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Sebenta Direito dos Contratos I – 2017/2018 DNB CONTRATO COMPRA E VENDA ....................................................................................................... 3 Forma ........................................................................................................................................ 4 Efeitos – art. 879º ...................................................................................................................... 5 Contrato Sinalagmático ........................................................................................................... 12 Cláusula de Reserva da Propriedade – art. 409º ................................................................... 13 Perturbações do Contrato Compra e Venda............................................................................ 18 1. Não Cumprimento da Obrigação de Pagar o Preço........................................................... 18 2. Compra e Venda a Prestações – art. 934º e ss. CC............................................................ 18 3. Compra e Venda de Bens Alheios – art. 892º e ss. CC....................................................... 23 4. Compra e Venda de Bens Onerados – art. 905º e ss. CC ................................................... 29 5. Compra e Venda de Bens Defeituosos – art. 913º e ss. CC ............................................... 34 6. Venda Sobre Documentos – art. 937º e ss. CC.................................................................. 48 7. Compra E Venda De Coisa Sujeita A Pesagem, Contagem Ou Medição – art. 887º e ss. CC ............................................................................................................................................. 49 Modalidades Especiais de Compra e Venda ............................................................................ 51 VENDA A RETRO – art. 927º e ss. .......................................................................................... 51 VENDA A CONTENTO e SUJEITA A PROVA– art. 923º, 924º e 925º ....................................... 52 Proibições de Compra e Venda................................................................................................ 53 CONTRATO LOCAÇÃO................................................................................................................... 55 Art. 1023º ................................................................................................................................ 56 Elementos Constitutivos do Contrato de Locação – art. 1022º: ............................................. 57 Forma e Formação do Contrato de Locação ........................................................................... 58 Efeitos da Locação ................................................................................................................... 59 OBRIGAÇÕES DO LOCADOR................................................................................................. 59 OBRIGAÇÕES DO LOCATÁRIO .............................................................................................. 61 Proibições de Locação ............................................................................................................. 67 Vicissitudes do Contrato de Locação ...................................................................................... 67 Sublocação – art. 1060º ...................................................................................................... 70 Perturbações da Prestação no Contrato de Locação .............................................................. 71 Resolução do Contrato de ARRENDAMENTO URBANO ...................................................... 74 Extinção do Contrato............................................................................................................... 75 Revogação ........................................................................................................................... 75 Resolução ............................................................................................................................ 76 Caducidade .......................................................................................................................... 77 Denúncia e Oposição à Renovação ..................................................................................... 78

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CONTRATO COMPRA E VENDA ....................................................................................................... 3

Forma ........................................................................................................................................ 4

Efeitos – art. 879º ...................................................................................................................... 5

Contrato Sinalagmático ........................................................................................................... 12

Cláusula de Reserva da Propriedade – art. 409º ................................................................... 13

Perturbações do Contrato Compra e Venda ............................................................................ 18

1. Não Cumprimento da Obrigação de Pagar o Preço ........................................................... 18

2. Compra e Venda a Prestações – art. 934º e ss. CC ............................................................ 18

3. Compra e Venda de Bens Alheios – art. 892º e ss. CC ....................................................... 23

4. Compra e Venda de Bens Onerados – art. 905º e ss. CC ................................................... 29

5. Compra e Venda de Bens Defeituosos – art. 913º e ss. CC ............................................... 34

6. Venda Sobre Documentos – art. 937º e ss. CC .................................................................. 48

7. Compra E Venda De Coisa Sujeita A Pesagem, Contagem Ou Medição – art. 887º e ss. CC

............................................................................................................................................. 49

Modalidades Especiais de Compra e Venda ............................................................................ 51

VENDA A RETRO – art. 927º e ss. .......................................................................................... 51

VENDA A CONTENTO e SUJEITA A PROVA– art. 923º, 924º e 925º ....................................... 52

Proibições de Compra e Venda ................................................................................................ 53

CONTRATO LOCAÇÃO ................................................................................................................... 55

Art. 1023º ................................................................................................................................ 56

Elementos Constitutivos do Contrato de Locação – art. 1022º: ............................................. 57

Forma e Formação do Contrato de Locação ........................................................................... 58

Efeitos da Locação ................................................................................................................... 59

OBRIGAÇÕES DO LOCADOR................................................................................................. 59

OBRIGAÇÕES DO LOCATÁRIO .............................................................................................. 61

Proibições de Locação ............................................................................................................. 67

Vicissitudes do Contrato de Locação ...................................................................................... 67

Sublocação – art. 1060º ...................................................................................................... 70

Perturbações da Prestação no Contrato de Locação .............................................................. 71

Resolução do Contrato de ARRENDAMENTO URBANO ...................................................... 74

Extinção do Contrato ............................................................................................................... 75

Revogação ........................................................................................................................... 75

Resolução ............................................................................................................................ 76

Caducidade .......................................................................................................................... 77

Denúncia e Oposição à Renovação ..................................................................................... 78

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Normas do CC da parte dos Contratos Especiais não regulam exaustivamente estes Contratos – há espaço para

legislação avulsa particularizar certos preceitos.

CONTRATO COMPRA E VENDA

Romano Martinez: termos “compra” e “venda” indissoluvelmente ligados do ponto de vista

linguístico, representando a mesma unidade concetual sendo uma expressão que representa

as duas realidades do contrato (a aquisição do direito e respetiva alienação), que não se

podem dissociar.

ML: talvez o mais importante contrato regulado no Código, não apenas em virtude da função

económica essencial que desempenha, mas também porque a sua regulação se apresenta como

paradigmática em relação aos restantes contratos, tendo uma grande relevância na construção

da dogmática dos contratos em especial.

➢ Estamos perante um contrato nominado, (maioritariamente) não formal, consensual,

obrigacional e real quoad effectum, oneroso, sinalagmático, (normalmente)

comutativo (embora possa ser aleatório – art. 880º/2) e de execução instantânea (RM:

podendo ser de execução continuada, conformando a sua natureza como contrato de

fornecimento)

Noção -> ART. 874º

1. Transmissão da Propriedade ou outro direito

• Maria de Lurdes Pereira: o que acontece mais na prática e a prevalência

estatística é a transmissão da propriedade, mas, também existe uma Compra e

Venda quando se transmitem outros direitos

i. Direitos Reais: Usufruto

ii. Direitos de Crédito: Cessão de Crédito1 e Posições Contratuais2

iii. Direitos de autor, patentes

iv. Universalidades de Direito

2. Pagamento de um preço

• Preço = Quantia em Dinheiro3

i. Se não for em dinheiro não é uma Compra e Venda e sim uma TROCA

(a que se aplicam algumas regras da Compra e Venda, mas que tem

especificidades diferentes)

“Comprar bilhete” é mesmo uma Compra e Venda?

MLP: pode haver propriedade do bilhete, mas, a propriedade da coisa corpórea “bilhete” é

acessória portanto não se aplica o regime da Compra e Venda.

➢ Expressão corrente mas que não tem alcance jurídico por não preenche a noção de

Compra e Venda – o bilhete é um título de legitimação que é adquirido.

1 Simultaneamente funciona o regime da Cessão de Créditos (do art. 577º e ss.) e o da Compra e Venda pois são compatíveis (art. 587º compatibiliza ao referir o negócio oneroso). 2 Que incluem posições jurídicas ativas e passivas.

Quanto à Assunção de Dívida (art. 595º e ss.) já não se pode falar numa Compra e Venda pois não temos um contrato remunerado (ninguém paga para assumir dívida) – embora haja a possibilidade de aplicar parte do regime da Compra e Venda a esta figura 3 ML: contrapartida pecuniária

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Compra e Venda é contrato oneroso mas não tem necessariamente de haver uma equivalência

exata da contraprestação – não tem de haver correspondência exata entre o sacrifício das

partes.

Forma Regra da Liberdade de Forma: art. 219º

Plenamente aplicável à aquisição de Direitos Reais sobre bens móveis.

Pode é haver requisitos de Formalidades que exigem forma escrita, mas, não afetam a validade

do contrato4 e apenas a oponibilidade a terceiros.

➢ Há casos em que as formalidades têm mesmo de ser observadas pois podem levar a

sanções:

o Licença de utilização de imóvel

o Princípio da legitimação do Código Registo Predial (art. 9º)5 – certifica que à luz

do Registo, aquela pessoa é a que pode transmitir

▪ Os factos de que resulte transmissão de direitos ou constituição de

encargos sobre imóveis não podem ser titulados sem que os bens

estejam definitivamente inscritos a favor da pessoa de quem se adquire

o direito ou contra a qual se constituiu o encargo.

Direitos Reais sobre bens imóveis – art. 875º

Não somente a propriedade – todos os direitos reais sobre bens imóveis6 devem observar a

forma de Escritura Pública ou Documento Particular Autenticado

➢ Exceções em lei especial:

o Desde 2007 que nas Conservatórias do Registo Predial as partes podem fazer

um documento particular que substitui a escritura pública (art. 8º/3 DL 263-

A/2007 + Portaria 794-B/2007)

o Quando é um contrato de mútuo e o mutuante é instituição de crédito e

financeira também não se requer esta forma, por motivos de celeridade – basta

documento particular (art. 1º e 2º/1 DL 255/93)

Outros Direitos – Direitos de autor, patente, estabelecimento comercial, quinhão hereditário7

Exigência de Documento Escrito

4 E a inobservância de forma exigida leva à nulidade do negócio jurídico (art. 220º). 5 É comando para o notário, que tem obrigação de verificar e fazer valer este princípio, sendo as sanções a ele impostas. 6 ML: todos os atos que importem reconhecimento, constituição, modificação, divisão ou extinção dos direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, superfície ou servidão sobre coisas imóveis e aos atos de alienação, repúdio e renúncia de herança ou legado, de que façam parte coisas imóveis (art. 22º/a DL 116/2008 e art. 2126º/1) 7 Fora desta lista, vigora a liberdade de forma.

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Efeitos – art. 879º Compra e Venda ó se encontrará definitivamente executada quando se verificarem duas

alterações na situação jurídica patrimonial dos contraentes:

i. aquisição por parte do comprador do direito de propriedade sobre o bem vendido (com

efeito subordinado de aquisição da posse)

ii. aquisição por parte do vendedor do direito de propriedade sobre determinadas espécies

monetárias

No entanto, o art. 874º estabelece 2 processos técnicos distintos para a obtenção desse mesmo

resultado:

• a) – Efeito Real – que se reconduz no efeito translativo automático com a perfeição do

acordo contratual

• b), c) – Efeito Obrigacional – que se reconduz à constituição das obrigações de entregar

a coisa e pagar o preço

a) A transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito = EFEITO TRANSMISSIVO

o MLP: não é acertado falar-se em Efeito Real pois pode não estar em causa

qualquer direito real, uma vez que este efeito abrange todo o universo dos

direitos que podem ser objeto de Compra e Venda

Os art. 879º/a e 874º parecem indicar que este é um efeito absolutamente necessário da

Compra e Venda

➢ Olhando para o regime da Compra e Venda vemos que este efeito é tendencialmente

necessário, mas que há exemplos que o contrariam

Art. 880º e 881º - estão em causa contratos que podem nascer e morrer sem se dar qualquer

efeito transmissivo

• Art. 880º/1: Partes podem convencionar que não transmitem logo o direito sobre um

quid o Resposta tradicional: então não se paga o preço e não há Compra e Venda

o E se as partes convencionarem que se paga o preço mesmo que não chegue a

existir o bem futuro sobre o qual se transmite o direito? Estamos perante uma

Compra e Venda em que não há Efeito Transmissivo

• Art. 880º/2: se as partes convencionarem que o contrato tem caráter aleatório, há uma

Compra e Venda e não há efeito transmissivo

• Art. 881º: caso em que a coisa está em litígio; não é certo que seja do seu proprietário

pelo que, sendo vendida nestas condições, o preço é devido na mesma apesar da coisa

poder não vir a ser do proprietário – há Compra e Venda sem efeito transmissivo.

MLP: conclui que o Efeito Transmissivo não é elemento indispensável para haver uma Compra

e Venda pois o próprio regime da Compra e Venda o contraria.

O Efeito Transmissivo pode ser concebido de acordo com vários sistemas:

1) Sistema do Título – Portugal – contrato tem efeito real que se produz com a mera

celebração do contrato, não sendo preciso nenhum ato posterior.

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• Contrato tem logo efeito translativo: art. 879º/a + 408º CC – o título é só por si

suficiente para produzir o efeito real

• ML: Acordo das partes acarreta logo a transferência ou constituição imediata

e instantânea do direito – transmissão do direito depende exclusivamente do

negócio transmissivo

➢ Princípio da Consensualidade8 – direito transmite-se com base no

simples consenso das partes.

➢ Princípio da Causalidade – há uma causa jurídica que justifica.

2) Sistema do Modo – Alemanha – contrato produz efeito obrigacional e tem de haver ato

posterior do vendedor para transmitir o direito real sobre a coisa.

• Contrato de Compra e Venda não produz efeitos reais tendo apenas por função

a constituição de obrigações, resultando a transferência do direito de um

segundo ato, que o vendedor se obriga a praticar e, esse ato sim, produz

efeitos reais.

➢ Princípio da Abstração – obrigação de transmissão do direito pelo

vendedor subsiste mesmo que a Compra e Venda seja inválida.

ML: Os vícios no negócio causal não podem afetar a transferência da

propriedade

3) Sistema Misto (Sistema do Título e Modo) – Espanha, Áustria – contrato tem eficácia

obrigacional e o direito não se transmite só por si e é exigível um ato posterior, mas, não

consagra princípio da abstração e o ato do vendedor pode ser afetado pela invalidade

da Compra e Venda

• Não basta que exista uma justa causa ou fundamento jurídico de aquisição,

sendo ainda necessária a realização de um segundo ato de transmissão.

➢ O título só por si é insuficiente para produzir o efeito real, exigindo

necessariamente um modo. Mas, também o modo de aquisição só por

si é insuficiente, pressupondo igualmente um título – só pode haver

traditio quando tal seja precedido por um negócio jurídico que

fundamente essa transmissão.

Consagrando o Sistema do Título, o art. 408º/1 também permite exceções:

➢ ML: fica em aberto a possibilidade de que ao lado da venda real9, regra no nosso sistema

(do título), o Direito reconheceria também a venda obrigatória (característica dos outros

sistemas)10.

➢ MLP: há disposições que podem manifestar um Sistema Misto

8 ML: a que se liga necessariamente o Princípio da Causalidade, exigindo-se uma justa causa de aquisição para que o direito real se transmita ou constitua. 9 Compra e Venda é negócio jurídico real quoad effectum 10 Apenas reconhece duas situações:

1º. Compra e Venda de coisas indeterminadas em que a lei procede a uma separação, ainda que meramente cronológica, entre o momento em que se verifica a conclusão do contrato e a que ocorre o fenómeno translativo.

2º. Compra e Venda de coisa alheia em que o fenómeno translativo não se pode verificar em virtude de o vendedor não ser efetivamente o proprietário do bem vendido (art. 892º).

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Art. 409º - cláusula em que o efeito real não se produz até pagamento do preço ou até “outro

evento”

• Doutrina minoritária (Assunção Cristas/França Gouveia) entende que nos casos de

“outro evento” não há ligação com cumprimento de obrigações, o que faz depender o

efeito translativo de algo diferente que não o cumprimento da obrigação da outra parte,

portanto, foge ao Sistema do Título e enquadra-se num Sistema Misto pois exige que as

partes realizem um ato posterior.

o Escola Nova de Lisboa entende que isto é um desvio plenamente possível pois

foi convencionado pelas partes.

o Escola Clássica de Lisboa entende que isto não é desvio ao Sistema do Título.

▪ ML: o fenómeno translativo é diferido para momento posterior mas não

fica dependente do cumprimento de uma obrigação de transferir em

sentido técnico; ainda que surjam obrigações associadas a essa

transmissão, não são elas que produzem o efeito translativo; o contrato

integra sempre um esquema negocial translativo

▪ Pedro Albuquerque: o STJ (18/9/03) reconheceu que nos caos do art.

409º há apenas diferimento da eficácia real que se continua a imputar

ao consenso.

Maria de Lurdes Pereira concorda com a Escola Nova de Lisboa mas entende que no Direito

Português as maiores exceções são no caso dos Valores Mobiliários.

• Põe enfoque no art. 102º do Código Valores Mobiliários11 – entendendo o artigo como

uma Compra e Venda obrigacional em que primeiro há a constituição de uma obrigação

e só depois, com a inscrição do título, há a aquisição do mesmo.

o No caso dos Valores Mobiliários há um Sistema de Título e de Modo quanto à

sua aquisição.

▪ = Veiga Eiró, Ferreira de Almeida, Coutinho de Abreu + alguma

jurisprudência (STJ, 13/3/07; STJ 15/5/08)

o Pedro Albuquerque: discorda e entende que há eficácia transmissiva imediata.

▪ As exigências no respeitante ao registo ou posse, situam-se no plano da

simples atribuição de legitimidade, não ao nível da realidade

substantiva.

▪ O adquirente não está legitimado para exercer certos direitos, mas já é

o titular da posição de fundo, podendo opor-se à atuação do titular

aparente e condicioná-la dando-lhe instruções, cujo incumprimento

responsabiliza o alienante e nisto se manifesta já o conteúdo da

titularidade do comprador.

▪ Conclui-se em definitivo, também no âmbito dos valores mobiliários

não há lugar para uma Compra e Venda meramente obrigacional e,

entre nós, tem sempre eficácia real.

11 Art. 102º: valores mobiliários titulados nominativos transmitem-se por declaração de transmissão, escrita no título, a favor do transmissário, seguida de registo junto do emitente ou junto do intermediário financeiro que o represente.

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b) A obrigação de entregar a coisa

O cumprimento da obrigação de entrega corresponde a um ato material, que permite ao comprador

a apreensão física ou aquisição do gozo da coisa (que é o objeto desta obrigação12).

Comprador adquire um direito de crédito à entrega da coisa pelo vendedor.

➢ MLP: não tem sempre de existir

o Há casos em que há Compra e Venda sem a obrigação de entrega. Ex: quando a

coisa já está em poder do comprador como nos casos de constituto possessório

(art. 1263º/c + 1264º)

Quando existe, está sujeita ao regime do art. 882º - que só se aplica a coisa específica e

determinada e não às coisas genéricas13.

• A obrigação de entrega da coisa implica um dever de custódia e guarda da coisa, pelo

vendedor, até à sua entrega.

o Romano Martinez: dever instrumental em relação à entrega da coisa, pelo que

as despesas de guarda da coisa correspondem a um ato instrumental da

entrega, sendo suportadas pelo devedor.

Caso haja uma deterioração, há um “defeito da coisa” – art. 913º e ss. – pelo que se aplica o art.

918º (que reitera a aplicação do regime do não cumprimento).

• O art. 882º tem de ser articulado com o regime14 do Risco do art. 796º15.

o São compatíveis pois o art. 796º aplica-se quando há danos não imputáveis a

nenhuma das partes e o art. 882º aplica-se quando o dano é imputável ao

vendedor (que tem uma presunção de culpa sobre ele, devido ao dever de

custódia16).

12 Apesar de poder ainda incluir objetos que garantam que a coisa seja entregue nas devidas condições – embalagens e acondicionamentos devidos. 13 Nesses casos aplicam-se os art. 539º e ss. 14 MLP: é discutível se é um bom regime, uma vez que a referência ao “domínio” gera dificuldades interpretativas. Deve simplificar-se e entender-se como “propriedade”.

15 (risco nos contratos sinalagmáticos reais de alienação) Res perit domino – o risco pelo perecimento ou deterioração da

coisa cabe ao que for proprietário dela no momento de tal evento. Se já houve transmissão da propriedade sobre a

coisa objeto de entrega, o seu perecimento não extingue o direito à contraprestação (art. 796º/1) – credor suporta o

risco, continuando onerado com a sua contraprestação.

➢ O devedor passa a funcionar como mero depositário da coisa, não retirando qualquer benefício da sua guarda

– risco pelo perecimento é legalmente associado ao proveito que da coisa se retira, o que compete, em

princípio, ao proprietário.

Art. 796º/2 – ex: pessoa vende quadro mas estabelece que entrega daqui a um mês para o expor. Nessa exposição ele

é queimado. Devedor suporta o risco. – Tendo o termo constituído a seu favor, não é mero depositário e utiliza a

coisa em proveito próprio, sendo justo que suporte o risco.

• Risco só se transfere com o vencimento do termo (alienante deixa de beneficiar do prazo para utilização da

coisa) ou com a entrega da coisa.

• Admite-se que o alienante se possa constituir em mora pelo art. 807º (o que leva a uma inversão do risco)

Art. 796º/3 – resolutiva significa que adquirente se encontra a tirar proveito dela justificando-se suportar o risco;

suspensiva significa que a propriedade ainda não se transferiu, sendo apenas eventual, pelo que não se justifica que seja

o adquirente a suportar o risco.

Art. 797º - apenas aplicável às obrigações genéricas (art. 541º) pois as de coisa determinada têm a transferência de

risco com a celebração do contrato (antes do envio)

16 Se ilidir esta presunção pode vir depois a ser aplicado o art. 796º.

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▪ Romano Martinez: se a coisa se deteriorar entre a data da celebração e

a da entrega presume-se a culpa do vendedor (art. 799º) pois ele é

responsável pelo não cumprimento da obrigação de entrega (art. 918º),

aplicando-se as regras do cumprimento defeituoso; se a coisa se

deteriorar por causa não imputável ao vendedor (devido a este ter

ilidido a presunção) entre a data da celebração e a da entrega, o risco é

assumido pelo comprador (art. 796º).

Na falta de entrega da coisa, a situação é a do incumprimento e presume-se a culpa do

vendedor (art. 799º), que pode ser ilidida.

➢ Tem de se ter em conta se esse não cumprimento pode ter a ver com a exceção do não

cumprimento (art. 428º)17.

c) A obrigação de pagar o preço

Previsão da entrega de uma quantia em dinheiro ao vendedor como contrapartida da entrega da

coisa por parte deste.

• Assunção desta obrigação faz nascer na esfera do vendedor um direito de crédito sobre

o comprador, ficando o vendedor apenas proprietário das espécies monetárias

correspondentes aquando do cumprimento da obrigação.

• Sujeito ao regime do cumprimento das obrigações pecuniárias.

Pedro Albuquerque: Preço tem de ser a expressão do valor em dinheiro.

17 Art. 428º/1 – permite-se a um dos contraentes recusar a realização da sua prestação enquanto não ocorrer a prévia

realização da prestação da contraparte, ou a oferta do seu cumprimento simultâneo.

• Lícita a recusa de cumprimento – impede regime da mora e do incumprimento definitivo – meio de defesa

que assiste ao credor como causa justificativa de incumprimento das obrigações

• Sendo obrigações puras, a exceção do não cumprimento é sempre invocável e não pode ser afastada mediante

a prestação de garantias (art. 428º/2)

• Havendo estipulação de prazos certos diferentes, um dos contraentes obriga-se a cumprir em primeiro lugar,

renunciando à exceção do não cumprimento e consequente constituição em mora pelo decurso do prazo (art.

805º/2/a) – Se houver prazo diferente/diferido, deve ser interpretado extensivamente para abranger estes

casos também.

• ML: o contraente que esteja obrigado a cumprir em 2º lugar pode usar a exceção do não cumprimento se a

contraprestação (a 1ª) não for realizada. Ex: A diz que entrega o quadro dia 1 e B paga dia 15; se A não

entregar a 1, B não tem que pagar a 15 invocando a exceção do não cumprimento.

Para a invocação da Exceção do Não Cumprimento ser conforme à boa fé exige-se uma tripla relação entre o não

cumprimento de um contraente e a recusa a cumprir:

1. Relação de Sucessão – quem invoca a exceção não foi o primeiro a cair em incumprimento; recusa a cumprir

é posterior ao incumprimento da outra parte

2. Relação de Causalidade – invocação da exceção visa exclusivamente compelir a outra parte à realização da

sua prestação

3. Relação de Proporcionalidade – invocação da exceção tem que ser proporcional ao incumprimento que a

legitima

Art. 429º - mesmo que se tenha acordado que um prestaria primeiro que outro, se posteriormente ao contrato se

verificarem as situações do art. 780º relativamente a este outro, o primeiro pode não prestar.

Invocável em caso de cumprimento defeituoso?

• Sim – se os defeitos de que a prestação padece prejudicam a integral satisfação do credor. Cabe à parte que

pretende utilizar a exceptio non rite adimpleti contractus demonstrar que os defeitos existentes tornam

inadequada a prestação

• Não – se os defeitos da prestação, atendendo ao interesse do credor, forem de escassa importância (AV:

analogia do art. 802º)

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

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➢ Mas, este requisito não obsta, obviamente, a que o comprador acorde com o vendedor

que pague em bens diferentes de dinheiro – uma coisa é a fixação do preço

(necessariamente em dinheiro) e outra é a forma de pagamento, em momento posterior

à estipulação, o que cabe à autonomia da vontade das partes.

Art. 280º/1 não exige que preço esteja determinado, bastando que seja determinável.

• Não haver preço determinado pode ser indício de que o contrato não é final – as partes

ainda não chegaram a um acordo sobre todos os elementos essenciais do contrato (não

chegaram ao acordo do preço).

o STJ, 6/2/07 (Urbano Dias): discriminação [do preço] não tem de ser expressa

• As hipóteses de determinabilidade do preço ocorrerão quando as partes fixarem uma

forma do preço ser determinado ou a lei supletivamente indique essa forma nos termos

do art. 883º, em que o primeiro critério prevalece sobre o segundo.

o Romano Martinez: Princípio que vale para a determinação do preço é um de

liberdade contratual, apesar de, em certos casos, o preço poder ser fixado por

entidade pública.

▪ Não têm de atender ao valor de mercado, mas estão condicionadas pelo

regime da usura do art. 282º CC.

o Pedro Albuquerque: as partes podem também ter definido que seria um

terceiro a determinar o preço (completando a vontade negocial dos

intervenientes) ou uma das partes a posteriori – art. 400º

ML: Sujeito a prescrição ordinária de 20 anos – art. 309º

➢ No caso de comerciantes a prescrição é de 2 anos – art. 317º/b

Romano Martinez

Vigora, para as prestações pecuniárias, o regime geral para as obrigações (art. 762º e ss. CC) e

do não cumprimento (art. 790º e ss. CC).

➢ Tem duas exceções, mas, sendo estas normas supletivas:

o art. 885º

o art. 886º

ART. 884º - Previsão da redução do preço nos casos de redução do contrato

Não segue o regime geral da redução

➢ Pressupõe a aplicação prévia do art. 292º mas estabelece mais do que este artigo exige,

fazendo jus ao caráter sinalagmático da Compra e Venda, ao ajustar a contraprestação

à parte válida do contrato.

nº1: implica que no contrato esteja descriminado o preço de todas as parcelas, o que não

acontece na generalidade dos casos, uma vez que o preço é globalmente fixado e não

estabelecido por várias partes.

nº2: para os casos em que o preço é globalmente fixado

• MLP: faz sentido não ser proporcional à quantidade das coisas transmitidas pois pode

haver valorizações diferentes atendendo à função das coisas transmitidas – daí que haja

necessidade de ser avaliado caso a caso.

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ART. 885º - Tempo e lugar do pagamento do preço

Afasta o regime do art. 774º - justifica-se para possibilitar às partes o recurso à exceção do não

cumprimento do art. 428º CC18

O que mais acautela o cumprimento das obrigações, na Compra e Venda como contrato

sinalagmático, é o cumprimento simultâneo.

ML: Pressupõe que a obrigação do vendedor seja integralmente cumprida. Se a entrega for feita

por fases, a prestação do preço apenas deve ser efetuada aquando da realização da última

entrega, salvo convenção das partes.

ART. 886º - Falta de pagamento do preço

Obrigação na Compra e Venda é colocada em nexo de reciprocidade – com a entrega da coisa,

o não cumprimento da obrigação de pagar o preço poderia dar lugar à resolução do contrato

por incumprimento (art. 801º/2 CC).

➢ Esta faculdade é restringida por este artigo, que tem natureza supletiva e restringe a

possibilidade de resolução do contrato.

ART. 887º - Preço fixado por unidade

MLP: aparentemente é regra de determinação do preço, mas, é uma solução que vem reagir a

uma perturbação.

Quando uma coisa determinada está sujeita a pesagem ou medição (ex: um saco de 5kg de

limões; não 5 kg de limões – isso é genérico e não determinado, estando sujeito ao regime das

obrigações genéricas), o que é tido em conta é o valor real e não o declarado pelas partes.

• Havendo divergência entre o declarado e a realidade, as partes estão em erro face à

declaração e o legislador decidiu que se devia alterar o preço19.

o Estando o preço da unidade fixado no contrato, o preço devido é o que

corresponder à pesagem ou medição da quantidade real.

Com incumprimento, aplica-se o art. 891º que apenas tutela o comprador e não o vendedor,

não se percebendo muito bem porquê (MLP).

Outros efeitos/situações jurídicas geradas pela Compra e Venda não contempladas

expressamente pelo art. 879º

VENDEDOR 1) Art. 880º - Obrigação de exercer diligências necessárias para comprador adquirir bens futuros

que comprou

• Casos de Compra e Venda sem efeito translativo imediato – efeito translativo é

substituído pela obrigação de exercer diligências necessárias.

18 Também pode recorrer a esta disposição se se detetar, dentro dos prazos da lei, discordâncias entre a coisa entregue e a que era devida. 19 Apesar da doutrina avançar com a possibilidade de outras soluções: anulabilidade e manter preço inalterado.

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• Incumprimento desta obrigação, quando vendedor incumpre a obrigação de meios, por

causa que lhe é imputável, e não consegue transmitir a coisa:

o Indemnização pelo interesse negativo – Raúl Ventura – pois este negócio

jurídico é uma Compra e Venda incompleta.

o Indemnização pelo interesse positivo – Menezes Leitão (e maioria) – Compra e

Venda já é completa e posteriormente não se vai acrescentar mais nada.

2) Emissão de fatura – no âmbito de compra e venda comercial (art. 476º CCom).

• Obrigação extensível a todos os sujeitos passivos de IVA (art. 28º/1/b do CIVA).

3) Deveres acessórios impostos pelo princípio da boa fé (art. 762º/2 CC) que podem abranger

deveres de informação e conselho ou assistência pós-venda (mais importante nos contratos de

consumo).

COMPRADOR Art. 878º - despesas do contrato correm por conta do comprador.

• Despesas em relação às formalidades dos contratos e registo.

• MLP: duvida que isto seja um dever do comprador

o É um encargo do comprador, que corresponde a deveres que o comprador tem

perante terceiros, pois o contrato não faz nascer deveres do comprador ante o

vendedor.

• Nos casos em que o vendedor pagar pode exigir reembolso.

• São regras supletivas e as partes podem estipular coisas diferentes.

• ML: não se enquadram neste artigo as despesas relativas a atos de execução do contrato,

como o cumprimento das obrigações do vendedor e do comprador, que ficam a cargo do

devedor. Assim, corre por conta do vendedor as despesas relativas à guarda, embalagem,

transporte e entrega da coisa vendida e por conta do comprador as despesas necessárias

para o pagamento do preço (como obrigações fiscais).

Contrato Sinalagmático

MC + ML + Dário Moura Vicente

Sinalagma liga as prestações e as contraprestações que, no mesmo negócio, são a causa

jurídica e o fundamento um do outro – sem uma não se pode exigir a outra.

o Sinalagmáticos – nexo de reciprocidade entre as obrigações dos contraentes: partes

assumem obrigações recíprocas em que uma está na interdependência da outra.

Situações de “só se… se” – simultaneamente credor e devedor.

▪ Com o contrato cria-se um nexo entre as prestações (sinalagma genético) que se

mantém no sentido de que uma prestação não pode ser executada sem a outra

(sinalagma funcional) o Não-Sinalagmáticos – posição/deveres das partes não são correspectivos: não

dependem uma da outra e uma parte tem situação passiva e outra ativa. Ex: doação de

uma casa, mas ao doar dou o encargo de lá ficar com a avozinha – apenas uma das

partes assume uma obrigação e a contraparte não tem deveres, apenas o encargo

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MLP: Compra e Venda tem uma conceção ampla de sinalagma20

Esta conceção ampla explica algumas soluções do regime da Compra e Venda – celebração de

Compra e Venda sem nunca se constituir obrigação de entrega. Ex: venda de imóvel ao

arrendatário

➢ A conceção restrita não conseguia conceber esta situação como uma Compra e Venda

o MLP: deve utilizar-se o conceito amplo de sinalagma para termos uma Compra

e Venda (contrato sinalagmático por excelência) e ser-lhe aplicada as soluções

desse regime.

Tempo e lugar de entrega – regras gerais

Tempo e lugar de pagamento do preço – regras do art. 885º

➢ Quando se fala no artigo em “entrega”, também abrange a entrega simbólica

É a natureza de sinalagma que melhor faz compreender a

Cláusula de Reserva da Propriedade – art. 409º Esta cláusula surge em consequência da facilitação da lei da transmissão dos bem, que a todo o

custo se evita que seja revertida (art. 886º que retira ao vendedor a possibilidade de resolução do

contrato por incumprimento da outra parte a partir do momento em que ocorra a transmissão da

propriedade e a entrega da coisa).

Cláusula na qual o vendedor reserva para si a propriedade da coisa até ao cumprimento total ou

parcial das obrigações do comprador

➢ Por acordo entre as partes a transmissão da propriedade é diferida para o momento

do pagamento integral do preço.

➢ Não põe em causa o Sistema do Título porque o efeito Translativo continua a dar-se pelo

acordo das partes – há um diferir desse efeito face à entrega da coisa.

Cláusula tem de ser estipulada no contrato de Compra e Venda, do qual não pode ser cindida.

20 MLP + Pedro Múrias Conteúdo do sinalagma:

• Limitação imanente da vinculação assumida por cada uma das partes, traduzida em a prestação ser apenas devida contra ou em troca da contraprestação.

• Estrutura final do contrato, constituída quanto ao fim de troca em que o objeto dos deveres é a prestação sem quaisquer restrições.

o MLP: tese da estrutura final só se distingue da limitação imanente da prestação por colher do contrato uma fórmula menos clara da dependência das obrigações.

o Não são ambas totalmente corretas e há precisões que têm de ser feitas Um sinalagma é uma estipulação (ou determinação) com 3 elementos: cada parte vincula-se perante a outra parte, ficando esta com “direito” à concretização da atribuição; cada uma das partes vincula-se se e só se a outra vinculação se concretizar (há limitação imanente da vinculação); cada uma das vinculações é estabelecida para que a outra vinculação se concretize (a vinculação tem essa finalidade). É um elemento do negócio, do seu texto ou do seu conteúdo, por vezes autonomamente explicitado em locuções como “em troca de” mas podendo resultar do contexto. Outra das vantagens no alargamento da noção de sinalagma é a defesa da inaplicabilidade do art. 781º ao mútuo oneroso, devido à natureza sinalagmática deste contrato.

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• Há contratos Compra e Venda em que a cláusula pode ser aposta posteriormente à

celebração do contrato: aqueles em que a propriedade não se transmite logo (venda de

bens futuros); acautelado pelo art. 408º/2;

Regime está previsto no regime das obrigações em geral, e não apenas em relação à Compra e

Venda pois esta Cláusula pode ter um âmbito de aplicação mais amplo do que apenas a Compra

e Venda.

Trata-se da questão do “pagamento do preço” e não de “outro evento”, pois estamos a tratar

de uma situação relativa ao cumprimento do contrato – o que se relaciona com a obrigações

da outra parte.

➢ MLP: implica que haja Reservas de Propriedade muito distintas

Há entendimentos que não ligam a Reserva de Propriedade ao Sinalagma:

A. Reserva de Propriedade como Condição Suspensiva – Galvão Telles, AV, Almeida Costa

– transmissão da propriedade ficaria subordinada a um facto futuro e incerto (o

pagamento do preço).

• Risco do perecimento da coisa corria por conta do vendedor, mesmo após entrega

ao comprador, o que é inaceitável – comprador a partir da entrega fica investido

nos poderes de uso e fruição da coisa. A manutenção da propriedade no vendedor

apena para assegurar a recuperação do bem, em caso de não pagamento do

preço. i. É-lhe inaplicável o regime da transferência do risco do art. 796º/3.

• O contrato de Compra e Venda gera logo a obrigação de entrega e produz

efeitos – o pagamento do preço não é exterior ao Negócio Jurídico da Compra

e Venda, e o regime da condição é pensado/ajustado para situações em que o

negócio jurídico depende de facto exterior

i. Neste caso, não se subordinam os efeitos do negócio a um evento

exterior ao mesmo, antes se faz depender um dos efeitos do negócio

do prévio cumprimento de uma obrigação, que é um dos efeitos

essenciais desse mesmo negócio.

ii. Há apenas uma alteração da ordem de produção dos efeitos negociais,

passando a ocorrer depois do pagamento do preço.

B. Reserva de Propriedade como Condição Resolutiva – Cunha Gonçalves – transmissão

da propriedade para o comprador e a partir do momento em que se verificasse o

incumprimento do pagamento do preço ocorreria a resolução dos efeitos do negócio,

com eficácia retroativa, sendo a propriedade recuperada pelo vendedor.

• Sujeita às mesmas críticas concetuais que a tese anterior.

• Não tem correspondência com a letra da lei – não se adequa à construção do

art. 409º, cuja intenção é que a propriedade não seja transmitida (e não que

seja transmitida e depois possa voltar)

• Art. 304º/3 – se fosse uma condição, ao não poder pagar-se o preço, transmitir-

se-ia a propriedade pois desaparecia a condição (ter-se-ia por verificada – art.

275º/1)

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Regime da condição não é adequado para tutelar a Compra e Venda com Reserva de

Propriedade21.

MLP: Cláusula de reserva de propriedade é uma estipulação negocial que retarda a produção

do efeito real – a transmissão do domínio – até ao momento do pagamento do preço.

➢ Assegura, no plano de execução do contrato, a reciprocidade das atribuições – ligando-

se assim ao Sinalagma.

Função de defender o vendedor de eventuais consequências do incumprimento do

comprador.22

• Com o incumprimento do comprador, vendedor pode já não ter interesse em reaver a

coisa.

o É, então, admissível a renúncia unilateral à cláusula23: vendedor tem

legitimidade para renunciar à reserva da propriedade no caso de falta de

pagamento do preço pelo comprador.

▪ MLP: Vendedor tem de continuar a poder escolher o cumprimento

integral, executando, se necessário, o património do devedor para

obter o pagamento do preço.

▪ Jurisprudência concorda: TRE 16/2/84; TRL 8/6/98; TRL 30/4/02; TRL

13/5/03

Que tipos de situações jurídicas gera o art. 409º na esfera das partes? VENDEDOR – proprietário da coisa, mas, tendo a propriedade limitada

1. Vendedor conserva a propriedade como função de garantia, devendo apenas suportar

o risco da perda dessa garantia.

2. Em caso de incumprimento pelo comprador, vendedor pode resolver o contrato pelo art.

801º/2, uma vez que a exclusão do art. 886º só se verifica se tiver ocorrido a transmissão

da propriedade da coisa.

3. Credores do Vendedor: não podem executar a coisa pois a propriedade do vendedor

está limitada e destituída do poder de disposição.

➢ ML: esta regra decorre da cláusula e do pleno vigor da mesma, uma vez que se

infere da necessidade de assegurar o funcionamento cabal desta cláusula.

COMPRADOR – tem direito real de aquisição oponível a terceiros

1. Comprador como já tira proveito da coisa deve suportar o risco pela perda ou

deterioração.

2. Comprador já tem expectativa jurídica de aquisição do bem oponível a terceiros –

expectativa real de aquisição que, por ser inerente à coisa, deve ser incluída no âmbito

dos direitos reais de aquisição.

3. Credores do Comprador: Conservação da propriedade do vendedor até ao pagamento

do preço impede os credores do comprador de executarem o bem, podendo o vendedor

reagir contra essa execução através de embargos de terceiro.

➢ Nos casos de insolvência do comprador, a cláusula é oponível à massa

insolvente se tiver sido estabelecida por escrito (art. 104º/4 CIRE).

21 ML: Na Reserva de Propriedade não há qualquer condição mas antes uma alteração da ordem de produção dos efeitos negociais. 22 Propriedade é a melhor garantia porque prevalece sobre a outras garantias (art. 686º, 688º/f) 23 Desvio ao art. 406º, ao permitir esta ação unilateral, mas admissível tendo em conta a ideia de sinalagma.

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16

Reserva de propriedade a favor de 3º estranho ao contrato (financiador) Art. 409º fala apenas no alienante -> “para si”

• Não é possível – Romano Martinez, Pedro Albuquerque – instituição de crédito não é

vendedora (pois o seu objeto não é a Compra e Venda de bens de consumo)24; banco

estaria a reservar a propriedade de algo que nunca foi seu; DL 359/91 reconhecia a

hipótese de isto ocorrer; tipicidade direitos reais.

• É possível – PPV, Menezes Leitão (+/-) – estamos no âmbito da autonomia privada pelo

que é permitido (há contrato misto ou união de contratos); prática jurídica e habitual

no comércio; salvaguarda risco de incumprimento25; revogação da norma DL

Vendedor nomeia à penhora o bem sobre o qual tem Reserva de Propriedade devido

ao comprador ter sido declarado insolvente 1. Jurisprudência (AUJ 2008) + maioria doutrinária: tal equivale a uma renúncia tácita à

Reserva de Propriedade.

2. Raúl Ventura: do pedido de execução não se pode retirar a intenção de renunciar.

➢ Não é direito que se pode renunciar pois Reserva de Propriedade é apenas um

indeferimento de um dos efeitos.

3. Isabel Campos: pode haver renúncia, mas tem de ser expressa e nos bens registáveis dá-

se quando se cancela o registo.

Eficácia da cláusula em relação a terceiro de coisa móvel não sujeita a registo – não

tratado pelo art. 409º/2

• Pode opor-se a 3º - não se exige registo portanto (vendedor) pode opor a 3º sem

qualquer publicidade.

o MLP: resulta do princípio da consensualidade e a lei pode prescindir da

publicidade na transmissão de certos direitos.

o Apesar de, face a terceiros, o comprador aparentar ser o proprietário, o

vendedor pode opor a sua situação de proprietário a terceiro, já que não há

nenhuma exigência de publicidade.

• Não pode opor-se a 3º - o vendedor, no confronto com 3º não pode opor o direito de

propriedade.

o Romano Martinez

Transferência do risco nos casos de existir Cláusula de Reserva de Propriedade ML: Tanto o vendedor como o comprador são titulares de situações jurídicas reais, havendo que

distribuir o risco de acordo com o proveito que cada um tira da respetiva situação jurídica.

Art. 796º/1 dá a regra geral

24 Em caso de incumprimento, as instituições financeiras não têm interesse em ficar com a propriedade do bem ao resolver o contrato – coisa desvalorizou e instituições não podem ter no seu ativo bens de consumo por muito tempo. Podem exigir cumprimento coercivo das prestações (art. 817º) e executar património do devedor (art. 601º) – mas nesse património não vai lá estar o bem, que tem reserva de propriedade para o banco. Requerendo a penhora, sobre esse bem, renuncia à Reserva de forma unilateral. 25 Para este contrato ser válido podemos recorrer à sub-rogação pelo credor (art. 589º) – vendedor sub-roga banco nos seus direitos, que, por esta via, fica com os direitos como a Reserva (art. 594º -> 582º). Tem de ser concomitante do pagamento ou até esse pagamento.

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➢ Corre “por conta do adquirente” = impõe ao adquirente o dever de pagar o

preço/efetuar contraprestação apesar de já não receber a coisa/receber a coisa com

defeito.

Nos casos do art. 409º, se não for imputável, a nenhuma das partes o comprador suporta, na

mesma, o risco, mas não pela aplicação do art. 796º/1

➢ MLP: não se aplica o art. 796º/1 porque não houve “transferência de domínio”26 – é a

leitura global deste artigo que permite uma construção da norma de acordo com o

espírito do sistema que leva a concluir que é o comprador que assume o risco, uma

vez que goza já de tudo o que podia esperar do contrato e apenas não é proprietário.27

26 = transmissão direito de propriedade

→ MLP: interpretação restritiva

→ RM discorda e tem interpretação de “Entrega da Coisa” 27 Quem defender que a Reserva de Propriedade é condição suspensiva não pode advogar a tese que o risco corre pelo comprador – o art. 796º/3 in fine impede-o.

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Perturbações do Contrato Compra e Venda Expressão que evita o termo “não cumprimento”, que não se ajusta a todas as situações que

estudaremos – a algumas ajusta-se muito bem e a outras muito mal

➢ MLP: Perturbações é mais amplo e faz referência global aos casos em que algo correu

mal num contrato de Compra e Venda. Ex: no caso de venda de coisa defeituosa, não

estão em causa o não cumprimento mas simplesmente a desconformidade entre o bem

e o contrato. Já no caso de se incumprir a obrigação de pagar o preço, é um caso de não

cumprimento.

1. Não Cumprimento da Obrigação de Pagar o Preço Aplicam-se as regras gerais do regime do não cumprimento relativamente às obrigações

pecuniárias – art. 550º e ss.

Art. 886º CC

• Consagra um desvio ao art. 801º/2 (em que a parte fiel continua obrigada a realizar a

sua prestação mesmo que não lhe seja feita uma contraprestação).

o Há desvio ao sinalagma – o vendedor cumpre integralmente a sua parte do

contrato e o comprador não, mas, mesmo assim, não pode resolver o

contrato.

• Art. 886º é regime para garantir a estabilidade na atribuição da propriedade – tem que

se verificar os 3 requisitos/pressupostos.

Uma das convenções que as partes podem ter efetuado que impede a aplicação do art. 886º é o

caso da Compra e Venda a Prestações

2. Compra e Venda a Prestações – art. 934º e ss. CC Cumprimento fracionado do contrato de Compra e Venda

• Romano Martinez: Pagamento do preço é feito rateadamente.

o O preço devido corresponde a uma obrigação unitária que, todavia, foi

dividida e escalonada no tempo no que respeita ao seu cumprimento – o preço

acordado é uma obrigação liquidável em prestações, com vencimentos diferidos

no tempo.

▪ Preço = todas as quantias pagas pelo comprador ao vendedor em razão

da alienação da coisa, mesmo que não lhe tenham dado esse nome.

ML: Reserva de Propriedade é comum mas não necessária na venda a prestações.

• Devido ao art. 886º retirar ao vendedor a possibilidade de resolução do contrato por

incumprimento da outra parte a partir do momento em que ocorra a transmissão da

propriedade e a entrega da coisa, tornou-se comum nos contratos de Compra e Venda

a Crédito a celebração de uma cláusula de reserva de propriedade.

o A Compra e Venda com Reserva de Propriedade já constitui atualmente um tipo

jurídico estrutural, aplicável nas Compras e Vendas a Prestações ou com espera

de preço, em que o vendedor procede à entrega da coisa ao comprador, por

forma a permitir-lhe o gozo dela antes que o preço seja pago.

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Art. 934º tem desvio face às regras gerais Derroga art. 781º - em que nas obrigações com prestações fracionadas, a falta de cumprimento

de uma das prestações importa a perda do benefício do prazo quanto às restantes.

➢ Perda de benefício do prazo = possibilidade de vendedor exigir a totalidade do preço.

o Benefício do prazo é do devedor = devedor não pode ser constrangido a cumprir

antes do decurso do prazo, mas se quiser pode cumprir antes28.

➢ No art. 781º pergunta-se se há perda de benefício do prazo (devedor entra em mora se

credor decidir exigir a prestação) ou vencimento automático (devedor mal deixa de

pagar uma das prestações entra automaticamente em mora, independentemente de

qualquer ação do credor).

o O art. 934º tem vantagem pois evita a discussão teórica e indica que se

vendedor se quiser valer desta alternativa tem de notificar o comprador, o que

o coloca em mora – diz especificamente no artigo que o que existe é perda de

benefício.

Vendedor está limitado pelo artigo e não pode decidir livremente o que fazer – art. 934º29 tem

duas alternativas drásticas:

• Manutenção do contrato mas com vencimento das prestações futuras

• Resolução do contrato

Para se perder o benefício do prazo ou faltam mais de duas prestações, independentemente do

seu valor, ou a prestação que se deixou de realizar excede 1/8 do preço. 1. Limite de mais de 1/8 é feito porque legislador veio exigir que o incumprimento da

prestação não possa ser de um valor diminuto, o que não justificaria a resolução do

contrato30. A resolução do contrato é situação drástica, o que implica que só possa ser

utilizada quando o incumprimento é de certa gravidade (atendendo ao valor, neste

caso).

a. E se faltarem 2 prestações ou mais, mesmo que configurem menos de 1/8? MLP:

quando falta mais de 1 prestação já há incumprimento grave pois a reiteração

do não cumprimento leva à perda de confiança – gravidade do incumprimento

não é com base no valor mas sim com base na falta de vontade de cumprir o

contrato e na confiança.

• Só é possível resolução se for incumprimento definitivo (nos termos

das regras gerais31) – contando com prazo admonitório e etc.

b. Falta de uma das prestações e inferior a 1/8 do preço?

Vendedor não fica desprotegido e pode pedir juros de mora (art. 806º).

2. Só o incumprimento grave é que justificaria o desrespeito pelo prazo que as partes

convencionaram – solução é drástica para o comprador.

a. Não pode exigir a totalidade do preço.

28 Benefício do prazo pelo devedor tem duas faces: credor não pode exigir quando quiser; devedor pode pagar quando quiser. 29 Cujos requisitos não são pacíficos na doutrina, com Pedro Albuquerque a dizer que a reserva de propriedade é falso requisito (não sendo condição sine qua non para que se aplique o artigo). 30 Romano Martinez: Exigência de 1/8 parece corresponder sempre a incumprimento grave pelo que, sendo definitivo, não terá de passar por outro crivo. 31 Romano Martinez: Resolução só pode ser pedida nos termos gerais: perante situação de incumprimento definitivo e total ou parcial e grave.

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

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Art. 934º é imperativo? ➢ Interpretação da expressão “sem embargo” é dúbia:

o pode permitir convenção em contrário;

o significar “independentemente de” convenção em contrário.

MLP: sem embargo tem significado de “independentemente de” e é IMPERATIVO32.

➢ Regra de direito civil é a supletividade mas neste caso justifica-se para proteção da parte

mais fraca.

o ML: Norma imperativa, pois é proteção do comprador a crédito, normalmente

a parte mais fraca do contrato, não se admitindo que essa proteção fosse

retirada por simples estipulação negocial.

▪ Romano Martinez: Solução do art. 886º é supletiva e a do art. 934º é

imperativa – por motivos de defesa do consumidor associados com a

proteção da parte mais desfavorecida e menos esclarecida.

Pode haver convenção das partes desde que a proteção do comprador não fique diminuída. É

admissível convenção que tutele mais o comprador, mas nunca que o desproteja.

➢ Norma Imperativa de Mínimo

Falha de 1 dos pressupostos da 1ª parte do art. 934º CC33

➢ Resolve-se pelo art. 886º

Falha de 1 dos pressupostos da 2º parte do art. 934º CC

➢ Resolve-se pelo art. 781º

Art. 935º - estabelece limites máximos à estipulação de cláusulas penais Regulação específica, devido à frequência destas cláusulas nos contratos de Compra e Venda.

➢ E devido também à desvalorização da coisa – resolução por incumprimento tem efeito

restitutório e vendedor recupera o bem, mas geralmente bastante desvalorizado.

o Por isso os vendedores, por precaução, estabelecem uma cláusula penal e

geralmente as partes estipulam que numa situação de incumprimento o

vendedor não tem de restituir (o que já foi pago a título de preço dá-nos o

quantum da cláusula penal).

ML: Indemnização pelo não cumprimento pode ser pelo interesse contratual negativo ou

positivo, consoante o vendedor proceda, ou não, à resolução do contrato.

➢ Não se optando pela resolução, a indemnização pelo interesse contratual positivo não

deve ser limitada a metade do preço pois esse limite é só nos casos de resolução (art.

801º/2).

o Preocupação de tutela da parte mais fraca – lei considera excessiva cláusula

penal superior a 50% do preço.

▪ No entanto, partes podem convencionar que além daquele montante,

se vendedor demonstrar prejuízo acrescido (exigência de prova que

32 Batista Lopes defende que a natureza deste artigo é Supletiva.

➢ Posição isolada na doutrina, juntamente com a sua opinião quanto ao incumprimento de mais de uma prestação (exige que ascenda a 1/8 do preço).

33 A 1ª e a 2ª parte deste artigo são autónomas entre si e tem de se levar as consequências da primeira parte até ao fim.

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

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torna difícil a aplicação prática), esse valor será acrescido no que é

ressarcido.

▪ Limite de metade do preço não impede as partes de estabelecerem

convenção de ressarcibilidade do prejuízo excedente (resultava do art.

811º/2) – vendedor não necessita de provar qualquer prejuízo se

apenas reclamar a cláusula penal, tendo o ónus de provar que os

danos sofridos excederam esse montante sempre que reclame um

valor superior. ➢ Conclui-se assim que o art. 935º apenas se aplica às cláusulas penais relativas à

indemnização a pedir na hipótese de resolução do contrato.

Art. 936º/1: Regime da Compra e Venda aplicável a outros casos Romano Martinez

• Aplicação à empreitada, além do art. 939º

• Aplicação do regime protetor da Compra e Venda a prestações a situações análogas

não está na dependência da averiguação da existência de uma parte fraca no contrato,

pois aplica-se mesmo quando as partes se encontrem jurídica ou economicamente

equilibradas e até às situações em que o desequilíbrio está a favor do comprador.

• Ainda quanto à aplicação extensiva do regime da Compra e Venda a prestações, há que

aludir ao facto de nas situações jurídicas análogas raramente se estipular a reserva de

propriedade, mas isso não obsta à validade da extensão do regime em apreço, pois o

relevante é que tenha sido acordado um pagamento rateado do preço.

Art. 936º/2: Locação-venda Ideia de que há contratos a que não se chama Compra e Venda a Prestações mas têm uma função

semelhante.

➢ Partes declaram estipular uma locação, mas convencionam que a propriedade passará

para o locatário automaticamente no fim de pagamento de todas as rendas ou

alugueres convencionados.

o Casos de locação com elemento de venda no final.

Prestações não correspondem a uma contrapartida do gozo temporário da coisa, mas ao

pagamento da transmissão da propriedade sobre ela, apenas com a diferença que esse

pagamento ocorre antes dessa transmissão.

Economicamente cumpre função idêntica à Compra e Venda com Reserva de Propriedade.

➢ Partes qualificam o contrato como locação, mas devido a desempenhar a mesma função

económica da venda a prestações com reserva de propriedade é sujeito pelo legislador

ao mesmo regime. o Lei concluiu que se devia seguir o mesmo regime e que se locador resolver o

contrato com base no incumprimento de uma prestação, tem de reembolsar

as prestações pagas e retoma a coisa.

▪ Regime do incumprimento segue o regime do incumprimento de

Compra e Venda a prestações.

▪ Locatário terá direito a reaver as prestações que já pagou.

o Resolução tem efeito retroativo, não vigorando o regime do art. 434º/2

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ML: Natureza Controvertida desta figura

• União alternativa de contratos

• Venda com reserva de propriedade

• Menezes Leitão: modalidade específica de venda em que, sendo diferida a transmissão

da propriedade até ao pagamento do preço, o vendedor se obrigado entretanto a

proporcionar ao comprador o gozo da coisa, como locatário desta.

Diferente da locação convertível em venda

Crédito ao Consumo – DL 133/200934 Venda a prestações no âmbito das relações de consumo é qualificada como crédito ao

consumo.

➢ Art. 4º/1/c – tem noção de diferimento de pagamento

o Pelo que se há uma dilação no pagamento do preço de uma Compra e Venda

relacionada com consumidores estamos perante uma Venda a Prestações no

âmbito do Crédito ao Consumo.

Não se aplica se for relações de 2 particulares ou de 2 profissionais – aplica-se o CC pois há

maior paridade entre as partes.

Sendo qualificada como contrato de crédito ao consumo, a venda a prestações é sujeita a um

regime especial, destinado a proteger o consumidor, normalmente considerado mal informado

sobre os custos do crédito.

Diploma tem noção restrita de consumidor e é uma lei marcadamente favorável ao consumidor

do crédito.

Regime não se aplica aos contratos a crédito sem juros ou outros encargos

➢ Se for crédito a título gratuito pode ser Compra e Venda a prestações mas não se aplica

este regime.

Venda a prestações ao consumidor é sujeita aos requisitos da lei (art. 5º, 6º, 7º, 10º, 12º)35 e a

sua não observância leva à nulidade do contrato de crédito ou a outras sanções (art. 13º).

• Tem a especificidade do direito de arrependimento (art. 17º)36

• Pode cumprir antecipadamente (art. 19º)

Art. 20º derroga o art. 934º CC ao estabelecer regime especial para a hipótese de não

cumprimento do contrato de crédito por parte do consumidor.

34 Esta lei não é especificamente bancária – é também bancária, uma vez que disciplina os contratos de crédito aos consumidores, independentemente da qualidade do concedente do crédito.

➢ A grande maioria do crédito aos consumidores é concedida por instituições de crédito. 35 Onde se enquadram normas particularmente demonstrativas da proteção conferida ao potencial consumidor de crédito: dever de informação de assistência ao consumidor (i.e., coloca-lo em posição que permita avaliar se o contrato e crédito proposto se adapta às suas necessidades e situação financeira); dever de proteção de avaliar a solvabilidade do consumidor (credor deve verificar as informações prestadas na Central de Responsabilidades de Crédito). 36 Não é uma verdadeira “revogação” pois não há um acordo. É um cooling-of period, de inspiração anglo-saxónica.

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• Art. 20º aplica-se à Compra e Venda a prestações e a lei é mais exigente face ao disposto

no CC – gravidade de incumprimento tem de ser maior.

o Dependência de um nível específico de incumprimento, para que possa haver

invocação da perda de benefício do prazo ou a resolução do contrato, bem como

da concessão ao consumidor de um prazo suplementar para pagamento das

prestações em atraso e eventual indemnização devida.

Caráter imperativo dos direitos conferidos ao consumidor – art. 26º

3. Compra e Venda de Bens Alheios – art. 892º e ss. CC Consiste num contrato de Compra e Venda em que o vendedor não é proprietário dos bens

que vende. Há uma falta de um direito por parte do vendedor que impede a Compra e Venda

de produzir o seu efeito normal de transmitir o Direito de Propriedade (construída sobre o

paradigma da transmissão da propriedade mas pode ser aplicado à transmissão de outros direitos).

➢ Paulo Olavo Cunha: Negócio mediante o qual alguém aliena como próprio um direito de

outrem

➢ ML: sempre que o vendedor não tenha legitimidade para realizar a venda, como sucede

no caso de a coisa não lhe pertencer, ou de o direito que possui sobre ela não lhe

permitir a sua alienação.

Origem deste regime baseia-se na garantia contra a evicção em que o vendedor, em consequência do

contrato de compra e venda, garante ao comprador a posse pacífica da coisa vendida, respondendo

objetivamente se esta viesse a ser perturbada por uma pretensão de natureza real apresentada por terceiro

• Legislador aboliu esta garantia pois não fazia sentido responsabilizar autonomamente o vendedor

pelo facto de o comprador ser privado do gozo da coisa por terceiro, que a ela tinha direito.

Romano Martinez

Art. 892º: “boa fé” e “dolo” em sentido subjetivo, como formas psicológicas.

• Está de boa fé quem não sabe que o bem é alheio e age dolosamente quem pretende

causar prejuízo a outrem.

o Situações psicológicas aferidas no momento da celebração do negócio jurídico.

Só há Compra e Venda de bens alheios se alguém, sem legitimidade, vender coisa alheia como

coisa própria.

Pressupostos 1. Venda como própria de uma coisa alheia e presente, fora do âmbito das relações comerciais

– resulta do art. 893º, 904º CC e 467º/2 CCom

Nos outros casos não poderá ser aplicado o regime da venda de bens alheios:

• Se estiver em causa a venda de coisa futura aplica-se somente o regime da venda de

bens futuros (art. 893º) e a obrigação assumida pelo vendedor é válida (art. 880º).

o RM: Nos casos de bens futuros trata-se de contrato aleatório que fica na

dependência de um facto futuro e incerto, a aquisição da propriedade ou de

outro direito real sobre a coisa por parte do vendedor, para uma posterior

transmissão ao comprador.

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• Se for venda de coisa genérica que não pertença ao vendedor também não é

considerada nula, dado que para a sua estipulação não é necessária a qualidade de

proprietário do vendedor, ao tempo da estipulação do contrato (art. 539º e ss.).

• Se for compra e venda comercial também é lícita a venda de bens que sejam

propriedade de outrem (art. 467º/2 CCom).

→ Em todos estes casos, recai sobre o vendedor a obrigação de aquisição

e entrega ao comprador das coisas que se comprometeu a vender.

▪ Vendedor tem obrigação de adquirir a coisa, o que se reflete na

indemnização em caso de incumprimento dessa obrigação,

calculada pelo interesse contratual positivo.

▪ No caso do Direito Comercial, esta solução aproxima-se do

Direito Civil, devido à obrigação de convalidação.

Este regime também não se aplica se vendedor não vender a coisa como própria, vendendo-a

como alheia, mesmo sem legitimidade para tal (art. 904º).

• Nesses casos em que não há legitimidade para vender coisa alheia pode haver abuso de poderes

de representação (art. 269º) e etc. mas a consequência é que o contrato é ineficaz em relação ao

verdadeiro proprietário se este não o ratificar.

Não se aplica analogicamente o regime da venda de bens alheios aos casos em que o vendedor,

após a celebração da venda, tornar a vender a coisa a outrem, que regista primeiro a sua

aquisição – estamos no âmbito da Aquisição Tabular.

2. Ausência de legitimidade para venda – resulta do art. 892º CC

Vendedor tem de ter legitimidade para efetuar a alienação do bem.

➢ Normalmente só os proprietários têm essa legitimidade mas a lei, por vezes, estende-a

a outras entidades: credor pignoratício com autorização judicial (art. 674º)37, Estado

(art. 824º) e etc.

No caso de representação, o proprietário é o verdadeiro sujeito do negócio (art. 258º) pelo

que não se coloca a questão de aplicação deste regime.

➢ No caso da representação sem poderes, em gestão de negócios representativa (art. 464º

e 471º), não se aplica o regime e o comprador pode revogar ou rejeitar o negócio

enquanto proprietário não ratificar.

Aplica-se o regime nos casos de mandato sem representação para alienar (art. 1180º e ss.) e

gestão de negócios não representativa (art. 471º).

Mesmo faltando a legitimidade do vendedor, a lei em certos casos, por razões de tutela da

aparência, vem considerar válida a alienação – herança efetuada por herdeiro aparente a

terceiro de boa fé (art. 2076º/2), venda de bem sujeito a registo efetuado a terceiro de boa fé

por vendedor que adquiriu esse bem com base em negócio inválido (art. 291º), casos de

aquisição tabular.

37 Pode executar o objeto empenhado para se pagar pelo valor do bem, após autorização judicial (art. 674º).

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Efeitos da Venda de Bens Alheios 1. Nulidade da venda e Obrigação de restituição

➢ MLP: opção da nossa lei tendo em conta o contexto histórico-geográfico em que nos

inserimos.

o ML: Regime que pode ser questionado pois a nulidade da venda de bens alheios

tem muito pouco em comum com o regime da nulidade consagrado na parte

geral do CC.

o RM: Não é verdadeira nulidade e é invalidade atípica (por vezes denominada

nulidade mista).

▪ Institui um regime especial que afasta as regras gerais.

Aspetos em que a lei se desviou do regime legal da nulidade:

• Sistema de Inoponibilidades e Arguição – é nulidade que não pode ser oposta em

determinadas condições por uma das partes à outra nem pode ser invocada por

qualquer pessoa.

• Restituição da Coisa – art. 894º

• Possibilidade de Convalidação – através da aquisição da coisa.

o Estabelecimento de Obrigação de Convalidação – vendedor tem, por força da

lei, uma obrigação de adquirir a coisa.

Quanto à LEGITIMIDADE PARA A ARGUIÇÃO/ INVOCABILIDADE

Restringida apenas à parte de boa fé e sendo mesmo vedada, em qualquer caso, ao vendedor de

boa fé sempre que o comprador esteja de boa fé.

➢ Mesmo o verdadeiro proprietário não terá legitimidade para invocar a nulidade (o contrato

é ineficaz quanto a ele, art. 406º/2)38

➢ Parte de má fé não pode invocar nulidade contra a parte que está de boa fé.

1º Questão: nulidade é ou não invocável por terceiros, neste caso? É conhecida ex officio?

Lei só limita a invocabilidade do comprador e/ou vendedor.

• SIM – RM

• NÃO – ML; MLP, pois é a única capaz de salvaguardar os interesses que a lei visou ao

estabelecer estas limitações.

2º Questão: e o terceiro que é proprietário? Como é que ele é defendido nesta questão se não

pode invocar?

• Terceiro vai exercer o seu direito independentemente do negócio feito sobre a

coisa, devido à natureza dos direitos reais – basta interpor ação de reivindicação e

não tem de demonstrar a nulidade (caráter absoluto e oponível erga omnes)

Quanto à RESTITUIÇÃO

Art. 894º - foge ao art. 289º, onde cada uma das partes tem de restituir em espécie (ou em

valor) aquilo que foi prestado, em execução do contrato nulo.

➢ Este artigo afasta esse regime e estipula que se o comprador estiver de boa fé não tem

de restituir a coisa e tem direito à restituição.

38 Pode é exercer ação de reivindicação (art. 1311º) e etc.

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o Romano Martinez: Mesmo que comprador de boa fé não possa restituir a coisa

ou esta se encontre deteriorada ou de valor diminuído, por causa que não lhe

seja imputável, nada tem a devolver, mas pode exigir a restituição do preço (art.

894º/1).

▪ Art. 894º estabelece que risco corre por conta do vendedor.

Faz variar o conteúdo da obrigação de restituição consoante exista ou não boa fé do obrigado.

• Comprador de má fé não pode pedir a restituição do preço da venda, apenas

enriquecimento sem causa (art. 894º/1, a contrario).

• Comprador de boa fé, pode pedir a restituição do preço (art. 892º/1).

Art. 894º apenas se compreende se se entender que, ao contrário do que resulta do art. 289º, a

restituição do comprador de boa fé fica excluída ou limitada em virtude do perecimento ou

deterioração da coisa recebida – lei determina que a parte que está de boa fé deve ser

restituída do enriquecimento da parte de má fé, mas abatendo no valor o proveito que houve

para o comprador em virtude da perda ou diminuição do valor dos bens (art. 894º/2), sendo

este regime uma restituição por enriquecimento sem causa, que em tudo se harmoniza com

o regime dos art. 479º e 480º. ➢ Opinião ML (+ PL/AV) contra MC, Carneiro da Frada, Paulo Mota Pinto (que baseiam a

interpretação restritiva no regime da posse – art. 1269º).

CONVALIDAÇÃO EVENTUAL

Art. 895º - efeito de convalidação automático.

➢ Sanação da Venda de Bens Alheios: desaparece o impedimento de não produzir o efeito

translativo (pois a propriedade não era do vendedor) pelo que se atribui ao contrato os

efeitos que este originariamente devia produzir.

Esta possibilidade de convalidação é restringida pelo disposto no art. 896º

Portanto, temos uma nulidade provisória que pode ser sanada mediante a aquisição da

propriedade pelo vendedor, salvo algumas situações específicas.

➢ Verificando-se a sanação da invalidade, o contrato produz imediatamente o seu efeito

translativo, ficando assim o comprador investido na titularidade do bem.

2. Convalidação Obrigatória

Ao ser celebrada uma venda de bens alheios, surge a Obrigação de Convalidação do Contrato –

art. 897º

• Devido ao comprador de boa fé ter direito a que o efeito translativo, que não resultou

automaticamente da celebração do contrato, venha a ser posteriormente produzido.

o Adquire um direito de crédito sobre o vendedor para que este proceda à

aquisição do bem.

• Cumprimento desta obrigação depende da concordância do titular do direito.

• Tem de ser o vendedor a adquirir o bem, se for transmissão do comprador da coisa pelo

seu efetivo proprietário é uma dação em cumprimento.

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Efeito que é protetor do comprador e que acaba por tornar menos importante este esquema

de inimputabilidade da nulidade.

➢ MLP: este é o aspeto que mais afasta este regime do geral.

Obrigação de convalidação só existe nos casos de boa fé do comprador

• Aplicando-se mesmo quando o vendedor esteja de boa fé

o Ou seja, vendedor tem obrigação de adquirir a coisa mesmo quando tenha agido

de forma convencida que a coisa era sua.

MLP: em princípio, o vendedor é responsável pelo incumprimento desta obrigação de resultados

– art. 900º.

➢ Esta indemnização é segundo interesse contratual positivo.

3. Indemnização

Legislador estabeleceu 3 fundamentos de indemnização

A. Indemnização por qualquer das partes em caso de dolo – art. 898º

• Quando há dissimulação do caráter alheio da coisa, através do emprego de

sugestões ou artifícios com o fim de enganar ou manter em erro a outra parte.

i. No caso de ambos os contraentes agirem de boa fé não há qualquer

dever de indemnizar.

• Modo de cálculo da indemnização modifica-se conforme o contrato tenha sido

convalidado ou não39

i. No caso de uma nulidade sanada – indemnização pelo interesse

contratual positivo (devido ao contrato não ter sido válido logo ab

initio).

ii. No caso de uma nulidade não sanada – indemnização pelo interesse

contratual negativo.

• Estando em erro sobre o caráter alheio da coisa, não há dolo pelo que não se

aplica este regime.

i. Atuando com culpa, se for do comprador não há qualquer

responsabilidade, mas, se for do vendedor a situação enquadra-se no

art. 899º - regime difere caso a censura seja feita ao vendedor ou ao

comprador.

B. Indemnização pelo vendedor ao comprador de boa fé, com fundamento na

garantia da sua legitimidade – art. 899º40

39 MLP: Além do raciocínio de homo economicus de escolher os melhores negócios também há raciocínio de dificuldade de prova. A prova de oportunidades negociais alternativas desperdiçadas é muito difícil. 40 Confronto de art. 898 e 899:

• O primeiro impõe dever de indemnizar à parte que agiu dolosamente.

• O segundo impõe dever de indemnizar ao vendedor, mesmo agindo sem culpa. o Não agindo com dolo, mas, com culpa, qual a indemnização devida?

▪ Não age segundo art. 253º (MLP: de onde se retira o significado de dolo, neste contexto. Leitura estrita), mas não imprimiu todos os deveres de indagação, tendo uma ignorância negligente.

▪ Neste caso, a outra parte tem direito ao interesse contratual negativo.

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• Responsabilidade objetiva do vendedor41, pelos danos causados ao comprador,

devido ao vendedor estar obrigado a garantir a sua legitimidade.

i. Responde objetivamente pelos danos emergentes mas não pelos lucros

cessantes, desde que não tenham resultado de despesas voluptuárias.

➢ No caso de despesas voluptuárias depende do facto ter atuado

com dolo ou negligência.

• Vendedor presume-se culpado pelo que a limitação da sua responsabilidade aos

danos emergentes depende de ele ter elidido a presunção que recai sobre ele

(art. 799º).

C. Indemnização pelo vendedor ao comprador de boa fé, por incumprimento da

obrigação de convalidar o contrato – art. 900º

• Esta indemnização é cumulável com as anteriores, sendo excluída quando há

indemnização por lucros cessantes resultantes de dolo do vendedor (art. 898º)

i. Aí admite-se concurso alternativo de pretensões (art. 900º/2) –

comprador ou tem direito a ser colocado na posição em que estaria se

contrato tivesse sido celebrado ou colocado na posição se contrato não

tivesse sido celebrado.

➢ MLP: Técnica legislativa questionável de cumular os danos, uma

vez que não pode haver duas compensações pelo mesmo dano.

• MLP: indemnização pelo interesse contratual positivo

Garantia de Restituição por Benfeitorias – art. 901º Vendedor tem de satisfazer o comprador, se este lhe exigir, o reembolso das benfeitorias

feitas na coisa

➢ Podendo depois o vendedor exercer contra o proprietário o direito de regresso em

relação ao que houver pago, dado que é o proprietário que adquire o benefício

correspondente às benfeitorias.

Venda de Bens Parcialmente Alheios – art. 902º 2 situações em que se verifica:

• Vendedor aliena toda uma coisa quando apenas é dono de uma parte material da

mesma

• Vendedor aliena uma coisa de que é dono em regime de compropriedade

o Não se aplica art. 902º e sim, por força do art. 1408º/2, aplica-se integralmente

o regime da venda de coisa alheia.

Venda de coisa indivisa por apenas um dos titulares

Aplica-se o regime da venda de bens alheios pois a lei exige a unanimidade dos cotitulares para

os atos de disposição sobre a coisa indivisa (art. 1408º/1 e 2091º), apenas permitindo a

disposição isolada da própria quota (art. 1408º/1 e 2124º).

➢ ML discorda de Vaz Serra e Ribeiro de Faria que admitem para estes casos uma

conversão e redução simultânea do negócio

41 MLP: regime da responsabilidade objetiva não é muito comum no direito português e temos aqui um regime profundamente histórico.

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Restrições Convencionais ao regime da Venda de Bens Alheios – art. 903º Pode haver um aumento ou diminuição da garantia contra a falta de legitimidade do vendedor.

Não se admite derrogação do art. 898º.

Limite do art. 809º - vendedor não pode excluir totalmente a responsabilidade por facto

próprio.

Art. 903º/2 – declaração do vendedor42 (expressa) derroga o regime da venda de bens alheios,

traduzindo-se numa cláusula de exclusão de responsabilidade pelos danos que não exonera o

vendedor da obrigação de restituir integralmente o preço recebido.

4. Compra e Venda de Bens Onerados – art. 905º e ss. CC RM: O vendedor, tanto no caso de alienação de coisa genérica, como específica, está adstrito a

efetuar uma prestação sem defeito, a entregar uma coisa conforme ao disposto no contrato,

pois só desse modo se satisfaz o interesse do comprador.

Ideia da lei é que quando alguém celebra contrato que implique a transmissão de um direito que se

encontre onerado ou com limitações desconhecidas pelo comprador, este comprador tem uma série de

direitos.

➢ O que caracteriza a venda de bens onerados é a existência de ónus ou limitações no

direito transmitido.

o Esses ónus ou limitações constituem vícios do direito, afetando assim a

situação jurídica (e não as qualidades fácticas da coisa) por excederem os

limites normais inerentes aos direitos da mesma categoria.

o Não é qualquer ónus ou limitação existente que permite a aplicação deste

regime, apenas aqueles que normalmente não se verificam aquando da

transmissão deste tipo de direitos.

▪ Compreendem-se direitos reais de gozo menores ou de garantia sobre a

coisa vendida.

▪ Não se enquadram aqui as restrições normais derivadas das relações de

vizinhança (art. 1346º e ss.), as servidões legais ou as restrições à

edificabilidade impostas por planos diretores.

Romano Martinez: O ónus tem de ser concomitante com a celebração do contrato, pois se

depois de ajustado o negócio, o vendedor registou uma reserva de propriedade em termos

diversos dos acordados, não há compra e venda de coisa onerada.

Pode aplicar-se o regime se existirem irregularidades jurídicas no bem vendido que impeçam o gozo ou a

disposição deste pelo comprador, desde que a situação não seja por lei sujeita a considerações especiais.

Ex: incumpre-se obrigação de entrega quando se vende automóveis em que faltam os documentos e etc.

pelo que não se justifica a aplicação deste regime; já pode ser aplicado à venda de imóveis construídos

sem a respetiva licença.

42 De que não garante a sua legitimidade ou que não responde pela evicção.

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Regime aplicável a comprador que adquire um direito na expetativa errónea que ao

adquirir esse direito vai ter um direito adicional? Lei não contemplou a hipótese de o vendedor assegurar ao comprador a existência de especiais

vantagens jurídicas em relação à coisa, que excedem o normal dos direitos da mesma categoria,

mas que depois se verifica não existirem (ex: servidões ativas sobre o prédio vizinho; benefícios

fiscais; edificabilidade com certas características).

➢ Comprador tem expetativa de ter direito configurado de forma mais generosa do que

ele é na realidade – mas tal não constitui um ónus, constitui uma ausência de

vantagem de um direito que o comprador esperava adquirir por força da aquisição

daquele direito de propriedade.

o MLP: o regime a aplicar é o do art. 905º e ss., podendo ser aplicado

analogicamente a estes casos43.

o RM: não se aplica o art. 905º e sim a culpa in contrahendo.

▪ MLP discorda porque é mais desfavorável ao comprador, pois a

indemnização é mais pequena, por ser calculada segundo o interesse

contratual negativo.

Compra e Venda de Participações Sociais Compra e venda de ações em que o adquirente não foi devidamente informado acerca da

situação económica da empresa é uma hipótese de compra e venda de bens onerados?

➢ Questão controvertida na doutrina, particularmente quando essa transação de ações

importa a chamada “venda da empresa”, nos casos em que há um passivo mais alto do

que se supunha.

MLP: o problema não está no direito que ele adquire, mas sim no objeto que se adquire.

• Está é em erro quanto ao objeto – o erro diz respeito ao património da sociedade pelo

que não se pode aplicar diretamente este regime.

o Só se pode aplicar por analogia.

o Depois discute-se se se pode aplicar a compra e venda de bens defeituosos.

RM: mesmo quando a sociedade cujas ações são alienadas tenha assumido dívidas ou prestado

garantias que não foram dadas a conhecer ao adquirente, parece que se trata, antes, de um

problema de culpa in contrahendo.

• De facto, em rigor, nas situações descritas, sobre as ações transacionadas não incidem

quaisquer ónus que excedam os limites normais; o que ocorre é que é que as ações

não representam o valor esperado no capital social.

• Há apenas uma deficiente informação e, consequentemente, culpa na formação do

contrato.

43 Doutrina italiana defende aplicação analógica deste regime – ML concorda que seja assim também em Portugal. Apesar de em Portugal haver outras correntes:

• Enquadra-se no regime da venda de coisas defeituosas – PL / AV

• Enquadra-se no regime geral do incumprimento com os matizes impostos pela proximidade com a venda de bens onerados – Carneiro da Frada

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Efeitos da Venda de Bens Onerados Baseia-se na atribuição de sucessivos remédios ao comprador.

1. Anulabilidade do Contrato por Erro ou Dolo

Primeiro direito do comprador é o de se considerar não vinculado ao contrato – anulação do

contrato, dando-se por não celebrado o contrato nos termos gerais da anulabilidade.

➢ Solução destrutiva que muitas vezes não interessa ao comprador – mas faz sentido que

seja uma alternativa dada ao comprador.

Essa solução destrutiva depende vários requisitos, que decorrem da própria noção.

Art. 905º tem várias precisões:

A. “ónus ou limitações” – produto da aplicação de regras jurídicas que, de alguma forma,

comprimem ou conformam o conteúdo do direito adquirido pelo comprado.

• ÓNUS = resulta de direitos adquiridos sobre outros direitos (ex: usufruto sobre a

propriedade).

o No caso dos direitos reais menores que oneram o direito real maior são, sem

dúvida ónus.

o Mas também há direitos pessoais de gozo que podem onerar (ex: posição do

arrendatário permanece e a do senhorio é transmitida para o novo adquirente,

que tem de respeitar o contrato de arrendamento).

• LIMITAÇÕES = regras jurídicas que comprimem ou limitam o direito transmitido.

o Há juízo adicional para perceber se estamos perante regra geral que delimita o

conteúdo do direito, mas feito em termos normais, que devem ser esperados

pelo comprador, ou uma limitação anormal (ex: transmissão da propriedade

sobre imóvel; pagamento de IMI é limitação ao direito de propriedade, mas tal

não é anormal e não fundamenta a conclusão de compra e venda de bens

onerados).

B. Quando é que a compra e venda de bens onerados atribui ao comprador o direito de

requerer judicialmente a anulação do negócios?44

• Caso de erro – essencialidade e cognoscibilidade dessa essencialidade para o

declaratário (art. 251º e 257º)

o MLP: tem de demonstrar que sem aquele erro não se celebraria o negócio; ou

não se celebraria naqueles termos.

• Caso de dolo – basta que tenha sido determinante da vontade do declarante (art.

254º/1) salvo se provier de terceiro, caso em que se exige igualmente que o destinatário

conhecesse ou devesse conhecer a situação (art. 254º/2).

C. Têm de se verificar os requisitos legais da anulabilidade

MLP: para que seja anulado o contrato não é preciso que comprador demonstre que não

celebraria aquele negócio.

➢ Basta demonstrar que não compraria por aquele preço.

o Prova pode ser indiciária e com base no que a maior parte das pessoas faria.

44 Se ele souber o estado em que está a comprar o bem, não há problema. Esse conhecimento vai é refletir-se no preço

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Esta solução destrutiva, da anulabilidade, em que a lei considera que vontade não foi formada

de forma livre e/ou esclarecida, não é levada até às últimas consequências:

CONVALESCENÇA EVENTUAL DO CONTRATO

Lei permite convalescer o negócio – art. 906º

➢ Aplica-se independentemente da vontade das partes (art. 906º/1) – desvio da ideia

geral do regime do erro do negócio jurídico.

o Art. 906º/1 desvia-se da regra do art. 288º, que estabelece que a extinção do

vício não sana automaticamente a anulabilidade, apenas permite ao

interessado confirmar o negócio se assim o entender.

Posterior extinção retira ao comprador o interesse em solicitar a anulação do negócio, pelo que

estabelece automaticamente a sua convalescença, em caso de ocorrer a extinção dos vícios do

direito.

Solução artificial que depende da posição do comprador não ter sido afetada em consequência

dos vícios do direito.

➢ Por isso a lei estabelece que a anulabilidade persiste nos casos de haver prejuízo ou já

ter sido pedida a anulação (art. 906º/2).

o Solução automática pode acabar por prejudicar o comprador – como nos casos

em que já pôs em marcha a solução da destruição do negócio – aí permanece

anulável (art. 906º/2)

▪ MLP: Prejuízo lido num sentido que dificilmente pode ser compensado

através da solução da convalidação – comprador está numa posição tal

que a convalescença do contrato ir-lhe-ia causar prejuízo que

dificilmente é compensável por essa convalescença.

2. Convalescença Obrigatória do Contrato e Cancelamento de Registos – art. 907º

Comprador, perante contrato inválido tem 2 grandes opções:

• Ou o anula e destrói

• Ou mantem-no, exigindo ao vendedor a obrigação de fazer CONVALESCER o contrato

Comprador pode requerer, em lugar da anulação do contrato, a expurgação dos ónus ou

limitações.

➢ Só é possível se tiver existido erro do comprador relativamente à existência desses ónus

ou limitações – se tivesse conhecimento, tal significaria que o bem tinha sido vendido

nessas condições e o preço fixado tomando em consideração a desvalorização que os

ónus ou limitações implicam.

Nos casos de ónus ou limitações que não dependem unilateralmente da vontade do vendedor

para cessar, jurisprudência e doutrina entendem que nesse caso não há obrigação de fazer

convalescer o contrato

• Só há obrigação de convalescença quando o vendedor o possa fazer voluntaria e

unilateralmente

o Vendedor não pode fazer convalescer o contrato que não depende dele

o Vendedor não fica sujeito à indemnização do art. 910º

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Desvio ao regime do erro, onde o que é tutelado é o interesse de uma parte não estar vinculada

a um negócio em relação ao qual não se vinculou de forma inteiramente livre e esclarecida.

➢ Aqui é ideia de impor ao vendedor um dever de colocar a realidade como o comprador

desejaria que ela fosse.

Cabe ao comprador exigir a expurgação (que é obrigação do vendedor) do vendedor, não

podendo substituir-se a ele e depois exigir reembolso (pode é proceder à expurgação à sua

própria custa).

Art. 907º é direito de crédito do comprador, oposto a obrigação do vendedor fazer convalescer

o contrato

➢ Se vendedor não o fizer fica em mora, com todas as consequências que isso implica.

➢ Obrigação de fazer convalescer pode não ser cumprida, temporária ou definitivamente.

3. Indemnização

Legislador estabelece 3 fundamentos para uma indemnização

A. Indemnização em caso de dolo – art. 908º

• Dolo no sentido do art. 273º que significa “má fé” – não pressupõe apenas ilícito

intencional mas também o praticado com negligência consciente.

i. Dissimulação pelo vendedor dos ónus ou limitações existentes na coisa

através do emprego de sugestões ou artifícios com o fim de enganar ou

manter em erro o comprador.

• Indemnização pelos danos que não ocorreriam se o contrato não tivesse sido

celebrado – interesse contratual negativo que é solução típica da culpa in

contrahendo (art. 227º).

i. Permite abranger tantos os danos emergentes como os lucros cessantes

(incluindo os prejuízos causados pela privação do capital,

correspondente ao pagamento do preço, na aplicação de uma opção

mais vantajosa.

B. Indemnização em caso de simples erro – art. 909º

• Responsabilidade objetiva do vendedor

i. Fundamento desta responsabilidade é o pressuposto de que o

vendedor, no momento em que procede à venda do bem, dever

garantir, independentemente de culpa sua, que o bem vendido se

encontra livre de ónus ou encargos, respondendo pelos danos causados

se tal não se verificar.

• Responde pelos danos emergentes apenas, não pelos lucros cessantes.

i. Considera-se que os danos emergentes abrangem as despesas

voluptuárias.

C. Indemnização por incumprimento da obrigação de fazer convalescer o contrato

– art. 910º

• Art. 907º estabelece obrigação (art. 397º) estando sujeito ao art. 798º e ss.,

801º e ss., 804º e ss.

• Comprador pode manter o contrato e exigir que o vendedor elimine o ónus ou

limitação e enquanto vendedor não fizer, comprador pode exigir indemnização.

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• Como se calcula o valor da indemnização devida em caso de incumprimento?

i. MLP: nos termos gerais, interessa contratual positivo.

Se se optar por anulação: art. 908º e 909º

Se se optar por convalescer: art. 910º

Redução do Preço – art. 911º Aparece como alternativa à anulação do contrato em consequência do erro ou do dolo (art.

905º) – alternativa é imposta ao comprador sempre que se possa comprovar que os ónus ou

limitações não influiriam na sua decisão de adquirir o bem, mas apenas no preço que ele

pagaria.

➢ Cabe ao vendedor, pretendendo a subsistência do contrato, o ónus da prova de que o

comprador teria igualmente adquirido os bens por preço inferior.

Comprador pode solicitar imediatamente a redução do preço, caso esteja apenas interessado

nesta e não na anulação do contrato, podendo também fazê-la a título subsidiário.

Art. 905º/2 implica que a redução do preço vai excluir a anulação (art. 905º), a obrigação de

fazer convalescer (art. 907º).

➢ Escolhendo a redução, comprador terá direito à própria redução do preço e à

indemnização, que terá conteúdo variável, consoante exista dolo do vendedor (art.

908º) ou simples erro (art. 909º).

Também é opção conservatória, mas, é conservatória modificando o contrato.

Restrições convencionais a este regime – art. 912º ➢ Igual à venda de bens alheios

5. Compra e Venda de Bens Defeituosos – art. 913º e ss. CC Tratada pelo Código Civil com base numa diferenciação dogmática:

• se a venda é realizada, sendo a propriedade logo transmitida ao comprador, e já é

defeituosa ao tempo da celebração do contrato, estamos perante um erro do

comprador ao adquirir uma coisa com defeitos, sendo o contrato anulável por erro (art.

913º e 905º);

• se o defeito na coisa ocorre após a celebração do contrato e a coisa tiver sido entregue

em boas condições, estamos perante um cumprimento defeituoso, cujo defeito pode

ser imputável ao vendedor (art. 918º) ou de risco pelo que em princípio fica a cargo do

comprador (art. 796º).

Também é incumprimento da obrigação de entrega as situações de entrega de coisa defeituosa,

no caso em que a venda é de coisa futura ou indeterminada de certo género (art. 918º) – não

há erro do comprador porque a coisa sobre a qual estaria em erro ainda não existe ou não está

determinada.

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Dualidade de regimes que implica diferentes disparidades de tratamento.

➢ Se comprador comprar um anel numa ourivesaria e depois descobrir um risco, tem de

demonstrar um erro seu para anular o negócio e apenas tem direito à restituição do

preço e a uma indemnização pelos danos emergentes com base no interesse contratual

negativo (art. 915º e 909º).

➢ Se encomendar esse mesmo anel e o vendedor entregar um anel riscado, considera-se

haver incumprimento do vendedor (art. 918º) e a indemnização naturalmente abrange

o interesse contratual positivo.

Doutrina (Batista Machado, Romano Martinez) critica esta dualidade e propugna o

enquadramento da venda de coisa específica no regime do incumprimento, através da tese de

que o erro do art. 913º (e 905º e ss.) diz respeito não à fase da formação na da execução do

contrato.

➢ Posição consagrada de jure condito é que o regime da venda específica de coisas

defeituosas não se reconduz ao cumprimento defeituoso, exigindo antes um erro em

sentido técnico.

Pressupostos de aplicação do regime da venda específica de coisas defeituosas – art.

913º

➢ Não abrange situações de deficiência quantitativa – essas são incumprimento parcial na

venda genérica (art. 918º) ou desencadeiam aplicação art. 887º e ss.

Pressupostos assentam em duas naturezas diferentes:

1. Defeito – vícios da coisa; falta de qualidades asseguradas pelo vendedor e/ou necessárias.

• Vício ≠ Falta de Qualidade.

o Vícios: conteúdo pejorativo que abrange as características da coisa que levam a

que seja valorada negativamente;

o Falta de qualidades: não implicam valoração negativa da coisa, mas coloca-a

em desconformidade com o contrato.

Romano Martinez

• Vícios + Desconformidades = Defeitos

o Vício = imperfeição relativamente à qualidade normal de coisas daquele tipo

o Desconformidade = discordância com respeito ao fim acordado

• Defeito oculto – desconhecido do comprador, podendo ser legitimamente ignorado, não sendo

detetável através de um exame diligente.

• Defeito aparente – desconhecido do comprador, podendo ser revelado mediante exame

diligente.

• Defeito conhecido – vícios da coisa que foram revelados ao comprador (pela contraparte, terceiro

ou apercebido por ele próprio na perícia).

2. Repercussões que aquele defeito tem no programa contratual/acordo celebrado

entre as partes

• Desvalorização da coisa: é um vício;

o Conceção objetiva (vemos algo que faz com que ela valha menos) de defeito

implicando que o vício faça a coisa valer menos.

o Tem de ser significativa.

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• Não correspondência com o que foi assegurado pelo devedor: falta de qualidades;

o Conceção objetiva de defeito.

o Certificação pelo vendedor de que a coisa tem certas qualidades tanto pode ser

efetuada de forma expressa como tacitamente (podendo resultar de amostra

ou modelo – art. 919º)

• Inaptidão para o fim a que se destina: (vícios + falta de qualidades);

o Conceção subjetiva do defeito, estando em causa as qualidades específicas que

o comprador pretende que lhe sejam proporcionadas pela coisa.

o Indicação do fim tem de ser aceite pelo vendedor, ainda que tal possa ocorrer

tacitamente; se não houver essa aceitação entende-se que a coisa se destina à

função normal das coisas da mesma natureza (art. 913º/2)

Efeitos da venda específica de coisas defeituosas

Art. 913º in fine estabelece que se aplica o regime da venda de bens onerados em tudo o que

não for modificado pelas disposições do próprio regime da venda de coisas defeituosas.

1. Anulação do contrato por erro ou dolo

Comprador que tiver adquirido a coisa com defeito pode solicitar a anulação do contrato, por

erro ou dolo, desde que se verifiquem no caso concreto os requisitos legais da anulabilidade

– art. 905º

2. Reparação ou substituição da coisa

Obrigação de expurgar ónus ou limitações do art. 907º é substituída pela de reparar os defeitos

da coisa ou de a substituir no caso de ser necessário (e se a coisa for fungível – art. 914º).

➢ Romano Martinez: Eliminação do defeito não é exigível se implicar uma atuação

excessivamente onerosa para o vendedor.

➢ Vendedor tem o dever de reparar ou substituir os bens que vendeu com defeito, pois

garantiu tacitamente que vendia sem os mesmos.

Doutrina (ML, MLP) critica solução da parte final do art. 914º pois a obrigação de reparação

deixa de existir se vendedor desconhecer, sem culpa, do vicio.

➢ Há presunção de culpa (que pode ser elidida), mas não é coerente com a garantia

edilícia.

o Facilmente se ilide a presunção o que não se coaduna com a garantia edilícia.

INDEMNIZAÇÃO: Aplica-se art. 908º, 909º (com exclusão do art. 915º) e 910º

• Indemnização em caso de dolo

o Remissão para o art. 908º (dolo no sentido do art. 273º).

o Interesse contratual negativo

• Indemnização em caso de simples erro

o Remissão do art. 913º para o art. 909º

o Restrição do art. 915º - restringe as condições em que pode ser exigida a

indemnização

o Temos que articular com o facto de haver responsabilidade com culpa

presumida e não responsabilidade objetiva.

• Indemnização em caso de incumprimento de fazer convalescer o contrato

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o Esta indemnização vai ser substituída pelo regime do art. 914º e vai haver

indemnização por incumprimento de reparação ou substituição da coisa.

o Aplica-se a boa fé na execução dos contratos e eta reparação tem de ser feita

num prazo razoável, atendendo ao interesse do comprador.

3. Redução do preço

Nos termos do art. 911º - sendo solução imposta ao comprador se se comprovar que os vícios

ou falta de qualidades da coisa não influiriam na sua decisão de adquirir o bem, mas apenas no

preço disposto a pagar.

➢ Tem ínsito a a lógica do aproveitamento máximo dos negócios jurídicos

Romano Martinez: Os diversos meios jurídicos facultados ao comprador em caso de defeito da

coisa vendida não podem ser exercidos em alternativa.

➢ Há uma espécie de sequência lógica: 1º) o vendedor está adstrito a eliminar o defeito

da coisa e não sendo tal possível (ou sendo extremamente onerosos) deve proceder à

substituição; 2º) frustrando estas pretensões exige-se a redução do preço, que, não

sendo um meio satisfatório, cabe ao comprador pedir a resolução do contrato.

Indemnização cumula-se com qualquer das pretensões com vista a cobrir os danos não

ressarcíveis por estes meios.

Forma e Prazos de exercício do direito Comprador tem ónus de denúncia dos defeitos da coisa ao vendedor, exceto se vendedor tiver

utilizado dolo45 – art. 916º

• Primeira coisa a fazer é denunciar o defeito - imposição de um ónus de denúncia ao

comprador. Que tem de demonstrar que cumpriu este ónus ou que não o cumpriu por

haver dolo do vendedor.

• Todo o comprador fará esta denúncia por escrito mas a lei não impõe nenhuma forma

(art. 219) mas é mais fácil para a prova.

Prazos variam consoante se trate de bens móveis ou imóveis – art. 916º/2 e 3

• São aplicados cumulativamente, pelo que se não for observado qualquer deles,

caducarão os direitos conferidos ao comprador que pressupõe a denúncia dos defeitos.

• A descoberta dos defeitos vale independentemente para cada um deles, renovando-se

sempre que forem descobertos novos defeitos.

o Já o prazo a contar da entrega da coisa46 vale para a generalidade dos defeitos.

Incumprindo-se os prazos caducam os direitos – art. 917º

Letra da lei restrita à ação de anulação mas deve aplicar-se o prazo igualmente em relação a

todas as ações conferidas ao comprador com base em simples erro, uma vez que não se justifica

a grande divergência de regime de se aplicar a estas o prazo geral da prescrição.

45 Contam os prazos do art. 287º e a indemnização é pelo art. 227º 46 Entrega material – entendimento suportado pelo art. 922º

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Cláusulas de Exclusão de Garantia Podem ser admitidas estipulações contrárias à garantia, a não ser que o vendedor tenha

procedido com dolo e as cláusulas contrárias àquelas normas visem beneficiá-lo (art. 912º ex

vi art. 913º).

Regime dos defeitos supervenientes + defeitos na venda de coisa futura ou de coisa

genérica – art. 918º Quando os defeitos não correspondem a vícios da coisa específica comprada que existiam no

momento da venda, não se aplica o art. 913º e ss. e aplica-se o regime do não cumprimento

das obrigações.

Presume-se que os vícios são imputáveis ao devedor – art. 799º.

➢ Vendedor responde pelos danos causados ao comprador (art. 798º e ss.), que pode

também exigir indemnização correspondente aos prejuízos que lhe causou o

cumprimento defeituoso ou resolver o contrato sem prejuízo de reclamar a

correspondente indemnização pelos prejuízos da celebração do mesmo (art. 801º).

Não sendo imputáveis ao vendedor, há risco pela perda ou deterioração da coisa, o qual corre

por conta do comprador nos casos de defeito superveniente e por conta do vendedor no caso

de coisa futura ou genérica (art. 408º/2 e 540º).

Abrange também os defeitos na venda de coisa genérica ou futura pois não pode ser aplicado o

regime do erro do art. 913º.

Venda sobre amostra – art. 919º Venda de coisa específica é realizada por referência a outro objeto, indicado como amostra

ou modelo.

• A lei considera estipulada a existência de qualidades iguais às da amostra no bem

vendido, o que determinará a aplicação do regime dos art. 913º e ss., no caso de essas

qualidades não se verificarem.

o Dos usos ou convenção pode resultar que a amostra não tem efeito vinculativo,

servindo apenas para indicar de modo aproximado as qualidades do objeto –

vendedor assegurará, então, ao comprador, apenas qualidades próxima e não

estas exatas.

Venda de animais – art. 920º Intenção de não regular a compra e venda de animais defeituosos pelas regras do CC, mas

apenas pelas leis especiais ou, na falta delas, pelos usos.

➢ Assim, quanto aos animais e doenças abrangidas pelas leis especiais, haverá que aplicar

o regime destas.

➢ No caso de não se encontrar previsto, não se aplica analogicamente a lei e sim os usos

relativos à venda desses animais. Se não se verificarem usos, parece que se aplica o

regime geral do CC.

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Garantia do bom funcionamento - art. 921º Permite algo que o regime geral não permite: comprador tem o direito de exigir a reparação ou

substituição independentemente de qualquer culpa do devedor.

• Foge do regime da compra e venda defeituosa do art. 914º (que limita essa

reparação/substituição ao vendedor que conhecia com culpa).

• Domínio de aplicação mais para os casos que o defeito é oculto e o vendedor não tem

conhecimento disso, mas por convenção ou usos há a garantia do bom funcionamento.

o É uma espécie de promessa pública ou garantia unilateral de que a coisa possui

requisitos para funcionar bem.

Jurisprudência tem considerado a existência de garantias de bom funcionamento com base

em meras declarações assertivas do vendedor, o que tem atenuado os ónus que o CC faz recair

sobre o comprador.

• Aplicação deste artigo é objeto de extensão além do que o legislador inicialmente

pretendeu.

o Basta o vendedor declarar que a coisa é vendida em boas condições para que

se esteja a prestar esta garantia.

o Pode afastar esta garantia dizendo “vendo no estado em que está”.

• É apenas em relação ao vendedor e não abrange os casos em que a garantia é prestada

pelo fabricante, situação que é estranha ao vendedor, não excluindo nem limitando as

garantias por ele prestadas.

Não há referência na lei à redução do preço nem à indemnização.

Doutrina entende que art. 921º consagra uma responsabilidade especial do vendedor, de

natureza objetiva, que tem por base a assunção pelo vendedor do risco relativo a defeitos de

funcionamento da coisa.

Art. 922º Situação em que, de acordo com o contrato, o vendedor entrega a coisa a um despertador.

➢ As coisas só chegam ao comprador no momento em que é cumprida a prestação de

transporte.

o Nesse caso, só a partir do momento em que comprador (credor) as receber é

que se começam a contar os prazos para a denúncia e caducidade.

REGIME DA VENDA DE BENS DE CONSUMO – DL 67/2003

➢ MLP: REGIME DA COMPRA E VENDA DE CONSUMO – porque a qualificação de

consumo é quanto à compra e venda e não quanto a um tipo específico de bens.

Estatisticamente é este o regime que mais se aplica ao dia-a-dia das compras e vendas.

• Nos negócios jurídicos de consumo, a tutela do consumidor é assegurada de uma

forma distinta do que corresponde ao modelo clássico do cumprimento defeituoso.

Este diploma tem aplicação limitada pois não abrange a formação e os efeitos do contrato de

Compra e Venda de bens de consumo, nem sequer a indemnização pelos prejuízos resultantes

da falta de conformidade, que continua a ser regulada pelo CC.

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➢ Aplica-se quanto à “falta de conformidade” que o CC chama “defeitos”.

Hoje em dia temos dois regimes amplamente distintos, um aplicável aos consumidores e outro

a profissionais.

➢ MLP: Leva a quebra de sistema e contradições dificilmente explicáveis.

Âmbito de aplicação da garantia contratual sobre bens de consumo MLP: âmbito de aplicação é bastante amplo e é feito à custa de alguma indeterminação47

1. ÂMBITO RELACIONAL/OBJETIVO

Art. 1º-A: abrange não apenas os contratos relativos à transmissão de bens, mas também os

que envolvam o seu fabrico e produção, incluindo contratos típicos de empreitada ou outra

prestação de serviços, e ainda a locação de bens de consumo.

2. ÂMBITO SUBJETIVO

Tem de ser um contrato celebrado entre Profissionais e Consumidores

• Exclui-se contrato entre profissionais e contrato entre não profissionais – quanto a esses

aplicam-se as regras do CC

• Também se aplica o CC no caso da Compra e Venda de Bens de Consumo Invertida –

quando o profissional compra ao particular.

Noção de Consumidor e de Profissional:

• Art. 1º-B/a -> Consumidor (e profissional)

• Art. 1º-B/c -> Vendedor (o profissional que já foi referido na alínea a).

MLP: poder-se-ia por em causa esta definição quando o profissional atua de forma próxima de

um consumidor. Ex: sociedade advogados que adquire computadores, na perspetiva da lei,

como o bem é adquirido para ser utilizado no exercício de uma profissão a sociedade é

consumidora e não de profissional.

➢ Há problemas nestes casos devido à capacidade para entender as características do

negócio (consumidor é equiparado a profissional).

3. ÂMBITO TELEOLÓGICO

Fim do contrato tem de ser particular.

Bens adquiridos com fins simultaneamente profissionais e não profissionais

Qualquer aplicação profissional do bem, mesmo que não exclusiva, implicará a não aplicação do

regime desta garantia. ➢ Não se pode dizer que não se usa para uso não profissional, portanto age também na

qualidade de profissional.

o MLP: lógica literal é imbatível e está a aplicar-se a lei.

o Na generalidade dos casos ninguém pergunta se utiliza para fins profissionais e

na prática não se coloca a questão.

47 Porque depois quando se olha para as soluções do DL verificamos que todas estão formuladas e pensadas para a situação da Compra e Venda, tendo de ser sujeita a alguma adaptação quando é para aplicar o DL a outros contratos

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

41

o Mas, alguns comerciantes, em certos casos, vendendo bens a sociedades

aplicam o regime do CC.

Qualquer aplicação nos casos de aquisição de um bem de consumo a um profissional, quando

este não está a atuar no âmbito da sua atividade normal, também implica a não aplicação deste

regime.

Ferrer Correia: o critério era segundo o fim dominante – tinha de se provar qual o uso

dominante.

Pedro Albuquerque: critério é o uso habitual – tendo o profissional o ónus de demonstrar que o

uso não era estritamente pessoal.

Imposição da conformidade do bem entregue com o contrato

Conformidade como garantia nos contratos com os consumidores

Art. 2º/1: Imposição de obrigação de entrega de bens de consumo em conformidade com o

contrato, estabelecendo-se assim uma garantia contratual relativamente aos bens de consumo

consistente na imposição da sua conformidade com as descrições constantes do contrato.

• MLP: de acordo com as conceções mais modernas deste problema dos defeitos no contrato de

compra e venda, quando se compra bem específico, no momento da celebração do contrato não

há referência a esse bem em concreto e sim a um bem ideal, com as características ideais.

• Contrato faz configuração ideal da coisa, de como ele devia ser e não necessariamente

aquilo que ele é.

• Nesse caso, o problema é de incumprimento e não de erro. Partes estavam cientes

quanto às qualidades normais e expectáveis da coisa.

• O problema é de desconformidade entre o bem vendido e a representação da coisa

que as partes fizeram no momento do contrato.

Critério adotado para unificar a nível internacional as diversas soluções existentes nos vários

ordenamentos sobre a garantia edilícia.

A imposição ao vendedor da garantia de conformidade implica uma alteração substancial bastante

importante no regime da compra e venda de bens de consumo, na medida em que vem afastar a

solução tradicional que levava a que o comprador, aquando da celebração do contrato, tivesse de

assegurar que a coisa adquirida não tem defeitos e é idónea para o fim a que se destina. ➢ Esta averiguação deixa de ser imposta ao consumidor para ser objeto de uma garantia

específica, prestada pelo vendedor, cabendo a ele o ónus da prova, segundo as regras

gerais, de ter cumprido essa obrigação de garantia.

Conformidade consiste numa relação deôntica entre o referente, segundo o texto e o objeto do ato

executivo. ➢ Não pressupõe uma apreciação negativa da situação, como sucede com o conceito de

defeito da coisa, referido no art. 913º.

A venda de bens onerados e de bens defeituosos constitui uma hipótese de desconformidade.

• Este DL trata o problema dos defeitos como problema de incumprimento e não de erro,

pelo que atribui meios de defesa ao comprador sem falar em anulação e sem

terminologia própria do erro.

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• Problema não é de vontade viciada (ela foi perfeitamente formada) e sim o objeto não

corresponder à representação da coisa que correspondia às declarações das partes –

problema é de cumprimento do contrato

Como se caracteriza o objeto do contrato compra e venda para se verificar a conformidade?

• O conteúdo das declarações das partes refere-se à coisa como

qualidades/características ideais – portanto se se entrega coisa que não tem essa

característica ideal, está a incumprir-se o contrato.

o Caracterização da coisa é ideal e não real.

• Mesmo que a coisa esteja determinada, ela é entendida idealmente.

• No entanto, se o comprador souber que está a adquirir coisa com defeito, isso é

relevante pois a representação da coisa e a configuração da mesma no contrato é com

tal defeito. Ao ser entregue com esse defeito, não há incumprimento porque as partes

já o previam.

Exclusão da garantia de conformidade

Art. 2º/3: se vendedor colocar a coisa à disposição do consumidor para este examinar e se

certificar da não existência de defeitos e o consumidor decidir não fazer uso dessa faculdade,

parece que o vendedor poderá ficar isento de responsabilidade.

• Ónus de exame da coisa por parte do consumidor – menos proteção do consumidor.

• Doutrina tem vindo a entender esta solução como limitada aos casos de culpa grave do

consumidor, sem abranger as de culpa leve.

MLP: o disposto no artigo faz sentido, do ponto de vista do regime do incumprimento, pois se o

comprador conhecia a falta de qualidade/defeito, o bem que é objeto das declarações das

partes, tais declarações já são delimitadas como tendo esse defeito.

➢ A outra situação é de mais difícil de compreensão, mas enquadra-se nos cânones da

interpretação (teoria da impressão do destinatário) – a dificuldade é o grau de ónus para

o comprador de verificar eventuais defeitos e falta de qualidades dos bens adquiridos.

Presunção de não conformidade

Nos casos do art. 2º/2, há o estabelecimento de uma presunção (ilidível) que quando se

verificam certos factos há desconformidade.

• Vêm consagrar critérios de definição da coisa vendida.

o Critérios para caracterizar a coisa que é objeto do contrato – critérios de

interpretação do contrato de compra e venda.

Basta que se verifique algum destes factos negativos para que logo se presuma a não

conformidade com o contrato.

Aplicação da presunção de não conformidade acaba por funcionar como um indício de

violação da garantia edilícia, que passa assim a ser definida em termos bastante mais rigorosos

do que os que resultavam dos direitos dos Estados-membros.

a) Desconformidade com o assegurar de qualidades pelo vendedor – que pode resultar da

própria descrição do bem ou da sua comparação com amostra ou modelo apresentadas

na contratação.

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• O mero facto da descrição do vendedor é suficiente para determinar o assegurar

das qualidades.

• Mais proteção que o regime do CC, que pressupõe uma vinculação do vendedor,

ainda que tácita, relativamente à garantia das referidas qualidades, ao passo

que aqui bastam meras declarações de ciência e comportamentos fácticos.

• Não se contempla o dolus bonus e as sugestões legítimas, protegendo também

o comprador.

b) Desconformidade se informação prestada pelo consumidor quanto ao fim foi recebida

pelo vendedor, que quanto a ela não manifestou oposição aquando da celebração do

contrato.

• Critério importante nos casos em que o consumidor quer utilizar a coisa para

fim específico, mas esse fim não é habitual nas coisas do mesmo género.

i. Comprador pergunta se esse fim era alcançado e vendedor diz sim.

c) Aponta para um critério de habitualidade e não no sentido de regularização da utilização

e sim uma formulação em relação à frequência da sua utilização, de acordo com a

perspetiva do consumidor.

• Foge ao critério do uso normal da convenção habitual.

• É excessivo porque alberga todas as utilizações habituais do bem – mesmo que

os bens não tenham sido feitos normalmente para tal.

d) Critério objetivo de relevância das mensagens para efeitos de garantia prestada pelo

vendedor, que não pressupõe qualquer estipulação contratual, presumindo-se sempre

que as partes tomaram essas características como asseguradas na coisa comprada.

• Permite trazer para o contrato as qualidades que são anunciadas como

pertencendo àquele bem.

• Essa característica faz parte do contrato por força desta alínea.

• MC: onde está “e” deve ler-se “ou” – torna o requisito alternativo pois a ratio

da norma é proteger o consumidor, que fica mais protegido com um critério

alternativo do que cumulativo.

i. Paulo Mota Pinto discorda e diz que o “e” está lá por algum motivo e o

legislador decidiu criar o regime assim.

Mas mesmo que não se preencham nenhuma destas presunções, nada impede o consumidor

de demonstrar que, apesar disso, se verifica alguma desconformidade com o contrato.

Garantia de conformidade nos bens objeto de instalação

Art. 2º/4 institui extensão da garantia de conformidade a prestar pelo vendedor aos bens objeto

de instalação.

➢ Garantia está além do próprio bem vendido, abrangendo situações de prestações de

serviços conexas com esse bem como a instalação pelo vendedor ou a prestação de

informações sobre como proceder a tal instalação.

Qual o momento em que se afere da falta de conformidade?

Verificação da desconformidade do bem, de forma a gerar os direitos do comprador perante o

vendedor (art. 4º), está regulada no art. 3º:

➢ Momento relevante é o momento da entrega do bem (no CC, do art. 913º é a

celebração do contrato – da contraposição do art. 913º e 918º)

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A conformidade deve verificar-se no momento em que a coisa é entregue ao consumidor

• Implica que os riscos relativos a defeitos da coisa ocorridos entre a venda e a entrega ao

consumidor correm por conta do vendedor.

o ML: É uma derrogação do regime geral do CC – alteração às regras relativas à

distribuição do risco na venda de bens de consumo.

O art. 3º/1 estabelece que a responsabilidade do vendedor se mantém até ao momento da

entrega fáctica do bem ao consumidor.

Prova de que a falta de conformidade já existia no momento da entrega do bem cabe ao

consumidor.

➢ Se defeito tem de existir no momento da entrega, como é que consumidor prova que

comprou bem que já estava desconforme com o contrato no momento da entrega?

o Isto é difícil porque muitas das desconformidades só se revelam com a

utilização do bem (que só por si já é capaz de gerar defeitos e falta de

conformidade e etc.)

Art. 3º/2 vem estabelecer uma presunção de que as faltas de conformidade que se verifiquem

num certo prazo já existiam no momento da entrega.

➢ Essa presunção é inderrogável pelas partes, nos termos do art. 10º DL 67/2003 ➢ Se vendedor desejar ilidir essa presunção tem o ónus de o provar.

MLP: Temos de perceber que há diferença entre existência do defeito e manifestação do defeito.

• Se o defeito se manifestar no determinado período, presume-se que ele já existia antes

(mas em gérmen – não manifesto, mas que potencialmente se desenvolve para vir a

manifestar-se).

• Lei exige que a causa dessa manifestação seja contemporânea da celebração do

contrato – presumindo-a.

Art. 4º - Direitos do Consumidor perante a falta de conformidade

→ Reparação

→ Substituição

→ Redução do preço

→ Resolução do contrato

Soluções alternativas – não pressupõe culpa do vendedor.

• O que se pode cumular é o direito à indemnização, não previsto neste DL, mas também

não excluído por ele – pressupõe a culpa do vendedor.

o Acresce ainda uma indemnização, prevista pelo art. 12º/1 da Lei 24/96

• Na generalidade dos casos não há direito à indemnização porque na maior parte dos

casos o vendedor não tem culpa. Ex: grandes retalhistas que vendem os bens como

recebem.

Nº2: Direito à reparação ou substituição é em prazo razoável, atendendo à natureza do defeito.

➢ Lei tem em conta que uma reparação demorada pode ser onerosa e prejudicial para o

consumidor.

Nº3: Direito à reparação é sem qualquer encargo do consumidor

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A diretiva continha uma hierarquia das soluções, que é lógica devido ao aproveitamento dos

negócios jurídicos impor a prevalência das soluções que conduzem à integral execução do

negócio sobre soluções que implicam uma sua ineficácia total ou parcial.

➢ Art. 4º/5 não contem hierarquia, podendo o consumidor exercer qualquer um dos

direitos, salvo se tal se manifestar como abuso de direito.

➢ No nosso direito não há reflexo dessa ordem de prioridades, o que trouxe divergência

na doutrina quanto a este aspeto.

o MLP: legislador quis simplificar e consagrar regime simples, sem haver

hierarquia.

▪ Comprador pode escolher meio mais desfavorável ao vendedor.

o O que estabeleceu foi no art. 4º/5 referir o abuso de direito: podendo haver

casos em que optar logo pela resolução cai no abuso de direito. A prova é difícil

e a lei é exigente quanto à verificação de abuso de direito. Mera referência da

lei ao abuso de direito não é suficiente para dizer que o comprador não pode

optar logo pela resolução.

➢ Nem toda a doutrina concorda e deve entender-se que há ordem, devido às indicações

dadas pela diretiva (Romano Martinez).

o ML: lei portuguesa tem esta possibilidade de dar mais flexibilidade ao

consumidor de escolher diferentes soluções sem nenhuma hierarquia.

o MLP: Diretiva é de mínimos. Não se pode sustentar que resolver logo contrato

é abuso de direito. O abuso de direito (art. 334º CC) só funciona em funções

relativamente graves, de modo que nem sempre a opção do comprador pela

resolução se enquadre como grave.

▪ Para haver desproporcionalidade não pode ser apenas por ser

desvantajosa para o vendedor. É difícil dizer que há

desproporcionalidade nessa opção (o prejuízo para o vendedor não será

pior que a vantagem que traz para o comprador).

A segunda venda, a que diz respeito o art. 4º/6, já não é uma venda de bens de consumo, para

efeito do art. 1º-A pois o negócio é celebrado entre dois consumidores.

➢ No entanto, essa segunda venda permite ao adquirente daquele bem receber os direitos

contra o profissional de que o anterior adquirente era titular, enquanto parte na

anterior venda de bens de consumo.

➢ Pode também reagir contra o consumidor que lhe vendeu os bens, nos termos do art.

913º CC.

Art. 5º

• É um prazo material relativo à manifestação de falta de conformidade, e não um prazo

de caducidade.

• Conjuga-se com o art. 5º-A – prazo de caducidade em que a presunção de

desconformidade retroage à entrega do bem

Prazo de garantia – qualquer desconformidade que se manifeste naquele prazo dá ao

comprador os direitos do art. 4º - prazo material quanto à manifestação da desconformidade

➢ Prazo aplica-se à manifestação dos defeitos.

o Tem de se manifestar naquele prazo sob pena de não vir a dar direitos ao

consumidor.

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➢ Conjuga-se com a presunção do art. 3º

Duas regras importantes:

1. direitos do art. 4º é se o defeito se manifestar no prazo de garantia;

2. esses direitos dependem da desconformidade originária, que a lei presume que, ao

serem manifestados nesse período, são originalmente desconformes.

Prazo de garantia também vale para o bem substituto (aquele dado ao consumidor num

contexto de reparação/substituição de um bem).

➢ MLP: Faz sentido, pois o bem substituto tem de ser experimentado.

Art. 5º/2: só se pode reduzir o prazo de garantia, respeitando a imperatividade do art. 10º, se a

coisa for Móvel e Usada. É uma possibilidade para as partes, se elas quiserem.

Responsabilidade Direta do Produtor – art. 6º

Legislador português decidiu seguir o anteprojeto de Paulo Mota Pinto e estabelecer a

responsabilidade direta do produtor perante o consumidor. ➢ Definição de produtor é do art. 1º-B/b

Consumidor tem direitos contra o vendedor e contra o próprio produtor do bem.

➢ Serve para pedir a reparação ou substituição do bem

o ML: direito de redução do preço e resolução do contrato não podem ser

atribuídos ao consumidor contra o produtor ou seu representante.

o Responsabilidade é limitada à substituição e reparação da coisa e não à

indemnização pelos danos resultantes do não aproveitamento do produto

defeituoso.

o Não faz sentido exercerem contra o produtor os direitos de redução do preço e

resolução do contrato – esses direitos são para o consumidor reagir contra o

vendedor, enquanto contraparte do contrato.

o Mas, não se exclui o direito de indemnização contra o produtor, em

solidariedade com o vendedor.

Não se pode confundir com a Responsabilidade do Produtor (no contexto da responsabilidade

delitual – danos na pessoa ou património da pessoa que adquire os bens).

Direito de regresso – art. 7º

Vem clarificar que apesar de se impor ao vendedor uma responsabilidade objetiva perante o

consumidor pela falta de conformidade (resultante de ato ou omissão do produtor), o vendedor

final tem direito de regresso contra a pessoa responsável da cadeia contratual.

Direito de regresso pode ser dogmaticamente justificado com a consideração de que existe uma

relação quase-contratual entre produtor e consumidor final, através da qual se estabelece o

regresso.

5 anos para exercer este direito – art. 8º

Garantia Voluntária – art. 9º

Garantia voluntária está definida no art. 1º-B/g

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

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Estipulação de uma garantia voluntária pode fazer crer ao consumidor que ele só tem esses

direitos.

➢ Por isso a lei vem impor que na própria garantia se tem de mencionar que além destes

direitos estabelecidos pela garantia tem também todos os direitos da lei.

Regime português abrange as garantias voluntariamente prestadas pelo produtor e vendedor

que ultrapassem o conteúdo da garantia legal e as garantias que impliquem uma prestação

suplementar a pagar pelo consumidor ou, ainda, as garantias prestadas por terceiro (como os

contratos de seguro).

➢ Essas garantias vinculam juridicamente os que as oferecem, nas condições constantes

da declaração de garantia e da publicidade correspondente.

➢ Eficácia de promessa pública (art. 459º CC).

Art. 10º - Caráter injuntivo das disposições de proteção ao consumidor

Nulidade atípica (art. 10º/2)

Compra e Venda de ações tem em vista a venda da empresa Em que medida é que se aplica o regime de venda de coisas defeituosas se aplica.

Negócio da compra e venda de ações: Share Deal (vs. Asset Deal – negócio relativo à compra e

venda de património).

O objeto do negócio são as participações sociais que é isso que vai ser adquirido.

No entanto, o objeto do negócio são as participações sociais mas esse negócio é feito com base

numa série de pressupostos relativos à empresa (atribui-se valor às participações no

pressuposto que ela tem certo volume de bens e etc.).

• Todo o negócio é feito com base no pressuposto do património da sociedade (e seu

volume de negócios).

o Esses pressupostos podem não corresponder à realidade.

o Como é que o comprador pode ser tutelado nestas situações?

Ex: comprador compra ações de uma sociedade segundo o pressuposto de ela

ser dona de um certo património, mas, depois descobre que os bens da

sociedade estão hipotecados.

1ª abordagem formalista: objeto da compra e venda não regista nenhuma anomalia.

• MLP: mas a verdade é que comprador ao adquirir as participações sociais queria adquirir

a empresa com base em certos pressupostos que depois não se verificam.

o Parte da doutrina tem considerado que o regime da compra e venda de coisas

defeituosas pode ser aplicável a este caso – quando o negócio da compra e

venda de participações sociais tenha analogia com o negócio sobre a compra e

venda do património da empresa

▪ MLP: dois problemas – tese da equiparação não é defendida pela

totalidade da doutrina e aplica-se o regime da parte geral (erro + culpa

in contrahendo); é preciso critérios para a equiparação (Mota Pinto:

tem de comprar as participações sociais com o intuito de comprar a

empresa).

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

48

▪ Esta tese tem dificuldades, ultrapassando o grau de analogia, há o

problema que este regime das coisas defeituosas tem muito a ver com

a compra e venda de coisas corpóreas, ajustando-se mal a estes casos

em que não se podem exigir prazos tão exíguos

Na prática, com alguma frequência e por recurso à tradição anglo-saxónica, as partes preveem

nos próprios contratos essas situações.

➢ Fazem-no em cláusulas de “Declarações e Garantias”.

Convenção de Viena sobre a Compra e Venda Internacional de Mercadorias Portugal assinou a Convenção mas não a ratificou, não vigorando na Ordem Jurídica

Portuguesa.

É uma convenção que uniformiza o direito e faz com que as partes saibam com o que podem

contar.

Só se aplica entre partes comerciais.

➢ Não se aplica à compra e venda de consumo.

6. Venda Sobre Documentos – art. 937º e ss. CC A entrega de documentos legitima o comprador a levantar as respetivas mercadorias

diretamente ao transportador ou depositário, sendo desnecessário que o vendedor assegure

essa entrega.

O objeto de venda não são os documentos mas antes as coisas a que estes se referem, sendo

que o direito incorporado no título constitui unicamente um crédito à entrega dessas coisas e

não a propriedade das mesmas.

Regime especial quanto à transferência do risco48 – art. 938º (Venda de Coisas em Viagem)

• Transferência do risco (pelas alíneas a) e b)) estabelecem que o risco do perecimento ou

deterioração da coisa é atribuído ao comprador desde que a coisa é entregue ao

transportador.

o Isto porque a transmissão do seguro contra os riscos do transporte de alguma

forma segura o comprador contra esse risco e não se considera por isso

justificado fazer depender a transmissão do risco do facto de os danos ocorridos

durante o transporte se terem verificado antes ou após a celebração do

contrato.

▪ MLP: leva até a que se coisa pereceu ou se deteriou antes da

celebração, não se concede nenhum direito ao comprador. Ou pode

48 Momento da Transferência do Risco na Compra e Venda

➢ MLP: entende que se transmite o risco com a celebração do contrato, à luz do art. 716º o Regula os casos de perecimento da coisa e deterioração da coisa (que no fundo são

casos de defeitos da coisa). o Se o perecimento ocorreu antes da transferência do risco consumidor não é obrigado a

pagar o preço. Se ocorreu depois, então é obrigado a pagar o preço. O mesmo com a coisas defeituosas.

▪ Daí ser muito importante o momento da transferência do risco.

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

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levar a que comprador compre uma coisa que já não existe (porque foi

destruída ou adquiriu defeitos no transporte) e tenha de pagar o preço.

MLP: parece querer dizer que o risco se transferiu antes do contrato ser celebrado.

➢ Não é esta a forma correta.

o O contrato é celebrado tendo em conta a coisa como existe (ou não) naquele

momento e que comprador não a pode prever.

➢ Explicação para este regime é que comprador tem direito às pretensões do seguro de

transporte.

7. Compra E Venda De Coisa Sujeita A Pesagem, Contagem Ou Medição – art. 887º

e ss. CC Tema que não é tradicionalmente tratado como perturbação do contrato de compra e venda

➢ Mas na realidade é uma perturbação

o Interesse da lei em regular é na hipótese de poder ocorrer uma anomalia.

▪ Essa anomalia pode ser quando as partes, ou pelo menos quando uma

delas, está em erro quanto à quantidade, peso ou medida da coisa

vendida.

Venda de coisas determinadas, ainda que sujeitas a uma posterior operação de contagem,

pesagem ou medição.

➢ O regime não se aplica à venda de coisas genéricas, uma vez que nesta estão em causa

coisas indeterminadas, dado que a obrigação só está determinada quanto ao género e

quantidade (art. 539º). Ex: 20 quilos de maçã é diferente de comprar um saco que indicia

ter 20 quilos

o Nos casos de coisa genérica o que pode ocorrer é uma situação de não

cumprimento, e não de erro.

A referência das partes quanto à quantidade, peso ou medida dos bens vendidos vai

implicar uma futura operação de contagem, pesagem ou medição, a qual coloca o problema

de eventualmente se verificar uma discrepância entre a referência contratual e o resultado da

operação de contagem, pesagem ou medição.

• Venda considera-se concluída antes da operação de contagem, logo com a celebração

do contrato, adquirindo o comprador imediatamente a propriedade dos bens vendidos. o MLP: para aplicar este regime pelo menos uma das partes tem que estar em

erro quanto às coisas determinadas efetivamente vendidas.

• A discrepância entre o contratado e a realidade apenas pode ter reflexos para efeitos de

apuramento do preço devido. o Problema que se coloca e que a lei resolve é quanto ao preço a pagar – que

nestes casos foi fixado (pelo menos uma aceitou o preço) na convicção de que

a coisa era vendida com uma certa quantidade ou certas medidas.

▪ Base para o cálculo do preço foi perturbada por esse erro.

MLP: este regime só se aplica quando a contagem, pesagem ou medição é fundamental para

a determinação do preço.

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

50

➢ Não é a todas as coisas que são suscetíveis de medição (mero dado ontológico de

poderem ser sujeitas a isso) mas só aquelas cuja contagem é essencial para determinar

o preço.

Depende se o preço foi estabelecido em função de um tanto por cada unidade vendida (venda

ad mensuram ou por medida) – art. 887º

• Sempre: Correção do preço estabelecido

o Vontade formou-se com referência direta ao preço unitário, levando a supor

que se quis fazer corresponder o preço à efetiva quantidade, peso ou medida

das coisas entregues.

o Quando o preço é fixado por unidade ajusta-se o preço às medidas efetivas da

coisa medida.

Depende se o preço foi estabelecido para o conjunto de coisas vendidas (venda ad corpus ou a

corpo) – art. 888º

• Quando a discrepância do preço for superior a 5%: Correção do preço estabelecido

o Vontade formou-se em relação ao preço global, sendo incidental a referência à

quantidade, peso ou medida das coisas vendidas.

▪ Preço foi fixado pelo conjunto e se a desconformidade não for muito

significativa não é possível pedir ao vendedor um ajustamento do

preço.

▪ MLP: lei apenas permite ao comprador que ele pague menos. Significa

que se o erro for desfavorável ao vendedor, ele não pode exigir um

pagamento adicional. Alteração do preço devido só pode funcionar em

favor do comprador e não do vendedor.

Art. 889º

Conjunto de coisas vendidas abrange mais do que uma categoria e a discrepância na referência

se caracteriza por faltar parte de uma das categorias e haver excesso em relação a outros.

➢ Faltas e excessos compensam-se.

➢ Ex: vende-se adega com 50 pipas de vinho branco e 50 de vinho tinto. Não tem o

vendedor que corrigir a discrepância se se verificar 60 pipas de vinho branco e 40 de

vinho tinto.

Art. 890º

Prazo para efetivar o direito do recebimento da diferença de preço.

Art. 891º

Comprador pode resolver o contrato sempre que se venha obrigado a pagar ao vendedor uma

diferença de preço superior a 1/20 do preço declarado.

➢ Só não acontece se tiver havido dolo do comprador.

O regime desta Compra e Venda não exclui a aplicação do regime do erro, caso se verifiquem os

seus pressupostos – assim, se for essencial para o declarante que a coisa vendida tenha a

quantidade declarada e a outra parte conhecia ou não podia ignorar essa essencialidade, cabe

à parte a anulação do contrato nos termos gerais (art. 251º e 247º).

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

51

Vem provar que, à partida, mesmo nas coisas em que o preço não tenha sido fixado por unidade

o vendedor também pode exigir um acrescer do preço.

➢ MLP: chegamos à conclusão que o vendedor também pode pedir um ajustamento do

preço em seu benefício

Há meio de defesa adicional para o comprador (que vai ter de pagar um preço para o qual não

estava preparado).

Este regime é específico e é uma perturbação do contrato compra e venda ao nível da formação

do preço.

Coloca-se o problema se este regime veda a aplicação do regime das coisas defeituosas

• MLP: mais aplicável no caso dos imóveis, que têm uma medida que as partes tiveram

em conta na formação do preço. Essas medidas podem também por em causa o

fim/utilidade da coisa para o fim a que o comprador a destina. Permite ajustamento do

preço em função das expetativas do comprador.

Modalidades Especiais de Compra e Venda

VENDA A RETRO – art. 927º e ss. Modalidade de venda em que a transmissão da propriedade não se apresenta como definitiva,

na medida em que o vendedor se reserva a possibilidade de reaver o direito alienado,

mediante a restituição do preço e o reembolso das despesas feitas com a venda.

➢ Vendedor adquire uma posição jurídica específica que lhe permite resolver o contrato e

recuperar o bem.

o Faculdade ad nutum do vendedor = segundo a sua própria utilidade

Surgiu na necessidade de tutelar um proprietário que, devido à contingência das suas

necessidades financeiras, se vê obrigado a alienar um bem seu mas tem mantém o interesse de

o voltar a adquirir logo que a sua condição financeira o permita.

Função creditícia em relação ao vendedor e função de garantia em relação ao comprador.

• Contrato apresenta-se como operação de financiamento na qual o pagamento do preço

substitui a concessão de um empréstimo pelo comprador ao vendedor, e o exercício do

direito de resolução por este substitui o reembolso desse mesmo empréstimo –

reembolso que se apresentou como garantido, através da prévia atribuição da

propriedade ao comprador49.

Tem sido questionada pois pode tornear-se, através dela, a proibição da estipulação de pactos

comissórios (art. 694º, 665º, 678º e 753º).

• O CC atual, após o Código de Seabra a ter abolido, voltou a reinstituir este contrato mas

em termos tais que o tornaram sem qualquer relevância prática.

• Para evitar a sua utilização com fins de garantia, o CC proibiu a atribuição ao comprador

de qualquer benefício como contrapartida da resolução, tornando assim muito difícil

que algum comprador aceite celebrar uma aquisição com uma cláusula a retro.

49 Garantia máxima que envolve a transmissão da propriedade.

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• Apesar do CC, quando não haja uma qualquer intenção de transferir a propriedade

contra o pagamento de um preço a receber, mas apenas a de constituir uma garantia

de pagamento de um crédito a favor do comprador, estamos perante uma verdadeira

alienação fiduciária em garantia, que é dificilmente compatível com a proibição do pacto

comissório.

Prazo: art. 929º

Forma: art. 930º

Oponível a terceiros: art. 932º

A contrario conclui-se que, diferentemente do que acontece na cláusula de reserva de

propriedade, não é possível opor a terceiros a cláusula a retro quando esta diga respeito a coisas

móveis não registáveis.

➢ Só tem eficácia real quando diz respeito a bens imóveis ou móveis sujeitos a registo.

Se o bem já tiver sido alienado a terceiro, notifica-se a resolução ao comprador e é a ele que lhe

deve ser feita a oferta real do preço e despesas, devendo depois o vendedor opor ao adquirente

o seu direito e tendo este, por sua vez, direito de reclamar do comprador o reembolso do que

lhe tiver sido pago.

Resolução faz retornar a propriedade à esfera jurídica do vendedor.

➢ Tem efeitos ex nunc (sem eficácia retroativa) – pelo que os frutos que a coisa produziu

entre o momento da venda e o da resolução pertencem ao comprador.

Natureza jurídica

É um regime que se integra harmoniosamente com o disposto no art. 432º e ss., podendo ser

considerada como uma convenção atributiva de um direito de resolução do contrato, a exercer

ad nutum pelo vendedor.

VENDA A CONTENTO e SUJEITA A PROVA– art. 923º, 924º e 925º Venda realizada por etapas.

Verifica-se a subordinação do contrato a uma aprovação da coisa vendida por parte do

comprador, da qual vai depender a sua efetiva vigência.

➢ Depende de um teste posterior, a realizar pelo comprador.

➢ Temos uma situação em que o vendedor aceita que o comprador possa existir da

compra depois de examinar a coisa.

VENDA A CONTENTO Comprador reserva-se a faculdade de contratar ou resolver o contrato, consoante a apreciação subjetiva (o seu gosto pessoal) que vier a fazer do bem vendido.

Primeira Modalidade: implica a estipulação de que a coisa vendida terá de agradar ao

comprador – cláusula ad gustum (art. 923º).

• Reserva relativa à aceitação do contrato de Compra e Venda, o que significa que em

virtude dessa cláusula o acordo das partes vem a ser qualificado como uma mera

proposta de venda, ficando o vendedor vinculado sem que o comprador o venha a estar.

• Art. 923º/2 atribui valor negocial ao silêncio (art. 218º).

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53

• Não necessita de motivos e o se o comprador, durante o prazo estabelecido, se

pronunciar no sentido da rejeição do contrato, a venda considerar-se-á como não

celebrada.

Segunda Modalidade: concede-se ao comprador um direito de resolução unilateral do contrato

se a coisa não agradar ao comprador, seguindo as regras do art. 432º e ss.

• Não é condição resolutiva, uma vez que as partes não subordinam a resolução do

negócio a um acontecimento futuro e incerto, antes atribuindo ao comprador o direito

de resolver unilateralmente o contrato (art. 924º).

• Se a coisa se vier a perder ou deteriorar, o comprador deixará de a poder restituir ao

vendedor, pelo que perde o direito de resolver o contrato (art. 432º/2).

VENDA SUJEITA A PROVA Está em causa uma avaliação objetiva do comprador em relação às qualidades da coisa, em

conformidade com um teste a que esta será sujeita.

• Comprador verifica, por via de um uso da coisa, que ela é idónea para o fim a que é

destinada e tem as qualidades asseguradas pelo vendedor – art. 925º

• Não se trata de um exercício discricionário – tem de existir um fundamento.

o A coisa não tem as qualidades asseguradas pelo vendedor e não cumpre com o

fim que é destinado.

Proibições de Compra e Venda Conceptualização que vem na esteira de Raúl Ventura e que não é objeto de um regime unitário.

• Casos em que a lei veda a celebração do contrato de compra e venda entre

determinadas pessoas

o Não é vício do objeto negocial nem de incapacidade dos sujeitos, mas antes

situações em que está vedada, por razões atinentes às relações das partes entre

si ou com o objeto negocial, a celebração do contrato entre elas, admitindo-se,

porém, a sua realização entre outros sujeitos.

VENDA DE COISA OU DIREITO LITIGIOSO – art. 876º Remissão para o regime dos art. 579º e ss.

Razão desta proibição é que as entidades a que se proíbe a venda possam atuar com fins

especulativos, levando os titulares a vender-lhe os bens por baixo preço, a pretexto da sua

influência no processo.

Essa proibição cessa nos termos do art. 581º

Não pode ser invocada pelo comprador e ainda dá direito a uma indemnização (limitada ao

interesse contratual negativo) pelos danos causados.

VENDA A FILHOS OU NETOS – art. 877º Justificada historicamente, a sua proibição foi sempre a de evitar o favorecimento de certos

descendentes em que sob a capa da compra e venda se efetuassem doações simuladas.

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54

No caso de venda a filhos, exige-se o consentimento dos restantes filhos, mas não dos netos

(salvo se forem descendentes de um filho falecido).

No caso de venda a netos, exige-se o consentimento tanto dos filhos que encabeçam a estirpe

como dos netos que sejam irmão do comprador.

➢ Nesta proibição também de proíbe a venda a filhos ou netos feita através de interposta

pessoa.

Não engloba a venda a bisnetos nem o caso em que são os filhos ou netos os vendedores.

COMPRA DE BENS DO INCAPAZ PELOS SEUS PAIS, TUTOR, CURADOR,

ADMINISTRADOR LEGAL DE BENS OU PRODUTOR QUE EXERÇA AS FUNÇÕES DE TUTOR Requer autorização do Ministério Público – art. 1892º/1

Sem essa autorização pode haver uma anulação da compra e venda – art. 1893º

VENDA ENTRE CÔNJUGES Ínsita no art. 1714º/1 – proibição de venda encontra-se diretamente ligada ao princípio da

imutabilidade das convenções antenupciais, o que significa que esse regime é vinculativo a partir

do momento que é escolhido.

➢ Se se aceitasse a compra e venda entre cônjuges, tal podia ser uma forma indireta de

tornear esse princípio.

COMPRA DE BENS DA MASSA INSOLVENTE PELO ADMINISTRADOR DA INSOLVÊNCIA Art. 168º/1 CIRE

➢ Fundamenta a destituição da causa e obriga o administrador a restituir à massa o bem

ou direito ilicitamente adquirido, sem direito a reaver a prestação efetuada – art. 168º/2

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CONTRATO LOCAÇÃO

Corresponde à figura da location conductio rei do Direito Romano e é um regime que sofreu várias

alterações, nomeadamente com a retirada do Regime do Arrendamento Urbano no CC e depois

com a sua reintrodução.

Locação desempenha importante função económica, na medida em que permite ao titular de

direitos de gozo sobre determinada coisa obter um rendimento, concedendo temporariamente o

gozo dessa coisa a outrem, o que faz sem abdicar do direito que lhe corresponde.

➢ Facilita ao aproveitamento económico dos bens.

ART. 1022º: Locação é o contrato50 pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra

o gozo temporário de uma coisa, mediante retribuição.

• Contrato com prestação específica: proporcionar a outrem o gozo de uma coisa

corpórea

• Caráter transitório de celebração por período transitório

• Contrapartida pecuniária pelo gozo dessa coisa.

Visa proporcionar o gozo de uma coisa determinada e infungível. ➢ Há necessariamente uma contraprestação.

o Distingue-se, assim, do contrato de comodato, pelo facto de este último ser um contrato gratuito.51

o A responsabilidade do comodatário é menor, porque ele está a emprestar sem receber nada por isso.

A lei, hoje em dia, regula o contrato de locação em geral no CC, sendo também aí que encontramos o essencial do regime do Arrendamento Urbano, mas, fora do CC estão outros regimes, como diplomas relativos a aspetos do arrendamento urbano e todo o regime do Arrendamento Rural.

A posição do locador: verdadeira obrigação?

Romano Martinez: Concede-se ao locatário um direito de gozo sobre a coisa. É negócio jurídico

sinalagmático em que implica proporcionar o gozo de uma coisa como contrapartida do dever

de pagar a retribuição.

➢ Há reciprocidade e interdependência entre estas duas prestações.

50 ML: Nem sempre tem de resultar de um contrato e pode resultar de sentença judicial (art. 1798º), de arrendamentos impostos por órgãos públicos e ainda se discute na doutrina a possibilidade do direito do locatário se constituir por usucapião. 51 RM: diferença entre locação e comodato – no comodato não basta dizer que se empresta um determinado bem, enquanto o bem comodatado não for entregue ao comodatário não há contrato; diferentemente, na locação, o negócio jurídico existe e é válido mediante o mero consenso e do contrato emerge a obrigação da entrega da coisa (art. 1031º/a).

➢ Não há acolhimento da doutrina que vê a locação como um negócio jurídico real quod constitutionem pois a entrega não é elemento constitutivo do negócio.

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Lei fala em obrigação de proporcionar o gozo e generalidade da doutrina considera isto como

um direito de crédito do locatário ao gozo

➢ Doutrina maioritária caracteriza a posição jurídica do locado como obrigação de

proporcionar o gozo.

Doutrina discute: se existe uma prestação de facere e uma prestação de non facere.

• Prestação devida pelo locador é apenas omissiva, no sentido que ele apenas tem de tolerar e não perturbar o gozo do locatário.

• ML, RM: prestação positiva, que se concretiza em várias ações. Por exemplo: o locador é obrigado, no arrendamento urbano, a fazer obras de conversão – artigo 1074º.

MLP: vai ganhando algum corpo a ideia de que os contratos, de que a locação é exemplo, podem não criar obrigações, mas sim outras atribuições patrimoniais que não revistam a forma de obrigações.

• Ex. compra e venda de direito não reveste forma obrigacional.

• Não negue que o locador esteja obrigado a algumas ações que sejam configuráveis como prestações mas contesta que a qualificação daquilo que o locador da a título principal é uma obrigação.

• Ex: coisa móvel furtada, no caso de aluguer. A lei diz que o locador não tem de assegurar o gozo contra atos de terceiro, pelo que podem-se fazer diligencias para ver se se encontra o carro, mas não há responsabilidade do locador. Assim, não há prestação do locador que é incumprida. Mas o locatário tem direito a deixar de pagar o aluguer (1040.º CC). Como conseguimos explicar isto se nos mantivermos fiéis à ideia de que o contrato institui uma obrigação? Não conseguimos explicar. Este exemplo só se explica se tivermos em consideração que o locador não dá uma prestação, mas o gozo da coisa.

• Aquilo que o locador dá não é uma prestação, mas sim o gozo da coisa, que não é configurável como uma prestação ou como um comportamento do locador.

o Se o gozo for perturbado, então a outra parte pode não fazer a contraprestação, porque não obteve o gozo.

o Existem sempre algumas prestações que estão incumbidas sobre o locador, contudo estas não são a sua atribuição principal, mas sim prestações instrumentais.

Posição do Locador, no contrato de locação, é que ele faculta o gozo da coisa, em si, pelo qual

recebe dinheiro.

Posição do Locatário, no contrato de locação, não é qualificada como um direito de crédito.

• Mas tal não obriga a qualificar o direito do locatário como direito real.

• A única consequência necessária desta tese é desqualificar o direito do locatário como

direito de crédito – o direito do locatário não é o direito a uma prestação.

o O que recebe a título principal não é uma prestação, é o gozo.

o Há de facto prestações, mas o que se recebe é o gozo e não um crédito ao gozo.

Art. 1023º • Arrendamento – locação que recai sobre coisa imóvel.

o Pode ser Urbano (para fins habitacionais ou fins não habitacionais) ou Rústico

(pode ser rural, se tiver fins agrícolas, florestais ou outras atividades desse

estilo).

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• Aluguer – locação que recai sobre coisa móvel52

Menezes Leitão – Locação é contrato:

• Nominado e típico.

• Consensual.

• Formal (arrendamento urbano – art. 1069º) e não formal (aluguer).

• Obrigacional.

o Discussão na doutrina:

▪ PL/AV, Romano Martinez, Januário Costa Gomes, ML – direito pessoal de gozo.

➢ Proporcionar o gozo da coisa é uma obrigação por parte do locador, o

que naturalmente corresponde a um direito de crédito do locatário

▪ OA, MC – direito real. Suportada pelo art. 1037º/2.

• Oneroso.

• Sinalagmático.

• Comutativo.

• Execução duradoura.

Elementos Constitutivos do Contrato de Locação – art. 1022º: 1. OBRIGAÇÃO DE PROPORCIONAR A OUTREM O GOZO DE UMA COISA – essa obrigação

é a prestação característica do contrato de locação (referida no art. 1031º/b) e é uma obrigação

de conteúdo positivo.

• Alguns autores, entendem o direito do locatário como um direito real pois há um direito

de gozo inerente à coisa e dotado de sequela.

• ML: é uma obrigação de conteúdo positivo53 (art. 1031º/b) que visa assegurar o gozo

da coisa ao locatário.

o No entanto, isto não implica que se assegure continuamente o gozo da coisa ao

locatário, uma vez que tendo a coisa lhe sido entregue, e estando ele na sua

posse, torna-se desnecessária qualquer intervenção do locador para assegurar

esse gozo, bastando normalmente a sua abstenção em praticar atos que o

impeçam ou diminuam (art. 1037º/1/).

2. CARÁTER TEMPORÁRIO – o art. 1025º expressamente determina a proibição da locação

se celebrar por mais de 30 anos, sendo reduzida a esse limite quando celebrada por tempo

superior54.

52 RM: Suscita-se a questão se é possível ou não locar as coisas consumíveis ou fungíveis – lei não resolve mas conclui-se que não pode ser locada uma coisa consumível ou fungível, pois seria difícil imaginar a obrigação do locador de assegurar o gozo da coisa durante a vigência do contrato e o dever do locatário de a restituir no fim do contrato (que pressupõe devolução da mesma coisa e não de uma idêntica). 53 Discussão na doutrina que distingue 2 momentos:

1º. Entrega da coisa – é prestação de facere e de conteúdo positivo 2º. Assegurar o gozo da coisa – é prestação de conteúdo negativo pois basta a abstenção de atos

que colidam com esse gozo da coisa, não tendo de se continuadamente assegurar o gozo, uma vez que isso é uma decorrência da lei

MLP: não entra propriamente nesta discussão pois não entende o gozo como uma prestação. No entanto, entende que há um 2º momento em que não se tem de continuadamente assegurar o gozo da coisa. 54 Conversão Automática para o limite quantitativo em termos temporais que a lei estabeleceu.

➢ Solução do art. 1025º, in fine, não está inteiramente de acordo com a Redução da parte geral.

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• Este é o limite máximo do prazo inicial do contrato e não o limite de duração do contrato,

pelo que nos casos de arrendamento sujeitos a renovação forçada (art. 1054º) não há

nenhum impedimento em que o contrato de arrendamento tenha duração superior a

30 anos.

Arrendamento Urbano: lei admite contratos de arrendamento urbano com duração

indeterminada.

➢ Art. 1099º não poem em causa o art. 1025º pois esta previsão legal não constitui uma

contradição à preocupação essencial que subjaz ao art. 1025º - pois qualquer uma das

partes, no caso de duração indeterminada, pode unilateralmente e discricionariamente

por termo ao contrato (denúncia).

o Esse direito depende da observância de um determinado prazo de antecedência

– aviso prévio para o exercício do direito, sendo importante para a outra parte

organizar a sua vida.

3. RETRIBUIÇÃO – é um contrato oneroso pois das prestações do locador surge uma

contraprestação do locatário (de pagar a RENDA ou ALUGUER, art. 1038º/a).

➢ É uma obrigação pecuniária de quantidade, que se caracteriza pelo seu caráter

periódico.

Forma e Formação do Contrato de Locação Aluguer – forma consensual (art. 219º)

➢ Mas há casos em que se exige que seja celebrado por escrito (aluguer de veículos sem

condutor, art. 17º DL 354/86).

Arrendamento Urbano – forma escrita cujo documento tem de obedecer a determinadas

formalidades (art. 1069º, 1070º).

Capacidade para a celebração do contrato Art. 1024º

• Locação por menos de 6 anos – ato de administração ordinária, pelo que podem

celebrar este contrato todos aqueles que podem administrar os (seus) bens.

• Locação por mais de 6 anos – ato de administração extraordinária, pelo que se exigem

poderes de disposição sobre a coisa, somente podendo o proprietário, usufrutuário e o

fiduciário (ou procuradores destes com poderes especiais para o ato) celebrar este

arrendamento.

Locação na perspetiva do locatário: é ato de disposição?

Quanto ao locatário, a lei não toma posição expressa sobre a sua qualificação como ato de

administração ou disposição.

• ML – se não for celebrada por um prazo excessivo ou desproporcionado, pode ser

considerado como mero ato de administração.

• Cunha Gonçalves – quanto ao locatário é ato de mera administração, pois seja qual for

o prazo este só tem a lucrar com a locação

o Nesse caso, ao não se estabelecer o prazo consoante a lei, o negócio era nulo (contrário

a disposição legal imperativa) e depois teria de haver essa tal redução (art. 292º).

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• Galvão Telles – não é administração pois não se destina à mera frutificação de bens e

implica assunção de obrigações pelo locatário.

• Januário Gomes – ato de disposição se > 6 anos e ato de administração ordinária se < 6

anos.

• MLP – questão prévia que não é tanto de saber se é ato de administração ou

disposição, é sim se a pessoa para dispor o bem precisa de ser locatário

Problema de saber quem tem direito a locar

• Não só o proprietário, mas outras pessoas como os outros titulares de direitos pessoais

de gozo – usufrutuário, superficiário e etc.

• O próprio locatário pode locar: sub-locação

Legitimidade para celebrar contratos de locação não se cinge ao proprietário e são válidos e

eficazes.

➢ O problema é que o contrato caduca no termo do direito que está na sua base. Ex:

usufruto foi celebrado por 10 anos e o contrato de locação de tempo indeterminado,

caduca no fim desse usufruto.

E se alguém sem legitimidade celebra um contrato de locação?

➢ Seria nulo.

o Mas a lei vem dizer que o contrato é válido mas poderá considerar-se não

cumprido (art. 1034º). Considera-se não cumprido quando numa locação de

bens alheios o proprietário vem reinvindicar.

o Não se aplica a lógica da nulidade da compra e venda de bens alheios.

o Contrato não se considera incumprido se locatário conseguir aproveitar o gozo

do bem sem ser perturbado – não pode invocar que locador não tem

legitimidade, para evitar pagar a renda, se conseguir gozar do apartamento.

➢ Contrato é válido e eficaz inter partes mas isso não afeta o direito real do proprietário

(terceiro ao contrato).

Efeitos da Locação

OBRIGAÇÕES DO LOCADOR I. Obrigação de entrega – art. 1031º/a

Lei não concretiza o regime da obrigação de entrega no âmbito da locação pois não se justifica

instituir uma obrigação de custódia do locador em relação à coisa após a celebração do contrato,

uma vez que o locador responde sempre por vícios da coisa locada que datem do momento da

entrega, se não provar que os desconhecia sem culpa (art. 1032º/b) ou que os defeitos eram

conhecidos ou cognoscíveis pelo locatário (art. 1033º/a, b).

➢ Pode ser material ou simbólica.

➢ Existe se o bem não estiver em poder do locatário

II. Obrigação de assegurar ao locatário o gozo da coisa para os fins a que se destina – art. 1031º/b

Sendo o principal direito do locatário o gozo da coisa locada – como direito pessoal de gozo que

se estrutura com base numa obrigação do senhorio.

• Mas locatário tem posse sobre a coisa locada e pode utilizar as ações possessórias dos

art. 1276º e ss. CC, ainda que contra o próprio dono.

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• Esta obrigação pode implicar a necessidade do locador fazer reparações e outras

despesas necessárias à conservação da coisa locada (art. 1036º)

o MLP: na obrigação de facultar o gozo tem de estar implícita a manutenção da

coisa

Locador não é obrigado a assegurar o gozo contra atos de terceiro – limite para o locador.

➢ Se terceiro se instalar e etc., senhorio não é responsável por isso.

➢ Este exemplo mostra que não há nenhum incumprimento das obrigações do senhorio.

Romano Martinez:

OBRIGAÇÃO DE ENTREGA da coisa locada está associada com o DEVER DE ASSEGURAR O GOZO

DA COISA – destas obrigações que impendem sobre o locador advêm, em especial, 3 deveres

principais:

1. Entregar o bem sem vícios de direito nem defeitos que obstem à realização cabal do

fim a que a coisa se destina (art. 1032º e 1034º)

2. Locador deve abster-se de atos que impeçam ou diminuam o gozo da coisa

3. Locador está adstrito a realizar as reparações necessárias e pagar as despesas

imprescindíveis à boa conservação da coisa

III. Pagamento dos encargos da coisa locada – art. 1030º

ML: não parece ser possível admitir a derrogação desta disposição por convenção em contrário

das partes – “sem embargo” exprime claramente o cariz injuntivo da norma.

MLP: nada impede que as partes possam convencionar entre elas que é o locatário que tem

de pagar os encargos.

➢ Romano Martinez: concorda

Para efeitos desta disposição:

➢ Encargos = impostos prediais, taxas, prémios de seguro e encargos de condomínio.

Arrendamento Urbano: art. 1078º/1

• As partes estipulam por escrito o regime dos encargos da coisa locada.

o Onde aqui se podem incluir o pagamento de bens ou serviços relativos ao local

arrendado (que são contratados pelo responsável pelo seu pagamento – art.

1078º/4).

IV. Obrigação de Reembolso de Benfeitorias – art. 1046º/1

Locatário tem direito a ser indemnizado das benfeitorias necessárias que haja efetuado, bem

como a levantar as benfeitorias úteis, se tal puder ser efetuado sem detrimento da coisa.

➢ Se não tem direito à restituição do enriquecimento por despesas (art. 1273º).

o Locador paga porque recebe coisa valorizada em função de despesas realizadas

pelo locatário

Não tem direito ao levantamento de benfeitorias voluptuárias (art. 1275º/2) – remete para o

regime da posse de má fé

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Arrendamento Urbano: art. 1073º, 1074º

Realização de obras pelo arrendatário depende de cláusula do contrato ou autorização por

escrito do senhorio, exceto em situações de urgência ou mora do senhorio em que pode

proceder a realização de obras e tem direito a reembolso.

• Efetuando licitamente as obras terá direito no final do contrato a uma compensação por

essas obras – aplica-se o mesmo das benfeitorias realizadas por possuidor de boa fé (art.

1074º/5).

o Art. 1074º/5 – regime mais favorável pois arrendatário pode pedir

compensação nos mesmos termos que um possuidor de boa fé o pode fazer. Isto

porque a lei pressupõe que as obras são autorizadas pelo senhorio.

• Este regime pode ser derrogado por convenção das partes, em que se pode estabelecer

que o arrendatário não terá direito a qualquer indemnização pelas obras que venha a

fazer no prédio.

o As partes estabelecem o regime das benfeitorias (e normalmente estabelecem

que o senhorio não tem de pagar nada e depois o arrendatário devolve a coisa

como está) ou então vigora o regime das benfeitorias (o art. 1074º/5 remete para o

regime do possuidor de boa fé).

Em princípio o arrendatário pode fazer algumas alterações.

➢ Tem é de se apurar até onde vai o seu direito de fazer alterações no locado – art. 1073º

o São lícitas = não carecem de autorização do senhorio.

▪ Direito do arrendatário pode ser configurado de forma mais restritiva

ou ampla – pode haver contrato que diga que não pode haver alteração

nenhuma.

o Mas o regime supletivo permite ao locatário fazer algumas coisas pequenas.

Art. 1078º - torna inequívoco que as partes podem estipular o que lhes aprouver nesta matéria.

➢ As regras são supletivas e as partes podem estipular algo diferente.

V. Obrigação de Preferência

Na venda ou dação em cumprimento do prédio arrendado deve dar-se preferência ao

arrendatário – obrigação estabelecida em todas as modalidades de arrendamento.

➢ Arrendamento Urbano: art. 1091º

o Direito que beneficia de um modo de defesa especial – art. 1410º - ação de

preferência (pode afastar o comprador do imóvel e tornar-se ele o proprietário).

OBRIGAÇÕES DO LOCATÁRIO I. Obrigação de Pagamento da Renda ou Aluguer – art. 1038º/a

Obrigação principal e cujo regime geral se encontra nos art. 1039º e ss. e em relação ao

Arrendamento Urbano se encontra nos art. 1075º e ss.

FIXAÇÃO E ALTERAÇÃO DA RENDA OU ALUGUER: são as partes que convencionam o montante,

com algumas restrições legais no âmbito dos regimes especiais de arrendamento

Arrendamento Urbano

➢ Questiona-se até se o arrendamento se pode considerar validamente celebrado

se as partes nada estipularem sobre o montante da renda.

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

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➢ ML: renda não tem de estar determinada, no momento da celebração do

contrato, bastando que seja determinável.

Objeto da renda – art. 1075º/1 exige que seja prestação pecuniária periódica (art.

550º e ss.)55

➢ Montante pode ser objeto de alteração – art. 1077º - permite-se a

convenção de rendas escalonadas em que as partes determinam

previamente um incremento do valor da renda, ao longo da vigência do

contrato.

➢ Na ausência de estipulação a lei determina a atualização anual da renda (art.

1077º/2)

TEMPO DO CUMPRIMENTO: como a renda nunca constitui uma obrigação pura (art. 777º/1) e

sim uma obrigação periódica, haverá sempre que estipular o momento do seu vencimento,

podendo este resultar das disposições supletivas da lei.

• Geral – art. 1039º/1

• Arrendamento Urbano – art. 1075º/2 – estipula-se supletivamente, contrariamente ao

regime geral da locação, uma antecipação de renda.

o Ex: em fevereiro paga-se a renda de março.

o Renda destina-se a remunerar certo período no tempo. Mas partes podem

convencionar que essa renda somente é paga, relativamente a esse período,

muito mais tarde.

Art. 1076º - Antecipado em que sentido? Em relação ao momento de vencimento ou de

remuneração? ➢ Partes podem convencionar num contrato que a renda de maio de 1018 é paga em janeiro de

2018? Convenção relativa ao vencimento da renda e antecipa-se muito o momento desse

vencimento.

➢ Lei intenta que partes não possam convencionar uma grande dilação entre o

momento do pagamento e o momento que se visa remunerar.

▪ Se superior pode arguir-se a nulidade

➢ MLP: este artigo visa proteger o arrendatário de cláusulas que o possam

prejudicar

LUGAR DO CUMPRIMENTO

➢ Art. 1039º/1º - domicílio do locatário à data do vencimento (obrigação de colocação,

que derroga o disposto no art. 774º)

o Esta regra não costuma ser observada quanto ao arrendamento onde, por força

de estipulação ou dos usos, é comum estabelecer que o lugar do pagamento

seja no domicílio do senhorio.

MORA DO LOCATÁRIO: art. 1041º prevê regime específico

➢ Nada impede as partes de estabelecerem uma cláusula penal moratória56 para cobrir o

atraso no pagamento das rendas, mesmo em caso de resolução do contrato.

55 Sendo admissíveis cláusulas de pagamento de renda em moeda específica (art. 552º e ss.) ou em moeda estrangeira (art. 558º), ao contrário do que anteriormente dispunha o art. 19º/1 do RAU. 56 As consequências da mora existem na mesma mas sendo aquelas que as partes estabeleceram como cláusula penal e não as do art. 1041º

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

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GARANTIAS DE PAGAMENTO: obrigação de pagamento da renda pode ser objeto de qualquer

garantia que as partes venham a estipular para a hipótese de incumprimento pelo locatário.

➢ Forma mais comum é prestação de fiança, que se for prestada manter-se-á em princípio

durante todo o período de vigência do arrendamento, incluindo as suas renovações.

o Mas nada obsta a que o fiador apenas se obrigue pelo período inicial de duração

do contrato excluindo as renovações.

o Também pode ser garantia bancária e autónoma à primeira solicitação, mas não

é comum.

Está expresso para o Arrendamento Urbano – art. 1076º/2

➢ É caução de fonte negocial pelo que o art. 624º/1 admite que ela seja prestada por

qualquer garantia, real ou pessoal.

MLP: A obrigação principal é o pagamento, que visa remunerar o gozo. Mas depois há uma série

de obrigações acessórias.

II. Obrigação de facultar ao locador o exame da coisa locada – art. 1038º/b

Situação visa permitir ao locador controlar o bom estado da coisa e, eventualmente, suprir

deficiências ou exigir responsabilidade pelos danos a esta causados – também serve para o

locador se proteger contra eventual mau uso da coisa.

➢ Direito que tem de ser exercido em termos moderados, pois pode corresponder a uma

perturbação do gozo pelo locatário.

o Articula-se com a Obrigação do locador não perturbar o gozo da coisa, art.

1037º/1

o Locador não pode fazer uso desse direito/dever de examinar de forma a por em

causa o direito do locatário.

o Está sujeito aos limites do abuso do direito.

o MLP: direito do locador tem de ser delimitado de forma a interpretar-se que

desse direito resulta a perturbação mínima do direito do locatário e é apenas

um exame e não uma ingerência maior – é o mínimo necessário para defender

os interesses do locador e que perturbe minimamente o locatário no seu

uso/gozo da coisa.

III. Obrigação de não aplicar a coisa a fim diverso daquele a que ela se destina – art. 1038º/c

É frequente no contrato se determinar o fim a que se destina a coisa locada, com base no qual

se delimitam as possibilidades da sua utilização pelo locatário.

➢ O fim da coisa resulta de convenção das partes

➢ Se não for feito, vigora o art. 1027º que permite aplicar a coisa a quaisquer fins lícitos,

dentro da função normal das coisas de igual natureza.

o Art. 1027º, 1067º/2, 1092º - quanto ao tipo de utilização que pode ser dado ao

locado.

Arrendamento Urbano – art. 1067º/1 distingue apenas o arrendamento para fim habitacional

(art. 1092º e ss.) e o arrendamento para fim não habitacional (art. 1108º e ss. – onde também

se distinguem especificidades quanto ao comércio e às profissões liberais).

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IV. Obrigação de não fazer da coisa locada uma utilização imprudente – art. 1038º/d

É um dever de manutenção da coisa no mesmo estado em que foi recebida, ressalvando-se a

normal deterioração – art. 1043º/1

➢ Utilização prudente da coisa importa necessariamente a deterioração da mesma – é normal algum desgaste da coisa ligada ao uso da coisa.

o É inerente ao próprio uso da coisa, para os fins a que se destina. ➢ Se a coisa se deteriorar devido a uma imprudente utilização, a lei presume a

responsabilidade do locatário (art. 1044º).

o Estabelece presunção a quem se imputa a perda ou deterioração da coisa –

presunção de culpa do locatário.

Arrendamento Urbano – art. 1073º

➢ Obrigação de não fazer utilização imprudente não é violada se o locatário fizer algumas pequenas alterações/deteriorações

É obrigação que existe ao longo de todo o contrato – se violada pode dar origem a resolução do contrato.57

Lei não diz que locatário deve utilizar a coisa de forma prudente

• MLP: isso seria errado, pois locatário não está obrigado a utilizar a coisa. Ele usa se

quiser. Mas se utilizar, então tem de a utilizar de forma prudente.

V. Obrigação de tolerar as reparações urgentes, bem como quaisquer outras que sejam

ordenadas por autoridade pública – art. 1038º/e

Casos em que tal se impõe para evitar a deterioração da coisa locada.

➢ O locatário suporta essa perturbação no gozo da coisa em ordem a evitar maiores

riscos para o prédio.

Obrigação que se traduz numa ligeira compressão do direito do locatário.

➢ A lei aqui é descritiva, comparando com as disposições homólogas no comodato. O

direito do comodante é muito mais amplo que este aqui (pode perturbar mais o gozo).

VI. Obrigação de não proporcionar a outrem o gozo total ou parcial da coisa por meio de cessão

onerosa ou gratuita da sua posição jurídica, sublocação ou comodato, exceto se a lei o permitir

ou locador autorizar – art. 1038º/f

O contrato de locação é intuitu personae

➢ Locatário não pode transmitir o seu direito, sublocar a coisa ou fazer comodato. o Se locador não autorizar, locatário viola dever e sujeita-se a que haja resolução

do contrato. Se autorizado (no contrato), tem de transmitir ao locador que o fez.

➢ Há uma outra obrigação que é a da comunicação: art. 1038º/g o Se não o fizer sujeita-se à resolução do contrato.

Exemplo de caso em que a lei permite sem autorização: trespasse (art. 1112º)

Arrendamento Urbano – o subarrendamento deve ter consentimento escrito (art. 1088º/1)

57 E nisto se distingue da Obrigação de Restituir a Coisa – essa é obrigação que nasce, ou pelo menos que se vence, no fim do contrato e apenas se refere àquele momento.

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VII. Obrigação de comunicar ao locador, dentro de 15 dias, a cedência do gozo da coisa, sempre

esta seja permita ou autorizada – art. 1038º/g

Sem esta comunicação a cedência é ineficaz58 em relação ao locador e permite-lhe resolver o

contrato (art. 1083º/2/e para Arrendamento Urbano).

Mas há especialidades em relação a esta matéria: art. 1049º

• Significa que o locatário tem dever de comunicar a cedência, quando autorizada, mas se não o fizer, aquele que recebe o direito pode comunicar e então o locador já não pode pedir resolução ao locatário.

VIII. Obrigação de avisar imediatamente o locador, sempre que tenha conhecimento de vícios

na coisa, ou saiba que a ameaça algum perigo, ou que terceiros se arrogam direitos em relação

a ela, desde que o facto seja ignorado pelo locador – art. 1038º/h

Esta obrigação é imposta ao locatário em virtude de lhe ser atribuída a posse da coisa locada,

que lhe implica um dever de custódia mínimo da mesma, concretizando-se na imposição de

um aviso ao senhorio.

➢ Lei estabelece uma obrigação que permite ao locador ter conhecimento dos perigos a

que a sua coisa está sujeita, não estando em seu poder.

o Esse conhecimento serve para ele decidir o que melhor lhe aprouver em relação

à coisa.

o É para o locador poder tomar as medidas que entender adequadas face a um

perigo.

➢ MLP: parecido à gestão de negócios quando gestor dá conhecimento ao dominus de que assumiu a gestão.

Não há sanção mas estabelece que o senhorio deixa de responder pelos vícios da coisa locada

(art. 1033º/d derroga 1032º).

Relaciona-se com a OBRIGAÇÃO DO LOCADOR DE CONSERVAR A COISA

• CC não é muito claro quanto ao dever de reparar a coisa caso haja anomalia na mesma.

• Arrendamento Urbano é mais claro: obras ordinárias e extraordinárias competem ao

senhorio (art. 1074º)

Problema é que senhorio pode não faze ressas intervenções a que está por lei obrigado. ➢ MLP: problema prévio se há obrigação é resolvido, porque há essa obrigação no

Arrendamento Urbano. Problema posterior é quanto ao que se pode fazer para dar corpo a essa obrigação.

Para o cumprimento dessas obrigações, no âmbito do contrato de locação, seria muito moroso a propositura de uma ação de cumprimento. Tem de haver outra solução mais expedita:

• Lei introduz esquema no art. 1036º e permite intervenção do locatário sem ele ter de esperar pela intervenção do senhorio – arrendatário pode substituir-se ao senhorio no

58 Art. 1034º

• Consequências da falta de legitimidade do locador para a celebração de um contrato de locação: Contrato não é inválido e sim ineficaz.

o Há obrigação de não ceder o gozo da coisa, mas ele pode não ser inválido. o É sem dúvida ineficaz, mas não é necessariamente inválido.

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cumprimento de uma obrigação deste (intervindo até fisicamente numa coisa que é de propriedade alheia).

o Art. 1036º/1 – caso de mora do locador; ▪ Locatário pode realizar reparações urgentes59

o Art. 1036º/2 – não chega a haver mora; ▪ Locador não sabe o que está a acontecer pois não houve tempo de o

notificar para ele intervir. ▪ É importante que ele avise o senhorio ao mesmo tempo – para ser lícita

a ação do locatário. Isto porque é o locador que decide qual a solução que dá à coisa.

O locatário que agir ao abrigo do art. 1036º tem direito ao reembolso das despesas – e é o reembolso imediato (não tem de esperar pelo fim, como as benfeitorias). Arrendamento Urbano: art. 1074º/3, in fine – o que tiver gasto na reparação pode ser compensado na obrigação de pagar a renda

IX. Obrigação de restituir a coisa locada, findo o contrato – art. 1038º/i

Surge como consequência da natureza temporária do contrato de locação.

➢ Obrigação de Restituir a Coisa nas condições em que a recebeu e no termo do contrato. o No domínio da locação em geral, o locatário não tem de restituir a coisa nos

exatos termos em que recebeu se a utilização da coisa faz com que ela se deteriore ao longo do tempo.

▪ PL/AV: há casos em que decurso do tempo e exposição do bem aos fatores naturais leva a um desgaste e deterioração – nesses casos também não tem de devolver no estado em que resolveu.

Locatário pode restituir a coisa sem ser igual ao início se a deterioração da coisa for devida a uma deterioração prudente60. Arrendamento Urbano – art. 1081º

➢ Articulando com o art. 1073º/2 temos que o locatário tem de reparar as

alterações/modificações/deteriorações lícitas que fez no locado.

59 Para aferir o preenchimento deste requisito tem de se fazer ponderação entre desvantagem/prejuízo que locatário teria para resolução do problema em prazo normal de ação judicial e verificar se esse prejuízo é ou não aceitável.

➢ Afere-se também a importância da reparação para o uso da coisa. ➢ MLP: afere-se em função do interesse do locatário e o impacto que a falta dessa reparação

causa no exercício do seu direito

60 Articula-se com a Obrigação de Utilização Prudente de uma forma que se pode respeitar um dos deveres e não o outro.

➢ MLP: eles estão alinhados e termos de conteúdo mas não precisam de estar

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Proibições de Locação

Só existe uma única proibição específica de locação, que respeita ao arrendamento de bens do

incapaz a favor dos seus pais, tutor, curador e etc.

➢ Art. 1892º - sem autorização do tribunal (atualmente do Ministério Público, por força do

DL 272/2001) não podem os pais tomar de arrendamento, ainda que por intermédio de

hasta pública, os bens do filho sujeito ao poder paternal.

o Sem esta autorização, o arrendamento é anulável a requerimento do menor, até

um ano depois de atingir a maioridade ou ser emancipado ou, se entretanto

falecer, pelos seus herdeiros excluindo-se os pais – art. 1893º

Extingue-se o direito de anulação se tribunal confirmar o arrendamento – art. 1894º

Art. 1937º/b em relação ao tutor, que é extensiva ao curador por força do art. 156º, ao administrar

os bens, por força do art. 1971º/1.

➢ Também parece ser extensível ao produtor, sempre que este substitua o tutor (art.

1956º/b).

➢ Art. 1939º

Vicissitudes do Contrato de Locação

Transmissão da Posição Contratual do LOCADOR art. 1057º a 1059º CC A necessidade de tutelar a posição do locatário, em caso de transmissão da coisa locada a

terceiro, levou à consideração que esta transmissão não deveria afetar o direito do locatário,

estabelecendo-se assim uma transmissão contratual forçada da posição do locador para o

adquirente da coisa locada (= sucessão61 forçada na posição de locador)

➢ Princípio emptio non tollit locatum – art. 1057º CC

o Romano Martinez: transmissão da posição contratual do locador verifica-se

ipso ure sempre que se transmita o direito com base no qual foi celebrado o

contrato de locação.

▪ Situação do locatário subsiste, havendo tão-só uma alteração subjetiva

quanto à pessoa do locador.

o Locatário pode sempre opor o seu direito em relação a qualquer adquirente do

direito com base no qual foi celebrado o contrato, sujeitando-o a continuar com

ele o contrato de locação, mesmo que o adquirente desconhecesse totalmente

a existência desse contrato no momento em que adquiriu o bem.

Pressuposto do art. 1057º é apenas a aquisição do direito com base no qual foi celebrado o

contrato, independentemente da forma como essa transmissão se opere (por ato entre vivos ou

mortis causa).

➢ Se locador transmitir seu direito de propriedade sobre a coisa, transmite também o seu direito no contrato de locação.

61 MLP: Lei utiliza a palavra sucessão porque a transmissão é forçada. Não é um caso de cessão da posição contratual, pois o efeito translativo ou transmitivo é forçado e a lei estabelece independentemente da vontade das partes (do locatário)

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o O adquirente do direito de propriedade passa a ser parte no contrato de locação e tem de respeitar o direito do locatário, pois esse adquirente passa a ser o locador.

o MLP: Regra não é muito característica de direitos de crédito e sim dos direitos reais (que acompanham a coisa). Aqui o direito do locatário mantém-se e segue a coisa (que é transmitida).

Também no caso de constituição de um novo direito deve transmitir-se a posição de locador

para o novo titular no caso desse novo direito implicar a exclusividade do gozo da coisa locada.

Ex: constituição de usufruto.

• RM: Não se pode transmitir a posição de locador sem o direito que lhe é subjacente,

porém, nem sempre é necessário que haja a transferência do direito em cuja base o

contrato de locação foi celebrado, porque a transmissão da posição contratual pode

ocorrer em caso de constituição ex novo de um direito real.

Venda executiva do bem (art. 824º/2 não inclui a locação) ou alienação em processo de

insolvência (art. 109º CIRE) também não afetam o direito do locatário.

Objeto de transmissão: transmitem-se para o adquirente os direitos e obrigações do locador

respeitantes à execução futura do contrato

• Permanecendo na esfera do anterior locador os direitos e obrigações respeitantes ao

período locativo anterior à transmissão – as posições constituídas anteriormente

mantêm-se na esfera jurídica daquele que transmitiu o direito, e não aquele que se

tornou o novo locador.

Novo locador não pode reclamar o pagamento de rendas respeitantes a períodos de

tempo anteriores à transmissão, nem requerer a resolução do contrato com este

fundamento.

o Lei resolve o problema do direito a Rendas ou Alugueres que se vencessem posteriormente e se referem a períodos posteriores à data da transmissão – art. 1058º estabelece a inoponibilidade da liberação ou cessão de rendas ou de alugueres não vencidos ao sucessor entre vivos do locador, na medida em que tais rendas ou alugueres respeitem períodos de tempo não decorridos à data da sucessão.

▪ Quando rendas/alugueres referentes a períodos posteriores são pagas anteriormente, esse pagamento não é oponível – novo senhorio tem direito a essas rendas e pode exigir ao locatário.

▪ Não vale apenas para o pagamento de rendas mas também na modalidade de Cessão de Créditos Futuros. Essa cessão de créditos não é oponível ao sucessor.

▪ Art. 1058º apenas aplicável à sucessão entre vivos. o Se não estiver regulado no contrato, supletivamente, a transmissão da posição

só se refere a situações jurídicas que digam respeito a períodos posteriores à transmissão.

Sucessão na Posição de Locador Nos casos de morte do locador, os herdeiros do de cujus sucedem a este na relação de

arrendamento, que não é um contrato intuitu personae (art. 2024º).

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Transmissão da Posição Contratual do LOCATÁRIO Art. 1059º/2 remete para o regime geral dos art. 424º e ss., o que significa que esta transmissão

só pode ser realizada com o consentimento do senhorio, podendo este resolver o contrato se

a cessão for efetuada sem o seu consentimento (art. 1083º/2/e) – isto porque uma das

obrigações do locatário é não ceder o gozo da coisa.

• Caso tenha por objeto a casa de morada de família, a cessão da posição contratual do

arrendatário depende ainda do consentimento do seu cônjuge (art. 1682º-B/c)

Há casos em que essa transmissão da posição contratual do arrendatário não depende do

consentimento do senhorio.

1) Art. 1105º- casos em que existe arrendamento sobre uma casa que é casa de morada

de família

2) Art. 1112º- caso de trespasse62

➢ Garante que titular do estabelecimento comercial conserve e possa negociar o

valor desse estabelecimento comercial.

MESMO QUE PERMITIDA, deve ser comunicada ao senhorio no prazo de quinze dias (art.

1038º/g e 1112º/3, in fine CC), sem a qual essa transmissão será ineficaz em relação ao

senhorio, podendo este resolver o contrato (art. 1083º/2/e), a menos que tenha reconhecido

o beneficiário da cedência como tal ou que a comunicação lhe tenha sido efetuada por este

(art. 1049º).

Sucessão na Posição de Locatário Locação é contrato intuito personae quanto ao locatário, pelo que caduca com a morte deste.

➢ Admite-se, no entanto, convenção em contrário pelo que as partes poderão afastar esse

cariz intuitu personae, estabelecendo a transmissão por morte do direito do locatário.

62 Transmissão da propriedade de um Estabelecimento Comercial com caráter definitivo e unitário, por negócio entre vivos. Art. 1112º vem estabelecer exceção ao art. 424º - casos de trespasses de estabelecimentos instalados em prédios arrendados

➢ Não há necessidade de autorização do senhorio (nos termos do art. 424º) se houver um trespasse de um Estabelecimento Comercial (e agregado de elementos que enformam o Estabelecimento Comercial) que funcione em prédio arrendado.

o Só a transmissão da posição de arrendatário está excetuada das regras civis – dispensa de autorização só é válida para negociação sobre Estabelecimento (negociado como um todo embora seja possível retirar alguns elementos)

o As transmissões de dívidas e as restantes figuras são reguladas pelo CC – créditos podem ser englobados na transmissão do Estabelecimento e débitos também – art. 595º CC

▪ Quanto ao pagamento de dívidas anteriores à transmissão, não havendo autorização, o transmitente continua a ser responsável perante o cedido, em solidariedade com o transmissário, pelo pagamento das dívidas existentes à data da “assunção” pelo cedido da relação contratual com o cessionário.

o Esta exceção não e aplica aos contratos que têm natureza intuitu personae. ➢ Januário: Art. 424º CC não se mostra pensado em função da empresa e das realidades comerciais, as quais

clamam por uma maior flexibilidade quanto à “circulação do contrato” (característica do Direito Comercial)62 – o regime do art. 424º CC espartilha ou impede a negociação da empresa, o que dificilmente seria compatível com o principio constitucional de livre iniciativa e de organização empresarial, consagrado no art. 80º/c CRP.

o Cassiano dos Santos: art. 424º CC não se aplica no Direito Comercial pois a solução do Direito Civil não é conveniente para as relações comerciais

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Esse cariz intuitu personae é atenuado no âmbito do Arrendamento Urbano em que ocorre uma

comunicação do direito em relação ao respetivo cônjuge, nos termos gerais e de acordo com o

regime de bens vigentes (art. 1068º).

Há algumas situações previstas em que o direito do arrendatário se transmite por morte deste:

art. 1106º + 1107º

Não impede a oposição à renovação pelo senhorio nos termos do prazo do contrato (art. 1097º).

• Se for de duração indeterminada, a morte do arrendatário não afeta o direito do

senhorio a denunciar com a antecedência mínima de dois anos (art. 1101º/c).

• Para o comércio e indústria: art. 1113º

Sublocação – art. 1060º O contrato de sublocação encontra o seu fundamento num precedente negócio jurídico locativo,

pois o sublocador celebra o contrato de sublocação com base no seu direito de locatário, que lhe

advém do contrato primitivo.

• Sublocação é contrato subordinado, mediante o qual o sublocador, ao abrigo da sua

qualidade de locatário, proporciona a terceiro (sublocatário) o gozo de uma coisa,

mediante retribuição.

• Passam a coexistir dois contratos de locação sobrepostos, ficando o segundo negócio

jurídico dependente do primeiro.63

Engloba tanto o subarrendamento como o subaluguer, embora este último não tenha

relevância prática – conforme o bem (art. 1023º).

Sublocação pode ser total ou parcial – consoante sublocador conceda ao sublocatário todo o

gozo do bem locado ou apenas parte dele.

Em princípio é proibida: art. 1038º/f

➢ Consequências da violação da proibição: art. 1049º64 e 1088º. ➢ A não ser que haja cláusula no contrato de locação a permitir.

A sublocação exige o consentimento por escrito do senhorio e é proibida sem esse

consentimento (art. 1038º/f + 1088º).

• Apenas após a comunicação ou reconhecimento do sublocatário pelo locador ou o

reconhecimento (art. 1038º/g, 1049º, 1061º, 1088º/2) é que a sublocação se considera

eficaz em relação ao locador.

o Sublocação produz efeitos em relação ao locador por via do reconhecimento ou

da comunicação.

o Não sendo eficaz, locador pode resolver o contrato com o locatário (art.

1083º/2/e).

63 Romano Martinez: Não há substituições de partes no contrato (como na cessão) e coexistem 2 contratos e não há uma modificação subjetiva do primeiro. É também diferente da Hospedagem, do art.1093º/3 (+ art. 1093º/1/b). 64 O que significa reconhecer? Ter conhecimento da locação e tolerar a conduta do locatário após ser conhecida, por exemplo.

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Sebenta Contratos I – 2017/2018 DNB

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Aplica-se o regime da locação mas com algumas especificidades:

• limite na renda (art. 1062º);

• locador pode exigir do sublocatário a renda se tanto ele como o locatário estiverem em

mora (art. 1063º).

• Arrendamento Urbano65: art. 1089º

Direitos do sublocatário: perante o locador, os direitos do sublocatário não podem exceder os do locatário/sublocador (art. 1089º). Perante o locatário; os que resultem do contrato e da lei como direitos do locatário perante o locador. Direitos do locador: exigir rendas ao sublocatário (art. 1063º); substituir-se ao arrendatário na relação com o subarrendatário (art. 1090º).

Perturbações da Prestação no Contrato de Locação

Originárias

VÍCIOS DA COISA LOCADA Existência de vício na coisa locada corresponde a uma perturbação da prestação no contrato de

locação, dado que o locador é obrigado a assegurar ao locatário o gozo da coisa para os fins a

que esta se destina (art. 1031º/b) – não assegurando isto, o contrato considera-se não

cumprido (art. 1032º)66

Para desencadear responsabilidade do locador, o vício ou a falta de qualidade têm de resultar

de culpa sua (art. 798º), a qual se presume nos termos gerais (art. 799º).

• Art. 1032º/a – locador tem de provar que os desconhecia sem culpa

• Art. 1032º/b – locador tem de provar que o defeito posterior não foi culpa sua?

o Não, como é algo raro e difícil de conceber, compreende-se que seja o locatário

a demonstrar que o locador teve culpa na sua verificação.

Art. 1033º - casos em que o locador deixa de responder pelos defeitos da coisa

(Irresponsabilidade)

a) Conhecimento dos defeitos pelo locatário leva ao afastamento da responsabilidade

do locador, pois locatário aceita conscientemente celebrar o contrato de locação nessas

condições. ➢ O desconhecimento como fundamento da tutela do locatário; conhecimento, logo

desnecessidade de culpa.

b) Pois cabe ao locatário o ónus de verificar o estado da coisa, salvo se locador assegurar

a inexistência de defeitos ousar de dolo para os ocultar (uma vez que nesse caso o

locador tem responsabilidade específica por o locatário ter aceite o contrato nessas

condições). ➢ O desconhecimento como fundamento da tutela do locatário; conhecimento, logo

desnecessidade de culpa.

65 No arrendamento urbano, senhorio pode substituir-se ao arrendatário, mediante notificação judicial, considerando-se resolvido o primeiro arrendamento e passando o subarrendatário a arrendatário direto (art. 1090º/1) 66 Vício implica incumprimento do locador desde que verificados os requisitos positivos e negativos do art. 1032º, logo, resolução e responsabilidade civil. Mas também anulação por erro ou dolo (art. 1035º).

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c) É o locatário que coloca a coisa com vícios ou sem as qualidades necessárias à

realização do fim do contrato. ➢ Desconhecimento culposo, logo, sem tutela; salvo garantia ou dolo do locador.

d) Locatário está obrigado a avisar (art. 1038º/h)

Esses defeitos enquadram-se no regime geral do incumprimento – art. 1035º

➢ Mas não há obstáculos a que o locatário proceda à anulação do contrato por erro ou

dolo, caso estejam verificados os respetivos pressupostos.

ILEGITIMIDADE DO LOCADOR OU DEFICIÊNCIA DO SEU DIREITO Art. 1034º

a) Ilegitimidade do locador – remete art. 1024º

• Exa: locação de bens alheios, falta de capacidade de gozo, falta de poderes de

representação voluntária ou orgânica, locação pelo locatário

b) c) Deficiência do direito

• Exb: locador faz-se passar por proprietário, não o sendo; sobre bem incide ónus

que poderá determinar extinção dos direitos do locatário (TRC, 26/2/13)

• Exc: locatário com direito a sublocação garante ao sublocatário que o contrato

de locação celebrado por um prazo de 10 anos

Em qualquer destas situações considera-se o contrato como incumprido quando determinar a

privação definitiva ou temporária, do gozo da coisa por parte do locatário (art. 1034º/2).

A locação de bens alheios é válida – solução compreensível pois não estamos perante contrato

translativo de direitos, mas antes constitutivo de obrigações.

➢ Apenas quando locatário é privado do gozo da coisa é que pode reagir perante o locador,

mas a situação já não é de invalidade, mas antes de incumprimento do contrato.

➢ Nestes casos, o art. 1035º admite que o locatário pode também proceder à anulação do

contrato por erro ou dolo, nos termos gerais.

REGIME ESPECÍFICO DA LOCAÇÃO DE BENS DE CONSUMO O art. 1º-A/2 DL 67/2003 vem determinar que se aplica o regime das garantias nas vendas de

bens de consumo à locação de bens de consumo.

➢ Sendo uma locação de bens de consumo aplica-se, com as devidas adaptações, o regime

do DL 67/2003

Supervenientes

PRIVAÇÃO TEMPORÁRIA DA COISA LOCADA Relaciona-se com circunstância que diz respeito à própria coisa locada e não devido a situações do locatário. Ex: automóvel é furtado, em circunstâncias que não era possível evitar ou prevenir

➢ Art. 1037 – locador não tem de assegurar o gozo da coisa contra atos de terceiro Há privação de gozo, o que é perturbação do contrato de locação, mas tal não corresponde a nenhum incumprimento do locador – daí que este seja o exemplo que revele que este contrato providencia o gozo da coisa (opinião MLP)

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Ex: se locador é hospitalizado e não aproveita o gozo da coisa isso é problema dele, não há nenhum problema com a coisa locada Próprio locatário pode reagir contra essa perturbação do gozo da coisa

➢ Ações Possessórias – art. 1037º Reflexos na renda ou aluguer Ele tem na mesma que pagar renda ou aluguer durante período em que foi privado da coisa?

• Se pensarmos sinalagmaticamente, então não. o Se ele é privado do gozo por razões que não lhe dizem respeito, não tem a

obrigação de pagar a renda ou aluguer. o Art. 1040º

▪ Aplicável quer à privação quer à diminuição do gozo ▪ Consagra uma regra que é decorrente da noção de sinalagma.

o Art. 1040º/2 tem uma restrição ▪ MLP: levanta problemas quanto aos contratos de duração

indeterminada Direito à Resolução Lei também estabelece a possibilidade de resolução, em certos termos – art. 1050º/a

➢ Pode haver algumas dificuldades em articular este artigo geral com o regime do Arrendamento Urbano (art. 1083º)

VÍCIOS SUPERVENIENTES DA COISA LOCADA Locador tem obrigação de eliminar defeitos ou perda de qualidades que ocorra na coisa durante a vigência do contrato? E se esses defeitos decorrem de um desgaste normal? Decorre da obrigação do art. 1031º/b

• Implicar a necessidade do locador fazer reparações e outras despesas necessárias à

conservação da coisa locada (art. 1036º)

o MLP: na obrigação de facultar o gozo tem de estar implícita a manutenção da

coisa

MLP: CC não é muito claro mas deve concluir-se pela existência desta obrigação

➢ Mas no Arrendamento Urbano há consagração legal de conservação – não há dúvidas que é um dever do senhorio – art. 1074º

o Perante um defeito superveniente, no Arrendamento Urbano não há dúvidas (art. 1074º), e para a locação em geral também há a obrigação (do locador) de reparação devido a que só assim se garante o gozo da coisa ao locatário

Este art. 1032º/b diz que locador só é responsável por este efeito se ele ocorrer por culpa do locador.

➢ MLP67: este artigo refere-se apenas à indemnização e não à reparação do defeito (como PL / AV)

Reflexos na renda ou aluguer Locatário não tem de pagar a renda ou aluguer, ou tal tem de ser diminuído, pois vê o gozo da coisa prejudicado – art. 1040º

67 = PL/AV ≠ ML e Januário Gomes

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Direito à Resolução Locatário tem direito à resolução do contrato – art. 1050º/b

• Exige-se que seja um defeito grave para justificar a resolução.

• No Arrendamento Urbano há norma paralela (art. 1085º/5)

REGIME DA MORA NO PAGAMENTO DA RENDA OU ALUGUER – mora do locatário Caso em que é o locador que está a sofrer perturbações no contrato por não estar a receber a renda ou aluguer. Art. 1041º

• Locador a quem não seja paga a renda no tempo devido ele tem direito a indemnização o Mas esta indemnização é opção do locador, ele pode exigir somente os juros de

mora. Se o não pagamento for devido a uma razão que o legitima então não há mora. Dentro dessas razões podem estar as perturbações no gozo da coisa que o locatário sofre. Este direito à indemnização cessa nos casos do art. 1041º/2

➢ Moratória = tolerância legal, sem consequências Art. 1041º/3

• Locatário para fazer cessar a mora tem de pagar a renda em atraso e a indemnização

• Ideia de que locatário só purga a mora se pagar renda/aluguer + indemnização está também consagrada no art. 1042º/1

MORA DO LOCATÁRIO NO PAGAMENTO DE OUTROS ENCARGOS Designadamente no Arrendamento Urbano.

➢ Ex: conta da eletricidade pode ser paga pelo locatário. Art. 1078º/4, 5, 6, 7 Estes casos não estão sujeitos ao art. 1041º Se locatário não pagar, com a transformação da mora em incumprimento definitivo pode resolver-se o contrato.

Resolução do Contrato de ARRENDAMENTO URBANO Quanto à resolução do contrato de locação, no geral, esta é uma matéria difícil em que CC não é claro

➢ MLP: A dogmática civilista não está ainda muito desenvolvida quanto a estas relações contratuais duradouras.

o Lidar com problemas específicos de resolução de contratos de execução duradoura tem as suas particularidades.

Regime geral da resolução do contrato de locação: art. 1047º e ss.

• Das regras resulta claramente que pelo menos há dois fundamentos inequívocos para a resolução do contrato pelo locador:

o Locatário não paga renda ou aluguer (art. 1048º) o Locatário cede a outrem o gozo da coisa sem autorização do locador (art. 1049º)

Mas a lei não conferiu nenhuma taxatividade e não estabeleceu nenhum critério orientador

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No Arrendamento Urbano o legislador foi cuidadoso e estabeleceu um regime completo de resolução

• Compreende-se esta solução porque até 2006 havia regime vinculístico68, sendo importante estabelecer claramente quais as situações em que o senhorio podia por termo ao contrato.

• Ultrapassado esse período e com a liberalização do regime de arrendamento, a lei continua a ser cuidadosa.

No regime atual, art. 1083º tem o fundamento da resolução do contrato de Arrendamento Urbano

➢ Cláusula geral e sem enumeração taxativa. o A enumeração é meramente exemplificativa e não taxativa.

Art. 1083º estabelece os termos em que cada uma das partes pode resolver o contrato de arrendamento.

➢ Pode ser noutros termos (oposição à renovação, denúncia e etc.), aqui é somente a resolução.

Por este artigo perpassa a ideia que cada uma das partes só pode por termo ao contrato por via da resolução com fundamento no incumprimento da contraparte quando esse incumprimento torne inexigível a manutenção da relação contratual.

• Isto obriga a fazer juízo de prognose, que entra em conta com as consequências desse incumprimento para o futuro

o Pergunta-se a parte fiel deve ou não ter de suportar essas futuras consequências.

o Ex: locatário viola reiteradamente regras de sossego e de boa vizinhança. Locador avisa. É exigível ao locador esperar que locatário mude? Não é. É este juízo do que é esperável para o futuro que tem de se fazer para saber se é suportável esse risco e o incumprimento dos deveres do locatário.

• Exige-se que incumprimento seja de tal ordem que torne inexigível a manutenção da relação contratual

Extinção do Contrato

O contrato de locação está sujeito às causas gerais de extinção dos contratos – art. 1079º

O regime da cessação do contrato de Arrendamento Urbano tem natureza injuntiva pelo art.

1080º

➢ ML: Compreensível face à importância dos interesses em jogo.

Revogação Romano Martinez: Ato bilateral que carece do consentimento do locador e do locatário – por

vontade das partes pode extinguir-se o vínculo entre elas.

• Acordo que leva à extinção de um vínculo obrigacional = Distrate (Galvão Telles)

• Aqueles que constituíram um vínculo contratual podem a todo o tempo, com base num

princípio de autonomia privada, extinguir esse mesmo vínculo.

68 Locatário podia por sempre termo ao contrato e locador não podia por termo a esse contrato

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o Partes põem termo ao contrato celebrando um contrato extintivo,

perfeitamente admissível ao abrigo da autonomia privada (art. 406º/1)

Arrendamento Urbano: art. 1082º

➢ Sujeita a forma escrita (art. 1082º/2) quando não é imediatamente executado

(Revogação Real – ex: aqui estão as chaves, adeus) ou contenha cláusulas

compensatórias ou outras.

Resolução

RESOLUÇÃO PELO LOCADOR

Locador pode resolver o contrato com fundamento no incumprimento das obrigações do

locatário (art. 801º69), mas essa resolução é sujeita a certos condicionamentos.

➢ Não é todo e qualquer incumprimento do locatário que fundamenta a resolução – exige-

se um incumprimento grave.

Pode ser feita judicial ou extrajudicialmente – art. 1047º

Arrendamento Urbano: pode requerer-se uma Ação de Despejo, utilizando-se a via judicial (art.

1084º/2 + art. 14º NRAU)

Como é contrato de execução continuada, a resolução não opera retroativamente, pelo que

não obriga a restituir as prestações já realizadas (art. 434º/2).

Arrendamento Urbano: art. 1083º

➢ MLP: forte preocupação do legislador regular a Resolução no Arrendamento Urbano.

Nº1 é enigmático (MLP)

• Pois o contrato de arrendamento, como vem a ser admitido no art. 1083º/2, gera uma

relação contratual duradoura – que tem um fundamento diferente dos contratos de

execução instantânea, que são aqueles que estão nas regras gerais (art. 801º e ss.)

Nº2 é uma das regras que vem adaptar um fundamento geral de extinção do contrato, tendo em

conta uma relação duradoura.

• Não é todo o tipo de incumprimento que gera um direito à resolução do contrato – só

aquele que torne inexigível à parte fiel o continuar o contrato.

o Tem que se testar se a violação/incumprimento leva efetivamente a esta

situação de inexigibilidade da manutenção do contrato.

o Ex: Arrendatário dá festa até tarde e viola o art. 1083º/2/a – mas se acontece

só uma vez não dá fundamento para resolver o contrato

• MLP: O raciocínio que a lei obriga a fazer é pensar em que medida o acontecimento

pretérito se projeta na execução futura do contrato – isto é o que a lei reclama quando

fala em inexigibilidade do contrato.

o Pode ser reiteração ou gravidade.

69 Romano Martinez: quando o locatário não cumpra definitivamente a sua prestação, cabe ao locador o direito de resolver o contrato.

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Caráter exemplificativo (enumeração não taxativa e meramente enunciativa), pelo que se

poderão igualmente enquadrar outros casos de incumprimento pelo arrendatário como a

realização de deteriorações e obras no imóvel, a violação dos limites legais ou contratuais relativos a

hóspedes e a cobrança ao subarrendatário de renda superior à permitida e etc.

MLP: casos do art. 1083º/2 são situações de incumprimento e são suscetíveis de gerar um direito

à resolução pelo senhorio mas têm de passar pelo crivo de gravidade e tornar inexigível a

manutenção do contrato.

➢ Nalguns casos e difícil imaginar um incumprimento que só por si não gera direito à

resolução.

Intéprete-aplicador é exonerado de fazer essa ponderação (de verificar se o incumprimento

gera inexigbilidade) nos casos do art. 1083º/3 e 4

Terminologia legal não é a mesma (MLP: infelizmente), no caso do art. 1083º/5 – parece que a

sua verificação não tem de ter dos dois requisitos da inexigibilidade.

RESOLUÇÃO PELO LOCATÁRIO

É genericamente admissível nos casos de incumprimento da obrigação ou cumprimento

defeituoso – art. 801º/2.

➢ Art. 1050º CC

Arrendamento Urbano: art. 1083º/2 – sem os exemplos referidos pelas alíneas

➢ Esta resolução pode ser declarada pelo senhorio ou pelo arrendatário – artigo regula a

resolução por qualquer uma das partes.

COMO OPERA A RESOLUÇÃO?

Opera por declaração à outra parte – art. 436º/1 e 1084º/1

➢ Esta comunicação tem de obedecer a formalismos (art. 9º e ss. NRAU)

Esta regra geral tem um desvio – quando se trata de resolução de um senhorio que não seja

fundada por falta de pagamento do preço, ele tem de por uma ação judicial (art. 1084º)

Prazo de resolução no Arrendamento Urbano: art. 1085º

• Prazo para a resolução caduca a partir de um determinado prazo desde o

incumprimento.

• Lei impede que as partes estejam numa situação de incerteza.

Caducidade

ML: Extinção do contrato em virtude da verificação de um facto jurídico stricto sensu

Art. 1051º

a) Pressupõe que não se tenha verificado uma renovação do contrato, que é a regra no

âmbito do arrendamento (art. 1054º)

b) Aposição de condição resolutiva aos contratos de arrendamento sofre alguma limitação,

dado que a mesma não poderá ser usada para defraudar os fundamentos da resolução

do contrato, atenta a natureza imperativa dos mesmos (art. 1080º).

c) Sujeita a restrição pelo art. 1052º

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d) Excetuando os casos em que a lei admite

e) Contrato de locação fica sem objeto, manifestamente extinguindo-o

A permanência pelo arrendatário do gozo da coisa, pelo prazo de um ano e sem oposição do

senhorio, funciona como uma causa de renovação do contrato, mesmo após a verificação da sua

extinção – é uma sanação da caducidade – art. 1056º

➢ Restrito às hipóteses do art. 1051º/1/a, b, g

Arrendamento Urbano: art. 1091º/b estabelece um direito de preferência70 do arrendatário na

celebração de novo contrato de arrendamento em caso de caducidade do seu contrato por ter

cessado o direito ou terem findado os poderes legais de administração com base nos quais o

contrato fora celebrado, estabelecendo-se que esse direito apenas existe enquanto não for

exigível a restituição do prédio nos termos do art. 1053º (art. 1091º/2).

Cessação do direito com base no qual se estabeleceu a locação, o contrato de locação caduca

Por exemplo, art. 1089º

Se o contrato cessou, a partir de quando é que é devida a restituição da coisa?

Caducidade leva a que haja um dever de restituição imediata – mas lei estabelece que tem de

ser 6 meses, art. 1053º

➢ MLP: o contrato continua a vigorar por mais 6 meses desde o facto que gera a

caducidade

o Pode haver dificuldade com o art. 1081º (que diz que no Arrendamento Urbano

a restituição deve ser imediata).

o No caso de conflitos a lei especial (do Arrendamento Urbano) afasta a lei geral

(de caducidade).

Denúncia e Oposição à Renovação

• Denúncia – aplicável aos contratos de duração indeterminada onde a declaração do

senhorio a por termo ao contrato pode ocorrer em qualquer altura

• Oposição à Renovação – aplicável aos contratos em relação aos quais tenha sido

estipulado um prazo renovável, apenas podendo ocorrer no fim desse prazo e

impedindo que o contrato se renove por períodos subsequentes.

o Art. 1054º e 1055º CC

▪ Regime regra não é que findo o prazo o contrato caduca. Findo o prazo

o contrato renova-se.

Se partes nada disserem

➢ art. 1026º tem prazo supletivo para a locação, pelo que o processo de extinção da

relação locatícia para o futuro constitui normalmente um caso de oposição à renovação.

Arrendamento Urbano

PRAZO CERTO – art. 1095º e ss.

70 Preferência Legal: não pode haver renúncia genérica e antecipada a este direito – tal seria nulo pelo art. 280º - pois há razões de ordem pública subjacentes a esta opção do legislador.

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Se partes nada disserem

➢ art. 1094º/3 tem prazo supletivo para o arrendamento urbano

o Prazo igual para os contratos de arrendamento urbano com fins não

habitacionais – art. 1110º/2, desde a alteração de 2017

Renovação automática: art. 1096º

➢ A essa renúncia pode opor-se o senhorio (art. 1097º) ou o arrendatário (art. 1098º)

Qualquer das partes pode opor-se à renovação

Através da:

• Comunicação de uma das partes à outra – que diz que não quer que o contrato se

renove.

o Tem de ter uma antecedência determinada, devido ao investimento de

confiança na relação duradoura71

Este regime é aplicável, por remissão, ao contrato de arrendamento para fins não

habitacionais – portanto aplica-se a todo o regime do arrendamento urbano

MLP: No entanto, para os fins habitacionais as normas são imperativas.

➢ Para fins não habitacionais: art. 1110º - desvio/fuga à imperatividade pelo menos

quanto à oposição à renovação e à denúncia.

DURAÇÃO INDETERMINADA – art. 1099 º e ss.

➢ Ainda se aproxima bastante do regime tradicional dos arrendamentos vinculísticos, tendo

em conta os fundamentos de denúncia do arrendatário/inquilino – art. 1100º

➢ Também há possibilidade de denúncia pelo senhorio – art. 1101º e ss.

o Denúncia discricionária (art. 1101º/c) e denúncia justificada (art. 1101º/a, b)

▪ Governo está a pensar alterar o art. 1101º/c para 5 anos

• MLP esta alteração vai tornar menos atraente a celebração de

contratos de duração indeterminada.

• Senhorio não vai querer celebrar contratos de duração

indeterminada pois o prazo é muito longo.

71 MLP: Compreende-se que quando a Oposição à Renovação é feita pelo arrendatário os prazos sejam menores.