Revista SescTV - Janeiro de 2013

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1 FOTO: DIVULGAÇÃO Janeiro/2013 - edição 70 sesctv.org.br Foto: Pedro Abude MÚSICA ERUDITA CAIO PAGANO E QUARTETO DE CORDAS DA CIDADE DE SÃO PAULO DOCUMENTÁRIO ROMANCE DE FORMAÇÃO APRESENTA A VIDA DE UNIVERSITÁRIOS TEATRO O TRABALHO DE GRUPOS QUE USAM ESPAÇOS NÃO CONVENCIONAIS

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A diretora Julia de Simone fala sobre seu documentário Romance de Formação. No artigo deste mês, Regina Porto, compositora e pesquisadora, analisa a música erudita na televisão.

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O olhar feminino em 22 curtas-metragens

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destaques da programação 4

entrevista - Julia de Simone 8

artigo - Regina Porto 10

As manifestações artísticas das mais diversas naturezas têm, em comum, uma capacidade inerente de instigar o espectador, convidando-o a se confrontar com novos olhares, concepções, formas, sons e sensações. Às vezes, essas novas propostas encontram reações inesperadas por parte do público. Foi assim, por exemplo, na pintura, com o Impressionismo do final do século 19; na literatura, com o surgimento do Realismo, em reação ao Romantismo; e também na música, ao longo da História.

No Brasil do início do século 20, um grupo de artistas que buscava uma arte ge-nuinamente brasileira organizou, em fevereiro de 1922, a Semana de Arte Moderna. Houve quem aplaudisse, mas também quem vaiasse as manifestações, com sua estética inovadora. O SescTV relembra, neste mês, parte da programação musical da Semana de 22, com a exibição do espetáculo Caio Pagano e Quarteto de Cordas da Cidade de São Paulo. O concerto, gravado no Theatro Municipal de São Paulo, relembra composições apresentadas naquela ocasião, com obras de Heitor Villa-Lobos e de Claude Debussy.

E se a arte instiga e transforma, também transpõe o espectador para diferentes realidades. A experiência cinematográfica permite o acesso ao universo do outro, como propõe o documentário de longa-metragem Romance de Formação, que o canal exibe neste mês, pelo qual o telespectador acompanha a rotina de estudantes brasileiros em universidades pelo mundo.

Mudar o foco e aprofundar a relação entre artistas e espectadores também motiva grupos de teatro de várias regiões do País, que trocaram os palcos convencionais pelas ruas, como mostram quatro episódios inéditos da série Teatro e Circunstância.

A Revista do SescTV deste mês entrevista a cineasta Julia de Simone, diretora do filme Romance de Formação. O artigo da produtora Regina Porto aborda o espaço destinado à música erudita na televisão. Boa leitura e bom 2013!

Danilo Santos de MirandaDiretor Regional do Sesc São Paulo

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CAPA: Foto: Pedro Abude

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Funk à brasileira

banda black rio, formada em 1976, mistura referências do funk e do soul com o samba

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O movimento de valorização da cultura negra, a mistura de referências musicais e a busca por uma sonoridade que tivesse o swing e a batida brasileira mobilizaram o Rio de Janeiro no início da década de 1970. Do Beco das Garrafas às casas noturnas da zona sul carioca, esses músicos trocavam referências, vindas especialmente do funk, do soul e do jazz norte-americano, acrescentando a esse som o samba dos subúrbios e dos morros. Essa efervescência logo chamou a atenção das gravadoras e de um público que buscava novidades. Artistas como Jorge Ben, Wilson Simonal e Tim Maia tornaram-se populares, abrindo o caminho para um gênero até então desconhecido dos brasileiros. Foi nesse contexto que, em 1976, o saxofonista Oberdan Magalhães criou a banda Black Rio. “Nossa sonoridade é totalmente antropofágica, porque junta os ritmos brasileiros com o funk e o soul dos anos 1970. A banda trouxe uma nova expressão de música brasileira, o samba funk”, afirma William Magalhães, filho e sucessor de Oberdan.

A proposta inovadora da banda espalhou-se rapidamente para outras regiões do País. O público se surpreendia com versões de canções como Na Baixa do Sapateiro, de Ary Barroso, e Tico-tico no Fubá, de Zequinha de Abreu. “A banda tinha essa proposta de fazer releituras, dentro desse trabalho de fusão

do funk com o samba”, explica William. O músico João Parayba, um dos criadores do Trio Mocotó, acompanhou o início desse processo. “A Black Rio explodiu nos anos 1970. Os músicos eram muito conceituados, tinham espaço para desenvolver esse trabalho”, diz Parayba.

Após a morte de Oberdan Magalhães, em 1984, a Black Rio foi desfeita. Mas, após 16 anos, seu filho retomou o projeto. “Voltei porque achei que [esse trabalho] não podia morrer e virar peça de museu. A gente tem de mostrar essa cultura que influencia tanta gente e buscar nosso reconhecimento no Brasil”, afirma William. A formação atual do grupo conta com William Magalhães, no teclado; Robson Couto, no baixo; Rodrigo Coelho, na percussão; Paulo Camelo, no saxofone; Douglas Antunes da Silva, no trombone; Marcus Vinicius Manfredi, no trompete; Bruno Silveira, na bateria; e Isaac Negrene, na guitarra. À proposta inicial, a nova geração de músicos incluiu recursos da música eletrônica e influências do rap. “Mas a base estrutural é o samba funk. É a síntese inicial”, diz William.

O SescTV exibe, neste mês, show inédito da banda Black Rio, na série Instrumental Sesc Brasil. No espetáculo gravado no Sesc Consolação, em julho de 2012, a banda apresenta repertório do Gafieira Universal, seu segundo disco, e duas músicas do trabalho mais recente, Super Nova Samba Funk. Destaques para Mr. Funk Samba e para a versão de Cravo e Canela, de Milton Nascimento. Direção artística para TV de Max Alvim.

Segundas, às 22h

gilson britoDia 7/1banda black rioDia 14/1

toninho ferragutti e bebe kramerDia 21/1

patavinas Jazz clubDia 28/1

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filme romance de formação, de Julia de simone, aborda o cotidiano de quatro Jovens em universidades

Do sonho à conquista

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Segundo dados recentes do Censo da Educação Superior, divulgado pelo Ministério da Educação, o Brasil conta, atualmente, com 6,37 milhões de estudantes universitários. Embora esse número tenha mais que dobrado na última década, é ainda considerado pequeno diante de uma população de quase 200 milhões de habitantes. E se o acesso ao diploma de graduação é restrito, alcançar uma vaga nas mais conceituadas universidades do Brasil e do exterior é missão ainda mais complicada.

O cotidiano de quatro desses jovens brasileiros que conseguiram uma vaga nessas disputadas universidades é tema do documentário Romance de Formação, longa-metragem de estreia da cineasta Julia de Simone, que o SescTV exibe este mês. A diretora acompanhou o cotidiano de estudantes da Harvard Law School, Stanford University, ambas nos Estados Unidos; da Universidade de Música de Karlshure, na Alemanha; e da PUC do Rio de Janeiro.

Esses brasileiros enfrentam, em comum, uma rotina diária de muitas horas de estudo e leitura, um fascínio pela vida acadêmica e o sonho de construir uma carreira sólida, com estabilidade profissional. Mas também têm de enfrentar a solidão, a saudade de casa, da família e dos amigos, além de lidar com dilemas como a tomada de decisões sobre seu futuro, numa emancipação muitas vezes prematura.

Cedo, eles aprendem a lidar também com as cobranças pelo cumprimento de prazos, tornam-se

desenvoltos na elaboração de seminários e relatórios – apropriando-se de uma língua estrangeira – e se acostumam a conviver com outros colegas igualmente dedicados aos estudos.

Romance de Formação propõe um olhar reflexivo sobre a Educação, sem abrir mão da poesia, sintetizada no texto O Haver, de Vinícius de Moraes, que ilustra o filme: “Resta essa faculdade incoercível de sonhar / De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade / De aceitá-la tal como é, e essa visão / Ampla dos acontecimentos... / Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto / Esse eterno levantar-se depois de cada queda / Essa busca de equilíbrio no fio da navalha / Essa terrível coragem diante do grande medo, e esse medo / Infantil de ter pequenas coragens”.

DoCUMENTáRIo

romance de formaçãoDireção: Julia de SimoneDia 18/1, às 20h.Reapresentações: dia 19/1, às 23h; dia 21/1, às 19h; dia 28/1, às 23h.

DOCumentÁrIO

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De volta à Semana de 22

Transformar, subverter e propor uma arte essencialmente brasileira. Esses eram os objetivos de um grupo de artistas brasileiros que, em fevereiro de 1922, organizou a Semana de Arte Moderna. Tomados de inspiração pelos ares de mudança que sopravam do exterior, e do desejo de renovar o contexto cultural no Brasil, esses artistas trouxeram uma nova proposta na literatura, nas artes plásticas, na arquitetura e na música, inaugurando o modernismo no País.

Dentre as apresentações musicais, um dos mais atuantes participantes da Semana de 22 foi o compositor Heitor Villa-Lobos (1887-1959). Em três espetáculos, ele apresentou ao público do Theatro Municipal de São Paulo – o primeiro palco erudito a receber suas obras – as composições Segunda Sonata; Segundo Trio; Valsa Mística; A Fiandeira; e Ginete do Pierrozinho, dentre outras. Além de Villa-Lobos, os concertos da Semana também contemplaram obras de outro compositor moderno, o francês Claude Debussy (1862-1918), como La Terrace des Audiences du Clair de Lune; Clair de Lune; e La Soirée dans Grenade, interpretadas pela pianista Guiomar Novaes.

Em fevereiro de 2012, nas comemorações de 90 anos da Semana de Arte Moderna, o pianista brasileiro Caio Pagano e o Quarteto de Cordas da Cidade de São Paulo foram convidados para levar novamente ao palco do Theatro Municipal de São Paulo o repertório apresentado naquela ocasião. O concerto foi gravado e será exibido neste mês pelo SescTV.

Na primeira parte, Pagano faz uma apresentação solo das obras de Debussy. Num segundo momento

caio pagano e quarteto de cordas da cidade de são paulo apresentam obras em homenagem à semana de arte moderna

música erudita

do espetáculo, Pagano homenageia o brasileiro Heitor Villa-Lobos, interpretando O Ginete do Pierrozinho; Acordei de Madrugada; Manquinha; e Na Corda da Viola. Em seguida, o Quarteto de Cordas da Cidade de São Paulo apresenta, também de Villa-Lobos, Scherzo Satírico do Quarteto Nº 3 – Pipocas e Patocas. O Quarteto é formado por Betina Stegmann e Nelson Rios, no violino; Marcelo Jaffé, na viola; e Robert Suetholz, no violoncelo.

Além das obras de Villa-Lobos e de Debussy, Pagano e o Quarteto se juntam, na parte final do concerto, para interpretar a obra Quinteto em Mi Bemol Maior, Op. 44: Allegro Brillante; Scherzo Molto Vivace; e Allegro ma non Troppo, de Robert Schumann (1810-1856). O programatem direção para televisão de Daniel dos Santos.

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caio pagano e quarteto de cordas da cidade de são pauloDia 27/1, às 20h

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Lugares improváveis

série mostra, em quatro episódios, o trabalho de grupos que se apresentam em espaços não convencionais

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teatrO e CIrCunstânCIa

Se o palco é, por excelência, o espaço em que o teatro acontece, ele também pode ser reinventado e reinterpretado, assim como tudo o que diz respeito a essa arte. A busca por novos espaços para a manifestação da arte teatral instiga e motiva grupos de teatro de várias regiões do Brasil. A ocupação desses lugares não convencionais acaba alterando a própria dramaturgia presente no trabalho desses grupos. Até mesmo a escolha dos temas e a construção das cenas passam a considerar o espaço como um elemento fundamental. “A nossa pesquisa vai além do espaço físico em si: se ele é quadrado, redondo, alto, baixo, quente, frio. A gente também investiga os sons desse espaço. A rua entra na peça, é uma intervenção. Isso influencia nos temas que a gente discute. É impossível não trazer a cidade, o meio no qual a gente vive, para nossas questões”, afirma a atriz Kelly Crifer, integrante do grupo Teatro Invertido (MG).

A encenação em espaços alternativos – como a escadaria de uma igreja, praças, parques, depósitos e até o pátio interno de um hospício desativado – muda não apenas o foco do ator, mas também sua relação com o espectador. “Nossa pesquisa de recepção, que está diretamente ligada a essa pesquisa espacial, se dá ao incluir o espectador, a fim de que ele se sinta fundamental para o espetáculo em si, tanto física quanto dramaturgicamente. Fisicamente, procurando intimidade, itinerância, interatividade. E dramaturgicamente, chegando ao caso de se atribuir um personagem ao espectador”, diz o diretor Ivan Segahara, do grupo Os Dezequilibrados (RJ).

temporada: rua, o grande teatro do mundoTerças, às 22h

a ideologia da ruaDia 8/1

sementeira do teatro popularDia 15/1

tradição da rua no novo teatro nordestinoDia 22/1

espaços ressignificados pelo dramaDia 29/1

teatro e circunstância

Atrás dessa escolha há, por parte desses grupos, a intenção de sensibilizar seu público, que não raras vezes é surpreendido pela arte em seu caminho cotidiano. “A ideia é não só que a pessoa assista ao espetáculo teatral, mas que ela passe por uma experiência teatral e artística na sua vida”, explica o diretor Roberto Oliveira, do grupo Depósito de Teatro (RS). Trata-se, também, de propor uma participação mais ativa e engajada dos atores com seu público. “O fato de fazer teatro tem de ser transformador. A pessoa não pode entrar numa oficina de formação e permanecer igual, sem se abrir e se mostrar”, resume Oliveira.

Neste mês, o SescTV exibe quatro episódios inéditos da série Teatro e Circunstância, com o tema Rua, o Grande Teatro do Mundo. Cada programa apresenta o trabalho de grupos que deixaram os palcos convencionais para levarem sua arte a lugares improváveis, dando uma nova dinâmica ao teatro e também às cidades em que estão inseridos. A série tem direção de Amilcar M. Claro e pesquisa, roteiro e entrevistas de Sebastião Milaré.

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entrevIsta

“A arte não ensina”

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“o tema da educação interessa como possibilidade de encontrar o outro, de entender as relações

humanas. é um ponto de partida para encontrar a diversidade

humana”

Romance de Formação é seu primeiro documentário de longa-metragem. Qual sua motivação para a escolha desse tema? Eu trabalhava na produtora Imatizar, com Guilherme Coelho, quando ele me propôs dirigir esse filme. O projeto já existia, como um argumento de se realizar um filme sobre brasileiros que cursavam as universidades de excelência no mundo. Aceitei o desafio e assumi o projeto, realizando todo o trabalho de pesquisa e acompanhando os estudantes. Quais as dificuldades para realizar um filme desse porte? Você contou com alguma consultoria técnica? Não, não tivemos consultoria. Fizemos um primeiro recorte, que era o de buscar alunos bolsistas. Isso nos levaria a um determinado perfil de alunos, que já eram vitoriosos por terem conseguido essa bolsa. Entramos em contato com instituições que oferecem bolsas a estudantes brasileiros, como a Capes e a Fundação Estudar. Eles nos passaram nomes, contatos e histórias. Chegamos a um total de 70 estudantes. A partir daí, passamos a entrevistar todos esses alunos, por skype, até chegar aos quatro personagens do filme. Nessa fase, mandamos para eles uma pequena câmera, para que filmassem sua rotina diária. A princípio, isso também fazia parte da pesquisa. Mas o material gravado foi tão bom que decidimos incluir algumas cenas no corte final. Esse processo foi muito interessante, porque fez dos personagens coautores do filme. Quando a gente finalmente viajou para encontrá-los e filmá-los [dois nos Estados Unidos, um na Alemanha e outro, no Rio de Janeiro], houve uma parceria, uma construção coletiva. Os planos eram fixos, a câmera em cima do tripé, e eles sabendo quando e como estavam sendo filmados. Em média, ficávamos uma semana com cada um, exceto o personagem do Rio, que pudemos encontrar mais vezes. Qual foi a repercussão do filme? Romance de Formação estreou no Festival de Realizadores do Rio, em outubro de 2011. Depois, foi lançado em circuito comercial, em sete cidades brasileiras, mas por pouco tempo. No Rio, ficou em cartaz por cinco semanas. Em São Paulo, duas. Mas também fizemos, na época do lançamento, algumas sessões seguidas de debates nas universidades UFRJ, PUC-Rio e ESPM-SP. Essa troca foi interessante para entender melhor esse universo de estudantes

Julia de Simone, 30 anos, é formada em Publicidade,

mas nunca chegou a exercer a profissão. Apaixonada

por Cinema, ela começou a trabalhar com produção de

documentários, fazendo assistência de direção. Após

um ano e meio vivendo em Barcelona, onde cursou

pós-graduação nessa área e realizou o curta-metragem

Encanto, Julia voltou ao Brasil e, em outubro de 2011,

estreou seu primeiro longa-metragem: o documentário

Romance de Formação, sobre o tema Educação, que o

SescTV exibe neste mês.

entrevIsta

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universitários. E agora teremos a estreia na televisão [no SescTV, dia 18/1, às 20h]. Acho que a TV é uma janela imprescindível para o documentário, porque o espaço que existe no cinema é muito pequeno. A TV é o caminho para alcançar um público maior. Há outros filmes recentes tratando o tema da Educação, tanto no Brasil quanto no exterior. Você percebe um aumento do interesse dos cineastas pelo tema? Não saberia dizer. Como cineasta, não tenho nenhuma intenção de ser educadora. Estou fazendo Cinema. Claro que o tema da Educação tem suas especificidades e dificuldades; a princípio, é um assunto duro, sem nenhum atrativo do ponto de vista cinematográfico. Para mim, o tema da Educação interessa como possibilidade de encontrar o outro, de entender as relações humanas. É um ponto de partida para encontrar a diversidade humana. Em Romance de Formação, queríamos investigar a relação desses brasileiros com grandes instituições de ensino, fato que já carrega, em si, uma carga muito pesada: “você vai estudar em Harvard!”. O que nos movia no filme, até pela proximidade da idade e das condições sociais, era: por que não sou eu? Por que também não fiz essa escolha? É essa vontade de entender o outro, tendo nossas referências pessoais como ponto de vista. E, além disso, tentar entender o próprio sistema educacional dessas instituições, porque é rigoroso, é padronizador, exige persistência, dedicação e disciplina. E tem essa coisa da solidão e da melancolia, um traço comum aos personagens, que vem dessa disciplina extrema e desse lugar que não permite muito, que é quase militar. Há interesse do público por filmes com esse tema? Acho que filme é filme, não importa muito a temática, nem mesmo o gênero, se é ficção ou documentário. O que vai fazer dele um bom filme é a maneira com que a história é contada. Por exemplo, sobre o tema da Educação, como realizadora, é difícil prever se terá público ou não. Ser e Ter [Être et Avoir, de Nicolas Philibert, 2002] fez dois milhões de espectadores na França. E é essencialmente um filme sobre Educação, mas também é um filme sobre o ser humano e sobre a vida. De que forma o Cinema contribui para a ampliação do debate a respeito da Educação? O Cinema tem a possibilidade de contribuir no pensar, no sentir e no questionar. Mas não acho que o Cinema “deva contribuir” para nada. Arte é arte, está num outro patamar. Acho que a questão maior é como nos relacionamos com essa arte. Mais do que o papel e a função que ela deveria ter. Cabe a nós aprender com a arte e não à arte

ensinar nada. Essa resistência do público sobre o que se relaciona à Educação já vem daí, desse papel que ela “deve ter”. Então, é isso: a arte não tem que carregar esse estigma, a arte não ensina. Nós é que aprendemos com ela, ampliando nosso repertório cultural, acumulando uma bagagem a partir das experiências que temos com ela. Na sua opinião, falta criatividade por parte dos canais na criação de programas sobre Educação? Falta criatividade, sim, por parte dos canais, falta empenho artístico. Se você se dispõe a tratar um tema qualquer que também está presente na grade escolar, não pode simplesmente sair explicando: “a Revolta da Chibata foi assim...”. Vai ficar chato. Romance de Formação trata sobre a Educação no mundo hoje e, nem por isso, o filme tenta explicar como é. Essa questão de tentar informar já dificulta e já aprisiona, porque enquadra e deixa o cineasta refém desse propósito. O pensamento tem de estar livre da necessidade de educar. Por isso, a arte é algo que vai além. Faz com que você aprenda de outras formas, faz você questionar. Quais seus próximos projetos para Cinema? Em 2013, realizarei dois documentários; um deles é o filme Porto, que trata sobre as obras de urbanização no porto do Rio de Janeiro. A ideia é pensar essas transformações da cidade e como lidamos com nossa memória e nossa história. O outro é Aracati. Esse é o nome dado a um vento que sopra no Ceará, todos os dias, no mesmo horário, do litoral para o sertão, viajando por 400 quilômetros. Vamos percorrer o caminho desse vento e mostrar de que modo cada lugar se relaciona com ele. No litoral, aproveitando sua força como energia eólica, até o interior, nos vilarejos do sertão, onde as pessoas saem de suas casas para aproveitar o sopro desse vento e amenizar o calor.

“cabe a nós aprender com a arte e não à arte ensinar nada...

nós é que aprendemos com ela, ampliando nosso repertório

cultural, acumulando uma bagagem”

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A música erudita na televisão

Regina Porto é compositora, curadora de concertos e pesquisadora.

Há três formas de transpor a música erudita para o meio visual – e em nenhum caso é tarefa fácil. A primeira é a transmissão da situação de concerto propriamente, com ou sem informação adicional. A segunda consiste no gênero documental, a partir de uma investigação do fazer musical por um olhar poético ou pelo viés jornalístico. A terceira, e a mais dificultosa, é a de caráter didático, idealmente uma adequação entre conteúdo musical e formato televisivo, no propósito da formação de público leigo sem ferir o público informado.

Em qualquer caso, é um desafio. Música é uma matéria complexa, e a ausência do especialista – aquele que responde pela produção ou pela pós-produção de conteúdo, com pleno domínio do jargão e do léxico musical em vários idiomas – pode prejudicar, senão comprometer,fortemente a credibilidade do produto final.

Gravar um concerto exige a presença de ao menos um profissional da música altamente qualificado, capaz de ler com fluência partituras de toda espécie – incluindo a orquestral – para orientar os cortes e a movimentação das câmeras. A “microfonação” é um complicador a mais. Na Alemanha, resolveu-se a questão com a formação, em nível superior, da figura interdisciplinar do tonmeister (mestre de som), um híbrido de músico e engenheiro de áudio na dupla competência de dimensionar e equacionar parâmetros de acústica e estética.

Já as implicações do gênero documental são de outra ordem. De forte teor autoral, o documentário vai além da “documentação” da performance, para buscar o intangível da música ou a subjetividade de quem a vive – imersão que demanda tempo de convivência e de observação e, em boa dose, autoridade na interlocução com o tema ou o personagem.

É raro encontrar, mundo afora, núcleos audiovisuais independentes que cumpram com sucesso essas duas frentes – documento e documentário. Caso notável é o pequeno selo alemão Accentus Music, cuja valente aparição há menos de três anos surpreendeu o mercado dos clássicos. Com um padrão de cinema no registro audiovisual de concertos, sob o comando do premiado diretor e documentarista Paul Smaczny, o selo dispõe em catálogo de títulos documentais preciosos (como Abbado, Barenboim, a Orquestra Simón Bolivar), parcerias institucionais com o Festival de Lucerna, a Gewandhaus de Leipzig, a Staatskapelle e a Staatsoper de Berlim, além de cooperações estratégicas com emissoras públicas, como a WDR (Alemanha) e a NHK (Japão), e os canais online privados Arte (Bélgica) e Medici (França-Itália).

Há mais expansão que retração nesse campo, sobretudo nos países ricos, conforme avalia Claudia Toni, consultora de música e dança da Fundação Padre Anchieta. No Brasil, onde a prática e a apreciação da música erudita formam uma militância de poucos, e igualmente poucos são os canais que investem recursos nesse repertório, a TV Cultura constitui exceção. Entre produções próprias e material estrangeiro, a programação de clássicos da emissora subiu para 60 programas anuais (o equivalente a cem horas). E esse número deve aumentar.

Replicada em território nacional, sua grade comporta concertos da Osesp e de grandes orquestras do mundo, documentários internacionais antológicos (como o de Arvo Pärt ou da West-Eastern Divan Orchestra) e o concurso Pré-estreia, que, além do prêmio em dinheiro, leva jovens talentos à Juilliard School. Em 2013 a Cultura contemplará efemérides (Verdi, Britten, Wagner e Stravinsky, nos cem anos da Sagração da Primavera), montagens de ópera dos grandes palcos do mundo e, em negociação, títulos da Accentus. “Nada substitui o exercício de estar na sala de concerto”, diz Toni. “Mas para a população fora dos grandes centros ou sem poder aquisitivo, a TV trará sempre a oportunidade da experiência auditiva.”

Se é verdade que a “espetaculosidade” do concerto bem televisionado aumenta em número e qualidade a audiência, resta às TVs não comerciais o desafio maior da produção educativa. Fazer uso legítimo das linguagens da música e da TV, porém, pressupõe não só um bom tanto de virtuosismo inventivo quanto um razoável aporte financeiro.

Curiosamente, a contribuição mais sofisticada nesse campo se deu ainda quando a TV era em preto e branco e um artigo de luxo: nos anos 1950. Modelo até hoje insuperável, os oito programas da série Omnibus, apresentados pelo gênio vulcânico e “telegênico” de ninguém menos que Leonard Bernstein, foram resultado de um aporte conjunto de grandes redes (CBS, NBS e ABC) e a Fundação Ford. Histórico, o projeto ainda serve de modelo na comunicação de tópicos complexos, com seu formato inovador aliado a técnicas revolucionárias de câmera, iluminação, design, roteiro, cenário, marcação de palco e performance em estúdio. Mais: toda essa “coreografia” era transmitida ao vivo! A sobrevida desses filmes, hoje patrimônio dos Arquivos da Televisão Americana, pode e deve ser constatada em DVDs.

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para sintonizar o sesctv: anápolis, Net 28; aracaju, Net 26; araguari, Imagem Telecom 111; belém, Net 30; belo horizonte, Oi TV 28; brasília, Net 3 (Digital); campo grande, JET 29; cuiabá, JET 92; curitiba, Net 11 (Cabo) e 42 (MMDS); fortaleza, Net 3; goiânia, Net 30; João pessoa, Big TV 8, Net 92; maceió, Big TV 8, Net 92; manaus, Net 92; natal, Cabo Natal 14 (Analógico) e 510 (Digital), Net 92; porto velho, Viacabo 7; recife, TV Cidade 27; rio de Janeiro, Net 137 (Digital); são luís, TVN 29; são paulo, Net 137 (Digital). uberlândia, Imagem Telecom 111. no brasil todo, pelo sistema DTH: Oi TV 28 e Sky 3. Para outras localidades, consulte sesctv.org.br

O SescTV apresenta, neste mês, três episódios inéditos da série Curtadoc. Artista e a Rua, dia 1º/1; Visões Urbanas, dia 8/1; e Ideologias, dia 15/1, sempre às 21h. Com direção de Kátia Klock, a série reúne documentários em curta-metragem, divididos por recortes temáticos, em programas com uma hora de duração.

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site do SescTV.

A diversidade cultural presente na arte paulistana é destaque na programação do SescTV no dia 25/1, data em que a metrópole comemora 459 anos. O show instrumental do grupo Panorama do Choro Paulista Contemporâneo traz repertório de novos e antigos compositores, às 17h. Os sambas de Adoniran Barbosa, inspirados no cotidiano de São Paulo, servem de base para o espetáculo de dança Adoniran, do Ballet Stagium, às 18h. Em Teatro e Circunstância – Agitação na Praça Roosevelt, uma reflexão sobre as mudanças arquitetônicas e socioculturais a partir da chegada de grupos teatrais na região central da cidade, às 19h. Arnaldo Antunes, Chico César e Arrigo Barnabé participam do Era Iluminada – Vanguarda Paulista, às 20h, lembrando o cenário musical paulistano do final dos anos 1970. A arquitetura urbana também é discutida em Objetos da Cultura – Calçada da Paulista, com enfoque histórico e social de uma das mais famosas avenidas da cidade, às 21h30.

mosaico paulistano

Em 31 de março de 1964, um golpe militar deu início ao regime que seria mantido até a década de 1980. O presidente deposto era João Goulart e sua história política é reconstituída pelo diretor Silvio Tender no documentário de longa-metragem Jango: Como, Quando e Por que se Depõe um Presidente da República (14 anos), que será exibido no dia 20/1, às 22h.

Dois anos após o falecimento da mãe, os irmãos Felipe e Fabrício se reencontram. Antigas lembranças, boas e ruins, são resgatadas, bem como os problemas da convivência em família. Esse é o foco do curta-metragem de ficção Distantes, dos diretores Bruno Peres e Bruno Martins, que o SescTV exibe no dia 10/1, às 21h.

a história de Jango

Direção Executiva Valter Vicente Sales Filho Direção de Programação Regina Gambini

Coordenação de Programação Juliano de Souza Coordenação de Comunicação Marimar Chimenes Gil

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