Sete dias

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Sete Dias Lá estava ele com seu casaco preto e chapéu. Tinha nas mãos uma rosa vermelha e um lenço carmim. Nada dizia, apenas fitava as pessoas que por ele passavam silenciosamente. Seus pensamentos divagavam sobre a última semana, mas as recordações ainda estavam meio confusas. Não sabia ao certo como tudo havia acontecido. Lembrava-se apenas daquele perfume adocicado que o despertava todos os dias, do lindo sorriso que o recebia todas as manhãs. Parecia ter sido uma eternidade, mas não passara de uma semana. A vida toda esperara por ela, e tão pouco desfrutara de suas delícias. Era ela ruiva, de olhos tão claros como o azul do céu, de faces tão macias que pareciam veludo, mas tudo havia ido embora sem maiores explicações. Nos últimos sete dias, haviam ido ao parque, tinham jantado em seu restaurante preferido, foram felizes. Os melhores momentos de sua breve vida conjugal. Nada mais restava, a não ser a memória daqueles dias. Noite passada, foram ao teatro. Um belo espetáculo desvendava as peripécias de Shakespeare, e ambos estavam tão contentes que não cabiam em si. Após a peça, dirigiram-se para um café a fim de terminar a noite com um delicioso cappuccino. Sentaram-se, pediram a bebida e um pedaço de torta. Ela adorava torta. As próximas duas horas foram extremamente fascinantes. Conversaram sobre diversos assuntos, quando se conheceram, o primeiro beijo, o anel de noivado... Riram e choraram juntos.

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Crônica literária

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Page 1: Sete dias

Sete Dias

Lá estava ele com seu casaco preto e chapéu. Tinha nas mãos uma rosa vermelha e um lenço carmim. Nada dizia, apenas fitava as pessoas que por ele passavam silenciosamente.

Seus pensamentos divagavam sobre a última semana, mas as recordações ainda estavam meio confusas. Não sabia ao certo como tudo havia acontecido.

Lembrava-se apenas daquele perfume adocicado que o despertava todos os dias, do lindo sorriso que o recebia todas as manhãs. Parecia ter sido uma eternidade, mas não passara de uma semana.

A vida toda esperara por ela, e tão pouco desfrutara de suas delícias. Era ela ruiva, de olhos tão claros como o azul do céu, de faces tão macias que pareciam veludo, mas tudo havia ido embora sem maiores explicações.

Nos últimos sete dias, haviam ido ao parque, tinham jantado em seu restaurante preferido, foram felizes. Os melhores momentos de sua breve vida conjugal. Nada mais restava, a não ser a memória daqueles dias.

Noite passada, foram ao teatro. Um belo espetáculo desvendava as peripécias de Shakespeare, e ambos estavam tão contentes que não cabiam em si. Após a peça, dirigiram-se para um café a fim de terminar a noite com um delicioso cappuccino. Sentaram-se, pediram a bebida e um pedaço de torta. Ela adorava torta. As próximas duas horas foram extremamente fascinantes.

Conversaram sobre diversos assuntos, quando se conheceram, o primeiro beijo, o anel de noivado... Riram e choraram juntos.

A noite tinha sido perfeita, até aquele momento. Entraram no carro e dirigiram-se para o seu aconchegante ninho de amor. Eis que, ao dobrar a esquina da Rua 42, depararam-se com uma enorme caminhonete em alta velocidade. Tudo girava ao redor deles, já não sabiam o que estava acontecendo.

Minutos depois, as sirenes das ambulâncias soavam perto, ela chorava ao seu lado. Os médicos tentaram de tudo, massagem cardíaca, desfibrilador, já era tarde.

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Ele continuava a fitar a longa fila de parentes e amigos que o observavam do alto. Alguns choravam, outros apenas comentavam o quão estúpida havia sido sua morte.

O caixão parecia agora uma confortável cama, e sua amável esposa parecia um lindo sonho, do qual acabara de acordar. Resolveu então adormecer novamente, para que pudesse continuar no belo sonho que acabara de ter.