Sobre Agência

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1 Universidade Federal de Minas Gerais Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas Departamento de Sociologia e Antropologia Mestrado em Sociologia &DSLWDOVRFLDOHYLROrQFLD XPDDQiOLVHFRPSDUDGDHPGXDVYLODVGH%HOR+RUL]RQWH por Cláudio Santiago Dias Júnior ’LVVHUWDomRVXEPHWLGDjDYDOLDomR FRPRUHTXLVLWRSDUFLDOSDUDDREWHQomR GR JUDXGH0HVWUHHP6RFLRORJLD 3URI’U)UDQFLVFR&RHOKRGRV6DQWRV Orientador Profa. Dra. Virgínia Torres Schall Co-orientadora Belo Horizonte, Dezembro de 2001

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Explicação de conceitos de agência

Transcript of Sobre Agência

  • 1Universidade Federal de Minas Gerais Faculdade de Filosofia e Cincias Humanas Departamento de Sociologia e Antropologia

    Mestrado em Sociologia

    &DSLWDOVRFLDOHYLROrQFLDXPDDQiOLVHFRPSDUDGDHPGXDVYLODVGH%HOR+RUL]RQWHpor

    Cludio Santiago Dias Jnior

    'LVVHUWDomRVXEPHWLGDjDYDOLDomRFRPRUHTXLVLWRSDUFLDOSDUDDREWHQomR

    GR JUDXGH0HVWUHHP6RFLRORJLD

    3URI'U)UDQFLVFR&RHOKRGRV6DQWRVOrientador

    Profa. Dra. Virgnia Torres Schall Co-orientadora

    Belo Horizonte, Dezembro de 2001

  • 2$*5$'(&,0(1726

    Primeiramente gostaria de agradecer aos meus pais e irmos que sempre me

    apoiaram. Na UFMG, onde constru a minha vida acadmica, vrias pessoas

    contriburam direta ou indiretamente para este trabalho. Em primeiro lugar

    gostaria de agradecer a Francisco Coelho dos Santos que no s me orientou

    como me acolheu em um momento difcil do meu curso de mestrado; ao

    professor Antnio Augusto Pereira Prates por suas indicaes de leituras a

    respeito do conceito de capital social durante o curso de sociologia das

    organizaes em 1999; ao Crisp pela liberao dos dados sobre a

    criminalidade em Belo Horizonte, em especial ao amigo Brulio Figueiredo, que

    com pacincia e disposio tratou os dados sobre violncia que esto neste

    trabalho; aos amigos Marcelo judeu Bernardes, Ablio cear Queiroz e Wilson pato Cruz, que com coragem e afinco me ajudaram na coleta dos dados na Vila Cafezal; com certeza uma grande ajuda! amiga de mestrado e da vida, Clia, pelas longas conversas... a Cirene pela presteza nas solues

    das questes burocrticas que apareceram na reta final do mestrado, e a

    turma, pelos momentos etlicos...

    Ao Centro de Pesquisa Ren Rachou, que me possibilitou novos conhecimentos e me mostrou o quanto

    gratificante fazer cincia, e aos colegas de Ren Ceclia, Ivana, Daniel, Denise e Karina pela agradvel

    convivncia durante dois anos.

    Capes e a Fiocruz, pelas bolsas, que me ajudaram bastante durante o mestrado.

  • 3Agradeo ao professor Antnio Tomasi pelo apoio no s a mim, como a todos os alunos da sociologia do

    trabalho, que se viram rfos com a morte do professor Vincius Caldeira Brant. Confesso que este

    apoio apenas consolidou a nossa percepo sobre a grandeza de seu esprito ...

    URBEL pela liberao dos cadastros dos domiclios das duas vilas estudadas e senhora Edna, lder

    comunitria da Vila Novo Ouro Preto, que nos mostrou todos os meandros da regio.

    Para terminar, destaco trs pessoas em especial:

    9LUJtQLD7RUUHV6FKDOO, que com a sua vontade de produzir cincia, com a sua disposio para o trabalho e sua alegria de viver, no deixou que eu desanimasse. Agradeo tambm a sua confiana em mim, a sua

    pacincia, compreenso e apoio nos momentos difceis...

    9LQtFLXV&DOGHLUD%UDQW (LQPHPRULDQ), que com seu esprito crtico, sua verve cientfica, sua postura poltica, sua tica, me inspiraram e me inspiram... No incio professor e depois amigo... com muita

    saudade que agradeo a ele todos os momentos felizes, profissionais e pessoais, que me marcaram e

    colaboraram para a minha formao como pessoa e como socilogo.

    0DULD-RVp, por tudo...

    Como de praxe, todos os erros, equvocos e eventuais falhas neste trabalho de total responsabilidade

    minha.

  • 41',&(,QWURGXomRS&DStWXOR$JrQFLDHPXGDQoDVRFLDOS 7HRULDVGDDJrQFLDSULQFLSDLVFRUUHQWHVS

    &DStWXOR&DSLWDOVRFLDOFRQFHLWRVHGHILQLo}HVS 3LHUUH%RXUGLHXS -DPHV&ROHPDQS 5REHUW3XWQDPS 8PDYLVmRFUtWLFDGRFRQFHLWRGHFDSLWDOVRFLDOS &DSLWDOVRFLDOHYLROrQFLDS 1RYDVWHQGrQFLDVGDDQiOLVHGDFULPLQDOLGDGHS&DStWXOR0HWRGRORJLDS $VSHFWRVUHOHYDQWHVSDUDDGHILQLomRGRFDSLWDOVRFLDOS $FRQVWUXomRGRTXHVWLRQiULRS 2SODQHMDPHQWRDPRVWUDOS&DStWXOR$QiOLVHGRVGDGRVS $QiOLVHGHVFULWLYDS 'DGRVGHPRJUiILFRVHVyFLRHFRQ{PLFRVS 'DGRVVREUHRFDSLWDOVRFLDOS $QiOLVHIDWRULDOGRVGDGRVS&DStWXOR&RQVLGHUDo}HVILQDLVS%LEOLRJUDILDS$QH[RVS

  • 5,1752'8d2

    Por que algumas localidades tm altas taxas de criminalidade e outras no? Esta

    pergunta h muito vem sendo feita no s por pesquisadores e administradores pblicos,

    mas por toda a populao leiga que, principalmente na ltima dcada, vem assistindo o

    crescimento assustador da violncia. Observando pesquisas de opinio, discursos

    oficiais e promessas eleitorais, notamos que todos buscam por explicaes e possveis

    solues para este grande drama nacional que a violncia, seja ela no espao urbano

    ou rural.

    Tendo em vista estas preocupaes, nosso objetivo perceber, de modo exploratrio, se

    h alguma associao entre o capital social1 e as taxas de criminalidade2, j que nosso

    instrumento de medida de capital social e os dados referentes criminalidade contra

    pessoa no nos permite afirmar categoricamente a influncia de um perante o outro.

    Sendo assim, nosso trabalho est dividido em 5 partes:

    Na primeira parte procuramos demonstrar o processo de consolidao do conceito de

    agncia nas diversas fases da sociedade ocidental; para em um segundo momento

    destacar algumas escolas sociolgicas que trabalharam com o conceito de agncia. Por

    se tratar de um aspecto introdutrio e em um certo sentido perifrico no que diz respeito

    ao cerne deste trabalho, optamos por acolher as anlises de Piotr Sztompka, em sua obra

    $ 6RFLRORJLD GD 0XGDQoD 6RFLDO, por acreditar que ela nos fornece subsdios consistentes aos nossos objetivos e, claro, sem nos esquecermos que outros pontos de

    1 O conceito de capital social que utilizamos tem como matiz Pierre Bourdieu, James Coleman e Robert Putnam. 2 Entre as mais diversas categorias de crimes, elegemos, como alvo do estudo, os crimes contra a pessoa.

  • 6vista so relevantes e necessrios para o avano do debate em torno da mudana social,

    mas por ora, no nos cabe aqui trazer.

    Na segunda parte, tratamos especificamente do conceito de capital social, onde

    destacamos os trs autores bsicos, utilizados em nosso trabalho: Pierre Bourdieu,

    James Coleman e Robert Putnam. Aqui procuramos detalhar principalmente os dois

    ltimos autores, pois foram eles que nos forneceram as idias principais para a

    construo do questionrio utilizado na coleta dos dados e destacamos dois estudos

    realizados nos E.U.A onde os autores correlacionam capital social e violncia.

    Na terceira parte destacamos a metodologia, onde explicitamos o caminho utilizado para

    a construo do questionrio, a escolha das vilas a serem pesquisadas, o clculo

    amostral e a forma de coleta dos dados.

    Na quarta parte desenvolvemos a anlise dos dados. Utilizando o programa estatstico

    SPSS, analisamos o comportamento distinto das duas comunidades diante das situaes

    postas.

    Na quinta e ltima parte procuramos destacar alguns aspectos relevantes em nossas

    anlises que nos permitisse perceber alguma associao entre o volume de capital social

    presentes nas comunidades e as taxas de criminalidade. Assim, reiteramos que o

    objetivo central deste trabalho foi o de consolidar o instrumento de medida de capital

    social e tentar perceber caminhos alternativos para a explicao da violncia no cenrio

    brasileiro.

  • 7&$378/2$*1&,$(08'$1d$62&,$/

    Desde os primrdios que o homem, com sua curiosidade inata, procura compreender o

    mundo a sua volta; esta preocupao advm da busca das causas ltimas dos eventos,

    das foras que movimentam os fenmenos e dos processos que no final influenciam seu

    destino.

    Com estas grandes preocupaes, evidente que o pensamento social e em particular a

    sociologia, se ocupasse em compreender tais indagaes, e que as mesmas indagaes

    se consolidassem como combustvel que move a dinmica social, a operao e a

    transformao da sociedade3. Como sugere Sztompka(1998[1993]), nesta linha

    evolutiva do pensamento humano, a agncia foi gradualmente secularizada, humanizada

    e socializada. Entendemos a agncia como o espao onde se encontram as estruturas

    (capacidade de operao) e os agentes (capacidade de ao); uma fuso de

    circunstncias estruturais e capacidade propulsora. A agncia duplamente

    condicionada, desde cima, pelo equilbrio entre restries e limitaes por um lado;

    recursos e facilitadores propiciadas pelas estruturas por outro; e desde baixo, pelas

    aptides , talentos, habilidades, conhecimento e atitudes dos membros da sociedade;

    bem como organizaes; sejam elas coletividades, grupos ou movimentos sociais.

    Historicamente, a agncia teve incio na esfera do sobrenatural, isto , totalmente

    descolada do mundo humano e social; neste cenrio fantasmagrico, deuses, foras

    animsticas ou foras metafsicas sustentavam a agncia, que operando para alm do

    mundo fsico, controlava e conformava a vida individual e coletiva do homem.

  • 8Em uma etapa posterior da histria do homem, a agncia desce dos cus para habitar

    juntamente com os homens, a terra. As transformaes sociais so aqui relacionadas

    com os processos naturais, fsicos, biolgicos, climticos, geogrficos e astronmicos.

    Temos neste momento, a secularizao da agncia, mas ainda distante da humanidade e

    da sociedade.

    Este processo descrito em poucas linhas, evidentemente, demandou sculos de histria

    para se afirmar como alternativa de explicao dos fatos sociais. Em um momento

    posterior, temos a correlao entre a agncia e o homem, ainda que no a qualquer

    homem. A agncia um recurso de apenas alguns eleitos, como os profetas, heris,

    guerreiros, gnios, descobridores e inventores. As transformaes sociais saram das

    mos destas pessoas que, com seu carisma inato, dado geneticamente, promoviam a

    mudana social. Neste momento histrico, temos a humanizao da agncia mas ainda

    no temos a sua socializao.

    Uma anlise interessante da corrente estrutural-funcionalista demonstra que a

    responsabilidade das mudanas das sociedades (por oposio s mudanas na

    sociedade) estaria nas mos dos indivduos que se rebelam contra o HVWDEOLVKPHQW .

    Este aspecto assim descrito por Dahrendorf: RV GHVYLRV RFRUUHP SRU UD]}HVVRFLRORJLFDPHQWH QmRFRQKHFLGDV HQmRFRQKHFtYHLVeXPYtUXVTXHDWDFDR VLVWHPDTXH YHP GDV SURIXQGH]DV GD SVLTXH LQGLYLGXDO RX GDV UHJL}HV QHEXORVDV GR PXQGRH[WHULRU (DSXG Sztompka, 1998[1993]p.328).

    3 necessrio destacar que este movimento de transformao social acontece independente da teoria.

  • 9Continuando neste caminho evolutivo, com o aparecimento e consolidao da

    sociologia como cincia, h uma reviravolta na percepo da agncia; neste caso ela

    socializada e despersonalizada.

    A agncia corretamente localizada dentro da sociedade, mas o grande problema foi a

    percepo orgnica da sociedade que marcou o nascimento da sociologia. A sociedade

    vista como um corpo social tendo uma totalidade que auto-regula e auto-transforma; a

    sociedade literalmente interpretada como um organismo vivo, que nasce, cresce e se

    desenvolve, requerendo cuidados para que ele no perea.

    Nesta realidade, a agncia um poder recorrente ao organismo social, pODQ YLWDOHVSHFtILFR PDV QmR DQDOLVDGR DGPLWLGD D SULRUL FRPR DOJR TXH VH PDQLIHVWDQHFHVVDULDPHQWH QD YLGD HQDPXGDQoD VRFLDO GHPDQHLUDGLUHFLRQDO H LUUHYHUVtYHO (Sztompka,1998[1993]p.328, grifo do autor)

    Esta viso grandiosa, de um poder acima do bem e do mal, coordenando as vidas dos

    homens, acompanhou o pensamento social por muitos anos; produzindo uma sociedade

    "sem homens"4. Aps anos dominando a teoria sociolgica, esta percepo da agncia

    cai em desuso. A agncia torna-se parte indissocivel das aes dos indivduos, neste

    momento ela humanizada e socializada.

    A figura individual retorna ao cenrio social como agente transformador mas com

    poderes delegados pela sociedade e no mais pela gentica ou coisa que o valha. Na

  • 10

    realidade, estes indivduos so a expresso maior das WHQV}HV HVWUXWXUDLV kQLPRVVRFLDLV H WUDGLo}HV KLVWyULFDV, (Sztompka,1998[1993]p.329), eles agiam como condutores, na realidade, sabiam conformar a realidade para os outros, tinham o SRGHUGH HVWUXWXUDUUHODo}HVVRFLDLVGHDOWHUDURWLSRGHMRJRHPTXHVHHQJDMDPRVDWRUHVGH PDQLSXODU RXPRGLILFDU D GLVWULEXLomRGRV UHFXUVRV H FRQGLo}HVTXHJRYHUQDPDVLQWHUDo}HVRXWURFDVHQWUHRVDWRUHVHQYROYLGRV (Sztompka1998[1993]p.329)

    Com o avano da sociologia, a agncia afasta-se dos lderes sociais e aproxima-se das

    funes sociais, principalmente das que podem efetivamente provocar mudanas

    sociais; neste ponto, emerge a preocupao com a legitimidade de seus "mandarins" e

    das funes.

    Com a transformao da teoria sociolgica a todo vapor, a questo da agncia

    novamente passa por transformaes, sendo que a maior delas a extenso da agncia

    para todos os indivduos, independentemente do VWDWXVou posio na estrutura social. Como diz Sztompka, UHFRQKHFHXVHRyEYLRTXHXPLQGLYtGXRQmRWHPPDLVTXHXPPLQ~VFXOR SRGHU GH GHFLVmR QD PXGDQoD VRFLDO PDV DR PHVPR WHPSR TXH DPXGDQoDVRFLDOGHYHVHUWUDWDGDFRPRUHVXOWDGRFRPELQDGRGDTXLORTXHID]HPWRGRVRVLQGLYtGXRV 'LVWULEXWLYDPHQWH FDGD LQGLYtGXR p SRUWDGRU GH XPD DJrQFLD tQILPDSUDWLFDPHQWH LQYLVtYHO PDV FROHWLYDPHQWH RV LQGLYtGXRV VmR WRGRSRGHURVRV(1998[1993]p.329) Esta profunda transformao do conceito de agncia, teve o apoio de duas cincias

    correlatas sociologia: a economia e a lingistica. Da economia a sociologia

    retrabalhou o conceito da mo-invisvel de Adam Smith, compreendendo assim que

    4 Esta percepo acompanhou diversas matizes do evolucionismo e desenvolvimentismo, transformando-

  • 11

    mltiplas decises podem ser tomadas por mltiplos atores sociais; quanto lingistica,

    a sociologia adaptou e compreendeu como os indivduos podem criar, recriar e

    modificar seu prprio cotidiano similarmente ao que ocorre na linguagem.

    Com este instrumental, a sociologia torna-se mais capaz de compreender os fenmenos

    sociais e, mais especificamente, as possibilidades de mudana social. Na trilha destes

    avanos, temos Merton(1976) com sua noo de efeitos latentes, no pretendidos, da

    ao humana. Com esta teoria, a mudana social se consolida como um UHVXOWDGRDJUHJDGR H KLVWRULFDPHQWH DFXPXODGR GDTXLOR TXH ID]HP WRGRV RV PHPEURV GDVRFLHGDGH FRP EDVH HP VHXV SUySULRV PRWLYRV SDUWLFXODUHV H SURSyVLWRV HJRtVWLFRV (Sztompka,1998[1993],p. 330).

    Apesar desta nfase mertoniana nos aspectos individuais e no pretendidos, devemos

    ressaltar que nem todas as pessoas atuam de maneira isolada; pois a noo de mudana

    planejada e o conceito de ao coletiva fazem parte da realidade moderna, que em um

    certo sentido complementa as mudanas espontneas provocadas individualmente. Esta

    relao concomitante entre a mudana pretendida e no pretendida, entre

    individualidade e coletividade, faz com que a agncia seja materializada nos agentes

    coletivos ou associativos (nem sempre, pois a agncia pode se materializar nos

    indivduos). Neste cenrio, temos mudanas realizadas de cima para baixo, como no

    caso das aes governamentais, das grandes organizaes, etc. Na outra ponta temos

    aes iniciadas de baixo para cima, como as associaes de bairro, os grupos de

    presso, as organizaes no-governamentais, os OREELHVos movimentos sociais, dentre outros. $ FRPSOH[D LQWHUDomR HQWUH HOHV IRUPD R FHQiULR SROtWLFR GDV VRFLHGDGHV

    se ainda em um dos pontos fracos do funcionalismo ortodoxo

  • 12

    FRQWHPSRUkQHDV VHXV UHVXOWDGRV HVSHUDGRV FUX]DQGRVH FRP DV DWLYLGDGHV GLVSHUVDVGRV DWRUHV LQGLYLGXDLV OHYDGDV D FDER QR FHQiULR GD YLGD FRWLGLDQD ,QGLYtGXRV HFROHWLYLGDGHIRUPDPMXQWRVSRUWDQWRRFXUVRVLQXRVRGDKLVWyULDKXPDQD (Sztompka, 1998[1993],p.330)

    Assim temos o combustvel que faz mover a sociedade: a relao ntima entre atores

    individuais e agentes coletivos, que produzem e reproduzem a realidade social. A seguir

    trabalharemos com alguns tericos da mudana social, destacando suas principais

    contribuies para a teoria sociolgica.

    7HRULDVGD$JrQFLD3ULQFLSDLV&RUUHQWHV

    2 FRQFHLWRGHPRUIRJrQHVHHP:DOWHU%XFNOH\Em seu estudo publicado em 19675, Buckley procura, atravs da incorporao da teoria

    das trocas, do interacionismo simblico, da teoria dos jogos e dos modelos de

    comportamento coletivo, revisar as anlises estrutural-funcionalista e a teoria geral dos

    sistemas. Dentro do esquema sistmico, o autor acreditava poder sintetizar os modelos

    de interao em uma teoria fundamental do processo sociocultural.

    6LVWHPD$XWR5HJXODGR0RGHOR(VWUXWXUDO)XQFLRQDOLVWD

    6LVWHPDV0RUIRJrQLFRV0RGHORGH%XFNOH\

    Feedback Negativo Feedback Positivo Sistema Compensatrio Sistema Ampliado(Estrutura Construdas e

    Transformadas) 2 PRGHOR VXS}H XP VLVWHPD GH FRPSRQHQWHV LQWHUDWLYRV HP SHUPDQHQWH DWLYLGDGHFRP XPD IRQWH LQWHUQD GH WHQVmR HVWDQGR R FRQMXQWR HQYROYLGR HP WUDQVDo}HVFRQWtQXDVFRPRVHXYDULiYHODPELHQWHH[WHUQRHLQWHUQRGHWDOPRGRTXHHVWH~OWLPR

  • 13

    WHQGHDVH WRUQDUVHOHWLYDPHQWHPDSHDGRGHDOJXPDIRUPDGHQWURGDHVWUXWXUD DPRUIRJrQHVHVHUHILULUijTXHOHVSURFHVVRVTXHWHQGHPDDSHUIHLoRDURXPRGLILFDUXPDGDGD IRUPD HVWUXWXUD RX HVWDGR GR VLVWHPD (Buckley DSXGSztompka, 1998[1993], p.331)

    O aspecto positivo desta teoria encontra-se nas possibilidades de ao do funcionamento

    social, mas ao mesmo tempo reafirma certos automatismos dos modelos orgnicos e

    mecanicistas que ele queria combater.

    $ VRFLHGDGHDWLYDGH$PLWDL(W]LRQLEtzioni inicia a discusso sobre a agncia propondo uma sociedade ativa, cuja

    essncia est na noo de mobilizao e ativao social. Partindo deste ponto, o autor

    desenvolve a teoria do direcionamento societrio, onde os impulsos mobilizatrios das

    coletividades e das sociedades so os fatores responsveis da transformao social. 1DPHGLGD HP TXH VHPRELOL]D XPD XQLGDGH VRFLDO WHQGH DPRGLILFDU D VXD SUySULDHVWUXWXUDHOLPLWHVEHPFRPRDHVWUXWXUDGDVXSUDXQLGDGHGDTXDOID]SDUWH(Etizioni DSXGSztompka, 1998[1993] , p.332)

    O autor acredita que a sociedade est em permanente movimento, transformando-se

    constantemente, tendo os indivduos como os principais responsveis por estas

    mudanas. A capacidade de transformao dos homens, materializa-se nas

    coletividades, nos grupos e nas organizaes sociais, sendo conceituado de ao

    coletiva.

    5 6RFLRORJ\DQG0RGHUQ6\VWHPV7KHRU\(QJOHZRRG&OLIIV3UHQWLFH+DOO

  • 14

    8PD WHRULD GR GLUHFLRQDPHQWR S}H D TXHVWmR GH FRPR XP GDGR DWRU GLULJH XPSURFHVVR H GH FRPR HOH PRGLILFD D HVWUXWXUD H OLPLWHV GH XPD XQLGDGH $ WHRULD GRGLUHFLRQDPHQWRVRFLHWiULRS}HDOpPGLVVRDTXHVWmRGHFRPRXPDGDGDHVWUXWXUDIRLPRGHODGD FRPR p PDQWLGD FRPR SRGH VHU DOWHUDGD RQGH VH ORFDOL]DP RV IRFRV GHSRGHUTXHPFRPDQGDRFRQKHFLPHQWRHTXHPWHPFDSDFLGDGHGHGHWHUPLQDU(Etzioni DSXGSztompka, 1998[1993],p.332)

    $ODLQ7RXUDLQHHDFRQWULEXLomRIUDQFHVDA partir da dcada de 1970, a escola francesa insere-se no debate sobre a agncia; um

    momento especial, pois sabidamente a Frana um reduto da teoria estruturalista.

    Criticando a postura desenvolvimentista e estruturalista da anlise sociolgica, Touraine

    cria a sociedade autoprodutiva, como um IURQW em defesa da ao. As velhas correntes sociolgicas, de acordo com Touraine, subordinavam o senso de ao coletiva a

    imutveis leis e exigncias histricas, tornando o homem um mero apndice da anlise

    sociolgica.

    Era preciso trazer o homem novamente a cena, como agente da histria, transformador

    da realidade social. Nesse sentido, a sociedade torna-se fruto dos esforos humanos, no

    mais que R UHVXOWDGRLQVWiYHOHEDVWDQWHLQFRHUHQWHGDVUHODo}HVVRFLDLVHGRVFRQIOLWRVVRFLDLV. (Touraine DSXG Sztompka,1998[1993],p.333) Assim, a sociedade torna-se produto da ao coletiva, tendo para o pensador francs, os movimentos sociais como

    vanguarda da transformao social. 2PRYLPHQWRVRFLDOpDQWHVGHWXGRXPDWRUXPDYH] TXH D UHDOLGDGH KLVWyULFD p FRQVWUXtGD DWUDYpV GRV FRQIOLWRV H QHJRFLDo}HV GHPRYLPHQWRVVRFLDLVTXHFRQIHUHPXPDIRUPDVRFLDOHVSHFtILFDjVRULHQWDo}HVFXOWXUDLV (Touraine DSXG Sztompka1998[1993],p.334).Assim sendo, os movimentos sociais

  • 15

    tornam-se fundamentais para a anlise da mudana social. relevante a correlao que

    ele traa ao vincular a decadncia da anlise evolucionista e a ascenso dos movimentos

    sociais como atores principais da realidade social e o surgimento da sociedade ps-

    industrial.

    Esse movimento proporciona o aparecimento das capacidades de autoatividade dos

    atores sociais, tornado-os produtos de sua prpria ao. A escola francesa6 rejeita o vis

    historicista e determinstico da realidade social. Em termos gerais, a mudana social

    tida como um processo de estruturao e reestruturao contnua, onde os atores sociais

    respondem aos problemas e desafios que enfrentam na vida diria. As solues so

    criadas a partir de jogos sociais, das negociaes, barganhas, conflitos e cooperao.

    $WLYLGDGHV FROHWLYDV GHVVH JrQHUR VmR LQHUHQWHPHQWH FULDWLYDV GHYLGRDRPHFDQLVPRGR DSUHQGL]DGR FROHWLYR HP TXH DV GHVFREHUWDV H LQRYDo}HV LQGLYLGXDLV WRUQDPVHSUiWLFDV VRFLDLV FRPSDUWLOKDGDV HPEXWLQGRVH QR VLVWHPD (P FRQVHTrQFLD DVFDUDFWHUtVWLFDV GR VLVWHPD VmR PRGLILFDGDV SRGHQGR UHVXOWDU QD WUDQVIRUPDomR GRVSUySULRV PHFDQLVPRV GH WUDQVIRUPDomR ,QH[LVWH PXGDQoD QHFHVViULD LQHYLWiYHO RXQDWXUDO R PXQGR VRFLDO p IXQGDPHQWDOPHQWH LQGHWHUPLQDGR RX SHOR PHQRVVXEGHWHUPLQDGR WRGD PXGDQoD UHVXOWD GD LQYHQomR FULDomR H LQYHVWLJDomRKXPDQDV ( Sztompka, 1998[1993], p.335)

    Assim, para a escola francesa, o aprendizado coletivo um dos mais importantes

    mecanismos de auto-transformao social.

  • 16

    $QWKRQ\*LGGHQVHDWHRULDGDHVWUXWXUDomRConcomitantemente a reao francesa em defesa da ao, Giddens surge na Inglaterra

    propondo a teoria da estruturao; como uma forma de afastamento das correntes

    sociolgicas que defendiam a reificao das totalidades sociais e a determinao social

    dos atores.

    Criticando a noo de estrutura, Giddens afirma que a sociedade fluida, mutvel e

    totalmente contingente da realidade social; ele destaca que o nico substrato ontolgico

    so as aes e interaes dos sujeitos humanos. A partir deste ponto, Giddens sugere a

    transformao da noo esttica de estrutura pela dinmica do conceito de estruturao,

    tida como a conduta da coletividade humana. O objetivo central da proposta de Giddens

    a produo e a reproduo da sociedade. Para Giddens, analisar a estruturao de um

    sistema social estudar as diversas maneiras na qual ele produzido e reproduzido,

    interagindo com as vias de aplicao das regras e recursos generativos em contextos

    impremeditados. As regras e recursos usados pelos atores so reformulados pelo prprio

    uso, DVSURSULHGDGHVHVWUXWXUDLVGRVVLVWHPDVVRFLDLVVmRWDQWRPHLRTXDQWRSURGXWRGDV SUiWLFDV TXH FRQVWLWXHP RV SUySULRV VLVWHPDV (Giddens DSXGSztompka,1998[1993],p.336). Aqui temos a explicitao do conceito da dualidade da

    estrutura. Para Giddens, o agente, seja individualmente seja em grupos, fundamental

    na teoria da estruturao; so suas aes cotidianas que constituem o cerne da teoria. De

    maneira surpreendente, Giddens eleva o indivduo, assegurando-o na conscincia das

    condies e conseqncias dos seus atos.

    6 Esta corrente da escola francesa centrada em Crozier e Friedberg, cuja a problemtica relacionada s organizaes, destacando a interdependncia entre atores e sistemas.

  • 17

    Evidente que Giddens no trilha o caminho da ingenuidade afirmando total

    conhecimento de todas as motivaes dos atos bem como a total conscincia destes atos,

    por parte dos atores sociais. Admite-se que em algum momento no h o conhecimento

    das condies e que alguns resultados das aes no so previstos.

    Como resultado temos que, apesar da histria ser construda a partir da contingncia da

    atividade humana, criada e recriada a partir das aes e atividades intencionais

    produzidas pelos indivduos, ela no um projeto premeditado, mas sim o resultado de

    esforos que buscam uma direo mais consciente.

    Outro aspecto relevante destacado por Giddens, e muito pouco relevado pelos

    socilogos, est na (aparentemente simples) constatao da implicao do tempo e

    espao na ao humana. Esta relao fundamental para uma anlise acerca da teoria da

    agncia, como destaca Giddens, D FRUSRUDOLGDGH LPS}H OLPLWDo}HV HVWULWDV VREUH DVFDSDFLGDGHV GH PRYLPHQWR H SHUFHSomR GR DJHQWH KXPDQR (DSXG Sztompka, 1998[1993],p.336) Com Giddens a agncia corporificada nos seres humanos

    individuais, retira-se dos sistemas e das coletividades a responsabilidade da mudana,

    na conduta cotidiana das pessoas comuns, quase sempre sem a preocupao reformista,

    que molda e transforma as sociedades humanas.

    $ HVFRODGH8SSVDODDWHRULDGRVVLVWHPDVQRUPDWLYRVA teoria dos sistemas normativos, na figura de Tom Burns e Helena Flam(1987),

    procura construir uma ponte na dicotomia entre agncia-estrutura, mas de maneira

    distinta de Giddens; eles afirmam que no so os atores que conformam, mas as

    estruturas que so conformadas, sendo vistas como um complexa rede de relaes.

  • 18

    Para a escola sueca7, toda e qualquer atividade humana, em toda a sua magnitude,

    conformada por normas e sistemas normativos previamente determinados pela

    coletividade. Como ressalta Sztompka (1998[1993]), a grande contribuio desta

    corrente foi a sofisticada anlise das regras sociais, que produzem as estruturas da

    histria humana.

    Burns e Flam (1987) dividem a estrutura em trs grupos: sistemas, regimes e gramticas

    normativas. O sistema normativo consiste em regras inter-relacionadas com o contexto

    em que ela est inserida e temporalmente especificadas para regular as transaes

    sociais; os regimes normativos so decisivos, j que esto apoiados nas sanes sociais

    e redes de poder e controle, tornando-se assim, algo externo ao homem; os regimes so

    materializados nas sociedades sob a forma de instituies. Trazendo para o mbito

    individual, os sistemas normativos tornam-se "gramticas generativas da ao social"

    que so cooptadas pelos atores sociais para estruturar e regular as transaes mtuas na

    esfera social.

    Destaca-se que esta rede normativa complexa e multidimensional, ao contrrio do

    significado dado a ela por Durkheim(1995[1893]), construda pela ao humana; so

    os prprios homens que constrem e transformam os sistemas normativos, sendo que

    estes impem-se diante da ao humana.

    2V VLVWHPDVVRFLDLVQRUPDWLYRVRUJDQL]DPHUHJXODPDVWUDQVDo}HVVRFLDLVWDLVFRPRD QHJRFLDomRRXDFRPSHWLomRSROtWLFDHPWHUPRVGHTXHPWHPGLUHLWRGHSDUWLFLSDU

  • 19

    TXDLV WUDQVDo}HV VmRDSURSULDGDVRX OHJtWLPDVRQGHHTXDQGRDV WUDQVDo}HVSRGHPVHUHIHWXDGDVFRPRVmRHIHWXDGDVHDVVLPSRUGLDQWH$RPHVPRWHPSRRVSURFHVVRVWUDQVDFLRQDLV VmR HVVHQFLDLV SDUD D IRUPDomR H WUDQVIRUPDomR GRV VLVWHPDVQRUPDWLYRV EHP FRPR SDUD D VXD LQWHUSUHWDomR H LPSOHPHQWDomR (Burns e Flam, DSXG Sztompka, 1998[1993], p.339)

    Para a escola sueca, os atores sociais transformam atravs de suas aes as prprias

    condies de suas aes.

    7HRULD GD PRUIRJrQHVH DSHUIHLoRDGD FRQWULEXLo}HV GH0DUJDUHW $UFKHU SDUD DTXHVWmRGDDJrQFLDA autora inglesa entra no debate propondo uma nova noo de agncia, para isto

    aprimora a teoria da morfognese. Nesta teoria, o nico aspecto que distingue os

    sistemas sociais dos sistemas orgnicos e mecnicos a sua capacidade de

    reestruturao. Avanando na anlise, Archer credita ao humana esta capacidade de

    transformao. A noo central da morfognese refere-se s interaes complexas entre

    estrutura e ao que produzem determinadas mudanas em um sistema. Ao estudar a

    relao entre estrutura e ao, Archer desenvolve o princpio de dualismo analtico,

    contrapondo-se a dualidade conceitual.

    O dualismo analtico considera a ao e a estrutura analiticamente isolveis, pois as

    propriedades emergentes que caracterizam os sistemas socioculturais implicam em

    descontinuidades entre as interaes iniciais e os resultados alcanados. A dualidade

    7 A escola sueca tem origem na ontologia normativa do mundo social elaborada por Torgny Segerstedt(1966), onde a interao e cooperao pressupem normas comuns.

  • 20

    conceitual se destaca por retirar toda e qualquer autonomia e independncia seja da

    estrutura, seja da ao, ou de ambas.

    Para Archer o dualismo analtico destaca-se ao propor uma relao constitutiva entre

    ao e estrutura, que impede uma clara descrio da influncia de um pelo outro; este

    argumento refere-se ao fato de que a ao e a estrutura so de fato distintas, pois o

    condicionamento estrutural, a interao cultural e a conseqente transformao

    cultural ocorre em momentos distintos. $HVWUXWXUDSUHFHGHORJLFDPHQWHDDomRTXHDWUDQVIRUPDHRDSHUIHLoRDPHQWRHVWUXWXUDOVXFHGHORJLFDPHQWHDTXHODVDo}HVR DSHUIHLoRDPHQWRFXOWXUDOpRIXWXURIRUMDGRQRSUHVHQWHHODERUDGRFRPDKHUDQoDGRSDVVDGRSRUPHLRGDLQRYDomRDWXDO ( Archer DSXG Sztompka, 1998[1993], p.340)

    Dentro deste espectro, Archer termina sua anlise destacando que a estrutura o meio

    condicionante e o produto elaborado da interao; a agncia reforma e reformada pela

    estrutura enquanto transforma a si mesma no processo. em sntese, uma viso

    dialtica da relao entre ao-estrutura, sendo de fundamental importncia a

    localizao desta relao no tempo histrico.

    &RQFOXV}HVDFHUFDGDUHODomRDJrQFLDHPXGDQoDVRFLDOAo encerrar a explanao acerca do desenvolvimento terico sobre a agncia e mudana

    social (mesmo que de forma sucinta) alguns aspectos tornam-se relevantes e at mesmo

    fundamentais na compreenso da realidade social. importante destacar que a relao

    entre a ao e a estrutura sempre foi alvo da anlise sociolgica; partindo da oposio

    entre os conceitos, houve, e ainda h, uma preocupao em aproxim-los.

  • 21

    Tendo esta preocupao, Sztompka(1998[1993]) destaca um conjunto de seis

    pressupostos ontolgicos baseados nas teorias da agncia acima descritas. Nestes

    pressupostos, a sociedade vista como um processo em constante mudana; a mudana

    ocorre principalmente de dentro para fora, criando um mecanismo de

    autotransformao; a mudana movida pela capacidade dos indivduos humanos e

    coletividades sociais; o sentido, o objetivo e a velocidade so ditadas pela disputa entre

    os diversos agentes, sendo motivos de lutas e disputas; a ao ocorre em uma estrutura

    previamente construda (a estrutura molda e moldada e os atores produzem e so

    produzidos); por fim, a relao entre a ao e a estrutura dada no tempo, alternando

    criatividade motriz e determinao estrutural.

    Assim, a relao entre agncia e estrutura torna-se central na anlise sociolgica

    contempornea, merecendo, com isto, alternativas metodolgicas e conceituais para o

    aprofundamento da questo. Nesse sentido, acreditamos que o conceito de capital social

    poderia auxiliar no entendimento da relao ao-estrutura, bem como nos aspectos

    relativos mudana social.

    A contribuio da idia de capital social significativa por que h uma preocupao dos

    tericos em aproximar as aes individuais e as estruturas sociais; para esta vertente da

    sociologia possvel a mudana social atravs das aes positivas, que so sustentadas

    pelos sentimentos de confiana, participao cvica, reciprocidade, proatividade, dentre

    outros.

    Diversas pesquisas esto sendo realizadas, principalmente nos Estados Unidos,

    procurando detectar os mecanismos do capital social que favorecem a mudana social

  • 22

    dentro de uma estrutura pr-estabelecida. H, como destacou Archer(1988), uma relao

    dialtica entre a ao e a estrutura, e nesta interao, o capital social seria importante,

    como combustvel das transformaes sociais.

    nesta direo que centramos nossa anlise; pois queremos avaliar o real impacto do

    capital social no comportamento social (individual ou coletivo) dentro de uma realidade

    dada e em constante transformao. possvel correlacionarmos o volume de capital

    social presente em uma comunidade com suas caractersticas scio-econmicas e

    polticas? A qualidade de vida de um dado local estaria diretamente ligada aos aspectos

    relevantes do capital social?

    Assim, a nossa pesquisa procura identificar uma associao entre o capital social e as

    taxas de criminalidade em duas vilas de Belo Horizonte. Nosso objetivo perceber se o

    comportamento social nestes locais estaria influenciando positivamente na conteno da

    criminalidade, ou seja, o capital social estaria de alguma forma reformulando a estrutura

    social e vice-versa, possibilitando alternativas s polticas pblicas de combate

    criminalidade?

    A seguir iremos discorrer sobre o conceito de capital social, destacando os principais

    tericos que trabalham com a questo: Pierre Bourdieu, James Coleman e Robert

    Putnam.

  • 23

    &$378/2&$3,7$/62&,$/&21&(,726('(),1,d(6

    O conceito de capital social construdo, embora de maneiras distintas, inicialmente por

    Bourdieu (1986[1983])8 e Coleman (1988,1990); ambos apontam para caractersticas

    que ressaltam sentimentos de reciprocidade nas relaes de interao social.

    Coleman (1990) define o capital social como os recursos produzidos pela interao

    social entre os indivduos ou grupos, que resultam, por exemplo, em confiana e

    credibilidade. Estes recursos, quando disponveis, facilitam a ao social seja dos

    indivduos seja de grupos ou comunidades9. Quanto maior a produo destes recursos,

    maior a possibilidade de desenvolvimento dos indivduos, dos grupos ou da

    comunidade. Coleman destaca que o conceito de capital social no uma entidade

    nica, ele possui uma variada gama de manifestaes que encontram-se na estrutura

    social e que facilitam a ao dos indivduos dentro desta estrutura. 'LIHUHQWHPHQWHGHRXWUDV IRUPDV GH FDSLWDO R FDSLWDO VRFLDO VLWXDVH QD HVWUXWXUDGDV UHODo}HV HQWUH DVSHVVRDV GH XPD FRPXQLGDGH (OH QmR VH HQFRQWUD QHP QRV LQGLYtGXRV QHP QRVLPSOHPHQWRVItVLFRVGDSURGXomR(Coleman, 1990, p.302).

    Robert Putnan (1996 [1993]) em seu estudo sobre a comunidade e democracia na Itlia

    moderna, ressalta a intensa relao entre capital social e cultura cvica10, para ele a nica

    8 Bourdieu (1986) acredita que o capital social a somatria dos recursos reais ou virtuais, produzidos pelas redes de relacionamentos de mtuo entendimento e reconhecimento, disposio dos indivduos ou grupos. 9 Embora Coleman reconhea a presena de capital social em grupos e comunidades, centra a sua anlise no indivduo. 10

    Putnam caracteriza a cultura cvica a partir da atuao dos cidados, imbudos de esprito pblico; por relaes polticas igualitrias e estruturas sociais baseada na confiana e na colaborao.

  • 24

    forma de capital social. Isto nos impede de detectar outras formas de capital social,

    principalmente nas esferas da credibilidade e confiana mtua, aspectos que podem

    estar presentes em comunidades com uma estrutura social sem uma tradio cvica

    mais forte. 11

    Apesar das polmicas em torno do conceito de capital social e das possibilidades de

    produo de relaes conflituosas entre os indivduos e grupos, sugerimos que a

    definio do conceito contemple os aspectos que Coleman e Putnam destacam; como a

    cultura cvica, a crena entre os membros da comunidade, o envolvimento nas questes

    comunitrias, uma boa relao entre a vizinhana, dentre outros. De acordo com a

    literatura consultada, estas questes so fundamentais para a prosperidade econmica e

    para o desenvolvimento sustentvel; fatores preponderantes para uma sensvel melhoria

    nas esferas da sade, educao, meio-ambiente, segurana pblica, etc.

    Assim sendo, destacaremos a posio de Bourdieu, Coleman e Putnam em relao ao

    capital social, procurando sublinhar as principais caractersticas de cada autor em

    relao ao conceito.

    3LHUUH%RXUGLHX

    Podemos considerar as anlises de Bourdieu como precursoras no que tange viso

    contempornea do conceito de capital, nesse sentido, autores que sero aqui trabalhados,

    tm, de alguma maneira, fortes influncias do autor francs.

    11 Devemos destacar que nem sempre o capital social resulta em efeitos positivos na comunidade

    (Paxton,1999), como ressalta Onyx et al. (1997) a Klu Klux Klan pode ter sido resultado do capital social disponvel para a comunidade branca do sul dos E.U.A.

  • 25

    Para Bourdieu, o mundo social um retrato fiel da histria humana, com todos os seus

    percalos e sucessos. Assim, Bourdieu aponta para a necessidade da reintroduo do

    conceito de capital e as conseqncias advindas de seu acmulo para a anlise social.

    Inicialmente, o capital visto como um acmulo de trabalho que, quando apropriado de

    maneira privada, seja por agentes ou por grupos constitudos, possibilita a apropriao

    da energia social, seja em forma reificada do trabalho, seja em forma do trabalho vivo.

    O capital constitudo desta maneira, objetivamente ou personificado, reveste-se de uma

    capacidade potencial em produzir lucros e, ao mesmo tempo, em se auto-reproduzir, na

    mesma proporo ou de maneira expandida.

    A estrutura social, que permite a distribuio de diferentes tipos e sub-tipos de capital,

    em um dado momento, no tempo e espao, representa a estrutura social do mundo

    social. Assim sendo, Bourdieu acredita na impossibilidade de analisar a estrutura e o

    funcionamento do mundo social sem a reintroduo do conceito de capital, em todas as

    suas formas, no s na forma econmica.

    A teoria econmica reduz a anlise do capital, centrando-se na perspectiva da troca,

    produzindo assim, subjetiva e objetivamente, uma orientao para a maximizao do

    lucro. A nfase economicista impede a percepo no-econmica do capital.

    Esta viso reduzida questionada por Bourdieu, pois tanto o capital cultural quanto o

    capital social podem ser, em algum momento, intercambiados para a esfera econmica.

  • 26

    2FDSLWDOSRGHVHDSUHVHQWDUGHWUrVPDQHLUDVIXQGDPHQWDLVFRPRFDSLWDOHFRQ{PLFRTXH pLPHGLDWDPHQWHHGLUHWDPHQWHFRQYHUWLGRHPGLQKHLURHSRGHVHULQVWLWXFLRQDOL]DGRVRE D IRUPD GH GLUHLWR GH SURSULHGDGH FRPR FDSLWDO FXOWXUDO TXH p FRQYHUWLGR VREFHUWDV FRQGLo}HV HP FDSLWDO HFRQ{PLFR H SRGH VHU LQVWLWXFLRQDOL]DGR QD IRUPD GHTXDOLILFDomRHGXFDFLRQDO H FRPRFDSLWDO VRFLDOSURGX]LQGRREULJDo}HVVRFLDLVTXHpFRQYHUWLGRVREFHUWDVFRQGLo}HVHPFDSLWDOHFRQ{PLFRSRGHQGRVHULQVWLWXFLRQDOL]DGRQDIRUPDGHWtWXORVQRELOLiUTXLFRV(Bourdieu, 1986[1983] p.243)

    Apesar dos trs tipos de capital relatados por Bourdieu12, destacaremos apenas o capital

    social, que o objetivo deste trabalho.

    &DSLWDO6RFLDOHP%RXUGLHXO autor inicia destacando que o capital social um agregado de recursos, reais ou

    latentes, que esto presentes nas relaes sociais mais ou menos institucionalizadas,

    tendo um acordo e reconhecimento mtuo dos participantes desta interao.

    O volume de capital social de cada agente depende diretamente do tamanho e

    intensidade das conexes que ele efetivamente mobiliza a seu favor, aliado presena

    de outras formas de capital, como por exemplo o econmico e o cultural; demonstrando,

    com isto, que o capital social no totalmente independente de outras formas de capital.

    Bourdieu destaca que as redes de relaes sociais no so dadas naturalmente, mas so

    produes de aes estratgicas, individuais ou coletivas, conscientes ou inconscientes,

    que estabelecem ou reproduzem as relaes sociais.

  • 27

    Este estabelecimento ou reproduo das relaes sociais transforma as relaes

    contingentes, como por exemplo a vizinhana, o local de trabalho, etc. Tais relaes

    tambm produzem elos de obrigaes subjetivas (sentimentos de gratido, respeito,

    amizade, etc.) que criam e potencializam o capital social. Nesse aspecto, Bourdieu

    individualiza o capital social, pois delega s pessoas a responsabilidade da

    transformao social, ao contrrio da escola americana que procura estabelecer uma

    relao de mo-dupla entre o indivduo e sociedade, coletivizando as possibilidades de

    transformao.

    -DPHV&ROHPDQ

    Coleman parte do princpio de que a construo do conceito de capital social

    proporciona a introduo da estrutura social para dentro do paradigma da ao racional.

    Para esta empreitada, o autor parte da descrio das possibilidades de entendimento da

    ao social.

    Ele divide o pensamento sociolgico em dois grupos; o primeiro parte da noo de

    indivduo socializado a partir de normas sociais, regras e obrigaes; conforme

    Coleman, esta percepo possibilita a descrio da ao dentro de um contexto social,

    elucida como a ao formada, construda e redirecionada pelo contexto social. O

    segundo grupo concorda com os paradigmas das cincias econmicas, que defende a

    12 importante destacar que no livro Practical Reason (1998[1994]) Bourdieu amplia o leque de capital,

    destacando, dentre outros, o capital burocrtico.

  • 28

    busca de metas a partir de aes individuais, calcadas em interesses prprios; a

    consolidao do princpio da relao ao/utilidade. 13

    Dentro desta disputa terica por uma melhor explicao da realidade social, Coleman

    acredita na possibilidade de uma terceira via, unindo aspectos da teoria da ao racional

    e do estruturalismo. Para ele, aceitar os princpios da ao em conjunto com contextos

    sociais particulares pode contribuir para a compreenso no apenas de aes individuais

    em contextos particulares, mas pode tambm propiciar o desenvolvimento das

    organizaes sociais.

    neste contexto que James Coleman prope uma nova ferramenta conceitual para a

    anlise social, a qual ele chama de capital social. Para ele, o capital social pode ser

    definido como recursos sociais (crena na estrutura social, relaes de amizade e

    confiana, dentre outros) utilizados pelos indivduos para realizar seus interesses.

    Partindo desta nova noo, Coleman procura apontar as falhas e deficincias da

    concepo estrutural e da concepo racional que divide a sociologia.

    Na concepo estrutural, o ator no o motor da ao; ele formado pelo meio

    ambiente no qual vive , estando margem dos processos de escolha, pouca ou nenhuma

    alternativa dada aos indivduos. A concepo racional, por sua vez, procura construir

    seus argumentos a partir da realidade emprica; onde as aes individuais so formadas,

    redirecionadas e construdas pelo ator social. As normas, a confiana interpessoal, os

    elos de sociabilidade e a organizao social so importantes no apenas para o

    funcionamento da sociedade mas para o funcionamento da economia. Dentro da

    13 Este princpio tem propiciado o crescimento e a consolidao de correntes filosficas filiadas ao utilitarismo,

  • 29

    concepo da ao racional temos alguns tericos que se auto intitulam economistas

    neo-institucionais. Dentro da dificuldade das duas correntes sociolgicas em se

    acordarem a respeito das noes de ao e da estrutura, estes tericos buscam

    alternativas onde aproximam, ou supem que aproximam, a estrutura e a ao e vice

    versa. Ben-Porath (1980) desenvolveu uma teoria que chamou de )FRQQHFWLRQ (IULHQGV IDPLO\ DQG ILUP) onde utiliza uma bibliografia centrada na antropologia, na sociologia e na economia, para demonstrar que as formas de organizao social afetam

    as trocas econmicas. Willianson (1975,1981) acredita que as atividades econmicas

    so organizadas de forma distinta, adequando-se s diferentes formas institucionais,

    sejam elas em nvel micro-econmico, sejam elas em nvel macro-econmico.

    Resumindo, esta corrente procura mostrar como as instituies econmicas particulares

    surgem e quais so seus efeitos no funcionamento do sistema social.

    Nesta discusso, Granovetter(1985) entra questionando as bases tericas dos neo-

    institucionalistas, argindo que eles falham por no reconhecerem a importncia das

    relaes sociais concretas e os elos de relaes, o que ele denomina HPEHGGHGQHVV.Podemos acreditar que a idia de Granovetter acerca do HPEHGGHGQHVV uma tentativa de introduzir na anlise econmica dos sistemas sociais e das relaes sociais, uma

    viso de estrutura com histria e continuidade que do um efeito independente do

    funcionamento dos sistemas econmicos e no uma estrutura como plataforma para o

    cumprimento das funes econmicas.

    Coleman diferencia-se das correntes acima, pois acredita nos princpios da ao racional

    para a anlise dos sistemas sociais, mas acredita tambm ser necessria a extenso desta

    contratualismo, direitos naturais e a teoria econmica neoclssica.

  • 30

    anlise para alm das fronteiras dos sistemas econmicos, incluindo assim, em sua

    anlise, a compreenso da organizao social. Com isto ele elege o conceito de capital

    social como a ferramenta mais adequada para esta empreitada.

    $V%DVHVGR&RQFHLWRGH&DSLWDO6RFLDOPara Coleman, uma das grandes deficincias ao introduzir a teoria da troca na sociologia

    a sua limitao s anlises microssociais, que impede a utilizao da maior virtude da

    teoria econmica: a habilidade em fazer a transio micro-macro nos sistemas sociais.

    Trabalhando a princpio com a teoria da ao racional, onde os atores tm certa

    autonomia e controle sobre os recursos disponveis para a realizao de suas metas, o

    conceito de capital social uma espcie de recurso particular utilizado no momento das

    escolhas. Aqui ele definido como uma funo que possibilita e facilita a ao dos

    atores ou grupos de atores ou mesmo corporaes dentro da estrutura social.

    Como outros aspectos de capital, o capital social produtivo, possibilitando a realizao

    de determinadas metas; ao contrrio do capital fsico (aspectos meramente econmicos)

    e humano (qualificao profissional, formao escolar formal, etc.), o capital social no

    pode ser medido ou aferido facilmente, mas possvel especific-lo utilizando como

    medida certos comportamentos sociais.

    O capital social apontado como facilitador de certas aes que podem ser teis ou no

    para a comunidade. Diferentemente de outros tipos de capital, o capital social surge das

    relaes sociais, independente desta relao se passar em nvel micro ou macro.

  • 31

    Centrando sua anlise nas relaes entre pessoas, Coleman demonstra como o capital

    social se manifesta nas relaes sociais descrevendo alguns episdios. O primeiro

    exemplo que ele destaca, refere-se ao comrcio de diamantes; a negociao neste

    mercado bastante fechada, exigindo um alto grau de confiana entre as partes. As

    relaes familiares, comunitrias ou religiosas so bastante valorizadas nas transaes.

    Em Nova Iorque este comrcio est basicamente centrado nas mos da comunidade

    judaica, o que permite uma real avaliao das peas e uma garantia da qualidade do

    produto e do recebimento das vendas.

    O segundo exemplo destacado por Coleman foi retirado da imprensa; consiste na

    atuao dos estudantes sul-coreanos nas manifestaes contra as aes governamentais

    de seu pas. Como observa o jornal, os estudantes so, em sua grande maioria,

    pertencentes mesma escola, ao mesmo bairro ou mesma igreja, ou seja, so

    pertencentes ao mesmo crculo de relaes. Esta proximidade proporcionada pela

    escola, pela vizinhana ou pela igreja facilitou a fundao de crculos de estudos na qual

    eram organizados os protestos. Como relata Coleman, as organizaes civis so

    fomentadoras, com bastante eficincia, de capital social.

    O terceiro exemplo relata a histria de uma dona-de-casa, moradora de Detroit, que em

    busca de paz e liberdade para seus filhos, muda para Jerusalm. De acordo com

    Coleman, o grau de capital social presente nas duas comunidades pode explicar as

    diferenas de comportamento das pessoas que, em ltimo caso, gera a paz e a segurana

    esperada. Em Jerusalm, as pessoas procuram se envolver mais profundamente nas

    questes locais, procuram, de uma maneira geral, cuidar do seu bairro, auxiliar as

    crianas nas praas e parque etc., o que no possvel, ou pelo menos no detectado

  • 32

    nas grandes cidades norte-americanas. Estas diferenas, que no final traduzem-se em

    qualidade de vida, so explicadas, para Coleman, pelo nvel de capital social presente

    em cada comunidade; quanto mais alto o nvel de capital social maior a participao e

    preocupao com as questes locais da comunidade.

    O quarto e ltimo exemplo de Coleman passa-se nos mercados da cidade do Cairo,

    Egito. Estes mercados so caracterizados pela presena dos laos familiares, os quais se

    reafirmam pelas indicaes de outros estabelecimentos caso no tenha a mercadoria

    procurada, pela troca de dinheiro, etc. enfim, pela criao de obrigaes e expectativas.

    Ou seja, o objetivo maior a criao de obrigaes que venham afirmar e consolidar os

    elos familiares, proporcionando uma forte estrutura social capaz de auxiliar seus

    membros em momentos difceis da vida.

    Estes exemplos demonstram como o capital social age na sociedade, de maneira

    independente da esfera econmica, embora mantenha relaes ntimas com esta,

    principalmente no que se refere racionalidade da ao.

    2V$VSHFWRVGR&DSLWDO6RFLDOO grande valor do conceito de capital social est, na viso de Coleman, na possibilidade

    de identificar certos aspectos funcionais da estrutura social. A funo identificada pelo

    conceito de capital social refere-se aos aspectos da estrutura social que proporciona aos

    atores sociais recursos para a realizao de seus interesses.

  • 33

    Coleman destaca que utilizando o conceito de capital social podemos observar

    diferentes resultados da ao individual, fazendo a transio entre o micro e o macro,

    sem utilizar uma anlise mais acurada da estrutura social, ou seja, atravs das aes

    individuais podemos diagnosticar de forma mais abrangente e generalizadora as

    transformaes das sociedades.

    Apesar de acreditar neste ponto de vista, Coleman no renega as possibilidades de

    investigar os detalhes das estruturas sociais para a anlise sociolgica, mesmo para

    explicar casos particulares; a maneira como a estrutura estaria agindo nos casos

    particulares. O que o autor deseja com o seu conceito de capital social destacar cada

    recurso oferecido aos atores sociais e mostrar as possibilidades de combinao destes

    recursos com outros recursos para a formao de diferentes nveis de comportamento,

    ou em outros casos, diferentes resultados individuais.

    $V5HODo}HV6RFLDLVHD3URGXomRGH&DSLWDOObrigaes, expectativas e confiana:

    Coleman trabalha as relaes entre obrigaes, expectativas e confiana a partir de um

    modelo terico desenvolvido por ele. Se $ realiza alguma coisa para % e acredita que %retribuir no futuro, estabelece-se uma expectativa em $ e uma obrigao em % esta obrigao pode ser transformada em FUHGLWVOLS

    O FUHGLWVOLS pode ser comparado ao capital financeiro, onde alguns detm o crdito que pode ser recuperado a qualquer momento quando necessrio; isto se no houver uma

    quebra do acordo, mesmo que este seja implcito, como a maioria das transaes

    informais presentes na vida social. Este aspecto de capital social depende de dois

  • 34

    fatores primordiais: o primeiro a confiana no meio-ambiente social, pois ele deve

    passar a certeza de que as obrigaes sero cumpridas; e o segundo a extenso atual

    das obrigaes que sero honradas.

    Um exemplo so os consrcios realizados em comunidades de baixa renda nas pequenas

    cidades do sudeste asitico, onde grupos de amigos depositam mensalmente uma

    quantia pr-estabelecida em prol de um dos membros do consrcio ( Q pessoas, Qcontribuies); esta ao caracterizada pela confiana e obrigao entre os membros

    dos grupos . Para Geertz (1962) esta uma eficiente forma de ativao do

    desenvolvimento econmico de comunidades de baixa renda; para Coleman, atitudes

    parecidas seriam impensadas em mercados de grandes reas urbanas com altos ndices

    de desagregao social, onde o grau de confiana baixo e com isto a possibilidade da

    quebra do contrato alta. o que se chama reas de baixo capital social.

    Estas diferenas podem aparecer por diversas razes. A primeira pode ser creditada

    predisposio, ou a falta dela, para auxlio comunitrio dos membros da comunidade, a

    segunda consiste na presena maior ou menor de um estado atuante, nos moldes do

    ZHOIDUHVWDWHa terceira est no grau de necessidade da comunidade, e a quarta consiste nas diferenciaes culturais; algumas culturas sendo mais predispostas ao voluntarismo.

    &DQDLVGHLQIRUPDomRNa anlise de Coleman, a informao um importante mecanismo para a ao social, ao

    mesmo tempo em que o acesso informao um gerador de capital social.

  • 35

    A informao torna-se um meio para atingir determinados fins; em todas as esferas da

    sociedade fundamental ter em mente os fatos e eventos que esto acontecendo para

    nos pautarmos dentro de uma expectativa, digamos, social. Ou seja, nossas aes so

    pautadas por informaes e expectativas balizadas pelas relaes sociais. Como analisa

    Coleman, as relaes sociais constituem a base do capital social. Como exemplo,

    podemos citar o estudo de Katz e Lasarsfeld (DSXGColeman,1988), onde destaca-se o comportamento das mulheres do meio-oeste americano. Elas, em busca de informaes

    sobre a moda, invariavelmente procuravam as amigas que julgavam ter maiores

    conhecimentos do assunto. um exemplo onde se demonstra a importncia das relaes

    sociais para a obteno de informaes e ao mesmo tempo consolidando o capital

    social.

    importante destacar que nesta interao no se cria o FUHGLWVOLSe consequentemente as redes de obrigaes e expectativas, mas simplesmente um mecanismo de

    informaes.

    Normas e sanes efetivas:

    Para Coleman, se as normas existentes so efetivas, produzem capital social, embora

    algumas vezes mostram-se bastante frgeis, no h infalibilidade nas normas no sentido

    de produzir capital social. Coleman aponta que pode haver efeitos perversos, como por

    exemplo a relativa efetividade das normas na preveno de crimes.

    O autor destaca as normas prescritivas dentro da coletividade, que para ele constituem

    uma importante fonte de capital social, j que pode atender aos interesses individuais e

    da coletividade.

  • 36

    importante ressaltar o papel das normas prescritivas, pois elas podem facilitar a

    consolidao de jovens naes, o desenvolvimento de novos movimentos sociais, ou

    seja,

    ela um agente facilitador das aes sociais. Nesse sentido, podemos encontrar muitas

    semelhanas com as caractersticas da burocracia weberiana, seja em sua essncia, seja

    em seus objetivos. Em todos os casos, as normas so internalizadas visando otimizar as

    aes coletivas em busca de metas em comum, sendo respaldada pelas sanes internas

    ou externas que possibilitam o domnio dos problemas que colocam em risco os bens

    pblicos e a existncia da coletividade.

    As normas constituem uma importante fonte de capital social. Como destaca Coleman,

    as normas sociais podem facilitar certas aes mas podem dificultar outras,

    principalmente se estas forem inovadoras, colocando em xeque a ordem j estabelecida.

    Como destacava Merton (1968), se por um lado as normas podem facilitar as aes, por

    outro lado podem inibir solues mais viveis para a resoluo dos problemas postos.

    Estrutura social: aspectos facilitadores para a criao do capital social:

    Para Coleman, toda estrutura social e relao social, de algum modo, facilitam o

    aparecimento de algum aspecto de capital social, sendo que o ator social mantm esta

    relao enquanto obtm algum benefcio. Mas, como destaca Coleman, devemos estar

    atentos, pois, algumas estruturas sociais, de maneira muito especial, facilitam de modo

    mais eficaz o aparecimento do capital social.

  • 37

    Uma propriedade presente nas relaes sociais e que essencial para as normas efetivas

    o que Coleman chama de elos fechados. Para ele, o fechamento da estrutura social

    importante no somente para a existncia de normas efetivas mas tambm para a criao

    de outros tipos de capital social : a confiana na estrutura social que permite a

    proliferao das obrigaes e expectativas; em uma relao social aberta h um

    enfraquecimento da confiana na estrutura social e todo o aparato legal ou no legal de

    controle sobre as aes que coloquem em risco a coletividade so ineficientes.

    Ao trabalhar o capital social, Coleman destaca a relao existente entre o conceito e a

    criao do capital humano. Para corroborar esta afirmao, o autor procura destacar a

    importncia do capital social na famlia para a criao do capital humano.

    comum aos socilogos da educao relacionar o sucesso escolar com o EDFNJURXQG familiar,(incentivo, escolaridade dos pais, participao ativa no aprendizado dos filhos,

    valorizao da escola, da cultura, etc.), este EDFNJURXQG normalmente analisado separadamente, sendo constitudo de capital financeiro, capital humano e capital social.

    O capital financeiro medido pela renda familiar; que no caso da educao consiste em

    proporcionar um lugar fixo para os estudos, a compra de material escolar, atividades

    extra-classe no auxlio do aprendizado (curso de idiomas, reforo escolar, etc.), acesso a

    computadores e internet, dentre outros fatores.

  • 38

    O capital humano consiste basicamente no grau de escolaridade e qualificao formal

    dos pais ou responsveis e as possibilidades que esta educao possibilita para o

    desenvolvimento do aprendizado das crianas.

    O capital social, como aponta Coleman, distinto das duas formas acima descritos. Para

    o autor, o capital financeiro e humano so de extrema importncia, mas no so

    essenciais; o fator preponderante o interesse dos pais, medido em tempo e esforo, no

    aprendizado dos filhos. esta atitude que caracteriza o capital social. Mesmo com um

    baixo capital financeiro e humano, podemos ter sucesso desde que tenhamos um alto

    capital social. O exemplo utilizado por Coleman, centrado na educao, serve de

    modelo para outras anlises. Ou seja, uma famlia realmente unida e participativa pode

    proporcionar um alto desenvolvimento social; a importncia maior est na relao

    positiva entre pais e filhos. interessante notar a importncia da presena fsica dos

    pais. Coleman destaca este ponto assinalando que esta falta provoca uma deficincia

    estrutural no capital social familiar, seja esta falta provocada por morte, separao ou

    por motivos profissionais.

    O capital financeiro, como foi dito anteriormente, est vinculado aos aspectos materiais

    presentes na sociedade, mais especificamente aos bens e a renda. O capital humano

    relaciona-se qualificao, quanto mais qualificado maiores as possibilidades dos

    melhores empregos, ascenso social, VWDWXV etc.

    Para Coleman, a principal caracterstica do capital social est justamente em apresentar-

    se como alternativa s possibilidades das duas formas de capital citados acima,

  • 39

    centrados especificamente nos indivduos. O capital social possibilita, atravs dos

    esforos somados das comunidades, ganhos sociais importantes para todas as pessoas.

    Ao separar as caractersticas mais individuais do capital financeiro e humano e as

    caractersticas mais coletivas do capital social, Coleman procura demonstrar como o

    conceito pode auxiliar no entendimento da relao macro e micro, na anlise

    sociolgica. Nesse sentido fundamental perceber como o capital social trabalha na

    realidade, como, atravs de esforos ora aparentemente individuais ora aparentemente

    coletivos, transforma a realidade e s vezes a estrutura social; aqui temos a redeno

    da sociedade civil em prol do bem comum, temos possibilidades de transformao

    social sem a necessidade da participao efetiva do estado como agente portador das

    idias e solues para a transformao social; com o capital social, a sociedade mune-se

    de possibilidades que, em conjunto com os diversos tipos de capital, e com o auxlio do

    estado, podem transformar, de maneira positiva, a realidade social.

    5REHUW3XWQDP

    Robert Putnam(1996[1993]) consolida sua viso do conceito de capital social a partir de

    um grande estudo realizado na Itlia, cujo objetivo foi analisar os impactos da reforma

    administrativa que se operou naquele pas no incio da dcada de setenta. O estudo

    centrou-se em uma anlise longitudinal, durante duas dcadas, procurando identificar as

  • 40

    transformaes sociais, institucionais e polticas advindas da reforma administrativa e

    seu impacto no desenvolvimento econmico e social nas diversas regies italianas.

    Partindo deste estudo, Putnam se prope a averiguar SRUTXHRVPRGHORVHVLVWHPDVGHHQJDMDPHQWR FtYLFR LQIOXHQFLDP WDQWR DV SHUVSHFWLYDV GH XP JRYHUQR HILFD] HUHVSRQViYHO H SRU TXH DV WUDGLo}HV FtYLFDV VH PDQWrP HVWiYHLV SRU WDQWR WHPSR ( 1996[1993]p.31) Para esta empreitada, Putnam fundamenta-se na lgica da ao

    coletiva e no conceito de capital social, e este ponto que nos interessa: como Putnam

    trabalha o conceito de capital social e como ele utilizado para a anlise da realidade

    social?

    A partir destes estudos, Putnam desenvolveu uma srie de anlises dentro da realidade

    norte-americana, relacionando o nvel de capital social e seu impacto na vida pblica.

    neste sentido que podemos destacar a grande colaborao de Putnam para a

    consolidao do conceito de capital social.

    Assim, vamos destacar neste captulo os principais aspectos do conceito de capital

    social na obra de Robert Putnam.

    Ao coletiva e capital social:

    Putnam inicia sua anlise sobre o capital social discutindo as questes referentes ao

    coletiva. Para ele, a incapacidade de interao entre os indivduos em busca do bem

    comum no caracteriza ignorncia ou irracionalidade, nesse sentido ele destaca as

    anlises da teoria dos jogos. Em diversos momentos, estes tericos criam situaes e

  • 41

    estudam as possibilidades de soluo dos problemas colocados, sendo o mais conhecido

    o dilema do prisioneiro.

    Este dilema consiste em colocar dois cmplices em salas diferentes e dizer para ambos

    que se colaborarem, acusando o colega, ganharo a liberdade, mas se um calar e o outro

    confessar, aquele receber uma pena extremamente pesada. Se ambos permanecerem

    em silncio, ambos recebero penas leves; o problema reside na impossibilidade de

    saber qual a verso que cada um dar para combinarem as aes, logo, a melhor sada

    delatar o outro.

    Com este exemplo, Putnam destaca que se houvesse uma mtua cooperao, todos os

    envolvidos sairiam ganhando; mas na falta de um compromisso confivel mais sensato

    a desero; sem uma ao de confiana mtua mais irracional colaborar.

    Transportando esta anlise para questes mais prximas das sociedades modernas,

    Putnam ressalta que necessrio uma fonte de informao confivel e uma efetiva

    realizao dos acordos para se ter uma efetiva colaborao.

    Como diz o autor, (P XP PXQGR KDELWDGR SRU VDQWRV WDOYH] RV GLOHPDV GD DomRFROHWLYD QmR H[LVWLVVHP PDV R DOWUXtVPR XQLYHUVDO p XPD SUHPLVVD TXL[RWHVFD SDUDTXDLVTXHUDo}HVRXWHRULDVVRFLDLV (Putnam,1996[1993]p.174)

    Ao perceber que no habitamos o reino dos cus, Putnam retorna a Hobbes, que

    diante de tanta barbrie, prope a coero de um terceiro. Para esse ltimo, se houver

  • 42

    um comum acordo das partes em relao ao poder do Leviat, a ordem social e a

    confiana mtua estar estabelecida na sociedade civil.

    A soluo hobbesiana demasiadamente formal para Putnam e em certo sentido

    bastante complicada de se implementar pois, HPSULQFtSLRDFRHUomRGHXPWHUFHLURUHTXHUHULD XPD SDUWH QHXWUD TXH SXGHVVH VHP {QXV DYDOLDU RV DWULEXWRV GH XPFRQWUDWRHWDPEpPVHP{QXVID]HUFXPSULURVDFRUGRVGHPRGRDTXHDSDUWHLQIUDWRUDVHPSUH WLYHVVH TXH LQGHQL]DU D SDUWH OHVDGD GH WDO IRUPD TXH OKH UHVXOWDVVH RQHURVRYLRODURFRQWUDWReyEYLRTXHQRPXQGRUHDOVHULDGLItFLOVHQmRLPSRVVtYHOSUHHQFKHUWDLVFRQGLo}HV (1996[1993]p.175)

    A coero onerosa e o uso da fora mostra-se mais ineficiente, nas relaes mais

    democrticas e participativas a confiana mais satisfatria; outro problema est na

    imparcialidade da coero, pois se cria o mesmo dilema que ela quer resolver; quem

    garante que os ocupantes do estado so confiveis? Quem garante que no utilizaro o

    poder em benefcio prprio?

    Aqui temos inmeros exemplos da falncia do Leviat; sendo claro em pases da

    Amrica Latina, frica, sia e pases mediterrneos da Europa. Nesse sentido, algumas

    solues so propostas para a resoluo dos dilemas da ao coletiva, mais viveis que a

    soluo hobbesiana.

    Putnam acredita que instituies colaborativas implementam solues viveis aos

    dilemas da ao coletiva; so as chamadas solues conciliadoras, imbudas de

    confiana e comunitarismo: QXP PXQGR RQGH H[LVWHP GLOHPDV GR SULVLRQHLUR DV

  • 43

    FRPXQLGDGHV FRRSHUDWLYDV SHUPLWLUmR DRV LQGLYtGXRV UDFLRQDLV VXSHUDUHPRV GLOHPDVFROHWLYRV (BatesDSXGPutnam, 1996[1993]p.176)

    Capital social e confiana :

    Buscando solues para os dilemas da ao coletiva, Putnam acredita que um bom

    resultado depende diretamente do contexto social onde o jogo jogado. Para ele,

    quanto mais capital social herdado em forma de regras de reciprocidade e participao

    cvica, maior o nvel de cooperao voluntria.

    $TXL R FDSLWDO VRFLDO GL] UHVSHLWR D FDUDFWHUtVWLFDV GD RUJDQL]DomR VRFLDO FRPRFRQILDQoDQRUPDVHVLVWHPDVTXHFRQWULEXDPSDUDDXPHQWDUDHILFLrQFLDGDVRFLHGDGHIDFLOLWDQGRDVDo}HVFRRUGHQDGDV ( Putnam, 1996[1993]p.177)

    Para Putnam, o capital social facilita a cooperao espontnea; como exemplo, ele

    destaca as associaes de crdito rotativo, praticamente presentes em todo o mundo.

    Neste cenrio, um certo nmero de pessoas estipula o valor das contribuies

    individuais e as normas da retirada do montante arrecadado. Estas associaes variam

    em tamanho, composio social, organizao e critrios, mas todas contribuem para a

    produo de sociabilidade, contribuindo com a consolidao da solidariedade dentro da

    comunidade.

    Para Putnam, as associaes de crdito rotativo contradizem a lgica da ao coletiva: o

    que garante a continuidade das contribuies de um membro j sorteado? certo que

    riscos existem, mas a reputao de honestidade e confiabilidade dos membros so uma

    garantia, bem como as informaes acerca do comportamento destes membros em

  • 44

    outras associaes. Temos aqui a importante trade confiana, credibilidade e

    informao que sustentam e ampliam as redes e relaes sociais. Mesmo sem o

    Leviat, as relaes sociais so garantidas por aspectos do capital social.

    Neste contexto, as associaes de crdito rotativo mostram como os impasses da ao

    coletiva podem ser resolvidos com aspectos do capital social. Como o capital

    convencional utilizado nas relaes sociais oficiais, o capital social serve de garantias

    nas relaes sociais no oficiais.

    Em geral, como destaca Putnam, as relaes sociais do tipo das associaes de crdito

    rotativo, respaldado pelo capital social, servem de consolidao da solidariedade

    comunitria; continuando, tambm destaca que o aumento ou diminuio do capital

    social (em todas as suas vertentes: confiabilidade, normas, cadeias de relaes sociais,

    etc.) se caracteriza pelo uso ou no uso destes recursos. Quanto mais utilizado, mais

    amplo o capital social.

    Uma das principais caractersticas do capital social justamente a confiana, as normas

    e as cadeias de relaes sociais, que so, geralmente, bens pblicos; contrapondo-se ao

    capital convencional, que normalmente um bem privado. Como diz Coleman, SRUVHUXP DWULEXWR GD HVWUXWXUD VRFLDO HP TXH VH LQVHUH R LQGLYtGXR R FDSLWDO VRFLDO QmR pSURSULHGDGHGHQHQKXPDGDVSHVVRDVTXHGHOHVHEHQHILFLDP(1988,p.315)

    A confiana, YLVWD FRPR XPPHFDQLVPR TXH SHUPLWH XPDPRELOL]DomR FROHWLYD H DPD[LPL]DomR GRV UHFXUVRV LQGLYLGXDLV H[LVWHQWHV (Abu-El-Haj,2000, p.89). fundamental para o capital social. Em sua anlise da realidade italiana, Putnam detecta o

  • 45

    baixo nvel de confiana na Itlia meridional, o que para ele seria um dos fatores do

    baixo nvel de capital social da regio, sendo uma das possveis causa de

    subdesenvolvimento. No norte italiano, ao contrrio, a confiana social garantiu o

    dinamismo econmico e o desempenho governamental. 4XDQWRPDLVHOHYDGRRQtYHOGH FRQILDQoD QXPD FRPXQLGDGH PDLRU D SUREDELOLGDGH GH KDYHU FRRSHUDomR ( DSUySULDFRRSHUDomRJHUDFRQILDQoD$SURJUHVVLYDDFXPXODomRGHFDSLWDOVRFLDOpXPDGDV SULQFLSDLV UHVSRQViYHLV SHORV FtUFXORV YLUWXRVRV GD ,WiOLD FtYLFD(Putnam, 1996[1993]p.180)

    Esta confiana que Putnam trata em seus estudos, no uma confiana cega, mas uma

    confiana amparada pela previso, onde o ator agir de forma a visar o bem comum no

    por que ele bom por natureza, mas porque ser melhor agir assim, pois as

    conseqncias negativas sero muito custosas para todos se ele optar por uma soluo

    cujo benefcio seja individual. Assim, a questo levantada por Putnam a seguinte:

    como transformar a confiana individual em confiana social?

    Reciprocidade, participao cvica e capital social:

    Ao procurar as origens da confiana social nas sociedades modernas, Putnam enxerga

    duas fontes correlatas: as regras de reciprocidade e os sistemas de participao cvica.

    Baseado em Coleman(1988), Putnam destaca que nas regras sociais, o ator transfere

    para outrem o direito de controlar uma ao, onde as regras so incutidas tanto por

    condicionamento e socializao como por meio de sanes.

    Um exemplo claro desta relao est nas regras de convivncia dos habitantes dos

    subrbios americanos. Com a chegada do outono, comum a queda das folhas das

  • 46

    rvores nos gramados das casas, como tambm comum a valorizao dos gramados

    dos jardins; ou seja, nestas comunidades de vital importncia um jardim bem tratado.

    Mesmo se eu no me importar com estas questes estticas dos jardins, sou impelido a

    cuidar do meu, pois as sanes a que sou passvel de sofrer, mesmo sendo informais,

    tm um custo bastante alto, pois meu ambiente na comunidade ficar bastante afetado14.

    Para Putnam so atitudes assim que fortalecem a confiana social, pois reduzem os

    custos das transaes e facilitam a cooperao. Para ele, o mais importante destas

    relaes a reciprocidade, que ele divide em balanceada e especfica.

    A reciprocidade balanceada refere-se basicamente a trocas de igual valor, como por

    exemplo a troca de dias de folga entre colegas da mesma empresa. A reciprocidade

    generalizada caracteriza-se pelo fluxo contnuo de trocas, onde a qualquer momento

    pode-se haver um desequilbrio, mas independente disto mantm-se as expectativas

    mtuas de que em um futuro este desequilbrio seja acertado. Como exemplo, Putnam

    destaca as relaes de amizade, onde h um fluxo contnuo de reciprocidade. Para ele, a

    regra de reciprocidade generalizada uma fonte inesgotvel de capital social, por isto

    fundamental nas sociedade modernas.

    1XP VLVWHPDGHUHFLSURFLGDGHWRGRDWRLQGLYLGXDOJHUDOPHQWHVHFDUDFWHUL]DSRUXPDFRPELQDomRGRTXHVHSRGHULDFKDPDUGHDOWUXtVPRDFXUWRSUD]RHLQWHUHVVHSUySULRDORQJR SUD]R HX WH DMXGR DJRUD QD H[SHFWDWLYD SRVVLYHOPHQWH YDJD LQFHUWD HLPSUHPHGLWDGDGHTXHPHDMXGDUiVIXWXUDPHQWH$UHFLSURFLGDGHpIHLWDGHXPDVpULH14

    Este exemplo bastante contraditrio se tivermos em mente a perspectiva durkheimiana de coero, que consiste basicamente na ao da estrutura social sobre os indivduos. Putnam relega esta percepo

  • 47

    GHDWRVTXHLVRODGDPHQWHVmRDOWUXtVWLFRVDFXUWRSUD]REHQHILFLDPRXWUHPCDFXVWDGRDOWUXtVWD PDV TXH WRPDGRV HP FRQMXQWR QRUPDOPHQWH EHQHILFLDP WRGRV RVSDUWLFLSDQWHV (Taylor DSXGPutnam,1996[1993],p.183, grifado no original)

    Estas relaes sociais geradoras de reciprocidade geralmente esto imbudas de um

    elaborado sistema de intercmbio social. Em comunidades com altas taxas de confiana

    e sem um abuso no uso da reciprocidade muito provvel que haja um forte

    intercmbio social, que no mbito geral, acaba facilitando a soluo dos dilemas da ao

    coletiva.

    Outro aspecto importante analisado por Putnam refere-se participao cvica. Para ele,

    os sistemas de participao cvica so uma forma essencial de capital social; quanto

    mais desenvolvidos forem esses sistemas numa comunidade, maior ser a probabilidade

    de termos cidados ativos e participativos, procurando sempre o benefcio mtuo. Mas

    por qu?

    Porque, Putnam responde:

    (OHV DXPHQWDP RV FXVWRV SRWHQFLDLV SDUD R WUDQVJUHVVRU HP TXDOTXHUWUDQVDomR LQGLYLGXDO 2 RSRUWXQLVPR S}H HP ULVFR RV EHQHItFLRV TXH HOHHVSHUDREWHUHPWRGDVDVGHPDLVWUDQVDo}HV1RMDUJmRGDWHRULDGRVMRJRVRV VLVWHPDVGHSDUWLFLSDomRFtYLFDDXPHQWDPD LQWHUDomRHD LQWHUFRQH[mRGRVMRJRV

    (OHV SURPRYHP VyOLGDV UHJUDV GH UHFLSURFLGDGH 2V FRPSDWULRWDV TXHLQWHUDJHP HP PXLWRV FRQWH[WRV VRFLDLV WrP D IDFXOGDGH GH HVWDEHOHFHU

    destacando que a relao entre os vizinhos assume uma postura individual; so com as relaes

  • 48

    VyOLGDV UHJUDV GH ERPFRPSRUWDPHQWRHGH WUDQVPLWLUXQVDRVRXWURV VXDVP~WXDV H[SHFWDWLYDV HP P~OWLSORV FRQWDWRV HVWLPXODQWHV 7DLV UHJUDV VmRUHIRUoDGDV SHOD FDGHLD GH UHODFLRQDPHQWRV TXH GHSHQGHP GR JR]R GDUHSXWDomR GH PDQWHU SURPHVVDV H DFDWDU DV UHJUDV GH FRPSRUWDPHQWR GDFRPXQLGDGH

    (OHV IDFLOLWDP D FRPXQLFDomR HPHOKRUDPR IOX[R GH LQIRUPDo}HV VREUH DFRQILDELOLGDGHGRVLQGLYtGXRV2VVLVWHPDVGHSDUWLFLSDomRFtYLFDSHUPLWHPTXH DV ERDV UHSXWDo}HV VHMDP GLIXQGLGDV H FRQVROLGDGDV &RPR YLPRV DFRQILDQoD H D FRRSHUDomR GHSHQGHP GH LQIRUPDo}HV ILGHGLJQDV VREUH RFRPSRUWDPHQWRSUHJUHVVRHRVDWXDLVLQWHUHVVHVGHYLUWXDLVSDUWLFLSDQWHVDRSDVVRTXHDLQFHUWH]DUHIRUoDRVGLOHPDVGDDomRFROHWLYD$VVLPPDQWLGDVDVGHPDLVFRQGLo}HVTXDQWRPDLRUIRUDFRPXQLFDomRWDQWRGLUHWDTXDQWRLQGLUHWD HQWUH RV SDUWLFLSDQWHVPDLRU VHUi D VXD FRQILDQoDP~WXD HPDLVIDFLOLGDGHHOHVWHUmRSDUDFRRSHUDU

    (OHV FRUSRULILFDP R r[LWR DOFDQoDGR HP FRODERUDo}HV DQWHULRUHV FULDQGRDVVLPXPPRGHORFXOWXUDOPHQWHGHILQLGRSDUDIXWXUDVFRODERUDo}HV2ILOWURFXOWXUDOHVWDEHOHFHXPDFRQWLQXLGDGHQDPHGLGDHPTXHDVROXomRLQIRUPDOHQFRQWUDGD DQWHULRUPHQWH SDUD RV SUREOHPDV GD SHUPXWD DFDED SRUHVWHQGHUVHDRSUHVHQWHWRUQDQGRVHHVVDVOLPLWDo}HVLQIRUPDLVLPSRUWDQWHVIDWRUHV GH FRQWLQXLGDGH QR SURFHVVR GH PXGDQoD VRFLDO D ORQJR SUD]R(Putnam,1996[1993],p.183)

    Putnam identifica em sua anlise duas formas de sistema de intercmbio e comunicao:

    umaKRUL]RQWDO e outra YHUWLFDO. No sistema horizontal os agentes possuem o mesmo

    individuais que se produz a confiana e fortalece a comunidade. uma inverso da teoria durkheimiana.

  • 49

    VWDWXV e o mesmo poder; no sistema vertical h uma relao assimtrica de dependncia. Na realidade no podemos dissociar estas duas vertentes, pois elas coexistem e em

    determinados casos h uma tendncia maior de uma ou outra vertente.

    O sistema vertical incapaz de sustentar a confiana e a cooperao social, pois os

    fluxos de informao so menos confiveis j que esta estrutura organizacional

    possibilita a reteno de informaes e cria impossibilidades de lutas contra

    arbitrariedades. Como destaca Putnam, em relaes clientelistas, que envolvem

    permutas interpessoais e obrigaes recprocas, a permuta vertical e as obrigaes

    assimtricas; o que se pode chamar de DPL]DGHGHVHTXLOLEUDGD; sendo que as relaes clientelistas inibem a formao de organizao grupal e solidariedade horizontal; seja

    entre os clientes, seja entre os patronos. Aqui ocorre a dependncia , no a

    reciprocidade. Como assinala o autor:

    2 IDWR GH DV DUWLFXODo}HV YHUWLFDLV VHUHP PHQRV ~WHLV GR TXH DV DUWLFXODo}HVKRUL]RQWDLVSDUDVROXFLRQDURVGLOHPDVGDDomRFROHWLYDWDOYH]VHMDXPDGDVUD]}HVSRUTXH RFDSLWDOLVPRPRVWURXVHPDLVHILFLHQWHGRTXHRIHXGDOLVPRQRVpFXOR;9,,,HSRUTXH D GHPRFUDFLD UHYHORXVH PDLV HILFD] GR TXH D DXWRFUDFLD GR VpFXOR ;; (Putnam,1996[1993]p.184)

    Putnam aponta para a importncia da famlia para a soluo dos dilemas da ao

    coletiva; para ele, os laos de sangue so comparados aos aspectos horizontais do

    engajamento cvico mas, como ressalta o autor, os sistemas de participao cvica so

    mais abrangentes, possibilitando a colaborao em nvel comunitrio.

  • 50

    Granovetter(1985) destaca que o parentesco e a amizade ntima (vnculo forte) so

    menos importantes que o conhecimento e a afiliao a associaes secundrias (vnculo

    fraco) para garantir e sustentar a coeso comunitria e a ao coletiva.

    Como defende Putnam: VLVWHPDV KRUL]RQWDLV H[WHQVRV SRUpP LVRODGRV VXVWHQWDP DFRRSHUDomR GHQWUR GH FDGD JUXSR PDV RV VLVWHPDV GH SDUWLFLSDomR FtYLFD TXHHQJOREDPGLIHUHQWHVFDWHJRULDVVRFLDLVSURPRYHPXPDFRRSHUDomRPDLVDPSOD(VVDpWDPEpPXPDGDV UD]}HVSHODVTXDLVRV VLVWHPDVGHSDUWLFLSDomRFtYLFD VmRSDUWH WmRLPSRUWDQWHGRHVWRTXHGHFDSLWDOVRFLDO(Putnam,1996[1993]p.185)

    Assim, os sistemas de participao cvica ajudam os participantes a solucionar os

    problemas da ao coletiva; quanto mais horizontalizada a organizao, maior o

    favorecimento do desempenho institucional na comunidade em geral.

    H uma correlao forte entre grupos horizontalmente organizados com um bom

    desempenho governamental. Esta teoria, onde Putnam destaca os efeitos benficos dos

    sistemas de participao cvica para o desenvolvimento poltico e econmico, vai contra

    a percepo de Mancur Olson(1965).

    Olson afirma que no h motivos para que pequenos grupos optem para um trabalho

    comunitrio, no sentido de buscar solues timas para o bem coletivo, pois para o

    autor, qualquer forma de trabalho neste sentido oneroso e ineficiente. Como resultado

    deste movimento, temos cada vez mais grupos que sufocam a inovao e o

    desenvolvimento econmico. Como podemos ver, grupos numerosos e fortes resultam

    em menos desenvolvimento. Sociedade forte, estado fraco. Enfim, Olson refuta

  • 51

    qualquer possibilidade de associativismo ou coisa que o valha pois, como resultado,

    temos um estado e governo ineficiente.

    Putnam acredita no associativismo e na sociedade articulada e forte. Baseado em seus

    estudos na Itlia, ele nos mostra que as regies mais desenvolvidas em todos os sentidos

    apresentavam um histrico de participao cvica: SUHVHQoD GH DVVRFLDo}HV FtYLFDVDWLYDVJDUDQWLDGHLQVWLWXLo}HVS~EOLFDVHILFD]HV

    Assim, DWHRULDIRUPXODGDDMXGDDH[SOLFDUSRUTXHRFDSLWDOVRFLDOFRUSRULILFDGRHPVLVWHPDVKRUL]RQWDLVGHSDUWLFLSDomRFtYLFDIDYRUHFHRGHVHPSHQKRGRJRYHUQRHGDHFRQRPLD H QmR R RSRVWR VRFLHGDGH IRUWH HFRQRPLD IRUWH VRFLHGDGH IRUWH (VWDGRIRUWH (Putnam,1993[1996]p.186)

    Bem, neste ponto da exposio das idias de Putnam a respeito do capital social, e de

    sua manifestao em forma de participao cvica, resumiremos de forma sucinta suas

    idias.

    Em princpio, Putnam destaca que o dilema da ao coletiva o grande obstculo nas

    relaes de auxlio mtuo; ou seja, os dilemas da ao coletiva impedem aes eficazes

    em prol do bem comum. Solues baseadas na coero no so satisfatrias, podendo

    ocasionar danos maiores que os j causados pelo dilema da ao coletiva. Para Putnam,

    a cooperao depende diretamente do capital social.

    atravs do capital social, que se evidencia na prtica como regras de reciprocidade e

    sistemas de participao cvica, que teremos a cooperao e a confiana social que

  • 52

    estimulam a no transgresso, diminuem as incertezas e proporcionam modelos para

    uma cooperao futura.

    O volume de capital social (confiana, ajuda mtua, normas e sistemas de participao)

    presente em uma sociedade tende a reforar-se proporcionando equilbrio social com

    elevados nveis de cooperao, confiana, reciprocidade, civismo e bem-estar coletivo.

    So estas as caractersticas de uma comunidade cvica.

    Opondo-se a isto, temos comunidades no-cvicas que tambm se auto-reforam; temos

    neste cenrio a afirmao da desconfiana, da omisso, da explorao, do isolamento,

    da desordem e da estagnao. uma idia de capital social ao avesso, na perspectiva de

    Putnam. Aqui temos duas realidades concretas que se apresentam em diversos lugares

    do mundo. Na primeira realidade temos o capital social proporcionando solues mais

    satisfatrias e mais eficientes, implantando com isto uma comunidade cvica. Na

    segunda realidade temos uma sociedade mais debilitada, na esfera cvica pelo menos,

    que levaria a escolha hobbesiana para a soluo dos problemas da ao coletiva (

    coero, explorao e dependncia); apesar de ser uma soluo inferior soluo dada

    pelo capital social, infinitamente superior ao estado anrquico de todos contra todos.

    Como diz Putnam, a soluo hobbesiana pelo menos proporciona um mnimo de

    segurana, mesmo que ao preo da explorao e da ineficincia.

    Um aspecto muito importante a ser destacado a dimenso que os dilemas da ao

    coletiva tomam nas sociedades modernas. Esta dimenso potencializada por causa da

    cooperao impessoal que o desenvolvimento econmico e tecnolgico requerem.

  • 53

    Aspectos como o oportunismo, a trapaa e a transgresso aumentam com o

    desenvolvimento econmico; como vacina temos o capital social.

    Para Putnam, o governo autoritrio, o clientelismo, a coero ilegal uma soluo

    vivel para se evitar a guerra de todos contra todos sem vislumbrar uma ao em

    direo cooperao. A famlia e a fora so representaes primitivas da comunidade

    cvica, mas tendo um volume considervel de capital social possvel um equilbrio,

    para Putnam, mais satisfatrio nos dilemas da ao coletiva. Este equilbrio mais

    satisfatrio porque em uma sociedade com ampla participao cvica, onde as normas

    cvicas so respeitadas, se no por todos pela maioria, mais fcil identificar e punir o

    transgressor, o delito torna-se um tanto mais arriscado e ao mesmo tempo com pouco ou

    nenhum aspecto tentador que pudesse potencializar o desvio.

    Concluindo, WDQWR UHFLSURFLGDGHFRQILDQoD TXDQWR GHSHQGrQFLDH[SORUDomR SRGHPPDQWHU XQLGD D VRFLHGDGH PDV FRP GLIHUHQWHV QtYHLV GH HILFLrQFLD H GHVHPSHQKRLQVWLWXFLRQDO 8PD YH] LQVHULGRV QXP GHVVHV GRLV FRQWH[WRV RV DWRUHV UDFLRQDLV WrPPRWLYRV SDUD DJLU FRQIRUPH VXDV UHJUDV $ KLVWyULD GHWHUPLQD TXDO GHVVHV GRLVHTXLOtEULRVHVWiYHLVLUiFDUDFWHUL]DUXPDGDGDVRFLHGDGH (Putnam,1996[1993]p.188)

    8PDYLVmRFUtWLFDGRFRQFHLWRGHFDSLWDOVRFLDO

    Como foi destacado nos tpicos anteriores, o conceito de capital social bastante

    amplo, e ao ser aplicado em diversas pesquisas, resultados interessantes esto sendo

    obtidos, principalmente nos Estados Unidos. Estes resultados tm impulsionado

    interesses e esforos de polticos e intelectuais acerca do assunto.

  • 54

    Em se tratando dos Estados Unidos, o conceito vem aproximando liberais e

    conservadores, os quais, atravs do uso do capital social propem solues viveis para

    os problemas da criminalidade, da sade pblica, do meio-ambiente, e de diversas

    outras reas que demandam propostas urgentes de soluo. Para estes polticos, em tese

    antagnicos, vem os aspectos do capital social como complementar s polticas

    pblicas. preciso uma massiva participao do estado, como implementador de aes

    para a comunidade, mas tambm necessria a participao da populao no controle

    dos gastos pblicos e na vigilncia da efetiva implantao das polticas pblicas.

    O capital social criado e sustentado pelas associaes voluntrias, essencial para a

    integrao e prosperidade das comunidades; h um consenso tcito de que o capital

    social pode resolver os dilemas da ao coletiva com a unio e participao da

    comunidade.

    Nossa percepo acerca dos dilemas da ao coletiva vem da obra de Mancur

    Olson(1965), com o conceito do aproveitador (IUHH ULGHU). Partindo do dilema do prisioneiro, Olson analisa a natureza da ao coletiva. A contradio do jogo est em

    que cada prisioneiro busca seu auto-interesse isolado, levando a todos os envolvidos a

    terminarem com um resultado menos satisfatrio, resultado este que poderia ser

    diferente se todos estivessem dispostos a uma colaborao mtua, sacrificando os

    interesses individuais.

    A partir desta constatao, Olson generaliza essa situao para organizaes que

    procuram mobilizar um grande nmero de pessoas movidas por interesses prprios. Em

  • 55

    situaes de grande amplitude, onde os benefcios so coletivos ou pblicos, sem

    possibilidades de ganhos pessoais ou individuais, no haver cooperao ou unio entre

    os indivduos; a no ser que se tenha ganhos no-coletivos ou seletivos para se

    conseguir a participao. Desde ento, vrias contribuies foram acrescentadas,

    requintando e aperfeioando as idias de Olson. Em primeiro lugar, temos que muitas

    organizaes so de natureza altrusta, sem um interesse prprio claro. Em segundo

    lugar, complicado pensar que os benefcios coletivos, por si s, expliquem as

    diversas organizaes em que os indivduos ingressam. Em terceiro lugar, a vida social

    deveria ser encarada de maneira interativa, onde os potenciais caronas possam

    aprender que existem benefcios e ganhos coletivos que resultaro, de maneira no-

    racional, em solues individuais. Em quarto lugar,, preciso dar ateno s ideologias

    presentes em diversas sociedades ou em partes de uma mesma sociedade, que pode

    potencializar a participao ou a no participao. Por fim, preciso estar atento s

    diversas posies estruturais, como por exemplo, o capital e trabalho assalariado, para

    poder perceber as diversas possibilidades de ao coletiva.

    Estas ponderaes, quanto ao coletiva, vai ao encontro das idias sobre o capital

    social, e as possibilidades que ele fornece para a soluo dos dilemas acerca da

    participao ou no participao na vida social. O capital social no abandona a fora da

    estrutura, mas prega a efetiva atuao dos indivduos nas questes referentes

    sociedade. uma posio prxima do que chamamos anteriormente de agncia.

    Alguns socilogos olham com desconfiana para as possibilidades do conceito de

    capital social, principalmente, nas suas possibilidades de resoluo dos problemas da

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    ao coletiva. Assim, podemos destacar algumas dvidas levantadas quanto a real

    eficcia do conceito.

    Um primeiro aspecto que podemos levantar refere-se confuso entre a origem e os

    benefcios do capital social. Ou seja, o desenvolvimento e o bem-estar que produzem

    o capital social ou vice-versa? Para os crticos, praticamente impossvel esta previso

    e, portanto, bastante arriscado inferir ao capital social tamanha responsabilidade junto

    ao desenvolvimento e bem-estar das comunidades.

    Outro aspecto levantado pelos crticos, e talvez mais procedente, est na omisso,

    voluntria ou no, dos efeitos perversos que o prprio capital social pode vir a produzir.

    Muitos exemplos podem ser dados, como