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So Jos

-Tu, Jos, continuars a descendncia de Davi. Foi o que meu pai, Jac, me disse, momentos antes de expirar. - Oxal, meu filho, possam teus olhos ver o o de Israel, o Messias prometido. nou a minha mo, apertou-a e, olhandome fixamen-iinuou: TI, Jos, oxal possas ver o Filho de Davi, de nossa es-; um dia chegares a v-lo, s digno dele. s olhos se encheram de lgrimas. Todos estvamos dos. Eu no sabia o que dizer. Por fim, eu disse quase m, Pai. Deus permita! j pai morreu naquela mesma tarde. A famlia toda es-nida na nossa casa de Belm. Minha me estava des-da. Meus irmos, desolados. ico a pouco, a casa foi se enchendo de gente: todos sane meu pai j estava doente h algum tempo, mas no m que partiria to depressa, pois mal passara dos qua-os. norte ocorreu em conseqncia de uma pneumonia contraiu quando trabalhava no campo num dia chu- inverno. A tosse no mais o abandonou. Suas foras lebilitando dia aps dia.

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E assim, em poucos meses, nos deixou. Para mim, foi um choque e uma dor to grandes que mu-tas vezes tive que me esconder para que no me vis sem cho rar. Senti profundamente sua ausncia. Eu era o filho mais velho. Meu pai tinha toda confiana em mim; havamos chegado a ser timos amigos. Meu pai me transmitia paz, porque interiormente nem sempre me sentia seguro e, muitas vezes, as dvidas me assaltavam. era um pouco apreensivo, bastante tmido, el.il.iva pouco. Meu pai me havia ensinado a trabalhar e a fazer as coisas bem feitas. A palavra dele era indiscutvel. O bom critrio da vida se havia aninhado em seu corao. No havia coisa mais acertada do que um conselho, um aviso, uma rec orriendao dele. Era um homem de religiosidade simples e profunda, alimentada pela sabedoria de nossos livros sagrados. Ensinou-me especialmente a confiar em Deus, a nunca ter medo de nada nem de ningum. Ele costumava dizer, quando conversvamos em momentos difceis ou situaes de apuro: - Deus nos ajudar! Sempre o fez. nele que confiamos. Senti muitssimo a falta dele. Era grande a confiana que eu lhe dedicava, e conversvamos com freqncia. A ele podia dizer-se tudo, pois sabia escutar e compreender. E tambm sabia responder. Trabalhvamos de vez em quando no campo, mas em geral ele me ajudava nas minhas tarefas de carpintejro' e construtor, que quase sempre ocupavam todo o meu tempo Ele me ensinou a conhecer as pessoas, a considerar mais os fatos do que as palavras, a ponderar mais o tom da voz do que a prpria voz, e o olhar mais do que os olhos das pessoas. Ele me dizia: - So coisas nas quais transparece a al m ena. No podem Dele aprendi a retido, aprendi a ser honrado e leal para com todos, a manter sempre a palavra dada. Meu pai foi um grande mestre para mim. Deus o tenha em seu regao.

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Minha me, Rute, era bem diferente de meu pai. Talvez por isso mesmo havia entre eles aquela harmonia e bom entendimento que todos admiravam. Em minha me predominava sentimento de famlia e de piedade. o

va sempre em casa, s saa rua ou ao campo em caso sidade. lavia assumido a obrigao de educar os filhos e s visos. Era muito discreta. Fora de casa falava bem pou-i casa, o que a caracterizava era sua contnua atividade, losa conosco, atenta, s vezes um pouco severa. Amara e se preocupava especialmente com o nosso futu-ria que crescssemos ntegros, bem formados, que i tivesse nada a dizer da famlia. n disso, sua piedade era proverbial. Nos sbados ela e sinagoga e nas grandes festas nunca faltava s ce- do templo de Jerusalm. tava da orao, sabia muitos salmos de cor e muitas : da Escritura que freqentemente nos contava. 1 sei por que, mas quando nos contava os fatos de stria, o personagem que mais me atraa era Josu, o : de Moiss. Jovem, ativo, valente, Josu foi o heri I, que introduziu seu povo na terra prometida. Gene-iil batalhas e sempre vitorioso, a figura de Josu me mava.

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A passagem do Jordo, a derrubada da.s muraJht c, o sol e a lua parados at que tivesse vencido se, gos... Jamais homem algum da histria fez coisas to sas como Josu. Ele reuniu o povo em Siqum, rn aliana, repartiu a terra s tribos de Israel. -. Tanto ele me fascinava que muitas vezes me faz," no dia em que tiver um filho, vou dar-lhe o nome de j Minha me foi uma sbia mestra de vida e def gou-nos sobretudo uma grande idia de Deus, um D(1 e generoso. Em grande parte foi ela que nos inculcou) a Deus acima de qualquer pessoa ou coisa. Freqentt nos repetia: - Deus nos ama sempre, nos compreende e nos ^ E algum dia saber recompensar-nos. E ensinou-nos que a vontade de Deus era o mais ^ tante de nossa vida. Quando chegava o tempo da colhe frutos, por exemplo, costumava dizer-nos: - Meus filhos, como boa a fruta que Deus nos d. 2( algum dia ele nos dissesse que no devamos comer deja simples fato de am-lo e de querer cumprinua vontade,: comeramos. O mais importante cumpri: sua vontade, pensar em ns. o que nos dizem as Escriraas. E assim nos inculcava o temor de Deis, incio e raj verdadeira sabedoria. Quando meu pai morreu, minha me ficou por rrj-tempo como que aturdida. Compreendi (Mo como e amava e como havia infludo em seu carter/ornando-o ra sereno, mais profundo e religioso. Sobrevi como j aconteceu outras vezes. - Graas a Deus! Se Maria pensa assim, estou certo c'c que vai ser assim. - Deus te oua, Jos. - Tiraste-me um peso das costas. Eu j estava peitando o pior. No sobre Ana, pois eu ignorava o estado dela ms so~ bre Maria: eu estava desconfiado que ela ia casaf-se com Efraim. J me via desbancado, suplantado... O modocomo Clofas me recebeu tambm no foi muito cordial.-- Fica tranqilo, Jos. Isto acontece com qualquer lHS" soa quando deseja algo vivamente. Vejo que deves arnar Maria de verdade. Clofas um pouco frio, mas muito bom. Hoje foi um mau dia para ns e talvez estivesse nerVso. Su-sana, nossa filha, foi picada por abelhas hoje de manha epare-cia que ia morrer. Um curandeiro que a observou nos disse: "Se mais uma abelha a picasse, ela era uma menina iriorta... . Mas, graas a Deus, foi-se recuperando e j parece fora de perigo. Agora Clofas foi chamar Maria. Pela port traseira chega-se a sua casa.

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Respirei profundamente e me senti reviver. s - Agora toma alguma coisa, Jos. E descansa que deves estar muito cansado. De um momento para outro Maria deve vir, com Clofas e Efraim. - Que te parece a Galilia. Gostaste? - Muito. um encanto de verdor e de riqueza. Muito diferente da Judia. - S nos falta um pouco de chuva. - Mesmo assim, a Galilia parece um jardim!... - E seria mais ainda se tivesse chovido um pouco mais no inverno passado. Em todo caso, a colheita no foi m. Mas j se sabe, sempre se quer mais chuva nos povoados. - Clofas me disse que Zacarias lhe havia falado de mim. E Maria... Maria no disse nada? No falou de mim? - Claro que falou de ti, e muito! Quase sempre que vem, a conversa sobre ti. - Mas ele no me disse nada... - Olha, Jos, os homens so assim mesmo observou sem acrimnia. As mulheres no contam, no so nada. S existem homens no mundo. Eles fazem e desfazem, viajam. S eles pesam no mundo, s eles mandam... - Desde que conheci Maria, o mundo novo para mim; e as mulheres, pensando nela, subiram categoria de rainhas... -Dizes isto de corao, Jos? Conserva sempre este sentimento. As vezes tenho a impresso de que ns, mulheres, no somos nem pessoas. Nem testemunho podemos dar de coisas que vimos com nossos prprios olhos. - A sociedade, Maria, uma sociedade dominada pelos vares. Mas se no existissem as mulheres, esta sociedade viria abaixo. No duraria nem um ms... - Nossos livros sagrados - continuou ela falam de mulheres santas e muito famosas...

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-Sim, apresentam uma galeria de mulheres esclarecidas. Passando pela Samaria, pensei em sua mulher mais famosa, Judite, de Betlia. E uma das heronas mais valentes de nossa histria. Dela se diz: "Tu s a glria de Jerusalm, a alegria de Israel; tu, a honra de nosso povo". - E a rainha Ester, e Abigail, e Susana, a da histria de Daniel. E tambm Rute, a moabita, a antepassada de teu oovo, e tantas outras... - S o amor que as mulheres tm aos filhos, a pacincia c ledicao delas quando os filhos esto doentes, a capacidade le compreendlos, de perdoar as suas travessuras!... E mais linda, o sentido inato de intuio que elas possuem e que faz leias, em certos aspectos, seres verdadeiramente muito su-leriores a ns, homens. - Se todos pensassem assim, Jos... o mundo mudaria. Tal-ez ainda chegue o tempo em que as mulheres sero aceitas, :speitadas, igualadas em direitos aos homens... Quem sabe!... - Eu penso que sim, este dia chegar. Hoje j existe mais berdade e autonomia do que no tempo de nossos juizes ou. ossos reis... e o mundo avana sem parar. -Jos, agora estou vendo, que ferida essa que tens na_ 3o? - Ah, no nada! Foi noite. Nos arredores de Dotainu io encontrei nenhuma caverna e passei a noite debaixo de ti nrn.

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grande terebinto, com meu burrico ao lado. De repente acordei porque o animal estava nervoso e se mexia inquieto. Vi que trs lobos tentavam assalt-lo, talvez tambm a mim. Levantei-me depressa, agarrei o basto que sempre trago a meu alcance e um faco afiado e tratei de afugentar os lobos. Um fi-cou estendido no cho. No foi fcil domin-los, pois estavam com muita fome e atacavam furiosos. Foi ento que me corte' a mo. Depois lavei a ferida com um pouco de gua. - Vem, Jos, vou fazer-te um curativo com vinho e azeite. Vai ficar bem e sarar rapidamente. Naquele momento, Clofas, entrando na oficina, anun ciava: - Maria disse que j est vindo!

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Meu corao ficou sobressaltado. Estava ansioso por ver Maria. Mal haviam passado uns momentos depois que a mulher de Clofas fez o curativo na minha mo, ouvi a voz de Maria. Parecia que eu estava retornando queles dias felizes de Ain-Karen. Ouvir aquela voz, contemplar aquele sorriso encantador, olharme naqueles olhos transparentes, tudo isto era para mim um cu e um prmio totalmente imerecido. J da porta ela me disse, feliz e sorridente: - Ol, Jos! Bem-vindo! Como ests? - Ol, Maria! Estou muito bem, obrigado, e muito contente. Como est tua me? Disseramme que ela no est bem de sade... - Ela teve uma recada bem sria, mas parece que j est fora de perigo. Apesar destes sustos, tem uma natureza muito forte e acaba superando tudo. Disse que quer ver-te, que est ansiosa por conhecer-te... - Hoje mesmo, Maria? No est muito tarde? - No, ao contrrio. Ela ceou h pouco e est esperando por ti. Vamos l. - Sim, vamos todos - disse Clofas. E, voltando-se para sua mulher, disse-lhe: Tu ficas em casa com a pequena. A pouca distncia encontrava-se a casa de Ana e Maria. Uma casa pequena, de pedra, que tinha em seu interior, na prpria rocha, uma gruta com uma cortina na frente, como o estilo das edificaes desses lugares. Ao redor havia um espao livre cercado por um muro de pedra. Havia muitas flores e uma amendoeira j bem antiga. Entramos. direita da porta, entrando, havia uma cama, a de Ana, e ao lado, junto parede, outra cama que presumi ser a de Maria. Trs lamparinas de azeite iluminavam o quarto. - Me, j estamos aqui. Agora conhecers Jos. - Oh, Jos, obrigado por ter vindo! S bemvindo entre ns... Tu nos trazes a bno! exclamou Ana, um pouco re-clinada no leito, com voz fraca, porm afetuosa. - Ol, Ana! Tambm eu tinha muita vontade de conhecer-te... Como ests? J vais melhorar, tenho certeza.

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Ana me olhava e parecia muito contente de ver-me a seu lado. Era um pouco mais idosa do que Isabel. Seu rosto irradiava paz e serenidade, e algo daquele resplendor de Maria, que a tornava, a meus olhos, sumamente agradvel. - De vez em quando me sobrevm estas crises, mas j estou melhor. E a alegria de verte parece que j me tirou a metade do mal. - Oxal fosse assim! Tens apetite, Ana? - No muito. Mas graas a Maria, que uma excelente enfermeira, vou comendo quase sem me dar conta. E graas tambm outra Maria, a de Clofas, que se preocupa para no me faltar nada. Que sorte a de Clofas de encontrar uma mulher como ela! - E que sorte a de Jos, de ter encontrado uma mulher como Maria - replicou ele. - Jos - insistiu Ana - senta-te um momento aqui do meu lado. Deixa-me ver-te bem de perto... s forte e robusto, e tens olhos muito bonitos. s da famlia de Davi, no ? - Sim, Ana, esta a minha nica glria.

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- A principal glria, mas no a nica, porque possuis muitas outras. Esta famlia de Davi, para o nosso povo, guarda um tesouro oculto que um dia se dar a conhecer, no s I Israel, mas a todo o mundo. Que sorte a de pertencer a esta estirpe, cantada pelos profetas e portadora de uma esperana to grande!... - Sim, Ana. Tambm a mim, meu pai sempre fazia qiu-s to de lembrar: que eu fosse sempre digno de nossa linhagem. E com estas palavras nos lbios expirou. - Palavras que foram quase um testamento, Jos. Deves lembr-las sempre!...

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Sentia-me to bem ali, que nunca teria sado. A conversa de Ana era muito humana e muito profunda ao mesmo tempo. - Esto todos bem em tua casa, Jos? - perguntou-me. O que faz tua me? E teus irmos? Tua me ficou muito triste com tua partida, no ? - Sim, muito. Mas, olha, Ana, tuas primeiras palavras de que eu era uma bno, foram precisamente as ltimas palavras de despedida de minha me... - Ns mes sempre adivinhamos as coisas que dizem respeito aos nossos filhos, Jos. Deus nos concede uma luz particular, uma ternura, uma fora, quase diria, uma viso de futuro, que parece realmente uma providncia. - verdade, Ana. E isso evita muitos males. As mes sabem resolver situaes difceis. H pouco falvamos sobre um tema parecido com Maria de Clofas. - Com Maria, ou melhor, com as duas Marias, ters ocasio de falar de muitos temas. Elas no s dizem palavras, mas expressam idias. - verdade, Ana, expressam idias, dizem coisas que trazem vida e esperana. - Alm disso, elas tm grande estima por nossos livros. Vo sinagoga com freqncia e so muito amigas do venerando rabino de Nazar, Ezequiel, que lhes explica muitas pginas de nossa histria.

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- Bem se v, Ana. Como conhecem as Escritvxras!... l uma sorte ter um rabino sbio e prudente. O de Belm t.im bm homem de valor, mas freqentemente deve ir a Jerusalm e quase sempre est fora. - Minha filha e minha sobrinha so pessoas que receberam muito de Deus: muito amor e muita benevolncia. E elas, por sua vez, querem comunicar esta ditosa experincia de sentir-se amadas, e o fazem muito bem. Mas, Jos, voltemos tua famlia. Em Belm, esto todos bem? - Muito bem, graas a Deus. E, como dizias, um pouco tristes, porque os deixei, sobretudo minha me. Mas ao mesmo tempo muito contentes, porque vim morar aqui. Ainda no conhecem Maria, mas j lhes falei muitssimo dela. - E ela nos falou muito de ti, Jos. Parece que fostes feitos um para o outro. - E o que diziam Zacarias e Isabel, em AinKaren. - Que pessoas boas, no? - E devo reconhecer que foram eles os autores de nosso noivado. Com muita prudncia foram guiando nossos passos, at chegar a este encontro definitivo. Sou-lhes muito grato por isso. - Tens razo, Jos. Quando meu pobre Joaquim caiu enfermo, vieram imediatamente v-lo. Foram as pessoas que mais nos assistiram e ajudaram. E quando ele morreu, Zacarias encarregou-se de tudo: do enterro, do funeral... E foi ele que me aconselhou a voltar a Sforis. H anos que venho arrastando minha doena e o clima de Jerusalm no me fazia bem. Aqui na Galilia, ao contrrio, recupereime bastante. - Onde viveis em Jerusalm, Ana? - No muito longe do templo, junto piscina chamada Probtica, em frente ao Monte das Oliveiras. Maria se lembra bem daquele tempo e Jerusalm a encantava... Mas, diz-me, Jos, viste Zacarias e Isabel h pouco tempo?

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- Sim, h uns dois meses, na festa da Hanuk. Zacarias tinha que ir ao templo e combinamos o encontro. Mandou muitas lembranas para todos daqui. E eis o que me entregou para dar a Maria. - Oh, meu Deus! Um anel... um anel de ouro... que lindo, Jos!... O anel das npcias...

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Voltamos casa de Clofas e ceamos. Ao terminar, indicaram-me o lugar para dormir. - o quarto de Efraim - disse-me Clofas. H lugar suficiente para duas camas. Minha mulher j preparou tudo. E, Jos, como se estivesses em tua casa. Se faltar alguma coisa, s dizer. Dorme tranqilo, Amanh cedo devo ir a Sforis com Efraim com uma carga de cermica. - Queres que te acompanhe? Meu burrico tambm po deria levar um pouco da carga. - Gostaria muito, Jos, mas ests cansado e temos que sair bem cedo. -Cansado, eu? Que nada! Quando te levantares, s ml chamar e irei contigo. Ao despontar a aurora, carregamos tambm o Srec e, sem perder tempo, tomamos o rumo da cidade, capital da Galilia, a uma distncia de hora e meia ao norte de Nazart Clofas ia me dizendo: - A Maria, filha de Ana, nunca te cansars de observ-l.i e de descobrir novos aspectos de seu carter que te causaro idmirao. O que ela est fazendo por aquela pobre cega, nem uma filha o faria. Eu no consigo compreender sua maneira de agir. - Nem me precisas dizer, Clofas. O mesmo acontece comigo.

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- Tudo lhe agrada, gosta de todo mundo, tudo est bom para ela! E como se no existissem problemas para ela e, se existem, trata de resolv-los. Vive sempre muito serena. Nunca a ouvirs falar mal de algum. - Ela, sim, uma verdadeira bno do Senhor! - Pensei, Jos, que poderias morar na casa de um parente nosso que morreu h uns meses e a casa est fechada. Talvez tivesses que reform-la um pouco. Tem trs quartos e, debaixo, um bom poro que poder servir-te muito bem de oficina de carpintaria. - Se queres, Jos, eu te darei uma mo para o que for preciso fazer. - Oh, obrigado, Efraim! Tua ajuda ser muito bem-vinda. Tenho muita vontade de trabalhar, de fazer alguma coisa, e muito, para Maria, com vistas ao casamento. - A me dela ficou muito bem impressionada contigo. - Achas, Clofas? Eu tinha um certo medo... Sabes que as mes tm uma grande intuio e muita influncia nas filhas, e mais ainda quando se trata do matrimnio. - Tambm Ana um caso. Ela tia de minha mulher. Nasceu em Sforis mas casouse em Jerusalm, com Joaquim. No tinham filhos e, um dia, depois de muito suplicar ao Senhor, tiveram Maria, que tem sido a alegria de sua vida. Mas quando a menina tinha seis ou sete anos, Joaquim morreu. Por isso Ana decidiu voltar Galilia. - E em Nazar no apareceu nenhum pretendente de Maria? - perguntei. - Sim, apareceram, e alguma famlia j me havia falado deste assunto. Mas todo mundo tinha a sensao de que a jovem era um caso especial e no seria qualquer um que poderia casar-se com ela. Este aspecto de superioridade que ela irradia a primeira coisa que se nota. E isto no se encaixa em todos. Alm disso, seu olhar, to luminoso, parece penetrar no esprito da gente.

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- Ento me diz, Clofas, no foi este tambm para mim o principal obstculo para aceitar a possibilidade de casar-me com ela? E at meus irmos me falaram disto. - Eu tambm tenho esta sensao acrescentou Efraim. E como se ela fosse um ser superior, destinado a algum em particular, ou para alguma misso bem elevada... E eu acho, Jos, sinceramente, pelo que vejo e sinto, que tu s a pessoa mais adequada para ela. Vs dois tendes sorte! - Agradeo-te, Efraim. Muito me alegra tua opinio. Obrigado! - Tem confiana, Jos - continuou Clofas. Ns estaremos do teu lado. Como haviam mudado meus juzos, de ontem para hoje, sobre esses dois amigos!... Quanto ao resto, de Sforis quase nem me dei conta. S poderia dizer que era uma cidade grande e bonita, e que se ouvia falar muito em lngua grega. O pensamento em Maria prendia toda a minha ateno.

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J era tarde quando chegamos de Sforis. Efraim I havia voltado a Can. Passamos um momento pela casa de Ana, para v-la e tambm para saudar Ma-PgP ria. Ana havia passado um bom dia. Depois fomos cear na casa de Clofas e, em seguida, ele me levou casa da qual me havia falado. Sua mulher me havia preparado um quarto para dormir, num aposento que havia previamente arrumado e arejado, alm de enfeit-lo com um jarro de lrios purpreos. E sobre um enxergo havia colocado dois lenis, um cobertor e um travesseiro. - Aqui vais dormir muito bem, Jos. Acho que no vais sentir frio. Deixo-te aqui este po, azeitonas, algumas frutas e mel. Tambm uma vasilha de gua. Amanh poders fazer o desjejum. Depois vamos arrumando o resto da casa. Se faltar alguma coisa, s dizer... - Obrigado, Maria e Clofas! Vou dormir como um rei. No me falta nada. Eles foram embora e eu fiquei, contente de poder encontrar um tempo tranqilo para refletir, recordar e assimilar tantas emoes. E, sobretudo, para encontrar um tempo para a orao. Estava sentindo uma grande necessidade de orar. A alegria me dominava, ainda que, por outro lado, me parecia um 112112

sonho. E era esta alegria profunda que eu queria agradecer de todo corao, ao Senhor, doador de todo bem. No dia seguinte levantei-me ao amanhecer. Fiz o desjejum e passei em revista a casa e o poro. Trs quartos, portas

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e janelas em mau estado, goteiras... A casa, um tanto isolada do resto das outras, era a primeira em direo fonte do povo. A seu redor estendia-se um pequeno quintal pertencente a casa, com algumas oliveiras. Comecei a limpar os quartos. Clofas me havia providenciado duas vassouras, e quando j estava amontoando coisas velhas e sem serventia, vi que Nat estava chegando. - Ol, Nat! Como s madrugador!... - Sim, Jos. Gosto de levantar bem cedo. Deste aquelas amndoas a Maria? - Claro que sim, no mesmo dia que cheguei. Ela ficou muito contente e te agradece muito. Disse-me que sois bons amigos, e que um dia a acompanhaste da fonte at sua casa e querias levar-lhe o cntaro... - verdade, at j me havia esquecido. Por ela eu faria qualquer coisa! E muito boa. Mas agora mesmo, se quiseres, posso ajudar-te em alguma coisa. - Claro que sim, Nat. Vais fazer-me um grande favor. Ajuda-me a tirar essas madeiras. Tira as pequenas que eu tiro as mais pesadas... -Jos, vem c. Antes quero mostrar-te uma coisa. - O que isso, Nat? - Um ninho, um ninho de passarinho. Est atrs da casa, na parede, quase tocando o terrao... verdade. Havia uma fenda entre as pedras da parede e ali os passarinhos haviam feito seu ninho. -Cada ano eles vm fazer seu ninho aqui, disse-me. -Eu gosto muito de passarinhos, Nat. Mas... estava pensando justamente em derrubar essa parede para levantar uma nova... De toda maneira, vamos esperar uns dois meses, dandolhes tempo para criar e ir embora, e ento vamos tratar de fazer a nova parede.

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- Maria tambm gosta muito deles, e sempre pra para ouvi-los cantar. - Eu tambm fico encantado ao ouvir seu canto, que simples, montono, mas doce e prazeroso, e no cansa. - Sim, e quando cantam, movem a cabea de cima para baixo. - s um bom observador, Nat. Os pssaros so muito teis para o campo. At a Sagrada Escritura fala deles.

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Passaram-se dois meses. Eu havia reformado toda a casa e arrumado o poro como minha oficina de carpintaria. Os primeiros visitantes foram as crianas. Nat encarregou-se de espalhar a notcia entre seus companheiros. Eu trabalhava como em Belm e logo nos fizemos amigos. Passado um tempo, tomei a deciso de derrubar as paredes e erigir novas. Mas Nat me disse: -Jos, sabes que os passarinhos costumam fazer uma segunda postura? _ Uma segunda postura? Sim, verdade, costumam faz-la. - E ento, o que vais fazer?... - Olha, Nat. J vi que gostas muito dos passarinhos. Ento, se fazem ninho outra vez, vou esperar at que acabem de criar os filhotes. - Oh, obrigado, Jos! Tens um grande corao, tambm para os pssaros. Minha pressa no era tanta. As paredes poderiam ser refeitas dentro de uns trs meses e ento tudo poderia coincidir com o anncio de nosso quiddushin ou esponsais. E nesse meio-tempo, o que poderia fazer? J havia aparecido algum trabalho na carpintaria com as encomendas das pessoas de Nazar. Mas dispunha ainda de bastante tempo livre. Ento

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ocorreu-me esta idia feliz: cavar, junto a casa, uma cisterna grande e de alta capacidade, como presente de casamento para Maria. Dito e feito: Clofas e Efraim deram-me uma ajuda e tambm Simo, o pai de Nat, algumas vezes. Escavamos o terreno a uma profundidade de duas vezes a altura da casa. A forma da cisterna era cnica e trabalhamos s mil maravilhas. Fazia muito calor e suvamos pelejando entre o p. Encontramos uma camada de rocha durssima que quase nos quebrava a coluna. Mas continuamos aprofundando at chegar ao fim previsto. Uma vez escavada, tratamos de embo-la muito bem, fizemos os pequenos canais de entrada da gua e as pequenas balsas de decantao. Tudo estava no ponto. S faltava comear a chover. Acabada a cisterna, dispunha-me a derrubar as paredes estragadas da casa. E eu disse a Nat: - Olha, graas a ti, que me falaste dos passarinhos e de sua segunda postura, Maria vai ter uma bela cisterna, sempre cheia de gua fresca... Agora vou derrubar as velhas paredes da casa. -Uma cisterna bem grande!... Como Maria vai ficar contente! J no precisa mais ir fonte. Mas acho que os passarinhos no vo voltar mais com a parede nova que vais fazer... - Vo voltar sim, Nat, vers! Aproveitarei as mesmas paredes do ninho de antes, e vou encrav-las na parede nova, formando uma fenda semelhante antiga. E vais ver como eles voltaro... Passados uns meses, tudo j estava pronto: casa e cisterna. Em Nazar j se falava publicamente de meu casamento com Maria. As mulheres, especialmente, o comentavam, e todas se mostravam encantadas com o casal, do qual diziam "foram feitos um para o outro". Maria e eu nos vamos todo dia. Eu ia freqentemente casa dela e com Ana mantnhamos conversas bem interessantes, que sempre me deixavam com a sensao de que Ma

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ria era uma criatura fora do comum. Falvamos de nossa vida, de nosso trabalho, de nosso futuro, de nossa histria, de nossa f... e sempre as reflexes mais sensatas e profundas eram as de Maria. Por ocasio da Festa das Tendas, fixamos oficialmente, de acordo com Ana e Clofas, a data de nosso matrimnio: faramos o contrato dentro de um ms. Seis ou sete meses depois teramos o nissuin ou cerimnia e festa do casamento propriamente dito. Graas a Deus no me faltava trabalho na carpintaria. Tanto de Nazar como de Sforis e de Can chegavam-me encomendas, algumas bem importantes. E quando se levantavam novas casas, as pessoas queriam que eu interviesse. Para mim, a vida em Nazar era feliz. As dvidas, de momento, haviam desaparecido. Maria iluminava tudo.

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Na data fixada, fizemos o quiddushin. De Belm vieram meus irmos Rubem, que acabava de ser pai de uma menina, e Sadoc, que estava a ponto *" de casar-se. Touxeram-me muitos presentes. Minha me e minhas irms se haviam ocupado de tudo, at demais. Elas viriam por ocasio do casamento. Zacarias e Isabel nos enviaram dois clices muito artsticos que, segundo o costume, deviam ser quebrados durante a boda, depois de ter bebido o vinho. A cerimnia dos esponsais foi uma festa familiar. Tudo estava muito bem preparado. Foi realizada na casa de Clofas, mais espaosa do que a de Maria. O celebrante foi o rabino Ezequiel, que cumpriu muito bem seu papel e se demonstrava muito feliz. E o contrato, as testemunhas, a promessa formal de matrimnio... tudo se cumpriu segundo as nossas antigas tradies. Os convidados nos davam os parabns e todos se mostravam contentes com a nossa promessa matrimonial. Mas havia algumas excees. Um dia em que estava capinando no quintal de casa, um rapazote de uns quinze ou dezesseis anos me interpelou: - Eh, tu a de Belm! No tinhas bastante po na casa de po, para vires aqui comer o nosso, e roubar as nossas mulheres? Aquelas palavras me fizeram perder as estribeiras de tal maneira que larguei a enxada e, olhando-o fixamente, ameacei:

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- E tu, galinho de pena nova! Se tomares a repetir-me uma s dessas palavras, vou dar-te um sopapo que te far girar como um pio at a Plancie de Esdrelo! Pelo visto, meu tom de voz e meu olhar o impressionaram. Fiz gesto de avanar em sua direo, mas ele saiu correndo como uma lebre assustada. Mais tarde aquele rapazote foi para mim motivo de grande tristeza, como veremos. Passaram-se vrias semanas de paz e de espera. Dois dias antes das npcias, Maria chamou-me para dizer-me: - Jos, tenho uma boa notcia para dar-te. Nem vais acreditar! - Vamos, fala, Maria! - Soube que nossa tia Isabel, de Ain-Karen, est esperando um filho! - Esperando um filho, ela, a mulher de Zacarias?... - isso mesmo. Eu fiquei contentssima. Amanh, quando teus irmos chegarem, podes pergunt-los. -Vemc um momento, Maria; algum est te chamando - disse Ana. E ela foi, deixando-me sumamente maravilhado com a notcia. Seria possvel? No se trataria de uma espcie de milagre?... Lembrei-me ento das palavras que ela havia dito a Isabel em cena ocasio: "Isabel, a bondade de Deus pode fazer maravilhas, sempre e em todo lugar. No deixemos nunca de confiar nele..." Ser cue Maria, orando com sua f to grande, no teria obtidoesta graa do cu? E mais ainda: no seria uma espcie de doai de profecia? ... Eu, tratando-se de Maria, no teria nenhuma dvida!.-

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Porm, mais ainda do que suas palavras, o que me impressionou foi a alegria de seu rosto. Aquele resplendor que habitualmente a iluminava, chegou a tal ponto que parecia ter atingido seu clmax. Queria pedir-lhe que me explicasse o motivo. Alguma coisa se havia passado em Maria, alguma graa ou dom de Deus a haviam transfigurado. S a alegria do casamento no podia t-la feito chegar quele estado to maravilhoso de alegria e luminosidade interior. Maria permanecia, aos meus olhos, como um segredo, um tesouro arcano e precioso, amvel e fascinante ao mesmo tempo, que me havia cativado inteiramente.

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Quando meus familiares chegaram, tambm eles ficaram admirados com a Galilia, este pas to verde e rico, onde se vem gua e flores por gr^ S toda parte. - No h comparao com a nossa terra, to prxima do deserto... - comentava minha me. Isto aqui um jardim! - Ento, se visses o Lago de Genesar!... ponderou Efraim. -Iremos v-lo esses dias? - perguntaram minhas irms. - Uma coisa que me impressionou muito foi o Monte Tabor, to solitrio e majestoso, no meio da Plancie de Esdrelo... - comentou Rubem. -Jos, meu filho, que sorte tiveste! Ou melhor, como o Senhorte abenoou, meu filho, por tua bondade para com teus irmos! Valeu a pena esperares, assim pudeste encontrar este anjo de Deus que Maria de Nazar... -Ento no isto que eu j vos dizia, me? -Eque ela acha tudo bom e bonito. De nossos presentes disseCUso lindssimos comentou Ester. -Eamim me disse que tu, Jos, s o homem mais extraordinrio aue j viu. Disse que tudo te agrada, que tens habilidade parado, que nunca discutes... - acrescentou Sara. -Mo h motivos para tanto! - retruquei mas interior-mentenuito feliz por saber que Maria disse tais coisas. Joscontinuou Rubem - agora que j conhecemos Maria, vaispedoar-nos aquela conversa que tivemos em Belm... Ns no a conhecamos e nossos clculos eram humanos demais, quase egostas. Mas agora vimos quem e como ela . Sentimos muito termos sido to precipitados em nossos julgamentos. -J sei que foi por no conhec-la, e que no fundo o comentrio era s para o meu bem... - Basta ver como ela te olha, Jos! continuou Sadoc. Ela te escuta embevecida... Vai ser a mulher mais amvel e obediente que podias imaginar!... - E formareis um casal maravilhoso! 1221 2 2

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exclamou Rubem. -Jos, meu filho, v s como Maria te ama! - ponderou minha me. D graas a Deus. E agora, mudando de assunto, sabes que notcia trazemos? J te comunicaram que Isabel est esperando um filho? - Sim, me, Maria j me contou a novidade ontem. No sei como ela soube, mas me disse e at acrescentou que hoje minha famlia poderia confirmar a notcia. Como possvel? - Pois , meu filho. Todos estamos de parabns. E por isso eles no vieram a Nazar. Isabel est esperando com muita nsia o nascimento de seu filho... A festa do casamento, o nissuin, foi muito bonita. No faltou nada nem ningum. S Raquel ficou em Belm com a filhinha de poucos meses. Celebramos a boda com todo o ritual tradicional. Foi tudo muito pomposo. Todo o povo participou nos atos. A procisso, ao entardecer, da casa de Maria at a minha, foi muito simptica. Cerca de doze jovens compareceram para cantar e danar ao som da msica, enquanto levavam as lmpadas de leo. Os parentes, o rabino, os amigos... todos respiravam satisfao. O pequeno Nat no saa do meu lado. O vestido da noiva, confeccionado por Maria de Clofas, era muito bonito, mas simples, de acordo com o que Maria havia pedido. O banquete, bom e abundante; o vinho, riqussimo, presente de tio Iz. O povo comentava que h muitos anos no se via um casamento como aquele em Nazar. E no tanto pela riqueza ou pelo regozijo, mas pelo casal to singular e to promete-dor que formvamos, Maria e eu...

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Ao anoitecer, uma vez terminada a festa, todos foram para suas casas. Meus familiares se alojavam na casa de amigos e conhecidos. Maria e eu ficamos ss. -Jos, agora que estamos ss, quero dizer-te unia coisa. J confirmaste o que aconteceu em Ain-Karen, que Isabel est

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esperando um filho? - Sim, j me disseste isto anteontem, e ontem meus irmos e minha me o confirmaram. - Mas sabes quem me deu a notcia? -No, no sei. Quis perguntar-te, mas tua me te chamou... - Sim, e isso veio a calhar. Agora posso contar-te melhor, ilibes quem me comunicou, Jos? -Suponho que foi algum que veio da Judia. -No,Jos... Foi o Senhor que me disse... - 0 Senhor, Maria?... Mas possvel?... E onde te disse isso, na sinagoga? -No, foi em casa, Jos, exatamente como estou dizen-Jo. E j viste que verdade. -E verdade mesmo!... -Poisisso, Jos, isso nada em comparao com o que o Senhor me comunicou em seguida! - O que foi, Maria? Vamos, fala, fala por favor!... -Jos, abre o corao!... Disse-me que eu... que eu... eu era a escolhida para ser a Me do Messias... - Tu, Maria?... Tu, a me do Messias esperado?... - Sim, e me disse que se encarnaria em minhas entranhas por obra do Esprito Santo... - Por obra do Esprito Santo?... E tu o que disseste, o que respondeste?... - Pensei e meditei bem suas palavras, o que significavam... pensei tambm em ti, at lhe fiz uma pergunta... Apesar de estar emocionada, encontrava-me tambm muito serena. E vendo depois, com toda clareza, que era esta a vontade do Altssimo, respondi que sim. Disse-lhe "Eis aqui a serva do Senhor: faa-se em mim segundo a tua palavra..." - Fizeste bem, Maria... Se a vontade de Deus... isso para ns tudo. - Obrigada, Jos, obrigada! E tu, o que pensas de tudo isto? - Deixa-me refletir um pouco... algo to maravilhoso, to grande... Eu, Maria, penso 1241 2 4

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como tu... Que se faa sempre e em tudo, em ti e em mim, a vontade de Deus... - Eu sabia, Jos, que compreenderias e aceitarias o projeto de Deus!... - Maria, as Escrituras vo-se cumprindo... No Isaas que diz: "Uma virgem conceber e dar luz um filho?" - Sim, Jos, Isaas. E agora cumpre-se esta palavra. Demos por isso graas a Deus! - E que o Messias proceder da casa de Davi... Por isso eu, da casa de Davi, vim de Belm... Agora compreendo o significado do nome Nazar! O broto, o rebento deJess... De Belm a Nazar, o nezer da profecia tornou-se realidade... Meu Deus!... E... Maria... que nome levar o Menino?

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- Isso tambm o Senhor disse, Jos. Seu nome ser Jesus! -Jesus? Jesus justamente o nome do Josu de meus sonhos... o nome do filho que sempre quis ter!... E Deus mesmo o escolheu: Josu, Jesus! Quo maravilhosos so os desgnios do Senhor!... E como so grandes os seus projetos! - Temos que dar incessantemente graas ao Senhor, Jos. - verdade, Maria... E nossa casa - podes imaginar? - vai ser um paraso... - Certamente, Jos. E ns viveremos neste paraso feito de louvor, de agradecimento e de santidade...

A pedido de Maria, pusemo-nos em orao No podamos fazer outra coisa. Ela dirigia a orao, feita de gratido e louvor, com pensamentos da Escritura entrelaados de maneira to bela que no me lembro ter ouvido nenhum mestre da Lei expressar-se com tanta profundidade. No sei quanto tempo durou a orao; as horas pareciam no passar. O pensamento do Deus conosco, do Emanuel profetizado por Isaas, enchia nossas mentes. E ento intu o segredo de Maria, aquela sua especial preparao para um mistrio to excelso, para ser toda de Deus, segredo inspirado pelo Esprito do Senhor. Quando acabamos a orao, j apontavam no oriente as primeiras luzes da aurora. O tempo passou como um suspiro. Nossa felicidade no podia ser contida, era como se vivssemos momentos celestiais. S sentimentos de louvor, de ao de graas, de alegria e de f alimentavam nosso corao. No sentamos nenhum cansao. Vamos claramente a presena de Deus entre ns, de seu amor, de sua bondade, de um Esprito que nos levava como que pela mo orao e docilidade... De comum acordo decidimos no dizer nada a ningum, nem sequer aos familiares. Para muitos seria muito difcil acreditar naquele sublime desgnio de Deus. - Quando o Senhor quiser - observou Maria dar a conhecer este mistrio, incrvel por sua grandeza e sua ternura... um mistrio para o bem de toda a humanidade. E a seu tempo ele provera...

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- Sim, Maria. O Senhor, que comea suas obras, sabe termin-las maravilhosamente. - Eu hei de dar muitas graas a Deus continuou Maria -pelo fato de ter em nosso povoado de Nazar uma pessoa to excepcional, como o nosso querido Rabi Ezequiel, que ainda no me explicou como pde permanecer, com todo valor que ele tem, neste rinco da Galilia. um homem de Deus, que passa horas e horas escrutando os livros sagrados e depois, aos sbados e demais dias de festa, no-los explica na sinagoga. Ele, a pedido de minha me apesar de ser uma coisa bastante inslita entre ns - explicou-nos ao longo dos anos, a Maria de Clofas e a mim, muitas pginas de nossa histria, e especialmente algumas passagens referentes ao Messias esperado. - Ento, Maria, h tanto tempo recebes instruo do mestre Ezequiel? - Sim, Jos. Deus prepara muito bem seus desgnios, especialmente quando se referem ao bem de seu povo. Deus inspirou minha me aquela boa idia para que eu pudesse ter uma preparao espiritual adequada a essa graa que nunca poderia ter imaginado receber. O rabino Ezequiel aceitou de bom grado i idia e foi preparando assim o caminho do Senhor. - E Maria de Clofas saber algo sobre este mistrio? - Por ora no, Jos. Mas acredito que tambm ela ter ua parte no desenrolar do plano de Deus. to inteligente, :o religiosa, e ama tanto a Palavra de Deus!... - Mas tu, Maria, foste a eleita. Tu s a Me do Messias! -Jos, em nossa vida tudo dom de Deus, tudo graa iele. Ns, sem Deus, no somos nada, nem sequer existira-rios. Ele tudo e tudo faz. Cabe a ns to-somente saber icolher seu desgnio, que no fundo no seno um rio de be-levolncia e de amor para conosco. - E o que pensas fazer? - Simplesmente, como sempre, deixar-nos guiar pela mo lo Senhor, ver em cada um de nossos passos sua presena e

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sua bondade, e continuar aprofundando-nos na Palavra de Deus, especialmente na que se refere a nosso Filho... E, como podes ver, Jos, s em pronunciar esta palavra j sinto uma comoo inexprimvel, uma alegria que no sei como explicar. - Quantas maravilhas brotam das mos do Senhor!... -exclamei. - Nunca chegaremos a conhec-las, por pouco que seja -disse ela. Penso que o nascimento de nosso Filho ser como um novo nascimento para o mundo, como uma histria que comea com um beijo de Deus a toda a humanidade...

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Os dias das festas nupciais continuaram. As pessoas nos felicitavam por nosso presente e nosso futuro, e todos se mostravam muito amveis para conosco. Terminados aqueles dias, os familiares foram regressando a seus lares. Minha me e meus irmos no sabiam como expressar sua alegria pela sorte que tive de encontrar Maria e casar-me com ela. Tomaram o caminho de volta, mas em seu corao estavam conosco; 3 que nos manifestavam, emocionados e felizes. Maria os ha-ria fascinado. Possua uma tal irradiao de bondade, de paz 5 de alegria, que sua simples presena fazia feliz qualquer um. Nossa casa mudou por completo; como, por outro lado, :reio que mudamos tambm ns dois, e especialmente Maria. Compreendi ento aquele maravilhoso resplendor de seu ros-:o. O mistrio que aconteceu em seu seio nos enchia de assombro e alegria. Eu no me considerava digno daquela graa. Vias no foi difcil aceit-la. Certamente Deus me ajudou, guando tomei conhecimento do nome do Menino, vi nisso im ato de ternura de Deus para comigo, uma daquelas delicadezas que Ele reserva unicamente para pessoas muito amadas. Maria descreveu-me e comentou aquela experincia espi-itual. Tratando-se de um mistrio de Deus, nem sequer ela :abia expressar com palavras apropriadas aquele contato com 3 Senhor. Falava-me de uma espcie de iluminao, de um :omo que encontro com algum que lhe falava, talvez um anjo, le uma escuta ntida e clara, de uma voz interior que lhe comunicava o desgnio de Deus. Ela, contudo, teve uma certeza absoluta sobre aquela experincia, uma convico total, tanto da mensagem enviada da parte de Deus como de sua resposta, clara e decidida. E 130

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naquela convico vi manifestada sua f imensa, profunda, como a dos grandes personagens de nossa histria. Ela tinha ouvido que a chamavam com um nome que nunca tinha escutado, uma expresso que queria indicar algo como favorecida pela benevolncia divina, minha complacncia, amada de Deus, transfigurada pela graa, cheia da graa do Altssimo... Algo que acentuava a complacncia de Deus e a abundncia de graa que havia cado sobre sua pessoa. Compreendeu que havia sido eleita para ser a Me daquele que era o Esperado de Israel, que era anunciado naquele dilogo com ttulos to extraordinrios que pareciam incrveis. E Maria, em sua obedincia ao Senhor, aceitou... Naqueles dias no fazamos mais do que comentar aquele dilogo com o Senhor, aprofundando-nos em seu sentido e alcance... Dias depois, no momento em que eu queria comear a trabalhar, Maria chamou-me e me disse: -Jos, gostaria de propor-te uma idia que h dias venho ruminando. Vimos palpavelmente como a mo do Senhor est sobre ns. E sabemos tambm que essa mesma mo, cheia de bondade, pousou igualmente sobre nossos parentes Isabel e Zacarias. Que tal se fssemos v-los? - V-los? Maria, foi Deus que te inspirou! Pois vamos, parece-me uma boa idia. - Tive esta idia porque l poderamos compreender ainda mais este acontecimento de Deus, contemplar seu desgnio, como tudo foi preparado e desenvolvido. L poderamos manifestar sem temor algum nossa alegria. E ao mesmo tempo, eu poderia ajudar em tudo e por tudo a nossa querida Isabel, que nestes dias certamente necessitar de algum que lhe faa companhia.

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- Maria, isso me parece perfeito. - Eu poderia ficar l uns trs meses, at chegar o nascimento de seu filho. E tu, por causa do trabalho, transcorridos uns dias, poderias regressar a Nazar. Quanto minha me, poderamos lev-la a Sforis, a casa dos irmos. O que achas? -J te disse que me parece muito bem. Equando iramos? - Se quiseres, dentro de trs dias.

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Comunicamos nossa deciso a Clofas e a Maria e eles concordaram. Pareceu-lhes muito boa a inteno de Maria d e ajudar a nossa querida tia. Ana tambm achou bom irmos, e no dia seguinte a acompanhamos casa de seus irmos em Sforis. - Vou consultar Judite, a irm de Nat - disse Maria -para ver se ela pode dar uma ajuda a Lia, minha querida cegui-nha. Penso que ela aceitar. E assim Maria e eu tomamos o caminho para a Judia. Seguimos a via do Jordo, porque no queria que Maria se cansasse ou corresse algum perigo. Em sete dias chegamos a Ain-Karen. A alegria do encontro foi indescritvel. Tia e sobrinha abraaram-se e felicitaram-se mutuamente, com grande cordialidade. Eu participava daquela alegria to grande e efusiva. Isabel disse tais coisas de Maria que eu fiquei pasmo. Louvou-a de mil formas, bendisse sua f e assegurou que Maria era a me do Senhor; que ao ouvir sua voz, a criana que trazia em suas entranhas havia saltado de pura alegria... Maria, com aquela facilidade que tinha de rezar e de utilizar pensamentos da Escritura, naquela ocasio orou admiravelmen-te. Eu no sei se cantava ou recitava, o certo que resultou um cntico maravilhoso. Ela disse assim, mais ou menos: Oh! Deus de nossos pais, bendito e louvado sejas para sempre!... Como poderei expressar minha alegria, minha admirao e meu agradecimento,

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por teres olhado para a humildade de tua serva?... De todo o corao te engrandeo, Senhor, meu Deus... Por tua benignidade, todas as geraes me chamaro bem-aventurada no correr dos sculos. Como s bom, Senhor, e como benigno teu grande corao!... Porque te inclinaste para os humildes, para os que nada contam e derrubaste os poderosos. Tu sempre contemplaste teu povo, Israel, com grande benevolncia. Eu estava admirado ao ouvir uma orao como aquela, to espontnea, to profunda, to autntica. Tambm Isabel a ouvia embevecida. Deixei as duas mulheres expandir-se em seus sentimentos e experincias e fui ter com Zacarias. Ele estava muito contente, mas, coitado, no podia falar. Algo devia ter-lhe acontecido no templo. Como nos explicou mais tarde, quando seu filho j havia nascido, ele teve uma viso no templo, na ltima vez que oficiou, quando oferecia o incenso no interior do santurio. Apareceu-lhe naquela ocasio um anjo do Senhor, mas o que aquele anjo lhe dizia parecia-lhe to maravilhoso, to fora das possibilidades humanas, que ele no acreditou, e o anjo lhe disse que permaneceria mudo at que se cumprisse o que lhe havia anunciado. Maria e Isabel sentaram-se num banco de madeira do jar-dinzinho que h diante da casa de campo, no longe do povoado. Isabel, mulher muito prudente, vendo a graa recebida de poder ser me, quis tomar todas as precaues para garantir aquela maternidade to singular. , passados uns meses, preferiu retirar-se quela casinha, para estar mais tranqila, com mais paz, sem movimento de visitas e livre do contnuo falar a que se via submetida antes. Ao cabo de uns poucos dias, despedi-me daquela casa abenoada e daquelas pessoas ainda mais abenoadas. Voltei a Nazar. No me faltava trabalho, ao contrrio; mas meu corao permanecia na Judia, em Ain-Karen. L estava meu mundo, meu tesouro, minha felicidade.

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Cheguei a Nazar. Todos me perguntavam pela viagem, por Maria, por Isabel. Tambm fui a Sforis ver Ana e dar-lhe as notcias. Ana ainda ficou l. Ern seguida, comecei a trabalhar. Mas comecei tambm a sentir quanto Maria me fazia falta. Os dias, antes luminosos e fugazes, pareciam-me agora cinzentos e montonos. E, medida que o tempo passava, um pensamento perturbador comeou a dominarme. Se Maria estivesse comigo, tudo se teria resolvido com uma nica palavra dela. Mas agora, sozinho, comecei a consumir-me e angustiar-me, assediado noite e dia por uma idia fixa que, no fundo, era uma tentao contra a esperana, como veria mais tarde. E eu no podia evit-la nem comunic-la a ningum. Era um martrio interior que me consumia. a Maria estava esperando o Messias anunciado pelos profetas. Ela era cabalmente a criatura mais digna da terra. Eu via isto de maneira clarssima. Mas, e eu? Qual era o meu papel neste mistrio? Os livros sagrados, se no me enganava, falavam somente da me do Messias. O anjo s falou com ela. A mim, Deus no me havia comunicado nada explicitamente... Alm disso, que formao tinha eu? Que educao, que cultura poderia dar a este Filho do Altssimo, ao Prncipe d; Paz? Por conseguinte, o verdadeiro pai era Deus, no eu. Na verdade, eu era apenas uma espcie de intruso nesta histria. E comecei a ficar sobressaitado. Por natureza eu era propenso angstia e apreenso, e frgil nos pensamentos. Mi

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nha tendncia era sempre de aumentar e exagerar as coisas, sobretudo as negativas. Necessitava sempre de uma palavra de algum que me serenasse. E naqueles dias no a encontrava... Sentia a solido como um peso insuportvel. Pensava comigo mesmo: "Certamente no era aquela a minha misso, nem a minha vocao. No teria sido tudo uma iluso, deslumbrado que estava pelo amor a Maria? A mim, Deus certamente no pedia nada. Devia ser um caminho equivocado. Meu irmo Sadoc falou-me um dia de presuno..." Ento, o que podia fazer eu, pobre Jos? Sozinho comigo mesmo, debatia-me interiormente entre dvidas pungentes. Pensava que no podia acolher Maria em casa para viver com ela. Estava a ponto de decidirme a voltar a Belm, minha casa, sem revelar os motivos a ningum, dissimulando o fato com a escusa de que seria por pouco tempo... Mas a minha famlia se teria alarmado. Pensei tambm em ir trabalhar no templo, como em outras ocasies, ou inclusive no estrangeiro - e m Damasco ou Tiro - pelo menos at que nascesse o filho de Maria. Estava to aterrorizado que pensei, inclusive, em ibandonar Maria para sempre, romper o acordo matrimonial, livorciar-me dela... Minha sade comeou a ficar abalada, estava ficando p-ido, sem apetite, emagrecia a olhos vistos... Maria, a de Clo-;as, deu-se conta deste meu estado. -Jos - disse-me ela um dia - est acontecendo alguma :oisa contigo. Comes pouco, ests plido. Tens algum pro-ilema? Alguma preocupao? - No, no nada, obrigado. Sinto falta de Maria. - o que eu pensava. natural. Mas, se queres, por que o vens comer aqui em casa todo dia? - Agradeo muito, Maria. Talvez eu v algum dia. Mas ca tranqila, esta ausncia de Maria j est chegando ao fim. Jentro em pouco irei busc-la. Agradeci muito sua ateno. Ela sempre demonstrou ter ira bom corao e interessar-se pelos outros. Quando a gen

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te se encontra na solido, como que perdido, como bom ouvir uma palavra amiga, como se grato por um gesto, um sorriso! Mas, por outro lado, eu relutava em ir a sua casa, com medo de que me escapasse alguma palavra sobre o problema que me torturava... E Deus compadeceu-se de mim. Viu a aflio de seu servo e me consolou. Inspiroume o recurso orao, recurso que me ajudou a resolver as situaes mais difceis e desesperadas. Eu ia rezar num lugar solitrio, como fez o profeta Elias no Sinai... Deus no podia abandonar-me, no me teria abandonado. Mais ainda, em meio minha aflio, sentia que Ele mesmo me indicava o caminho da paz...

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Lembrei-me da gruta de Catefa no deserto de Jud. Ao sul de Nazar existe outra, bem espaosa, chamada Cfisa. E um lugar agreste, quase se preci-rjj^ *^ sa subir pela rocha para chegar caverna. Certo dia, de manh, fui l com meu fiel Srec. No me dei onta da paisagem, to linda, nem das flores, nem do canto os pssaros, de to abatido que estava. No obstante, sentia o fundo do corao que saberia algo da parte do Senhor. Entrei na caverna, grande espao de rocha negra, com vaias voltas e reviravoltas e corredores. L dentro havia pomas e morcegos, mas no fiz o menor caso deles. Sozinho, narecinto sombrio e severo, cheio de ueJe majestade, sen-i-rne sobre uma esteira que trazia comigo. Pus, como Elias, cabea entre os joelhos, e rezei intensamente. Talvez por lusa do cansao ou da tristeza, em pouco tempo adormeci, o sei quanto tempo rezei, nem quanto tempo fiquei dor-lindo. Mas ali mesmo, naquela gruta que jamais esquecerei, aqueles momentos de profundo silncio, pareceu-me ver m anjo do Senhor, resplandecente, maravilhoso. Jos, filho de Davi - disse-me - no temas receber tua ;posa em tua casa e viver com ela. Porque o que foi concebi-ern seu seio realmente obra do Esprito Santo, tal como a te explicou. Tu pors o nome ao Filho que h de nascer, e u nome ser Jesus. Tu, Jos, hs de ser seu pai legal entre os ^mens, 0 pai davdico, que d testemunho de sua estirpe... E -a sabendo, Jos, que tambm tu encontraste graa aos olhos > Deus. Deus est contigo!

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O anjo desapareceu. A gruta permaneceu como sempre. Mas a mim me parecia tudo diferente, mais luminoso, mais bonito... - Oh, meu Deus, obrigado! Obrigado mil vezes por est libertao!... Graas infinitas te dou por tua bondade par com teu servo! Tu devolveste a paz, a alegria, a vida, minh alma! A partir deste momento, Jesus, Maria e eu permaneceremos unidos para sempre, fundidos num s e grande amor... num s corao!... A tormenta havia passado. Voltava a brilhar o sol, a paz, serenidade, a esperana... Tudo tinha mudado. Veio-me mente uma passagem da Escritura, no me lembro de que livro, que diz: Em vez de espinhos, crescero ciprestes, o mirto cres cer no lugar de urtigas: isso ser a glria do Senhor, um sinal eterno que perdurar. Quo verdadeiras me pareciam aquelas palavras e como as sentia apropriadas para mim! Para refletir serenamente sobre o que me havia sucedido, saborear ao mesmo tempo aquela paz recuperada, sentei-mev entrada da caverna, diante do panorama que se oferecia minha vista. Ento pude contempl-lo, magnfico, com todo o esplendor e beleza da primavera da Galilia: embaixo, a meus ps, estendia-se a grande plancie, como um tapete verde e perfumado; minha esquerda alavase, solitrio e majestoso, o Monte Tabor; diante de mim a colina alongada e suave de Mor com o povoado de Naim em sua vertente norte. Ao fundo desenhava-se a silhueta severa dos montes de Gelbo, e 4 minha direita a cadeia montanhosa do Carmelo. Contemplando o Carmelo, o monte de Elias, veio-me memria outro episdio daquele profeta, que tambm eu tinha vivido. Elias, sobre o Monte Horeb, havia experimentado um vivo sentimento de angstia e de temor, quando sentiu passar diante dele aquele vento com a fora de furaco,

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quele terremoto, aquele fogo devorador... e, finalmente, sen-iu a carcia do murmrio daquela brisa suave... Uma histria dntica minha... Agora podia ver bem claro: a Palavra do Senhor foi escri-a para o nosso bem, para a nossa consolao. E muitas vezes eflete nossa prpria vida, nossas prprias circunstncias... As rolas arrulhavam pelos pinhais da encosta. Pelo sop Io monte triscava um rebanho; o balir das ovelhas e o som da lauta do pastor resultaram para mim numa melodia jamais luvida, que emoldurava em beleza e alegria a fulgurante ex-erincia daquela manh.

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Em quatro dias cheguei casa de Zacarias. A alegria que me inundava converteu aquela viagem num passeio triunfal. Refiz o caminho, ao inverso, e, passando pela Samaria, admirei novamente a cidade de Sebaste. - Oh, Jos! Que alegria! - disse Maria, correndo ao meu encontro. - Como ests, Maria? Ests passando bem? - Muito bem, Jos. E no cesso de dar graas a Deus. - Sim, faz isso, tu que sabes orar to bem! - Ontem voltamos de novo a esta casa do povoado. Dentro de uns dias vai nascer o menino de Isabel, e querem que nasa em casa. E como vo as coisas em Nazar? Como est minha me? - Ela sente muito tua falta, Maria. Mas est contente porque voltars em breve. - Sim, em breve, assim que acabem as festas do nascimento. E os primos? -Todos bem. E todos te esperam. Muitas lembranas de Nat e de Judite. Ela est cumprindo muito bem teu encargo e Lia est muito contente c agradecida pela companhia e pela ajuda que lhe presta. - Oh, minha querida Lia, e Nat, e Judite! Quantas vezes penso neles!

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So JosSo Jos

Zacarias aproximou-se, ainda sem fala. Abracei-o estreitamente e permanecemos ss os dois. No obstante sua mudez, ele permanecia sereno, tranqilo, e o brilho de uma alegria interior adivinhava-se em seus olhos, antes empanados pela tristeza. Dentro em pouco nasceria seu filho, e este prximo acontecimento era superior a qualquer pesadume... Transcorridos os dias, Isabel deu luz um menino encantador. Os conterrneos diziam unanimemente que tudo tinha sido graa de Deus. No houve problema algum e o parto foi normal. As pessoas da vizinhana tinham uma f muito grande e sua alegria pelo acontecimento foi sincera e afetuosa. A figura de Zacarias era conhecida e respeitada, e tambm Isabel era considerada uma mulher muito virtuosa. Oito dias depois do nascimento, juntou-se muita gente na casa deles. Era o dia da circunciso do menino. Uma grande festa havia sido preparada. De Belm vieram minha me e meus irmos, e do templo alguns sacerdotes e levitas, amigos de Zacarias. Maria, mal avistou minha me entrando pela cancela, correu a seu encontro e exclamou: -Oh, Rute, s bem-vinda! Como ests? - Maria, minha filha, muito bem, graas a Deus! Que alegria ver-te, minha filha! - Quero dizer-te uma coisa que vai encher-te de alegria, que te far muito feliz!... -De ti e de Jos, meus filhos, s posso esperar satisfao e alegria... -Pois sim, Rute. Jos e eu estamos esperando um filho!... -Louvado seja Deus, Maria! Que alegria imensa! Como s er belo! Parece at que j estou vendo a criana... - Ser para dezembro, Rute, passada a festa da Hanuk. - Que Deus te abenoe, minha filha! Sabes muito bem o Jos>o Jos

- Sim, e acrescentou incrveis!...

que falta ele vai fazer! Dlat. Porque fez coisas

Maria e eu nos olhamos em silncio. Aquela notcia significava muito para ns. Dlat trouxe um farol de metal, muito artstico e reluzente: - Este farol para vs. Ser muito til. E o mesmo que eu usava naquela noite em que nos encontramos no deserto. Fiquei com muita pena, vendo-vos naquele estado. Estveis tremendo de frio, totalmente encharcados, perdidos por aquelas paragens to inspitas, e de noite... Estais lembrados? - Sim, como poderamos esquecer, Dlat. Vs fostes nossa salvao - disse Maria. - Ns? Deveis dizer antes que fostes vs que devolvestes a vida a Dimas... - Obrigado, Dlat - respondi. Este farol vai ser uma bela recordao para ns e nos ser de grande utilidade. No dia seguinte despedimo-nos. Mas antes de partir, os dois pequenos haviam recomeado a brincadeira do dia anterior. E na hora de irmos, deixaram os bastes apoiados num tronco de palmeira mal podada: o de Dimas, mais longo de p e c de Jesus colocado horizontalmente, formando uma cruz. - Adeus, bons amigos de El Fayum, at sempre! - Adeus, mas esperamos ver-vos novamente em breve. Esta casa vossa. Esperamos por vs. - Adeus, Dimas!... - Adeus, Jesus!... E os dois pequenos se deram um abrao rpido, mas to cotdial e espontneo que encheu nossa alma de alegria. Voltamos a Helipolis. A Moisina deu mostras de contentamento ao ver-nos. O Nret, feliz e incansvel, no se afastava de ns. Sua cauda cabeluda era bonita. Podamos sentir-nos seguros tendo-o como vigilante. O Srec, por sua vez, comeava a sentir o peso dos anos. Maria e eu j pensvamos no regresso nossa ptria, de acordo com as palavras do anjo. A notcia da morte de Herodes significava uma mudana na nossa vida. Maria lembroume: - Osias, o profeta da Samaria, tambm escreveu acerca de nosso Filho: "Do Egito chamei meu Filho..." Percebes, Jos, como nossos passos so guiados pela vontade de

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>o Jos

Deus? Jesus havia aprendido um pouco de egpcio e de grego, alm de nosso aramaico. Nos seus cinco anos, ele era para ns o verdadeiro Sol na Cidade do Sol, que Helipolis.

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Parte III - Judia, Egito, Galili

Depois de terminar todos os trabalhos que tnhamos em mos, fomos pela ltima vez a El Fayum. Costuma-se dizer que os gatos amam a casa e os cachorros, o dono. Por isso deixamos a gatinha com nossos amigos de El Fayum. L encontraria uma casa grande e bonita, toda para ela. Todos a aceitaram com carinho, especialmente o pequeno Dimas. O Nret ficou conosco. Nossos amigos queriam que ficssemos por l. Finalmente, encheram-nos de presentes, pensando na nossa longa viagem at a Judia. Cedemos a casinha de Helipolis a uma amiga de Maria que nos visitava com freqncia e precisava de uma casa para seu filho. Samos do Egito levando conosco uma recordao indelvel daquele pas acolhedor. Jamais podemos esquecer seus monumentos, sua riqueza... seu lindo pr-do-sol sobre o Nilo... Mas acho que seu clima mais mido prejudicou um pouco a minha sade. A tosse me voltava com alguma freqncia, e durava alm do normal, sem privar-me, no obstante, de trabalhar. Minhas tarefas de carpinteiro satisfaziam-me e, graas a Deus, eram o sustento de nossa vida. Depois de trs semanas de caminhada chegamos a Gaza. J havia falado com Maria sobre o nosso prximo destino: fudia ou Galilia? Ela via com bons olhos que ficssemos em Belm. Mas, como sempre, me dizia: "O Senhor j nos far saber nosso destino".

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Parte III - Judia, Egito, Galilia

Em Gaza, depois de comer alguma coisa e descansar um pouco numa hospedaria, vimos entrar no saguo um homem que parecia revestido de alguma autoridade, porque ao entrar todos se levantaram. Vinha com soldados e gente respeitvel. E dirigiu-se a dois oficiais que permaneciam na porta: - Na Judia - disse - h muito alvoroo e sublevaes. Arquelau herdou de seu pai Herodes somente os aspectos negativos. E um verdadeiro tirano. A Judia e a Samaria tremem debaixo de seu jugo. E Roma j est pensando em tomar decises. - Ouviste, Jos? - Sim. Est bem claro. Ns iremos para a Galilia. A Providncia nos guia. - Sabes o que eu estava pensando, Jos? Que as Escrituras tambm dizem: "O chamaro de nazareno..." - Uma boa confirmao, Maria. Mas como que podes conhecer to bem os nossos livros sagrados? - Toda a Escritura nos fala do Messias. Cada pgina como um anncio dele. Isso j nos dizia o rabino Ezequiel. O caminho at a Galilia durou dez dias. Tomamos a antiga Via Maris, a rota comercial que une a Mesopotmia com o Egito. Deixamos para trs a bonita plancie litornea e a esplndida capital de Herodes, Cesaria Martima. Diante dela se estende a frtil plancie do Saron, citada no Cntico dos Cnticos. Grandes bandos de cegonhas que se dirigiam ao norte nos acompanhavam. Sempre gostei muito das aves, grandes ou pequenas. Transposta a passagem de Meguido, chegamos Plancie de Esdrelo e, bem ao longe, j avistamos, com o corao emocionado, as colinas de Nazar. Chegamos ao entardecer. Havamos pedido a um vizinho que encontramos no caminho que anunciasse a nossa vinda. A surpresa de nosso retorno poderia ser muito grande, especialmente para Ana.

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De fato, Ana sofreu um breve desfalecimento com a alegria e emoo que sentiu. Mas conseguiu super-lo em pouco tempo, e a prpria alegria parecia dar-lhe, depois, como que uma nova vida. Tambm Clofas e sua mulher ficaram muito contentes. Durante a nossa ausncia tiveram mais trs filhos, alm de Susana: Tiago, Joses e Jud. Meu amigo Nat apresentou-se em seguida, j com seus doze anos, alegre e cordial como sempre. Sua irm Judite se havia casado com Efraim, o de Can. Mas a grande surpresa e a grande alegria para todos foi Jesus.

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Todos ficavam admirados com o nosso Filho, belo e forte, e repetiam os mesmos elogios que as pessoas lhe haviam feito em Belm. Ana se deleitava com aquela beleza e bondade de Jesus, e admirava a grande semelhana do Menino com sua me Maria. Jesus se fazia querido de todos, tinha algo irresistvel em seus olhos, em sua voz, em toda a sua pessoa. Em Nazar comeou um perodo de tempo tecido de paz, de alegria interior, de orao, de uma felicidade indescritvel. A presena de Jesus e de Maria enchiam meu corao de f e de alegria. J no podia pedir nada melhor a Deus. S agradecer-lhe, agradecer-lhe infinitamente sua bondade para conosco. Nossa casinha estava intacta. Clofas e Maria haviam cuidado dela. As pessoas de Nazar nos saudavam, faziam perguntas, diziam que tinham sentido muito a nossa falta... Havamos regressado nossa terra, a terra de nossos antepassados e nos sentamos em casa, rodeados de nossos familiares e amigos, e de todas as evocaes de cada canto de nosso pas. Mas no podamos esquecer o Egito. Sua recordao permanecia viva em ns. Ainda hoje lembro-me com nostalgia e quase com emoo daquele pas. O Egito nos abriu suas portas, nos acolheu, nos salvou. No Egito passamos uma das etapas mais fundamentais e felizes de nossa vida. Estivemos num pas onde tudo era grande e bonito: o deserto, o delta, o rio, os templos... Diziam-nos que a cidade de Alexandria, junto ao mar, era vinte vezes maior do que Jerusalm, cheia de monumentos e famosa em todo o mundo por seus grandes centros de estudo e arte. Contavam-nos que no Alto Egito h templos to grandiosos como em nenhuma outra parte do mundo, com esttuas colossais, obeliscos altssimos feitos de uma s pedra, e tmulos grandiosos. Nossa terra, a seu lado, insignificante, apenas um pedao de estepe. Mas nosso querido rabino Ezequiel j nos explicava que pelo menos numa coisa a Judia podia competir com o Egito: o templo de Jerusalm, construdo por Herodes. E verdade. Ns no vimos os famosos templos de Tebas, de Edfu ou de Abidos, mas os que vimos em Mnfis e em Helipolis no os consideraramos muito 217

superiores ao santurio de Jerusalm, nem em magnitude, nem em magnificncia. O que nos encantava cada vez mais naquela terra eram as pirmides. At nosso pequeno Jesus, admirado, se detinha a contempl-las sem pestanejar, envoltas em sua grandiosidade e em seu mistrio. Parece que eram tmulos dos reis egpcios h muitos sculos. O que nos chamou a ateno que a nica coisa que permanecia das antigas glrias do Egito eram seus templos e ;eus tmulos, como a indicar que s os valores do esprito permanecem na histria. Nem palcios, nem casas reais nanam perdurado. No aspecto humano, o Egito surpreendeunos por seu >ovo: bom, simples, hospitaleiro e religioso. Em Helipolis, idade muito antiga e muito grande, conviviam diversas reli-;ies: a religio tradicional do Egito, a que os gregos introdu-iram e a dos judeus. No havia problemas nem litgios, e tolos podiam render culto s suas respectivas divindades. Res-eito e liberdade dominavam a vida e a cultura daquele povo. Encontramos muitas pessoas com as quais travamos uma rande amizade: os j mencionados Dlat e Neya, de lem

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branca inesquecvel, e em Helipolis, o sacerdote do templo de Ra e o arquissinagogo Lsias, com sua esposa Assenet e seus dois filhos, Alexandro e Nike, grandes amigos de Jesus. O Egito, pas de refgio, foi para ns um pas de bno e de novos horizontes. L Jesus se abriu vida, l aprendeu a andar e a falar. E l ns aprendemos que ele, e s ele, seria para sempre o centro, o m e a luz de nossa vida.

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Ns dois, Maria e eu, amos cada ano a Jerusalm pela festa da Pscoa. Jesus ficava em Nazar, na casa da av. Confesso que amos Cidade Santa somente para cumprir a lei do Senhor; para ns esses dias eram dias de profunda saudade, de uma separao que nos doa fundo na alma: deixar Jesus parecia-nos algo alm de nossas foras e nos consumamos esperando a hora do retorno. Quando Jesus completou doze anos, achamos que tambm ele devia ir tomar parte naquela festa, que era uma de nossas grandes peregrinaes. A viagem pelo vale do Jordo foi para ele uma contnua surpresa, como se podia ver em seus olhos atentos. Maria indicava-lhe os lugares que lembravam histrias de nossos livros e ele ia olhando tudo demoradamente. Em Jerusalm, alojamo-nos na casa de tio Bartolomeu por uns dias. Fomos tambm a Belm e a Ain-Karen. Onde quer que fssemos, reinava a alegria, e a tristeza na hora da despedida. Chegou o ltimo dia de nossa estadia em Jerusalm. J havamos preparado tudo para voltar com outros peregrinos da Galilia, quando Jesus nos disse: -Tio Bartolomeu me pediu que levasse suas chaves casa do ferreiro de Silo. Vou j. No preciso esperar-me, podeis ir que eu vos alcanarei no caminho.

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A famlia de nosso tio, terminada a festa, ia passar uns dias numa propriedade que possuam perto de Emas. Assim podiam estar ao par do andamento das tarefas do campo; e enquanto ficavam fora de casa deixavam as chaves com um ferreiro amigo, que vivia no bairro de Silo. Maria e eu comeamos a caminhada de volta, certos de que Jesus chegaria pouco depois. Seu atraso no nos preocupava. Achvamos que estava em companhia de algum dos grupos. S ao anoitecer, chegando a hora do descanso da primeira etapa, constatamos que Jesus no estava em nenhum grupo. E impossvel descrever a nossa situao: dor, angstia, preocupao... At Maria, sempre to serena e confiante, por um momento foi tomada de preocupao (a nica vez em sua vida); mas logo depois recuperou sua serenidade habitual, fruto de confiana plena em Deus. Certamente naquela noite nem ela nem eu conseguimos pregar o olho. No dia seguinte, j estvamos em Jerusalm antes do meio-dia. Pensvamos que Jesus se tivesse perdido ou extraviado. Eu temia o pior, que algum o tivesse raptado... Fomos casa dos conhecidos. Tio Bartolomeu j no estava. Nossa nsia crescia e o corao estava aos frangalhos. -Jos, vamos ao templo. O que podemos fazer s rezar - disse-me Maria no dia seguinte. Fomos ao templo na primeira hora. E ali, sob o Prtico Real, no meio dos doutores da Lei, vimos Jesus que os ouvia e interrogava, e todos estavam admirados de sua sabedoria. - Meu filho! - exclamou Maria. Louvado seja Deus! Enfim te encontramos, meu filho! Ambos corremos a ele. Os doutores nos abriram caminho. Depois de abra-lo efusivamente, Maria observou-lhe: - O que fizeste conosco, Jesus, meu filho? Nem podes imaginar como teu pai e eu te procurvamos cheios de aflio!... E Jesus, com uma serenidade e maturidade que nos deixou surpresos, respondeu:

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- E por que me buscveis? No sabeis que eu devia dedicar-me s coisas que se encaminham glria de meu Pai? Na hora no compreendemos o sentido de suas palavras. Estvamos tomados pela alegria de hav-lo encontrado. Des-pedimo-nos daqueles doutores respeitveis e samos do templo. A grande alegria do encontro pusera um fim quele verdadeiro martrio.

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Jesus explicou-nos tudo. Quando descia pela rua que leva a Silo, uma casa bem velha daquele bairro, devido s chuvas insistentes de dias atrs, havia desabado, e dentro dela havia gente. Ento Jesus, tirando foras da fraqueza, dedicou-se, junto com outras pessoas, a tirar as pessoas dos escombros, entre barro, pedras, adobes e vigas desmoronadas... Parece que no houve nenhum morto, mas sim vrios feridos e machucados. Foi Jesus que tirou de debaixo de uma viga um garoto de sua idade que se encontrava naquela casa. Fez um esforo muito grande e levou-o, apoiado em seu ombro, penosamente, at a casa dele, na parte alta da cidade. O garoto, que se chamava Manasses, havia quebrado um p, sangrava na cabea e tinha o corpo cheio de hematomas. Os pais, que tinham uma casa bem espaosa, espantaram-se ao ver seu filho naquele estado e agradeceram muito a Jesus pelo esforo e vontade de salv-lo e traz-lo para casa. Mas Jesus estava muito cansado e sua tnica estava manchada de sangue e barro. Aquela boa gente obrigou-o a descansar e a me de Manasses lavou a tnica manchada. Eram pessoas muito religiosas. J passava do meio-dia. Jesus pensou que seria intil empreender a viagem naquela hora para juntar-se a ns, e permaneceu naquela casa onde nunca havia estado. Fez-se amigo de Manasses. Mais tarde, soubemos que aquele garoto, aos vinte anos, retirou-se para o deserto. Foi viver em comunidade com os chamados essnios, perto do Mar Morto.

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O dia seguinte, Jesus passou-o quase todo no templo. Sentia-se como que atrado por aquele lugar sagrado, cheio de recordaes da f de nosso povo. E l conheceu alguns mestres da lei, que o exortaram a voltar no dia seguinte, que foi exatamente quando o encontramos. Aquelas palavras de Jesus foram para mim um alvio. Primeiro no consegui entend-las de todo, mas depois, comentando-as com Maria, fui compreendendo todo o seu alcance. E medida que ia meditando nelas, ia ficando mais tranqilo. Ento me dei conta de que Jesus j era quase um homem, quase um adulto, apesar de seus doze anos, com uma grande maturidade interior. E sobretudo vi que ele sabia muito bem qual era sua misso e que j estava dedicando-se a ela com nlena conscincia. Pensei: "J tempo de retirar-te, Jos. Teu filho j sabe o jue deve fazer e como. Tua misso parece j cumprida." Sempre havia abrigado, no fundo do corao, uma espcie le temor, aquela vacilao e sentimento de minha prpria inlignidade, de minha incapacidade para a misso que Deus me avia outorgado. Maria, ao contrrio, sempre serena, cumpria naravilhosamente suas tarefas de me, mestra e educadora da-juele que o Altssimo lhe havia confiado. Mas aquelas palavras de Jesus revelaram-me que ele j ia ornando, sozinho, seu caminho. Por outro lado, para Maria, aquelas palavras foram mais luras. O corao de uma me tem algo misterioso quando se rata do amor dos filhos. Ela, aprofundando-se nas palavras le Jesus, deu-se conta, como eu, da maturidade dele e de que estava consciente de sua misso. Mas teve a sensao de ue Jesus estava separando-se um pouco dela para dedicar-se nteiramente sua misso, conforme a vontade de seu Pai do u. Isto a fez sofrer em silncio. Anos depois ela comentou >to comigo, lembrando ao mesmo tempo as palavras prof-cas do velho Simeo... Ao voltar Galilia, vimos que alguma coisa havia muda-o no pas. Respiravam-se ares novos, uma atmosfera de luta de revoltas. Alguns judeus, dos mais notveis, fugiram para exterior.

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Quando chegamos cidade de Arquelaide, construda por Arquelau, chamou-me a ateno uma comitiva de soldados romanos que se dirigiam ao norte. Eram uns trinta. Iam com cavalos e mulas, armas e carros carregados de vigas (acho eu). Mas depois soube que eram lenhos para o suplcio das crucifixes. Uma daquelas mulas levava uma carga de cravos grossos e longos, de mais de meio palmo. Aquilo me gelou o sangue nas veias. Roma queria dar um castigo, uma lio exemplar de como sabia castigar os rebeldes ao Imprio. Poucos dias depois o comprovaramos, e bem tragicamente. Quando as legies romanas entraram na Judia para domin-la, ao ser deposto Arquelau, encontraram muita resistncia, particularmente na Galilia, por causa dos rebeldes que no queriam aceitar aquela ingerncia poltica. Os chefes dos sublevados eram Judas de Gamala, cognominado o Galileu, e o fariseu Sadoc. Em poucos meses as foras romanas conseguiram limpar aqueles territrios de rebeldes, considerados por uma boa parte do povo como heris. Sforis, a capital, foi escolhida como um dos lugares daquele terrvel suplcio. Ao longo das vias que saam da cidade foram aparecendo aqueles troncos secos e macabros, plantados pelos romanos, e centenas de judeus foram pregados naquelas cruzes. Os habitantes de Nazar, aterrorizados, subiam o outeiro para

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observar, de longe, aquele horroroso espetculo. Ns queramos evitar que Jesus visse aquilo, mas no se fa

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ava de outra coisa, e foi intil. Tambm nosso filho, acompa-hado de Nat, foi ver o tremendo panorama... Ns resolve-nos seguilo. Maria me disse: Jos, observei que Jesus, ao contemplar de longe as cruzes, deixou transparecer em seus olhos uma expresso parti-:ular, bem profunda... Sim, eu tambm notei... Nos primeiros dias se ouviam, de Nazar, os gritos de lesespero daqueles desgraados, e viam-se bandos de corvos : abutres revoando por cima dos corpos. De noite eram as hie-las e os chacais que vagueavam ao redor daqueles infelizes rucificados. A crucifixo me deixou aterrorizado... Nunca >ensei que pudesse haver uma morte to horrvel, to desu-nana... Ela no saa do meu pensamento. Soubemos que uma das vtimas era o jovem Nabal, de Nazar, que um dia, anos atrs, me havia confrontado. Du-ante nossa estadia no Egito, ele se tornou insuportvel. Cer-o dia, numa discusso violenta, matou com uma facada um ompanheiro. Abandonou a famlia, retirou-se de Nazar e deriu ao grupo armado de Judas de Gamala. Como me doa aquela notcia! Meu corao encheu-se le tristeza. Pensei um momento no Nret e na Moisina, que e fizeram amigos porque se sentiram acolhidos. Se eu tives-e respondido quelas palavras de Nabal com mais mansido, iu simplesmente no tivesse respondido e tivesse procurado proximar-me dele com compreenso e serenidade, ser que le teria este fim to triste? Este foi um pesadelo que por mui-o tempo atormentou meu esprito, to imperfeito e jactan-ioso. Mais tarde, comentei o fato com Maria, e ela, como empre, devolveu-me a paz. Uma onda de dio contra Roma espalhou-se por toda a udia. Muitos judeus no suportaram aquela violncia e fu-iram para outros pases; outros incubavam secretamente o rprio esprito de rebeldia contra os dominadores. E, alm

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disso, a partir de ento o dinheiro dos impostos comeou a ser enviado a Roma; no tempo de Herodes ficava no pas e servia para fazer muitas coisas: cidades novas, portos, o prprio templo de Jerusalm... Mas o tempo ajuda a cicatrizar as feridas e, pouco a pouco, os nimos exasperados foram se acalmando. A vida recuperou sua normalidade. E dei graas ao Senhor por ternos feito escolher Nazar como lugar de residncia: uma cidade pequena, quase ignorada, e distante de tantas turbulncias. A situao de Belm, neste aspecto, teria sido mais difcil, porque estava mais exposta ao movimento das tropas ocupantes e s reaes do povo.

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Nossa vida em Nazar transcorria sob o signo da bno. A paz e a alegria sempre reinavam no nosso lar. Mas ao mesmo tempo comearam a dimi-nuir minhas foras fsicas e, com cias, m i n h a sade. O trabalho era muito, e tanto eu como Jesus estvamos sempre ocupados, particulamiente quando comeou a construo da nova capital da Galilia, Tiberades. medida que o tempo passava, eu admirava cada vez mais Maria, e dava graas ao Senhor por Jesus... As palavras de um daqueles sbios orientais, que vieram a Belm, foram uma exortao e uma profecia... Como eram verdadeiras! Eu no saberia dizer se em nossa famlia o mais importante era amar ou deixar-se amar... O amor transformava tudo, convertia tudo em beleza, em luz... A noite se transformava em dia e a dor em esperana e alegria. Deus nos manifestava seu amor ajudando-nos a cada passo. - Quando se faz o bem, Jos - dizia Maria -, no se sabe o bem que se faz... Porque Deus que traz o bem em suas mos, ou melhor, nossas prprias mos se convertem nas mos de Deus... Lembro-me de uma conversa que tive com Ana sobre Maria. Comentei com ela aquela observao sobre o olhar de Jesus ao ver as cruzes. E Ana me disse: verdade, Jos. Embora iguais aos olhos de Deus, homens e mulheres so muito diferentes. Os homens tm mais fora, so mais dominadores... As mulheres, ao contrrio, tm mais pacincia e fortaleza... O fato de trazer em seu seio um filho, faz com que a mulher o sinta dia e noite, que pense nele constantemente, que o deseje, que o ame imensamente... que se identifique com ele j antes de nascer... Por seu filho a me sofre, chora, canta, feliz... Por isso, mais tarde, a 229

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me pode quase prever ou pressentir o futuro de seu filho... Maria, certamente, sabe alguma coisa a respeito de Jesus que tu no podes saber, intui algo que tu no podes compreender sobre o sofrimento de seu Filho... Ela, de toda maneira, saber resistir. Tu, querido Jos, penso que no agentarias... desmoronadas, precisamente porque amas tanto a Jesus, porque s forte, mas no com a fortaleza de uma me... Acho que as palavras que o ancio de Jerusalm vos disse tambm vo neste sentido: Maria sofrer, a espada ser somente para ela. Sentia-me envolto na sabedoria de pessoas extraordinrias. Ana o era realmente, como tambm minha me; mas Ana possua, alm disso, a riqueza da contnua meditao dos textos sagrados. Certo dia, pouco antes de sua prpria morte, falando de Maria - que ela conhecia muito melhor do que eu - mostroume aspectos de sua virtude e daquela riqueza interior que transparecia no exterior, naquele resplendor to singular... - Maria - disse-me - uma criatura excepcional, Jos. Nem eu nem ningum poder compreender a insondvel riqueza espiritual que ela possui. como se uma superabun-dncia de bno, de benevolncia divina, de graa, de amor e de alegria tivesse sido derramada sobre ela. Algo de Deus, de seu Esprito, deve haver nessa criatura... E isto, para sua misso particular. Aquele cntico que ela entoou em Ain-Karen, segundo me disseste, refletia algo de sua rica interioridade. Jos, acho que tudo est em funo deste Filho maravilhoso que Deus vos deu. Maria revelou-me o segredo, e eu o mantenho guardado como o maior dos tesouros... e por ele louvo o Senhor continuamente. Ambos sois abenoados do Altssimo... Este Filho explica tudo nela... sua graa, sua bondade, sua alegria, sua misso... E este Filho explica tambm tudo em ti, querido Jos. Tu foste escolhido, entre os homens. Tu,

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da famlia de Davi, foste pensado desde sempre pela mente de Deus para ter esta misso: ser o pai davdico deste Filho do Altssimo, gerado por minha filha Maria para este desgnio de salvao do Senhor... Bendiz sempre ao Senhor, Jos! Digo isto a ti, eu que conheo o corao humano e a vida, e :onheo especialmente Maria. Bendizei juntos sempre ao Senhor, doador de todo bem e de toda bno!

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Nazar!...Quanto hei de agradecer ao Senhor por este lugar que guarda os maiores tesouros da terra!... Lar de paz e harmonia, de amor e de sim-$LP plicidade, nossa casa tem sido um incessante hino de louvor a Deus. Pensei nisto muitas vezes: venho da Judia, nome que significa louvor a Deus; minha vida no pode ser mais do que louvor contnuo ao Senhor; Maria o verdadeiro templo do Altssimo; conosco temos o Esperado de Israel, o Filho do Senhor... Este Filho nos satisfaz plenamente, no temos outro desejo. Ele enche nossos dias, nossas festas, nossa vida... Sua presena nos cumula e nos cumulou de paz. Minhas apreenses, minhas dvidas, minhas impacincias transformaram-se, graas a ele e a Maria, em certeza, serenidade e confiana. E que alegria v-lo crescer, tornar-se cada dia mais maduro, mais responsvel, mais profundo!... Que grande emoo eu sentia quando o ouvia chamar-me Abba, pai!... Quando pequeno brincava com seus companheiros, corria, pulava, ria... Nat se fez muito amigo dele e se sentia como seu guardio; no o deixava nunca, sobretudo quando se afastavam um pouco de casa. Mas sua vida pareceu mudar desde o dia em que o encontramos no templo. Aquele dia significou muito para ele, ou melhor, para ns, no sentido de que nos demos conta de sua maturidade espiritual e de sua independncia nas coisas que se referem a seu Pai do cu. Mas sua piedade e devoo no o dis

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traam de sua tarefa diria, que era tambm a minha. Ah! Pensar que durante tantos anos o tive a meu lado... que me falava, me olhava... me perguntava como se faziam os trabalhos de meu ofcio... Como poderei agradecer suficientemente a Deus por esse privilgio?... Jesus um exmio trabalhador, bom, paciente, generoso. Muito mais forte do que eu, consegue carregar sobre os ombros troncos pesados, conhece muito bem seu ofcio de carpinteiro e construtor. Freqentemente fomos chamados, ns dois ao mesmo tempo, aos postos de trabalhos de Sforis ou Tiberades. Eu no tirava a vista dele, apesar de saber perfeitamente que ele no tinha nenhuma necessidade de mim nem de minha proteo. Mas estava de tal maneira cativado por ele que no podia afastar-me um instante de seu lado. S imaginar que ele poderia morrer j me parecia insuportvel. Acho que no agentaria se tal acontecesse. Deus far, estou certo, como lei natural, que eu morra antes dele. Um dia Maria me disse: -Jos, estou muito contente e sou muito grata por esta magnfica cisterna que escavaste para mim antes de nosso casamento. Sua gua sempre fresca e muito boa. Mas, se tu no te importas, gostaria de ir de vez em quando fonte do povo. Sinto necessidade de encontrar-me com as pessoas, de ouvi-las, de participar de algo de sua vida. sempre uma ocasio de fazer um pouco de bem. E, efetivamente, a cada trs ou quatro dias, sempre acompanhada por Susana, a filha de Clofas, ela vai fonte. Leva :onsigo uma cesta com algo para dar: ou frutos de nosso hor-:o, ou ovos, ou alguma pea de tela que ela mesma teceu. E sempre encontra algum necessitado. E outra virtude de Ma-"ia saber reconciliar, fazer as pazes entre as famlias ou entre 3s vizinhos. As pessoas a chamam para pedir-lhe conselho ou )ara que sirva de medianeira em questes familiares difceis.

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Em casa, Maria se encontra como se estivesse no templo. Sem nunca descuidar do trabalho, parece-me que ora continuamente. Sua mente est como que absorta em Deus, em dilogo com Ele. Sua confiana em Deus permanece sempre firme. Aprendi tanto dela! E tambm Jesus. Desde pequeno teve uma mestra insupervel nas coisas de Deus e da vida. Ouvi-la cantar uma delcia. Seu sorriso jamais desaparece de seus lbios. A paz e a alegria transbordam de seu corao, conserva todas as graas da juventude e o resplendor de seu olhar ainda me fascina...

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Os anos comeavam a pesar-me. Certo dia, regressvamos Jesus e eu de Can e, ao subir o outei-ro de Nazar, senti-me de repente muito

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cansado. Tive que colocar no cho, por uns momentos, umas varas que estava carregando. Jesus pegou as varas e juntou-as com as que j estava levando. Mas aquele dia marcou meu declnio. Desde ento me cansa muito o andar, e o trabalho penoso me est proibido. Mas aceito tudo das mos de Deus. Viver com Jesus e Maria j um dom maravilhoso... Eles me querem bem e cuidam de mim, como sempre, com muito carinho. O Senhor dispe sempre as coisas de seus servos de forma providencial. Trs anos antes desta minha piora na sade, teve lugar a morte, prevista mas no menos dolorosa, de Ana, me de Maria. Eu a considerava como uma me de Israel, cheia de sa-sedoria, de experincia e de f. Sua morte foi muito sentida Dor todos, e particularmente, como natural, por Maria. Era ima mulher admirvel e querida de todos. E seu maior mri-:o o de ter sido a me e mestra de Maria. Apenas meio ano depois, morria tambm minha me, Rute. la soube cumprir seu papel de esposa, me e av. Informa-lo de sua enfermidade, fui a Belm, e Jesus quis vir comigo, ilegando: - A av Rute se sentir feliz de ver seus filhos e netos a eu redor. - Sim, muito feliz. E especialmente com a tua presena, neu filho. Maria anos atrs, havia revelado minha me o mistrio do Senhor. Depois de ouvir, ela acreditou, como Ana, e ambas choraram de alegria e gratido. Num momento em que me encontrava a ss com minha me, perguntei-lhe: - Me, guardaste o segredo de Maria? E ela respondeu: - Jos, vs, homens, sabeis guardar um segredo; ns, mulheres, sabemos guard-lo no fundo de nosso corao. Palavras sbias, bonitas, fruto de um corao habituado a ler os sinais da vida e do corao. O anjo da morte visitou tambm a casa de AinKaren. E sinto que tambm a mim o Senhor vai chamar-me dentro de pouco tempo. Estamos em suas mos. Lembro-me com nostalgia de muitos outros episdios de minha vida, inseparvel da de Jesus desde que nasceu. Por exemplo, nossas peregrinaes a Jerusalm. Naquelas ocasies, sempre destinvamos um dia para ir ao deserto, com Jesus'e seus amigos Nat e Manasses. 235

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Atraa-nos irresistivel-mente aquele deserto, sempre magnfico... Muitas vezes amos precisamente ao lugar onde levado o bode expiatrio, cada ano, na festa da Expiao. E como o corao do deserto. Ali passvamos muito tempo em silncio, admirados do panorama e em profunda orao. E ali observei sempre, tambm eu, muitas vezes, aquele olhar profundo e pensativo de meu Fiho... Quem sabe o que ele evocava ou pressentia!... Certamente algo de sua futura misso. E agora, meus queridos, agradeo-vos de todo corao. S Deus sabe o bem que me fizestes com vossa presena nestes dias em que Maria e Jesus foram a Jerusalm. Eu, sozinho, sem ningum a meu lado, teria morrido de tristeza. E a primeira vez que fiquei sozinho em casa, por causa de minha doena. Maria queria ficar comigo, mas eu mesmo insisti que ela acompanhasse Jesus.

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Viestes todas as tardes fazer-me companhia... Deus vos enviou e eu lhe dou graas por isso e tambm sou muito grato a vs. Pedistes que eu vos falasse um pouco de mim. Estas so as minhas recordaes, tudo que ouvistes. H outras tambm que eu, em minha pequenez, no seria capaz de descrever. Se um dia pedirdes a Maria, ela poder fazer-vos uma narrativa muito mais rica e mais bela...

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dou Pofo IIICap. 2: "O mais belo entre os filhos dos homens" (Salmo 45,3). Cap. 5: "Nasceu-nos um Menino e um Filho nos foi dado..." (Is 9,5). Cap. 9: A profecia de Daniel que fala das setenta semanas encontra-se em Dn 9,20-27. Cap. U: "Clamei ao Senhor em minha aflio, e Ele me respondeu..." (Salmo 120,1). Cap. 16: "O lobo conviver com o cordeiro e a pantera se deitar com o cabrito" (Is 11,6). A bno do Senhor transbordado" (Eclo 39,22). como o Nilo

Cap. 17: "Do Egito chamei meu Filho" (Os 11,1). Cap. 28: "Ser chamado nazareno" (Mt 2,23; o fundamento bblico desta citao no literal deve ser buscado em Is 11,1; ou talvez em Is 42,6; 49,8). Eplogo: "Amado de Deus e da humanidade" (Eclo 45,1, referido a Moiss).

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Assim falou-nos Jos, e pouco depois nos deixou. Sua se era persistente. As foras o abandonaram lentamente, i mesmo costumava dizer que a famlia de Davi tinha pro-mas de pulmo... Talvez seja verdade, mas em compensa->, que tesouro nos havia dado a estirpe de Davi neste seu :cendente!... Sempre humilde, silencioso, sereno e sacrifi-lo, soube oferecer aos outros o melhor de si mesmo... De-ado a seu trabalho, queria fazer as coisas bem e a tempo. E apreciado por todos tambm por isto. Sabia ouvir, paci-e e generoso, e quantas vezes fazia seu trabalho de graa, indo os clientes eram pobres ou de famlias necessitadas... Amava muito a orao e seu trabalho era como se fosse ia orao... e toda a sua vida um canto de louvor ao Senhor, o gosta