irei pedir que cada aluno me mostre sua escultura realizada
e que deveria ser entregue até esta aula. Principalmente para aqueles que não
trabalharam em sala de aula. Após isso irei informar novamente como foi feita a
avaliação de cada aluno. Irei explicar como havia dito na primeira aula que todas as
aulas seriam avaliadas.
Após a explicação sobre o modo de avaliação, pedirei que cada aluno venha
à frente da sala de aula e fale a respeito de sua escultura. O que estavam retratando
nela e qual discriminação estavam querendo mostrar. Perguntarei se foi difícil fazê-
la. Depois passarei a avaliação para a turma, questionando sobre a qualidade
plástica do trabalho do colega e o que poderia ser feito para melhorar. Após essa
avaliação, darei meu conceito final sobre o trabalho, informando sobre a qualidade
plástica do trabalho, bem como o que poderia ter sido feito para melhor a escultura.
Então, depois disso, irei pedir que outro aluno venha e assim até o ultimo se
apresentar. Encerrarei a aula desejando boas festas a todos, que se foquem nos
estudos e aproveitem as férias.
152
Realizado
Esta será a ultima aula. Na realidade nada me deu tamanha alegria ao saber
que seria a ultima vez que veria alguns alunos. Iniciei a aula cumprimentando a
todos e, tão logo solicitei que os alunos Elton e Wellington fossem buscar os
trabalhos realizados na aula anterior na sala local em que eles estavam secando.
A professora titular estava presente neste momento e disse aos alunos que
esta seria a ultima aula deles comigo e que hoje eu iria fazer um encerramento das
atividades com eles, que falaria a respeito também das notas finais. Então ela
deixou a sala e logo vieram as perguntas a respeito das notas finais. Pedi a todos
que se sentassem e se acalmassem, mas isso não ocorreu. Então disse a eles que
todas as aulas eram avaliadas, que aula dada era aula dada, caso não houvesse
justificativa legal para a ausência ou não houvesse a participação pertinente em sala
durante as atividades em artes, a avaliação seria zero naquela aula em que faltaram
ou não realizaram a tarefa proposta.
Após essa resposta, muitos disseram que estavam então reprovados na
disciplina, então eu disse que para toda ação haveria uma reação, quem havia
realizado os trabalhos práticos, haviam falado de forma pertinente nas aulas de
debate, estavam bem. Então veio outro aluno e começou a reclamar da nota, que
por sinal nem ele sabia se era boa ou ruim. Veio dizer que eu estava errada na
avaliação por eu vinha dar aula e na outra eu mudava o conteúdo. Eu não conseguia
entender realmente o que ele falava. Primeiro pelo linguajar dele que atrapalhava
sua dicção, segundo, pois ele não tinha razão alguma de reclamar pois não produziu
praticamente nada o trimestre inteiro. Se ele tinha alguma nota, foi golpe de sorte e
não proposital. A media dele final quando calculei foi 3,8. Até fiquei surpresa, pois
teve uma media mais alta que o aluno Elton, que ficou com 2,3. Um outro aluno,
Marciano, perguntou se eu não faria recuperação, eu disse que não, pois eles
haviam tido cinco aulas para realizarem a atividade, algo que planejei para quatro no
máximo. As alunas Esther e Amanda concordaram comigo, junto com os outros
alunos que realizaram a atividade.
Posso lembrar de Libanêo (2001) que fala sobre não usar a nota para punir os
maus e recompensar os bons. Não foi essa minha intenção, a nota é apenas o
reflexo das atividades realizadas. Em momento algum eu tirei nota pelo aluno ser
153
mal educado, e sim por não realizar as atividades propostas. Por isso desde a
primeira aula eu disse que toda aula seria avaliada, eles concordaram quando eu
disse isso, disseram que era justo. Ainda mais quando falamos de uma aula de arte.
Nunca dei um grande valor à qualidade estética do trabalho e sim a todo o percurso
que o aluno percorreu para chegar a tal resultado, nem sempre alguém tem algum
“talento nato” para o desenho, ou escultura e pintura conforme compreendi sobre a
avaliação em artes de Ferraz e Fuzari (1999). Quem sou eu para dizer que o
trabalho esta ruim ou sua fala esta inadequada quando naquele momento é o
máximo que o aluno consegue chegar? Eu achei meu modo de avaliação justa.
Então, o aluno David se sentou e parou de reclamar. Prosseguindo, todos
estavam ainda agitados e pedi para as meninas Esther e Amanda começarem a
apresentar sua escultura e falarem a respeito da mesma. Nisso a turma não fazia
silencio e eu bati palmas pedindo atenção para o silencio, nisso os alunos Guilherme
e Daniel também aplaudiram. Essa afronta foi a gota d’água, mandei eles se
retirarem da sala de aula e da minha frente, que já bastava a falta de educação
deles. Então eles se recusaram a sair e eu disse que iria chamar a vice diretora e
nisso eles saíram e foram pro pátio da escola. Perguntei se mais alguém queria ir
junto e todos se calaram, acreditei que isso fosse um “não”.
Então novamente pedi que as meninas começassem a falar a respeito do seu
trabalho. Elas começaram a falar que o boneco delas representava a homofobia, as
corrigi e disse que seria um homossexual, ai elas rebateram e disseram que queria
dizer que homofobia seria o preconceito que elas estavam representando, ai
compreendi e disse que estava tudo bem. Ficaram falando que o colorido em volta
da escultura representava a bandeira do movimento LGBT e que o brilho era pra
enfatizar o quão gay era a escultura. Eu ria junto com elas, pois lembrei da aula
anterior em que elas ficaram debatendo se colocavam ou não brilho na escultura,
pois gay não era sinônimo de carnaval.
Após elas terminarem seu discurso perguntei à turma o que eles achavam da
escultura que elas fizeram. O aluno Marciano disse que achou ela muito “magra”,
fina, já outros alunos disseram que a intenção era legal, mas faltava a cabeça, nisso
todos riram. Então finalizei minha avaliação do trabalhos delas da seguinte maneira:
visualmente vocês conseguiram atingir objetivo de vocês usando cores tidas como
154
gay , o brilho, a intenção esta de acordo, mas plasticamente falando o trabalho de
vocês não esta bom pois como vocês sabiam, deviam ter realizado algumas aulas
anteriores à ultima. Disse que o grande erro delas estava nisso, se tivessem
realizado o trabalho de uma forma mais seria quando eu havia solicitado há umas
três aulas anteriores e elas estavam presentes. Elas concordaram com minha
avaliação e eu disse que agradecia o esforço delas por mais que tenha sido de
ultima hora e dei parabéns pela suas participações nas aulas.
Trabalho das alunas Amanda (a frente) e Esther (ao fundo)
FROES (2012)
Depois pedi ao aluno Diego vir à frente falar de seu trabalho, estranhei, pois
não veio somente ele, mas um colega que não fez o trabalho, Wagner. Deixei, pois
não iria querer cortar aquele momento. O aluno que segura o trabalho não é o
Diego, mas sim Wagner. Wagner ficava segurando a escultura enquanto Diego
falava sobre o boneco, dizia que representava um atleta (por sinal o aluno Diego é
atleta e veio do Paraná para treinar no Rio Grande do Sul), quis dar noção de
movimento para o seu trabalho e que ele era “gay” devido à cor rosa. Eu sabia que o
155
termo gay foi usado como desculpa de ultima hora para apresentar o trabalho, mas
não liguei para isso, pois ele estava apresentando e ao contrario da maior parte da
turma, ele realizou a tarefa sem nunca ter reclamado e sim perguntando como devia
fazer. Perguntei a turma o que eles achavam e disseram que o boneco não era gay,
mas sofria de anorexia, pois era estreito demais.
Após esse comentário, eu elogiei o trabalho do aluno, mas disse que
plasticamente ele estava realmente estreito demais, então Diego argumentou que
ele era assim, pois era atleta, então eu disse que tudo bem, mas como havia
orientado ele nas aulas anteriores, seu trabalho poderia ter sido melhor se tivesse
usado mais camadas de papel para modelar o corpo, que plasticamente ficaria
melhor. Enfatizei a turma ainda que Diego trabalhou usando a técnica de
papietagem e não papel machê, devido aos transtornos e atrasos nas aulas
anteriores, os alunos que não haviam usado o papel machê, trabalharam com
papietagem, que era mais rápido de usar do que o papel machê.
Trabalho do aluno Diego (Wagner segurando a escultura)
FROES (2012)
156
Após a avaliação do trabalho do aluno Diego, pedi ao aluno Filiphe que viesse
à frente para poder falar de seu trabalho. Filiphe veio e começou a falar que seu
trabalho representava um deficiente que tinha um membro amputado, logo após sua
fala, a aluna Amanda disse que era uma amputação parcial pois ele só não tinha
uma parte do corpo. Gostei da sua observação e prossegui com a aula perguntando
mais sobre a escultura. O aluno Filiphe, como sempre muito tímido, disse que não
tinha mais nada a acrescentar, então perguntei à turma o que haviam achado, todos
concordaram que o trabalho estava bom e o aluno Marciano disse que estava
revoltado, que brincaram com a cara dele, pois o movimento dos braços da escultura
era o mesmo que ele conseguia fazer com seus braços. O aluno Filiphe concordou e
disse que se inspirou nele para fazer isso, com isso a turma riu muito e eu elogiei a
originalidade de seu trabalho.
Trabalho do aluno Filiphe
FROES (2012)
Minha avaliação final sobre o trabalho dele foi muito positiva, disse que
plasticamente ele me surpreendeu, pois ele era tão magrinho e raquítico no inicio e
157
no outro dia mostrou uma escultura com mais formas, mais volume, disse que gostei
do uso das cores para representar roupa e pele. Disse que foi muito positivo ele ter
usado outra alternativa para a construção da sua escultura já que não estava tendo
sucesso em usar o papel machê. Enfim, seu trabalho estava muito bom. Agradeci
seu trabalho, sua dedicação e lhe dei os parabéns.
Então pedi ao aluno Vanderlei para vir falar sobre seu trabalho. Fazendo um
adendo, eu estava muito contente com o trabalho deste aluno, que no inicio não
produzia e ficava com os alunos que não trabalhavam, gostei da mudança de atitude
dele e de como ele era educado com todos.
Quando Vanderlei chegou, começou a falar que seu trabalho era simples, um
homem negro usando uma sunga branca e que ele não tinha uma parte da perna.
Agradeci sua participação e disse que havia gostado do trabalho que ele e a aluna
Alexandra haviam realizado. Disse que gostei da bunda que eles deram à escultura
que isso dava noção de volume ao trabalho, mais que os anteriores apresentados.
Trabalho do aluno Vanderlei (de lado e frente)
FROES (2012)
158
Lembrei ele sobre a dificuldade que os alunos que usaram o papel machê
tiveram e que a escultura de costas estava muito boa, uma pena que de frente não
ficou tão lisa como deveria ter ficado, mas seu trabalho estava muito bom. Agradeci
seu esforço e o parabenizei pela participação nas aulas.
Logo depois houve a apresentação do aluno Carlos, que não queria ir à frente
apresentar seu trabalho. Quando ele foi à frente falar, falou que sua escultura sofria
de câncer. Lembrei que isso não era um preconceito e ele disse que o trabalho dele
estava um lixo. Então perguntei à turma o que achavam. os alunos responderam que
realmente estava muito ruim. Fui obrigada a concordar com eles. Disse a Carlos que
seu trabalho estava mesmo muito ruim plasticamente, que ele devia ter se esforçado
muito mais, já que havíamos tido cinco aulas para terminar a tarefa e que
infelizmente ele se dispersou fazendo trabalhos de outras disciplinas ao invés da
aula de artes. Informei que ele não havia usado o trabalho de papietagem como eu
havia ensinado aos alunos e a ele e que isso diminuiu seu trabalho plástico
consideravelmente. Disse também que me decepcionei muito com o resultado, pois
ele era um garoto com muito talento, com desenhos muito bonitos e que esse
trabalho não refletia o talento pra artes que ele demonstrava ter no inicio das aulas.
Que eu não o reconhecia ali.
Então o lembrei sobre ele ter me dito que pretendia cursar Arquitetura, disse a
ele que seu talento pra desenho iria ajudar e muito, mas que ele também iria
trabalhar de forma tridimensional, realizando maquetes e que ele não devia
apresentar um trabalho como esse que ele estava apresentando em sala de aula.
Ele concordou e pediu desculpas por não ter se dedicado nas ultimas aulas.
Agradeci e chamei o ultimo aluno para falar de seu trabalho.
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Trabalho do aluno Carlos
FROES (2012)
Então o ultimo aluno presente naquele dia e que fez o trabalho, Douglas, foi a
frente falar sobre seu trabalho. Disse que ele era negro, com um braço amputado,
hermafrodita e o vermelho representava a calcinha e o sutiã. Nisso eu e toda turma
começamos a rir porque eu fiquei incrédula que ele conseguiu pensar nisso tudo nos
trinta minutos antes de apresentar seu trabalho. Achei a relação muito engraçada,
realmente eles me surpreenderam em suas falas. Literalmente eu fiquei sem
palavras.
Então me refiz e disse que o trabalho estava mediano, pois houve algumas
falhas enquanto ele moldava a escultura com o papel machê. Que eu não sabia
como ele havia conseguido amputar um braço sendo que o esqueleto estava por
dentro, nisso ele disse que sofreu um acidente. Disse pra ele que seu trabalho
embora mediano estava bom, seu único defeito eram as falhas do papel machê, não
estava tão liso como a escultura do Vanderlei.
160
Trabalho do aluno Douglas
FROES (2012)
Minha avaliação final da aula foi positiva. Após retirar os maus elementos de
dentro da sala de aula, pudemos prosseguir com a aula sem muito transtorno. Todos
de alguma forma colaboraram, seja durante as apresentações ou nos comentários
pertinentes. Esta devia ter sido a atitude que devia ter tomado desde o inicio do
projeto, talvez assim eles levassem mais a sério as aulas de artes.
Ouço comentários sobre todos amarem os estagiários quando vão dar aula,
mas não no meu caso, pois sacrifiquei meu projeto para ser justa e não me estressar
por eles serem como são. Estou muito frustrada com a educação, e não falo a
respeito de conteúdo didático ensinado nas escolas, esse é meu trabalho, mas das
regras de boa convivência, etiqueta que alguns alunos não têm. Antonin Zabala
(2002) nos lembra sobre a utopia, que sem ela não é possível falarmos de
educação. Então não é exigir demais que eles tenham esse respeito pelos colegas e
professores em sala de aula, assim como eu tentei fazer minha parte, tive falhas,
tentei arrumar, eles também devem colaborar, pois o ensino não é uma mão única e
161
sim uma troca, mas infelizmente essa troca não existiu devido ao estresse que eles
me causaram e a minha falta de tesão em estar la com eles. No final eu consegui
atingir e ficar mais próxima de alguns alunos, uma pena não poder ser a maioria. De
todas as aulas essa foi a melhor, talvez não por ser a ultima como havia escrito no
inicio, mas por ela ter fluido em partes de uma maneira como o planejado.
162
4. Conclusão
O estágio realizado no Colégio Estadual Pres. Arthur Costa e Silva foi tomado
por uma tensão muito grande por parte da estagiaria Priscila. Seu projeto de ensino
bem como as aulas planejadas não estavam sendo desenvolvidas como ela havia
arquitetado.
Era importante que ela tratasse de preconceito em suas aulas, mas a mesma
não se desvencilhava de suas próprias amarras. Esse foi seu ponto fraco. Por causa
disto, a raiva foi um sentimento que permeou todo o estágio de Priscila Fróes. Pude
perceber o quanto ela se sentiu agredida, frustrada pelas aulas não estarem
alcançando todos os objetivos que ela havia planejado para as mesmas. Foi um
sentimento fácil dela admitir. Mas de difícil reflexão durantes os relatórios.
A raiva de Priscila a cegava e fazia com que não enxergasse suas falhas a
ponto de a todo relato, pôr a maior responsabilidade em seus alunos, como se eles
fossem somente os responsáveis pelo insucesso da pratica de estágio. Se a
conheço bem, acredito que, mesmo que quase todos os alunos tivessem agido de
acordo com o planejado, ela ainda sim ficaria com raiva da mínima provocação,
como ocorreu por parte de um aluno em especial, Elton.
Houve diversos momentos em que o sentimento de fracasso tomou conta de
Priscila e ela pensava a todo instante em acabar com tudo aquilo e desistir. As aulas
não estavam progredindo do jeito que haviam sido planejadas. Estava estressada, e
eu ficava pensando em como ela poderia realizar os relatórios das aulas se não
haviam bons resultados.
Essa sensação de fracasso ao final das aulas, levava-nos ao choro quando
chegávamos em casa. Eu pensava com muita tristeza no que ela estava fazendo, se
essa era a trilha que realmente ela deveria seguir em sua vida. O auge desse
sentimento foi a partir da nona aula quando ela estava muito contente pelo fato de
duas aulas anteriores tivessem atingido os objetivos propostos, até um certo ponto,
atingindo a maior parte da turma e então simplesmente ficou decepcionada pela
irresponsabilidade da turma em não levar o protótipo realizado na aula anterior. Foi o
momento em que ela pensou: “vou dar aula para aqueles que querem aprender”.
Talvez não tenha sido a melhor opção a se fazer, mas devido ao seu estado
163
emocional ela já estava pronta para desistir e se agarrou aos últimos fios de
esperança para a concretização do estágio.
Relembrando como foram as aulas ministradas por Priscila, acredito que a
oitava aula, tenha sido a melhor aula pratica ministrada. Porque de algum modo
houve uma intervenção sobre os trabalhos dos alunos. Foi planejada uma aula em
que os alunos deveriam criar um esqueleto e existiam regras para que esse
esqueleto fosse montado de acordo com o esperado. Eles receberam instruções
bem especificas, diferente das aulas com a técnica de recorte e colagem em que as
instruções ficaram vagas e o resultado não saiu como foi planejado. Em que mesmo
observando que os alunos não estavam selecionando boas imagens nenhuma
intervenção mais incisiva da parte de Priscila foi realizada.
Acredito agora que a metodologia pratica demonstrativa seja um ótimo
método a ser utilizado nas aulas de artes. Pois assim os alunos compreendem de
uma forma mais objetiva o que é esperado deles e se concentram mais na atividade
proposta. Quando Priscila empregou essa metodologia não era esperado que desse
certo já que todas as outras não saíram como o planejado. Foi um teste que deu
certo.
Para exemplificar novamente, mas com outra metodologia, a sétima aula, foi
planejada de forma que os alunos deveriam, em conjunto com perguntas feitas a
eles e exposições de imagens, falar sobre o que estava sendo exibido. O que difere
da segunda e terceira aula, em que a metodologia empregada era muito mais
Expositiva Dialogada do que Interrogativa. Pois Priscila tentou fazer com que os
alunos falassem através das imagens exibidas, sem muitos questionamentos.
Nas duas primeiras tentativas desta metodologia, Expositiva Dialogada,
Priscila não obteve muitos resultados. Os alunos respondiam ao método, calados ou
agitados demais. Já na sétima aula, Priscila estava mais confiante do que fazer, pois
não era apenas uma atividade na qual expunha uma imagem, falava, e esperava
uma resposta espontânea deles. Na sétima aula ela foi um pouco menos passiva, ou
seja, distribuiu imagens bem definidas sobre o que queria conversar com os alunos,
os separou em grupos para diminuir a agitação e ter mais controle sobre a turma.
Logo após os questionou com perguntas sobre o que estava escrito no verso da
reprodução e o que eles pensavam sobre aquela palavra de forma especifica.
164
A partir desta aula, foi possível perceber outros sentimentos emanando dela
além da raiva, o gozo da satisfação. Mesmo quando sentia muita raiva numa
determinada aula – como por exemplo a sétima aula – na qual havia planejado e
feito em casa todo um jogo em folhas de oficio com imagens e palavras para poder
ter a melhor aula possível. Saiu de lá com um sentimento de dever cumprido. Aliás,
essa foi a segunda aula em que senti isso nela depois da primeira aula, na qual ela
saiu com um sorriso no rosto e muito feliz. Ao todo foram necessárias seis aulas
para ela poder se sentir satisfeita com os frutos colhidos durante a aula. Isso
também ocorreu na oitava aula quando os alunos estavam todos dispostos a
colaborar com a aula e realizar a atividade proposta. Sentindo-se útil, amada e
respeitada pelo posto que estava ocupando, pôde pela primeira vez se enxergar
como uma professora de verdade. Senti que de algum modo ela havia superado
certas adversidades com a turma e estava progredindo, mesmo que quase ao final
do projeto.
Pensando ainda na sétima aula, o silencio por parte dos alunos não era uma
resposta aceitável, de modo que Priscila fez todos os alunos falarem, mesmo
aqueles que não estavam interessados na disciplina. Voltando para esta
metodologia, Dialogada Interrogativa, acredito que ela foi aplicada na sétima aula,
pois ela sabia exatamente aonde queria chegar e como. Ela conseguiu perceber que
as duas últimas aulas teóricas não haviam atingido os objetivos propostos por conta
de alguns detalhes já citados. Então tentou algo mais dinâmico, que a aproximasse
mais dos alunos e eles dela e não uma aula simplesmente expositiva, em que se
expõe imagens e eles estavam lá enfileirados, em silencio, com medo de conversar.
Todas as aulas práticas foram pensadas de forma que eles refletissem sobre
o que estávamos falando – preconceito - e traduzissem isso de forma plástica.
Chamo isso de Pratica Reflexiva. As aulas em que Priscila pôde notar uma eficácia
desse método foi a partir da nona aula em diante, na qual os alunos realizaram a
construção de um corpo tridimensional em papel machê. É necessário destacar que
nem todos participaram da atividade. Talvez a falta de domínio sobre a turma nas
aulas em geral, tenha prejudicado e muito o rendimento e a qualidade plástica dos
trabalhos. Pois houve pouca reflexão acerca do preconceito social. Mas ainda assim
é um bom método, mesmo Priscila não tendo aplicado da melhor forma possível e
de como deveria se esperar de um método assim. O grande mérito deste método é
165
que a atividade pratica possui um sentido muito maior e nobre por parte das artes.
Não é apenas vencimento de conteúdos. Conhecer e experimentar novos materiais
não é algo que deva ser aplicado ao ensino médio do mesmo modo que é aplicado
no fundamental, não é uma fase de descobertas e sim redescobertas, sobre novas
possibilidades, novos campos.
Priscila não queria que o processo de formulação do pensamento e criação
dos alunos fosse tomado pelos seus desejos e vontades, quase egocêntricos, de
como eles deveriam pensar ou efetuar um trabalho plástico. Relendo os realizados
ela não havia percebido o quanto essa parte foi importante para o “fracasso” do
projeto. Eu não conseguia perceber que isso ao mesmo tempo estava minando suas
aulas, e que sua raiva, como dito anteriormente, a cegou a ponto de não enxergar
suas falhas. Talvez haja um lado positivo em tudo isso, para se conhecer
profissionalmente e intimamente de verdade foi necessário passar por esse
processo. O qual antes não era possível enxergar nada e atualmente ser capaz de
enxergar e conseguir admitir que estava equivocada em suas reflexões. Quem sabe
se ela tivesse sido um pouco mais energética, esse tipo de situação não ocorresse e
ela ficaria mais alegre, mais motivada e mais próxima da turma.
Durante todo o estágio, o processo de reflexão de Priscila se centrava apenas
nos alunos como um empecilho para o sucesso das aulas. Ela não conseguia
perceber que suas metodologia estavam fracas. Ela se utilizou muito mais de sua
intuição do que de empregar novas metodologias baseando-se em suas reflexões.
Ela acreditava que estava certa e os alunos errados. Por isso, após o estágio em
sala de aula, Priscila conseguiu respirar melhor e dentre conversas com colegas
conseguiu perceber algo que antes ela não havia refletido.
Então, voltando alguns anos atrás, me vem a cabeça quando Priscila Fróes
não existia e sim José Carlos Fróes e de termos sido ensinados por dois professores
de matemática, um na sétima serie e outra professora na oitava. O primeiro
professor, Augusto, acompanhava a turma desde a quinta serie e José tinha grandes
dificuldades para aprender matemática e sempre tirava as notas mais baixas na
disciplina. O professor deixava a turma muito livre para conversar e bagunçar, no
ultimo ano com ele José recebeu por dois bimestres a media 3 sobre 10 em
matemática, mas conseguiu passar de ano graças ao conselho de classe. Já na
166
oitava serie, ele tinha uma professora, Luiza, que era vista como muito chata e
rigorosa e com esta, sua media em matemática nunca mais ficou abaixo de 8 sobre
10. Tendo isso como uma lembrança que me ocorreu esses dias, fico pensando no
modo como o professor se porta na aula e em sala de aula. Digo: a professora não
era tão rigorosa como José e eu pensávamos, mas ela mantinha um controle da
turma que Augusto nunca manteve. Ela sabia quando a bagunça estava demais e
então tomava as rédeas da aula. Este outro professor embora pedisse as vezes para
diminuir a bagunça, nunca impôs respeito sobre o ato de estudar, da importância
que havia em estar numa escola, o “respeitávamos” gratuitamente, mas o respeito
com a outra professora era diferente, não era por ela ser legal, era por exigir aquilo
que era pedido pela escola, pelos pais além de as aulas não eram torturantes o
tempo todo. A turma se divertia e aprendia matemática.
Essa lembrança de uma parte da minha antiga vida se encaixa perfeitamente
no modo como Priscila estava ministrando suas aulas. Talvez inconscientemente,
ela tenha sido aquele nosso professor Augusto, que não quer se estressar ou
mesmo arranjar confusão para o seu lado. Como não era turma dela, Priscila estava
apenas estagiando nela, Priscila não queria se intrometer demais no ambiente.
Como ir para dentro da selva e tentar se camuflar para não espantar os bichos e
deixar que o circulo natural das coisas acontecessem? Mas por que ela agia desta
forma? Talvez eu tenha a resposta.
Houve muito medo da parte dela em ser reconhecida como uma professora
transexual, seu medo era de sofrer novamente o preconceito que eu e o José
sofremos durante toda nossa infância dentro do ambiente escolar. Acreditava
também que se os alunos soubessem oficialmente, que isso prejudicasse seu
rendimento tanto como estagiaria como aluna. É complicado pensar nisso e falar: se
assuma. Somente quem sentiu o preconceito em carne viva durante a infância e
adolescência sabe o quanto é difícil se desfazer das mascaras e escudos
desenvolvidos ao longo de uma transição. A dor da vergonha, as lagrimas, o frio, a
auto piedade, todas essas coisas dentro de uma única pessoa, algo que ela não
queria vivenciar de novo. Compreendo que é nossa realidade, mas ela teve muito
medo disso.
167
Então, devido ao medo de ser rechaçada pelos alunos, Priscila adotou uma
postura dócil, passiva diante dos alunos. Embora milhões de sentimentos não muito
saudáveis estivessem borbulhando dentro dela. Ela manteve a calma na maior parte
do tempo, pensando que assim a turma não teria domínio sobre ela. Pouco se
intrometeu no modo como eles pensavam ou trabalhavam durante as aulas.
Por fim, concluo que a metodologia não deva se basear apenas na intuição do
professor, bem como no seu desejo em como as aulas devem ser. O professor deve
estudar sempre novos métodos de ensino e aplicar o melhor método para aquela
turma, pois cada turma possui um perfil. Não é possível nos dias atuais, que um
professor siga em frente com um método que ele percebe não estar funcionando. É
necessário flexibilidade por parte do profissional, pois deste modo os alunos serão
capazes de desenvolver em conjunto com o professor, um excelente trabalho.
Parando de falar apenas de Priscila e seus traumas, é necessário falar
também do comportamento dos alunos, que ao mesmo tempo fascinou Priscila e
depois a fez temê-los. Desde as observações ela avaliou que eles eram
extremamente agitados em relação aos alunos do estágio II. Ela pensou que isso
era algo positivo, se canalizado de forma correta. Pois para ela nada era pior que
uma turma quieta, educada demais, mas que não tivesse impulso para produzir.
Durante suas observações era claro que a professora titular não tinha um
domínio total sobre a turma e se desgastava muito, admitia que amava o que fazia,
mas que o estresse era muito alto. Durante todas as aulas em que Priscila ministrou
suas aulas, ela pôde entender o que a professora titular queria dizer.
Além da agitação dos alunos, outro comportamento que Priscila percebeu foi
o desinteresse da turma por qualquer atividade proposta. Ela sabe que não pode
falar isso de todos os alunos, mas a grande maioria não queria conversar ou praticar
atividades em artes. Essa percepção foi mais visível a partir da terceira aula. Os
alunos não tinham interesse em conversar a respeito das imagens exibidas. Em
alguns momentos os alunos realizavam comentários ora pertinentes, ora
impertinentes. De todos os comentários realizados um nos chocou demasiadamente.
Um aluno – na segunda aula- havia ofendido seus colegas com comentários
racistas, no qual além do racismo, expunha a mulher negra como objeto sexual.
Fora isso, a maioria dos alunos não desenvolveram nada muito além do que simples
168
comentários. Falavam muita bobagem e dificilmente tinham algo a acrescentar. Não
a desafiavam como professora, não questionavam. Priscila sentia-se um robô,
estava ali para dar o que eu havia planejado, eles não colocavam suas opiniões,
desejos de que ela pudesse fazer algo diferente. O único desafio sentido por ela, foi
o de sobreviver e que aquilo tudo acabasse.
É muito provável a irritação e descaso de Priscila tenha provocado nos alunos
uma postura de rejeição por ela e suas aulas, sua introspecção e falta de empatia
foram alguns dos fatores, aliado a sua passividade, como dito anteriormente: não
querer ser a professora chata.
Também não é possível deixar de ressaltar as qualidades observadas na
turma. Os alunos eram amáveis uns com os outros, mesmo brigando às vezes,
também nunca falavam palavras de baixo calão para a professora. Mesmo diante de
toda uma agitação existia um certo respeito, sem agressão verbal ou física.
As frustrações de Priscila foram refletindo no seu humor e consequentemente
no modo como as aulas estavam sendo ministradas. Cada vez que se
decepcionava, menos ela queria continuar a dar aula e quanto mais ela gostava de
uma aula, mais Priscila queria continuar o projeto. Quanto a qualidade plástica dos
trabalhos dos alunos é possível observar a forma passiva como a professora se
portou, de não interferir no trabalho dos alunos, esperando que eles magicamente
produzissem coisas maravilhosas (acredito que essa foi sua expectativa real) e isso
também reflete nos alunos em talvez pensarem que a professora não soubesse o
que estava fazendo dentro de sala de aula, legando a eles o poder de fazerem o que
quiserem e também de não se interessar pela disciplina.
Muitos alunos não participaram das aulas e isso é muito ruim, pois quem
participou atingiu alguns dos objetivos propostos para as aulas. Que consiste em
desenvolver uma nova linha de raciocínio acerca dos diversos preconceitos
existentes em nossa sociedade através de reproduções de obras de arte, trabalho
manual com desenho e escultura da figura humana. Alguns alunos, em especial
alguns meninos, possuíam um noção maior sobre desenho, conseguiam criar
expressões, possuíam noção de espaço na folha, noção de volume, espessura das
linhas, ou seja estavam um pouco além do esperado pela professora conforme
observação dos trabalhos dos outros alunos.
169
Como posso avaliar realmente se os objetivos podem ter sido atingidos ou
não? Teria que fazer de uma forma geral ou mais individualizada? Eu acho justo
avaliar que muitos objetivos foram atingidos por aqueles que desenvolveram seus
pensamentos e questionamentos. Senti durante as aulas que o tema preconceito
não estava sendo levado com seriedade pelos alunos.
Percebi na ultima aula que aqueles que participaram das atividades
conseguiram desenvolver melhor o que pensavam a respeito do preconceito.
Percebi em suas falas e ações que os alunos estavam bem encaminhados quanto a
este assunto. O principal objetivo foi atingido, o da reflexão a cerca do preconceito
social. Embora, objetivos como, o do desenvolvimento da imaginação, criação de
corpos rejeitados pela sociedade, refletir e relacionar isto em conjunto com a arte
não tenham sido alcançados como os planejado. Isso provavelmente foi uma
resposta ao não assimilamento dos conteúdos desenvolvidos durante todo o estágio.
Concluindo, durante todos os estágios Priscila tentou negar sua
transexualidade. Como dito anteriormente, essa foi sua principal falha. Acredito que
o professor deva ser honesto com aquilo que ele propõe a trabalhar. Com certeza o
projeto de ensino teria tido mais sucesso se ela tivesse se assumido. Como tentou
negar a sua existência seu projeto fracassou em muitos aspectos. Talvez ninguém
melhor que ela, enquanto transexual para falar sobre corpos. Sobre todo um
processo de auto apoderamento sobre seu corpo, sua moral e desejos.
170
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174
Apêndices
175
Apêndice 1: Avaliação realizada pela professora titular
176
Apêndice 2: Questionário respondido pela professora titular
177
178
179
180
181
Apêndice 3: Questionário respondido pelos alunos
182
183
184
185
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