SERGIPE: O DESAFIO DA PRODUÇÃO IRRIGADA NO MUNICÍPIO DE ... · Em Sergipe, as experiências com...

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1 MODERNIZAÇÃO DA AGRICULTURA FAMILIAR NO AGRESTE DE SERGIPE: O DESAFIO DA PRODUÇÃO IRRIGADA NO MUNICÍPIO DE RIBEIRÓPOLIS-SE Ramon Oliveira Vasconcelos Universidade Federal de Sergipe (UFS) [email protected]. Diana Mendonça de Carvalho Universidade Federal de Sergipe (UFS) [email protected] Givaldo Santos de Jesus Universidade Federal de Sergipe (UFS) [email protected] José Eloizio da Costa Universidade Federal de Sergipe (UFS) [email protected] Lucivalda Sousa Teixeira e Dantas Universidade Federal de Sergipe (UFS) [email protected] Resumo: O presente trabalho tem como objetivo analisar a organização, produção e circulação dos produtos agrícolas irrigados no município de Ribeirópolis-SE. O desafio é discutir a pequena produção agrícola para entender a formação, o papel econômico-social e a importância das relações entre agricultura familiar, força de trabalho e meio ambiente. Os procedimentos metodológicos foram seqüenciados a partir do seguinte panorama: revisão da bibliografia, coleta de dados no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Aplicação de questionários com estes atores sociais, além de entrevistas semiestruturadas com agentes públicos responsáveis pela gestão do segmento social. Um dos resultados observados é a mudança do padrão produtivo e demográfico desse segmento da agricultura familiar no Estado de Sergipe. Palavras-chave: Agricultura, irrigação e trabalho familiar. Introdução O presente artigo surge da necessidade de ressaltar a importância da agricultura irrigada no município de Ribeiropolis-SE destacando a produção, o uso da força de trabalho familiar e a circulação da produção dentro e fora do estado de Sergipe.

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MODERNIZAÇÃO DA AGRICULTURA FAMILIAR NO AGRESTE DE SERGIPE: O DESAFIO DA PRODUÇÃO IRRIGADA NO MUNICÍPIO DE

RIBEIRÓPOLIS-SE

Ramon Oliveira Vasconcelos Universidade Federal de Sergipe (UFS)

[email protected].

Diana Mendonça de Carvalho Universidade Federal de Sergipe (UFS)

[email protected]

Givaldo Santos de Jesus Universidade Federal de Sergipe (UFS)

[email protected]

José Eloizio da Costa Universidade Federal de Sergipe (UFS)

[email protected]

Lucivalda Sousa Teixeira e Dantas Universidade Federal de Sergipe (UFS)

[email protected]

Resumo:

O presente trabalho tem como objetivo analisar a organização, produção e circulação dos produtos agrícolas irrigados no município de Ribeirópolis-SE. O desafio é discutir a pequena produção agrícola para entender a formação, o papel econômico-social e a importância das relações entre agricultura familiar, força de trabalho e meio ambiente. Os procedimentos metodológicos foram seqüenciados a partir do seguinte panorama: revisão da bibliografia, coleta de dados no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Aplicação de questionários com estes atores sociais, além de entrevistas semiestruturadas com agentes públicos responsáveis pela gestão do segmento social. Um dos resultados observados é a mudança do padrão produtivo e demográfico desse segmento da agricultura familiar no Estado de Sergipe.

Palavras-chave: Agricultura, irrigação e trabalho familiar.

Introdução

O presente artigo surge da necessidade de ressaltar a importância da agricultura irrigada

no município de Ribeiropolis-SE destacando a produção, o uso da força de trabalho

familiar e a circulação da produção dentro e fora do estado de Sergipe.

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O município de Ribeirópolis, segundo dados do IBGE, integra a microrregião de Carira,

situado na Zona Oeste, área de transição do agreste com o sertão. Apresenta uma área

de 263.0 Km² e a sede municipal localiza-se no centro do território, ao norte da Serra do

Saco, distando em linha reta 61 km e pela rodovia 75 km da capital do estado. De

acordo com o Censo Demográfico de 2010 (IBGE), o município possui uma população

de 17.163 habitantes. Partindo deste contexto, observa-se que o mesmo originou-se, na

divisão territorial (sesmarias – Período Colonial) integrado ao município de Itabaiana,

sendo inicialmente povoada do mesmo, desta maneira, a finalidade é colocar em foco a

pequena produção irrigada (figura 01) agrícola como entendimento do desenvolvimento

rural de Ribeirópolis.

Figura1: Agricultura Irrigada no Município de Ribeirópolis - SE

Fonte: Seplantec; Organização: Ramon Oliveira e Diana Carvalho.

A pequena produção agrícola no município de Ribeirópolis merece estudos específicos

e aprofundados para entender a formação, o papel econômico-social e a importância

significativa das relações entre agricultura, força de trabalho e meio ambiente. O desafio

é discutir a questão do agricultor familiar no minifúndio relatando a dinâmica das

relações capitalistas e não capitalistas nos aspectos econômicos e demográficos da

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pequena exploração familiar. Este tema é relevante por vários motivos. Um deles é a

persistência das pequenas propriedades que variam de -1 a menos de 10 ha e a força de

trabalho familiar. De forma insofismável muitos desses pequenos produtores são

capitalizados, mas alguns apresentam problemas financeiros, endividados com

financiamentos. Outro motivo que justifica a importância do tema é o estudo especifico

da economia do agricultor em nossa realidade, apesar de suas contradições internas da

qual uma delas é o desamparo por parte dos órgãos públicos sobre essa categoria,

quando sabemos que essa categoria é o elo fundamental da reprodução social.

O artigo foi desenvolvido com base na teoria de Ricardo Abramovay (1992), em que o

autor formulou a tese que as unidades de pequeno porte, alto volume de produção e

elevada produtividade existentes hoje nos países capitalistas avançados descendem do

campesinato tradicional, mas não têm mais nada a ver com ele, e Eliano Sérgio (1997),

que entre seus fundamentos teóricos o termo agricultura incorporou-se ao vocabulário

das políticas públicas, ao discurso dos movimentos sociais voltado ao conhecimento do

meio rural.

Abramovay (1992) enfatiza a implantação do Programa Nacional de Fortalecimento da

Agricultura Familiar (PRONAF), visto pelo Movimento Sindical de Trabalhadores

Rurais, como uma conquista, a partir de uma perspectiva mais promissora. O que se

observa é a ampliação na quantidade de agricultores com acesso ao crédito e as

condições que poderão liberar o potencial econômico que representam para suas regiões

e para o País. Em suma, a agricultura familiar está proporcionando a cidadania no

campo, o acesso dos habitantes do espaço rural a melhores condições de vida. E claro

que se trata apenas de um começo, já que no campo encontram-se ainda os piores

indicadores sociais do País.

Procedimentos Técnicos e Metodológicos

O presente artigo tem por objetivo realizar uma pesquisa de abordagem geográfica, a

partir da análise dos aspectos econômicos, sócio-culturais e rurais da cadeia produtiva

da horticultura irrigada praticada por agricultores familiares no município de

Ribeirópolis no Estado de Sergipe. A metodologia auxiliará na confecção de uma base

conceitual mais rica para a interpretação e validação dos resultados da pesquisa.

Em busca de um maior embasamento teórico que dê respaldo a um desenvolvimento

claro sobre a pesquisa e a fim de obter uma melhor compreensão a respeito do tema em

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questão, foi realizado um levantamento bibliográfico em obras como as de Santos

(1997, 2004), Abramovay (1992), Scheneider (2003), Graziano da Silva (1996,1999);

Eliano Sérgio (1997). Autores que discutem a respeito das estratégias da agricultura

familiar, irrigação e modernização da agricultura.

Com o intuito de melhor compreender os processos que permeiam o tema do nosso

trabalho, foi necessária a realização do levantamento de dados secundários. Estes

coletados junto ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE); no Instituto

Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA); na Emprese de

Desenvolvimento Agropecuário de Sergipe (EMDAGRO); Companhia de

Desenvolvimento de Recursos Hídricos (COHIDRO) e na Secretária de Agricultura de

Ribeirópolis.

O trabalho de campo com o intuito de levantar dados empíricos, através da aplicação de

questionários, observação direta e de conversas com os agricultores, teve como objetivo

averiguar como se dá o trabalho familiar, se possuem trabalhadores domésticos,

diaristas ou até mesmo assalariados e entre outras características que contribuiu para

compreendermos a dinâmica do espaço rural do agreste de Ribeirópolis.

Modernização Agrícola e Ação do Estado

De forma indubitável no estudo da irrigação como alternativa para resolver os

problemas econômicos e sociais da região semi - árida nordestina, deve ser visto como

integrando a temática teórica de mudança social, em que a compreensão esta centrado

na relação Estado x Sociedade, representado por um tipo de política pública (a

irrigação) direcionada a uma categoria especifica de produtores rurais (agricultores

familiares). O que se propõe é uma concepção de estado que tem funções como resposta

as condições históricas especificas do que a uma teoria sobre o Estado capitalista, isto é,

tais funções são moldadas por lutas sociais anteriores e pelo caráter de prévias

intervenções desse mesmo Estado.

Em Sergipe, as experiências com agricultura irrigada, têm seu inicio com os projetos de

irrigação da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco – CODEVASF

e do Departamento Nacional de Obras contra a Seca- DNOCS, como o açude da

Macela, em Itabaiana, além das iniciativas particulares. Em meados dos anos 80 é que a

política de irrigação tornou-se prioridade do Governo Estadual para o setor agrícola. É

importante estudar o processo técnico e os determinantes da renda gerada nos

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perímetros públicos de irrigação de Sergipe pelo fato de a irrigação constituir na

alternativa de transformação ou modernização da agricultura familiar.

A noção de agricultura familiar aqui trabalhada não se confunde com a idéia de algo

frágil e sem poder econômico, mas no sentido que concebe Abramovay (1992:142).

[...] “familiar não é necessariamente sinônimo de precário; a existência de unidades produtivas contando majoritariamente com o trabalho da família, mas que são grandes quando ao seu volume e valor da produção é a regra no Hemisfério Norte. Claro que a produção esta cada vez mais concentrada num numero menor de unidades produtivas: esta é a conseqüência do próprio funcionamento de uma economia de mercado. O interessante é que mesmo estas unidades de grandes dimensões econômicas permanecem, na maior parte dos casos familiares quanto a sua composição social”.

A ação do Estado, visando ampliação da agricultura irrigada no país e no Nordeste, esta

vinculada ao processo de modernização da agricultura brasileira a partir da década de

60, como “modernização conservadora”, caracterizada como manutenção da elevada

concentração fundiária e nas alterações profundas na base técnica de produção, com o

emprego de inovações tecnológicas (máquinas e equipamentos, insumos modernos,

etc.,) e transformações nas relações de produção como aprofundamento e consolidação

do trabalho assalariado no campo particularmente o trabalho temporário.

A irrigação tem suas ações voltadas para o aumento da produção e produtividade

agrícola, embora os projetos de irrigação sejam justificados legal e politicamente pela

sutilidade pública da obra implantada e pelo interesse social para a população da área de

influência. Segundo Pinto (1989: 34)

[...] “a irrigação, do ponto de vista do desenvolvimento das forças produtivas é apenas uma pré-condição para a implantação de uma agricultura moderna na região semiárida do nordeste. Não garante, porém, que os seus resultados sejam socialmente distribuídos de um modo mais justo. Porém, mesmo quando os assentamentos de colonos resultam em sucesso (...) os beneficiários, além de poderem ser contados nos dedos reproduzem, no entorno dos projetos, situações semelhantes às que inspiraram a necessidade de intervenção publica original. Quando, por outro lado, os assentamentos não dão certo, em conseqüência do cerco que lhes impõem as oligarquias locais, os colonos permanecem sob a tutela do Estado ou, com a retirada destes, subordinam-se inteiramente aos mesmos capitais comerciais dos quais se buscava libertá-los”.

As áreas beneficiadas permitem a desapropriação fundiária, evitando a valorização

imobiliária decorrente dos investimentos públicos, além da importância do seu caráter

“pontual”, não prescindindo de outras políticas complementares se o objetivo é de que

seus resultados atinjam uma perspectiva mais ampla.

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É fundamental explicitar o contexto de progresso técnico que é utilizado neste estudo

porque os projetos de irrigação “tocados” por pequenos produtores ensejam e requerem

o uso dos mais diversos tipos de insumos, e de equipamentos modernos, além de

conjuntos de irrigação por aspersão e gotejamento. O progresso técnico constitui uma

das facetas do próprio desenvolvimento do capital cujo objetivo é o de subordinar a

terra e a própria Natureza ao imperativo da acumulação.

A Produção Agrícola no Município de Ribeirópolis-SE

A ocupação da região de Ribeirópolis se deu na distribuição de sesmarias dentro da

capitania de Sergipe, no período Colonial, entre 1600 e 1669, sendo que Itabaiana

abarcava as áreas dos atuais municípios de Campo do Brito, Frei Paulo, Macambira,

Ribeirópolis, Pinhão, Pedra Mole, Moita Bonita, São Domingos, parte de Malhador e

Areia Branca, possuindo uma extensão de cerca de 200 léguas quadradas, ou seja,

8.000Km2 reduzidos no decorrer dos séculos XIX e XX, a uma área de 346 Km2 em

função dos desmembramentos e formação de novas unidades político-administrativa.

Durante esse marco temporal, a utilização da terra estava orientada para a criação de

gado e lavouras de subsistência, entretanto, as fazendas de gado foram competindo com

as plantações de algodão, mandioca e legumes.

O elevado número de pequenos produtores é consequência de relativa concentração de

lavouras na região agrestina, apoiado no latifúndio-minifúndio, ocasionando a

dependência do acesso a terra, seja por multiplicação do número de arrendamentos, seja

pela divisão sucessiva das propriedades voltadas a produção de alimentos. Itabaiana

destina como “lócus” de intervenção estatal, via capacitação e armazenamento de água

em açudes para pequena irrigação, a exemplo do açude da Macela. Na figura 02, fica

clara a grande quantidade de agricultores familiares com 77,3% do total, enquanto as

médias propriedades com 17,9% e as propriedades grandes com 4,8% da área deixando

visível a divisão das propriedades no agreste de Ribeirópolis.

Figura 02: Divisão das propriedades no município de Ribeirópolis.

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

Na Microrregião Homogênea do

tem origem nas áreas com até 10h. Há um predomínio das lavouras de ciclo curto pelos

pequenos produtores da região, enquanto as culturas permanentes são mais freqüentes

nas médias e grandes propried

das Secas, constitui-se no principal pólo de desenvolvendo da região Agreste,

concentrando as atividades de comercialização de insumos e produtos de uso agrícola,

distribuidor de produtos agrícolas no

campo-cidade.

A agricultura na região era regida pelos fatores naturais com dependência das chuvas de

inverno para iniciarem o plantio de mandioca, milho, batata

feijão, macaxeira, repolho, vagem, quiabo, amendoim e pimentão sempre em consorcio

e baseado nas experiências que eram passadas de pai para filho. No verão apenas a

mandioca era cultivada para a produção de farinha.

O preparo do solo era manual e não tinha assistência técnica, à

predominantemente familiar e nas épocas do cultivo eram contratados trabalhadores

diaristas para o preparo do solo, plantio e colheita. A ocorrência de atividades como

ajuda mútua, o mutirão e a troca de dias de serviço aconteciam principa

de farinha, mas essas atividades foram perdendo espaço no cotidiano dos agricultores.

Os produtos colhidos destinavam

de parte da farinha de mandioca. O produto era comercializado na feira

intermediários da região. Para Silva (1989, p.

17,9%

Figura 02: Divisão das propriedades no município de Ribeirópolis.

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

nea do Agreste de Itabaiana, 99,8% da produção de lavoura

tem origem nas áreas com até 10h. Há um predomínio das lavouras de ciclo curto pelos

pequenos produtores da região, enquanto as culturas permanentes são mais freqüentes

nas médias e grandes propriedades. Com 13,9% da sua superfície incluída no Polígono

se no principal pólo de desenvolvendo da região Agreste,

concentrando as atividades de comercialização de insumos e produtos de uso agrícola,

distribuidor de produtos agrícolas no atacado e varejo. O município é foco de atração

A agricultura na região era regida pelos fatores naturais com dependência das chuvas de

inverno para iniciarem o plantio de mandioca, milho, batata-doce, tomate, coentro,

lho, vagem, quiabo, amendoim e pimentão sempre em consorcio

e baseado nas experiências que eram passadas de pai para filho. No verão apenas a

mandioca era cultivada para a produção de farinha.

O preparo do solo era manual e não tinha assistência técnica, à mão

predominantemente familiar e nas épocas do cultivo eram contratados trabalhadores

diaristas para o preparo do solo, plantio e colheita. A ocorrência de atividades como

ajuda mútua, o mutirão e a troca de dias de serviço aconteciam principalmente nas casas

de farinha, mas essas atividades foram perdendo espaço no cotidiano dos agricultores.

Os produtos colhidos destinavam-se para o autoconsumo com exceção das hortaliças e

de parte da farinha de mandioca. O produto era comercializado na feira

Para Silva (1989, p. 45):

77,3%

17,9%

4,8%

Agricultor Familiar

Propriedades Médias

Propriedades Grandes

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Agreste de Itabaiana, 99,8% da produção de lavoura

tem origem nas áreas com até 10h. Há um predomínio das lavouras de ciclo curto pelos

pequenos produtores da região, enquanto as culturas permanentes são mais freqüentes

ades. Com 13,9% da sua superfície incluída no Polígono

se no principal pólo de desenvolvendo da região Agreste,

concentrando as atividades de comercialização de insumos e produtos de uso agrícola,

atacado e varejo. O município é foco de atração

A agricultura na região era regida pelos fatores naturais com dependência das chuvas de

doce, tomate, coentro,

lho, vagem, quiabo, amendoim e pimentão sempre em consorcio

e baseado nas experiências que eram passadas de pai para filho. No verão apenas a

mão-de-obra era

predominantemente familiar e nas épocas do cultivo eram contratados trabalhadores

diaristas para o preparo do solo, plantio e colheita. A ocorrência de atividades como

lmente nas casas

de farinha, mas essas atividades foram perdendo espaço no cotidiano dos agricultores.

se para o autoconsumo com exceção das hortaliças e

de parte da farinha de mandioca. O produto era comercializado na feira ou a

Agricultor Familiar

Propriedades Médias

Propriedades Grandes

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[...] a intensificação da produção agrícola provocada pelo progresso técnico significa colocar as forças da Natureza a serviço do capital. Ocorre uma transformação essencial: o capital passa a comandar o processo de trabalho enquanto que a terra deixa de ser o meio de produção fundamental; a produção agrícola deixa de se guiar apenas pela fertilidade dos solos, pela água da chuva, enfim pelas condições naturais que afetam a produtividade do trabalho. Agora são as maquinas, os fertilizantes, os canais de irrigação e de drenagem que, progressivamente, assumem o papel de condutor da modernização da agricultura.

Com o surgimento do projeto de irrigação na década de 80, os agricultores tinham

desconfiança que não funcionasse e ao mesmo tempo de perder as terras, pois se tratava

de algo novo com informações desencontradas e por tratar de uma transformação na

relação do agricultor com a terra. Dessa forma, com a tentativa de contornar o

problema, foram plantados produtos escolhidos pelos colonos como mandioca,

amendoim e hortaliças. Após anos de funcionamento do projeto os agricultores foram

selecionando o que era economicamente mais vantajoso plantar, como batata-doce,

amendoim, pimentão e quiabo, sendo assim os mais cultivados, além do tomate, vagem,

repolho, cenoura, milho, maxixe, pepino e feijão.

Nos primeiros anos de funcionamento da agricultura irrigada familiar foram perfurados

poços artesianos e construídas barragens nos casos em que não encontravam água no

subsolo, além de investirem nos kits de irrigação de forma individual e independente,

desprezando acesso a recursos financeiros de agencias governamentais e de bancos,

devido às dificuldades e muitas vezes por falta de informação.

Com a introdução da tecnologia de irrigação em alguns povoados do município de

Ribeirópolis, ocorreram impactos na natureza da atividade agrícola ali desenvolvida: O

cultivo de produtos de subsistência deu lugar a produtos comerciais que visam o

mercado.

A farinha de mandioca, que era o principal e às vezes o único produto destinado a

venda, foi substituída pela produção de hortaliças, que passou a ser o determinante das

decisões dos agricultores quanto à exploração de terra.

A existência de infra-estrutura de irrigação já traz em si, mudanças no comportamento e

na visão dos irrigantes. O mercado é o horizonte a ser conquistado, o elemento definidor

das ações desses produtores, assim como o movimento de compra e venda de insumos e

implementos agrícolas, mão-de-obra e de diferentes serviços, em que a relação dos

pequenos produtores irrigantes com o mercado passa a ser indispensável à reprodução

social do grupo familiar. Outro aspecto importante nesse novo contexto diz respeito à

necessidade do estabelecimento de um padrão de organização social dos produtores

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diferente daquele a que estavam acostumados, haja vista as exigências impostas pela

irrigação.

Os irrigantes com rendas mais altas optam por proporcionar aos filhos melhor formação

escolar e qualificação profissional, a mantê-los no trabalho agrícola. A maioria não

dispõe desta possibilidade, o que os leva a incorporar nas atividades agrícolas todos os

membros da família inclusive as crianças. Em outras palavras, a utilização da totalidade

da força de trabalho familiar passa a ser indispensável às novas exigências que a

irrigação traz, não só a respeito da produção, mas quanto à comercialização.

A organização da produção e o uso da tecnologia obedeceu ao objetivo único de

maximização de lucros com a agricultura irrigada, com a diversificação da produção de

hortaliças, em que os irrigantes procuraram seguir aquilo que as suas condições

econômicas permitiam e que entendiam como sendo de menor risco econômico, isto é,

utilizar a tecnologia de irrigação em culturas que já dominavam o cultivo e tinham um

certo conhecimento e experiência do processo de comercialização, como é o caso da

batata doce.

O quadro 01 mostra os principais produtos cultivados no agreste de Ribeirópolis de

acordo com o censo agropecuário de 2006, destacando a produção, hectares, número de

produtores, utilização da adubação orgânica e química, manejo de irrigação, preparo do

solo e o trato cultural. A produção totalmente irrigada, com peculiaridades para o

amendoim, a bata doce e o maxixe que utiliza adubação química e orgânica. Todos os

produtores fazem o preparo do solo e o trato cultural, a maior área cultivada é de

maxixe, seguida de batata doce.

Quadro 01: Principais produtos cultivados no agreste de ribeirópolis Produção Hectares Nº de Adubação Adubação Manejo de Preparo Trato

Produtores orgânica química irrigação

ha do solo cultural

Amendoim 11 35 4 6 11 35 35 Batata doce 12 40 12 - 12 40 40

Pepino 6 30 - 6 6 30 30

Pimentão 7 35 - 7 7 35 35

Maxixe 20 30 20 20 20 30 30

Tomate 4 20 - 4 4 20 20 Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006. Na atualidade, as sementes são selecionadas e/ou adaptadas, usam adubo químico,

tração animal e mecânica e o mais preocupante, a utilização excessiva de agrotóxicos.

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No caso dos agrotóxicos, a utilização tem sido abusiva e sem controle, e os produtores

não tomam as precauções necessárias, sendo frequentes os problemas de tonturas e

desmaios. Os agricultores conhecem os impactos causados pelos produtos químicos,

mas não buscam alternativas para lidar com os agrotóxicos, além de usar desculpas que

não tem condições de comprar o equipamento e também porque este incomoda.

No espaço de produção irrigada em Ribeirópolis ainda é tímida a utilização de insumos

de origem orgânica, entretanto, um pequeno número de irrigantes da Ribeira povoado de

Itabaiana com certa consciência ecológica tem produzido hortaliças sem o uso de

agrotóxicos praticando uma agricultura orgânica com a utilização de húmus

provenientes da minhocultura, o uso de alho e farumo despertando a curiosidade e a

critica daqueles agricultores que abusam dos produtos químicos.

Sobre a questão tecnológica e da mecanização os irrigantes usam o que podem como o

trator para o preparo do solo, assim como, o uso também da tração animal. O sistema de

adubação utilizado na produção é por cova, lanço e sulco, porém, os mais usados são

aqueles com a fórmula 10-15-10, 0-10-10, 18-18, torta de mamona, além do calcário e o

esterco de gado.

Outro problema observado é a utilização excessiva de água desprezando as necessidades

hídricas das culturas, pois, são ignorados pelos irrigantes que decidiram irrigar as

culturas de acordo com o conhecimento deles, em que pode ocorrer o comprometimento

da disponibilidade desse recurso no futuro próximo. Quanto à assistência técnica, apesar

de reconhecerem a importância, a maioria dos irrigantes não buscam esse recurso que

poderia tornar esta atividade ainda mais produtiva e quem sabe mais viável

economicamente.

A mão-de-obra e as relações de trabalho, na irrigação passam a obedecer às exigências

do capital subordinado aos objetivos da produção, em que o mercado é agora o

elemento decisivo do ato de produzir, e não mais a produção para o consumo familiar,

como antes. É importante destacar que 91% dos agricultores são proprietários, não

existe ocupante, a parceria existe em poucos casos quando a família é pequena e não

consegue dar conta do trabalho e por fim os arrendatários que totalizam 8% como ilustra

a figura 03.

Figura 03: Percentual das características da propriedade.

Fonte: Pesquisa de campo, 2010.

A mudança nas relações de trabalho aparece como uma das mais importantes

consequências da introdução da agricultura irrigada

jornada de trabalho, seja em termos d

casos (famílias pequenas) houve a necessidade de utilizar a parceira em decorrência da

insuficiência de recursos financeiros do proprietário da terra e em relação à

disponibilidade de terras e da inexistência de um trabalho estruturado, além de evitar

reclamações por parte dos trabalhadores contratados através de diárias.

(1989, p. 87):

A parceira pode ser vista, assim, como uma forma flexível de remuneração do trabalho, adaptável a circunstancias especificas de organização da produção, permitindo combinar simultaneamente atividades típicas de empregado e empregador.

A contratação de trabalhadores assalariados foi ampliada em função das novas

exigências a partir da irrigação com o prolongamento e a intensificação da jornada de

trabalho. Houve um aumento significativo na contratação de diaristas e trabalhadores

temporários, que trabalham em

Os agricultores familiares que trabalham com irrigação são individualistas e não há

organização entre eles para que os serviços sejam realizados coletivamente, ou quem

sabe formarem uma cooperativa que possa estruturar a

produção e a comercialização da horticultura.

0%

20%

40%

60%

80%

100%

Proprietário

91%

Figura 03: Percentual das características da propriedade.

Pesquisa de campo, 2010.

A mudança nas relações de trabalho aparece como uma das mais importantes

ências da introdução da agricultura irrigada, seja em termos de extensão d

, seja em termos da natureza da força de trabalho, que em alguns

casos (famílias pequenas) houve a necessidade de utilizar a parceira em decorrência da

insuficiência de recursos financeiros do proprietário da terra e em relação à

nibilidade de terras e da inexistência de um trabalho estruturado, além de evitar

reclamações por parte dos trabalhadores contratados através de diárias.

parceira pode ser vista, assim, como uma forma flexível de remuneração do trabalho, adaptável a circunstancias especificas de organização da produção, permitindo combinar simultaneamente atividades típicas de empregado e empregador.

lhadores assalariados foi ampliada em função das novas

exigências a partir da irrigação com o prolongamento e a intensificação da jornada de

trabalho. Houve um aumento significativo na contratação de diaristas e trabalhadores

temporários, que trabalham em média dois ou três dias por semana.

Os agricultores familiares que trabalham com irrigação são individualistas e não há

organização entre eles para que os serviços sejam realizados coletivamente, ou quem

sabe formarem uma cooperativa que possa estruturar a cadeia produtiva e

comercialização da horticultura.

Proprietário Oculpante Arrendatário Parceiro

91%

0%8%

1%

Série1

11

A mudança nas relações de trabalho aparece como uma das mais importantes

seja em termos de extensão da

trabalho, que em alguns

casos (famílias pequenas) houve a necessidade de utilizar a parceira em decorrência da

insuficiência de recursos financeiros do proprietário da terra e em relação à

nibilidade de terras e da inexistência de um trabalho estruturado, além de evitar

reclamações por parte dos trabalhadores contratados através de diárias. Para Silva

parceira pode ser vista, assim, como uma forma flexível de remuneração do trabalho, adaptável a circunstancias especificas de organização da produção, permitindo combinar simultaneamente atividades típicas de

lhadores assalariados foi ampliada em função das novas

exigências a partir da irrigação com o prolongamento e a intensificação da jornada de

trabalho. Houve um aumento significativo na contratação de diaristas e trabalhadores

Os agricultores familiares que trabalham com irrigação são individualistas e não há

organização entre eles para que os serviços sejam realizados coletivamente, ou quem

cadeia produtiva e melhore a

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Circuitos e Mecanismos de Comercialização

Com a inexistência de agroindústrias que pudessem absorver a produção irrigada,

beneficiando ou transformando os produtos ali cultivados, contribuiu para o alto índice

de perda de produção e impede que tenha maior valor aos mesmos, restringindo a

comercialização e a capacidade de acumulação e capitalização dos irrigantes.

A agricultura irrigada, pelos investimentos que ela exige é incompatível com uma

atividade que insiste em ser conduzida de modo empírico e sem planejamento, como

acontece no agreste de Ribeirópolis.

Os principais agentes de comercialização de hortaliças são os intermediários, detendo o

controle dessa atividade e influenciando tanto na determinação dos preços como na

seleção dos produtos a serem cultivados. A venda da produção é feita de diferentes

maneiras, a principal é a entrega dos produtos ao intermediário, que vem buscá-los na

propriedade do irrigante. Outra forma é a venda direta aos feirantes e ao consumidor,

nas feiras de municípios vizinhos (figura 04) como Itabaiana e/ou em feiras

permanentes em bairros de Aracaju. É importante destacar que embora a irrigação tenha

alterado as condições de produção dos agricultores de Ribeirópolis, a estrutura de

comercialização pouco se modificou em relação ao passado.

Figura 04: Fluxo de Comercialização de Horticultura de Ribeirópolis

Fonte: Seplantec. Organização: Ramon Oliveira e Diana Carvalho

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Na atualidade existe um pequeno número de produtores que além de comercializarem a

produção obtida na sua própria área também atuam como compradores da produção de

outros irrigantes. O uso diferenciado da tecnologia de acordo com o tamanho da terra

disponível e ainda pelo maior ou menor conhecimento do mercado e de seu

funcionamento sempre preservam a autonomia e a individualidade dos agricultores que

trabalham com irrigação.

Considerações Finais

Em Sergipe, a agricultura irrigada tem a potenciação do trabalho agrícola através da

introdução de novas culturas e do uso do progresso técnico, no semi-árido sergipano. As

experiências em andamento merecem estudos, seja do ponto de vista técnico-

agronômico, seja dos impactos na geração de renda e na melhoria das condições de vida

dos irrigantes.

Os efeitos do uso da irrigação e dos problemas surgido pela falta de um planejamento

agrícola, crédito rural compatível com a situação financeira dos agricultores, orientação

técnica mais eficiente e necessidade de mudanças na sistemática de comercialização,

são percebidos e reivindicados pelos irrigantes, como uma condição indispensável à

consolidação econômica do projeto e melhoria da renda e condições de vida dos

pequenos agricultores. Em que, ao mesmo tempo propala a independência na

organização do processo produtivo reconhece ser esta impossível sem a relação com os

outros irrigantes e com a sociedade envolvente, em suas diferentes esferas.

Apesar de tudo, é significante a melhoria das condições de vida e de renda dos

produtores familiares irrigantes de Ribeirópolis, como provam não apenas as rendas por

eles obtidas, mas também as boas condições sociais, qualidade das habitações,

abastecimento d’ água, saneamento, energia elétrica e o patrimônio que conseguiram

formar após a implantação da irrigação.

É preciso cautela nas afirmações catastróficas da ineficiência da pequena agricultura

irrigada, e na não comprovada tese de inviabilidade econômica da irrigação

frequentemente manifestada por técnicos do governo de Sergipe para justificar a criação

de projetos hidroagrícolas para grandes empresas capitalistas. Por outro lado, a irrigação

não apenas ampliou o mercado de trabalho, como também, reteve na terra potenciais

candidatos ao êxodo rural e trouxe de volta trabalhadores da região que haviam

emigrado para centros urbano-industriais, em busca de sobrevivência.

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As condições de vida das famílias sofreram mudanças significativas com a introdução

da irrigação nas áreas, como na alimentação, na moradia e no poder aquisitivo, além de

provocar mudanças importantes no panorama da agricultura estadual. Proporcionou o

acesso a terra; criaram melhores condições de aproveitamento das pequenas

propriedades do agreste de Ribeirópolis; contribuíram com o aumento da oferta de

olerícolas no mercado; ampliaram o consumo de insumos e equipamentos agrícolas e as

oportunidades de negócios agrícolas e não agrícolas no entorno do município; e foram

responsáveis pela constituição parcial de um mercado de trabalho, com o

aproveitamento da mão de obra.

Assim, a irrigação para pequenos produtores não pode ser condenada de antemão ao

fracasso. Mas que é possível e recomendável, como forma de minimizar os graves

problemas sociais que atingem milhares de pequenos agricultores e trabalhadores do

campo sergipano.

Referências

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