PRESTAÇÕES DE CONTAS DE RECURSOS ANTECIPADOS UMA ABORDAGEM PRÁTICA
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Sérgio Brigas Afonso
Regime Societário e Fiscal dos Créditos por Prestações Suplementares e Prestações
Acessórias
Sérgio Brigas Afonso
Advogado na CMS RPA
Resumo
O presente trabalho faz o enquadramento das prestações acessórias, bem como das prestações
suplementares, quer no plano do direito societário, quer no plano do direito fiscal.
No plano do direito societário, é identificado o objeto destas prestações e os seus elementos
essenciais, nomeadamente, os seus sujeitos passivos, as condições para que estas se tornem
exigíveis, bem como as condições de que depende a sua restituição aos sócios prestadores.
Seguidamente, é feito o enquadramento contabilístico destas prestações, quer na perspetiva do
sócio prestador, quer na perspetiva da sociedade beneficiária, abordando aquele que tem sido
o entendimento da doutrina sobre esta matéria e o registo contabilístico destas prestações e
dos respetivos créditos.
Por fim, o presente trabalho aborda o enquadramento fiscal das prestações suplementares e
acessórias. Para alcançar este desiderato, é abordada a problemática do tratamento fiscal dos
gastos incorridos para a realização destas prestações e do entendimento que tem sido adotado
pela doutrina e pela jurisprudência, a problemática do tratamento fiscal das perdas e menos-
valias com prestações suplementares e acessórias.
Palavras-chave:
Prestações Suplementares; Prestações Acessórias; Partes de Capital; Capital Próprio; Gastos;
Mais-Valias e Menos-Valias
Abstract
This work makes the framework, according to corporate law and tax law, for additional
payments as well as supplementary payments.
Concerning to corporate law, this work analyses the main elements of each payment, in
particular, the taxpayers, when they become chargeable, and the conditions for its refund to
the partners.
Moreover, it is analyzed the accounting treatment of each payment and its credits, either in the
perspective of the partners but also in the company`s perspective, according to the legal
literature and in our point of view.
Finally, our work describes the tax treatment for the additional and supplementary payments,
namely, regarding the tax treatment of the costs to realize those payments and the opinion of
the legal literature and the case law. Linked to this matter, we also describe the tax treatment
of the losses and capital losses with those payments.
Keywords: Supplementary payments; Additional payments; Share capital; Equity capital;
Costs; Capital gains and losses
1. Regime societário das prestações suplementares
1.1 Previsão legal e objeto
As prestações suplementares encontram-se consagradas, no atual Código das Sociedades
Comerciais (CSC), nos artigos 210.º a 213.º, mas apenas para as sociedades por quotas.
Resulta do n.º 1 do artigo 210.º do CSC que, nas sociedades por quotas, a realização de
prestações suplementares está dependente, sob pena das mesmas não serem exigíveis, da sua
consagração no contrato de sociedade originário ou, por força do disposto no artigo 197.º,
n.º 2, do CSC e do artigo 980.º, do Código Civil (CC), através da alteração ao mesmo. O que
significa que, se a obrigatoriedade de prestações suplementares não tiver sido estipulada no
contrato de sociedade original, as mesmas apenas serão exigíveis, por força do disposto nos
artigos 85.º, n.º 1, 246.º, n.º 1, alínea h) e 265.º, n.º 1, do CSC, mediante alteração do contrato
tomada através de deliberação social aprovada por uma maioria de três quartos dos votos
correspondentes ao capital social ou por número ainda superior de votos exigido pelo contrato
de sociedade. Importa, contudo, referir que, se a exigência de prestações suplementares
resultar da introdução de nova cláusula no contrato de sociedade ou do alargamento da
obrigação já existente, atento o disposto no artigo 86.º, n.º 2, do CSC, a nova obrigação
apenas abrange os sócios que aprovem essa nova obrigação.
Outra questão relevante é a de saber se será possível aos sócios realizar prestações
suplementares que não tenham sido consagradas no contrato de sociedade. Em nossa opinião,
ainda que a realização de prestações suplementares não tenha sido estipulada no contrato de
sociedade, a sua realização pode ser determinada por deliberação dos sócios tomada por
unanimidade. Este entendimento resulta do facto de o n.º 1 do artigo 86.º, do CSC, estabelecer
que, só por unanimidade, pode ser atribuído efeito retroativo à alteração do contrato de
sociedade e apenas nas relações entre sócios. A regra da unanimidade deve-se ao facto de a
alteração do contrato de sociedade implicar um aumento das obrigações exigidas aos sócios, o
que só é admissível se todos os sócios derem o seu consentimento.
Um traço distintivo das prestações suplementares relativamente às demais prestações
acessórias resulta do facto de aquelas terem sempre dinheiro por objeto, de acordo com o
disposto no artigo 210.º, n.º 2, do CSC. Esta disposição legal é clara na sua intenção de
excluir a realização de prestações suplementares sob a forma de outros bens ou direitos,
evitando, deste modo, que o seu valor seja sobrevalorizado no momento em que as mesmas
são efetuadas, o que implicaria um prejuízo para os credores da sociedade. Acompanhamos,
pois, a doutrina1 que sustenta que a obrigatoriedade das prestações suplementares apenas
terem dinheiro por objeto se justifica pelo facto de estas terem por finalidade o aumento do
capital da sociedade, através do reforço de capitais próprios.
O contrato de sociedade deverá, ainda, de acordo com o disposto no artigo 210.º, n.º 3, alínea
a), do CSC definir o montante global das prestações suplementares. Por força da primeira
parte do n.º 4 do artigo 210.º do CSC, a fixação do montante global das prestações
suplementares constitui um elemento essencial do contrato de sociedade que consagre a
obrigação de realização destas prestações, sancionando-se com nulidade a cláusula contratual
que imponha a sua realização, sem definir o montante global destas prestações.
O CSC estabelece, ainda, no artigo 210.º, n.º 3, alínea b), a obrigatoriedade de o contrato de
sociedade definir quais são os sócios que se encontram obrigados à realização destas
prestações.
Por último, o artigo 210.º, n.º 3, alínea c), do CSC impõe, ainda, que o contrato de sociedade
defina qual o critério de repartição das prestações suplementares entre os sócios obrigados à
sua realização, sob pena de, por força do disposto na parte final do n.º 4 daquela disposição
legal, a obrigação de realização de prestações suplementares recair sobre os sócios na
proporção das quotas respetivas.
O n.º 5, do artigo 210.º, do CSC, regulamenta, ainda, um aspeto fundamental do regime legal
das prestações suplementares ao determinar que estas prestações não vencem juros. Esta
característica das prestações suplementares afasta, em nossa opinião, de forma inequívoca,
estas prestações dos suprimentos, que vencem juros, e alicerça a ideia, que desenvolveremos
mais adiante, segundo a qual, quer do ponto de vista contabilístico, quer do ponto de vista
fiscal, estas prestações são enquadráveis como capital próprio atento o seu cariz societário.
1.2 Exigibilidade da obrigação de prestações suplementares
1 Neste sentido, MANUEL ANSELMO TORRES (setembro de 2011), "Prestações suplementares, seu regime
comercial, contabilístico e tributário", em Paulo Otero, Fernando Araújo e João Taborda da Gama (orgs.),
Estudos em Memória do Prof. Doutor J. L. Saldanha Sanches, Volume IV, 1.ª Edição, Coimbra Editora, pp. 899-
918.
A exigibilidade das prestações suplementares, nas sociedades por quotas, é regulada pelo
artigo 211.º em conjugação com o disposto no artigo 246.º, n.º 1, alínea a), ambos do CSC.
Como a deliberação que determine a realização de prestações suplementares não altera o
contrato de sociedade, pode ser tomada, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 211.º e os
artigos 246.º, n.º 1, alínea a) e 250.º, n.º 3, todos do CSC, por maioria simples dos sócios
presentes ou representados.
O n.º 1, do artigo 211.º, do CSC determina, ainda, o conteúdo da deliberação a tomar pelos
sócios, ao referir que a deliberação deverá tornar exigível parte ou a totalidade das prestações
suplementares, fixando o montante tornado exigível e o prazo para realização da prestação,
que não poderá ser inferior a 30 dias. Esta disposição legal não impõe que a totalidade das
prestações sejam exigidas de uma só vez, permitindo aos sócios, em cada momento, decidir o
montante tornado exigível, em face das necessidades da sociedade beneficiária. A lei também
não impõe a proporcionalidade na chamada, podendo acontecer que, estando estabelecido o
montante da obrigação de cada sócio, os sócios ao deliberarem a realização de prestações
suplementares apenas façam recair, num determinado momento, esta obrigação sobre
determinados sócios ou mais agravadamente sobre alguns.
A parte final do n.º 1, do artigo 211.º do CSC estabelece que a deliberação que determine a
realização de prestações suplementares deverá ser comunicada aos sócios com uma
antecedência mínima de 30 dias. Embora a lei não esclareça se a deliberação que torne
exigível a realização de prestações suplementares deverá ser comunicada a todos os sócios ou
apenas àqueles que não participaram na deliberação, entendemos, acompanhando a doutrina2,
que o dever de comunicação não exclui os sócios que participaram na deliberação.
Se o sócio não cumprir com a deliberação que determine a realização da prestação
suplementar, estabelece o artigo 174.º, n.º 1, alínea a), do CSC, que o sócio entrará em mora,
iniciando-se a contagem do prazo de prescrição de cinco anos.
O CSC faz, ainda, depender a exigibilidade das prestações suplementares da prévia
interpelação dos sócios para liberação das suas quotas. Com efeito, o artigo 211.º, n.º 2, do
CSC estabelece que a deliberação para realização de prestações suplementares apenas será
válida se todos os sócios tiverem sido interpelados para liberarem as suas quotas de capital,
sendo este requisito inderrogável, quer através de cláusula contratual, quer através de
2 RAÚL VENTURA (setembro de 2004), Sociedades por Quotas, Comentário ao Código das Sociedades
Comerciais, Vol. I, 2.ª edição, Almedina, p. 249.
deliberação de chamada. Na verdade, a lei não impõe que as quotas tenham sido,
efectivamente, liberadas, bastando-se com a exigência de que os sócios tenham sido
interpelados a liberá-las, o que se compreende, uma vez que se não as liberarem ficarão
sujeitos ao regime de incumprimento regulado pelos artigos 204.º e seguintes do CSC.
Subjacente a esta solução legal, está o entendimento segundo o qual não faz sentido permitir
aos sócios a realização de prestações suplementares antes de liberadas as suas entradas de
capital, uma vez que as prestações suplementares poderão ser, posteriormente, restituídas,
beneficiando de um regime mais favorável do que as entradas de capital.
A exigibilidade de prestações suplementares fica, ainda, dependente, de acordo com o artigo
211.º, n.º 3, do CSC, da não dissolução da sociedade. Esta condição é facilmente
compreensível, uma vez que se a sociedade tiver sido dissolvida deixam de existir interesses
sociais que justifiquem a obrigação de realização de prestações suplementares por parte dos
sócios.
1.3 Sujeitos passivos das prestações suplementares
A preocupação de determinação dos sujeitos passivos das prestações suplementares está
patente no artigo 210.º, n.º 3, alínea b), do CSC, no qual se prevê que o contrato de sociedade
deverá fixar os sujeitos passivos das prestações suplementares. Assim, pode estabelecer-se, no
contrato de sociedade, que todos os sócios que, no momento da deliberação que determine a
realização de prestações suplementares, ou no momento em que estas se vençam, tenham a
qualidade de sócios, ficam obrigados à realização de prestações suplementares, mas também
se poderá determinar que apenas alguns sócios ficarão sujeitos a esta obrigação perante a
sociedade.
Nas situações em que não tiver sido estipulado, no contrato de sociedade, quais os sócios
obrigados à realização de prestações suplementares, estabelece o artigo 210.º, n.º 4, do CSC
que serão sujeitos passivos das prestações suplementares todos os sócios na proporção das
respetivas quotas.
1.4 Cumprimento da obrigação de prestações suplementares
No que diz respeito ao cumprimento da obrigação de realização de prestações suplementares,
o artigo 212.º, n.º 1, do CSC remete para o disposto nos artigos 204.º e 205.º deste Código.
Se o sócio não cumpriu nem com as suas obrigações de capital, nem com as obrigações de
prestações suplementares deverá aplicar-se o regime previsto nos artigos 204.º a 208.º, do
CSC, procedimento que poderá conduzir à exclusão do sócio da sociedade e à perda, total ou
parcial, da quota detida na sociedade. Na eventualidade de se cumular o incumprimento por
falta de pagamento da prestação de capital e da prestação suplementar, deverá distinguir-se a
situação em que já foi deliberada a exclusão do sócio por incumprimento da prestação de
capital, hipótese em que a obrigação de realização de prestações suplementares já não
abrangerá o sócio excluído e a situação em que essa deliberação ainda não ocorreu, hipótese
em que deverá proceder-se à cumulação de processos por incumprimento.
A lei veda, ainda, através do n.º 2, do artigo 212.º do CSC a possibilidade de compensação do
crédito por prestações suplementares, o que significa que o sócio está impedido de compensar
créditos normais que detenha perante a sociedade, bem como de compensar um crédito da
sociedade relativamente a uma prestação acessória com um crédito do sócio relativamente a
uma prestação complementar.
De acordo com o disposto no artigo 212.º, n.º 3, do CSC, a sociedade beneficiária das
prestações suplementares não pode exonerar os sócios da obrigação de realização de
prestações suplementares, quer estas estejam ou não exigidas. O que não impede que a
sociedade possa, nas situações em que as prestações suplementares ainda não foram exigidas
aos sócios, eliminar ou reduzir esta obrigação mediante alteração do contrato de sociedade.
A transmissão, por parte da sociedade, do direito de exigir prestações suplementares e de sub-
rogação dos credores da sociedade é vedada pelo n.º 4, do artigo 212.º do CSC. Importa,
contudo, sublinhar que esta proibição não impede que, após a deliberação de realização de
prestações suplementares, prevista no artigo 211.º do CSC, o crédito da sociedade relativo à
prestação suplementar seja transmitido e que nele se sub-roguem os credores da sociedade.
1.5 Restituição das prestações suplementares
Contrariamente ao que parece resultar de uma primeira leitura do artigo 213.º do CSC,
disposição legal que estabelece os pressupostos e as regras a observar na restituição das
prestações suplementares, em regra, estas prestações são restituíveis. Esta característica
aproxima, de acordo com alguma doutrina3, as prestações suplementares dos suprimentos,
afastando-as das prestações de capital que, por regra, não são restituíveis.
Antes de analisar os pressupostos de que depende a restituição de prestações suplementares,
importa referir que estes são imperativos, com exceção do disposto no n.º 5 do artigo 213.º do
CSC.
O n.º 1, do artigo 213.º, do CSC começa por salvaguardar que a restituição das prestações
suplementares depende de a situação líquida da sociedade não ficar, depois da restituição,
inferior à soma do capital e da reserva legal. Subjacente a este requisito está o princípio da
intangibilidade do capital social, consagrado no artigo 32.º, do CSC, que poderá impedir a
restituição integral das prestações suplementares.
A segunda parte do n.º 1, do artigo 213.º, do CSC impõe, ainda, que a restituição das
prestações suplementares só possa ocorrer quando o sócio já tenha liberado a respetiva quota.
Ou seja, o sócio não pode beneficiar da restituição da prestação suplementar se ainda não
satisfez a sua obrigação de realizar a sua quota parte no capital subscrito. Esta disposição não
é, contudo, isenta de críticas por parte da doutrina4 que refere que a lei deveria ter mantido,
conforme decorria do artigo 21.º, § 3.º, da Lei de 1901, a exigência de que fossem liberadas
todas as quotas, uma vez que só assim se salvaguardaria os interesses dos credores da
sociedade, impedindo que a sociedade restituísse créditos por prestações suplementares sem
que o capital tivesse sido completamente liberado. No entanto, em nossa opinião, a explicação
para a solução legal adoptada poderá estar no facto de se pretender minimizar a desigualdade
entre os sócios que estão obrigados a realizar prestações suplementares e aqueles que não
estão abrangidos pelas mesmas.
3 Neste sentido cf. RAÚL VENTURA, op. cit., p. 264. No mesmo sentido e a propósito da distinção entre partes de
capital e capital próprio: FERNANDO CARREIRA ARAÚJO; ANTÓNIO FERNANDES DE OLIVEIRA (setembro de 2011),
"O Código do IRC e os Conceitos de (I) Capital, (II) Partes de Capital, (III) Prestações Suplementares e (IV)
Créditos pela Realização de Prestações Suplementares", em Paulo Otero, Fernando Araújo e João Taborda da
Gama (orgs.), Estudos em Memória do Prof. Doutor J.L. Saldanha Sanches, Vol. IV, 1.ª Edição, Coimbra,
Coimbra Editora, p. 681 e ss. 4 RAÚL VENTURA, op. cit., p. 266.
Por força do disposto no artigo 213.º, n.º 2 em conjugação com o artigo 246.º, n.º 1, alínea a),
ambos do CSC, a restituição de prestações suplementares fica, ainda, dependente de
deliberação que a determine. Embora o contrato de sociedade possa impor uma maioria
qualificada, a Lei não impõe qualquer maioria qualificada para esta deliberação, pelo que
deverá concluir-se que, por força do disposto no artigo 250.º, n.º 3, do CSC, a mesma pode ser
tomada por maioria simples. Ou seja, a restituição das prestações suplementares não ocorre,
automaticamente, quando se encontrem reunidos os requisitos previstos no n.º 1, do artigo
213.º do CSC, sendo sempre necessário que a sociedade beneficiária exteriorize, através de
uma deliberação, a intenção de restituir esses créditos a quem os realizou.
Embora a Lei não conceda aos credores sociais a possibilidade de contestar a deliberação de
restituição de prestações suplementares, o n.º 3 do artigo 213.º, do CSC vem impedir a
restituição destas prestações em data posterior à declaração de falência da sociedade. Com
efeito, não faria sentido permitir que os sócios pudessem exigir, mesmo depois de declarada a
falência da sociedade, a restituição das prestações suplementares, concorrendo, desse modo,
com os créditos dos credores sociais. A restituição de prestações suplementares está ainda
subordinada, de acordo com o disposto no n.º 4, do artigo 213.º, do CSC, ao princípio da
igualdade, o que significa que os sócios obrigados à realização de prestações suplementares
deverão ser reembolsados proporcionalmente aos montantes que tenham realizado, em
conformidade com o critério de repartição que tenha sido contratualmente estabelecido ao
abrigo do disposto no artigo 210.º, n.º 3, alínea c), do CSC.
Relativamente ao regime de restituição das prestações suplementares importa, ainda, fazer
referência à regra consagrada no n.º 5, do artigo 213.º, do CSC. Esta disposição legal vem
salvaguardar que não podem ser exigidas prestações suplementares enquanto for atingido o
montante máximo fixado no contrato de sociedade. Será, pois, necessário determinar o
montante total das prestações suplementares já exigidas aos sócios, deduzindo-se as
prestações já restituídas aos sócios, pois, será esse saldo (positivo) que a sociedade poderá
exigir aos sócios mediante deliberação.
Relativamente à restituição dos créditos por prestações suplementares aos sócios, mostra-se
também indispensável averiguar qual a natureza jurídica e a tutela da expetativa do sócio
relativamente à restituição destes créditos. Como vimos, o n.º 2, do artigo 213.º, do CSC,
estabelece que a restituição de prestações suplementares depende, obrigatoriamente, de
deliberação da sociedade, ou seja, é necessário um ato volitivo da sociedade, não podendo o
sócio exigir, nem mesmo judicialmente, que a sociedade lhe restitua o seu crédito. Sobre esta
matéria, consideramos que deverá acompanhar-se o entendimento da doutrina5, fazendo
claramente a distinção entre dois momentos: até iniciar-se a fase da liquidação e depois de
esta se iniciar. Enquanto não se iniciar a liquidação da sociedade, não se vislumbra base legal
para que um sócio, que tenha realizado prestações suplementares, possa exigir a sua
restituição, ficando a sua restituição na exclusiva disponibilidade da sociedade, mediante
deliberação que observe os requisitos consagrados no n.º 1, do artigo 213.º, do CSC. Se for
iniciado um processo de liquidação da sociedade, deverá dar-se primazia à satisfação dos
créditos dos credores da sociedade, mas nada impede que, após a satisfação desses créditos,
seja determinada a restituição dos créditos por prestações suplementares. Partilhamos, pois,
do entendimento de Raúl Ventura, quando este autor refere que, nas situações de liquidação
da sociedade, os créditos por prestações suplementares devem ser satisfeitos antes da partilha
do saldo entre os sócios, atenuando, deste modo, a desigualdade em que estes sócios se
encontram ao terem sido forçados a liberar as suas quotas e a realizar estas prestações que
poderão não ter abrangido todos os sócios.
1.6 Admissibilidade de prestações suplementares nas sociedades anónimas
Como vimos, o CSC apenas regula a obrigação de prestações suplementares no âmbito das
sociedades por quotas, consagrando o seu regime nos artigos 210.º a 213.º, não prevendo o
seu regime para as sociedades anónimas. Poderá, pois, questionar-se se o legislador pretendeu
excluir a possibilidade de realização das prestações suplementares para as sociedades
anónimas ou se, na ausência de uma regulamentação específica das prestações suplementares
para as sociedades anónimas, deverá ser aplicado o regime previsto para as sociedades por
quotas com as necessárias adaptações.
5 RAÚL VENTURA, op. cit., pp. 272 e 273. Embora não partilhemos das conclusões alcançadas, sobre esta matéria,
refere o Parecer n.º 107/04 do CEF, proferido em 30 de novembro que, "(...) em face deste regime não é possível
configurar nestas prestações suplementares "créditos exigíveis" por parte dos sócios sobre a sociedade, ou, pelo
menos, a sua exigibilidade apresenta-se como muito enfraquecida, dado que não existe a faculdade de livremente
as exigir, antes a sua restituição encontra-se dependente de factos alheios à vontade do sócio concedente."
Alguma doutrina6 em Portugal tem sustentado não ser possível a realização de prestações
suplementares nas sociedades anónimas com fundamento no facto de não existir uma ligação
íntima entre o sócio e a sociedade, o que impede, na opinião dos subscritores deste
entendimento, a realização destas prestações no âmbito destas sociedades. Para Rui Pinto
Duarte7, um dos autores que nega a possibilidade de realização de prestações suplementares
no âmbito das sociedades anónimas, a impossibilidade de realização de prestações
suplementares no âmbito das sociedades anónimas seria colmatada através das prestações
acessórias pecuniárias.
Contudo, existe também doutrina8, com a qual concordamos, que sustenta que nada na lei
impede a realização de prestações suplementares nas sociedades anónimas, uma vez que a
existência de vários tipos de sócio, designadamente, de sócios com ações ao portador, não
impede a imposição de prestações suplementares aos sócios, do mesmo modo que o artigo
287.º, n.º 2, do CSC permite, relativamente às sociedades anónimas, a realização de
prestações acessórias em dinheiro. Consideramos, pois, que deverá ser acolhido o
entendimento dos autores que defendem a aplicação analógica do disposto na primeira parte
do artigo 287.º do CSC desde que as mesmas estejam previstas no pacto social.
2. Regime societário das prestações acessórias
2.1 Previsão legal e objeto
As prestações acessórias estão previstas nos artigos 209.º e 287.º, ambos do CSC,
respetivamente, para as sociedades por quotas e para as sociedades anónimas. A sociedade
pode, pois, através do contrato de sociedade, obrigar os seus sócios a efetuar prestações para
além das entradas de capital. Como refere alguma doutrina9, o legislador não teve a
preocupação de definir o que se entende por prestação acessória, limitando-se a consagrar o
6 PAULO OLAVO CUNHA (2007), Direito das Sociedades Comerciais, 3.ª edição, Almedina, p. 441. 7 RUI PINTO DUARTE (2008), Escritos sobre Direito das Sociedades, Coimbra Editora, p. 259. 8 HELENA CLÁUDIA FERREIRA DA SILVA (2011), As Obrigações de Prestações Acessórias e a Obrigação de
Prestações Suplementares no Direito Societário Português, Cascais, Principia, p. 51 e ss., p. 108 e PEDRO PAIS
DE VASCONCELOS (2006), A Participação Social nas Sociedades Comerciais, 2.ª edição, Coimbra, pp. 277 e 278,
autor que sustenta a possibilidade de recurso às prestações suplementares através de analogia do artigo 287.º, 1.ª
parte, do CSC e BRITO CORREIA (1989), Direito Comercial, Vol. II, AAFDL, Lisboa, 1989, p. 298. 9 Neste sentido, HELENA CLÁUDIA FERREIRA DA SILVA, op. cit., p. 45.
seu regime, quer para as sociedades por quotas, quer para as sociedades anónimas. Não
obstante, o recorte legal das prestações acessórias permite-nos concluir que estas consistem
em quaisquer prestações a que os sócios se obriguem, entre si, para além da obrigação de
entrada para realização do capital social.
A obrigação de prestações acessórias apenas é válida quando prevista no contrato de
sociedade inicial ou, posteriormente, alterado. No entanto, se as prestações acessórias apenas
forem estabelecidas através da alteração do contrato de sociedade, o artigo 86.º, n.º 2, do CSC
estabelece que apenas ficarão obrigados à sua realização os sócios que as tenham aprovado. O
que não impede que, uma vez consagrada no contrato de sociedade a obrigação de realização
de prestações acessórias, estas possam recair apenas sobre alguns dos sócios ou que estas
sejam qualitativa ou quantitativamente distintas entre si.
No que respeita ao objeto das prestações acessórias, o artigo 209.º, do CSC não estabelece
qualquer limitação, permitindo que estas tenham por objeto dinheiro ou qualquer outro objeto
e possam materializar-se, nomeadamente, em obrigações de dare, facere e non facere ou até
mesmo em obrigações de suportar ou tolerar.
Embora inicialmente, e à semelhança do que sucedia noutros ordenamentos jurídicos, não
fosse possível a realização de prestações acessórias pecuniárias, o legislador nacional parece
não ter pretendido estabelecer essa limitação ao prever, quer nas sociedades por quotas, quer
nas sociedades anónimas, a possibilidade de realização de prestações acessórias pecuniárias.
Uma leitura a contrario sensu do disposto nos artigos 209.º, n.º 2 e 287.º, n.º 2, do CSC não
deixa qualquer dúvida de que o legislador quis introduzir no ordenamento jurídico português
a possibilidade de realização de prestações acessórias pecuniárias.
2.2 Exigibilidade da obrigação de prestações acessórias
Conforme já referido anteriormente, para que as prestações acessórias possam ser exigidas aos
sócios será necessária a sua prévia consagração no contrato de sociedade originário ou
alterado.
De acordo com o n.º 1, do artigo 209.º, do CSC, a exigibilidade de prestações acessórias fica
dependente da fixação, no contrato social, dos elementos essenciais dessa obrigação e, bem
assim, se as mesmas deverão ser efetuadas onerosa ou gratuitamente.
Neste ponto, Raúl Ventura10 faz a distinção entre a natureza unilateral e bilateral da obrigação
que recai sobre o sócio e o carácter oneroso ou gratuito dessa mesma prestação. Existem
situações em que o sócio, obrigado contratualmente a realizar uma prestação acessória à
sociedade, não tem qualquer contrapartida por parte da sociedade beneficiária, as quais
deverão ser qualificadas de prestações unilaterais e situações em que à prestação do sócio
corresponde uma contrapartida por parte da sociedade beneficiária, prestações que, neste caso,
se qualificarão de bilaterais.
A sociedade beneficiária das prestações poderá, ainda, retribuir onerosamente a prestação
acessória realizada pelo sócio, quer restituindo o dinheiro que lhe foi entregue, acrescido de
juros ou pagando o preço em contrapartida do bem recebido ou do serviço prestado ou, em
alternativa, beneficiar da prestação acessória sem que haja qualquer contrapartida financeira
para o sócio, ou seja, não suportando juros ou não pagando o preço do bem que lhe foi
entregue pelo sócio ou pelo serviço que por este lhe foi prestado. Esta classificação das
prestações acessórias, em onerosas ou gratuitas, tem suscitado algum debate na doutrina,
esclarecendo Manuel António Pita11 que, à luz da classificação do contrato de empréstimo em
oneroso e gratuito "(...) haveria prestação gratuita se a vantagem para a sociedade fosse
apropriada por ela sem contrapartida de uma prestação efetuada ou a efetuar em benefício do
sócio; ao contrário, a prestação seria onerosa se a apropriação pela sociedade se realizasse em
contrapartida de uma prestação a pagar ao sócio".
No caso de ser convencionada a onerosidade da prestação, o n.º 3, do artigo 209.º do CSC
esclarece que a sociedade poderá pagar ao sócio a contraprestação independentemente da
existência de lucros de exercício, o que significa que não é ilegal pagar ao sócio a
contrapartida pela realização dessa prestação acessória, mesmo que esse pagamento afete a
conservação do capital.
Outro dos elementos essenciais da obrigação de prestações acessórias é a determinação da sua
duração, a qual deverá, em regra, estar fixada no contrato, estabelecendo o n.º 5, do artigo
10 RAÚL VENTURA, op. cit., p. 216. 11 MANUEL ANTÓNIO PITA, (abril-junho 2012) “As Prestações Acessórias em Dinheiro”, Revista Revisores e
Auditores, 57, pp. 38-45.
209.º, do CSC a regra supletiva segundo a qual as obrigações acessórias se extinguem com a
dissolução da sociedade. Não faria sentido que as obrigações acessórias perdurassem para lá
da sociedade, pelo que o legislador optou por esclarecer que as obrigações acessórias teriam
como limite máximo a dissolução da sociedade. Assim sendo, nas situações em que o contrato
não estabelece a duração máxima da obrigação acessória, deverá entender-se que esta terá
como limite a dissolução da sociedade.
Poderão, ainda, existir prestações acessórias de natureza continuada ou periódica, sendo
discutido pela doutrina se é admissível a consagração de prestações acessórias instantâneas,
ou seja, aquelas que se executam num só momento ou ato. Para os subscritores deste
entendimento12, uma vez que o CSC não impõe qualquer restrição à liberdade contratual,
deverá entender-se que nada impede que o contrato de sociedade imponha a realização de
uma prestação instantânea, opinião que partilhamos também.
A parte final do n.º 1, do artigo 209.º do CSC estabelece que, quando o conteúdo da obrigação
corresponder ao de um contrato típico, deverá aplicar-se a regulamentação própria e nuclear
desse contrato, a qual poderá ser imperativa ou supletiva. Ou seja, neste caso, embora a fonte
da obrigação acessória seja o contrato de sociedade, são aplicáveis as disposições
regulamentares do contrato típico que esteja em causa. Já no que respeita aos demais
elementos, vigora a regra geral, do direito das obrigações, de autonomia das partes.
Apoiando-se na doutrina alemã, refere Raúl Ventura13 que não é exigível que o contrato de
sociedade fixe, pormenorizadamente, a regulamentação dessas obrigações, sendo apenas
exigível que o mesmo fixe, como decorre do próprio n.º 1, do artigo 209.º, do CSC, os
elementos essenciais dessa obrigação, nomeadamente, o objeto da sua obrigação, a sua
espécie, qualidade e quantidade.
Por último, importa referir que se as cláusulas contratuais não fixarem o conteúdo essencial
da obrigação acessória com o grau de certeza imposto pelo artigo 209.º, n.º 1, do CSC, ficarão
feridas de nulidade, por violação daquela disposição legal, o que poderá implicar, ou não, a
nulidade de todo o contrato.
12 Neste sentido, MANUEL ANTÓNIO PITA, As Prestações…, op. cit., p. 40. 13 RAÚL VENTURA, op. cit., p. 214.
2.3 Sujeitos passivos das prestações acessórias
Os sujeitos passivos da obrigação de prestações acessórias são os sócios obrigados à
realização destas prestações, assumindo a sociedade o papel de sujeito ativo da prestação,
enquanto beneficiária das mesmas.
Se relativamente ao sujeito ativo da prestação acessória não se suscitam grandes dúvidas, o
mesmo não se pode dizer do sujeito passivo. Desde logo, e conforme anteriormente aflorado,
o artigo 209.º, n.º 1, primeira parte, do CSC estabelece que o contrato de sociedade pode
estipular que todos os sócios ficam obrigados à realização de prestações acessórias ou que
apenas alguns ficam obrigados à sua realização. Ou seja, a lei não impõe a igualdade entre os
sócios, permitindo que o contrato de sociedade imponha a apenas alguns sócios a obrigação
de realização de prestações acessórias. Atenta esta particularidade, a lei impõe a identificação,
no contrato de sociedade, dos sócios obrigados à realização de prestações acessórias, sendo
esse cuidado especialmente evidente no caso das sociedades anónimas, relativamente às quais
o artigo 299.º, n.º 2, alínea c), do CSC estabelece que as ações tituladas por sócios obrigados a
prestações acessórias deverão ser nominativas. É, pois, patente o cuidado do legislador,
relativamente às sociedades anónimas, na identificação dos sócios obrigados à realização de
prestações acessórias, o que bem se compreende, pois, de outro modo, seria impossível
determinar quais são os sócios obrigados à realização destas prestações.
Já no caso das sociedades por quotas, a identificação dos sócios obrigados a prestações
acessórias é mais simples, estabelecendo o artigo 209,º, n.º 1, do CSC, que será obrigado à
prestação acessória o sócio que for titular da quota no momento em que ocorrer o facto
previsto no contrato de sociedade. Existem, contudo, situações em que as prestações
acessórias não acompanham a transmissão das quotas, nomeadamente, quando as prestações
acessórias estão ligadas a uma pessoa em concreto, ou seja, as designadas prestações pessoais,
conforme dispõe o artigo 209.º, n.º 2, do CSC.
2.4 Transmissibilidade das prestações acessórias
Embora o legislador pareça ter pretendido sublinhar a intransmissibilidade das prestações não
pecuniárias, razão pela qual o artigo 209.º, n.º 2, do CSC está redigido na negativa, deverá
concluir-se que, por regra, as prestações acessórias, são transmissíveis, nomeadamente,
aquelas que sejam pecuniárias.14
O mesmo não acontece com a possibilidade do sócio transmitir a obrigação de prestação
acessória, uma vez que a lei nada refere quanto à possibilidade da sua transmissão. Conforme
sublinha Raúl Ventura15, tem-se entendido que a obrigação acessória é parte integrante da
quota, pelo que a mesma só poderá ser transmitida conjuntamente com a quota. Nas situações
em que as prestações acessórias acompanham a transmissão da quota, o sócio cedente deixa
de estar obrigado às mesmas, recaindo essa obrigação sobre o cessionário que fica obrigado,
perante a sociedade, à realização da prestação acessória nos mesmos termos do cedente.
Já nas situações em que, atenta a natureza pessoal da prestação acessória, esta não acompanha
a transmissão da quota, ou o cedente continua, não obstante a transmissão da quota ao
cessionário, obrigado perante a sociedade à realização da prestação acessória ou esta
extingue-se, hipótese que será mais frequente, uma vez que para que a prestação acessória
continue a obrigar o sócio será necessário que uma cláusula contratual estabeleça essa
obrigação.
2.5 Cumprimento da obrigação de prestações acessórias
Vimos que a parte final do n.º 1, do artigo 209.º, do CSC estabelece que são aplicáveis ao
cumprimento das obrigações acessórias as disposições reguladoras do tipo de contrato em
causa, limitada às finalidades ou disposições especiais aplicáveis à obrigação assumida.
Deverá, pois, no cumprimento da obrigação acessória, observar-se primeiro o que esteja
especialmente previsto para esta obrigação e só depois a regulamentação própria do tipo de
contrato e as regras gerais de direito16.
Estabelece o n.º 4, da mesma disposição legal que, salvo estipulação contratual em contrário,
o incumprimento da obrigação acessória não prejudica a situação do sócio enquanto tal, o que
14 RAÚL VENTURA, op. cit., p. 224. 15 RAÚL VENTURA, ibidem, p. 225, refere que a fundamentação para a inseparabilidade entre a obrigação
acessória e a respetiva quota poderia "(…) ser de duas ordens: ou incidir sobre a inseparabilidade da obrigação
acessória e respetiva quota, ou consistir em características especiais da própria obrigação acessória. Uma vez
que, em princípio, as obrigações acessórias são transmissíveis com a quota, parece preferível utilizar para aquele
efeito a inseparabilidade.". 16 Sobre a dificuldade prática de conjugação entre as normas reguladoras da obrigação assumida e da
regulamentação própria do tipo de negócio assumido, RAÚL VENTURA, op. cit., p. 228.
significa que o incumprimento destas obrigações é sancionado através do regime próprio das
obrigações. No entanto, os sócios poderão estabelecer, no contrato de sociedade, que o
incumprimento da obrigação acessória tenha consequências na situação do sócio na
sociedade. Importa, contudo, referir que a perda da qualidade de sócio impede, na maioria das
situações, a realização das prestações acessórias, o que apenas não acontecerá quando,
conforme anteriormente referido, atenta a natureza pessoalíssima da prestação acessória, o
cedente da quota continue obrigado perante a sociedade à sua realização.
Regime Contabilístico das Prestações Suplementares e das Prestações Acessórias
3. Contabilização das prestações suplementares e das prestações acessórias sob o regime
das prestações suplementares
3.1.1 Na perspetiva da sociedade beneficiária
Conforme decorre da análise do regime societário das prestações suplementares, a sociedade
beneficiária das prestações suplementares não assume, perante os sócios, qualquer obrigação
de restituição dos créditos decorrentes da realização destas prestações. O mesmo sucede com
as prestações acessórias que sigam o regime das prestações suplementares17. A inexistência de
uma obrigação, por parte da sociedade beneficiária, de restituição destas prestações, quer
através da restituição do capital entregue à sociedade, quer através do pagamento de juros e,
simetricamente, a inexistência, na esfera dos sócios, e até à deliberação que determine a sua
restituição, de um direito de crédito sobre a sociedade, leva-nos a acompanhar a doutrina18
que sustenta que estas prestações têm a natureza de capitais próprios da sociedade e não de
passivos financeiros.
Deverá, pois, distinguir-se dois momentos: o momento que medeia entre a realização da
prestação e a deliberação que determine a restituição das prestações suplementares e o
momento posterior à deliberação que determine a restituição de prestações suplementares.
No primeiro momento, o que existe é uma expetativa, por parte do sócio, de que a sociedade
beneficiária poderá, futura e eventualmente, deliberar a restituição das prestações
suplementares ou das prestações acessórias, sob o regime das prestações suplementares,
expetativa essa que é equiparável, por exemplo, à expetativa de um sócio receber dividendos.
Num segundo momento, após a deliberação, por parte da sociedade beneficiária, que
determine a restituição das prestações suplementares ou das prestações acessórias, sob o
mesmo regime legal, nasce, na esfera no sócio, um direito de crédito oponível à sociedade e,
consequentemente, suscetível de transmissão a terceiros.
17 As prestações acessórias seguem o regime das prestações suplementares quando tiverem i) dinheiro por objeto;
ii) não vencerem juros a favor do sócio prestador; iii) a sua devolução ficar dependente de deliberação dos sócios
nos termos previstos no artigo 213.º do CSC e iv) ficar sujeita à intangibilidade do capital social. 18 MANUEL ANSELMO TORRES, op. cit., p. 913.
Embora seja possível, em abstrato, conceber-se situações em que a restituição das prestações
suplementares ou das prestações acessórias, sob o mesmo regime, ocorra num curto período
de tempo, não podemos deixar de ter em atenção que, contrariamente ao passivo, em que
existe, ab initio, uma obrigação de restituição dos recursos entregues à sociedade, em regra,
associada ao pagamento de juros como forma de remuneração desses mesmos capitais, a
restituição de prestações suplementares ou das prestações acessórias, sob o mesmo regime,
está, como vimos, dependente de deliberação da sociedade e não pode ser remunerada através
do pagamento de juros, o que inviabiliza, do nosso ponto de vista, o enquadramento destas no
passivo19.
Aqui chegados, podemos concluir que, na perspetiva da sociedade beneficiária, as prestações
suplementares e as prestações acessórias, sob o mesmo regime legal, deverão ser registadas na
conta 53 (Outros Instrumentos de Capital Próprio)20. Esta conclusão é suportada nas contas da
classe 5 e nas notas de enquadramento, aprovadas pela Portaria n.º 1011/2009, de 9 de
setembro, nomeadamente, nas notas enquadramento à conta 53.
3.1.2 Na perspetiva dos sócios
Conforme já referido, os sócios que realizam prestações suplementares ou prestações
acessórias, sob o mesmo regime, não possuem, perante a sociedade à qual aportaram estas
prestações, um direito crédito que possa ser exigido unilateralmente, estando a sua restituição
dependente de deliberação. No entanto, e conforme também já referimos, se e quando a
sociedade determinar a restituição das prestações suplementares ou das prestações acessórias,
sob o mesmo regime legal, estas não serão remuneradas através do pagamento de juros, uma
vez que o seu pagamento se encontra vedado pelo disposto no artigo 210.º, n.º 5, do CSC.
Nesse pressuposto, as prestações suplementares constituem, para os sócios que as realizam,
um ativo financeiro que deverá ser registado como um custo adicional do investimento
financeiro na sociedade participada por débito numa conta 41 (Investimentos Financeiros)
para a subsequente aplicação do método de equivalência patrimonial. O que significa que o
19 Sobre esta problemática cfr. também FERNANDO CARREIRA ARAÚJO; ANTÓNIO FERNANDES DE OLIVEIRA, op.
cit., p. 688.
20 Neste sentido MANUEL ANSELMO TORRES, op. cit., p. 914 e JOÃO PEDRO SANTOS (julho-dezembro de 2012),
"Pareceres - Menos-Valias decorrentes da alienação de Prestações Suplementares", Ciência e Técnica Fiscal, n.º
429, pp. 285-293.
investimento é inicialmente reconhecido pelo custo e, posteriormente, ajustado em função das
alterações verificadas, após a aquisição, na quota-parte do sócio nos ativos líquidos da
investida.
Coloca-se, contudo, a questão de saber se estes investimentos deverão ser contabilizados na
mesma conta das partes de capital ou numa conta autónoma para que seja possível segregar o
custo de aquisição das partes de capital dos demais investimentos financeiros. Sobre esta
matéria acompanhamos Manuel Anselmo Torres21 quando este autor refere que as boas
práticas contabilísticas aconselham a inscrição segregada, em subcontas 41, do custo de
subscrição de aquisição das partes de capital e dos custos decorrentes da realização de
prestações suplementares e diríamos nós também das prestações acessórias, sob o regime de
prestações suplementares, por forma a distinguir o custo de aquisição das partes de capital,
por um lado, e das prestações suplementares ou acessórias, sob o mesmo regime, por outro.
Consideramos, pois, atenta a diferença entre titularidade de partes de capital e titularidade do
crédito por prestações suplementares ou de prestações acessórias, sob o mesmo regime das
prestações suplementares, que o registo contabilístico destes créditos deverá ser efetuado
numa conta segregada das "partes de capital", ou seja, deverá ser efetuado na conta 4155
(Outros Investimentos Financeiros - Prestações Suplementares).
3.2 Contabilização das prestações acessórias
3.2.1 Na perspetiva da sociedade beneficiária
Para que possamos melhor compreender o tratamento contabilístico das prestações acessórias,
devemos, em primeiro lugar, socorrer-nos da distinção efetuada, quer no artigo 209.º, n.º 1, do
CSC para as sociedades por quotas, quer no artigo 287.º, n.º 1, do CSC, para as sociedades
anónimas, entre prestações acessórias gratuitas e onerosas, pois, é desta distinção que
resultará o enquadramento das mesmas no "Capital Próprio" ou no "Passivo" da sociedade
beneficiária. Conforme tivemos oportunidade de referir aquando da diferenciação destes dois
tipos de prestações, quando a prestação acessória é gratuita, a sociedade beneficiária não
assume, perante o sócio, qualquer contrapartida financeira decorrente da realização da
21 MANUEL ANSELMO TORRES, op. cit., p. 915.
prestação acessória, ou seja, a sociedade não paga qualquer quantia em troco da prestação
(bem entregue ou serviço prestado) ou não suporta os juros relativos às quantias entregues. Já
quando a prestação acessória é onerosa, à prestação realizada pelo sócio corresponde uma
contraprestação financeira por parte da sociedade beneficiária, o que significa que a sociedade
retribui financeiramente a prestação recebida, quer pagando o preço do bem ou serviço, quer
suportando o juro sobre as quantias entregues.
Esta diferenciação entre prestações acessórias gratuitas e onerosas e o facto de as segundas
terem de ser pagas aos sócios independentemente da existência de lucros leva-nos a
acompanhar a doutrina que sustenta que as prestações acessórias onerosas deverão ser
enquadradas contabilisticamente como passivo da sociedade beneficiária, ou seja, na conta 25
(Financiamentos Obtidos) 22.
Relativamente às prestações acessórias gratuitas, uma vez que a sociedade não entrega ao
sócio, em contrapartida da prestação recebida, qualquer contraprestação, deverão estes
créditos ser enquadrados no capital próprio da sociedade beneficiária e registados numa
subconta apropriada da conta 53 (Prestações Suplementares)23 e não na subconta 51 (Capital)
atenta a distinção entre "Partes de Capital" e "Capital Próprio".
3.2.2 Na perspetiva dos sócios
No âmbito do POC, não existia, na perspetiva do sócio prestador, uma conta ou subconta
específica para registo contabilístico dos créditos por prestações acessórias. Entendia-se,
contudo que, simetricamente ao registo destas prestações na sociedade beneficiária, na
perspetiva do sócio prestador, os créditos por prestações acessórias deveriam ser registados
22 No âmbito do POC, a Comissão Executiva da CNC através do n.º 17/96, de 28 de fevereiro de 1996
pronunciou no sentido de enquadrar estas prestações no Passivo (Conta 25). Importa, contudo, referir que este
parecer traça a fronteira entre prestações acessórias gratuitas e onerosas na existência ou não de uma obrigação
de restituição destas prestações aos sócios. Este entendimento é criticado por Manuel António Pita, As
Prestações…, op. cit., p. 45, por entender que as prestações acessórias pecuniárias são sempre reembolsáveis,
com exceção para as designadas "prestações acessórias a fundo perdido", razão pela qual este autor considera
que a fronteira entre prestações acessórias gratuitas e onerosas deve ser traçada com recurso à classificação do
contrato de empréstimo, ou seja, as prestações acessórias serão onerosas se à prestação acessória obtida pela
sociedade beneficiária corresponder uma prestação a pagar ao sócio e será gratuita quando à prestação obtida
pela sociedade não corresponder qualquer prestação a favor do sócio. 23 Neste mesmo sentido pronuncia-se MANUEL ANTÓNIO PITA, As Prestações…, op. cit., p. 45, referindo este
autor que esta subconta deverá ser designada de "Prestações Acessórias Gratuitas".
numa conta distinta da conta 41 (Investimentos Financeiros24 e subconta 411 - Partes de
Capital)25.
Acompanhando o entendimento de Manuel António Pita26 que considera que o critério
diferenciador entre prestações acessórias onerosas e gratuitas assenta na existência ou
inexistência de uma contrapartida na esfera do sócio prestador, entendemos que as prestações
acessórias onerosas, ou seja, aquelas relativamente às quais a sociedade assume uma
contraprestação a favor do sócio, deverão ser registadas na conta 413 (Investimentos em
entidades conjuntamente controladas). Já relativamente às prestações acessórias gratuitas, ou
seja, aquelas em que o sócio não beneficiará de qualquer contraprestação por parte da
sociedade beneficiária, consideramos que deverão ser registadas na conta 4155 (Outros
Investimentos Financeiros - Prestações Suplementares / Prestações Acessórias). Ou seja, em
nossa opinião, deverá separar-se contabilisticamente os créditos por prestações acessórias das
partes de capital (registadas na conta 411 (Partes de Capital). Afastamo-nos, pois, da doutrina
acolhida, nomeadamente, pelo Parecer do CEF n.º 14/2010, de 24 de fevereiro, no qual se
sustenta que as prestações acessórias gratuitas deveriam ser registadas, na perspetiva do sócio
prestador, na conta 411 (Partes de Capital) e as onerosas na Conta 413 (Empréstimos de
Financiamento). Conforme tivemos já oportunidade de observar o enquadramento das
prestações acessórias gratuitas na conta 411 (Partes de Capital) parte do pressuposto, errado,
em nossa opinião, segundo o qual as partes de capital e os créditos por prestações acessórias
são incindíveis, entendimento que não se coaduna com a realidade, razão pela qual
consideramos que estes créditos deverão ser registados numa conta própria e distinta das
partes de capital.
24 Conta afeta às aplicações financeiras de caráter permanente. 25 Neste sentido JOSÉ AZEVEDO RODRIGUES, op. cit., p. 6, no qual este autor cita também o entendimento do
Prof. Doutor Rogério Fernandes Ferreira. 26 MANUEL ANTÓNIO PITA, As Prestações…, op. cit., p. 41.
Capítulo IV - Regime Tributário das Prestações Suplementares e Acessórias sob o
Regime das Prestações Suplementares
4.1 Na perspetiva da sociedade beneficiária
O Código do IRC, na redação anterior à entrada em vigor da Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro,
que procedeu à reforma do IRC, não esclarecia, expressamente, se as variações patrimoniais
decorrentes da realização e restituição de prestações suplementares ou de prestações
acessórias, sob o mesmo regime legal, estavam excluídas de tributação, uma vez que não fazia
referência expressa a estas prestações. Contudo, entendia alguma doutrina27 que esta exclusão
de tributação decorria quer do artigo 21.º, n.º 1, alínea a), sob a epígrafe "Variações
Patrimoniais Positivas" do Código do IRC, quer do artigo 24.º, alínea c), do Código do IRC,
sob a epígrafe "Variações Patrimoniais Negativas". Não obstante as referidas disposições
legais do Código do IRC não se referissem, expressamente, às prestações suplementares,
sustenta Manuel Anselmo Torres28 que as prestações suplementares são entradas feitas pelos
titulares do capital (social) com a natureza de capital (próprio) da sociedade, e a sua
restituição são saídas de dinheiro a favor dos mesmos. Ou seja, para este autor, embora o
Código do IRC não se refira, expressamente, às prestações suplementares, deverá entender-se
que as referências nos artigos 21.º e 24.º do CIRC a "entradas feitas pelos titulares do capital"
abrangem também estas prestações.
Encontramo-nos, pois, em condições de concluir que, até à entrada em vigor da Lei
n.º 2/2014, de 16 de janeiro, o englobamento das "entradas de capital" no âmbito das
variações patrimoniais positivas e negativas - excluídas de tributação - significa que os
aumentos e as reduções do capital próprio originados pelas prestações suplementares e
acessórias, sob o mesmo regime, não devem ser considerados lucros, sendo, assim, neutra, do
ponto de vista fiscal, a sua entrada na esfera da sociedade, bem como a sua restituição ao
sócio prestador.
Embora a nova redacção dos artigos 21.º e 24.º do Código do IRC, introduzida pela Lei
n.º 2/2014, de 16 de janeiro, continue a não esclarecer, de forma expressa, se as variações
patrimoniais positivas e negativas decorrentes da realização e restituição das prestações
27 MANUEL ANSELMO TORRES, op. cit., p. 915. 28 MANUEL ANSELMO TORRES, ibidem, 916. No mesmo sentido pronunciaram-se FERNANDO CARREIRA ARAÚJO
E ANTÓNIO FERNANDES DE OLIVEIRA, op. cit., pp. 716 e 717.
suplementares ou das prestações acessórias, sob o regime das prestações suplementares,
concorrem para a determinação do lucro tributável, não vemos razão para nos afastarmos do
entendimento que já era acolhido pela doutrina relativamente à anterior redação destas
disposições legais. Ou seja, em nossa opinião, o Código do IRC, ainda que de forma não
expressa, exclui as variações patrimoniais positivas e negativas decorrentes da realização das
prestações suplementares e das prestações acessórias, sob o mesmo regime, da determinação
do lucro tributável, no pressuposto de que estas prestações têm em vista o reforço de capitais
próprios da sociedade beneficiária.
4.2 Na perspetiva dos sócios
De acordo com o regime que vigorou até à entrada em vigor da Lei n.º 2/2014, de 16 de
janeiro, se a sociedade já tivesse deliberado a restituição das prestações suplementares, a
transmissão, por parte do sócio, do crédito por prestações suplementares não concorria para o
saldo das mais e menos-valias fiscais embora pudesse constituir, por força do disposto no
artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC, uma perda, que concorria para a formação do lucro
tributável, ainda que limitada a cinquenta por cento.29 Não restam, pois, dúvidas de que o
artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC, na redação introduzida pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de
dezembro, regulava, expressamente, o tratamento fiscal, em sede de IRC, das perdas
decorrentes da realização de prestações suplementares e, diríamos nós, as prestações
acessórias que seguissem o mesmo regime, limitando o seu concurso para a formação do
lucro tributável em apenas cinquenta por cento.
Com a entrada em vigor da Lei 2/2014, de 16 de janeiro, o artigo 45.º do Código do IRC foi
revogado, sendo introduzido um novo artigo 23.º-A no Código do IRC, disposição legal que
regula agora os "encargos não dedutíveis para efeitos fiscais". Com a entrada em vigor do
artigo 23.º - A, do Código do IRC, as menos-valias e outras perdas decorrentes da realização
de prestações suplementares ou de prestações acessórias sujeitas ao regime das prestações
suplementares abrangidas pelo regime da participation exemption deixaram de relevar para
efeitos de apuramento do lucro tributável. 30
29 O artigo 42.º, n.º 3, do Código do IRC, na redação dada pela Lei n.º 32.º-B/2002, de 30 de dezembro não fazia
referência às prestações suplementares, só tendo sido introduzida com a Lei n.º 60.º-A/2005, de 30 de dezembro. 30 Relatório Final da Comissão do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas - 2013, 30 de junho de
2013, p. 107.
A atual redação do artigo 23.º - A, n.º 2, do Código do IRC permite-nos concluir, através de
uma leitura a contrario sensu desta disposição legal que, nos casos em que não estejam
reunidos os pressupostos legais para benefício da participation exemption, as menos-valias e
outras perdas relacionadas com instrumentos de capital próprio concorrem, na sua totalidade,
para a formação do lucro tributável. Na atual redação desta disposição legal, são
individualizadas, claramente, as "menos-valias e outras perdas relativas a instrumentos de
capital próprio", o que nos leva a concluir, acompanhando a jurisprudência do CAAD
relativamente ao anterior artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC, que as menos-valias e perdas
com as prestações suplementares e acessórias, sob o mesmo regime legal, as quais são
enquadradas no capital próprio da sociedade beneficiária, concorrem para a formação do lucro
tributável.
4.3 Encargos financeiros suportados com a realização de prestações suplementares e de
prestações acessórias sob o mesmo regime legal
A possibilidade de a sociedade que recorre a capitais alheios, suportando encargos
financeiros, nomeadamente, juros, para, posteriormente, realizar prestações suplementares ou
prestações acessórias, sob o regime das prestações suplementares, em benefício das
sociedades suas participadas tem sido objeto de grande debate, quer na doutrina, quer em
conflitos que opõem os contribuintes à Administração Tributária. O âmago da questão está em
saber se uma sociedade quando se financia, perante terceiros, suportando os juros respetivos e
depois entrega esses recursos, sob a forma de prestações suplementares ou de prestações
acessórias, sob o regime das prestações suplementares, a sociedades suas participadas está ou
não a exercer a sua atividade produtiva, ou seja, se estas prestações são, ou não, realizadas
para manutenção da sua fonte produtora e, consequentemente, se estes gastos são dedutíveis
na determinação do lucro tributável. Importa, pois, debruçarmo-nos sobre a interpretação do
artigo 23.º do Código do IRC, sob a epígrafe "gastos e perdas".
O artigo 23.º, do Código do IRC, na redação introduzida pela Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro,
que aprovou a reforma do IRC, veio consagrar um princípio geral segundo o qual, na
determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos relacionados com a atividade
do sujeito passivo, desde que por este incorridos ou suportados. Recorde-se, a este propósito,
que esta disposição, na redação que vigorou até à entrada em vigor da Lei n.º 2/2014, de 16 de
janeiro, fazia depender a aceitação dos gastos da densificação do conceito indeterminado de
"indispensabilidade". Para melhor concretização dos gastos que esta disposição legal
considerava ilegíveis para a manutenção da fonte produtora e para a obtenção de rendimentos,
o n.º 1, do artigo 23.º do Código do IRC, elencava, ainda que de forma meramente
exemplificativa, como demonstra a utilização do advérbio "nomeadamente", diversos
exemplos dos gastos que seriam fiscalmente aceites. Em face da dificuldade de concretização
do critério de “indispensabilidade”, a jurisprudência tem firmado, consistentemente, uma
linha interpretativa na qual se sustenta que este critério foi criado para impedir a consideração
fiscal de gastos que não se inscrevem no âmbito da atividade das empresas sujeitas a IRC, isto
é, encargos que foram incorridos no âmbito da prossecução de interesses alheios, mormente
dos sócios. Sobre a concretização do conceito de "indispensabilidade", utilizado pelo artigo
23.º, do Código do IRC, na redação que vigorou até 2014, pronunciou-se a jurisprudência dos
Tribunais Superiores31 e a doutrina32 concluindo que a aceitação dos gastos depende,
essencialmente, da demonstração de que os gastos incorridos são aptos à atividade
desenvolvida pela sociedade, ou seja, que os gastos visam prosseguir o interesse da sociedade
e a obtenção de lucro e não interesses alheios à atividade da sociedade e do seu escopo
lucrativo. Podemos, pois, concluir que o artigo 23.º do Código do IRC, na redação que
vigorou até à entrada em vigor da Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro, ao restringir os gastos
fiscalmente aceites àqueles que fossem indispensáveis à obtenção de rendimentos e à
manutenção da fonte produtora apenas tinha por finalidade evitar que a sociedade incorresse
em gastos no interesse exclusivo dos seus sócios.
Transpondo para o objeto do presente estudo, quando uma sociedade recorre a capitais
alheios, suportando encargos financeiros para realizar, posteriormente, prestações
suplementares ou prestações acessórias, sob o mesmo regime, em favor das suas participadas,
reforçando os capitais próprios destas, não o está a fazer de forma desinteressada ou alheia ao
seu escopo lucrativo. Pelo contrário, quando uma sociedade incorre em encargos financeiros
para realizar prestações suplementares ou acessórias, sob o mesmo regime, pretende, através
desse meio, reforçar os capitais próprios da sociedade participada com vista à futura obtenção
de lucros, quer através das mais-valias resultantes da transmissão de partes de capital, quer
31 cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte proferido em 12 de janeiro de 2012 no processo n.º
00624/05.0 BEPRT e disponível em: www.dgsi.pt. 32 ANTÓNIO MOURA PORTUGAL, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Almedina,
2004, pp. 112 e ss.
através da distribuição de lucros. Deverá, pois, em nossa opinião, considerar-se que, mesmo
nas situações em que os recursos financeiros, obtidos junto de terceiros, para a realização de
prestações suplementares ou prestações acessórias sob o mesmo regime, não são aplicados
diretamente na atividade da sociedade que recorre aos capitais alheios, mas nas suas
participadas, a sociedade que suporta os gastos, nomeadamente, através do pagamento de
juros, está a prosseguir a sua atividade lucrativa.
Foi, pois, num contexto de incerteza e de querela doutrinária e jurisprudencial quanto à
concretização do conceito de indispensabilidade dos gastos que a Comissão de Reforma do
IRC veio propor a alteração da redação do artigo 23.º do Código do IRC no sentido de uma
maior uniformização com a terminologia contabilística, substituindo a terminologia "partes de
capital" por "instrumentos de capital próprio". Em nossa opinião, se dúvidas existiam, até
2014, quanto ao enquadramento dos encargos financeiros suportados com as prestações
suplementares e as prestações acessórias, sob o mesmo regime, nos gastos fiscalmente aceites
ao abrigo do artigo 23.º do Código do IRC, desde a entrada em vigor Lei n.º 2/2014, de 16 de
janeiro, foram dissipadas quaisquer dúvidas de que os referidos gastos têm por finalidade
"garantir os rendimentos sujeitos a IRC". Com efeito, embora num primeiro momento, a
sociedade que reforça os capitais próprios da sociedade participada não obtenha, de forma
direta e imediata, rendimentos do seu investimento financeiro, esses rendimentos poderão ser
gerados futuramente, nomeadamente, através da distribuição de lucros.33
Consideramos, pois, acompanhando a doutrina e a jurisprudência que já se pronunciava nesse
sentido relativamente à anterior redação do artigo 23.º do Código do IRC, que a expressão
"para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC" deverá ser interpretada no sentido de
que são dedutíveis os gastos incorridos pela sociedade, desde que estes se mostrem, em
abstrato, suscetíveis de gerar rendimentos futuros para a sociedade que realiza prestações
suplementares ou prestações acessórias, sob o regime das prestações suplementares.34
Chegamos, assim, à conclusão que, ainda que levantando algumas dificuldades
interpretativas, o artigo 23.º do Código do IRC, na redação que vigorou até 2014, apenas
procurava evitar a utilização abusiva dos gastos por parte das sociedades, ou seja, evitar que
os fundos fossem aplicados fora da sua atividade produtiva e no exclusivo interesse dos
33 Neste mesmo sentido pronunciou-se MANUEL ANSELMO TORRES, op. cit., p. 917. 34 Sobre esta questão e pronunciando-se em idêntico sentido pode ler-se a decisão do Centro de Arbitragem
Administrativa proferido no âmbito do processo n.º 12/2013-T, em 8 de julho de 2013, o acórdão proferido no
processo n.º 570/2015-T, em 8 de fevereiro de 2016, em especial pp. 24 e ss., bem como o Acórdão proferido,
em 14 de outubro de 2013, no processo n.º 39/2013-T, ambos disponíveis em: https://www.caad.org.pt/.
sócios. Não restam, pois, em nossa opinião, quaisquer dúvidas de que os juros suportados por
uma sociedade em favor da sua participada são dedutíveis a coberto do disposto no artigo
23.º, n.º 1 e do n.º 2, alínea c), do Código do IRC. Se este raciocínio era válido antes da
entrada em vigor da Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro ficou, em nossa opinião, ainda mais
evidente com a nova redação do artigo 23.º do Código do IRC.
4.4 Das menos-valias com prestações suplementares e das prestações acessórias, sob o
mesmo regime legal
Por último, importa debruçarmo-nos sobre o tratamento fiscal das, eventuais, menos-valias
decorrentes das prestações suplementares e acessórias, sob o mesmo regime.
Conforme referido anteriormente, pode acontecer que o sócio (sociedade participante)
pretenda, após a deliberação que determine a restituição das prestações suplementares ou
acessórias, sob aquele regime, transmitir a terceiros o crédito que detém sobre a sociedade
beneficiária daquelas prestações. Através desta operação a sociedade participante pode apurar
uma menos-valia.
Após a entrada em vigor da Lei n.º 2/2014, de 6 de janeiro, que instituiu o regime da
participation exemption35, as menos-valias decorrentes da transmissão de prestações
suplementares ou acessórias, sob o mesmo regime, deixaram, desde que reunidos os requisitos
previstos nos artigos 51.º e 51.º - C do Código do IRC, de concorrer para a formação do lucro
tributável. Deverá, pois, concluir-se que, nos casos em que as menos-valias com a transmissão
de prestações suplementares e acessórias, sob o mesmo regime, não se encontrem abrangidas
pela exclusão prevista no artigo 23.º-A, n.º 2, do Código do IRC, que as mesmas serão
dedutíveis a coberto do disposto no artigo 23.º, n.º 2, alínea l), do Código do IRC.
Relativamente às mais-valias, as mesmas apenas poderão ser apuradas em resultado da
transmissão das partes de capital, ações ou quotas, nos termos do artigo 20.º, n.º 1, alínea h),
do Código do IRC.
35 Reportamo-nos à redação do artigo 51.º do CIRC entretanto introduzida pela Lei n.º 7-A/2016, de 20 de
março, que aprovou o Orçamento de Estado para 2016.
Capítulo V - Regime Tributário das Prestações Acessórias
5.1 Variações patrimoniais decorrentes da realização de prestações acessórias gratuitas
Conforme já tivemos oportunidade de referir anteriormente, o artigo 21.º, n.º 1, alínea a), do
Código do IRC, relativo às variações patrimoniais positivas e, simetricamente, o artigo 24.º,
n.º 1, alínea a), do Código do IRC, relativo às variações patrimoniais negativas, estabelecem
que as variações patrimoniais, quer positivas, quer negativas, relativas a entradas de capital
realizadas pelos sócios não concorrem para a formação do lucro tributável.
Se este entendimento é, como vimos, válido relativamente às prestações suplementares e
acessórias, que sigam o mesmo regime, com fundamento no facto de os sócios reforçarem,
por essa via, os capitais próprios da sociedade participada parece-nos ser também válido para
as prestações acessórias que, tais como aquelas, se enquadrem no capital próprio da sociedade
beneficiária. Consideramos, pois, que, também relativamente às prestações acessórias, de
natureza gratuita, se deverá concluir que as variações patrimoniais positivas e negativas
resultantes da sua realização e posterior restituição ficam excluídas da formação do lucro
tributável.
5.2 Prestações acessórias sob a forma de bens imóveis: tratamento fiscal
Como vimos, as prestações acessórias podem ter por objeto dinheiro, serviços prestados pelos
sócios ou bens entregues pelos sócios a favor da sociedade. A prestação acessória poderá,
ainda, materializar-se, nomeadamente, na entrega de um bem imóvel à sociedade36, hipótese
em que se colocam questões sobre qual o tratamento fiscal a conceder a estas prestações.
Atenta a distinção, já realizada no presente trabalho, entre prestações acessórias onerosas e
gratuitas, consideramos que a entrega, a título de prestação acessória, de um imóvel à
sociedade, por parte do sócio, deverá ser qualificada de gratuita nas situações em que o sócio
não recebe o preço do imóvel e de onerosa, nas situações em que a sociedade beneficiária
36 Sobre esta matéria, RAÚL VENTURA, op. cit., p. 210, refere que considera que a prestação acessória poderá ser
realizada logo no momento da celebração do contrato de sociedade, dando como exemplo a subscrição da quota
por valor superior ao nominal, em que o ágio pode ser tomado como prestação acessória, "(...) (como na hipótese
de o sócio entrar para a sociedade, no momento e por força do contrato, com a propriedade de um bem cujo
valor é 1000, para liberar uma quota cujo valor nominal é 100)."
paga o preço do imóvel ao sócio. O artigo 2.º, n.º 1, do Código do Imposto Municipal sobre as
Transmissões Onerosas de Imóveis (Código do IMT) estabelece a regra geral em matéria de
incidência objetiva e territorial deste imposto ao referir que o IMT incide sobre as
transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito,
sobre bens imóveis situados no território nacional, pelo que podemos, desde logo, concluir
que, se o sócio realizar uma prestação acessória, sob a forma de entrega de um bem imóvel à
sociedade, a entrada do bem imóvel na esfera da sociedade não ficará sujeita a este imposto se
a prestação for realizada a título gratuito, uma vez que, neste caso, a sociedade beneficiária
não pagou o preço do imóvel, o que afasta a incidência objetiva deste imposto37. O mesmo já
não sucede quando a sociedade fica obrigada, perante o sócio, a pagar o preço do imóvel. Em
nossa opinião, estas situações deverão ser enquadradas no artigo 2.º, n.º 5, alínea e), do
Código do IMT, uma vez que neste caso estamos perante entradas dos sócios com bens
imóveis para a realização do capital das sociedades comerciais ou civis sob a forma
comercial. Através de uma interpretação meramente literal da lei, poderia concluir-se que o
IMT apenas incidiria sobre a transmissão de bens imóveis para realização do capital social da
sociedade, excluindo a sua transmissão para efeitos de realização das prestações acessórias em
espécie. Consideramos, contudo, não ser esse o sentido da lei, devendo incluir-se nesta
disposição não só as entradas, efetuadas pelos sócios, para realização do capital social
subscrito, mas também as prestações acessórias onerosas que tenham por objeto bens imóveis,
ou seja, em que a sociedade fica obrigada a pagar o preço do imóvel ao sócio.
Em sede de Imposto do Selo (IS), relativamente às prestações acessórias onerosas que tenham
imóveis por objeto, aplicar-se-á a Tabela 1.1 do IS, o que significa que sobre o seu valor
incidirá uma taxa de 0,8%.
Já relativamente às prestações acessórias gratuitas que tenham por objeto bens imóveis,
deverá ser liquidada a taxa de IS de 0,8% prevista na Tabela 1.1, acrescida da taxa de 10%,
prevista na Tabela 1.2 para as aquisições gratuitas, uma vez que estes bens imóveis ficarão,
simultaneamente, sujeitos à taxa que incide sobre as aquisições de bens imóveis e sobre as
aquisições gratuitas de bens.
Por último, importa fazer uma breve referência à hipótese de serem apuradas mais-valias
decorrentes da, eventual, transmissão dos bens imóveis. Em abstrato, podem ser apuradas
37 Cfr. Informação Vinculativa proferida no âmbito do processo n.º 151/2010, e que mereceu o Despacho
concordante da Senhora Subdiretora-Geral dos Impostos da Área do Património de 26 de março de 2010.
mais-valias decorrentes da realização de prestações acessórias, quer no momento em que o
sócio (pessoa singular ou sociedade participante) realiza a prestação acessória, transmitindo o
bem imóvel para a sociedade beneficiária da prestação acessória, quer na eventualidade da
sociedade beneficiária da prestação acessória transmitir a terceiros o bem imóvel adquirido.
No primeiro caso, aplicar-se-ão as regras previstas no Código do Imposto sobre o Rendimento
das Pessoas Singulares (Código do IRS) e no segundo caso as regras do Código do IRC.
5.3 Dedutibilidade dos gastos, das perdas e menos-valias decorrentes da realização das
prestações acessórias
Conforme já referido anteriormente, o artigo 42.º, n.º 3, do Código do IRC, na redação
anterior à entrada em vigor da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro, que aprovou o
Orçamento de Estado para 2006, restringia a relevância fiscal das mais-valias e das menos-
valias à transmissão onerosa de partes de capital que integrassem o ativo imobilizado.
Posteriormente, com a entrada em vigor da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro, o artigo
45.º, n.º 3, do Código do IRC, passou a atribuir relevância fiscal às perdas e menos-valias
relativas a "outras componentes de capital próprio", nomeadamente, relativamente às
prestações suplementares. Com efeito, se observarmos a redação do artigo 45.º, n.º 3, do
Código do IRC, introduzida pela Lei do Orçamento de Estado para 2006, constatamos que
apenas as prestações suplementares passaram a estar, expressamente, incluídas nesta
disposição legal. Não obstante, consideramos que a utilização do advérbio "nomeadamente"
demonstra que o legislador pretendia restringir, a cinquenta por cento, as perdas e menos-
valias com prestações suplementares, para a formação do lucro tributável, bem como as
perdas e menos-valias relativas a quaisquer outras componentes de capital próprio. Nesse
pressuposto, consideramos que esta disposição legal, entretanto, revogada pela Lei n.º 2/2014,
de 16 de janeiro, pretendia abranger não só as prestações suplementares e as prestações
acessórias sujeitas aquele regime legal, como também as prestações acessórias gratuitas.
Posteriormente, e conforme já deixámos anteriormente nota, com a entrada em vigor da Lei
n.º 2/2014, de 16 de janeiro, esta disposição legal foi revogada e introduzido o artigo 23.º-A
do Código do IRC que estabeleceu que não concorrem para a formação do lucro tributável as
menos-valias e outras perdas relativas a instrumentos de capital próprio, na parte do valor que
corresponda aos lucros ou reservas distribuídos ou às mais-valias realizadas com a
transmissão onerosa de partes sociais da mesma entidade que tenham beneficiado, no próprio
período de tributação ou nos quatro períodos anteriores da dedução prevista no artigo 51.º - C.
Consideramos, pois, através de uma leitura a contrario sensu que, a partir da entrada em vigor
da Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro, as perdas e as menos-valias decorrentes de prestações
acessórias que não beneficiem da participation exemption, concorrem, na sua totalidade, para
a formação do lucro tributável.
Conforme já tivemos oportunidade de referir, por força do disposto no artigo 23.º, n.º 1, do
Código do IRC, sob a epígrafe "Gastos e perdas", na determinação do lucro tributável, são
dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou
garantir os rendimentos sujeitos a IRC. Sendo que, por força do disposto no artigo 23.º, n.º 2,
alínea c), do Código do IRC, são dedutíveis no apuramento do lucro tributável os gastos e
perdas, de natureza financeira, nomeadamente, com juros de capitais alheios aplicados na
exploração38.
5.4 Das menos-valias com prestações acessórias
Após a entrada vigor da Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro, que, como vimos, instituiu o regime
da participation exemption, as menos-valias decorrentes da transmissão de acessórias
deixaram de concorrer para a formação do lucro tributável, desde que preenchidos os
requisitos previstos nos artigos 51.º e 51.º - C do Código do IRC. Deverá, pois, concluir-se
que, nos casos em que as menos-valias com a transmissão das prestações acessórias não se
encontrem abrangidas pela exclusão prevista no artigo 23.º-A, n.º 2, do Código do IRC, as
mesmas serão dedutíveis a coberto do disposto no artigo 23.º, n.º 2, alínea l), do Código do
IRC.
Consideramos, pois, que, atenta a natureza de capitais próprios das prestações acessórias
gratuitas na esfera da sociedade beneficiária, não se mostra possível o apuramento de
qualquer mais-valia em resultado da sua transmissão. Com efeito, importa relembrar que
estando em causa prestações que reforçam os capitais próprios da sociedade beneficiária, das
mesmas não decorrerá qualquer benefício para o sócio, razão pela qual se mostra, em nossa
opinião, impossível a futura obtenção de mais-valia decorrente da sua transmissão. A mais-
valia, a existir, apenas poderá ser apurada em resultado da transmissão das partes de capitais,
ou seja, das ações ou quotas.
38 Sobre a dedutibilidade dos juros incorridos com a realização das prestações acessórias vide, entre outros, o já
citado Acórdão proferido pelo CAAD no processo n.º 12/2013-T e disponível em: https://www.caad.org.pt/.