Suporte nutricional enteral em pacientes críticos...5 VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de...

71
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA CÂMPUS JABOTICABAL FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS DEPARTAMENTO DE CLÍNICA E CIRURGIA VETERINÁRIA APOSTILA VI SIMPÓSIO SOBRE NUTRIÇÃO CLÍNICA DE CÃES E GATOS - MÓDULO PRÁTICO Jaboticabal, novembro de 2015

Transcript of Suporte nutricional enteral em pacientes críticos...5 VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de...

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA

CÂMPUS JABOTICABAL

FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS

DEPARTAMENTO DE CLÍNICA E CIRURGIA VETERINÁRIA

APOSTILA

VI SIMPÓSIO SOBRE NUTRIÇÃO CLÍNICA DE CÃES E

GATOS - MÓDULO PRÁTICO

Jaboticabal, novembro de 2015

2

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Colaboração e Revisão

Prof. Dr. Aulus Cavalieri Carciofi

Prof. Dr. Marcio Antonio Brunetto

Profa. Dra. Márcia de Oliveira Sampaio Gomes

M.V. Érico de Mello Ribeiro

M.V. Fabio Alves Teixeira

M.V. Vivian Pedrinelli

3

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Índice Página

I. SUPORTE NUTRICIONAL ENTERAL NO PACIENTE CRÍTICO 4

1. Introdução 4

2. Alterações metabólicas 5

3. Avaliação nutricional e seleção dos pacientes 6

4. Necessidades nutricionais 8

5. Suporte nutricional enteral 11

6. O papel do intestino no paciente grave 12

7. Sondas Nasoesofágicas ou Nasogástricas 13

8. Sondas esofágicas 20

9. Sondas gástricas 25

10. Sondas Intestinais 28

11. Considerações finais 29

12. Referências 31

II. SUPORTE NUTRICIONAL PARENTERAL NO PACIENTE CRÍTICO 37

1. Resumo 37

2. Introdução 37

3. Fornecendo energia 39

4. Glicose 39

5. Lipideos 40

6. Aminoácidos 41

7. Vitaminas e Minerais 42

8. Eletrólitos 43

9. Cálculo do volume das soluções 46

10. Preparo da solução final 50

11. Administração 51

4

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

12. Complicações da nutrição parenteral 54

13. Considerações finais 55

14. Referências 56

III. DIETAS CASEIRAS PARA CÃES E GATOS 60

5

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

I. SUPORTE NUTRICIONAL ENTERAL NO PACIENTE CRÍTICO

1. Introdução

A maioria dos animais que ingressam em uma clínica ou hospital veterinário está

acometida por alguma alteração sistêmica que pode colocar sua vida em risco. Em

muitas ocasiões estes pacientes apresentam resposta catabólica aumentada,

conseqüente a processos infecciosos, sepse e traumas, que resultam em resposta

inflamatória sistêmica. Estas alterações no metabolismo são efeitos da maior liberação

de mediadores endógenos como hormônios do estresse e citocinas. Estes conduzem a

um estado de balanço calórico negativo que com o passar do tempo leva à desnutrição,

com perda de massa muscular, disfunções sistêmicas, queda na resposta imune,

comprometimento do processo de cicatrização tecidual e alteração no metabolismo de

drogas. Este fato é agravado pelo fato de muitos pacientes encontrarem-se hiporéticos

e anoréticos há dias, sem que algumas vezes isto tenha sido considerado importante

por parte do proprietário.

A escassez de dados mais precisos sobre as necessidades nutricionais de

animais hospitalizados durante as diversas fases da doença complica ainda mais este

quadro. Por este motivo, a abordagem nutricional dos pacientes gravemente enfermos

é um dos grandes desafios da nutrição clínica. Embora existam diferentes métodos,

técnicas e protocolos de fornecimento protéico-energético para pacientes enfermos,

cabe lembrar as dificuldades para a aplicação prática dos mesmos. Animais anoréticos

nem sempre toleram a administração de alimentos pela via enteral por apresentarem

vômitos, distensão abdominal e gastroparesias. Outras dificuldades como restrição no

fornecimento de líquidos, dificuldade de acesso vascular ou enteral, impossibilidade de

realização de procedimentos invasivos, insuficiência orgânica e a síndrome da

6

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

realimentação determinam grande complexidade no processo de nutrição desses

animais.

2. Alterações metabólicas

Animais enfermos apresentam resposta metabólica ímpar, o que os coloca em

maior risco de subnutrição e suas subseqüentes complicações1. Pacientes saudáveis,

em situações de déficit calórico, inicialmente suprem sua demanda energética pelo uso

dos estoques de glicogênio hepático e pela mobilização de aminoácidos do tecido

muscular. Embora estes processos possam fornecer a energia necessária, são

ineficientes. Dessa forma, após algum tempo, o organismo se adapta diminuindo o

turnover protéico e aumentando a oxidação de gorduras2. Em resposta a estas

adaptações um animal saudável pode sobreviver por longos períodos sem comida,

desde que haja água disponível3.

De modo contrário, em situações de injúria e doenças a secreção aumentada de

glucagon, catecolaminas, cortisol, hormônio do crescimento e citocinas antagonizam os

efeitos da insulina e induzem hiperglicemia e degradação de proteína tecidual para

fornecer substrato para a gliconeogênese. Este mecanismo perpetua a perda de massa

corporal magra, refletindo-se de forma negativa nos processos de reparação tecidual,

metabolismo de drogas, resposta imune e prognóstico4. Existe correlação importante

entre aptidão imune, sobrevida de pacientes hospitalizados e sua massa magra.

Pacientes em escore de condição corporal pobre, com perda das reservas nutricionais

orgânicas, demonstraram maior mortalidade do que aqueles em condição nutricional

ideal ou mesmo em sobrepeso5,6.

Além de modificar o metabolismo, situações graves como sepse, isquemia,

traumas e falência múltipla de órgãos podem induzir aumento drástico na produção de

radicais livres de oxigênio, o que pode resultar em estresse oxidativo (EO) com ativação

7

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

de células fagocíticas do sistema imune, produção de óxido nítrico pelo endotélio

vascular, liberação de íons de ferro, cobre e metaloproteínas7. A desnutrição pode ser

considerada como um fator determinante do EO, sendo reconhecido que deficiências

de nutrientes relacionados ao sistema de defesa antioxidante, como o magnésio,

selênio, zinco, cobre e vitamina E, e o excesso de outros, como o ferro, se encontram

relacionados com as alterações metabólicas ligadas a aumento na produção de radicais

livres com conseqüente dano oxidativo 8,9. Deve-se então sempre se considerar que

pacientes críticos estão mais suscetíveis a déficits de nutrientes, pois a condição

hipermetabólica induz a aumento das necessidades nutricionais e de nutrientes do

sistema antioxidante, que muitas vezes não são supridos com o uso de dietas de

manutenção10 e encontram-se agravados pela hiporexia ou anorexia.

Desta forma, o suporte nutricional, como fator independente, influencia o

prognóstico e deve ser considerado como parte integral do tratamento do paciente

crítico5. Este apresenta como objetivos prevenir a desnutrição protéico-energética,

situação muito comum devido ao hipermetabolismo e anorexia, e atuar como um agente

modulador da resposta inflamatória e metabólica, resultando em aumento das chances

de recuperação11.

3. Avaliação nutricional e seleção dos pacientes

Para escolher a abordagem nutricional mais adequada e eficaz, é fundamental

realizar a avaliação nutricional sistemática dos pacientes. Com isto é possível identificar

não só os desnutridos, que necessitam de intervenção nutricional imediata, mas

também os pacientes nos quais a terapia nutricional pode prevenir a desnutrição12.

A identificação dos animais que necessitam de suporte nutricional baseia-se no

histórico, exame físico e laboratorial. Deve-se realizar o inquérito alimentar para verificar

a qualidade, adequação e consumo diário da dieta empregada. Os proprietários também

8

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

devem ser questionados sobre o uso de drogas que podem interferir na homeostase

nutricional dos animais, como corticosteróides, antibióticos, diuréticos, agentes

quimioterápicos para câncer, dentre outros. No Quadro 1 encontram-se as principais

situações que determinam a necessidade de suporte nutricional intensivo.

Quadro 1 - Indicações para a intervenção nutricional intensiva13,14,15.

- Consumo prolongado de dieta considerada inadequada (desbalanceada);

- Ingestão inadequada de alimentos (inferior a necessidade energética basal) por

mais de três dias;

- Rápida perda de peso (> 5% do peso corporal total) ou perda crônica (> 10%)

de peso sem perda de fluidos;

- Cirurgia ou trauma recente e aumento da perda de nutrientes por ferimentos,

vômito, diarréia ou queimaduras;

- Baixo escore de condição corporal: inferior a 3 na escala de 9 pontos e inferior

a 2 na escala de 5 pontos;

- Perda acentuada de massa muscular em membros e região frontal e parietal do

crânio (baixo escore de massas musculares);

- Concentração de albumina sérica inferior aos parâmetros normais;

- Situações de hipermetabolismo como infecção, traumas, queimaduras e

cirurgia;

- Uso prolongado de drogas catabólicas que podem resultar em depleção de

nutrientes.

A determinação do escore de condição corporal16,17 demonstra-se método

bastante útil na avaliação do estado nutricional, devido à sua simplicidade. Porém, este

foi desenvolvido para avaliar os depósitos de massa adiposa e não para detectar perdas

de massa muscular. Ele é bastante subjetivo, devendo ser empregado com atenção18.

Os exames laboratoriais podem ser medidas mais objetivas do estado

nutricional, porém nem sempre apropriados para seu diagnóstico. A dosagem de

proteínas plasmáticas como as proteínas totais e albumina são parâmetros

9

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

interessantes para o diagnóstico de desnutrição calórico-protéica. No entanto,

apresentam tempo de meia vida diferentes e fatores não nutricionais podem interferir

nas suas concentrações19. A dosagem de albumina sérica é o teste bioquímico mais

realizado para avaliação da desnutrição. As concentrações normais de albumina variam

de 2,6 a 4,0 g/dL na espécie canina e 2,6 a 4,3 g/dL nos felinos. Variações nestes

valores podem indicar desnutrição protéica, mas não podem ser interpretados de forma

precipitada, pois devido a sua meia vida sérica relativamente longa (aproximadamente

8 dias), em geral é necessário prolongado período de privação alimentar para que suas

concentrações caiam abaixo dos parâmetros normais20. Desta forma, proteínas séricas

com meia vida mais curta, como transferrina, fibrinogênio e pré-albumina também

podem ser usadas para se obter informações adicionais mais dinâmicas e acuradas do

estado nutricional do paciente21. Contagens linfocitárias totais diminuídas são típicas em

cães e gatos criticamente enfermos, assim como anemia normocítica normocrômica

arregenerativa, decorrentes da deficiência protéico-energética.

O método mais prático e efetivo de se conduzir a avaliação nutricional e seleção

dos pacientes consiste na combinação de todos estes parâmetros. A integração das

informações de composição corporal, escore de massas musculares, composição e

ingestão alimentar, aspecto da pele e pelagem e avaliação bioquímica é o procedimento

mais interessante. Sendo necessário o suporte nutricional intensivo, parte-se para seu

planejamento que inclui a determinação das necessidades nutricionais do paciente e a

seleção do tipo de suporte que será utilizado.

4. Necessidades nutricionais

As necessidades energéticas dos pacientes enfermos são estimadas a partir da

soma da energia necessária para seu metabolismo basal, atividade física voluntária e

10

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

enfermidade. A taxa metabólica basal, ou necessidade energética basal, pode ser

estimada como: 70 x Peso Corporal(kg))0.75 kcal/dia22.

Tradicionalmente, a necessidade energética basal do paciente era multiplicada

por uma constante denominada fator de doença, que variava entre 1,0 e 2,0 vezes, para

considerar o aumento no metabolismo associado a diferentes condições e

enfermidades23,24,25. Recentemente, no entanto, verificou-se que além de bastante

subjetiva, esta abordagem levava ao fornecimento exagerado de calorias, aumento os

riscos de distúrbios metabólicos27,29. Assim, as recomendações atuais são de se utilizar

estimativas mais conservadoras de energia para se evitar superalimentação26,27,28.

Adicionalmente, embora tenha sido demonstrado que certas condições como

septicemia e queimaduras podem aumentar em 25% a 35% o gasto energético basal de

cães26, dados mais recentes sugerem que as necessidades energéticas basais em cães

criticamente enfermos, no pós-operatório e severamente traumatizados não são

maiores do que as necessidades basais de animais saudáveis. Em estudo que

comparou cães e gatos hospitalizados que receberam aproximadamente sua

necessidade energética basal, com os que receberam até 100% da necessidade

energética de manutenção (aproximadamente 1,8 vezes mais calorias), verificou-se a

mesma alta hospitalar. Estes resultados indicam que o fornecimento em nutrição

intensiva das necessidades energéticas basais pode ser suficiente para atender a

demanda calórica da maioria dos pacientes hospitalizados5,6.

De qualquer forma, o calculo das necessidades calóricas do paciente é apenas

um ponto de partida. Ajustes deverão ser realizados com base na reposta individual do

animal à alimentação, variações de seu peso corpóreo e mudanças na doença de base.

Deve-se ter em mente que o sucesso do suporte nutricional depende de monitoramento

constante, para assegurar que o fornecimento de calorias esteja adequadamente

ajustado ao cão ou gato.

11

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

As necessidades protéicas dos pacientes gravemente enfermos não são

conhecidas até o momento. Os animais jovens em crescimento necessitam de teores

protéicos que correspondam a aproximadamente 17% a 22% das calorias fornecidas30.

Nos pacientes acometidos por doenças que aumentam as perdas protéicas, como

enteropatias ou nefropatia, aconselha-se estimar e repor estas perdas30,31. Pacientes

queimados podem perder quantias relevantes de proteína e devem ser suplementados

com elevadas porcentagens de calorias provindas das proteínas32. Suplementos

caseiros como carne, ovo ou queijos podem ser empregados com esta finalidade,

tomando-se sempre cuidado destes representarem apenas parte da dieta e seu

conteúdo calórico ser computado na suplementação energética diária do animal.

Os pacientes hospitalizados também necessitam de ácidos graxos essenciais,

minerais e vitaminas. As necessidades específicas de minerais e vitaminas dependem

do processo mórbido de base. Para a suplementação nutricional por curto período,

devem ser fornecidos pelo menos sódio, cloro, potássio, fósforo, cálcio e magnésio. A

suplementação de zinco também deve ser considerada, especialmente nos pacientes

anoréticos com doença gastrintestinal, quando suas perdas podem estar aumentadas33.

Os alimentos comerciais de elevada energia e digestibilidade (> 4,2 kcal/g; > 20% de

extrato etéreo), quando empregadas no suporte nutricional de animais anoréticos, tanto

os que necessitam de alimentação via tubo como os que consomem voluntariamente,

contém todos os nutrientes necessários, provavelmente não justificando suplementação

adicional34. O fornecimento de minerais e vitaminas na quantidade exata ou próxima às

necessidades para crescimento estabelecidas pelo NRC (2006) parecem razoáveis e

sem qualquer contraindicação específica35. Na Tabela 1 é apresentada sugestão prática

do Serviço de Nutrição Clínica da FCAV/Unesp para seleção de alimentos para suporte

nutricional enteral em pacientes críticos.

12

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Tabela 1 - Guia prático para seleção de alimentos industrializados para suporte

nutricional de pacientes críticos. Serviço de Nutrição Clínica, FCAV/Unesp.

Item Cão Gato

Energia metabolizável (kcal/grama) >4,2 >4,2

Proteína bruta (%) ¹ >27 >33

Extrato etéreo (%) >18 >18

Carboidratos (%) <30 <25

Fibra bruta (%) <2 <2

Matéria mineral (%) <7,5 <7,5

5. Suporte nutricional enteral

A terapia nutricional enteral é definida como o fornecimento de nutrientes na luz

do trato gastrintestinal, administrados pela boca, sondas ou ostomias, com o objetivo de

proporcionar manutenção ou recuperação do estado nutricional do paciente36. Sempre

que possível, o uso do suporte enteral é preferível ao parenteral, por ser mais próximo

do fisiológico, seguro, econômico, além de garantir o aporte de nutrientes no lúmen

intestinal, mantendo desta forma a integridade da mucosa, o que evita atrofia do órgão,

comprometimento imune e translocação bacteriana37,38,39,40,41. A presença de nutrientes

na luz intestinal representa importante estímulo trófico para a mucosa deste órgão. A

absorção de nutrientes diretamente da luz intestinal corresponde a 70% das

necessidades energéticas dos colonócitos e 50% da dos enterócitos, sendo o restante

suprido pela corrente circulatória42. A mucosa intestinal apresenta as maiores taxas de

multiplicação e renovação celular de todo o organismo, o que demonstra a grande

importância do fornecimento de nutrientes para o intestino.

13

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

6. O papel do intestino no paciente grave

Durante muito tempo o intestino dos pacientes críticos foi considerado como um

órgão fisiologicamente inativo e de pouco significado fisiopatológico, sendo considerado

como de importância secundária nos processos de recuperação43. Ao contrário do que

se pensava, no entanto, este apresenta papel muito importante na recuperação do

paciente, desempenhando funções endócrinas, imunológicas e atuando como barreira

protetora, separando os meios corporais interno e externo44.

A capacidade de permeabilidade seletiva da parede intestinal está diretamente

ligada a sua integridade. Situações graves como queimaduras, politraumatismos,

pancreatite aguda e jejum prolongado podem ocasionar a perda desta função, o que

resulta na entrada e translocação de bactérias e produtos bacterianos (endotoxinas,

exotoxinas, fragmentos de parede celular) da luz intestinal para outros territórios

extraintestinais, refletindo-se em queda da resposta imune e da secreção de

substâncias imunológicas. Este aumento da permeabilidade intestinal resulta na

síndrome da resposta inflamatória sistêmica45.

Segundo alguns estudos em humanos e animais, pacientes graves que

receberam algum tipo de suporte nutricional enteral apresentaram índices de infecção

muito menores do que os que receberam nutrição parenteral ou foram mantidos em

jejum alimentar46,47. Estes achados podem ser explicados pelo importante papel

imunológico que o intestino apresenta. Há evidências cada vez maiores que a

manutenção da massa tecidual linfóide do intestino preserva a imunidade local e

sistêmica. A presença intraluminal de alimento relaciona-se com maior produção de

colecistocinina, esta por sua vez aumenta o cálcio disponível para os linfócitos, servindo

como cofator de multiplicação. Outros benefícios associados à nutrição enteral é o

aumento da IgA intraluminar, regulação da produção de mediadores inflamatórios e

redução da virulência bacteriana, conseqüente a menor expressão de adesinas48,49.

14

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Outro fator relevante é o estimulo trófico produzido pela presença de alimentos na luz

intestinal, permitindo maiores taxas de replicação e diferenciação celular com formação

de melhor membrana mucosa, com maior capacidade de absorção de nutrientes e

defesa contra penetração de antígenos.

Além de todos os benefícios citados anteriormente, o uso do suporte nutricional

enteral é preferível ao parenteral por ser mais próximo do fisiológico, seguro e

econômico. A seguir são descritos os principais tipos de sondas utilizadas para nutrição

enteral em cães e gatos anoréticos e gravemente enfermos.

7. Sondas Nasoesofágicas ou Nasogástricas

A colocação da sonda pela via nasoesofágica ou nasogástrica é o método mais

indicado para cães e gatos doentes que necessitam de suporte nutricional por período

inferior a uma semana50,51. Permite que o animal beba e coma normalmente, mesmo

com a sonda. Os nutrientes são administrados na porção distal do esôfago ou no

estômago. As vantagens desta técnica são seu baixo custo, facilidade, aceitação pelo

paciente e a dispensa da anestesia geral. No entanto, o pequeno calibre da sonda

permite apenas a administração de dietas líquidas sem partículas, o que dificulta o

suprimento calórico e protéico dos animais debilitados e desnutridos, principalmente

quando são de pequeno porte. As complicações associadas com seu uso incluem

obstrução, remoção pelo próprio animal, epífora, atraso no esvaziamento gástrico,

aspiração, vômitos, diarréia, hipocalemia e moléstias nasais e faríngeas relacionadas à

sua permanência prolongada50,51,52.

15

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Figura 1 - Radiografia torácica de paciente canino demonstrando localização de sonda

nasogástrica após passagem de contraste.

Como tipo de sonda para esta técnica podem ser empregadas as siliconizadas

descartáveis ou sonda Levine. Inicialmente deve-se estimar o comprimento da sonda

que será colocada no esôfago, pelo posicionamento da mesma desde o plano nasal até

a extensão do sétimo espaço intercostal (quando esofágica) ou estômago. Em seguida,

marca-se esta medida com o auxílio de um marcador de esparadrapo que será aderido

no tubo. Deve-se então lubrificar a extremidade da sonda com lidocaína a 5% e manter

a cabeça do paciente em posição normal. Posteriormente, a sonda deve ser colocada

na face ventrolateral de uma das narinas (direita ou esquerda) e introduzida em direção

caudoventral e medial na cavidade nasal escolhida. Ao se introduzir cerca de 3 cm na

narina, encontra-se uma barreira anatômica, o septo mediano, no piso da cavidade

nasal. Em caso de dificuldade para ultrapassar esta barreira, pode-se empurrar as

16

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

narinas externas dorsalmente para facilitar a abertura do meato ventral. Deve-se, então,

elevar a extremidade proximal da sonda e avançá-la para o interior da orofaringe (Figura

2).

Figura 2 - Ilustração da técnica de colocação da sonda nasoesofágica/nasogástrica –

6A. Elevação dorsal das narinas; 6B. Introdução da sonda na narina; 6C. Posição da

sonda dentro da narina; 6D. Elevação das narinas para facilitar a passagem do tubo

pelo septo mediano; 6E. Fixação da sonda; 6F. Colocação do colar elisabetano.

Para a confirmação da localização da sonda no tubo digestório e não traqueia,

pode-se injetar cerca de 5 mL de solução fisiológica estéril através do tubo. A ausência

do reflexo de tosse ou espirro sugere posição esofágica. Após este teste, deve-se

realizar avaliação radiográfica, com tomada de radiografia torácica! Esta é medida

importante de segurança, para verificar correto posicionamento. A Figura 3 demonstra

radiografia de sonda dobrada em esôfago. Neste caso ela deve ser removida e

reposicionada. Havendo posicionamento correto, a fixação da sonda pode ser feita com

17

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

cola de cianocrilato, na linha média nasal dorsal. Deve-se usar um colar elisabetano

para proteção do tubo.

Figura 3 - Radiografia torácica lateral de paciente canino com sonda nasoesofágica

mal posicionada, dobrada (seta) em esôfago.

A dieta a ser empregada dependerá do calibre da sonda. Sondas mais calibrosas

(>12 frenchs) permitem a utilização de determinados alimentos secos, umedecidos,

batidos no liquidificador e coados em peneira (o cálculo da quantidade de alimento a ser

administrado será ilustrado junto com os procedimentos de sonda esofágica). Sondas

mais finas (<10 frenchs) requerem alimentos especiais. Uma opção é o uso de alimentos

úmidos (enlatados) de alta energia para cães ou gatos, diluídos em água. Define-se um

alimento úmido como de elevada energia quando este apresenta mais de 1,5 kcal por

grama. Os alimentos úmidos de manutenção comercializados no Brasil apresentam

18

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

entre 0,75 e 0,9 kcal por grama, de forma que se diluídos em água geram solução com

muito baixa caloria e incompatível para fornecer as calorias necessárias dentro do

volume estomacal e necessidade hídrica do animal. Seu emprego leva a baixo

fornecimento de energia e a hiperidratação do paciente, não sendo recomendável.

Como alternativa, o Serviço de Nutrição Clínica do Hospital Veterinário da Unesp,

campus de Jaboticabal, desenvolveu fórmulas caseiras práticas para uso em sondas de

reduzido calibre, sendo de fácil preparação e que têm demonstrado bons resultados ao

longo dos anos em mais de 800 pacientes (Quadro 2).

Durante o suporte nasoesofágico ou nasogástrico pode-se infundir alimento

suficiente para suprir a necessidade energética basal ou a necessidade de manutenção

dos animais. A escolha da quantidade de energia a ser administrada dependerá

basicamente das condições de saúde do paciente. Paciente sem grandes

comprometimentos fisiológicos devem receber sua necessidade de manutenção,

enquanto pacientes severamente debilitados, em anorexia há muito tempo ou com

distúrbios metabólicos importantes devem receber sua necessidade energética basal.

Os procedimentos de cálculo estão ilustrados no Quadro 2.

A alimentação pode ser iniciada logo após a colocação do tubo, tomando-se os

cuidados de adaptação dos pacientes para a realimentação. Assim, o fornecimento de

alimentos deve ser gradual e respeitar a capacidade de digestão e absorção de cada

paciente. Sugere-se fornecer 1/3 da quantidade calculada no primeiro dia, 2/3 no

segundo dia e só no terceiro dia se fornece toda a quantidade calculada o paciente. Isto

é mais importante para pacientes severamente debilitados, ou que estão há muitos dias

sem comer.

19

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Quadro 2 - Protocolo de nutrição enteral para cães e gatos. Serviço de Nutrição Clínica

do Hospital Veterinário da FCAV/Unesp.

PROTOCOLO DE NUTRIÇÃO ENTERAL PARA CÃES E GATOS

SERVIÇO DE NUTRIÇÃO CLÍNICA – Hospital Veterinário da FCAV/Unesp

PACIENTES CRÍTICOS E QUE NÃO SUPORTAM GRANDE QUANTIDADE DE

ALIMENTOS

1.0 Determinação da necessidade energética basal dos animais:

1.1 Pesar o animal: (______)kg

1.2 Calcular a necessidade energética de repouso (NER):

NER = 70 x {peso corporal(kg)}0,75

NER = (______) kcal por dia, para cães ou gatos

PACIENTES EM MANUTENÇÃO QUE PODEM RECEBER ALIMENTO EM

QUANTIDADE NORMAL

1.0 Determinação da necessidade energética de manutenção de cães:

1.1 Pesar o animal: (_______) kg

1.2 Calcular a necessidade energética de manutenção (NEM):

NEM = 95 x {peso corporal(kg)}0,75

NEM = (______) kcal por dia

2.0 Determinação da necessidade energética de manutenção de gatos:

2.1 Pesar o animal: (______)kg

2.2 Calcular necessidade energética de manutenção

NEM = 100 x {peso corporal(kg)}0,67

NEM = (______)kcal por dia

3.0 Calcular a necessidade hídrica (NH) – (Cães ou gatos):

NH = peso corporal x 70mL = (______) mL por dia

Considerar o volume fornecido pelo alimento

Suplementação hídrica via sonda = NH – volume de alimento = (______) mL por dia

20

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

4.0 Dietas caseiras para utilização via sonda nasoesofágica:

Dieta 1(*) Dieta 2 (**)

1,1% Nutrilon ou Mucilon 3,9% Nutrilon ou Mucilon

1,1% dextrose 1,6% dextrose

15,3% extrato solúvel de soja 63,4% ração em lata para gatos

11,4% creme de leite 7,7% creme de leite

69,5% água 21,9% água

0,8% Suplemento vitamínico-mineral 0,8% Suplemento vitamínico-mineral

0,5% Ornitargim/ornitil 0,5% Ornitargim/ornitil

0,3% KCl a 20% (***) 0,3% KCl a 20% (***)

Composição química

PB: 32,1%, EE: 27,3%, EM: 0,96 kcal/ml PB: 32,5%, EE: 26,4%, EM: 0,96 kcal/ml

* Para uso em sondas com 06 ou 08 French; ** Para uso em sondas com mais de 10 French;

*** Gatos adicionar 30 mg de taurina por 100mL de alimento.

4.1 Como calcular e como prescrever a dieta:

Exemplo: Cálculo e prescrição de uma dieta enteral para cão adulto de 10 kg.

Dieta selecionada: alimento para sonda de 6 e 8 French. EM da dieta = 0,96 kcal por mL

Etapa I: Animal em estado crítico, recebendo necessidade energética basal. Obs.:

para os demais pacientes, empregar necessidade energética de manutenção.

NEM = 70 x (peso em Kg) 0,75

NEM = 70 x (10) 0,75

NEM = 392 Kcal por dia

Etapa II: Calcular a quantidade de alimento a ser administrada por dia, em mL.

Quantidade de alimento = NEM / EM dieta

Quantidade de alimento = 392 Kcal por dia / 0,96 kcal por mL

Quantidade de alimento = 408 mL por dia

Etapa III: Calcular a quantidade de cada ingrediente da dieta

Após calcular a quantidade a ser administrada em mL por dia da dieta deve-se calcular

a quantidade de cada ingrediente da mistura, como no exemplo a seguir:

21

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Exemplo (dieta para sonda 6 a 8 french):

Nutrilon: Do total calculado (408 mL), 1,1% será composta por Nutrilon:

408 mL da dieta ------------------100 % (total)

x gramas de nutrilon ----------------- 1,1% (% de nutrilon na fórmula)

x = 4,48 gramas de nutrilon por dia (aproximadamente 4,5g)

* realizar esse cálculo para todos os ingredientes

Fórmula final:

4,5 gramas de nutrilon;

4,5 gramas de dextrose;

62,4 gramas de extrato solúvel de soja;

46,5 mL de creme de leite;

283,5 mL de água;

3,26 gramas de Suplemento vitamínico-mineral;

2,0 mL de Ornitargim;

1,22 mL de KCl a 20%.

Etapa IV: Administração de água (cálculo para pacientes que não apresentam

retenção de líquido e podem receber água normalmente!)

Após calcular a quantidade de alimentos, verifica-se se existem necessidade de água

suplementar:

Necessidade Hídrica = 70 mL x peso corporal

Necessidade Hídrica = 70 mL x 10 kg = 700 mL por dia

Água suplementar = necessidade hídrica – volume de alimento

Água suplementar = 700 mL – 408 mL = 292 mL por dia

5.0 Modo de uso

5.1 Esta quantidade deve ser pesada e batida em liquidificador, permanecendo em geladeira até

o momento de uso.

5.2 Dividir o alimento em 6 refeições ao dia. Administrar o alimento em temperatura ambiente.

5.3 Injetar água potável para limpar a sonda de resíduos alimentares após seu uso.

5.4 Manter a sonda sempre bem fechada para evitar refluxo e entrada de ar no esôfago.

5.5 Monitorar a produção de fezes, vômito e hidratação.

22

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

8. Sondas esofágicas

A colocação de sonda por esofagostomia é de fácil realização e não apresenta

desconforto para o animal, podendo permanecer por meses quando necessário53.

Consiste em via bastante segura por proporcionar infusão e digestão eficiente do

alimento. Permite, também, que o animal beba e coma normalmente, mesmo com a

sonda. A simplicidade do manejo do tubo e administração do alimento permite a

cooperação dos proprietários, minimizando os custos de internação nas clínicas e

hospitais veterinários. Tem como inconvenientes a necessidade de anestesia geral, pois

trata-se de método invasivo com abertura da pele e esôfago do animal, na região medial

do pescoço, bem como relutância, ou não aceitação, por parte de alguns proprietários.

Sua vantagem em relação à sonda nasoesofágica/nasogástrica é seu maior

diâmetro, o que permite a administração de alimentos mais consistentes e em maior

quantidade54. As complicações associadas a esta técnica são infecção do campo

operatório, edema de face por pressão exercida pela bandagem, esofagite, aspiração

de alimento, obstrução das vias aéreas superiores, disfagia, vômito, com saída da sonda

através da cavidade oral e gastrite4,55. No entanto, nos 14 anos de sua utilização pelo

Serviço de Nutrição Clínica do HV da FCAV/Unesp Jaboticabal, nenhuma complicação

grave foi encontrada em mais de 600 pacientes alimentados. Apenas vômito ocasional

foi verificado, principalmente em gatos e infecção da ferida cirúrgica em alguns casos

nos quais os proprietários não realizaram a troca diária de curativo, 57. Como sugestão

de sondas, podem ser empregados para cães os tubos de PVC (Embramed) e Levine

(Medical´s) e para cães e gatos a sonda de Foley (Embramac). Esta última é mais

recomendável, pois tem demonstrado melhor aceitação, principalmente para gatos, com

menor ocorrência de vômito. Detalhes do procedimento cirúrgico para a colocação do

tubo podem ser encontrados em livros texto de cirurgia. E muito importante, no entanto,

23

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

se reconhecer que o tubo deve ser colocado no esôfago, e nunca da faringe! Tubos na

faringe levam a elevado desconforto pelo animal, dificultando a aceitação do

procedimento. Além disso, passam próximos a estruturas importantes, como glândulas

salivares, vasos e nervos, oferecendo muito maior risco ao animal. Ilustração do

procedimento de colocação de sonda por esofagostomia encontra-se na Figura 4.

Figura 4 - Ilustração da colocação da sonda pela técnica de esofagostomia – 7A.

Demarque a extensão da sonda que será introduzida dentro do esôfago (sétimo espaço

intercostal); 7B. Coloque o corpo do instrumento na cavidade oral, pressionando o

esôfago contra a musculatura mesocervical, formando uma saliência na pele cervical,

local onde se procederá a incisão; 7C. Com auxílio de uma lâmina de bisturi, faça incisão

na pele e tecidos até exteriorizar o instrumento através da incisão cutânea. Aumente o

orifício para permitir a passagem do tubo, após a fixação do mesmo ao instrumento; 7D.

Retraia o instrumento e puxe o tubo para o interior da cavidade oral; 7E. Redirecione o

tubo com o auxílio de um estilete para o interior do esôfago; 7F. Fixe o tubo na pele com

24

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

fio de sutura não absorvível 2-0 utilizando ponto dedo chinês ou bailarina; 7G. Coloque

uma bandagem na região para proteção dos pontos e da ferida.

Posicionado o tubo, é também recomendável realização de radiografia para

verificar localização. A sonda de Foley não é visualizada na radiografia, de modo que o

uso de contraste é necessário (Figura 5).

Figura 5 - Radiografia torácica lateral de paciente canino com sonda esofágica após

passagem de contraste.

A alimentação através da sonda esofágica pode se iniciar aproximadamente

duas horas após o término do procedimento cirúrgico e completa recuperação

anestésica do paciente. Normalmente se recomenda o fornecimento da necessidade

energética de manutenção do animal (cães = 95 x PC(kg)0,75; gatos = 100 x PC(kg)0,67

kcal por dia). Todos os pacientes devem passar por um processo inicial de adaptação,

principalmente quando anoréticos há vários dias, sob risco de desenvolverem síndrome

25

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

da realimentação ou distúrbios digestivos. É então conveniente se administrar no

primeiro dia 25% da quantidade total calculada de alimento, 50% no segundo dia, 75%

no terceiro e no quarto dia se infunde via sonda a quantidade total estipulada. Como

alimento pode-se utilizar ração comercial seca adequada ao paciente. Quando se tratar

de doente sem alterações fisiológicas específicas, recomenda-se alimento de alta

energia, conforme teores nutricionais sugeridos na Tabela 1. No entanto, o perfil

nutricional do alimento pode ser bastante variável, a depender de sua situação clínica e

necessidades individuais.

A ração deve ser umedecida em água potável, triturada em liquidificador, coada

em peneira e após administrada via sonda com o auxílio de seringa. A quantidade total

de alimento diário é dividida em 6 refeições, com o intervalo mínimo de duas horas entre

elas e duração de 10 a 15 minutos cada uma, sendo a dieta fornecida em bolus. Após

cada alimentação a sonda precisa ser higienizada com água. A capacidade gástrica de

cães e gatos pode ser estimada em até 50ml por kg de peso corporal em cada refeição,

sendo importante respeitar-se este limite para se evitar sobrecarga de alimentos e

vômito.

A ingestão hídrica pode ser estimada em 50 a 70 ml por kg de peso corpora por

dial, desde que o paciente não apresente retenção de água decorrente da afecção de

base. O alimento administrado, mas o volume hídrico utilizado para umedecer a dieta e

para a higienização da sonda devem ser considerados neste cálculo. Um exemplo do

procedimento de cálculo da quantidade de alimentos e água a ser infundida encontra-

se no Quadro 3.

26

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Quadro 3 - Exemplo de procedimento de cálculo da quantidade de ração e de água a

ser infundida via sonda esofágica de calibre superior a 12 French:

Cálculo e prescrição da dieta para cão adulto com 10kg de peso corporal.

EM da dieta = 4,2 kcal por grama (ração seca de alta energia)

Etapa I: Calcular a necessidade energética do animal

NEM = 95 x (peso em Kg) 0,75

NEM = 95 x (10) 0,75

NEM = 95 x 5,6 = 534,22 Kcal por dia

Etapa II: Calcular a quantidade de alimento a ser administrada por dia, em gramas

Quantidade de alimento = NEM / EM dieta

Quantidade de alimento = 534,22 Kcal por dia / 4,2 kcal por grama

Quantidade de alimento = 127,19 gramas por dia (130 gramas aproximadamente),

divididos em 06 refeições.

Etapa III: Calcular a quantidade de água a ser administrada via sonda

Necessidade hídrica= 70mL/kg de peso corporal (animal com hidratação normal, não

apresentando retenção de líquidos).

Necessidade hídrica= 70 x 10 = 700mL

Desse volume calculado (700mL), deverá ser descontado o volume de água utilizado

para umedecer a dieta seca antes de triturá-la, o volume adicionado no momento da trituração e

o volume utilizado para higienizar a sonda após cada refeição. A consistência do alimento deverá

ser semelhante à de mingau.

9. Sondas gástricas

São consideradas formas efetivas de suporte nutricional em cães e gatos, podendo

ser utilizadas por longos períodos (meses a anos)58. As funções do estômago de

mistura, digestão e estocagem permanecem íntegras, além do que o diâmetro das

sondas utilizadas permite a administração de alimentos mais consistentes e sob a forma

polimérica (não digerida). A boa aceitação do paciente e do proprietário, somado à

27

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

facilidade de reiniciar a alimentação oral ou espontânea, mesmo com a permanência do

tubo, representam vantagens para alimentação enteral pela técnica de gastrostomia59.

No entanto, este método apresenta como desvantagens a necessidade do uso de

anestesia geral e aparelho especializado para a colocação dos tubos61. Complicações

associadas incluem peritonite, quando o tubo é retirado pelo animal precocemente, sem

que haja ainda cicatrização e aderência do estômago à parede abdominal, vômito e

diarréia. Os pacientes candidatos a esta terapia são principalmente aqueles acometidos

por doenças orofaringeanas ou distúrbios esofágicos, mas podendo também ser

empregada em casos de lipidose hepática e outros quadros de anorexia resultantes de

distúrbios debilitantes. Porém, a gastrostomia fica contraindicada nas situações de

vômitos incoercíveis, desordens gastroentéricas, ascite, peritonite, pancreatite e em

pacientes que necessitam de suporte nutricional por um período inferior a cinco dias60.

Em função dos riscos muitos maiores do que os decorrentes da sonda esofágica, o uso

da sonda gástrica tem sido restrito a condições nas quais a esofagostomia é

contraindicada, como no megaesôfago. Mundialmente tem se verificado expressiva

redução desta técnica, substituída pela esofagostomia.

Outra desvantagem são as sondas utilizadas, como o cateter de Pezzer, que

nem sempre são facilmente localizados, pois o procedimento exige o emprego das

sondas especiais apropriadas ao procedimento, como as que apresentam um cogumelo

na ponta (ilustrado no detalhe 8I da Figura 6). As dietas, os cálculos e os cuidados no

emprego da sonda gástrica são os mesmos descritos para o uso de sonda esofágica. A

demonstração da técnica de colocação da sonda que emprega aplicador está ilustrada

na figura 6 e 6’.

28

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Figura 6 e 6’ - Ilustração da técnica de colocação de sonda de gastrostomia com uso

de aplicador – 8A. Vista esquemática demonstrando como o aplicador se posiciona

29

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

dentro do estômago do animal. Este deve empurrar o estômago contra a parede

abdominal e produzir uma saliência para que se possa introduzir o trocater; 8B. Com o

auxílio do trocater perfure a pele e musculatura até posicionar a extremidade distal do

trocater dentro da extremidade distal do aplicador; 8C. Introduza a guia pelo trocater até

o interior do aplicador; 8D. Visualize a guia sendo introduzido pelo trocater e em um

segundo momento esta já está posicionada dentro do aplicador; 8E. Retire o aplicador,

permanecendo apenas a guia dentro do animal; 8F. Fixe o tubo gástrico na extremidade

distal da guia; 8G. e 8H. Depois de fixado a guia, o tubo será arrastado da cavidade oral

para dentro do estômago; 8I. Localização da extremidade distal do tubo dentro do

estômago.

10. Sondas Intestinais

Os tubos intestinais são colocados em segmentos que ultrapassam o trato

gastrintestinal superior (estômago, duodeno proximal e pâncreas). Estes estão

indicados principalmente nas situações em que o estômago não se apresenta em

condições de uso. As indicações específicas da utilização das sondas alimentares por

enterostomia incluem pancreatite, cirurgia pancreática, cirurgia hepatobiliar, obstrução

gastrintestinal proximal, neoplasia, cirurgia gastrintestinal extensa e naqueles casos em

que existe risco de aspiração, coma, decúbito prolongado e distúrbios de motilidade

esofágica, pois a enterostomia implica em menor risco de refluxo gastroesofágico, se

comparada com as técnicas anteriores. A enterostomia está contraindicada quando

houver obstrução do segmento intestinal posterior ao local de colocação do tubo e

peritonite.

A alimentação pode ser iniciada 24 horas após o processo cirúrgico. O pequeno

calibre dos tubos utilizados exige a administração de dietas líquidas. O fato de

ultrapassar o estômago e infundir alimento diretamente no intestino faz com que seja

recomendado o emprego de dietas monoméricas (pré-digeridas). Como tentativa pode-

se usar as mesmas dietas recomendadas para sondas nasoesofágicas, mas podem

30

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

ocorrer diarréia, flatulência e desconforto abdominal pois o alimento não sofrerá a

digestão promovida pelo ácido clorídrico e proteases e lipases gástricas. Neste tipo de

suporte o alimento deve ser administrado por infusão contínua através de um equipo de

administração, pois o intestino não apresenta condições de receber grandes volumes

de alimento rapidamente. O cálculo da necessidade energética também deve ser o

mesmo utilizado para a sonda nasoesofágica. Está técnica implica na necessidade de

hospitalização, freqüente monitoração e o uso de bomba de infusão. O uso destes tubos

pode ser indicado para períodos longos (semanas a meses) e o período mínimo

recomendado é de 5 a 7 dias, para permitir a formação de aderência no local da

enteropexia.

As complicações mais comuns são a diarréia, vômitos e desconforto abdominal

relacionados com a doença primária, método de alimentação ou dieta empregada61,62.

A peritonite é a complicação mais séria da enterostomia e pode resultar do

extravasamento de alimento no local da cirurgia devido a deslocamento ou retirada

prematura da sonda. O extravasamento também pode resultar em celulite local ou

infecção em torno do local da enterostomia. Os cateteres rígidos de polivinil apresentam

maior incidência de dobradura e perfuração intestinal 63.

11. Considerações finais

O suporte nutricional enteral demonstra-se prática importante e efetiva para

auxilio no tratamento de pacientes em estado crítico. Existem diferentes técnicas de se

administrar este tipo de suporte, o que facilita seu uso pelos clínicos e aumenta as

chances de se instituir uma abordagem nutricional adequada. O uso da nutrição enteral,

além de fornecer nutrientes essenciais à manutenção da imunidade, capacidade

cicatricial e metabolismo de drogas, promove modulação da resposta inflamatória de

fase aguda, manutenção da função gastrintestinal e favorece o estabelecimento

31

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

adequado do metabolismo do animal durante os estágios críticos de diferentes tipos de

injúria.

12. Referências

1. CHAN, D. L. Nutritional support for the critically ill patient. In: BATAGLIA, A. M. Small Animal

Emergency and Critical Care for Veterinary Technicians. 2. ed. St. Louis: Saunders Elsevier,

2007. p. 85-108.

2. TORRANCE, A. G. Intensive care – Nutritional support. In: KELLY, N. C.; WILLS, J. Manual

of Companion Animal Nutrition & Feeding. Iowa: BSAVA, 1996. p. 171-180.

3. CHAN, D. L. Nutritional requirements of the critically ill patients. Clinical Techniques in Small

Animal Practice, v. 19, n, 1, p. 1-5, 2004.

4. REMILLARD, R. L.; ARMSTRONG, P. J.; DAVENPORT, D. J. Assisted feeding in

hospitalization patients: Enteral and parenteral nutrition. In: HAND, M. S.; THATCHER, C. D.;

REMILLARD, R. L.; ROUDEBUSH, P. Small Animal Clinical Nutrition. 4. ed. Topeka: Mark

Morris Institute, 2000. p. 351-400.

5. BRUNETTO, M. A. Avaliação de suporte nutricional sobre a alta hospitalar em cães e

gatos. 2006, 86 p. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária). Faculdade de Ciências

Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista, Jaboticabal, 2006.

6. BRUNETTO, M. A.; CARCIOFI, A. C.; GOMES, M. O. S.; ANDRÉ, M. R.; TESHIMA, E.;

VENTURELLI, K. N. Effects of the nutritional support in hospitalized dogs and cats. Journal of

Veterinary Emergency and Critical Care, v.20, n.2, p.224-231, 2010.

7. COLS, E. M. Antioxidant in criticall illness. Archives of Surgery, Chicago, v. 136, p. 1201-

1211, 2001.

8. MATAIX, J. Nutrición y estrés oxidativo. In:______. Nutrición y Alimentación Humana.

Barcelona: Ergón, 2002, p.1047-1064.

9. MARINO, P. El libro de la UCI. In: ________. El Libro de la UCI. Barcelona: Masson, 2002,

p. 33-51.

32

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

10. BAINES, M.; SHENKIN, A. Lack of effective ness of short-term intravenosus micronutrient

nutrition in restoring plasma antioxidant status after surgery. Clinical Nutrition, v. 21, n. 2, p.

145-150, 2002.

11. CARCIOFI, A. C.; FRAGA, V. O.; BRUNETTO, M. A. Ingestão calórica e alta hospitalar em

cães e gatos. Revista de Educação Continuada do CRMV-SP, São Paulo, v. 6, n.1/3, p. 16-

27, 2003.

12. CHAN, D. L.; FREEMAN, L. M. Nutrition in critical illness. Veterinary Clinics of North

America, v. 36, n. 6, p. 1225-1241, 2006.

13. ARMSTRONG, P. J.; LIPPERT, A. C. Selected aspects of enteral and parenteral nutritional

support. Seminars in Veterinary Medicine and Surgery, v. 3, n. 3, p. 216-226, 1988.

14. DELANEY, S. J.; FASCETTI, A. J. ELLIOT, D. A. Critical care nutrition of dogs. In: PIBOT, P.;

BIOURGE, V.; ELLIOT, D. eds. Encyclopedia of Canine Clinical Nutrition, Paris: Aniwa SAS;

2006, pp. 426-447.

15. DETSKY, A. S.; MCLAUGHILIN, J. R.; BAKER, J. P.; JOHNSTON, N.; WHITTAKER, S.;

MENDELSON, R. A.; JEEJEEBHOY, K. N. What is subjective global assessment of nutritional

status? Journal of Parenteral and Enteral Nutrition, v. 11, n. 1, p. 8-13, 1987.

16. LAFLAMME, D. P. Development and validation of a body condition score system for cats: a

clinical tool. Feline Practice, v. 25, n. 5-6, p.13-17, 1997.

17. LAFLAMME, D. P.; KUHLMAN, G.; LAWLER, D. F. Evaluation of weight loss protocols for

dogs. Journal of the American Animal Hospital Association, v. 33, n. 3, p. 253-259, 1997.

18. MICHEL, E. Nutritional assessment. In: ETTINGER, S. J.; FELDMAN, E. C. Textbook of

Veterinary Internal Medicine. 6 ed. Philadelphia: Elsevier, 2005. p. 554-555.

19. DE PAULA, I. D. Métodos laboratoriais auxiliares na avaliação da condição nutricional. I

SIMPÓSIO DE NUTRIÇÃO CLÍNICA EM CÃES E GATOS, São Paulo, Anais...CD ROM, 2005.

20. KANEKO, J. J.; HARVEY, J. W.; BRUSS, M. L. In: ______Clinical Biochemistry of

domestic animals. 5 ed. San Diego: Academic Press, 1997, p. 127.

33

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

21. FASCETTI, A. J.; MAULDIN, G. E.; MAULDIN, G. N. Correlation between serum creatine

kinase activities and anorexia in cats. Journal of Veterinary Internal Medicine, v. 11, n. 1, p. 9-

13, 1997.

22. HILL, R. C.; SCOTT, K. R. Energy requirements and body surface area of cats and dogs.

Journal of American Veterinary Medical Association, v. 225, n. 5, p. 241-246, 2004.

23. WOLFE, R. R.; DURKOT, M. J.; WOLFE, M. H. Effect of thermal injury on energy metabolism,

substrate kinetics and hormonal concentrations. Circulatory Shock, v. 9, n. 4, p. 383-394, 1982.

24. DONOGHUE, S. Nutritional support of hospitalised patients. In: KALFELZ, F. A. Veterinary

Clinics of North America: Small Animal Practice, v. 19, n. 3, p. 475-495, 1989.

25. CROWE, D. T. Nutritional support for the hospitalized patient: An introduction to tube feeding.

Compendium of Continuing Education for the Practicing Veterinarian, v. 12, n. 12, p. 1711-

1720, 1990.

26. WALTON, R. S.; WINGFIELD, W. E.; OGILVIE, G. K.; FETTMAN, M. J.; MATTESON, V. L.

Energy Expenditure in 104 postoperative and traumatically injured dogs with indirect calorimetry.

Journal of Veterinary Emergency and Critical Care, v. 6, n. 2, p. 71-79, 1996.

27. KRISHNAN, J. A.; PARCE, P. B.; MARTINEZ, A. Caloric intake in medical ICU patients:

consistency of care with guidelines and relationship to clinical outcomes. Nutrition in Clinical

Practice, v. 19, n. 6, p. 645-646, 2004.

28. O´TOOLE, E.; MILLER, C. W.; WILSON, B.; MATHEWS, K. A.; DAVIS, C.; SEARS, W.

Comparison of the standard predictive equation for calculation of resting energy expenditure with

indirect calorimetry in hospitalized and healthy dogs. Journal of American Veterinary Medical

Association, v. 255, n. 1, p. 58-64, 2004.

29. BIFFL, W. L.; MOORE, E. E.; HAENEL, J. B. Nutritional support for the trauma patient.

Nutrition, v. 18, n. 11-12, p. 960-965, 2002.

30. FERRABOLI, R.; MALHEIRO, P. S.; ABDULKADER, R. C.; YU, L.; SABBAGA, E.;

BURDMANN, E. A. Anuric acute renal failure caused by dextran 40 administration. Renal Failure,

v. 19, n. 303, 1997.

31. CHAN, D. L.; FREEMAN, L. M. Nutrition in critical illness. Veterinary Clinics of North

America, v. 36, n. 6, p. 1225-1241, 2006.

34

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

32. CHAN, D. L.; ROZANSKI, E. A.; FREEMAN, L. M.; RUSH, J. E. Retrospective evaluation of

human albumin use in critically ill dogs. Journal of Veterinary Emergency and Critical Care, v.

14, n. 1, p. 1-17, 2004.

33. GUYTON, A. C.; GRANGER, H. J.; TAYLOR, A. E. Intersticial fluid pressure, Physiology

Review, v. 51, p. 527, 1971.

34. BRUNETTO, M. A. Anorexia e doença: benefícios com o emprego de dietas de alta energia.

VI SIMPÓSIO SOBRE NUTRIÇÃO DE ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO, Campinas - SP, Anais... p.

35-44. 2007.

35. NATIONAL RESEARCH COUNCIL. Nutrient requirements of dogs and cats. Washington:

National Academy Press, 2006.

36. SHENKIN, A. Micronutrients. In: ROMBEAU, J.; ROLANDELLI, R. Clinical Nutrition: Enteral

and Tube Feeding. Philadelphia: Saunders, 1997. p. 96-111.

37. DONOGHUE, S.; KRONFELD, D. S. Feeding hospitalised dogs and cats In: WILLS, J. M.;

SIMPSON, K. W. The Waltham Book of Clinical Nutrition of Dog & Cat. New York: Pergamon,

1994. p. 25-37.

38. DAVENPORT, D. Suporte nutricional enteral e parenteral. In: ETTINGER, S. J.; FELDMAN,

E. C. Tratado de Medicina Interna Veterinária. 4 ed. Philadelphia: W.B. Saunders, 1995. p.

347-357.

39. DEVEY, J. J.; CROWE, D. T.; KIRBY, R. Postsurgical nutritional support. Journal of

American Veterinary Medical Association, v. 206, n. 11, p. 1673-1675, 1995.

40. JOLLIET, P.; PICHARD, G.; BIOLO, R.; CHIOLERO, R.; GRIMBLE, G.; LEVERVE, X.;

NITENBERG, G.; NOVAK, I.; PLANAS, M.; PREISER, J. C.; ROTH, E. A.; SCHOLS, A. M.;

WERNERMAN, J. Enteral nutrition in intensive care patients: a practical approach. Intensive

Care Medicine, v. 28, n. 8, p. 848-859, 1998.

41. MACINTIRE, D. K. Bacterial translocation: clinical implications and prevention. In: Bonagura,

J. D. KIRKS CURRENT VETERINARY THERAPY - Small Animal Practice. 13 ed. Philadelphia:

W. B. Saunders Company, 2000, p. 201-203.

42. ROEDIGER, W. E. The starved colon-diminished mucosal nutrition, diminished absorption,

and colitis. Diseases of the Colon & Rectum, v. 33, n. 10, p. 858-870, 1990.

35

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

43. PÉREZ, C. S. Tratado de Nutrición Artificial. Grupo Aula Médica, S. A., Madrid, 1998, p.

57-59.

44. RIBEIRO, P. C. Terapia nutricional na sepse. Revista Brasileira de Terapia Intensiva, v.

16, n. 3, p. 175-178, 2004.

45. SIMPSON, K. W.; BIRNBAUM, N. Fluid and electrolyte disturbances in gastrointestinal and

pancreatic diseases. In: DIBARTOLA, S. P. Fluid, Electrolyte, and Acid-Base Disorders In

Small Animal Practice. St. Louis: Saunders Elsevier, 2006. p. 420-436.

46. WINDSOR, A. C. J.; KANWAR, S.; LI, A.; BARNES, E.; GUTHRIE, J.; SPARK, J.; WELSH,

F.; GUILLOU, P.; REYNOLDS, J. Compared with parenteral nutrition, enteral feeding attenuates

the acute phase response and improves disease severity in acute pancreatitis. Gut, v. 42, n. 1,

p. 431-435, 1998.

47. BARR, J.; HECHT, M.; KARA, E.; FLAVIN, E. K.; KHORANA, A.; GOULD, M. K. Outcomes

in critically ill patients before and after the implementation of an evidence-based nutritional

management protocol. Clinical Investigations in Critical Care, v. 125, n. 4, p. 1446-1457, 2004.

48. LI, J.; KUDSK, K. A.; GOCYNSKY, B.; DENT, D.; GLIZER, J.; LANGKAMP-HENKEN, B.;

LIVINGSTON, D. H. MOORE, F. A. Effects of parenteral and enteral nutrition on gut-associated

lymphoide tissue. Journal of Trauma, v. 39, n. 1, p. 44-52, 1995.

49. BEALE, R. J.; BRYG, D. J.; BIHARI, D. J. Immunonutrition in the critically ill: a systematic

review of clinical outcome. Critical Care Medicine, v. 27, n. 12, p. 2799-2805, 1999.

50. ABOOD, S. K.; BUFFINGTON, C. A. Improved nasogastric intubation technique for

administration of nutritional support in dogs. Journal of the American Veterinary Medical

Association, v. 199, n. 5, p. 577-579, 1991.

51. ABOOD, S. K.; BUFFINGTON, C. A. Enteral feeding of dogs and cats: 51 cases (1989-1991).

Journal of the American Veterinary Medical Association, v. 201, n. 4, p. 619-622, 1992.

52. DONOGHUE, S.; KRONFELD, D. S. Feeding hospitalized dogs and cats In: WILLS, J. M.;

SIMPSON, K. W. The Waltham Book of Clinical Nutrition of Dog & Cat. New York: Pergamon,

1994. p. 25-37.

36

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

53. BATTAGLIA, A. M. Nutrition for the critically ill hospitalized patient. In:______. Small Animal

Emergency and Critical Care: A manual for the Veterinary Technician. New York: W. B.

Saunders, 2001. p. 72-93.

54. DONOGHUE, S. Nutritional Support of Hospitalised Dogs and Cats. Australian Veterinary

Journal, v. 71, n. 10, p. 332-336, 1994.

55. LEVINE, P. B.; SMALLWOOD, L. J.; BUBACK, J. L. Esophagostomy Tubes as a Method of

Nutritional Management in Cats: A Retrospective Study. Journal of the American Animal

Hospital Association, v. 33, n. 3, p. 405-410, 1997.

56. BRUNETTO, M. A.; CARCIOFI, A. C.; DALECK, C. R.; NARDI, A. B.; GOMES, M. O. S.;

SILVA, M.; CALAZANS, S.; MISTIERI, M. L. A. Suporte nutricional enteral com o uso de sonda

esofágica em cães submetidos à hemimandibulectomia. Relato de seis casos. Revista

Universidade Rural, v. 25. p. 264-265, 2005.

57. BRUNETTO, M. A.; CARCIOFI, A. C.; ABI RACHED, P.; BARBOSA, V. T.; GOSSUEN, L. G.;

THIESEN, R. Uso de sonda esofágica como método de suporte nutricional em cães e gatos

hospitalizados. XXVI CONGRESSO BRASILEIRO DA ANCLIVEPA, Salvador, Anais...2005, CD

Rom. 2005.

58. SIMPSON, K. W.; ELWOOD, C. M. Techniques for Enteral Nutrition Suport. In: WILLS, J. M.;

SIMPSON, K. W. The Waltham Book of Clinical Nutrition of Dog & Cat. Oxford: Pergamon,

1994. p. 63-74.

59. SEIM III, H. B.; BARTGES, J. W. Enteral and Parenteral Nutrition. In: TAMS, T. T. Handbook

of Small Animal Gastroenterology. Missouri: Saunders, 2003. p. 416-462.

60. HAN, E. Esophageal and Gastric Feeding Tubes in ICU Patients. Clinical Techniques in

Small Animal Practice, v. 19, n. 1, p. 22 - 31, 2004.

61. CROWE, D. T. Enteral nutrition for critically ill or injured patients. Part II. Compendium on

Continuing Education for the Practicing Veterinarian, v. 8, p. 719, 1986.

62. SWANN, H. M.; SWEET, D. C.; MICHEL, K. Complications associated with use of jejunostomy

tubes in dogs and cats: 40 cases (1989-1994). Journal of the American Veterinary Medical

Association, v. 210, n. 12, p. 1764, 1997.

37

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

63. ORTON, E. C. Enteral hiperalimentation administered via needle catheter-jejunostomy as an

adjunct to cranial abdominal surgery in dogs and cats. Journal of American Veterinary Medical

Association, v. 188, p. 1406, 1986.

38

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

II. SUPORTE NUTRICIONAL PARENTERAL NO PACIENTE CRÍTICO

1. Resumo

A nutrição por via parenteral consiste na administração de todas ou parte das

necessidades nutricionais diárias através da via intravenosa. Tem como objetivo reduzir

o catabolismo tecidual, evitando o desenvolvimento da subnutrição em pacientes que

não podem receber toda sua necessidade nutricional pela via enteral. Esta é modalidade

terapêutica em crescente evolução e que cada vez mais ocupa papel importante no

manejo de pacientes veterinários críticos. Apesar de ser suporte nutriconal com

aplicações crescentes, trata-se de recurso terapêutico caro, necessita de adequado

monitoramento, demanda tempo e cuidado por parte do corpo clínico e possui

indicações clínicas limitadas.

Palavras-chave: nutrição parenteral, cão, gato.

2. Introdução

Prevenir ou reverter a má nutrição em qualquer animal deve ser objetivo dos

médicos-veterinários1,2, já que a má nutrição é considerada fator de risco para o

aumento da morbidade e mortalidade3–5. Os principais efeitos da má nutrição,

principalmente nos animais enfermos, são alterações no metabolismo de drogas;

redução da imunocompetência e da capacidade de síntese e reparo tecidual4, menor

tônus muscular e piorprognóstico6. Estudos mostram que pacientes que recebem maior

parte de sua necessidade energética diária, precocemente, apresentam melhores taxas

de alta hospitalar que os mantidos sob baixa condição nutricional1,7–10.

Quando as necessidades nutricionais e energéticas do animal não estão sendo

atingidas voluntariamente é necessário um suporte nutricional, adequado através da

nutrição enteral ou parenteral11. A nutriçãoenteral se refere ao fornecimento de

nutrientes através do trato gastrointestinal, enquanto a nutrição parenteral (NP) não

39

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

envolve o trato gastrointestinal, sendo fornecida principalmente por via intravenosa1,

através de vasos centrais ou periféricos.

O suprimento de toda a necessidade nutricional diária do paciente, incluindo

calorias, aminoácidos, lípides, vitaminas e minerais é denominada Nutrição Parenteral

Total (NPT). Já a administração de apenas parte dessas necessidades é denominada

de Nutrição Parenteral Parcial (NPP)5,11,12. Normalmente, na NPP são administrados os

eletrólitos e vitaminas hidrossolúveis e parte das necessidades energéticas e de

aminoácidos do paciente, empregando-se solução com menor osmolalidade que na

NPT5,11,13. Na experiência do Serviço de Nutrição Clínica de Cães e Gatos do Hospital

Veterinário da UNESP-Jaboticabal, a NPP é recurso mais simples, prático, barato e

seguro para uso em cateter periférico que a NPT, com bons resultados clínicos.

São objetivos deste suporte alimentar fornecer nutrientes e energia14, prevenir e

tratar deficiências nutricionais11,14, preservar a massa corporal magra11,12,14, dar

condições para que os órgãos mantenham sua capacidade funcional e complementar a

ingestão enteral, principalmente em momentos iminentes de aumento das necessidades

nutricionais do paciente11.

Os candidatos ao recebimento da NP são aqueles que apresentam

comprometimento do trato gastrointestinal significativo, a ponto de se contraindicar o

uso da via enteral. São pacientes com indicações especificas para o uso da NP:

obstrução gastrintestinal, hipomotilidade gastrintestinal, período pós-operatório de

determinados procedimentos cirúrgicos do trato gastrintestinal,vômitos incoercíveis (não

controlados com medicamentos), pacientes anestesiados,em coma, inconscientes ou

com déficits neurológicos com reflexo de deglutição diminuído, má assimilação grave ou

insuficiente para suprir a totalidade da necessidade nutricional dopaciente5,11,15,16,14,17,13.

Esta via pode ser empregada, também, como forma de suplementação da rota enteral,

em ocasiões nas quais a colocação de tubos enterais não seja possível e outras

circunstâncias individuais. Animais com quilotórax também são candidatos a

40

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

administração de NP, já que os lipídios infundidos não se relacionam com o sistema

linfático ou ducto torácico5.

Antes de se proceder à nutrição parenteral, é importante que o paciente esteja

hidratado e com seu equilíbrio ácido-básico estabelecido. Pacientes com alterações

hidroeletrolíticas e ácido-básicas devem primeiro ser estabilizados, sob pena de

desenvolverem transtornos metabólicos graves durante o procedimento.Vale deixar

claro que a nutrição por via enteral, sempre que possível, deve ser privilegiada.

3. Fornecendo energia

O consenso atual entre autores é que o melhor método para se estimar a

necessidade energética der cães e gatos em estado crítico é pela formula recomendada

pelo NRC (2006)18 para cálculo da necessidade energética em repouso (NER)6,11,13,19,20,

na qual NER = 70 * PC0,75, (PC = peso corporal). Reforça-se que esta deve ser

empregada sem o uso de nenhum fator de correção de acordo com a doença!

Estimada a NER, decide-se qual método de nutrição parenteral será utilizado no

paciente: NPT ou NPP. Nas soluções para NPT, recomenda-se que a NER seja

distribuída entre lipídios, carboidratos e aminoácidos a fim de se evitar a

hiperalimentação19. Os autores possuem maior experiência e confiança na utilização da

NPP e, por isso, na grande maioria das vezes optam por não considerar a energia

oriunda dos aminoácidos na distribuição energética, já que não será a totalidade da NER

infundida. Assim, as soluções fornecedoras de energia serão as de glicose e de lipídios.

4. Glicose

Há soluções de glicose com concentração de 5% a 75%.Soluções a 50%

fornecem aproximadamente 1,7 kcal/mL e são as utilizadas na maioria das formulações

41

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

para nutrição parenteral devido a elevada concentração e fácil aquisição. Apesar de ser

importante fonte de energia, a administração isolada de glicose é nociva pois, em grande

quantidade, pode gerar aumento na secreção de insulina, que por sua vez diminui a

utilização da gordura como fonte energética, aumentando o uso de aminoácidos para

obtenção de energia6. Outro ponto importante é que muitos animais enfermos podem

apresentarquadro de resistência a insulina, com menor aproveitamento desta fonte

energética e possível ocorrência de hiperglicemia, glicosúria, poliúria, desidratação e

acidose.

Estudo recente utilizou apenas a glicose como principal fonte de energia e

concluiu que, devido as altas taxas de complicações, esse tipo de solução deve ser

utilizada com restrições e muita cautela21. Para evitar complicações, além da proporção

de energia via glicose, é importante controlar sua taxa de infusão que não deve

ultrapassar 4 mg/kg de peso corporal/minuto6,22,13,20,23. Devido a isto recomenda-se

inclusão de glicose nas formulaçõesde modo a esta corresponder entre 20% e 60% da

energia metabolizável das soluções para nutrição parenteral.

5. Lipídios

Emulsões lipídicas são utilizadas em nutrição parenteral como fonte energética

e de ácidos graxos essenciais. Em geral, são compostas por triglicérides contendo

ácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa e saturados de cadeia média. Seus

principais ingredientes incluem óleo de soja ou de açafrão, óleo de peixe, glicerina,

ácidos graxos essenciais e gema de ovo como emulsificante fosfolipídico. Há no

mercado emulsões comerciais em concentrações de 10 a 20% de lipídios. Estas são

hiposmolares (aproximadamente 270 mOsm/L), o que as torna úteis para administração

periférica. Outra vantagem das soluções lipídicas é apresentar alta densidade

energética, aproximadamente 2 kcal por mL em solução a 20%. Os lipídios são também

42

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

mais efetivos em favorecer o estabelecimento de balanço calórico positivo do que o

emprego isolado de glicose como fonte de calorias não protéicas29. O fornecimento de

lípides é fundamental, também, para reduzir as calorias vidas da glicose. Como

carnívoros, cães e gatos quando doentes não utilizam com facilidade glicose e o

fornecimento de lipídeos torna possível a infusão de calorias com redução deste

carboidrato.

Alguns autores sugerem não ultrapassar, em cães e gatos, 2 gramas de lipídios

por quilograma de peso corporal por dia. Em situações de hipertrigliceridemia torna-se

necessária redução maior nas doses desses compostos, ou mesmo evitar seu uso.

Cães acometidos por pancreatite sem cursar com hipertrigliceredemia não necessitam

de redução na quantidade de lipídeos fornecidos11. A proporção recomendada de

energia provinda de soluções lipídicas varia de 30 a 80% das calorias da formulação20.

Autores relatam sucesso clínico, tanto com cães como gatos, ao fornecer de 80 a 100%

da NER5 dos pacientes como lipídeos.

6. Aminoácidos

Todo paciente deve receber fonte de aminoácidos, que inclua tanto os

aminoácidos essenciais como não essenciais. Sem dúvida esta é a principal solução e

talvez a que mais traga benefícios aos pacientes. Como não existem no mercado

soluções de aminoácidos para cães e gatos, emprega-se soluções para o ser humano.

Devido às diferenças nas necessidades nutricionais, torna-se imperativo estudar a

composição de aminoácidos do produto e empregar apenas os que tenham composição

compatível com o desejado. Arginina é um aminoácido crítico, pois é essencial para

cães e gatos e não é necessária ao homem. Taurina é outro exemplo, necessária ao

gato mas não ao homem e aos cães. Como sugestão, pode-se empregar soluções

aminoacídicas pediátricas, pois estas costumam ter estes dois aminoácidos em

43

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

concentrações adequadas. Há disponíveis soluções de 3,5 a 15% de aminoácidos, com

osmolalidade chegando a 1505 mOsm/litro. Existem também soluções que contêm

glicose e eletrólitos. Na experiência dos autores, optar por produtos compostos

unicamente por aminoácidos facilita a formulação completa da nutrição parenteral.

Em geral se recomenda para cães aproximadamente 4 gramas de aminoácidos

para cada 100 kcal de NER e por volta de 5 g/100 kcal para gatos. Esses valores devem

ser diminuídos em animais doentes renais e/ou com encefalopatia hepática e

aumentados para aqueles com necessidades elevadas ou perdas concomitantes

importantes, como nos casos de enteropatia com perda de proteína ou peritonite5,6,20.

Cuidados devem ser tomados com o fornecimento excessivo de proteína, pois

esta requer energia extra para ser eliminada do organismo, e o excesso de nitrogênio

pode ou não ser adequadamente metabolizado pelo fígado ou rins5.

7. Vitaminas e minerais

Compostos multivitamínicos, com macro e microelementos também devem ser

incorporados à nutrição parenteral. As vitaminas, especialmente as hidrossolúveis, são

rapidamente perdidas durante a anorexia e o estado catabólico, pois o organismo do

animal não apresenta estoque eficiente destes nutrientes. Elas participam como

cofatores de várias etapas do processo de utilização da energia, de forma que a

suplementação de calorias acelera seu consumo e perda. A deficiência de vitaminas do

complexo B, em especial de tiamina e riboflavina, e de alguns eletrólitos como potássio

e fósforo, é um dos fatores responsáveis pela ocorrência da síndrome da realimentação,

um distúrbio metabólico potencialmente fatal que se desenvolve no paciente anoréxico

quando realimentado19. Como várias vitaminas do complexo B são destruídas pela luz,

é recomendável proteger o recipiente que contém a solução parenteral com papel

alumínio ou outro material que impeça a incidência de luz. Uma dose de 1ml de solução

44

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

de complexo B para uso parenteral para cada 100 kcal de energia metabolizável

administrada é geralmente o suficiente para atender as necessidades de tiamina e

riboflavina13.

Em relação a vitamina K, há a recomendação da sua administração pela via

subcutânea, de acordo com a necessidade12 na dose de 0,5 mg/kg de peso corporal

uma vez por semana13. Quanto as outras vitaminas lipossolúveis, sua administração

deveria ser considerada naqueles animais com má nutrição prolongada que apresentem

perda de peso grave com pouco ou nenhum estoque de gordura, já que raramente há

necessidade dessa suplementação devido a baixa taxa de turnover e ao fato de a

maioria dos pacientes apresentarem estoques hepáticos e lipídicos suficientes para

manter suas necessidades metabólicas por semanas a meses, enquanto a suporte

parenteral raramente excede 5 a 7 dias em medicina veterinária5,20,12. Vitaminas A e E

podem ser suplementadas, quando necessário via subcutânea em uma dose única de

5.000UI e 40UI por quilograma de peso corporal, respectivamente.

8. Eletrólitos

Como será explicado adiante, no Serviço de Nutrição Clínica de Cães e Gatos

da FCAV/Unesp a nutrição parenteral é diluída na solução de manutenção hídrica,

permitindo assim sua infusão em vasos periféricos. É necessário, assim, que esta

contenha os eletrólitos. Desta forma, a solução final deverá ter 60mEq/L de sódio e

60mEq/L de cloro. Fatores envolvidos na síndrome da realimentação são o fósforo, o

magnésio e o potássio. Estes são perdidos durante a destruição tecidual secundária à

inanição e podem ter sua concentração plasmática diminuída por captação celular

posteriormente à infusão de calorias, estimulada pela insulina secretada após a infusão

da solução parenteral. As soluções de nutrição parenteral,idealmente devem apresentar

concentração de potássio de acordo com a calemia e necessidade hídrica do paciente,

45

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

conforme Tabela 2. Este pode ser acrescentado como cloreto de ou fosfato de potássio.

Não podem ser administrados, no entanto, nos animais com hipercalemia20.

Tabela 2 - Recomendação de suplementação de potássio para cães e gatos24

Calemia

(mEq de K+/L)

Reposição

(mEq de K+/L)

Velocidade máxima de infusão

da solução (ml/kg/h)*

3,51 a 5,0 20 25

3,01 a 3,5 28 18

2,51 a 3,0 40 12

2,0 a 2,5 60 8

Menor que 2,0 80 6

Desconhecida 20 25

*Máximo 0,5 mEq de K+/kg/hora

Em relação ao fósforo,como não há recomendação especifica para fornecimento

deste nutriente na NP de cães e gatos, este é considerado como proveniente dos

fosfolipídios da emulsão lipídica e do fosfato de potássio utilizado como fonte de

potássio20. O tratamento parenteral profilático da hipofosfatemia pode ser

razoavelmente obtido mediante a adição de um quarto a metade do teor de potássio

suplementar na forma de fosfato de potássio e o restante como cloreto de

potássio26.Outro nutriente importante é o magnésio. A dosagem intravenosa

recomendada, em infusão lenta é de 0,3 a 0,5 mEq/kg/dia, tendo o sulfato ou o cloreto

de magnésio como as fontes mais utilizadas27.

Aos pacientes mal nutridos que precisam de nutrição parenteral por prolongado

período de tempo (10 a 14 dias), pode se fazer necessária a inclusão de outros

elementos como o zinco, cobre, manganês e cromo5,12,20. Existem soluções comerciais

prontas que contêm estes nutrientes, porém de alto custo e de difícil acesso na medicina

veterinária.

46

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

9. Cálculo do volume das soluções

Como escrito de início, tudo se inicia com a determinação da NER do paciente.

Na sequência deve-se estabelecer a proporção de energia distribuída entre glicose e

lipídio, e a necessidade de aminoácidos do paciente. O volume das soluções virá como

consequência destes cálculos e das concentrações dos produtos empregados. O

volume adequado a ser infundido, no entanto, depende da necessidade hídrica do

animal,e deve ser considerado com cuidado. Duas abordagens distintas existem neste

ponto: fornecer a nutrição parenteral isolada, em uma via de acesso central exclusiva;

diluir os nutrientes a serem infundidos na necessidade hídrica do paciente, reduzindo

assim a osmolalidade da solução. A maior parte das instituições internacionais utiliza a

primeira abordagem, suas vantagens são o baixo volume, melhor chance de

fornecimento da totalidade dos nutrientes ao paciente e menor riscos de complicações

mecânicas, suas desvantagens são e elevada osmolalidade (>1200mOsm/L) que requer

infusão em vaso central, elevação dos custos e dificuldade relativa à colocação do

cateter central e maior risco de flebite. Devido a isto, os autores sugerem a diluição dos

nutrientes na necessidade hídrica do animal, diluindo a osmolalidade da solução

(idealmente < 750 mOsm/L) e seu uso em vaso periférico. Este protocolo foi

desenvolvido pelo Serviço de Nutrição Clínica da FCAV/Unesp, e vem sendo

empregado já há mais de 15 anos.

Nesta abordagem, a diluição dos nutrientes na necessidade hídrica do paciente,

cada solução deve ser considerada como uma fonte de água, e somada no

procedimento de cálculo.A solução final para nutrição parenteral pode ou não conter a

totalidade da necessidade de água do paciente, devendo isto ser corrigido, se

necessário. A grande vantagem de se fornecer a necessidade hídrica na nutrição

parenteral inclui maior diluição dos nutrientes e redução da osmolalidade da solução.

Com isto reduz-se os riscos de complicações relacionadas à infusão muito rápida de

47

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

glicose, lipides ou eletrólitos, bem como o risco de ocorrência de flebites causada pela

alta osmolalidade da solução. A maior desvantagem a ser considerada são os

problemas mecânicos uma vez que tudo o que interferir na administração do fluído ao

paciente resultará na redução da infusão de nutrientes e da efetividade do

procedimento. Existem inúmeras propostas de formulações e procedimentos de cálculo.

No Quadro 4 demonstra-se as etapas envolvidas no cálculo das necessidades

nutricionais e volumes das soluções para formulação de nutrição parenteral parcial,

juntamente com a necessidade hídrica do paciente. Outras propostas, no entanto,

podem ser conseguidas na literatura.

Quadro 4 - Exemplo de procedimento de cálculo das necessidades nutricionais e

volumes das soluções para formulação de nutrição parenteral parcial.

SERVIÇO DE NUTRIÇÃO CLÍNICA – HVGLN/FCAV/UNESP - Jaboticabal

SUGESTÃO DE FORMULAÇÃO PARA NUTRIÇÃO PARENTERAL PARCIAL

ADMINISTRAÇÃO DE NUTRIENTRES E ÁGUA

1. Necessidade Energética de Repouso (NER):

NER = kcal/dia = 70 x (peso corporal) 0,75

A = NER x 60% (energia não proteica a ser fornecida, 60% das calorias vindas da

glicose mais lipídeos)

A = NER x 60/100

2. Necessidade Hídrica

NH = ml/dia = 70 x (peso corporal) 0,75

3. Volume de glicose

Sugestão: fornecimento de 45% da energia não proteica (A) como glicose

Energia não proteico a ser fornecida (A) x 45/100 = energia advinda da glicose (Glic)

A quantidade de energia oriunda de carboidratos pode ser dividida nas soluções de

glicose a 50% e glicose a 5% para que a osmolalidade final da solução de nutrição parenteral

seja mantida em valores adequados.

48

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Sugestão: 40% de glicose a 5% (B) e 60% de glicose a 50% (C)

B (ml de glicose a 50%) = Glic x 60% ÷ 1,7 (glicose 50% = 1,7 kcal/ml)

C (ml de glicose a 5%) = Glic x 40% ÷ 0,17 (glicose 5% = 0,17 kcal/ml)

4. Volume de lipídios a 20% (D)

Sugestão: fornecimento de 55% da energia não proteica (A) como lipídios

D (ml de lipídios a 20%) = A x 55% ÷ 2,0 (lipídios a 20% = 2,0 kcal/ml)

5. Aminoácidos

Necessidade protéica (E):

Ecão (gramas de aminoácidos) = NER x 4,5 ÷ 100 x 75% (cão: 4,5 g de

aminoácidos/100 kcal)

Egato (gramas de aminoácidos) = NER x 5,5 ÷ 100 x 75% (gato: 5,5 g de

aminoácidos/100 kcal)

(Exemplificando com fornecimento parcial, de apenas 75% da necessidade proteica)

Volume de aminoácidos:

F (ml de aminoácidos a 15%) = E ÷ 15% (considerando solução de aminoácidos com

15% de concentração)

6. Eletrólitos

EXEMPLO para fornecimento de 304 ml de NH (equivalente a peso de 7,1kg):

Sódio – solução deve ter 60 mEq/l de NH (acrescentar como NaCl 20%)

Quantidade de NaCl 20% (1mL NaCl a 20% tem 3,4 mEq de Na)

304 ml x 60÷1000 = 18,24 mEq de Na

18,24 ÷ 3,4 = 5,36 ml de NaCl a 20%

Potássio – usar tabela de correção considerando calemia de 4,0 mEq/l

Acréscimo de 30% como KPO4 (2,0 mEq de K+/ml) e 70% como KCl 19,1% (2,56 mEq

de K+/ml)

304 ml x 20mEq K (exemplo para 20mEq/L) ÷1000 = 6,08 mEq de K+

6,08 x 70% ÷ 2,56 = 1,66 ml de KCl a 19,1%

6,08 x 30% ÷ 2,00 = 0,9 ml de KPO4 a 2,0 mEq/ml

Magnésio – fornecer 0,15 mEq/kg de peso corporal (acrescentar como MgSO4 50%)

Quantidade de MgSO4 50% (4,0 mEq de Mg2+/ml)

7,1 x 0,15 = 1,065 mEq de Mg

1,065 ÷ 4 = 0,27 ml de MgSO4

49

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

7. Vitaminas hidrossolúveis

Sugestão: 1 ml de solução confiável de vitaminas do complexo B para cada 100 kcal

de NER

8. Volume da solução final (V)

V = Somatória do volume de cada solução adicionada (glicose a 5%, glicose a 50%,

lipídios, aminoácidos, eletrólitos, vitaminas hidrossolúveis)

9. Conferência da osmolalidade da solução (mOsm/l)

Osm = [∑(Osmolalidade de cada solução x Volume de cada solução)] ÷ V x 1000

Nesta etapa, o objetivo desta formulação é se manter com osmolalidade menor

que 750 mOsm/l. Isso pode ser conseguido com a mudança na proporção de glicose a

5% e 50%.

10. Conferir o volume final da solução final

É importante que seja feita a conferência do volume final da solução para que se

confirme se está de acordo com as necessidades hídricas do paciente. O recomendado é que

para pacientes com suspeita de retenção de líquidos (como cardiopatas) não se ultrapasse a

necessidade hídrica, assim como para pacientes com alterações na osmolalidade sanguínea

ou com predisposição a flebites, não haja alta osmolalidade da solução final. Por exemplo,

esta sugestão de formulação ultrapassa a necessidade hídrica de manutenção de cães e gatos

(aproximadamente em 25%), por priorizar adequada osmolalidade para infusão em vaso

periférico. Aumento na osmolalidade com manutenção de menor volume hídrico infundido ou

a elaboração de novas fórmulas com baixo volume e baixa osmolalidade, por exemplo com o

uso de soluções finais mais concentradas em lipídios, podem ser alternativas a serem

exploradas pelo médico veterinário.

11. Observações importantes

Através desta sugestão de protocolo, a nutrição parenteral total também pode ser

determinada. Basta para isto nas etapas 1 a 5 fornecer a totalidade das necessidades

estimadas, não se empregando glicose a 5% (apenas a solução a 50%). O recomendado é

que estas soluções com osmolalidade acima de 750 mOsm/l sejam infundidas em vaso central

e não periférico.

Vale deixar claro que a determinação de todas as variáveis na formulação da nutrição

parenteral é de obrigação do médico-veterinário responsável pelo paciente.

50

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

10. Preparo da solução final

Como a solução para nutrição parenteral é um meio propício de cultura para

microorganismos, esta deve ser preparada e sempre manipulada de maneira asséptica.

A melhor opção para preparo da solução final é adquiri-la pronta de laboratórios ou

farmácias de manipulação especializadas, que preparam a solução final de acordo com

a fórmula solicitada.Deve-se utilizar estabelecimentos que seguem as recomendações

da ANVISA para a preparação da solução28. Nesta opção o clínico deve prescrever com

precisão o volume e concentração final de cada nutriente (lípides, dextrose,

aminoácidos, vitaminas, eletrólitos e minerais). As vantagens incluem maior facilidade,

um menor custo potencial, maior garantia de assepsia e precisão da formulação e a

possibilidade do emprego de vários tipos de solução, formando uma nutrição mais

completa. Atenção especial deve ser dada aos aminoácidos, o médico veterinário deve

avaliar a solução comercial de aminoácidos que será empregada para garantir que seja

completa para cães e gatos, e discutir isto com o responsável na empresa de onde irá

adquirir a solução.

Outra opção é utilizar bolsas comerciais prontas para seres humanos, que vem

com as soluções de aminoácidos, glicose e lipídios em separado. Estas devem ser

criteriosamente avaliadas, quanto a sua composição, para ver se realmente se adequam

às necessidades nutricionais de cães e gatos. A quantidade a ser infundida destas

bolsas comerciais deve ser sempre calculada pelo médico veterinário. Como terceira

opção, também viável segundo a experiência dos autores, mas de maior risco séptico,

é que a preparação seja feita no próprio hospital veterinário, desde que haja condições

adequadas de assepsia: capela de fluxo laminar (totalmente higienizada e desinfetada),

paramentos estéreis (luvas, gorro, máscara, avental e panos de campo); e

disponibilidade das soluções. Além do risco de contaminação, ter as soluções em

51

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

estoque é um investimento considerável para o estabelecimento, dificultando esta opção

de uso. Quando a solução for ser preparada no local, deve ser seguida esta ordem de

inclusão no momento de preparo:solução de glicose, solução de aminoácidos, água

para injeção (ou a solução cristalóide que será utilizada como diluente), sulfato de

magnésio, cloreto de sódio, cloreto de potássio, fosfato de potássio, emulsão lipídica,

solução de polivitaminas. Esta ordem é adotada para minimizar risco de

descontinuidade da emulsão lipídica e formação e êmbolos, que podem trazer

consequências sérias aos animais.

11. Administração da solução

Um dos pontos mais importantes em relação a infusão da nutrição parenteral são

os cuidados de assepsia.Iniciando-se com a colocação do cateter no animal, todos os

cuidados de assepsia devem ser rigorosos (tricotomia, uso de soluções de higienização,

luvas, pano de campo para isolamento - principalmente durante a colocação do cateter

venoso central19). Na NPP podem ser empregados cateteres endovenosos comuns,

utilizados normalmente para fluidoterapia. Os vasos de eleição são as veias cefálica e

safena lateral (cães) e safena medial nos gatos. Na NPT, recomenda-se utilizar

cateteres de poliuretano ou silicone, cujo comprimento irá depender do porte do animal,

o vaso a ser canulado deverá ser a veia jugular. O risco de contaminação bacteriana

diminui ao se administrar as soluções de nutrição parenteral por uma via exclusiva, não

sendo usada para nenhum outro propósito6.

Com o acesso venoso adequadamente fixado, pode-se iniciar a infusão da

solução. Após fixação do equipo à solução e ao animal, o ideal é que seja mantido

fechadoo sistema, sem desacoplamento de nenhuma das extremidades, a fim de se

evitar possíveis contaminações. A infusão da nutrição parenteral deve ser feita através

de bomba de infusão, para melhor controle da velocidade de administração.O controle

52

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

da velocidade de infusão é de extrema importância uma vez que os transtornos

metabólicos são muito mais suscetíveis de ocorrerem em função da rápida velocidade

de infusão do que em função da qualidade do fluído administrado13. Na experiência dos

autores, utilizar velocidade de infusão de 4 a 6 ml/kg de peso corporal/hora13, com

infusão por aproximadamente 14 horas por dia mostrou boa tolerância por parte dos

animais. A aplicação de taxas de infusão mais rápidas para períodos curtos pode ser

conseguida com o uso de formulações ricas em lipídios, que possam ser mais toleradas

do que as ricas em glicose15. No entanto, aumenta-se muito o risco de transtornos

metabólicos potencialmente graves, como hiperglicemia, hiperlipidemia, síndrome da

realimentação, perda de nutrientes como glicose e aminoácidos pela urina - não sendo

aproveitados pelo animal - poliúria e desidratação subsequente, dentre outros. A etapa

limitante na nutrição parenteral – assim como na fluidoterapia - é a captação dos

nutrientes pelas células, após sua disponibilização venosa. Infundir os nutrientes é

simples, mas o organismo tem uma velocidade de captação celular que não pode ser

excedida sob riscos deste serem eliminados pelos rins, sem benefícios ao animal, ou

mesmo causar problemas metabólicos.

Ao longo de todo o período de infusão cuidados devem ser tomados afim de se

evitar as possíveis complicações que podem ocorrer devido a infusão de nutrição

parenteral. Na Tabela 3 pode ser observada sugestão de protocolo de monitoramento

dos pacientes submetidos a nutrição parenteral. Estas avaliações tem como objetivo

avaliar e prevenir o desenvolvimento de transtornos metabólicos, e acrescentam custo

significativo ao procedimento.

53

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Tabela 3 - Sugestão de protocolo de monitoramento de paciente sob nutrição parenteral.

Parâmetros Frequência

Temperatura, pulso, frequência respiratória e cardíaca A cada 6-12h

Hidratação A cada 6-12h

Coloração das mucosas, tempo de preenchimento capilar A cada 6-12h

Peso corporal A cada 24h

Consumo de alimento (quando permitido) A cada 24h

Hematócrito, contagem de plaquetas e lipemia A cada 24h

Glicemia A cada 6-12h

Ureia sérica A cada 12h (inicial)

Eletrólitos e fósforo séricos Cada 24h (inicial)

Hemograma completo 1-2 vezes por semana

Adaptado29

12. Complicações da nutrição parenteral

Todos os pacientes sob nutrição parenteral estão sujeitos a diversas

complicações5,6,16,19,30. Dentre as complicações metabólicas a hiperglicemia parece ser

a mais prevalente6,19,30,31. A síndrome de hiperglicemia hiperosmótica ocasionada após

a administração de soluções de glicose já foi descrita na medicina veterinária. Quando

grave, essa síndrome pode induzir a coma com fatalidade em mais de 45% dos animais

acometidos31. O segundo problema metabólico importante é a ocorrência de

hiperlipidemia19, muitas vezes causada pelo excesso de infusão que pode gerar também

hiperglicemia, esteatose hepática, lipogênese, disfunção do sistema imune, disfunção

respiratória e alterações nas distribuições de fluidos32. Relacionado ao excesso de

proteínas já foi reconhecida a ocorrência de vômito, neurotoxicidade, acidose

metabólica, hipercalciúria, hiperamonemia, disfunção hepática31, azotemia e

colestase20.

Ainda sobre as complicações metabólicas, a hipocalemia é o principal transtorno

eletrolítico da nutrição parenteral, relacionado à síndrome da realimentação, devendo a

54

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

concentração sanguínea deste elemento ser adequadamente monitorada. Outros

distúrbios eletrolíticos podem ser provocados ou piorados pela infusão de nutrição

parenteral (hiper/hiponatremia, hiper/hipocloremia, hiper/hipofosfatemia,

hiper/hipomagnesemia) e outras complicações metabólicas são citadas na literatura

como hipoglicemia; hiperbilirrubinemia; hiperamonemia; aumento da ureia sanguínea e

acidose metabólica6,16,19,20,29,30. O risco para efeitos metabólicos adversos depende da

composição da solução, sua velocidade de infusão e duração da aplicação14.

Já as complicações mecânicas são a infiltração perivascular, desconexão ou

mastigação do equipo, oclusão do cateter e tromboflebites16,19,30. A tromboflebite pode

ocorrer em resposta a lesões no endotélio causada pela inserção e/ou movimento do

cateter dentro da veia, que leva a vasoconstrição, maior irritação endotelial e diminuição

da diluição venosa da solução infundida15. O uso de soluções ricas em lipídios parece

ter algum efeito protetor sobre a parede endotelial, assim como a escolha do material

do cateter: os de silicone e de poliuretano são menos trombogênicos33. O

monitoramento frequente em busca de eritema, tumefação, dor, exsudação e mau

posicionamento do cateter6,33 é fator importante na prevenção de quadros graves.

Por fim, as complicações sépticas são de grande risco em pacientes sob nutrição

parenteral e o principal fator preventivo é a higiene e assepsia durante todo o manejo

da bolsa, do catéter e do paciente33. Há indícios na medicina veterinária de que

complicações sépticas aconteçam com maior incidência em NPC do que NPP16.

Na experiência do Serviço de Nutrição Clínica de Cães e Gatos do Hospital Veterinário

da FCAV/UNESP-Jaboticabal, uma baixa freqüência de complicações é observada. As

mais comuns são obstrução do cateter, rompimento das vias de administração,

interrupção na infusão decorrentes de problemas relacionados a bomba de infusão ou

posição do animal, hiperglicemia e hipertrigliceridemia. Esta baixa incidência pode ser

atribuída ao fornecimento parcial da NER, à diluição das soluções na necessidade

55

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

hídrica diária do paciente, ao emprego de bomba de infusão e de cateteres de boa

qualidade adequadamente posicionados.

13. Considerações finais

O suporte nutricional intensivo parenteral demonstra-se prática importante e

efetiva para infundir nutrientes, colaborando na recuperação dos pacientes. A terapia

nutricional parenteral pode ser instituída com segurança em cães e gatos hospitalizados,

sugerindo-se a nutrição parenteral parcial, diluída na necessidade hídrica diária do

paciente e infundida em vaso periférico como a mais prática e segura. Até o momento,

não existem estudos em animais comprovando quais são os pacientes que mais se

beneficiam com este tipo de suporte e quais estão mais propensos ao desenvolvimento

de complicações.Apesar dos benefícios, este é um recurso terapêutico caro, necessita

de adequado monitoramento, demanda tempo e cuidado por parte do corpo clínico e

possui indicações clínicas limitadas. A equipe envolvida, incluído veterinários e

enfermeiros deve ter treinamento e capacitação adequadas para este tipo de suporte

alimentar.

56

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

14. Referências

1. REMILLARD RL, DARDEN DE, MICHEL KE, MARKS SL, BUFFINGTON CA, BUNNELL PR.

An investigation of the relationship between caloric intake and outcome in hospitalized dogs. Vet

Ther Res Appl Vet Med. 2001; 2(4):301-310. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19746652.

Accessed September 11, 2014.

2. LARSEN JA. Enteral nutrition and tube feeding. In: Fascetti AJ, Delaney SJ, eds. Applied

Veterinary Clinical Nutrition. 1st ed. California: Wiley-Blackwell; 2012:329-352.

3. CARCIOFI AC, FRAGA VO, BRUNETTO MA. Ingestão calórica e alta hospitalar em cães e

gatos. Rev Educ Contin CRMV/SP. 2003; 6(1):16-27.

4. BUFFINGTON T, HOLLOWAY C, ABOOD S. Clinical dietetics. Man Vet Diet. 2004:49-142.

5. REMILLARD RL. Nutritional support in critical care patients. Vet Clin North Am Small Anim

Pract. 2002; 32(5):1145-1164, viii. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/12380170. Accessed

September 11, 2014.

6. FREEMAN LM, CHAN D. Parenteral Nutrition. In: DiBartola SP, ed. Fluid, Electrolyte, and Acid-

Base Disorders in Small Animal Practice. 4th ed. Missouri: Saunders Elsevier; 2012:605-628.

7. BRUNETTO MA, GOMES MOS, ANDRE MR, et al. Effects of nutritional support on hospital

outcome in dogs and cats. J Vet Emerg Crit care. 2010; 20(2):224-231. doi:10.1111/j.1476-

4431.2009.00507.x.

8. LIU DT, BROWN DC, SILVERSTEIN DC. Early nutritional support is associated with decreased

length of hospitalization in dogs with septic peritonitis: A retrospective study of 45 cases (2000-

2009). J Vet Emerg Crit Care. 2012; 22(4):453-459. doi:10.1111/j.1476-4431.2012.00771.x.

9. MOHR AJ, LEISEWITZ AL, JACOBSON LS, STEINER JM, RUAUX CG, WILLIAMS D a. Effect

of early enteral nutrition on intestinal permeability, intestinal protein loss, and outcome in dogs

with severe parvoviral enteritis. J Vet Intern Med. 2003; 17(6):791-798. doi:10.1111/j.1939-

1676.2003.tb02516.x.

10. WILL K, NOLTE I, ZENTEK J. Early enteral nutrition in young dogs suffering from

haemorrhagic gastroenteritis. J Vet Med Ser A Physiol Pathol Clin Med. 2005; 52:371-376.

doi:10.1111/j.1439-0442.2005.00745.x.

57

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

11. REMILLARD RL, SAKER K. Parenteral Assisted Feeding. In: Hand, M.S.; Thatcher, C.D.;

Remillard, R.L.; Roudebush, P.; Novotny BJ, ed. Small Animal Clinical Nutritional. 5th ed. Kansas:

Mark Morris Institute; 2010:477-498.

12. FREEMAN LM, CHAN DL. Total Parenteral Nutrition. In: DiBartola SP, ed. Fluid, Electrolyte,

and Acid-Base Disorders in Small Animal Practice. 3rd ed. Missouri: Saunders Elsevier;

2006:584-601.

13. BRUNETTO MA, OLIVEIRA M DE, GOMES S, OLIVEIRA LD DE, CARCIOFI AC. Nutrição

parenteral : princípios básicos de administração Parenteral nutrition : basic beginnings of

administration. Acta Sci Vet. 2007; 35(Supl 2):236-238.

14. ZENTEK J, STEPHAN I, KRAMER S, et al. Response of dogs to short-term infusions of

Carbohydrate- or lipid-based parenteral nutrition. J Vet Med Ser A Physiol Pathol Clin Med.

2003;50(6):313-321. doi:10.1046/j.1439-0442.2003.00541.x.

15. CHANDLER ML, GUILFORD WG, PAYNE-JAMES J. Use of peripheral parenteral nutritional

support in dogs and cats. J Am Vet Med Assoc. 2000; 216(5):669-673.

doi:10.2460/javma.2000.216.669.

16. CHANDLER ML, PAYNE-JAMES JJ. Prospective evaluation of a peripherally administered

three-in-one parenteral nutrition product in dogs. J Small Anim Pract. 2006; 47(9):518-523.

doi:10.1111/j.1748-5827.2006.00173.x.

17. CHAN DL, FREEMAN LM. Nutrition in Critical Illness. Vet Clin North Am - Small Anim Pract.

2006; 36:1225-1241. doi:10.1016/j.cvsm.2006.08.009.

18. NATIONAL RESEARCH COUNCIL (NRC), ed. Nutrients Requirements of Dogs and Cats.

Washington (DC): National Academy Press; 2006.

19. CHAN DL, FREEMAN LM. Parenteral nutrition in small animals. In: Chan DL, ed. Nutritional

Management of Hospitalized Small Animals. 1st ed. Oxford: Wiley-Blackwell; 2015:100-116.

20. PEREA SC. Parenteral nutrition. In: Applied Veterinary Clinical Nutrition. 1st ed. Wiley-

Blackwell; 2012:353-373.

21. GAJANAYAKE I, WYLIE CE, CHAN DL. Clinical experience with a lipid-free, ready-made

parenteral nutrition solution in dogs: 70 cases (2006-2012). J Vet Emerg Crit Care. 2013;

23(3):305-313. doi:10.1111/vec.12029.

58

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

22. CHAN DL, FREEMAN LM, ROZANSKI EA, RUSH JE. Alterations in carbohydrate metabolism

in critically ill cats. J Vet Emerg Crit Care. 2006; 16(s1): S7-S13. doi:10.1111/j.1476-

4431.2005.00150.x.

23. ROSMARIN DK, WARDLAW GM, MIRTALLO J. Hyperglycemia associated with high,

continuous infusion rates of total parenteral nutrition dextrose. Nutr Clin Pract. 1996; 11(4):151-

156. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9070016. Accessed June 19, 2015.

24. DIBARTOLA SP, MORAIS HA. Distúrbios relacionados ao potássio: hipo e hipercalemia. In:

DiBartola SP, ed. Anormalidades de Fluidos, Eletrólitos E Equilíbrio Ácido-Básico Na Clínica de

Pequenos Animais. 3rd ed. Roca; 2007:87-116.

25. DONOGHUE S, KRONFELD D. Feeding hospitalized dogs and cats. In: Wills J, Simpson KW,

eds. The Waltham Book of Clinical Nutrition of Dog and Cat. New York: Pergamon; 1994:25-37.

26. DIBARTOLA SP, WILLARD MD. Distúrbios relacionados ao fósforo: hipo e hiperfosfatemia.

In: DiBartola SP, ed. Anormalidades de Fluidos, Eletrólitos E Equilíbrio Ácido-Básico Na Clínica

de Pequenos Animais. 3rd ed. Roca; 2007:184-197.

27. BATEMAN S. Distúrbios relacionados ao magnésio: déficit e excesso. In: Dibartola SP, ed.

Anormalidades de Fluidos, Eletrólitos E Equilíbrio Ácido-Básico Na Clínica de Pequenos Animais.

3rd ed. Roca; 2007:198-216.

28. SECRETARIA DE VIGILANCIA SANITÁRIA. Portaria 272/MS/SNVS. 1998:definições 3.4.

29. STEIN III HB, BARTGES JW. Nutrição enteral e parenteral. In: Tams TR, ed.

Gastroenterologia de Pequenos Animais. 2nd ed. São Paulo: Roca; 2005:411-450.

30. CHAN DL, FREEMAN LM, LABATO M A, RUSH JE. Retrospective evaluation of partial

parenteral nutrition in dogs and cats. J Vet Intern Med. 2002; 16(4):440-445.

31. MOENS NM, REMEDIOS AM. Hyperosmolar hyperglycaemic syndrome in a dog resulting

from parenteral nutrition overload. J Small Anim Pract. 1997;38(9):417-420.

32. MALLO MK, FORSE RA. Suporte Nutricional Perioperatório. In: Rombeau JL, Rolandelli RH,

eds. Nutrição Clínica: Nutrição Parenteral. 1st ed. São Paulo: Roca; 2005:167-202.

59

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

33. ADAMANTOS S. Intravenous access for parenteral nutrition in small animals. In: Chan DL,

ed. Nutritional Management of Hospitalized Small Animals. 1st ed. Oxford: Wiley-Blackwell;

2015:92-99.

60

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

III. DIETAS CASEIRAS PARA CÃES E GATOS

Esta seção tem como objetivo introduzir formulação de dietas caseiras

balanceadas para cães e gatos e sua utilização na prática clínica. Como apanhado

geral, não tem objetivo de pormenorizar o procedimento. Atualmente as dietas caseiras

têm sido utilizadas tanto como coadjuvantes em tratamentos de algumas doenças

quanto como principal fonte alimentar em cães e gatos saudáveis. O correto emprego

de dietas caseiras, no entanto, vai além da simples indicação de alguns ingredientes e

suas proporções. É preciso conhecimento técnico sobre formulação e necessidades

nutricionais de cães e gatos para se desenvolver uma dieta completa e balanceada:

Completa - implica em ter se verificado a presença de aproximadamente 45 nutrientes

essências; Balanceada – significa que foi verificado que a concentração presente de

cada nutriente está correta, tanto em relação com a energia do alimento como entre os

demais nutrientes.

O ponto de partida para a formulação da dieta caseira é ter adequado

conhecimento sobre as necessidades nutricionais de cães e gatos e conhecer os

ingredientes que serão empregados. As necessidades nutricionais podem ser

conseguidas em publicações especializadas, como o FEDIAF, NRC e AAFCO. Cada

fonte de informações tem sua particularidade, e pode ser escolhida de acordo com a

prática do formulador. Os autores recomendam como guia nutricional o uso das tabelas

da European Pet Food Industry Federation (http://www.fediaf.org/self-

regulation/nutrition/). Elas são completas e apresentam recomendações nutricionais em

base seca e por 1.000kcal de alimento. As recomendações são baseadas na expectativa

de consumo, com tabelas para cães e gatos com baixa e elevada ingestão energética.

Todo o material é disponibilizado gratuitamente.

Já o conhecimento das matérias primais (ingredientes caseiros) é mais difícil e

nem sempre possível, ao menos de modo satisfatório. Esta fragilidade deve ser suprida

61

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

por estudos em tabelas de nutrição humana, buscando as informações necessárias de

composição dos alimentos a serem empregados. No conhecimento dos autores, o local

mais apropriado para a busca de informações sobre a composição nutricional de

ingredientes caseiros é o National Nutrient Database, United States Department of

Agriculture (http://ndb.nal.usda.gov/ndb/search). Acessando esta base de dados,

gratuita, informações detalhadas da maioria dos ingredientes caseiros poderão ser

localizadas. Para integrar estes dois bancos de dados, composição nutricional e

composição das materiais primas, o ideal é utilizar um software próprio para formulação

de dietas para animais, ou uma tabela própria com banco de dados consistente.

O processo envolve de início definir as necessidades nutricionais do paciente,

seguido pela seleção das matérias primas, considerando para isto tanto sua adequação

ao animal como o desejo do proprietário, e por fim a definição da proporção de cada

matéria prima (ou fórmula do alimento), normalmente com auxílio de um software.

Devem ser levadas em consideração, também, a palatabilidade do ingrediente e

preferências individuais, tanto do animal como do proprietário. O nutricionista, no

entanto, deve ter claro que sua tarefa é encontrar proporção de ingredientes caseiros e

suplementos de modo a que a mistura final contenha em equilíbrio todos os 45

nutrientes necessários a cães e gatos!

Ao formular, no entanto, suprir apenas o mínimo necessário, como está descrito

nas tabelas nutricionais, não é um objetivo frequente. Por razões que incluem

palatabilidade, macro composição do alimento, equilíbrio e distribuição dos

combustíveis orgânicos (carboidratos, proteínas e gorduras), para se proporcionar

restrição de nutrientes ou aumento de nutrientes em situações clínicas específicas,

dentre outros, grande variação de inclusão de nutrientes existe em casos individuais.

Para se ter um guia de formulação, estão apresentados a seguir a classificação

nutricional dos alimentos segundo o Serviço de Nutrição Clínica de Cães e Gatos do

Hospital Veterinária da FCAV/Unesp, campus de Jaboticabal.

62

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Esta mistura, além de conter os nutrientes necessários, deve ter boa

apresentação, boa digestibilidade e boa palatabilidade para o animal, sendo ao mesmo

tempo de preparação exequível e não muito complexa para o proprietário. O ideal é que

seja feito uso de ingredientes cotidianos e de fácil acesso, para facilitar o preparo e

evitar omissão e/ou substituição de ingredientes.

São ainda duas tarefas do nutricionista esclarecer ao proprietário o modo de

preparo da receita e seu modo de utilização, ou oferecimento para o animal. O modo de

preparo e a prescrição alimentar devem ser claros e objetivos, para que o proprietário

compreenda todos os passos e tenha completo entendimento da importância de seguir

as instruções à risca. O preparo das dietas pode ser, para alguns proprietários, bastante

difícil. Uma alimentação caseira correta depende de se preparar alimentos

especialmente para os animais e não se recolher sobras ou alimentos preparados para

o homem e os oferecer a cães e gatos. Desta forma, conversar sobre estes

inconvenientes e esclarecer devidamente o proprietário é bastante importante.

Tabela 4 - Classificação dos alimentos segundo sua concentração nutricional. Valores

com base em 1.000kcal de energia metabolizável. Serviço de Nutrição Clínica de Cães

e Gatos, Hospital Veterinária da FCAV/Unesp.

Gato Baixa (g/1000kcal)

Médio (g/1000kcal)

Alto (g/1000kcal)

Proteína Restrição de proteina

83,3 – 90 <70

91 - 110 >111

Extrato Etéreo Restrição de gordura

22,5 – 25 <21

26 - 50 >51

Fibra Bruta <4,5 5 - 23 >24

Fibra Dietética <14 15 - 46 >47

Cálcio 1,97 – 2,5 2,6 – 4,0 >4,1

Fósforo Restrição de fósforo

1,67 – 1,9 <1,5

2,0 – 2,4 >2,5

Sódio Restrição de sódio

0,5 – 0,8 <0,4

0,9 – 2,3 >2,4

63

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Cão Baixa (g/1000kcal)

Médio (g/1000kcal)

Alto (g/1000kcal)

Proteína Restrição de proteina

52 – 59 <40

60 - 94 >95

Extrato Etéreo Restrição de gordura

13,75 – 24 <13

25 - 49 >50

Fibra Bruta <5,0 6 - 24 >25

Fibra Dietética <15 16 - 49 >50

Cálcio 1,45 – 2,5 2,6 – 4,4 >4,5

Fósforo Restrição de fósforo

1,16 – 1,8 <1,0

1,9 – 2,4 >2,5

Sódio Restrição de sódio

0,5 – 0,8 <0,4

0,9 – 2,2 >2,3

Além de apresentar todas as instruções de preparo de maneira detalhada, ainda

é preciso realizar acompanhamentos periódicos para se certificar de que todos os

ingredientes estão sendo preparados da maneira correta e fornecidos na quantidade

indicada. Estudos de nosso grupo de pesquisa indicam que os proprietários tendem a

omitir, substituir ou alterar as quantidades dos alimentos por conta própria, por isso é

importante esclarecer e acompanhar.

Deve-se considerar que a dieta caseira na maioria das vezes é mais cara e

normalmente é menos segura, do ponto de vista nutricional, do que o fornecimento de

um bom alimento industrializado, formulado para a condição fisiológica específica de

cada animal. Por isso o proprietário deve estar ciente dos riscos envolvendo o

fornecimento de uma dieta inadequada, e ser bem orientado quanto a custos e preparo

da mesma. Para definição da quantidade de alimentos a ser fornecida, pode-se seguir

o Quadro 5.

64

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Quadro 5 - Definição da quantidade de alimento caseiro a ser fornecido ao animal.

Animais em manutenção que podem receber a quantidade normal de calorias

1.Cães adultos:

- Pesar o animal: _________ kg

- Calcular a necessidade energética de manutenção (NEM):

NEM = 95 x (peso corporal atual em kg) 0,75

NEM = _________ kcal por dia

2. Gatos adultos:

- Pesar o animal: _________ kg

- Calcular a necessidade energética de manutenção (NEM):

NEM para ECC 1 - 5 = 100 kcal x (peso corporal atual em kg)0,67

NEM para ECC 6 – 9 (sobrepeso/obeso): 130 kcal x (peso corporal atual em kg)0,4

NEM = _________kcal por dia

Animais debilitados que devem ser alimentados com quantidade moderada de

calorias

1. Cães e Gatos:

- Pesar o animal: ________ kg

- Calcular a necessidade energética de repouso (NER):

NER = 70 x (peso corporal atual em kg)0,75

NER = ________ kcal por dia

Cálculo da quantidade de alimento a ser administrada

Para o cálculo da quantidade de alimento deve-se considerar a necessidade energética

de manutenção (NEM) do animal, calculada anteriormente e a energia metabolizável (EM) por

grama da dieta.

Quantidade de alimento = NEM (kcal por dia) / EM por grama de dieta (kcal).

Quantidade de alimento = ___________ gramas por dia

A seguir segue um exemplo de dieta caseira formulada para cães em

manutenção. De forma a tornar a fórmula mais prática, duas fontes de proteína foram

sugeridas (carne moída ou peito de frango). Para facilitar o cálculo, a formula foi

65

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

arredondada de modo que a soma dos ingredientes não corresponde a exatamente

100%. A composição nutricional prevista está expressa na matéria seca. Esta é a média

conseguida com o emprego das duas fontes protéicas. Variações no preparo das dietas

e na composição química dos ingredientes podem levar a variação na composição

nutricional da dieta efetivamente consumida, devendo este aspecto ser considerado

pelo veterinário.

Tabela 5 - Formula caseira para cães em manutenção.

Composição (% da

MS)

Fórmula (% da Matéria Original)

Proteína

Bruta

Carboidrato

Extrato

Etéreo

Fibra Bruta

Matéria

Mineral

Umidade

Cálcio

Fósforo

25,3

50,4

16,3

1,5

1,8

55,1

1,03

0,92

Arroz cozido

Carne moída bovina ou peito de frango

Fígado bovino

Cenoura

Fosfato Bicálcico

Levedura de Cerveja

Suplemento Mineral e Vitamínico

Sal

Óleo de soja

Energia Metabolizável

60

20

5

13

0,7

0,7

1

0,1

1

2,00 Kcal/g

Como calcular e como prescrever a dieta:

Exemplo:

Cálculo e prescrição para cão adulto, de10 kg.

EM da dieta = 2,00 kcal por grama

66

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Etapa I: Calcular a necessidade energética do animal

NEM = 95 x (peso em kg) 0,75

NEM = 95 x (10) 0,75

NEM = 534 kcal por dia

Etapa II: Calcular a quantidade de alimento a ser administrada por dia em gramas

Para calcular a quantidade de alimento a ser fornecida por dia, é necessário

saber qual a energia metabolizável (EM) da dieta a ser prescrita. A EM é diferente para

cada dieta, e depende da composição e ingredientes da mesma. Como exemplo,

utilizamos a dieta acima, que possui 2,0 kcal por grama.

Quantidade de alimento = NEM / EM dieta

Quantidade de alimento = 534 kcal por dia / 2,00 kcal por grama

Quantidade de alimento = 267 gramas por dia (270 gramas aproximadamente)

Etapa III: Calcular a quantidade de cada ingrediente da dieta

Após calcular a quantidade a ser administrada em gramas por dia da dieta, deve-

se calcular a quantidade de cada ingrediente da mistura. Para isso, é necessário saber

qual a porcentagem de inclusão de cada ingrediente. Se a dieta foi formulada em

matéria seca, é necessário converter as porcentagens para matéria original antes de

calcular as quantidades. Se a dieta foi formulada em matéria original, é só calcular como

no exemplo a seguir:

67

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Exemplo: Arroz*: Do total calculado (267 gramas), 60% será compreendido por arroz:

270 gramas da dieta ------------------100 % (total)

x gramas de arroz ----------------- 60% (% de arroz)

x = 160 gramas de arroz por dia

* realizar esse cálculo para todos os ingredientes

Etapa IV: Como prescrever

Dieta calculada:

Ingredientes Fórmula (% na MO)

Arroz cozido 60

Carne bovina moída 20

Fígado bovino 5

Cenoura 13

Fosfato bicálcico 0,7

Levedura de cerveja 0,7

Suplemento mineral e vitamínico 1

Sal 0,1

Óleo de soja 1

Arroz cozido 160 gramas por dia

Carne bovina moída 54 gramas por dia

Fígado bovino 14 gramas por dia

Cenoura 35 gramas por dia

Fosfato bicálcico 1,87 gramas por dia

Levedura de cerveja 1,87 gramas por dia

Suplemento mineral e vitamínico 2,67 gramas por dia

Sal 0,26 gramas por dia

Óleo de soja 2,6 mL por dia

68

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Deve-se conversar com o proprietário sobre a importância de manter as

quantidades prescritas dos ingredientes. Alguns alimentos são necessários em muito

pequena quantidade, de forma que sua quantificação depende de uma balança

adequada, o que pode não existir na casa do proprietário. Assim, ajudá-lo a definir como

irá medir as quantidades ou volumes, de modo a se manter o perfil nutricional da dieta,

é importante.

Alimentos como o fosfato bicálcico, por exemplo, são extremamente

concentrados em nutrientes. No exemplo acima, uma variação de apenas 1grama para

menos significa o não fornecimento de cálcio e fósforo, enquanto uma variação de 1

grama para mais no fornecimento excessivo destes elementos, podendo causar

problemas ao animal. Para gatos recomenda-se suplementar taurina (40 mg por

quilograma de peso corporal por dia) e, além disso, durante o preparo dos alimentos, a

água do cozimento não deve ser desprezada, pois contém boa parte da taurina das

carnes.

Uma alternativa prática é mandar aviar em farmácias de manipulação os

ingredientes necessários em pequena quantidade em forma de envelopes, como

carbonato de cálcio, fosfato bicálcico e/ou taurina, e recomendar ao proprietário que

este abra e misture o envelope ao alimento. Abaixo estão indicadas as quantidades

desses ingredientes em uma colher rasa de chá (passar as costas da faca na colher

para nivelar tendo assim uma colher rasa) de aproximadamente 2,5 cm de largura e 4

cm de comprimento:

- 1 colher de chá de carbonato de cálcio: 3,3 gramas

- 1 colher de chá de fosfato bicálcico: 1,8 gramas

- 1 colher de chá de levedura de cerveja: 1,5 gramas

- 1 colher de chá de sal: 2,5 gramas

- 1 colher de chá de sal light: 2,5 gramas

69

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Também estão indicadas as quantidades desses ingredientes em uma colher

rasa de café (nivelar também com as costas da faca) de aproximadamente 2,0 cm de

largura e 3,0 cm de comprimento.

- 1 colher de café de carbonato de cálcio: 1,0 gramas

- 1 colher de café de fosfato bicálcico: 0,6 gramas

- 1 colher de café de levedura de cerveja: 0,5 gramas

- 1 colher de café de sal: 0,7 gramas

- 1 colher de café de sal light: 0,85 gramas

Os ingredientes que são necessários em maior quantidade também podem ser

medidos em colheres rasas de sopa (nivelar também com as costas da faca) de

aproximadamente 4,0 cm de largura e 6,0 cm de comprimento.

- 1 colher de sopa de arroz cozido: 15,0 gramas

- 1 colher de sopa de carne moída ou peito de frango ou músculo gordo: 15,0

gramas

- 1 colher de sopa de cenoura cozida ou lentilha ou vagem: 20,0 gramas

- 1 ovo cozido inteiro: 50,0 gramas

- 1 colher de sopa de óleo: 15 mL

Etapa V: Modo de Preparo

- Cozinhar os ingredientes separadamente. A formulação foi feita considerando

o ingrediente cozido. O cozimento altera a quantidade de água do alimento, podendo

levar a alterações na composição nutricional final da dieta caso a mistura seja feita com

os ingredientes crus.

- Pesar cada ingrediente na quantidade calculada para a fórmula após o

cozimento;

- Sal e óleo podem ser incorporados durante o preparo do alimento ou

acrescentados após o preparo, logo antes do fornecimento.

70

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

- O suplemento vitamínico e mineral não deve ser cozido, mas adicionado após

o alimento esfriar.

- Após a adição do suplemento vitamínico e mineral e da levedura de cerveja o

alimento poderá ser aquecido somente em banho-maria; portando é recomendado que

estes ingredientes sejam adicionados à dieta no momento em que ela será oferecida.

- Misturar todos os ingredientes após a pesagem e oferecer ao animal a

quantidade total do alimento dividido em, no mínimo, duas refeições diárias.

Etapa VI: Acompanhamento do animal após a prescrição da dieta

O animal deve ser acompanhado frequentemente após a prescrição de dieta

caseira, principalmente se esta for utilizada em longo prazo. O proprietário deve ser

consultado periodicamente sobre o modo de preparo, modo de medida e uso dos

ingredientes. É importante verificar se os alimentos estão sendo fornecidos como

prescritos, ou se o proprietário modificou as quantidades, omitiu ou substituiu algum

ingrediente.

É importante intervir antes que alguma alteração se manifeste em função de má

nutrição, para prevenir maiores problemas decorrentes de uma alimentação

inadequada.

O acompanhamento deve ser feito mês a mês nos primeiros 3 meses, e em

seguida uma vez a cada 6 meses, ou como achar mais adequado. Nas reavaliações

pode ser necessária a coleta de material biológico para exames de rotina, como

hemograma, função renal e hepática, albumina, triglicérides, glicose e colesterol.

Além de consultas periódicas, o ideal é que o animal seja avaliado por um

oftalmologista pelo menos uma vez ao ano, pois o tecido ocular é extremamente

sensível a deficiências ou excessos nutricionais, e é um dos primeiros tecidos a

manifestar as alterações nutricionais.

71

VI Simpósio sobre Nutrição Clínica de Cães e Gatos – Módulo Prático

Apenas como referência inicial, seguem alguns alimentos e sua composição

bromatológica. Esta, no entanto, é insuficiente pois não se necessita de proteína bruta

para formular, mas sim dos 10 aminoácidos essenciais. Além disso, faltam as

informações de vitaminas, minerais e ácidos graxos presentes.

Tabela 6 - Composição básica de alguns ingredientes para dietas caseiras na matéria

seca.

Ingredientes Água

%

ENN

%

MM

%

FB

%

EE

%

PB

%

EM

(100g)

Arroz branco cozido

Batata cozida

Carne bovina moída

Cenoura cozida

Carne cordeiro cozida

Fígado bovino cozido

Lentilha cozida

Levedura de cerveja

Músculo bov gordo cz

Músculo bov magro cz

Óleo de soja

Ovo cozido

Peito frango cozido

Vagem cozida

68,44

77,00

51,00

87,00

64,00

66,00

70,00

6,00

53,00

58,00

00,00

75,00

60,00

89,00

89,26

60,60

0,00

76,92

0,00

8,82

66,66

51,90

0,00

0,00

0,00

4,00

2,5

63,63

1,30

3,03

2,04

7,69

2,70

2,94

3,33

6,20

4,25

4,70

0,00

4,00

2,5

9,09

1,27

6,06

0,00

23,07

0,00

0,00

26,66

0,37

0,00

0,00

0,00

0,00

0,00

27,27

0,89

0,00

36,73

0,00

22,20

14,70

0,00

0,47

32,00

14,30

99,00

44,00

12,50

0,00

8,52

6,06

61,22

0,00

77,70

70,58

30,00

41,90

66,00

80,90

0,00

52,00

82,50

27,27

399,13

266,64

575,45

338,44

510,60

449,90

386,64

376,19

552,00

452,30

891,00

620,00

452,50

363,60

Fonte: USDA – Nutrition data base

Ingredientes Água %

Ca %

P %

Na %

K %

Mg %

Carbonato de cálcio

Fosfato Bicálcico

Levedura de cerveja

Sal comum

Sal light

Suplemento Mineral e Vitamina

0,00

1,00

6,00

0,20

0,20

0,00

38,40

24,10

0,15

0,02

0,00

12,32

0,00

18,5

1,50

0,00

0,00

6,20

0,00

0,00

0,07

38,83

19,64

0,00

0,00

0,00

1,80

0,008

24,25

0,00

0,00

0,00

0,25

0,001

0,00

0,044