Revista MURAL N. 95

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Fósseis: Uma visão Jurídica Jalusa Prestes Abaide faz observações sobre o assunto, objeto de estudo do Direito Ambiental. Matéria Atualidade Artigo A boate Kiss, o Voo da Morte e o Brasil: O Big Brother da Impunidade, por Francisco Dirceu Barros “Mudança na Súmula 244 do TST garante a estabilidade da empregada gestante, seja qual for a modalidade do contrato de trabalho”, explica Rodolpho Cézar Aquilino Bacchi Vigência do novo regime de previdência complementar dos servidores públicos federais. Silvio Moura de Oliveira Ano 09 - Nº 95 www.midiajuridica.com.br REVISTA MURAL JANEIRO-FEVEREIRO 2013.indd 1 3/3/2013 10:26:15 PM

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Revista MURAL 2013

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Fósseis:Uma visão

JurídicaJalusa Prestes Abaide faz

observações sobre o assunto, objeto de estudo

do Direito Ambiental.

Matéria Atualidade ArtigoA boate Kiss, o Voo da Morte e o Brasil: O Big Brother da Impunidade, por Francisco Dirceu Barros

“Mudança na Súmula 244 do TST garante a estabilidade da empregada gestante, seja qual for a modalidade do contrato de trabalho”, explicaRodolpho Cézar Aquilino Bacchi

Vigência do novo regime de previdência complementar dos servidores públicos federais. Silvio Moura de Oliveira

Ano 09 - Nº 95 www.midiajuridica.com.br

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Conselho Editorial:Dr. Aurélio Wander BastosDra. Cláudia Ribeiro Pereira NunesDr. Ivan Simões GarciaDr. Ricardo Lodi RibeiroDr. Nilton Cesar Flores REDAÇÃOReportagem, Editoração eletrônica e Projeto gráfico: Mídia JurídicaJornalista Responsável: Carlos Wesley Coordenação Geral: Rossana FiscilettiCoordenação de Pesquisa: André CostaCoordenação de Marketing e Comunicação: Fernando FreitasEditor da arte/finalização: Jorge Raul de SouzaComercial: Paulo MoretzsohnIlustração de capa: Sarkao

Publicidade: Webcom Comunicação, Marketing e Publicidade Ltda. Para anunciar: (21) 2215-7291 e 9956-7625 Para falar com a Redação:Tel.: (21) 2215-7291Av. Almirante Barroso, 2, 18º andar, Cep: 20.031-000E-mail: [email protected] M U R A L é uma publicação da Mídia Jurídica.www.midiajuridica.com.br A Mídia Jurídica não se responsabiliza por informações e opi-niões contidas nos artigos, entrevistas, depoimentos e teor dos anúncios publicitários, que são de inteira responsabilidade dos seus autores e não refletem, necessariamente, a posição desta revista.

Todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida, e a vida era a

luz dos homens. João 1:3-4

04- Entrevista – Jalusa Prestes Abaide

06- Novo regime de previdência complementar dos servidores

federais - Silvio Moura de Oliveira

08- Continua na Web

10- Brasil: O Big Brother da Impunidade - Francisco Dirceu Barros

14- Atualidade: A estabilidade da empregada gestante - Rodolpho Bacchi

17- Muralteca - Direito Tributário em destaque

18 - Mais que vencedores - Frustrações no serviço público

sumário

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editorialFim da mordomia

roSSaNa FiSCiLETTiCoordenadora

A proposta para retirada da mordomia dos 14º e 15º salários pagos aos parlamen-tares, parada desde o ano passado, ganhou celeridade e foi aprovada pela Câmara dos

Deputados poucos dias após a posse do seu novo presidente, Henrique Eduardo Alves.

Antes de chegar à Câmara dos Deputados, o projeto, de autoria da Senadora Gleisi Hoffmann, foi aprovado pelo Senado Federal (maio de 2012).

Os dois salários extras, tradicionais há 67 anos, atualmente eram concedidos no valor de R$ 26,7 mil a cada um dos 594 parlamentares (513 deputados e 81 senadores). A supressão desta regalia representa uma economia anual de 31,7 milhões aos cofres públicos ou até mais, pelo fato de alguns gabinetes receberem o 14° salário mais de uma vez no decorrer de um mesmo ano.

Segundo reportagem publicada pelo jornal Correio Brasiliense (outubro de 2012), a ajuda de custo era paga a quem exercesse o mandato por 30 dias, a contar da primeira vez que assumisse o cargo no ano. Dessa forma, um deputado titular que se licenciasse após pelo menos um mês no exercício do mandato, recebia a parcela integral de R$ 26,7 mil, além do salário normal e do 13º proporcional. O suplente que assumisse e permanecesse no cargo,

por no mínimo 30 dias, ganhava a mesma quantia. Imagine só!Os 14º e 15º salários, conhecidos como ‘auxílio paletó’ eram

atacados por diversos segmentos da sociedade, entre eles a Asso-ciação dos Servidores do Ministério Público Federal, que ingressou com ação no STF, no final de março de 2012, questionando a constitucionalidade de decretos legislativos garantidores do pa-gamento de dois salários, um no início e outro no final do ano.

As ajudas de custo foram criadas na vigência da Constituição de 1946, com o objetivo de custear viagens e mudanças, por conta das dificuldades da época. Com o passar dos anos, tais benefícios deixaram de se justificar e se tornaram imorais, diante da realidade do povo brasileiro.

Por conta dos fatos e da opinião pública, diversos Estados da Federação estão abolindo os benefícios que eram pagos às suas assembleias legislativas. Assim, a supressão das regalias parlamentares não se constitui apenas em uma grande economia para o Brasil, como também em um passo favorável na direção da moralidade. Momento de profunda tristeza para os parlamentares que saíram em defesa da manutenção do privilégio histórico do qual sentirão saudades.

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entrevista

FóSSeIS: UMAVISãO JURíDICA

Rossana Fisciletti

O estudo do Direito Ambiental passa por questões muito espe-ciais. À medida em que vai ampliando seus horizontes, novas questões interessantíssimas acabam surgindo e que certamente merecem uma abordagem especial, como é o caso do estudo dos fósseis sob a perspectiva jurídica. A Revista MURAL foi até Jalusa Prestes Abaide, uma das maiores autoridades sobre o tema, com importantes obras publicadas.

Do ponto de vista do Direi-to, qual é o enquadramento jurídico dos fósseis na nossa legislação? Os restos de plan-tas e animais encontrados no subsolo de uma propriedade privada brasileira são consi-derados como bens públicos ou privados?

Apesar dos fósseis serem defi-nidos constitucionalmente como integrantes do patrimônio cultural brasileiro (art. 216, V) e eles serem encontrados no solo e principal-mente no subsolo, (e aí surgiria a pergunta se eles estariam também compreendidos entre os bens da União nos temos do art. 20, IX da CF, o que mudaria o tratamento jurídico) a única regulação sobre estes espécimes (diz-se espécimes porque ainda não há uma defini-ção jurídica que estabeleça o bem jurídico tutelado) não se encontra no Código de Minas e tampouco na Lei de Patrimônio Cultural, mas em lei especial, qual seja o Decreto-lei 4.146/42. Este decreto-lei não estabelece nenhum regime jurídi-co além de citar a competência do órgão responsável pelo setor mineiro nacional para autorizar a extração. O código de mineração apenas transfere a competência ao

legislador ordinário para estabele-cer um regime jurídico aos fósseis não combustíveis. O constituinte e o legislador ordinário apenas tipificaram os bens de interesse arqueológico, mas não regularam a matéria em relação aos bens de interesse paleontológico. E o novo código de mineração mantém a mesma indefinição já posta no art. 10, incisos I e II do código de então.

Os fósseis encontrados no sub-solo de uma propriedade privada, conforme a legislação atual, são considerados bens públicos; o pro-prietário do imóvel deve comunicar o órgão competente para examinar. Este órgão deveria ser o IPHAN, que de imediato deve identificar seu valor cultural e tratar da sua catalogação em livro de tombo específico, porém, na prática isto não acontece.

A legislação brasileira que trata os assuntos relativos à pesquisa, extração e preser-vação de fósseis em relação às de outros países, pode ser considerada avançada?

A lei Catalã define melhor a questão e poderia ser um exemplo em termos de marco jurídico. Nos EUA é permitido explorar e comer-

Jalusa Prestes abaide: Coordenadora do curso de Direito da UNES (Faculdade do Espírito Santo); Pós-Doutora pela Université de Saint Esprit de Kaslik (Líbano); Doutora em Filosofia Jurídica, Moral y Política pela Universidade de Barcelona (Espanha); Mestra em Ciências Jurídicas e Políticas pela Universidade Federal de Santa Catarina. Pesquisadora na área de Direito Ambiental com atuação destacada em Urbanismo, Meio Ambiente e Direitos Humanos. É membro do Conselho Editorial da Revista Brasileira de Direito Ambiental; do Instituto Memória Editora de Projetos Culturais; da Associação dos Professores de Direito Ambiental do Brasil (APRODAB); da Asociación Interdisciplinar de Profesionales del Medio Ambiente (APROMA - Espanha), além ser uma das fundadoras da Asociación de Análisis sobre Derecho y Sociedad (Oñate/Espanha). É líder de Grupo de Pesquisa CNPq (Laboratório de Estudos Internacionais – LEIn: http://www.ufsm.br/lein) e do Núcleo de Estudos sobre Bens Naturais do Domínio Público (NEJURP). É autora de vários artigos científicos publicados em revistas especializadas de caráter nacional e internacional e de obras como: “Fósseis - Riqueza do Subsolo ou Bem Ambiental?” e “Regime Jurídico dos Fósseis Vegetais”, ambas publicadas pela Editora Juruá.

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CURSO HUMBERTO PEÑA DE MORAESDIREITO CONSTITUCIONALHUMBERTO PEÑA DE MORAES DIREITO ADMINISTRATIVOGUILHERME PEÑA DE MORAES www.penademoraes.com.br CONFIRA O PROGRAMA COMPLETO DOS CURSOS NO SITE!

MATRÍCULAS ABERTAS 1º SEMESTRE 2013

TELS: 2620-1236, 2710-8340, 9981-6123, 9922-3893RUA LUIZ LEOPOLDO FERNANDES PINHEIRO, 551/1402. CENTRO – NITERÓI

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cializar fósseis. Para saber se aqui no Brasil é mais ou menos avança-da, deveríamos ter um regime jurí-dico que nos permitisse estabelecer uma comparação em todos estes aspectos, e é o que falta.

A atividade da paleontologia é compatível com a preserva-ção ambiental?

Certamente, é típica do pesqui-sador paleontólogo ou geólogo, mas deve haver cuidado na defi-nição de pesquisador. Quem inter-preta o conceito de pesquisador é o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

Os fósseis vegetais são ri-quezas do subsolo ou bem ambiental? Proteção dos bens fósseis e outros bens naturais: como compatibilizar?

Este foi o objeto da minha tese. Entendo que pode ser as duas coisas, riqueza do subsolo ou bem ambiental, dependerá do legislador ordinário estabelecer como pre-tende proteger estes valores, pois os fósseis possuem uma tríplice natureza e a sua proteção pode se dar pelo domínio público, pela via cultural enquanto sítio; pela via mi-neral enquanto riqueza do subsolo; ou pela via ambiental ou urbanística enquanto espaço natural ou artifi-cial de especial interesse.

O interesse turístico pelos sítios de fósseis vertebrados põe, de alguma forma, em risco aspectos de preservação ambiental? A nossa legis-lação ambiental situa este questionamento?

Como falei antes, nenhuma le-gislação dispõe sobre os fósseis, ex-ceto o decreto-lei do ano de 1942, porém sendo um fóssil tombado pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e des-tinado a um fim turístico, seja pelo valor cultural ou científico, deve, sim, haver compatibilidade com a proteção do meio ambiente, por isto minha preocupação em sempre

denunciar a falta de legislação que objetivamente defina que tipo de bem se está falando, e qual o valor que está sendo protegido para de-terminar sua destinação. Há risco de impacto sobre o meio ambiente e sobre a propriedade privada, seja pela exploração do turismo ou pela simples ação do pesquisador (que precisa de autorização expressa do MCT, pois é o órgão que saberá avaliar quem é pesquisador). Estes precisam ser enquadrados legal-mente, a fim de evitar depredação do ambiente e do próprio bem (fóssil).A exploração econômica dos

combustíveis fósseis (petró-leo, gás e carvão) obedece à legislação própria? Esta legislação é eficiente e sufi-ciente para proteger o meio ambiente?

Sim, obedece a lei própria, porém este tema específico sofreu alterações nos últimos anos, não poderia neste momento fazer uma abordagem crítica a respeito da eficiência da lei em relação à pro-teção ambiental, mas é um estudo que estou iniciando especialmente porque trabalho em uma região rica neste aspecto, que é o estado do Espírito Santo. A região de Ca-choeiro do Itapemirim é uma zona de grande impacto no setor da mineração.

O ensino jurídico no Estado do Espírito Santo, particularmen-te na UNES, sob sua coorde-nação, terá o viés de formar profissionais para militância na advocacia privada ou para as carreiras públicas, pela via do concurso público?

O foco sempre é formar um livre pensador, um cidadão, um ser humano de bons costumes para o exercício de sua função como advogado e isto, por si só, deverá prepará-lo também para concursos, pois ele saberá direcionar sua von-tade de modo firme.

“Os fósseis possuem uma

tríplice natureza e a sua proteção pode se dar pelo domínio público,

pela via mineral e pela via ambiental

ou urbanística”

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artigo

ReGIMe De PReVIDÊNCIA COMPLeMeNTAR DOS

SeRVIDOReS PÚBLICOS FeDeRAIS TITULAReS De

CARGO eFeTIVO. QUANDO SeRÁ O INíCIO De SUA VIGÊNCIA?

Silvio Moura de Oliveira

O sistema previdenciário brasileiro é integrado, fundamentalmente, pelo regime geral de previdência social

(RGPS), pelos regimes próprios de previdência dos servidores públicos (RPPS) e pelo regime de previdência complementar, sendo que o último se caracteriza pela facultatividade, capitalização dos recursos e organização autônoma. O re-gime complementar é operado por entidades abertas de previdência complementar ou seguradoras e pelas entidades fechadas de previdência complementar, acessíveis a públicos específicos, como é o caso da Funpresp, ora objeto de análise.

As Emendas Constitucionais 20/98 e 41/2003 concederam status constitucional à previdência complementar e previram a possibilidade de criação de um regime de previdência complementar para os servidores públicos titulares de cargos efetivos. Após a instituição dessa modalidade de previdência, os benefícios a serem concedidos pelo RPPS serão limitados ao valor máximo estabelecido para os benefícios do RGPS.

Atendendo ao comando constitucional su-pra, foi publicada, no dia 02 de maio de 2012, a Lei 12.618, oriunda do PL nº 1.992/07, que institui o regime de previdência complementar para os servidores públicos federais titulares de cargo efetivo. Nela consta a permissão de criação de três entidades fechadas de previdên-cia complementar, denominadas Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Executivo (Funpresp-Exe), Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Legislativo (Funpresp-Leg) e Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do

Silvio moura de oliveira:Graduado em Ciências Jurídicas

e Sociais pela Universidade

Federal do Rio do Janeiro (UFRJ) e

Especializado em Direito Público.

Membro Integrante do Instituto

Brasileiro de Direito Previdenciário

(IBDP). Advogado da Consultoria

Jurídica da Caixa de Previdência dos

Funcionários do Banco do Brasil.

Poder Judiciário (Funpresp-Jud). O ponto que mais desperta atenção de

estudiosos sobre a matéria e dos que possuem interesse em ingressar nos quadros do serviço público federal é o momento em que terá início a vigência desse novo regime de previdência.

Tal interesse decorre do fato de que, após iniciado esse regime de previdência, os novos servidores que desejarem receber um benefício final superior ao limite máximo estabelecido para o RGPS necessitarão ingressar na respec-tiva Funpresp e contribuir para um plano de benefícios complementar ao RPPS.

Destaque-se que tais planos de benefícios serão estruturados na modalidade contribuição definida, que são aqueles em que “os benefícios programados têm seu valor permanentemente ajustado ao saldo de conta mantido em favor do participante, inclusive na fase de percepção de benefícios, considerando o resultado líquido de sua aplicação, os valores aportados e os benefícios pagos”1.

Apesar da Lei 12.618 ter sido publicada em 02 de maio de 2012, a Funpresp não entrou em funcionamento até o presente momento, razão pela qual os interessados em concorrer a uma vaga para cargos efetivos no serviço federal, bem como os que já foram aprovados, mas aguardam sua convocação e também os que já foram nomeados, mas não tomaram posse, possuem dúvidas em relação ao regime de previdência ao qual estarão submetidos.

Além disto, na Lei 12.618/12, ora encon-tramos informações de que o novo regime se iniciará com a criação de qualquer uma das Fundações (art. 33, I), ora de que se iniciará somente após a aprovação dos regulamentos dos planos de benefícios (Art. 30) e há, ainda,

1Art. 3º da Resolução CGPC 16, de 22 de novembro de 2005.2FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. 25 ed. São Paulo: Atlas, 2012. p.6153IBRAHIM, Fábio Zambitte. A criação do Fundo de Pensão dos Servidores Públicos Federais – Primeiras Impressões sobre a Lei 12.618/12, Disponível em < http://www.impetus.com.br/data/jpf_article/137/file/funpresp.pdf >, Acesso em: 15 jan. 2013.

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o que denominaremos de vigência expressa e de vigência tácita do novo regime (Art. 31, § 1º), dificultando a compreensão da questão por parte dos interessados.

De imediato, é possível afirmar que somente os servidores que já tenham tomado posse antes do inicio de vigência do novo regime de previ-dência não estarão a ele submetidos. Tal afir-mação decorre do que dispõe a Lei 8.112/90, conhecida como o Estatuto do Servidor Público Federal, que, no artigo 7º, estabelece que a investidura do servidor em cargo público de caráter efetivo ocorre com a posse.

José dos Santos Carvalho Filho esclarece que “a posse é o ato de investidura pelo qual ficam atribuídos ao servidor as prerrogativas, os direitos e os deveres do Cargo. É o ato de posse que completa a investidura, espelhando uma verdadeira ‘conditio iuris’ para o exercício da função publica.(...). Com a posse, completa-se também a relação estatutária da qual fazem parte o Estado, de um lado, e o servidor de outro” 2. (grifos nossos)

Fábio Zambitte Ibrahim , comentando o artigo 33, I, da Lei 12.618/12, defendeu que o prazo limite para a vigência inicial do regime em estudo seria a data de criação da primeira FUN-PRESP. Considerando que a criação da primeira FUNPRESP ocorreu no dia 20 de setembro de 2012, quando foi publicado o Decreto Presiden-

cial 7.808, que criou a Funpresp-Exe, este seria o marco inicial de vigência do novo regime.

Ousamos, contudo, discordar do ilustre professor pelas seguintes razões:

A parte final do inciso I do artigo 33 faz re-missão expressa ao artigo 31 da Lei 12.618/12, que, por sua vez, trata da criação das Funda-ções e do início de seu funcionamento após autorização concedida pelo órgão fiscalizador das entidades fechadas de previdência comple-mentar, nos termos do artigo 26.

Tanto o parágrafo primeiro, quanto o pará-grafo segundo do artigo 31 estabelecem que, transcorridos os prazos (no plural) previstos no caput, ou seja, o prazo do artigo 31 e o prazo do artigo 26, ocorrerá a vigência tácita do novo sistema. Portanto, se somente a criação de qualquer uma das Fundações fosse suficiente para o início do novo regime de previdência, não seria razoável que, para a vigência tácita, fossem necessários dois requisitos (criação e o início de funcionamento após a obtenção de autorização do órgão fiscalizador), tendo em vista que apenas a presença do primeiro requisito (criação) já bastaria para a instauração automática do novo regime.

Assim, entendemos que para o início de vi-gência do regime de previdência complementar dos servidores públicos federais não bastaria somente a criação de quaisquer das entidades

de que trata o Art. 4º da Lei, sendo necessário também o início de seu funcionamento, após a obtenção da respectiva autorização pelo órgão fiscalizador, que no caso das Entidades Fechadas é a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC).

Feitas tais considerações, releva informar que, no âmbito do Poder Executivo e do Poder Judiciário, já foram criadas a Funpresp-Exe e a Funpresp-Jud, por meio do Decreto 7808/12 e da Resolução do STF nº 496/12, respec-tivamente. A autorização de funcionamento da Funpresp-Exe ocorreu através da Portaria PREVIC nº 604, publicada em 22 de outubro de 2012.

Assim, desde o dia 22 de outubro de 2012, a União já poderia ter iniciado o funcionamento da Funpresp-Exe e dado início à vigência do novo regime de previdência para seus servido-res. Contudo, em recente pronunciamento da Ministra do Planejamento, o início de funcio-namento da Funpresp-Exe está previsto para o mês de fevereiro de 2013.

De toda sorte, em que pese o Poder Executivo parecer estar alinhado a nossa linha de interpreta-ção, resta pouco tempo para aqueles que ainda não tomaram posse e ainda desejam ingressar no serviço público federal com seus benefícios futuros calculados pela média de suas remunerações, nos termos da Lei 10.887/04.

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Continua na Web: midiajuridiCa.Com.br

Roberta Vieira adverte a importân-cia da linguagem para o opera-dor de direito reforçar, ampliar

ou reduzir aquilo que se avalia para que a defesa de uma tese jurídica possa ser bem sucedida. O artigo explica também o que é o ‘Sistema de Avaliatividade’, ferramenta persuasiva que merece destaque nos estudos de argumentação jurídica. Segue o texto

CIRURGIA De ADeQUAçãO SexUAL – TRANSexUAL MULheR PARA hOMeM

Roberta da Costa Vieira

Milene Regina Bonelli

do primeiro parágrafo do artigo:“Na execução de seu trabalho,

profissionais de áreas diversas do conhecimento fazem uso de diferentes instrumentos que devem ser maneja-dos com competência e precisão. A prática jurídica instrumentaliza-se pelo uso da palavra escrita e/ou falada em nível culto, preciso e estético, expressa com grau de formalidade adequado ao assunto e ao interlocutor. Consoan-te Madeu & Maciel (2012: 25) “Para se materializar e poder ser captado, o direito se manifesta pela linguagem. Precisa dela para se revelar, para se mostrar. O fenômeno jurídico se materializa na linguagem.” De fato, Carneiro, Severo & Éler (2010) suge-rem que em determinados momentos, a argumentação poderá ser a ferra-menta decisiva para que o operador de direito obtenha êxito em uma dada causa, já que a lei, por si só, não garante a promoção da justiça, dada a complexidade dos conflitos a serem solucionados em uma sociedade plu-

Na evolução histórica da so-ciedade, percebe-se cada vez mais a quebra de paradigmas

relacionados às diferenças em rela-ção à sexualidade. O sexo visível no nascimento de qualquer criança não está necessariamente ligado à defini-ção de homem ou mulher.

A transexualidade é um transtorno de gênero, segundo a CID-10 carac-teriza-se por “um desejo de viver e ser aceito como um membro do sexo oposto, usualmente acompanhado por uma sensação de desconforto ou

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Mestre em Letras pela UFF, com trabalho desenvolvido sobre discurso jurídico; pós-graduada em linguística aplicada ao ensino da língua inglesa, professora universitária.

ralista. Ademais, a norma, além de ser parte integrante do sistema jurídico, é também meio para a resolução de conflitos que não se caracterizam por suas dimensões meramente legais, vis-to que comportam aspectos sociais e valorativos (CAMARGO, M.M., 2003). Dessarte, cabe a esse profissional fazer uso de determinadas formas linguísti-cas em seu discurso com habilidade e perícia, com vistas a não apenas produzir argumentos, mas também saber como maximizá-los e minimizá-los ao longo do processo, objetivando promover uma determinada versão da realidade que garanta a defesa de sua tese (VOESE, 2011). Nas palavras de Bakhtin (1981: 95) “Na realidade, não são palavras o que pronunciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes ou triviais, agradáveis ou desagradáveis, etc. A palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial” (...)

Leia na íntegra em midiajuridica.com.br.

impropriedade de seu próprio sexo anatômico e um desejo de se subme-ter a tratamento hormonal e cirurgia para seu corpo, tão congruente quan-to possível com o seu sexo preferido”

O artigo da advogada Milene Regina Bonelli, aborda a cirurgia realizada em transexuais para mu-dança de sexo, especificamente do feminino para o masculino, trazendo a evolução no Brasil e a análise com-parativa com as cirurgias realizadas em homens.

Leia na íntegra em midiajuridica.com.br

ARGUMeNTAçãO JURíDICA

Pós-graduada em Direito de Família e Sucessões. Membro da Comissão de Família OAB/SP. Defensora no Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP. www.mileneadvogada.blogspot.com

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O vencedor do debate trazido pela professora Mônica Gusmão foi o

advogado Rogério Santiago Silva, com uma visão divergente e funda-mentada sobre o artigo polêmico que abordava a condenação, pelo TJ/RJ, de empresa de ônibus ao pagamento de indenização a uma mulher obesa que ficou presa na roleta. Em sua opinião, o advoga-do desabafou: “Nós profissionais desta área não podemos defender que a parte mais fraca conforme-se

que não se pode fazer com que o mundo e as coisas se acomodem às suas medidas, às suas possíveis limitações. Isso seria condenar te-traplégicos, paraplégicos, obesos, cegos e etc. a ficarem confinados em suas casas, pois o mundo não seria um lugar para eles”. Pela participação no debate, Rogério Santiago ganhará o livro “Lições de Direito Empresarial”, Editora Forense, de autoria da referida professora. O debate poderá ser lido na íntegra em nosso site.

O novo debate está lançado: o que você acha da aprovação de um novo Código Comercial? Novamente, quem provoca é a professora Mônica Gusmão, desta vez com o texto “Num certo país-do-faz-de-conta: o Novo Código Comercial”. Participe e dê sua opi-nião em www.midiajuridica.com.br. Nossa equipe selecionará a melhor opinião para contemplar com a obra “Direito Administrativo”, de autoria da professora Fernanda Marinella, Ed. Impetus.

ReSULTADO: O preço da Gordura

em debate

O curso tranquilo do Nilo representa um grande contraste com o frene-si e tumulto que toma conta das

ruas do Cairo. O povo egípcio luta por liberdade e dignidade, mas a economia se encontra em grande déficit e há uma grande carência por praticamente tudo, desde empregos a moradia, passando por saúde e educação. A corrupção, que graça pelo Egito, agrava a situação da já tão sofrida população e pode ser comparada a uma árvore de profundas raízes que não

DeMOCRACIA e LIBeRDADe, UM LONGO CAMINhO

Leticia Borges

pode ser derrubada ou transferida em um par de dias. A tensão se espalha pelo país, aliada à insegurança, afastando turistas e fazendo com que a receita do país diminua ainda mais.

Durante as grandes manifestações e as eleições, Mubarak chegou a ser chamado de o “último faraó”, o que reforça a noção de como o governo era levado com gran-de concentração de poder, desmandos e autoritarismo.

O governo autoritário foi derrubado e eleições livres, que contaram inclusive com a presença de observadores, foram realizadas, porém a democracia em todo o mundo se verifica pelo acúmulo de ex-periências, de cultura e amadurecimento da sociedade que a busca. Não há forma de se forçar a instalação e o avanço de uma democracia em um país.

A República Egípcia ainda está apren-dendo a lidar com a democracia e com as novas possibilidades e responsabilidades decorrentes de um Estado democrático. Contudo, o processo de revolução está longe do fim, o Egito encontra-se em uma situação muito peculiar, pois para

a democracia se estabilizar é necessário que se tenha maturidade política, o que é extremamente difícil, levando-se em conta que mais de um terço da população é analfabeta e sem possibilidade de acesso à educação.

Hoje o que vemos claramente é a im-possibilidade de um líder impor caminhos que a população discorda, deixando claro que o primeiro passo em direção à tão desejada democracia já foi dado, mas que o fim encontra-se terrivelmente longe.

No Egito, após a eleição, ficou clara a forte influência da Irmandade Mulçumana, partido com forte conotação religiosa, que relaciona a defesa da democracia e o desen-volvimento do país com um Estado menos laico. Esta postura, apesar de ser uma forma de defesa de um posicionamento acerca da melhor maneira de se redemocratizar o país, é extremamente traiçoeira, gerando um governo ligado a uma religião que tra-dicionalmente não é aberta para mudanças, direitos humanos e liberdade.

O texto completo da professora Letícia Borges está disponível em www.midiajuridica.com.br

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Mestra em Direito com ênfase

em Direito Internacional, Direito

Humanitário e Direitos Humanos,

Especialista em Direito Civil e

Processo Civil, Professora da

Universidade Estácio de Sá e do

Centro Universitário Moacyr Sreder

Bastos.

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matéria

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A BOATe KISS, O VOO DA MORTe e O BRASIL:

O BIG BROTheR DA IMPUNIDADe

Francisco Dirceu Barros

Francisco dirceu Barros: Promotor de Justiça, Mestre em Direito, autor de mais de 60 livros.

Conta a lenda (é lenda porque todo mundo já esqueceu) que um dia em um país imaginário

chamado “Big Brother da impunidade”, uma aeronave chocou-se com um avião, causando a morte de mais de 100 passageiros.

Seguem alguns dados hipotéticos para avaliarmos a benevolência das leis brasileiras:

a) imagine que ficou demonstrado que o piloto do avião A desligou o mecanismo anticolisão e entrou na rota de colisão com o avião B;

b) imagine que, alertado pela torre de controle para seguir o plano de voo normal, o piloto do avião A não obedeceu;

c) imagine que o resultado foi a morte de todos os passageiros do se-gundo avião;

d) imagine que o piloto do avião A sobreviveu e disse como será a pena do causador do acidente.

Agora, diga como será a solução jurídica.

Resposta: A questão jurídica deve ser solucionada com a elucidação de uma questão: o piloto do avião A agiu com dolo eventual ou culpa consciente?

A sua opção tem consequências jurídicas diversas, a saber:

a) Culpa consciente Na culpa consciente, também deno-

minada negligência consciente e culpa ex lascivia, o resultado é previsto pelo sujeito que confia levianamente que o mesmo não ocorrerá, que há uma circunstância impeditiva ou que possa evitá-lo.

Solução jurídica: alguns doutri-nadores defendem que mesmo tendo causado mais de 100 mortes, o piloto A pagará uma pena alternativa, pois, segundo o art. 44, inc. I, do Código Penal:

As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo.

Grifo:“[...] qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo”.

Sabe-se que é vedada a substitui-ção de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos quando se trate de crime praticado com violên-cia ou grave ameaça à pessoa, a teor do art. 44, inc. I, do Código Penal, mas o crime culposo é cometido por imperícia, imprudência ou negligên-cia, modalidades em que não há violência ou grave ameaça. Portanto, condenado em 1.000 anos por haver cometido 100 homicídios culposos, leia-se: “qualquer que seja a pena aplicada”, caberá pena restritiva de direito.

Na tragédia da boate Kiss caso seja identificado um autor e seja detectado que este agiu com culpa consciente a pena será alternativa, isso mesmo, que tal 234 cestas básicas???

b) Dolo eventualO dolo eventual ocorre quando

o sujeito assume o risco de produzir o resultado. O agente não quer o resultado diretamente, mas, sim, realizar sua conduta. Acontecendo o crime, o agente o aceita, tolera o resultado. Frank, em sua conhecida teoria positiva do conhecimento, sintetiza a definição de dolo eventual, nos termos seguintes: “se o agente diz a si próprio: seja como for, dê

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ATENÇÃO!

Dr. ALÍRIO & PROFESSORES ASSOCIADOSCURSO

MÓDULOS TRIMESTRAIS DE DIREITO PROCESSUAL Direito Processual Civil - Prof. Alírio de Carvalho (Juiz de Direito) Direito Processual do Trabalho - Prof. Paulo Roberto de Castro (Des. TRT/MG) Direito Processual Tributário - Prof. Paulo Adyr Dias (Doutor em Dir. Tributário) Direito Processual Penal - Prof. Júlio Cesar da Silva (Mestre em Dir. Público)

Início das aulas 14 de março de 2013Turmas noturnas: quintas e sextas das 19h às 22h

Turmas diurnas: sábados das 9h às 16h

Matrículas e Informações: Rua Senador Dantas 117/308, Centro, Rio de Janeiro/RJTels: (21) 2240-1100 / 8251-6676 / 8281-5321

no que der, em qualquer caso, não deixo de agir, é responsável a título de dolo.1”

DOLO EVENTUAL E CULPA CONSCIENTE

A culpa consciente limita-se com o dolo eventual (CP, art. 18, inc. I, in fine). A diferença é que, na culpa consciente, o agente não quer o resultado nem assume deliberada-mente o risco de produzi-lo. Apesar de sabê-lo possível, acredita sincera-mente poder evitá-lo, o que só não acontece por erro de cálculo ou por erro na execução. No dolo eventual, o agente não só prevê o resultado danoso como também o aceita como uma das alternativas possíveis2.

Há dolo eventual quando o agen-te assume o risco de produzir o resultado (CP, art. 18, inc. I, in fine). Assumir o risco significa prever o resultado como provável ou possível e aceitar ou consentir sua superve-niência. O dolo eventual aproxima-se da culpa consciente e dela se

distingue porque, nesta, o agente, embora prevendo o resultado como possível ou provável, não o aceita, nem consente. Não basta, portanto, a dúvida, ou seja, a incerteza a res-

peito de certo evento, sem implicação de natureza volitiva. O dolo eventual põe-se na perspectiva da vontade e não da representação, pois esta úl-tima pode conduzir também à culpa consciente. Nesse sentido, já decidiu o STF (RTJ 35/282). A rigor, a expres-são “assumir risco’” é imprecisa para distinguir o dolo eventual da culpa consciente e deve ser interpretada em consonância com a teoria do consentimento3 (STJ – REsp 192.049-DF, p. 355-356).

Finalizada, em síntese didática a diferença, pergunta-se: como identi-ficar no contexto prático se o agente agiu com dolo eventual ou culpa consciente?

Entendemos que a existência de dolo eventual deve sempre ser averiguada de acordo com o caso concreto.

Defendo que, nas circunstâncias hipotéticas descritas, o piloto A agiu com dolo eventual. Marcello Finzi procurou fornecer um critério cien-tífico e seguro para a determinação

“O dolo eventual aproxima-se da

culpa consciente e dela se distingue

porque, nesta, o agente, embora

prevendo o resultado como

possível ou provável, não o aceita, nem

consente”

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da intenção de matar (la intenzione di uccidere), sistematizando-a em dois grupos: o primeiro infere-se da modalidade do próprio fato (meio empregado, direção, número e a violência dos golpes, as condições de espaço, tempo e local, e as cir-cunstâncias conexas com a ação); o segundo liga-se às circunstâncias va-lorizadoras ou não de uma hipótese de matar (conduta do agente anterior e posterior ao crime, a causa de delinquir, a índole do culpado). Os critérios apontados servem apenas de diretriz, pois o dolo será aferido pelo somatório de todo o apurado, e sobre ele o juiz formará o seu livre convencimento.4

Usando a lição de Finzi, che-gamos à conclusão que, se houver ligação entre o primeiro grupo de condições (meio empregado, di-reção, número e a violência dos golpes, as condições de espaço, tempo e local, e as circunstâncias conexas com a ação) com o se-gundo grupo (conduta do agente anterior e posterior ao crime, a causa de delinquir, a índole do culpado), haverá impreterivelmente dolo eventual.

Um piloto profissional que des-liga os equipamentos anticolisão e coloca sua aeronave na mesma rota de colisão de outro avião, sabe, tem plena consciência de que vai causar uma tragédia, e está exteriormente demonstrando que o resultado é in-diferente; portanto, deve ser respon-sabilizado por homicídio doloso.

O STJ, por intermédio de sua 5a Turma, julgando o REsp no 249.604/SP, decidiu:

“O dolo eventual, na prática, não é extraído da mente do au-tor mas, isto sim, das circuns-tâncias. Nele, não se exige que o resultado seja aceito como tal, o que seria adequado ao dolo direto, mas isto sim, que a aceitação se mostre no plano do possível, provável”.

Solução jurídica: mesmo se-guindo a tese do dolo eventual, e caso seja identificado alguém que, no caso da boate Kiss, agiu com dolo eventual, ainda haverá duas posições.

a) O piloto A pagará pelos homicídios dolosos em concurso formal próprio.

Prevalecendo esta tese, o piloto A, mesmo tendo causado mais de 100 mortes, pagará por um homi-cídio doloso com a pena aumenta-da, de um sexto até metade.

Neste caso, a pena será de, “no máximo”, 45 anos.

Diante da benevolência da lei brasileira, chegamos à conclusão de que, nos dois casos, há plena desproporcionalidade entre a rele-vância dos bens jurídicos lesados (mais de 200 homicídios) e a pe-nalidade final.

Nos Estados Unidos, o piloto, no mínimo, seria enquadrado na lei antiterror e, também no mínimo, pegaria prisão perpétua.

b) Minha posição: o piloto A pagará pelos homicídios dolosos em concurso formal impróprio.

No concurso formal impróprio, usamos a regra do concurso mate-rial; portanto, as penas de todos os homicídios serão somadas. Neste caso, a pena passaria de 200 anos.

Pena pesada? Não. Lembre-se também de que,

conforme o art. 75 do nosso Big Brother Código Penal, o tempo de cumprimento das penas privati-vas de liberdade não pode ser superior a 30 anos.

Aqui temos outra grave con-trovérsia, que enfrento no livro As 200 maiores controvérsias do Direito Penal - Parte Geral (Editora Impetus):

Dissenso: “A pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento, deve ser considerada para a con-cessão de outros benefícios?”

Explica Celso Delmanto5 que, da leitura do art. 75 observa-se a existência de duas interpretações diferentes para o atual art. 75 do CP:

1a a unificação em trinta anos serve de baliza para todos os cál-culos de execução penal: detração, remição, progressão do regime de pena e livramento condicional; 2a a unificação no limite legal opera tão só para fins de exaurimento da execução, e não para outros inst i tutos ou incidentes desta. Embora a primeira posição (1a) seja aquela fiel ao texto da lei e à vontade de sua Exposição de Mo-tivos, a segunda interpretação (2a) tem logrado maior receptividade, sob o argumento político de que a primeira posição beneficiará delinquentes perigosos e poderá aumentar a criminalidade violenta que preocupa o país. Em nossa opinião, a primeira interpretação é a única que contém o sentido real e exato da lei, evitando que a desesperança tome conta dos condenados a longas penas, de-sestimule o bom comportamento e prejudique a sua futura reinserção social. Nesse sentido, lembrando que esta interpretação desencoraja a reincidência na cadeia, Reale Júnior6.

Observe que no caso em co-mento, seguindo-se a primeira posição, permite-se a progressão de regime com o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, o agente ativo responsável por mais de 200 mortes só ficaria preso em regime fechado por 12 (doze) anos, isto mesmo, 30 (máximo de cumprimento) x 2/5 (percen-tual da progressão).

Tal doutrina defende que viola a dignidade da pessoa humana a in-cidência do cálculo da progressão sobre os 200 anos, pois seria uma espécie de pena perpétua não admitida no Brasil; afinal, seriam necessários 80 anos para o autor obter a progressão (2/5 de 200 = 80).

“O que viola o princípio da dignidade da

pessoa humana é o extermínio de mais de

200 pessoas”

matéria

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POSIÇÃO DIVERGENTENossa posição: entendemos

que o que viola o princípio da dignidade da pessoa humana é o extermínio de mais de 200 pessoas. Afinal, é o cúmulo do absurdo o sujeito ativo matar mais de 200 pessoas e cumprir apenas 12 anos em regime fechado.

E há algo mais grave na primeira posição. Após cometer dois homicí-dios e ser condenado a 35 anos de reclusão, o sujeito ativo, enquanto não fosse capturado, poderia con-tinuar cometendo homicídios, pois estaria “isento de penalidade”, já que os mesmos em nada influen-ciariam no cumprimento de sua pena.

A matéria no STF e no STJ:Posição dominante do STF:

A pena unificada para atender ao limite de 30 anos de cum-primento, determinado pelo art. 75 do Código Penal, não é considerada para a con-cessão de outros benefícios, como o livramento condicio-nal ou regime mais favorável de execução (Súmula no 715 do STF).

Posição dominante do STJ: A unificação de pena, deter-minada pelo art. 75 do CP, refere-se somente ao tempo total em que o condenado fi-cará privado de sua liberdade, não servindo de base para outros benefícios (comutação de pena, livramento condicio-nal etc.). Precedentes do STF e do STJ. Recurso conhecido, mas improvido (STJ – REsp 402.115/RJ – 6a T. – Rel. Min. Fernando Gonçalves – p. 356).

Mas o nosso Brasil (o Big Brother da impunidade) ainda traz outra regra que é uma verdadeira ex-crescência jurídica: e se um menor com 17 anos e 11 meses jogar uma bomba em uma boate e matar 234 pessoas queimadas?

Fácil, será interposta pelo Minis-tério Público uma ação penal socioeducativa com escopo de decretar a internação do autor do ato infracional.

Cuidado I: agora o assunto deve ser tratado com muita sensi-bilidade, pois um menor com 16 anos vota em uma eleição presi-dencial, mas em relação a atos infracionais, os menores de 18 anos são penalmente inimputáveis, ou seja, inteiramente incapazes de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Cuidado II: A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de 45 dias.

Cuidado II I: A internação constitui medida privativa da liber-dade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

Cuidado IV: Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos.

E se a internação foi de-cretada quando o autor do ato infracional (leia-se mais de 200 homicídios), já havia completado 21 anos???

Não há possibilidade jurídica, pois o menor não pode ser inter-nado ao completar 21 anos. (vide art. 121, § 5º, da Lei nº 8.069/90: A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade).

CONCLUSÃOSabemos que:- O Direito Penal não deve

interferir em demasia na vida do indivíduo, retirando-lhe autonomia e liberdade. Afinal, a lei penal não deve ser vista como a primeira opção (prima ratio) do legislador para compor conflitos existentes em sociedade e que, pelo atual estágio de desenvolvimento moral e ético da humanidade, sempre estarão presentes.7

- O “princípio da subsidiarie-dade” se traduz no fato de que a norma penal exerce uma função meramente suplementar da pro-

1Apud HUNGRIA, Nélson. Comentários ao Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 1978. vol. 1, tomo II, p. 118. 2TOLEDO, Assis. Princípios Básicos de Direito Penal. 3FRAGOSO, Heleno. Lições de Direito Penal. 4Apud PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal brasileiro – Parte Especial. São Paulo: Editora RT. p. 55. 5DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 6. ed., Rio de Janeiro: Renovar. 2002, p. 151. 6REALE JÚNIOR, Miguel et al. Penas e Medi-das de Segurança no Novo Código. Rio de Janeiro: Forense, 1985, p. 245. 7NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal – Parte Geral e Especial. 2. ed. São Paulo: RT, p. 69. 8TAVARES, Juarez. Critérios de Seleção de Crimes e Cominação de Penas. Revista do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), número especial de lançamento, p. 81-82, dez. 2002.

teção jurídica em geral, apenas sendo válida a imposição de suas sanções quando os demais ramos do Direito não mais se mostram eficazes na defesa dos bens ju-rídicos.8

O grande problema é que temos uma grande inflação legis-lativa, leis de duvidosa eficiência e que só servem para encher os presídios com pobres que cometem pequenos delitos.

Anotem: tragédias como a dos 199 mortos do avião da Gol e a dos mais de 200 mortos da Boate Kiss, em pouco tempo serão esque-cidas e entrarão na história apenas para atestar que:

NÓS NÃO TEMOS POTENCIAL LEGISLATIVO PARA COMBATER A CRIMINALIDADE

A proteção penal é plenamente insuficiente para combater o crime organizado e os crimes que causam grandes impactos sociais, fato que viola frontalmente o princípio da proporcionalidade.

Como disse o MIN. GILMAR MENDES no julgamento do HABEAS CORPUS 104.410 - RIO GRANDE DO SUL:

Os direitos fundamentais não po-dem ser considerados apenas como proibições de intervenção (Eingriffs-verbote), expressando também um postulado de proteção (Schutzge-bote). Pode-se dizer que os direitos fundamentais expressam não apenas uma proibição do excesso (Über-massverbote), como também podem ser traduzidos como proibições de proteção insuficiente ou imperati-vos de tutela (Untermassverbote). Os mandatos constitucionais de criminalização, portanto, impõem ao legislador, para o seu devido cum-primento, o dever de observância do princípio da proporcionalidade como proibição de excesso e como proibição de proteção insuficiente.

Um fraternal abraço.

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A eSTABILIDADe DA eMPReGADAGeSTANTe e A MUDANçA NA SÚMULA Nº 244 DO TRIBUNAL

SUPeRIOR DO TRABALhO

Rodolpho Cézar Aquilino Bacchi1

Na semana de 14 de setem-bro de 2012, o Tribunal concluiu a 2ª Semana do

TST, em que houve o exame de diversos projetos de mudança em sua jurisprudência, tendo sido re-alizada a aprovação de inúmeras alterações em sua jurisprudência.

O objetivo do presente estudo é a análise dos motivos que justifica-ram a mudança na Súmula nº 244 do Tribunal Superior do Trabalho.

É cediço que a Constituição Federal da República de 1988 instituiu no artigo 10, II do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias a estabilidade pro-visória em favor da empregada no ciclo gravídico-puerperal2, a qual consiste numa garantia de emprego, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Pretende coibir a prática da despedida injusta por parte do empregador, protegendo a mãe trabalhadora em momento difícil de sua vida3.

Trata-se de uma estabilidade de ordem objetiva4, haja vista que a emprega gestante goza da referida estabilidade independen-temente da ciência da gravidez por parte do empregador no ato da dispensa (concepção objetiva).

Esse entendimento se encontra preconizado na Súmula nº 244, I do TST:

“O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade.”Estando vigente o período esta-

bilitário fará a empregada no ciclo gravídico-puerperal jus à reintegra-ção, e caso aquele seja ultimado, teremos apenas a incidência da chamada indenização substitutiva, nos termos do item II da Súmula nº 244 do TST:

“A garantia de emprego à gestante só autoriza a reinte-gração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade.”Contudo, até 14 de setembro de

2012, o item III da referida Súmula vinha entendendo que tal estabili-dade não se estendia ao contrato de experiência. Senão vejamos: “Não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego,

1Advogado no Escritório Marcos Simor Pani e Advogados Associados. Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Católica de Petrópolis. Professor do curso de Pós-Graduação Lato Sensu da Universidade Gama Filho e de cursos preparatórios.2A referida expressão foi cunhada de maneira brilhante na doutrina pela Desembargadora aposentada do Tribunal Regional do Trabalho e professora aposentada da UFMG Alice Monteiro de Barros. 3BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2011. p. 783.4Na doutrina podemos destacar o elastério de Jorge Luiz Souto Maior: “A aquisição de tal direito por parte da gestante independente de ter havido comunicação expressa ao em-pregador, pois a obrigação decorrente por parte do empregador é de natureza objetiva, isto é não é, não depende de que tenha a ciência do fato em si da gravidez.”MAIOR, Jorge Luiz Souto. Curso de Direito do Trabalho: A relação de emprego. vol. II. São Paulo: LTr, 2008. p. 483.

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em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa.”5

Tal raciocínio a fortiori se justificava pelo fato de que os contratos por prazo determinado (inclusive o contrato de expe-riência) configuravam exceção ao princípio da continuidade da relação de emprego e o término destes contratos em havendo o advento do termo final, portanto, não constituiria dispensa arbitrá-ria ou sem justa causa.

No entanto, o Supremo Tribu-nal Federal começou a firmar o entendimento em sua jurisprudên-cia de que as servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário,

independentemente do regime jurídico, têm direito à licença ma-ternidade de cento e vinte dias e a garantia provisória de emprega-da gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, nos termos dos arts. 7º, XVIII da Constituição Federal e do art. 10, II, ‘b’ do Ato das Disposi-ções Constitucionais Transitórias6.

Nesse sentido, de acordo com STF, o único pressuposto ao direi-to à estabilidade é a confirmação objetiva do estado fisiológico de gravidez da empregada ou da servidora pública, independen-temente, quanto a este, de sua prévia comunicação ao em-pregador ou ao órgão público competente7.

Cabe lembrar, ainda, que tal respeito à empregada gestante representa um compromisso as-sumido pelo Estado brasileiro no plano internacional, uma vez que o Brasil ratificou a Convenção OIT nº 103, de 1952, promulga-da pelo Decreto nº 58.821/66, Artigo VI e, firmando a neces-sidade de dar efetiva proteção à maternidade e ao nascituro, editou o art. 10, II, ‘b’ do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

A partir disso, o Tribunal Su-perior do Trabalho começou a modificar o seu entendimento jurisprudencial acerca do tema. Tal mudança se deve, em grande parte, a interpretação dos precei-

5Deve-se esclarecer que nos termos do art. 175 do Regime Interno do TST as mudanças em Súmula do TST iniciam a vigência a partir da publicação de resolução com as mudanças, por três vezes, no Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho. 6AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CARGO EM COMISSÃO. SERVIDORA GESTANTE. EXONERAÇÃO. DIREITO À INDENIZAÇÃO. 1. As servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Precedentes: RE n. 579.989-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Dje de 29.03.2011, RE n. 600.057-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Eros Grau, Dje de 23.10.2009 e RMS n. 24.263, Se-gunda Turma, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 9.5.03. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AI 804574 AgR/DF - DISTRITO FEDERAL - AG.REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - Relator: Min. LUIZ FUX - Primeira Turma - Publicação DJe-15/09/2011).7Idem. 8RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE DA GESTANTE. CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. NORMATIZAÇÃO ESPECIAL E PRIVILEGIADA À MATERNIDADE CONTIDA

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atualidade

REFERêNCIASBARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 7ª ed. São Paulo: LTr, 2011. DELGADO, Mauricio Godinho Delgado. Curso de Direito do Trabalho. 9ª Ed. São Paulo: LTr, 2011. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Manual de Direito do Trabalho. 5ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012.MAIOR, Jorge Luiz Souto. Curso de Direito do Trabalho: A relação de emprego. vol. II. São Paulo: LTr, 2008.

NA CARTA DE 1988. ARTS. 10, II, B, DO ADCT, ARTS. 7º, XVIII E XXII, 194, 196, 197, 200, I, 227, CF/88. RESPEITO, FIXADO NA ORDEM CONSTITUCIONAL, À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, À PRÓPRIA VIDA AO NASCITURO E À CRIANÇA (ART. 1º, III, E 5º, CAPUT, DA CF). Em princípio, a lógica dos contratos a termo não permite qualquer possibilidade de maior integração do trabalhador na empresa, além de já preestabelecer o final do próprio vínculo empregatício. Em face disso, em regra, o instituto da garantia de emprego é inábil a produzir, no contexto dos contratos a termo, a mesma extensão de efeitos que seguramente propicia na seara dos contratos indeterminados. Por outro ângulo, contudo, é certo dizer que a lógica dos contratos a termo é perversa e contra ela se contrapõe todo o Direito do Trabalho, já que esse ramo jurídico especializado busca aperfeiçoar as condições de pactuação da força de trabalho no mercado. Por essas razões, a legislação busca restringir ao máximo suas hipóteses de pactuação e de reiteração no contexto da dinâmica justrabalhista. Note-se que a CLT não prevê a situação da gravidez como situação excepcional a impedir a ruptura contratual no contrato a termo. Contudo o art. 10, II, do ADCT da Constituição, em sua alínea b, prevê a estabilidade provisória à “empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto”. Estipula, assim, a vedação à dispensa arbitrária ou sem justa causa. Ressalte-se que a maternidade recebe normatização especial e privilegiada pela Constituição de 1988, autorizando condutas e vantagens superiores ao padrão deferido ao homem - e mesmo à mulher que não esteja vivenciando a situação de gestação e recente parto. É o que resulta da leitura combinada de diversos dispositivos, como o art. 7º, XVIII (licença à gestante de 120 dias, com possibilidade de extensão do prazo, a teor da Lei 11.770/2008, regulamentada pelo Decreto 7.052/2009) e das inúmeras normas que buscam assegurar um padrão moral e educacional minimamente razoável à criança e ao adolescente (contidos no art. 227, CF/88, por exemplo). De par com isso, qualquer situação que envolva efetivas considerações e medidas de saúde pública (e o período de gestação e recente parto assim se caracterizam) permite tratamento normativo diferenciado, à luz de critério jurídico valorizado pela própria Constituição da República. Note-se, ilustrativamente, a esse respeito, o art. 196 que firma ser a saúde “direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos...”; ou o art. 197, que qualifica como de “relevância pública as ações e serviços de saúde...”, além de outros dispositivos, como artigos 194, 200, I, e 7º, XXII, CF/88. A estabilidade provisória advinda da licença maternidade decorre da proteção constitucional às trabalhadoras em geral e, em particular, às gestantes e aos nascituros. A proteção à maternidade e à criança advém do respeito, fixado na ordem constitucional, à dignidade da pessoa humana e à própria vida (art. 1º, III, e 5º,caput, da CF). E, por se tratar de direito constitucional fundamental, deve ser interpretado de forma a conferir-se, na prática, sua efetividade. Nesse sentido, entendo que não pode prevalecer o posicionamento adotado pelo TRT, que conferiu pre-ponderância aos efeitos dos contratos a termo - especificamente em relação à garantia de emprego - em detrimento da estabilidade assegurada às gestantes, na forma do art. 10, II, b, do ADCT. Nessa linha, está realmente superada a interpretação exposta no item III da Súmula 244 do TST. Inclusive o Supremo Tribunal Federal possui diversas decisões - que envolvem servidoras públicas admitidas por contrato temporário de trabalho -, em que expõe de forma clara o posicionamento de garantir à gestante o direito à licença-maternidade e à estabilidade, independentemente do regime jurídico de trabalho. Sob esse enfoque, o STF prioriza as normas constitucionais de proteção à maternidade, lançando uma diretriz para interpretação das situações congêneres. (TST, RR nº 21700-25.2009.5.01.0079, 6ª Turma, Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, DJe 08/02/2012).9RECURSO DE REVISTA - GESTANTE - ESTABILIDADE PROVISÓRIA - CONTRATO DE EXPERIêNCIA. Estabelece o art. 10, II, “b”, do ADCT/88 que é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, não impondo nenhuma restrição quanto à modalidade de contrato de trabalho, mesmo porque a garantia visa, em última análise, à tutela do nascituro. O entendimento vertido na Súmula nº 244, III, do TST encontra-se superado pela atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que as empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime de trabalho, têm direito à licença maternidade de 120 dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Dessa orientação dissentiu o acórdão recorrido, em afronta ao art. 10, II, “b”, do ADCT/88. (TST, RR-1601-11.2010.5.09.0068, 1ª Turma, Rel. Min. Vieira de Mello Filho, DJe 29/02/2012).

“A empregada gestante goza de

estabilidade independente-

mente da ciência da gravidez por

parte do empregador no

ato da dispensa”

tos do direito trabalho à luz da teoria dos direitos fundamentais no texto constitucional.

Nesse diapasão, segundo o Tribunal, a estabilidade da empregada no ciclo gravídico-puerperal decorre da proteção constitucional às trabalhado-ras em geral e, em particular, às gestantes e aos nascituros. Tal proteção à maternidade e à criança advém do respeito, fixado na ordem constitucional, à dignidade da pessoa humana e à própria vida (art. 1º, III, e 5º, caput, da CF). E, por se tratar de direito fundamental, deve ser interpretado de acor-do com o princípio da máxima efetividade8.

Sob esse prisma, o art. 10, II, ‘b’ do ADCT ao estabelecer que é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empre-gada no ciclo gravídico, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, não impõe qualquer restrição quanto à modalidade de contrato de trabalho, se a prazo determina-do, ou se a prazo indetermina-do, mesmo porque a garantia,

visa na sua essência, à tutela do nascituro9.

Desse modo, convergindo com o entendimento do Supre-mo Tribunal Federal, o Tribunal Superior do Trabalho consolidou o entendimento de que o único pressuposto ao direito a estabi-lidade (e a à sua conversão em indenização, caso ultrapassado o período de garantia de empre-go) é encontrar-se a empregada

grávida quando do momento da resilição contratual.

Diante disso, o Tribunal Su-perior do Trabalho em 14 de setembro de 2012 alterou o item III da Súmula nº 244, que passou a ter a seguinte redação:

“III - A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea ‘b’, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de ad-missão mediante contrato por tempo determinado”.

Vê-se, portanto, que o Tribu-nal Superior do Trabalho vem se pautando a cada dia mais para a criação de sua jurisprudência pela interpretação constitucional dos direitos do trabalhador, o que representa enorme avanço no sentido de reforçar as ideias de respeito e de força normativa do texto constitucional.

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muralteCa

A MOtivAçãO DO LANçAMENtO tribUtáriO

tribUtOS – tEOriA GErAL E ESPéciES

De tempos em tempos, deparamo-nos com o problema do abuso, pelo Estado, de seu poder de tributar.

É por demais percebida, ao longo dos tempos, permanente tensão entre a prerrogativa do Estado (de arrecadar tributos) e o animus do contribuinte (no sentido de subtrair-se a uma tal cobrança). Os caminhos por este utilizados são os mais diversos e criativos: ora conforme o Direito, ora na mais completa ilegalidade. O fato é que, historicamente, sempre esteve presente, na mente e no coração dos administrados, o sentimento de extorsão pelo Fisco. Por essa razão, morreram pessoas e se fize-ram revoluções. Não é diferente em nossos dias.

Aliás, não seria demais afirmar que quase todas as revoluções, no Brasil e no mundo, tive-ram origem em questões tributárias. Isso é claro: o abuso do poder de tributar ofende diretamente dois dos valores mais caros ao homem: liberdade e propriedade.

O autor, Paulo Adyr Dias do Amaral (pós-doutor em Direito pela Universidad Nacional de La Matanza – UNLaM; Mestre e Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais – (UFMG); professor de Direito Tributário de cursos de graduação e pós-graduação; Coordenador do Curso de Direito do Centro Universitário de Sete Lagoas – UNIFEMM, Diretor da Associação Brasileira de Direito Tributário (ABRADT) e profes-sor do Curso Dr. Alirio e Professores Associados),

Aobra do advogado Ricardo Lodi Ribeiro, Doutor em Direito, professor e coorde-nador do Programa de Pós-graduação

em Direito da UERJ (mestrado e doutorado) é composta de duas unidades. Na primeira é apre-sentado um estudo sobre o conceito de tributo e seus elementos constitutivos previstos no artigo 3º do CTN, bem como os traços característicos de cada uma das espécies tributárias, estabelecen-do suas distinções e características, a partir do critério de validação constitucional de cada uma delas e dos contornos estabelecidos pelo Código Tributário Nacional. Deste modo, os impostos, as taxas, as contribuições de melhoria, as contribui-ções parafiscais e os empréstimos compulsórios são apresentados em seus traços fundamentais.

Na segunda parte, a obra se dedica ao exame de cada um dos impostos e contribuições sociais da Seguridade Social do Sistema Tributá-rio Nacional, onde se destaca uma perspectiva menos formalista, de acordo com os valores

Ricardo Lodi Ribeiro

LANÇAMENTO:O professor Paulo Adyr, convida para o coquetel de lançamento da obra no dia 08/03/2013, sexta-feira, às 15h, na Livraria Café do Wilsinho (Rua do Rezende, 18 - Centro, Rio de Janeiro).

apresenta, como objetivo geral, compreender os fundamentos e a natureza do Direito Processual Tributário e propor uma teoria acerca do dever, do ônus e da qualidade da prova. Pretende, ainda, como objetivos específicos:• Assentar a premissa de que o Direito Tributário não detém autonomia científica, situando-se, na verdade, como capítulo do Direito Administrativo.• Compreender que o processo tributário apre-senta natureza própria, não podendo se desen-volver segundo as regras do processo comum.• Demonstrar que o Código de Processo Civil foi formulado segundo concepção privatística, o que o torna insuficiente, e, em certos momentos, impróprio, quando se trata de demandas entre Estado e cidadão.• Buscar, na doutrina da Teoria dos Motivos Determinantes, subsídios para a construção de uma teoria publicista em torno do dever, ônus e qualidade da prova.• Verificar que lançamento e auto de infração são atos administrativos vinculados e, sendo assim, não podem jamais dispensar a correspondente motivação.• Indagar se há relação entre motivação e dever de prova.• Constatar que, em procedimento administra-tivo tributário, existe dever de prova do Estado (e não ônus).• Propor a elaboração de regra específica acerca

da prova no Direito Tributário formal e processual.Na visão do autor, o processo tributário

(administrativo ou judicial) deve-se amparar em verdadeira prova (e não em simples presunções, indícios ou ficções), sob pena de instalar-se entre nós profunda insegurança jurídica.

Desta forma, o objeto de estudo insere-se em três setores do conhecimento: Direito Administrati-vo, Direito Processual e Direito Tributário. Trata-se de pesquisa interdisciplinar, porquanto reclama coordenação de disciplinas conexas. Insere-se no campo da dogmática do Direito.

e princípios constitucionais e os mais recentes posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais, relacionando os aspectos específicos de cada imposto aos institutos previstos na Constituição e no CTN.

A obra alia o sentido prático caro ao opera-dor do Direito Tributário com o aprofundamento necessário para a compreensão dos institutos jurí-dicos, lançando mão dos vários posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais em cada contro-vérsia. Por essa razão, é destinada a advogados, procuradores, juízes, autoridades administrativas, estudantes de graduação, pós-graduação, mes-trandos, doutorandos e concursandos.

Tributos - Teoria Geral e Espécies é uma obra de referência, por trazer o aprofundamento necessário para a compreensão dos institutos jurídicos, utilizando-se de vários posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais em cada contro-vérsia, através de linguagem objetiva e didática, além de ser o único livro que trata, em um só

volume, de cada um dos impostos em espécie, bem como das contribuições da Seguridade Social, que hoje são tão relevantes quanto os primeiros, juntamente com o estudo das dife-rentes categorias do gênero tributo.

LANÇAMENTO:O autor convida para o lançamento e coquetel no dia 19 de março das 17h30 às 21h, no Instituto de Direito do Estado e Cidadania (IDEC). Avenida Presidente Wilson, 165/309.

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MAIS qUE vENCEDORES

Vários são os servidores públicos que compartilham comigo sua dor e frus-tração. A impotência diante dos des-

mandos, a falta de valorização, a corrupção, a nefasta influência do aparelhamento político, o comando por estúpidos apadrinhados que não entendem nada e todas as outras questões que você, certamente, sabe como é. Em meio a esse cenário, claro que existem bons chefes e excelentes profissionais ocupando cargos em comissão, mas não vamos fechar os olhos. Não adianta tentar ser politicamente correto, ou sim-pático, e fingir que não temos um problema que nós temos. Isso para não falar dos fofoqueiros, invejosos, das “panelas” etc. E pior é que, às vezes, o “sistema” nos reserva o indesejável pa-pel de ser o capitão do mato, ou o carimbador, ou apenas aquele que dá ares de legitimidade ao que é imoral e ilegítimo. Caio Tácito disse certa vez que a arte da tirania é se valer de juízes ao invés de soldados... E isso acaba valendo para muitos cargos dentro do serviço público. E muitos se veem sem opção, sem saída. Bem, o que posso e vou fazer hoje é dizer como eu me protejo disso.Primeiro, eu penso o seguinte: minha relação com o Estado é uma, com os idiotas no poder é outra (não há só idiotas, eu repito), mas com as pessoas é ainda outra. Por mais difícil que seja, tento praticar o que recomenda Efésios 6, versos de 5 a 10.

Vós, servos, obedecei a vossos senhores segundo a carne, com temor e tremor, na sinceridade de vosso coração, como a Cristo; Não servindo à vista, como para agradar aos homens, mas como servos de Cristo, fazendo

FRUSTRAçÕeS NOSeRVIçO PÚBLICO

William Douglas

William Douglas é Juiz

Federal/RJ e professor

de coração a vontade de Deus; Servindo de boa vontade como ao Senhor, e não como aos homens. Sabendo que cada um receberá do Senhor todo o bem que fizer, seja servo, seja livre. E vós, senhores, fazei o mesmo para com eles, deixando as ameaças, sabendo também que o Senhor deles e vosso está no céu, e que para com ele não há acepção de pessoas. No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. (Efésios 6:5-10)

Segundo, penso na ideia do metro quadra-do. Eu cuido do meu metro quadrado. Nele o serviço público haverá de ser honesto, eficiente, educado, humano. Como dizia Theodore Roo-sevelt, devemos fazer o que podemos, com o que temos, onde nós estamos. Pus isso tudo no site www.revolucao.info – e tento fazer o melhor. Então, trabalho para que aquele que “cair nas minhas mãos” se considere uma pessoa de sorte. Esta pessoa terá o melhor que eu puder oferecer. De modo que tenho uma Vara elogiada, uma equipe formidável etc.

Ainda não cheguei no nível que gostaria, nem como cristão nem como servidor, mas tento. Acho que é o que nos resta, nos cabe, nos consola. Espero que você possa ficar feliz cuidando do seu metro quadrado. Estou certo que assim como o desânimo, a motivação também é contagiosa. Creio que podemos inocular noutros esse pedaço de sonho, de metro metro quadrado. Mas o que temos nós a oferecer senão isso: um metro e um ideal, por mais quimérico e utópico que seja. A utopia nos protegerá do desencanto. Ou, como já me disseram ao tratar de dúvidas sobre a fidelidade amorosa do parceiro, “é melhor viver iludido do que desiludido”. Eu convido você a ser extrema-mente ciente de tudo quanto aos fatos, mas se mantendo um sonhador quanto ao que fazemos. Cuide do seu metro quadrado e pronto.

Ainda existe um terceiro consolo, menos nobre, mas não menos respeitável: dali tiramos nosso sustento. Portanto, que levemos para casa o “leite das crianças” e honremos as calças que vestimos.

Mas me permita contar algo que aconteceu quando eu era Delegado de Polícia na 17ª D.P., em São Cristovão, há exatos 20 anos, em 1993. Houve um acidente de trânsito com um ônibus e eu, entusiasmado, infante, 1º colocado do 1º concurso externo para Delegado em talvez uns 20 anos, naturalmente, ia aos locais de homicídio, acidente, tudo que tinha “direito”. Vivi algumas histórias interessantes. Aprendi a

valorizar mais a vida vendo como ela escapa da mão num segundo, num atropelamento, ou acidente, ou roubo, ou vingança. Vi como é difícil aplicar nossas leis em situações reais. Vi uma mãe me pedir para praticar o que seria um abuso de autoridade, deixando seu filho passar uma noite na cadeia (na antessala dela, para ser mais exato), e lhe disse que não, mesmo achan-do, em meu íntimo, que a sabedoria materna não estava falhando; descobri, depois de algum tempo, que o melhor policial de minha equipe era um X-9, e o quanto seria complicado resolver isso. Enfim, foi um período bem interessante.

Mas porque conto isso? Volto ao acidente. Quando cheguei um Oficial do Corpo de Bombeiros, capacete branco, ao mesmo tempo profissionalmente calmo, mas humanamente angustiado, uniforme tingido de sangue, retirava do ônibus uma criança de talvez um ano e meio ou dois. Ele olhou para mim e disse: “A gente ganha mal e ainda tem que ver isso, criança san-grando”. Ele fez o que devia, e partiu sem que eu pudesse fazer nada senão compartilhar um olhar triste. Sua frase me acompanhou semanas, talvez meses, me torturando. Ela tinha uma dose de verdade que me angustiava. Finalmente, um bom tempo depois, me veio à mente a resposta que faltou naquele instante: “Não, Oficial, a gente ganha mal, mas pode ajudar uma criança sangrando”. Infelizmente não tive tirocínio para ter esta resposta à mão, ou, melhor, na ponta da língua, para consolar aquele modesto herói incomodado. Mas guardo essa resposta cada vez que ser servidor me incomoda. Não me considero nenhum herói, anoto, sou apenas mais um metro quadrado, e nem mesmo dos melhores, mas tento.

Eu sei de um amigo com tais frustrações. Ele, Delegado, já salvou duas pessoas sequestradas, cujo local de cativeiro estourou, salvado as ví-timas, depois de se sair bem no prévio tiroteio. Os sequestradores de fuzil, os policiais, nem tanto. Isso não é coisa de capitão do mato, com certeza. Quando me dói ser juiz, eu fico a me recordar dos tiros certeiros, das decisões nobres, das pessoas que resgatei dos tipos de cativeiro que eu tenho poder para, às vezes, tirar alguém. Ganha-se mal, meus caros amigos, mas podemos ajudar – lá, muito de vez em quando – alguma gente. Que isso nos sirva de consolo. E que não desanimemos: um dia reto-maremos o serviço público dos incompetentes, dos omissos, dos tíbios, e o devolveremos ao povo, finalmente.

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Diferenciais da obra:

• Traz o aprofundamento necessário para a compreensão dos institutos jurídicos, utilizando-se de vários posicionamentos doutrinários e juris-prudenciais em cada controvérsia.

• É o único livro que trata, em um só volume, de cada um dos impostos em espécie, bem como das contribuições da Seguridade Social, que hoje são tão relevantes quanto os primeiros, juntamente com o estudo das diferentes categorias do gênero tributo.

• Linguagem objetiva e didática.

• Indicada para advogados, procuradores, juízes, autoridades administrati-vas, estudantes de graduação, pós-graduação, mestrandos, doutorandos e concurseiros.

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