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CIDADES MÉDIAS: SEGREGAÇÃO E AS NOVAS FORMAS DE SOCIABILIDADE SCHMIDT, Naiara Conservani 1 1 UNESP/Marília-SP. Pesquisa financiada pela FAPESP Ao ouvir o termo “cidade do interior” é comum trazer à memória contextos relacionados a uma vida pacata de lugares quase bucólicos. Não é de se estranhar que imagens com essa configuração ainda permeiem o imaginário das pessoas, sobretudo daquelas que não vivem nesses espaços, já que as transformações sócio-espaciais das cidades do interior são fruto de processos recentes. A transformação de espaço rural em espaço urbano se consolidou nas cidades do interior do estado de São Paulo apenas na metade do século XX. Assim, além de se tratar de um processo de transformações espaciais recentes, trata-se também de um processo acelerado de consumo e de apropriações diferentes do espaço. O que antes se destinava as práticas agrícolas, principalmente ao plantio da cultura do café no contexto paulista, formando núcleos de ocupação e pequenos vilarejos ao longo das estradas de ferro construídas para escoar a produção, foi dando lugar às novas atividades econômicas e ao incipiente processo de urbanização. Tendo em vista essa dinâmica comum em algumas regiões do estado de São Paulo onde se formaram alguns dos atuais municípios que o compõe, pode-se analisar a paisagem 1 urbana de algumas cidades com traços bastante semelhantes no que se refere a sua composição espacial. Os municípios que se encaixam nesse tipo de configuração espacial marcadamente determinada 1 Utiliza-se como definição do conceito de paisagem a noção de construção e transformação social do espaço. “A paisagem é, em grande parte, uma construção material, mas também é uma representação simbólica das relações sociais e espaciais. A paisagem “coloca” os homens e mulheres em relação com os grupos sociais e os recursos materiais, bem como nos coloca como observadores em relação com homens e mulheres, as instituições e os processos sociais observados por nós. A paisagem é uma poderosa expressão das restrições estruturais de uma cidade. Com freqüência, o que observamos como paisagem aquilo que é construído, escondido e que resiste é uma paisagem do poder.” (ZUKIN, 2000: 106)

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CIDADES MÉDIAS: SEGREGAÇÃO E AS NOVAS FORMAS DE

SOCIABILIDADE

SCHMIDT, Naiara Conservani 1

1 UNESP/Marília-SP. Pesquisa financiada pela FAPESP

Ao ouvir o termo “cidade do interior” é comum trazer à memória

contextos relacionados a uma vida pacata de lugares quase bucólicos. Não é

de se estranhar que imagens com essa configuração ainda permeiem o

imaginário das pessoas, sobretudo daquelas que não vivem nesses espaços, já

que as transformações sócio-espaciais das cidades do interior são fruto de

processos recentes.

A transformação de espaço rural em espaço urbano se consolidou nas

cidades do interior do estado de São Paulo apenas na metade do século XX.

Assim, além de se tratar de um processo de transformações espaciais

recentes, trata-se também de um processo acelerado de consumo e de

apropriações diferentes do espaço.

O que antes se destinava as práticas agrícolas, principalmente ao plantio

da cultura do café no contexto paulista, formando núcleos de ocupação e

pequenos vilarejos ao longo das estradas de ferro construídas para escoar a

produção, foi dando lugar às novas atividades econômicas e ao incipiente

processo de urbanização.

Tendo em vista essa dinâmica comum em algumas regiões do estado de

São Paulo onde se formaram alguns dos atuais municípios que o compõe,

pode-se analisar a paisagem1 urbana de algumas cidades com traços bastante

semelhantes no que se refere a sua composição espacial. Os municípios que

se encaixam nesse tipo de configuração espacial marcadamente determinada

1 Utiliza-se como definição do conceito de paisagem a noção de construção e transformação social do

espaço. “A paisagem é, em grande parte, uma construção material, mas também é uma representação

simbólica das relações sociais e espaciais. A paisagem “coloca” os homens e mulheres em relação com

os grupos sociais e os recursos materiais, bem como nos coloca – como observadores – em relação com

homens e mulheres, as instituições e os processos sociais observados por nós. A paisagem é uma

poderosa expressão das restrições estruturais de uma cidade. Com freqüência, o que observamos como

paisagem – aquilo que é construído, escondido e que resiste – é uma paisagem do poder.” (ZUKIN, 2000:

106)

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pela presença da cultura do café e da construção da estrada de ferro como

elementos atrativos para a população e seu desenvolvimento econômico são

Araraquara, Bauru, Jaú, Marília, São Carlos, Limeira, Piracicaba e Rio Claro.

(Landim, 2004) 2

Segundo Landin (2004), determinantes como o conceito cultural de valor

estético, bem como o referencial de moderno ligado a padrões de urbanização

de grandes cidades, estão presentes na forma de organização espacial dessas

cidades, de maneira tal que a disposição de elementos importantes como o

shopping Center, a área verticalizada, os condomínios fechados, a rodoviária,

por exemplo, possuem similaridades quando analisados.

Tal fato, mais que uma análise da paisagem urbana como fenômeno

baseado em determinantes econômicos, reflete a presença de símbolos e

significados no processo de desenvolvimento urbano. Desse modo, trazer a luz

esses elementos suscita também a necessidade de pensar o local como um

lugar inserido em um contexto que se relaciona com outras experiências e

realidades.

Isso porque o incipiente processo de urbanização das cidades trazidas

por Landin (2004) mostra-se profundamente inserido e carregado de processos

sócio-espaciais e, também, culturais que incorporou e incorpora elementos

extra-locais, como o modelo de desenvolvimento da cidade de São Paulo e de

outros grandes centros que representam simbolicamente aquilo que é

moderno.

A paisagem da cidade se compõe além da mera distribuição de seus

elementos físicos. Constitui-se também dos usos e significados que os

indivíduos fazem do espaço urbano. Assim, o ambiente é manipulado para que

nele se realizem ações esperadas. Do mesmo modo, ele é configurado para

responder às demandas que nem sempre estão ligadas ao seu uso, mas

também a seu não uso, ou para o uso de determinados sujeitos em específico.

Esse tipo de organização sócio-espacial é visualmente disponível em

quase todas as cidades brasileiras. As avenidas largas da cidade destinadas

2 A cidade de Marília não é analisada por Landim, sua presença no grupo das cidades paulista estudadas

por ela se deve as análises anteriores (ver SCHMIDT, 2009) que mostraram características que a coloca

como uma cidade do interior inserida no contexto de urbanização das demais.

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ao rápido trânsito de automóveis e ônibus retiram o pedestre como

protagonista da cena, pois não é um espaço destinado a sua apropriação. 3

Assim como o centro da cidade e a presença dos calçadões destinados ao

comércio se mostram como o lugar do pedestre consumidor e um empecilho ao

automóvel. O shopping Center se apresenta como o espaço do consumo e do

lazer que determina quem e de que forma irá vivenciá-lo.

Desse modo, segundo Landim (2004) a paisagem das cidades do

interior paulista mostra-se homogênea devido aos aspectos econômicos

relacionados à sua formação e aos aspectos sócio-culturais relacionados à

existência de modelos de desenvolvimento e de elementos físicos urbanos

enquanto símbolos.

As transformações ocorridas na cidade trouxeram à sua paisagem novos

elementos, os quais implicam novas experiências de seus habitantes com este

espaço. A presença do shopping, por exemplo, com seus corredores e praças

de alimentação se coloca como um espaço cenográfico que copia as funções

da rua e da praça, entretanto, conferindo-lhe especificidade: o conforto e a

segurança.

O mesmo pode-se se encontrar nos condomínios fechados e nos clubes

particulares. Espaços esses que mesmo sendo relativamente recentes já se

mostram incorporados à experiência urbana, e sua forma de utilização restrita,

que confere segregação social, não suscita estranhamentos, mas é de certo

modo, considerada uma condição óbvia.

Segundo Landim (2004) a cidade se organiza entorno daquilo que se

mostra enquanto símbolo de status, representante do poder econômico. As

cidades do interior paulista tiveram na estação ferroviária o representante da

modernidade que viria com a estrada de ferro. Dessa maneira, as recentes

transformações vão trazendo e incorporando novos símbolos e se

reorganizando a partir deles.

Se no passado, a referência era a estação ferroviária como símbolo do

desenvolvimento e da entrada e elementos da modernidade na paisagem

3 Modelo de organização que segue os padrões urbanísticos haussmanniano da cidade recortada pelas

largas avenidas.

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urbana do interior, hoje as referências possuem outros representantes que,

como tais, re-configuram a paisagem. Se antes o espaço do entorno da

estação era o mais disputado entre aqueles que queriam “morar bem”, e era

visto como o lugar do desenvolvimento do núcleo urbano, composto pelos

casarios e raros sobrados da cidade. Hoje os lugares cobiçados são outros e

os símbolos de desenvolvimento também.

É comum em cidades de porte médio a referência à presença das

lanchonetes McDonald´s e de shopping como “medidores” do nível de

desenvolvimento da cidade. Falas como: “lá é uma cidade desenvolvida, tem

shopping e McDonald´s” são comuns em cidades do interior. Assim, como

outros, esses são os elementos contemporâneos que são lembrados para

ressaltar os aspectos da modernização local.

A presença cada vez maior de componentes urbanos que não possuem

uma relação com o local, como é o caso das grandes lojas e construções

padronizadas como o shopping, por exemplo, torna claros os contornos de

experiências urbanas contemporâneas que têm como possível as relações

descoladas do local.

Esse tipo de relação é intensificado pela tecnologia da informação e

pelos meios de comunicação, que tornaram possível a virtualidade da vida, o

que possibilitou extrapolar barreiras físicas e ter contato com realidades outras.

Tal fato torna possível a identificação com modos de vida, elementos da vida

cotidiana e experiências de outros lugares.

De tal modo, pensar o lugar hoje se mostra como uma tarefa mais

complexa do que apenas compreender uma localidade de maneira isolada. É

preciso considerar suas relações extra-locais e as interferências destas nas

relações sócio-espaciais e aos novos significados dados ao lugar e as

experiências que ele torna possível.

A constante reorganização da cidade segundo modelos adotados de

grandes centros urbanos evidencia a existência de padrões de consumo do

espaço, algo que está além das necessidades e particularidades locais. As

paisagens homogêneas encontradas em cidades do interior de São Paulo,

assim como entre tantas outras, colocam a questão da sobreposição de um

padrão estético a identidade local. Desse modo, “a falta de identidade é, na

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verdade, uma identidade. A identificação de uma cidade com outra tem por fim

colocar-se dentro de uma concepção corrente de modernidade e de boas

condições de vida.” (LANDIM, 2004: 41)

Diante disso, a configuração espacial das cidades médias paulistas e

seu processo urbano possuem relação com uma forma de habitar urbana que

não é exclusivo da sua localidade, o que promove ambivalências tanto

espaciais quanto sociais como características desse processo.

Se antes essa localidade era tida como o espaço do caipira, este

enquanto o sujeito da cultura rústica que se organizava na coletividade e que

tinha sua sociabilidade formada pela religiosidade, pelas festas de vila. O

sujeito que saiu do campo e levou para a cidade o modo de vida rural.4 O

“caipira” contemporâneo não se encontra no isolamento que esta localidade o

imprimia. Hoje seu isolamento é fruto de um processo que traz novos sentidos

e transforma a cultura do interior.

O modo de vida urbano não é algo específico do lugar e, também, não

se encontra na tradição do povo do interior que tem suas raízes no campo.

Assim, o modo de vida das cidades do interior mostra-se particular no sentido

de que incorpora modos de vida da metrópole ao mesmo tempo em que ainda

preserva modos de vidas locais. E é nessa coexistência que seu processo de

urbanização possui singularidade.

A cidade enquanto o lugar da dinâmica econômica e da efervescência

cultural é o símbolo da entrada em um novo momento. A cidade é o espaço

controlador da vida econômica, é o espaço onde se cria padrões de

comportamento que interfere e transforma a cultura. O urbano é mais que

espaço é modo de vida, é cultura. Segundo Wirth (1973) o grau urbano do

mundo não pode ser medido pela proporção da população que habita o espaço

das cidades, mas através do nível de influência que esse espaço possui na

organização da vida e do trabalho.

Para ele, o modo de vida urbano está relacionado à heterogeneidade

que o espaço da cidade contém como principal característica. A diferença

4 Referência ao caipira analisado por Antonio Cândido. Ver CÂNDIDO, Antônio “Os Parceiros do Rio

Bonito”, 2001.

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constitui o fundamento da cidade, pois esta se estabelece e toma corpo em

resposta as demandas industriais e, desse modo, a dependência entre seus

habitantes para a satisfação de suas necessidades, torna necessário a

associação de pessoas de forma muito maior do que ocorria no meio rural. A

fragmentação é uma estratégia essencialmente urbana. A fragmentação das

especializações profissionais, a fragmentação do espaço e a fragmentação das

relações dão ordem ao conjunto urbano, assim como dão ao espaço da fábrica.

Assim, têm-se segundo Wirth (1973), as relações sociais

caracteristicamente impessoais, transitórias e segmentárias como uma forma

de reserva, uma estratégia de relacionamento dentro de um contexto de

multidão. Desse modo, o superficialismo e a racionalidade das relações sociais

urbanas se relacionam com o contexto de produção da cidade. O espaço da

indústria, a presença da tecnologia e dos meios de transporte impõe um novo

tempo aos habitantes da cidade, o qual cada um deve dar conta.

Enquanto relações racionalizadas, as relações sociais urbanas

diminuem o nível de interação e espontaneidade entre os sujeitos, e possibilita

sua emancipação, pois o controle do coletivo também se torna menor.

Contudo, a emancipação do sujeito do coletivo ao mesmo em tempo que o

liberta, traz, no contexto urbano de interdependência, alto grau de instabilidade.

Diante disso, a cidade se mostra como o lugar da emancipação e da

insegurança ao mesmo tempo.

A experiência urbana imprime no indivíduo um conjunto de sentimentos

que o trazem para a experiência individual as ambigüidades que essa forma de

organização sócio-espacial contém em si.

Assim, o mundo urbano transforma as formas de sociabilidade e

interação. Se a superficialidade é a forma de interação mais “adequada” a

urbanidade, por não implicar em grande demanda de tempo e contato, algo que

já se apresenta com dificuldade nesse contexto, o reconhecimento visual se

mostra como uma alternativa a comunicação, segundo Wirth (1973).

A sensibilidade da leitura dos artefatos se apresenta como uma solução

para a comunicação com o ambiente e com os demais. A cidade do tempo

acelerado traz a necessidade de que a comunicação também se altere, sendo

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mais rápida e eficiente. E, desse modo, a comunicação visual se impõe e dá

voz aos objetos.

É na cidade que a padronização dos prédios, das roupas, dos

comportamentos se intensifica – utilização de uniformes nas fábricas e escolas,

padrões de materiais nas construções, padrões de consumo entre as classes.

Pois, espaços que não contribuem ou que impedem a interação social

de maneira próxima, ou seja, espaços que produzam relações distanciadas,

seja por motivos referentes a segurança, ao movimento acelerados das

pessoas (locais de passagem), por serem voltados para o privado e não para o

público (prédios, espaços cercados, condomínios fechados, etc.) impossibilitam

o ato de conhecer o outro, impossibilitam as conversas entre vizinhos, as

visitas, as brincadeiras das crianças nas ruas. Assim, as formas de interação e

contato passam por transformações, colocando como mediadores para o

conhecimento e reconhecimento do outro alguns signos, os quais passam a ter

um nível de importância cada vez maior nesse processo, pois dentro das

limitações de contato se mostram como meios de comunicação possíveis no

ambiente da cidade. Assim, a casa, o carro, o bairro onde mora, os locais de

lazer freqüentados, as roupas que veste são utilizados como formas de

identificar o outro.

A dinâmica da cidade contemporânea é a dinâmica do consumo e,

nesse sentido, a arquitetura é incorporada pela lógica da produção de valor, o

que abre espaço para criações estéticas e usos simbólicos que carregam

consigo signos5 de prestígio, sucesso, conforto, distinção, etc.

Segundo Bourdieu isso se dá, pois as condições materiais de existência

contém em si um quadro ético e estético que é responsável por exprimir as

preferências de grupos sociais distintos, o que é a forma, também, de

expressar as distinções simbólicas. Desse modo, para ele:

“Às diferentes posições no espaço social correspondem estilos de vida,

sistemas de desvios diferenciais que são a retradução simbólica de

diferenças objetivamente inscritas nas condições de existência. As práticas

5 Emprega-se aqui o termo signo na perspectiva de Bourdieu (2004) dentro da noção de campo utilizada

por ele na descrição de seu conceito de poder simbólico. Diante disso, o signo é aquilo que contém em

si elemento simbólico de distinção e classificação daquilo que se mostra adequado ou não em um

código de valores estabelecidos dentro de um campo de relações de poder.

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e as propriedades constituem uma expressão sistemática das condições de

existência (aquilo que chamamos de estilo de vida) porque são o produto do

mesmo operador prático, o habitus, sistema de disposições duráveis e

transponíveis que exprime, sob a forma de preferências sistemáticas, as

necessidades objetivas das quais ele é produto.” (BOURDIEU 1983: 82)

Desse modo, a cidade é o lugar de produção de bens simbólicos e de

bens materiais, através da interação de diversos agentes sociais. Para

Lefebvre (1969), no que ele chama de pós-contemporaneidade, há a noção de

predominância do espaço, pois todas as formas de produção são organizadas

espacialmente, assim como, há a produção do espaço. Frente a isso, para ele,

o espaço reflete e comunica a cultura, é marcado pelas intencionalidades, e

pelos significados dos bens simbólicos.

Destarte as cidades contemporâneas atravessam um processo de

estetização que, mais do que construção de objetos materiais está-se

produzindo também signos. Nunca foi tão importante mostrar-se através

desses signos como hoje, pois o contato nunca foi tão distanciado como agora.

Talvez por isso a presença tão forte das discussões sobre padrões (moda,

indústria tecnológica e automobilística, arquitetura, etc), das definições do que

é ou não “bom gosto”, originalidade, e estilo estão presentes na mídia de forma

muito marcante e se tornando cada vez mais especializado. Em um mundo

onde tudo se torna fast, inclusive as relações sociais, aquilo que é visualmente

compreendido de forma rápida ganha uma valorização imediata.

A análise de With se refere ao contexto de urbanização dos Estados

Unidos do início do século XX, processo já consolidado que imprimiu novas

características à vida da população. Não perdendo de vista o contexto, as

características desse processo se verificam hoje em cidades médias

brasileiras, juntamente com a fuga das indústrias dos grandes centros e a

incorporação de novas tecnologias e transportes. Passa agora a ser a vez da

experiência urbana destes lugares, entretanto, o processo não se mostra

exatamente igual ao de um século atrás. Pois, o descolamento do espaço e o

encurtamento do tempo intensificaram-se e, consequentemente, as

consequências nas relações sociais possuem impactos outros.

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A cidade média continua a ser um lugar onde o diferente chama a

atenção dos olhares e não passa despercebido, entretanto, é ao mesmo tempo

um lugar onde a individualidade e as relações ego centradas, que promovem

distanciamentos, e as relações de mínimo contato, também se fazem notar. A

percepção de algumas mudanças como estas na vida cotidiana desses lugares

chamam a atenção para a presença de novos comportamentos e novas formas

de interação social.

As mudanças na forma de habitar verificadas nessas paisagens são

elementos significativos do processo de transformação da vida urbana no

interior. Se, segundo Benjamin (1983), habitar é deixar rastros, ou seja, é

através da experiência com o corpo de sentir e vivenciar o espaço implicando

nele marcas, o habitar a cidade não fica restrito a casa, mas está nos trajetos e

percursos do dia-a-dia, nas experiências da casa, do bairro. Habitar é imprimir

transformações em todas essas dimensões, o público, o privado, o local e o

global.

O conhecimento dos diferentes cantos da cidade e o reconhecimento do

lugar da habitação se constrói nas ações cotidianas e nos trajetos: o caminho

até a escola, até trabalho, a ida a padaria do bairro, etc. Na medida em que a

cidade se fragmenta – em decorrência da impossibilidade de apreendê-la por

completo e da emergência de lugares de uso específicos e restritos.

Assim emerge no espaço da cidade a noção de “pedaço” e de “circuitos”

que podem ser compreendidos em sua materialidade, ou seja, na presença de

espaços de acesso restrito, quanto na subjetividade da classificação daqueles

que pertencem ao pedaço e aqueles que não pertencem, por apresentarem

condutas e padrões que distingue os de dentro e os de fora.6 Desse modo o

reconhecimento e o sentimento de pertencimento ficam restritos as diferentes

centralidades que vão emergindo no espaço da cidade.

6 Utiliza-se aqui a categoria “pedaço” no sentido trabalhado por Magnani (2002), ou seja, uma categoria

que é determinada pelo espaço, mas que, entretanto, se apresenta como um espaço intermediário

entre a casa e a rua, onde se reconhecem portadores dos mesmos símbolos e modos, o que não os

colocam como desconhecidos, mas ao mesmo tempo não estão uma relação próxima de familiaridade. E

a categoria “circuito” por ela conseguir compreender as práticas de consumo e culturais que aproxima

sujeitos com estilo de vida semelhante.

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Diante disso, a convivência com o sentimento de desconfiança torna-se

uma característica do habitante da cidade, pois a experiência da troca ganha

um caráter de desconforto e de agressão, na medida em que o outro é na

maior parte das vezes o desconhecido, do qual se reconhece apenas aquilo

que está inscrito em seu corpo e que pode ser lido: suas roupas, sua conduta,

onde se encontra. Frente a isso, elementos materiais e subjetivos da ação do

sujeito são utilizados como instrumentos de comunicação na impossibilidade do

estabelecimento da intimidade.

Diante da incorporação desse modo de vida no contexto da cidade

média a análise das transformações acerca das formas de sociabilidade que

nelas se apresentam hoje se mostra como significativa para a compreensão

das particularidades desse processo de urbanização. Pois, ao mesmo tempo

em que se verificam comportamentos padronizados, deparamos com

resquícios do passado que imprime outra cara a realidade experimentada.

A emergência de espaços privados destinados ao uso coletivo na

paisagem da cidade se relaciona com novas demandas surgidas nesse

processo acelerado de urbanização.

Segundo Zukin (2000) a presença desse tipo de empreendimentos

imobiliários que se dissiparam pela paisagem urbana se liga ao que ela chama

de “paisagem pós-moderna”, a qual consiste, segundo ela, na experiência de

dissolução e redefinição de artefatos da tradição. Trata-se de uma nova relação

de consumo visual do espaço e do tempo que está além da lógica puramente

industrial.

Assim, muitos projetos buscam trazer em seus materiais publicitários a

oferta da reconstrução a cidade de outrora, nos quais comumente possuem o

slogan “um novo conceito de morar bem”. O mercado vende assim a promessa

de tornar possível reviver formas de sociabilidade de pequenas comunidades,

onde todos se conhecem e sentem-se inseridos no grupo, associando essa

forma de sociabilidade a um espaço controlado e construído, onde é

descartado a casualidade e os imprevistos.

Esse conceito de “morar bem” trazido por esses empreendimentos

sempre trazem como padrão estético a presença de espaços verdes que

evocam uma antiga vida onde o contato com a natureza era possível ao

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mesmo tempo em que traz os dispositivos de segurança como elementos de

sua composição estética que tem na seletividade, no controle e na vigilância

elementos de distinção e status que lhe confere valor.

Os projetos voltados aos condomínios fechados e a reutilização de

regiões históricas das cidades comercializam esse tipo de ideia. Chamando os

habitantes da cidade a reviver antigos espaços que se encontravam

abandonados antes de sua reutilização, bem como a desfrutar da qualidade de

vida junto aos seus vizinhos em espaços de moradia e lazer. Essa cidade

transformada e vendida pelos empreendedores urbanos só pode se realizar e

se manter através do controle e da vigilância que imprime uma marca de

segregação.

Para ela o que descreve esse fenômeno é o conceito de liminaridade, ou

seja, a transformação que torna possível a passagem de um status para outro,

do público para o privado, do tradicional para o pós-moderno, do global para o

local. Diante disso, a liminaridade constante dificulta a formação de uma

identidade espacial.

A liminaridade se constitui, portanto, como o lugar que situa essas

transformações na experiência vivida. Por esse motivo, a análise da paisagem

urbana permite compreender esses processos e verificar as mudanças além da

experiência individual, mas através das representações coletivas e das práticas

culturais.

Zukin (2000) utiliza-se do conceito de gentrification para compreender

esse processo de transformações das paisagens das cidades, entendendo-o

enquanto processo de enobrecimento do espaço que transforma seu antigo

uso – ocupação pela classe trabalhadora – em uso para a elite urbana, que se

apropria dele ou para habitar, para consumir cultura e lazer. Promovendo,

desse modo, a mudança da antiga população e da paisagem. Trata-se de

padrões políticos e culturais de ocupação do espaço.

Para Zukin (2000) esse processo está atrelado ao consumo visual das

cidades, na ação de investidores imobiliários e do poder público em converter a

paisagem em atrativo para novos investidores e consumidores/habitantes

específicos. De tal maneira que redefinem o significado social de um lugar e

reforçam padrões de consumo e de produção sócio-espacial.

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Nas cidades médias do interior esse processo parece se ligar a negação

do passado rural, talvez por concebê-lo como símbolo de atraso e de modos de

vida rústicos, sendo os padrões de consumo e produção do espaço pós-

moderno muito bem recebidos. Assim, políticas de enobrecimento das regiões

centrais da cidade não estão voltadas, nas cidades médias, para a restauração

de prédios antigos, mas para demolição e construção de prédios modernos.

Diferentemente do que Zukin (2000) descreve das cidades como Nova York e

Londres, por exemplo. Entretanto, políticas públicas com parcerias privadas

voltadas para ações de enobrecimento são vistas em algumas capitais

brasileiras como São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Salvador, que mais que

enobrecimento elas possuem caráter também higienista.

Para Leite (2007) a noção de enobrecimento no Brasil está mais

fortemente vinculada à diferenciação econômica do que apenas no status em si

mesmo. Ele aponta para o fato de que as políticas públicas, sobretudo urbanas,

confundem cidadão com consumidor e realiza transformações no espaço

urbano voltados mais para o consumo do que para a vida pública.

Transformando a cidade no lugar do consumo e não da cidadania.

Diante disso, para ele, a sociabilidade urbana é perpassada pelas

práticas de consumo, entendendo estas enquanto “parte das interações sócio-

culturais”.7 Pois, a realidade objetiva e a dimensão simbólica não se encontram

isolados, mas apresentam-se em uma relação de complementaridade.

O processo de enobrecimento trabalhado por Zukin (2000) e retomado

por Leite (2007) são estruturantes de novas formas de sociabilidade urbana

marcadas pela crescente necessidade de homogeneização social como

elemento importante para o sentimento de segurança.

A presença cada vez mais comum de clivagens entre os espaços

habitados pela classe média e alta e os bairros da classe trabalhadora

evidenciam esse processo de fragmentação da cidade que configura ou espaço

urbano entre as áreas de visibilidade e prestígio social e as áreas da

precariedade.

7 Referência à Canclini 1996.

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Um tipo de construção que representa de forma bastante completa a

separação e a distância entre espaços socioeconomicamente distintos são os

condomínios fechados. Representantes contemporâneos da descontinuidade

sócio-espacial característica das cidades.

Caldeira conceitua estes espaços como enclaves fortificados, pois se

tratam de espaços semi-públicos, ou seja, espaços para uso coletivo que

apresentam acesso restrito através de aparatos de segurança. Para ela,

entram nessa categoria os condomínios residenciais e empresariais fechados,

os shoppings e os clubes. Tais espaços buscam administrar e controlar tudo o

que se passa dentre seus limites.

Os enclaves fortificados são desse modo, espaços onde seu tipo de

arquitetura enfatiza o valor daquilo que é privado e espacialmente restrito, ao

mesmo tempo em que desvaloriza aquilo que é público nas cidades. Sua

flexibilidade se volta apenas para as novas formas de construção e para os

novos dispositivos de segurança. Diante de tal configuração espacial se

apresentam como espaços descolados da localidade, pois não se relaciona

com seu entorno.

Configuram-se, portanto, como espaços fundamentados pela

diferenciação social, o que transforma tanto as paisagens quanto as grupos

sociais em homogêneos. Para Caldeira (2000) a expansão de tais

empreendimentos imobiliários se liga, também, a emergência de um novo estilo

de vida da elite urbana, que vê o isolamento que estes espaços oferecem

enquanto fator de prestígio. Esse novo estilo de vida identificado por ela não se

restringe apenas as novas construções e projetos urbanos, mas apresenta-se

também nas novas formas de sociabilidade e nas formas de interação social

intergrupos de moradores e destes nos espaços públicos da cidade: um

comportamento de desconfiança e restrição.

Desse modo, essa nova forma de habitar das elites se mostra como uma

forma de habitar associada a um símbolo de status, por se tratar de um

elemento de distinção, que se baseia e reforça a segregação sócio-espacial.

Diante disso, a presença desse tipo de espaço promove uma

reorganização no espaço da cidade e uma mudança de paradigmas nesse

sentido. O status e o prestígio da região central e das casas individuais vão

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sendo transferido a outras formas de construção como a verticalização e, mais

recentemente, os condomínios residenciais fechados em áreas mais distantes.

O que implica em um rearranjo espacial para dar conta da transferência de um

grupo social de forte poder de consumo e que se desloca através de veículos

individuais.

Desse modo, a cidade se polariza para dar conta de novas demandas.

Os equipamentos de infraestrutura chegam à periferia transformada por esses

empreendimentos imobiliários e a rede de serviços também. De tal forma que a

centralidade do centro vai se fragmentado em novas polaridades. Carlos (1999)

define esse momento como o da emergência de cidades policêntricas.

Para Caldeira (2000) o processo de fortificação promovido por este novo

tipo de habitação das elites se mostra como uma tendência global deste grupo

que tem como práticas sociais a proliferação dos discursos do medo, a

preocupação com referências raciais e preconceitos de classe.

Para Roberts (2002) o fenômeno vivenciado nas cidades brasileiras é de

encastelamento, ou seja, da separação física como um meio de apartação.

Segundo esse tipo de análise a ocorrência desse fenômeno está também

associada à existência de bolsões de pobreza, condições de precariedade

sócio-econômica e exclusão social.8 Desse modo, a reorganização do espaço

urbano baseada na construção ou na reconstrução de antigos espaços

segundo modelos e técnicas de enobrecimento se dá de maneira

profundamente segregadora.

O poder de compra passa a ser o “bilhete” de entrada para viver e

desfrutar desses espaços que possuem a segurança como elemento

diferenciador dos espaços comuns da cidade. Além de sua relação como uma

resposta aos índices de criminalidade e os medos urbanos, os dispositivos de

segurança passam a ser adotados também como símbolos de diferenciação:

aqueles para os quais eles são destinados enquanto dispositivos de proteção e

aquele para os quais são utilizados como meios de controle e banimento.

Mike Davis (2006) sugere que à partir da década de 1980 passou a

existir uma forte tendência a utilização de medidas policiais na vida dos

8 Este aspecto do processo de fortificação será desenvolvido no segundo capítulo deste trabalho.

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habitantes da cidade com a crescente utilização de tecnologias de segurança,

monitoramento e controle. É o que ele chama de “segurança total” – a busca

por uma vida completamente administrada através da previsão e controle de

riscos possíveis. 9

Considerações finais

A arquitetura das casas com todos os seus dispositivos de segurança,

voltada para o interior ou inserida em um condomínio fechado, a organização

da cidade voltada para a circulação de pessoas e mercadorias e a organização

do espaço urbano que lhe imprime uma forma específica expressam

necessidades sociais da vida urbana contemporânea, seja a demanda por

segurança baseada em riscos reais, seja a sensação de insegurança emergida

por determinantes outros que não apenas a violência em si. As formas de

relações distanciadas ou mesmo a ausência de um aparato do poder público

na administração das cidades, seja as demandas do setor produtivo por um

espaço que permita expansão, cada caso possui suas particularidades.

Entretanto, independente de seus determinantes essas configurações

transformam a paisagem urbana e alteram as formas de sociabilidade. Diante

disso, não é possível dissociar o espaço arquitetônico e suas características

das características da vida social em seu aspecto cultural e simbólico.

A cidade configurada através de projetos urbanísticos e de construções

que dificultam o contato de uma maneira que não apenas aquele pré-

selecionado através dos símbolos de distinção, ou um contato que vá além da

fugacidade daqueles realizados nos espaços de transito, passa a produzir uma

nova forma de habitat específica, segundo Sposito (2006), que se interioriza de

maneira notória. O que antes correspondia a uma demanda urbana de grandes

centros vai sendo gradativamente apropriado por cidades do interior10

9 Guiddens (2007) analisa também o que seria uma nova concepção de risco na sociedade

contemporânea. Relacionado, segundo ele, a um risco fabricado pela necessidade de controle e

segurança característicos desse período. Para ele, o risco hoje tem um novo caráter que está

relacionado ao ousar e, desse modo, a necessidade previsão e eliminação de surpresas indesejáveis.

10 Isso é identificado por Sposito (2006) que investiga a presença desse tipo de empreendimento

imobiliário em algumas cidades médias do interior de São Paulo. Ela acompanhou os primeiros

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Se em um número considerável das cidades médias paulistas há a

presença de condomínios fechados, por exemplo, já em meados da década de

1970, é apenas no final da década de 1990 em diante que esse tipo de

construção passa a ser assimilado e expandido na paisagem urbana.

Diferentemente do que ocorre em regiões metropolitanas a presença desses

espaços produz particularidades no espaço de cidades médias.

Desse modo essa nova forma de habitat transforma a realidade urbana e

as antigas noções de extensão e continuidade de cidades também de porte

médio, pois a presença de muros demarcando áreas restritas a circulação

dentro da cidade coloca a necessidade de refletir acerca do que faz parte da

cidade e do que não faz, pois há espaços que não estão disponíveis a todos os

seus habitantes. Noções de dentro e de fora, de urbano e não urbano se

mostra em processo de transformação em seus sentidos, devido à experiência

vivida a partir dessa configuração sócio-espacial.

Segundo Sobarzo (2006) esse processo contrapõe a antiga forma de

morar e de disposição da cidade a uma nova forma que, nas cidades médias

possui um impacto ainda mais forte do que nas metrópoles, pois em função do

tamanho mais reduzido de seu mercado consumidor, nas cidades médias a

tendência a se tornar obsoleta as necessidade de consumir e morar antigas

pode ser ainda mais acentuado.

Para ele, essa dinâmica se relaciona as formas de consumo da classe

média que busca imitar padrões de consumo das elites. Desse modo, a

moradia em seu aspecto simbólico possui nesse padrão de construção sua

forma de prestígio e diferenciação social.

Ao mesmo tempo são destacados como um novo momento da cidade, a

aquisição de uma posição de importância frente aos investimentos externos e a

incorporação de padrões arquitetônicos modernos. É comum ver referência a

grandes cidades brasileiras e até mesmo cidades internacionais nos projetos

dos condomínios fechados, como se esses fossem o veículo que traz aquilo

lançamentos nas últimas décadas: São José do Rio Preto em 1974, Sorocaba 1981, Mairinque 1981, São

José dos Campos 1981, Mogi Mirim 1991, Araraquara 1993 e Mogi Guaçu 1997.

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que é sinônimo de modernidade para as cidades do interior. Segundo Harvey

(2003):

“A ênfase dos ricos no consumo levou, no entanto, a uma ênfase muito

maior na diferenciação de produtos no projeto urbano. Ao explorarem os

domínios dos gostos e preferências estéticas diferenciados [...], os

arquitetos e planejadores urbanos reenfatizam um forte aspecto da

acumulação de capital: a produção e consumo do que Bourdieu (1977;1984)

chama de 'capital simbólico', que pode ser definido como 'o acúmulo de

bens de consumo suntuosos que atestam o gosto e a distinção de quem os

possui'. (HARVEY, 2003: 80;81)

A presença dos artefatos urbanos característicos do processo de

gentrification, bem como sua estética da segurança parecem ser hoje

elementos que demarcam a entrada das cidades em um período de

modernização, que lhes confere prestígio e status e parece provocar orgulho

em seus cidadãos/consumidores por terem embarcado nas novas tendências

de um modo de vida urbano global, o que traz as cidades os adjetivos de

desenvolvidas, modernas e progressistas. Desse modo, a realidade objetiva

que envolve todos os determinantes econômicos e políticos que estão

diretamente ligados ao processo de fortificação da cidade (Caldeira, 2000) e ao

processo de gentrification (Zukin, 2000) não se realiza isolada dos

determinantes sócio-culturais presentes no modo de vida urbano. Se

observarmos mudanças na paisagem das cidades médias do interior essas

mudanças se fazem acompanhadas de transformações no modo de vida

urbano desses espaços, onde se incorpora novos signos e novas formas de

sociabilidade.

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