Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo...

11
Mecânica Respiratória e Controle da Ventilação Renato Ângelo Saraiva, TSA 1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics - Control of Ventilation KEY WORDS - CENTRAL NERVOUS SYSTEM: medula, ventilation, control; RESPIRATION: mechanics; VENTILA- TION: control, medula, central nervous system MECÂNICA RESPIRATÓRIA Os pulmões têm movimentos passivos, sempre dependentes de forças externas. Na respiração espontânea, os músculos respi- ratórios geram a força capaz de levar o ar aos pulmões. Na respiração artificial, uma máquina gera a diferença de pressão entre o sistema de ventilação e a via aérea, fazendo com que o ar chegue ao alvéolo pulmonar. Em ambos os ca- sos o fenômeno físico do movimento pulmonar, fazendo com que o pulmão receba ou libere um certo volume de gás, é influenciado pela im- pedância do sistema respiratório. Esta impedân- cia se desenvolve em função da resistência elástica dos tecidos, da interface gás/líquido do alvéolo e do atrito entre a parede da via aérea e o fluxo de ar. Fontes menores de impedância (desprezíveis) são a inércia dos gases e dos tecidos e a fricção da deformação tecidual. Devido à sua estrutura elástica, os pulmões são capazes de sofrer variações de volume de acordo com a tensão exercida sobre sua massa tecidual. As variações de volume relacionadas às variações de pressão exercidas são conheci- das como complacência. Elastância é a recíproca da complacência. O pulmão rígido tem complacência baixa, expressa em mililitros por centímetros de água ou quilopascal. O pulmão rígido tem elastância alta, expressa em cen- tímetros de água ou quilopascal por mililitro 1 . PROPRIEDADES ELÁSTICAS DO PULMÃO O pulmão tem na estrutura alveolar, especialmente no revestimento interno, a base para seu mecanismo de retração elástica. Em 1929 Von Neergaard 2 mostrou que o pulmão cheio e imerso em água tem elastância menor do que o pulmão cheio de ar. Ele concluiu que há uma tensão superficial atuando na vasta camada de revestimento interno do alvéolo. Esta tensão superficial produz forças capazes de re- duzir a interface ar/água e sendo a pressão dos gases dentro das bolsas formadas nesta camada de revestimento alveolar maior do que a pressão dos gases que estão em volta delas, o alvéolo mantém-se livre de colabamento. A massa fluida que reveste a superfície do alvéolo internamente, sendo um material ativo de superfície, recebeu o nome de surfac- tante. É constituído de fosfolipídios que têm 4 núcleos químicos básicos: ácido graxo, glicerol, fosfato e base nitrogenada. Os ácidos graxos são hidrófobos e a base nitrogenada é hidrófila. Os ácidos graxos ficam em contato com o gás, enquanto a base fica no meio aquoso 1 . O surfactante opõe resistência à tran- sudação (passagem de água do capilar para o alvéolo) e sua ausência facilita o edema pul- monar. Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial 1 Coordenador de Anestesiologia da Rede SARAH dos Hospitais do Aparelho Locomotor - Brasília - DF Correspondência para Renato Ângelo Saraiva SQS 107 Bloco J Ap 202 - Asa Sul 70346-100 Brasília - DF Apresentado em 25 de agosto de 1995 Aceito para publicação em 06 de dezembro de 1995 © 1996, Sociedade Brasileira de Anestesiologia

Transcript of Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo...

Page 1: Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo Saraiva, TSA1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics ... Em anestesia ou terapia intensiva, com

Mecânica Respiratória e Controle da Ventilação

Renato Ângelo Saraiva, TSA 1

Saraiva RA - Respiratory Mechanics - Control of Ventilation

KEY WORDS - CENTRAL NERVOUS SYSTEM: medula, ventilation, control; RESPIRATION: mechanics; VENTILA-TION: control, medula, central nervous system

MECÂNICA RESPIRATÓRIA

Os pulmões têm movimentos passivos,sempre dependentes de forças externas. Narespiração espontânea, os músculos respi-ratórios geram a força capaz de levar o ar aospulmões. Na respiração artificial, uma máquinagera a diferença de pressão entre o sistema deventilação e a via aérea, fazendo com que o archegue ao alvéolo pulmonar. Em ambos os ca-sos o fenômeno físico do movimento pulmonar,fazendo com que o pulmão receba ou libere umcerto volume de gás, é influenciado pela im-pedância do sistema respiratório. Esta impedân-cia se desenvolve em função da resistênciaelástica dos tecidos, da interface gás/líquido doalvéolo e do atrito entre a parede da via aérea eo fluxo de ar. Fontes menores de impedância(desprezíveis) são a inércia dos gases e dostecidos e a fricção da deformação tecidual.Devido à sua estrutura elástica, os pulmões sãocapazes de sofrer variações de volume deacordo com a tensão exercida sobre sua massatecidual. As variações de volume relacionadasàs variações de pressão exercidas são conheci-das como complacência . Elastância é a

recíproca da complacência. O pulmão rígido temcomplacência baixa, expressa em mililitros porcentímetros de água ou quilopascal. O pulmãorígido tem elastância alta, expressa em cen-tímetros de água ou quilopascal por mililitro 1.

PROPRIEDADES ELÁSTICASDO PULMÃO

O pulmão tem na estrutura alveolar,especialmente no revestimento interno, a basepara seu mecanismo de retração elástica. Em1929 Von Neergaard2 mostrou que o pulmãocheio e imerso em água tem elastância menordo que o pulmão cheio de ar. Ele concluiu quehá uma tensão superficial atuando na vastacamada de revestimento interno do alvéolo. Estatensão superficial produz forças capazes de re-duzir a interface ar/água e sendo a pressão dosgases dentro das bolsas formadas nestacamada de revestimento alveolar maior do quea pressão dos gases que estão em volta delas,o alvéolo mantém-se livre de colabamento.

A massa fluida que reveste a superfíciedo alvéolo internamente, sendo um materialativo de superfície, recebeu o nome de surfac-tante. É constituído de fosfolipídios que têm 4núcleos químicos básicos: ácido graxo, glicerol,fosfato e base nitrogenada. Os ácidos graxossão hidrófobos e a base nitrogenada é hidrófila.Os ácidos graxos ficam em contato com o gás,enquanto a base fica no meio aquoso1.

O surfactante opõe resistência à tran-sudação (passagem de água do capilar para oalvéolo) e sua ausência facilita o edema pul-monar.

Rev Bras Anestesiol1996; 46: 3: 164 - 174

Artigo Especial

1 Coordenador de Anestesiologia da Rede SARAH dos Hospitaisdo Aparelho Locomotor - Brasília - DF

Correspondência para Renato Ângelo SaraivaSQS 107 Bloco J Ap 202 - Asa Sul70346-100 Brasília - DF

Apresentado em 25 de agosto de 1995Aceito para publicação em 06 de dezembro de 1995

© 1996, Sociedade Brasileira de Anestesiologia

164 Revista Brasileira de Anestesiologia

Vol. 46 : N° 3, Maio - Junho, 1996

Page 2: Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo Saraiva, TSA1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics ... Em anestesia ou terapia intensiva, com

Sempre que há grande aumento da águaintersticial existe uma tendência à redução dosurfactante, redução da elastância e da com-placência pulmonar.

O trabalho da musculatura do tórax pro-duz variações nos diâmetros internos que exer-cem influência direta sobre a pressão intra-torácica e interfere indiretamente na pressãoalveolar.

A pressão alveolar é maior do que apressão intratorácica ou intrapleural. Esta dife-rença é chamada de gradiente de pressão trans-mural. Quando há aumento no volume pulmonar,há aumento no gradiente de pressão transmural.Os alvéolos situados na parte superior dospulmões têm maior volume do que os localizadosna parte inferior. A maior expansão dos alvéolossuperiores resulta em pressão alveolar mais ele-vada e também no aumento do gradiente depressão transmural.

É conhecida a regra de que para cada 3cm de descida corresponde uma redução de1 cmH2O (0,1 kPa) no gradiente de pressãotransmural. Assim, se o gradiente tiver um valorde 12 cmH2O (1,2 KPa) no ápice pulmonar, naparte média do pulmão tal valor será de aproxi-madamente 6 cmH2O (0,6 KPa).

Para inflar o pulmão, o volume de gás sedirige para o alvéolo ao mesmo tempo em queaumenta o gradiente de pressão transmural. Avariação de volume dividido pela variação depressão é conhecida como complacência. Existeuma relação linear entre volume e pressão, noentanto, a retração elástica do pulmão na expi-ração é menor do que a distensão na inspiração,promovida pelo gradiente de pressão transmu-ral. Isto pode ser observado na figura 1.

Há alvéolos de abertura rápida que têmbaixa resistência ao fluxo e baixa complacênciae alvéolos de abertura lenta que têm alta re-sistência ao fluxo e alta complacência.

Durante uma inflação pulmonar curta osalvéolos de abertura rápida são ventiladosprimeiro, enquanto os alvéolos de abertura lentasão ventilados em inflação pulmonar mais longa,que permite uma melhor distribuição do gás ins-

pirado, ventilando um maior número de unidadesalveolares.

Esta distribuição do fluxo de gases nosalvéolos não é de grande importância no pulmãosadio, entretanto, merece atenção especial nopulmão doente, particularmente na doença obs-trutiva da via aérea como asma, bronquite eenfisema. Nestes casos a distribuição do fluxode gases se processa lentamente e certamentea inflação dos alvéolos é dependente do tempo,caracterizando a complacência como depen-dente da freqüência respiratória, como um sinalprecoce da anormalidade na distribuição dofluxo de gases no pulmão.

Alguns alvéolos tendem a fechar, vindoa reabrir com a administração de um con-siderável volume de gás que elevará o gradientede pressão transmural, sendo os valores muitoacima daqueles no momento do fechamento al-veolar.

Não há evidências histológicas que de-monstrem colapso alveolar no pulmão normal.Ele é sempre causado por alguma forma dedoença pulmonar ou agente externo como opneumotórax. A inflação pulmonar profunda fa-cilita a reabertura dos alvéolos e promoveaumento da complacência.

O efeito do surfactante em reduzir a ten-são superficial é menor quando o volume pul-

1,0

0,5

1,5

2,0

2-5 -10 -15 -20 cmH O-2,0-0,5 -1,0 -1,5 KPa

Vol

ume

Pul

mon

arac

ima

daC

apac

idad

eR

esid

ual F

unci

onal

(Litr

os)

Gradiente de Pressão Transmural

Fig 1 - Histeresis - curvas em forma de laço da relação volume/pressãodos pulmões na inspiração e na expiração.

SARAIVA

Revista Brasileira de Anestesiologia 165

Vol. 46 : N° 3, Maio - Junho, 1996

Page 3: Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo Saraiva, TSA1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics ... Em anestesia ou terapia intensiva, com

monar é elevado, sendo maior na inspiração doque na expiração. Isto favorece a elastância e acomplacência pulmonar e pode ser observadona histeresis da curva volume/pressão (Fig 1).

A complacência pulmonar é expressapela relação volume/pressão. As variações devolume são maiores do que as variações depressão, então a complacência é basicamentevolume dependente. Assim, em valores absolu-tos, o elefante tem maior complacência do que orato e o homem adulto tem a complacência maiselevada do que o recém-nascido3.

Sendo a complacência volume depen-dente, para se ter uma noção real do valor dacomplacência pulmonar deve-se relacionar estevalor ao da capacidade residual funcional, que éa melhor expressão do volume aéreo dopulmão4

. Em valores relativos, a complacência eoutras variáveis fisiológicas respiratórias dorecém-nascido são semelhantes às do adulto(Tabela I) 5.

Todos os fatores que podem alterar ovolume pulmonar interferem também na com-placência pulmonar.

Deste modo, a estase venosa do pulmãopoderá reduzir a inflação pulmonar e con-seqüentemente o volume e a complacência. Apostura (posição) também pode alterar o volumee a complacência pulmonar. Da mesma forma aidade e as demais restrições à expansão dotórax e do pulmão interferem no volume aéreo ena complacência pulmonar.

A complacência é medida dividindo-se avar iação de volume pela correspondente

variação de pressão. Para a medida da com-placência pulmonar o volume apropriado é ovolume corrente e a pressão é a expressa nogradiente de pressão alvéolo/pleural. No caso dacomplacência total toracopulmonar, o volumepode ser o volume corrente e a pressão a ex-pressa no gradiente alvéolo/ambiente. A com-placência da caixa torácica pode ser medidausando-se o volume expresso nas diferençasverificadas entre inspiração e expiração na ples-timografia e a pressão obtida pela diferença en-tre a pressão interpleural e a ambiente. Tem sidoutilizada a pressão esofágica como pressãopleural porque são realmente muito próximas.Da mesma forma a pressão medida na boca(pressão da via aérea superior) pode ser referidacomo a pressão alveolar quando não há fluxo degás em nenhum sentido.

A complacência estática é medida com oindivíduo relaxado, com sua via aérea emsistema semifechado e sendo submetido a respi-ração artificial, como acontece no pacienteparalisado na anestesia. O volume de ar insu-flado a partir da capacidade residual funcional eo gradiente de pressão são medidos e re-lacionados ao gradiente em repouso ao nível dacapacidade residual funcional 4.

A complacência dinâmica é medida du-rante a respiração rítmica (espontânea e invo-luntária). É calculada através de pontos devolume e pressão tomados no final da inspiraçãoe final da expiração, quando não há fluxo de ar.

Em anestesia ou terapia intensiva, como uso de um ventilador pulmonar que mostre os

Tabela I - Variáveis fisiológicas respiratórias do adulto e do recém-nascido 5.

Adulto Recém-Nascido

Capadidade Pulmonar Total (ml/kg) 86 63

Capacidade Vital (ml/kg) 52 33

Capacidade Residual Funcional (ml/kg) 34 30

Volume Corrente (ml/kg) 7 6

Ventilação Alveolar (L.min/m2) 2,4 2,3

Complacência Pulmonar/Capacidade ResidualFuncional (ml/cmH2O/L) 0,07 0,07

Freqüência Respiratória (resp/min) 18 30

MECÂNICA RESPIRATÓRIA E CONTROLE DA VENTILAÇÃO

166 Revista Brasileira de Anestesiologia

Vol. 46 : N° 3, Maio - Junho, 1996

Page 4: Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo Saraiva, TSA1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics ... Em anestesia ou terapia intensiva, com

valores do volume corrente e da pressão da viaaérea, pode-se fazer a estimativa da complacên-cia pulmonar a qualquer momento (complacên-cia = volume/pressão). Tendo o ventilador aindicação do fluxo respiratório é possível sabera resistência da via aérea (resistência = gradi-ente de pressão/fluxo).

DIFERENÇAS REGIONAISDE VENTILAÇÃO

A ventilação não é distribuída eqüitati-vamente em todos os alvéolos pulmonares. Osque oferecem maior resistência recebem menorvolume na unidade de tempo. A localização doalvéolo também é um fator determinante em suaventilação. É conceito clássico que os alvéolosda parte superior do pulmão são menos venti-lados do que os da parte inferior. Com o in-divíduo na posição vertical (em pé ou sentado),a base do pulmão recebe maior volume de ar doque o ápice. Da mesma forma, a base recebetambém maior volume de sangue do que o ápice.Entretanto a diferença entre o volume de sangueda base e do ápice é muito menor do que adiferença de volume de ar da base para o ápice,por este motivo se diz que o ápice é mais venti-lado do que perfundido, ou melhor explicando,da base para o ápice o pulmão se torna maisventilado do que perfundido 5.

O fenômeno da distribuição preferencialda ventilação para a base tem algumas expli-cações. A primeira delas é a gravidade, mesmoo gás tendo um menor peso por volume, tambémsofre a ação da gravidade. A segunda explicaçãoé que a base mantém um maior volume de gásapós a expiração (volume residual), provavel-mente devido ao fechamento da via aérea antesdo final da expiração (volume de oclusão), porinfluência da pressão pleural menos negativa emrelação à atmosfera na parte inferior do pulmão,estabelecendo menor gradiente de pressãotransmural que exerce maior estímulo nos bron-quíolos terminais para que efetuem o fecha-mento aparentemente precoce 6.

Sendo a base do pulmão mais ventiladae também mais perfundida, realiza maior volume

das trocas gasosas e por isto suas alteraçõescausam maiores repercussões sobre outrasfunções vitais do organismo como um todo.

É descrito que em virtude do homempermanecer a maior parte do tempo na posiçãoereta (em pé ou sentado), por ação da gravidadeos tecidos pulmonares se dirigem mais parabaixo. Então, na base, há um número maior deunidades alvéolo-capilares funcionantes.

PROPRIEDADES ELÁSTICAS DAPAREDE TORÁCICA

A caixa torácica é constituída de umaestrutura com propriedades elásticas, devido àdistribuição das costelas, com os espaços inter-costais amplos, e à presença de tecidos elásti-cos como os músculos, as pleuras e as fásciasde tecido conjuntivo.

Por sua elasticidade, na inspiração acaixa torácica promove aumento dos diâmetrostorácicos vertical, anteroposterior e lateral, ecom isto faz com que os pulmões sejam inflados.O fluxo de ar do meio ambiente, a partir da bocae nariz, se dirige até o alvéolo, devido ao gradi-ente de pressão transmural e à diferença entrea pressão alveolar e a pressão intratorácica(pleural). Na expiração, os diâmetros torácicosdiminuem, o gradiente de pressão transmuraltambém reduz e o gradiente de pressão boca-alvéolo se inverte. Então o fluxo passa a ser nosentido alvéolo-boca.

Há situações clínicas em que a elastici-dade da caixa torácica pode estar diminuída.Estas estão geralmente relacionadas comdoenças osteomusculares ou neuromusculares.As osteomusculares são encontradas nas calci-ficações das articulações costovertebrais, cos-toesternais e nas grandes deformidadest o rá c i c a s . A s n e u r o mu s c u l a r e s são asneuromiopatias, geralmente congênitas, que di-ficultam a contração muscular.

A complacência da caixa torácica podeser medida por vários métodos utilizando a re-lação volume/pressão. O volume corrente pode

SARAIVA

Revista Brasileira de Anestesiologia 167

Vol. 46 : N° 3, Maio - Junho, 1996

Page 5: Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo Saraiva, TSA1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics ... Em anestesia ou terapia intensiva, com

ser utilizado como o volume, e a diferença entrea pressão intrapleural e a ambiente como apressão. Pode ser usado o método da impedân-cia, que mede a variação de volume do tórax, nainspiração e em repouso, dividindo o valor peladiferença das pressões pleural e ambiente. Apressão intrapleural pode ser dita como o valormedido da pressão esofágica.

A complacência pulmonar do recém-nas-cido é semelhante à do adulto quando com-paradas em valores relativos (complacência/capacidade residual funcional). Entretanto, acomplacência da caixa torácica é bem maior norecém-nascido (0,58 ml/cmH2O/L) do que noadulto (0,07 ml/cmH2O/L)5.

Isto ocorre, certamente, devido à estru-tura tecidual do tórax do recém-nascido. Oesqueleto é muito cartilaginoso, as articulaçõesainda em formação faci l i tam bastante osmovimentos, os tecidos musculares e sub-cutâneos, pouco desenvolvidos, não exercemmuito peso sobre o gradil costal. Estas con-dições são bem diferentes das do adulto, quetem esqueleto de consistência mais rígida, mus-culatura torácica e tecido subcutâneo maisabundantes. Obviamente, no recém-nascido, aoinflar os pulmões é mais fácil movimentar seutórax e alterar seu volume. Por esta razão, acomplacência e a elastância da caixa torácicasão mais elevadas.

RESISTÊNCIA DAS VIAS AÉREAS

Ao receber o fluxo de ar pelas viasaéreas, o pulmão infla, se deforma e altera seuvolume. Isto é a impedância pulmonar. A re-sistência devido à impedância, ou seja, a re-sistência imposta ao fluxo de ar decorrente dadeformação tecidual do pulmão, somada à re-sistência das vias aéreas, eram conhecidas an-teriormente como resistência pulmonar. Pos-teriormente, a resistência pulmonar foi separadaem resistência das vias aéreas e resistência dostecidos pulmonares, esta última já descritaacima como complacência e elastância pulmo-nares.

Deve ser esclarecido que existem tam-bém como resistência pulmonar, no conceito am-plo, a inércia tecidual que é a resistência nãoelástica e a inércia do gás. Apenas em situaçõesespeciais de doença pulmonar a inércia tecidualpode ser considerada. Da mesma forma, a inér-cia do gás necessita também de condições espe-ciais da árvore traqueobrônquica que modi-fiquem as características do fluxo de gás paraalterar sua distribuição molecular, interferindoentão com a inércia.

O gás flui de uma área de maior pressãopara uma outra de menor pressão. A diferençade pressão entre duas áreas ou regiões é dire-tamente proporcional ao fluxo, ou seja, o fluxo édependente da diferença de pressão.

A relação precisa entre o fluxo e a dife-rença de pressão depende da natureza do fluxo.Este pode ser laminar, turbulento ou misto. Istodepende da organização e movimento moleculardos gases. Na via aérea há os vários tipos defluxo descritos.

FLUXO LAMINAR

O gás flui em um tubo reto, sem ramifi-cações, como se fosse uma série de cilindrosconcêntricos, sendo que o cilindro centralmovimenta-se mais rapidamente. Isto significaque no fluxo laminar o gás flui mais rápido naparte central do tubo enquanto que, nas partesmais externas ele é mais lento, por sofrer aresistência do atrito com a parede do tubo(Figura 2).

Fig 2 - Fluxo Laminar

MECÂNICA RESPIRATÓRIA E CONTROLE DA VENTILAÇÃO

168 Revista Brasileira de Anestesiologia

Vol. 46 : N° 3, Maio - Junho, 1996

Page 6: Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo Saraiva, TSA1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics ... Em anestesia ou terapia intensiva, com

FLUXO TURBULENTO

Quando a ordem de distribuição do fluxoé quebrada o fluxo passa a turbulento (Fig 3).Isto acontece quando o fluxo é muito alto em umtubo estreito (Fig 3a), nas angulações (Fig 3b),nas ramif icações (Fig 3c) e também nasmudanças bruscas de diâmetro (Fig 3d).

A relação entre o fluxo e diâmetro dotubo estabelece as condições de fluxo, podendoser laminar ou turbulento. O fluxo alto requertubo de diâmetro grande para fluir bem, comcaracterísticas de fluxo laminar. Não havendoesta relação o fluxo será turbulento.

Na respiração espontânea o f luxomáximo de ar é de aproximadamente 25 litrospor minuto. Para que este fluxo seja laminar énecessár io que o diâmetro da via aérea(traquéia) seja de, no mínimo, 40 milímetros.Caso o diâmetro seja menor, até 25 milímetros,será misto (laminar e turbulento) e sendo maisestreito será turbulento1.

Quando a resistência da via aérea estáaumentada o fluxo é totalmente turbulento, nestecaso haverá inércia do gás e a velocidade lineardo gás estará diminuída.

AUMENTO NA RESISTÊNCIADA VIA AÉREA

De acordo com Nunn1, há quatro grausde resistência da via aérea bem definidos:

Grau 1 -Resistência Leve, é aquela contra aqual o paciente pode manter a ventilaçãoalveolar normal indefinidamente.

Grau 2 -Resistência Moderada, é aquela con-tra a qual o paciente necessita desen-volver maior esforço para respirar, a fimde manter a ventilação alveolar. Dispnéiaé observada. Os gases sangüíneos sãomantidos em valores normais.

Grau 3 -Resistência Grave, é aquela contra aqual nenhum paciente é capaz de preser-var sua ventilação alveolar. A PaCO2 éaumentada e há redução significativa naPaO2.

Grau 4 -Obstrução Respiratória, é aquela naqual a resistência respiratória estáaumentada de tal forma que é incom-patível com a vida.

CAUSAS DE AUMENTO NA RESISTÊNCIADA VIA AÉREA

Para sistemas biológicos como em con-dutância de gases em tubos, de um modo geral,é importante saber que a obstrução ou reduçãodo diâmetro do tubo podem ocorrer por:

1) Material dentro do lumen;2) Estreitamento ou contração da parede do

tubo;3) Pressão de fora ou sucção na passagem

do gás.

As causas descritas a seguir referem-sea situações anormais da via aérea e estão re-lacionadas com estas condições gerais men-cionadas acima.

- Aparelhos externos - sistema ventilatório.

c) d)

a) b)

Fig 3 - Fluxo Turbulento

SARAIVA

Revista Brasileira de Anestesiologia 169

Vol. 46 : N° 3, Maio - Junho, 1996

Page 7: Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo Saraiva, TSA1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics ... Em anestesia ou terapia intensiva, com

- Tubos traqueais e de traqueostomia, cânulasoro e nasofaríngeas - em condições normaisnão causam grande aumento na resistênciada via aérea. No entanto, podem ser obs-truídos por pressão externa ou bloqueio in-terno.

- Material estranho na faringe ou laringe - con-teúdo gástrico, secreções abundantes,sangue e tumores podem obstruir a via aéreasuperior. Anomalias anatômicas da faringesão causas da obstrução respiratória duranteo sono.

- Obstrução bronquiolar - é geralmente causadapor edema, secreções, pus, tumores e corposestranhos. No entanto, a causa maisfreqüente de aumento da resistência das viasaéreas inferiores é o espasmo do bronquíolo,na maioria das vezes associado a edema damucosa. Existe ainda o colapso relacionadoà grande redução de fluxo e de volume.

O espasmo do bronquíolo é conseqüên-cia da hiper-reatividade das vias aéreas e en-volve edema, secreções que aderem à mucosae descamação do epitélio por agressão de agen-tes tóxicos e infecção. Estes fatores irritantesproduzem espasmo bronquiolar.

O colapso relacionado à queda do fluxopela redução do diâmetro da via aérea ocorre,freqüentemente, nos estados mais conhecidoscomo doença pulmonar obstrutiva como bron-quite, enfisema e asma.

Quando o volume pulmonar é diminuídopor qualquer causa, há alteração no gradientede pressão transmural e estímulo ao fechamentobronquiolar antes do final da expiração. Estemecanismo está implícito no volume de oclusão.

CAPACIDADE DE OCLUSÃO

Para manter o volume aéreo do pulmãoquando este é reduzido por problemas das viasaéreas ou do próprio parênquima pulmonar, osbronquíolos se fecham em momento oportuno dafase expiratória. O volume que ficou retido, que

não foi expirado, acima do volume residual é ovolume de oclusão e a somatória deste ao vo-lume residual é a capacidade de oclusão.

CONTROLE DA VENTILAÇÃO

A respiração é realizada pela contraçãoe relaxamento da musculatura estriada en-volvida neste processo, que tem um controleautomático no sistema nervoso central.

Até o início do século passado, imagi-nava-se que o cérebro tinha o comando do auto-matismo respiratório, quando surgiram osprimeiros trabalhos experimentais que se nota-bilizaram pelas explicações da fisiologia respi-ratória, especialmente o controle nervosocentral, com base nos resultados de estudosrealizados em animais de laboratório.

Em 1812 Legallois 9 mostrou que o ritmorespiratório continuava após a retirada do cere-belo e de parte do cérebro acima do bulbo. Em1880 Marckwald e Kronecker 10 diferenciaramos neurônios (centros) inspiratórios e expi-ratórios. Em 1923 Lumsden 11 descreveu oscentros pneumotáxico e apnêustico, localizadosna Ponte de Varoli (protuberância anular). Pitts,Magoun e Ranson 12, em 1939, relataram a lo-calização anatômica dos centros inspiratório eexpiratório no bulbo e também o conceito deinibição de um centro pelo outro, estabelecendoo automatismo respiratório. Concluíram que aritmicidade é feita por dois mecanismos separa-dos e alternativos com características de feedback em forma de alça, sendo um deles contro-lado pelo centro pneumotáxico e o outro peloreflexo vagal sensitivo aferente do estiramentopulmonar.

O CONTROLE CENTRAL

Os centros respiratórios foram locali-zados através de estudos laboratoriais que evi-denc ia ram mod i f i cações ou reg is t ra ramatividade após estímulos. Deste modo foram ob-servadas quatro técnicas principais, utilizadasnestas pesquisas: 1) remoção cirúrgica de ór-

MECÂNICA RESPIRATÓRIA E CONTROLE DA VENTILAÇÃO

170 Revista Brasileira de Anestesiologia

Vol. 46 : N° 3, Maio - Junho, 1996

Page 8: Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo Saraiva, TSA1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics ... Em anestesia ou terapia intensiva, com

gãos do encéfalo e verificação das alteraçõesdos padrões respiratórios; 2) estímulo elétricolocal, em vários pontos dos órgãos encefálicose registro da atividade respiratória; 3) registro daatividade espontânea com microeletrodos, pro-curando relacionar a atividade elétrica com al-terações respiratórias; 4) pesquisa de potencialevocado, em pequenos grupos de célulasatravés de estímulos aferentes vagais ou deestruturas envolvidas na função respiratória.

Atualmente, após inúmeros estudos re-alizados neste dois últimos séculos, é conhecidoum controle central do automatismo respiratórioque funciona paralelamente ao controle volun-tário. Ou seja, o indivíduo respira normalmentesem perceber e, a qualquer momento, pode as-sumir o controle voluntário da respiração. Destemodo, pode-se relacionar vários padrões respi-ratórios normais e anormais, voluntários e invo-luntários.

Eupnéia: ventilação normal, ciclos rítmicos,repetidos sem pausa, inspiração ativa eexpi ração passiva, mecanismoautomático e involuntário.

Hiperpnéia: ventilação aumentada, maior ex-pansão pulmonar, com aumento do vo-lume corrente, geralmente voluntária.

Taquipnéia: aumento da freqüência respi-ratória, geralmente involuntária.

Hipoventilação: redução na ventilação alveo-lar, podendo ser de causa central, de-pressão dos centros respiratórios comalteração da freqüência ou amplituderespiratória, geralmente involuntária.

Apnéia: parada respiratória involuntária, emposição basal, ao final da expiração.

Apneuse: parada respiratória involuntária naposição inspiratória.

Respiração Apnêustica: apneuse interrom-pida por expiração, involuntária.

Respiração de Cheyne-Stokes: ciclos respi-ratórios involuntários com aumento e di-minuição gradativos do volume corrente.

Respiração de Biot: respiração irregular comespasmos inspiratórios uniformes e pro-fundos, seguidos de pausas.

O controle do automatismo respiratório éfeito geralmente por via medular, com partici-pação bulbar e modulação pontina.

Atualmente, alguns fisiologistas, pre-ferem chamar os centros respiratórios descritosno século passado e início deste século comosimplesmente neurônios. Denominando neu-rônios medulares, bulbares e pontinos. No en-tanto, para objetivos didáticos, é importanteutilizar a denominação de centros e seguir asistemática descrita por Conroe 13. Assim, namedula há simplesmente um arco reflexo paraalternar a inspiração e a expiração; no bulbo háos centros inspiratórios e expiratórios; e na pon-te o centro apnêustico e o centro pneumotáxico.

O centro inspiratório inicia imediata ins-piração parando a expiração que é passiva. Ocentro expiratório inibe o inspiratório e faz comque se processe a expiração.

O centro apnêustico é estimulado poralguns reflexos e pelo centro inspiratório, paraprolongar a inspiração, e é inibido pelo centropneumotáxico e também, eventualmente, pelosimpulsos eferentes do reflexo de insuflação porvia vagal.

O centro pneumotáxico é modulador,não é um marcapasso. Ele modula, regulariza oque está irregular em relação ao ritmo respi-ratório automático, podendo inibir e estimular oscentros bulbares, inspiratório e expiratório, etambém o centro apnêustico.

Há uma experiência clássica realizadaem cães e descrita por alguns fisiologistas 13, naqual são feitas secções cirúrgicas em algunspontos do sistema nervoso central e verificadasas repercussões sobre o padrão do ritmo respi-ratório.

1. A secção no mesencéfalo, separando cérebroe ponte, não altera o ritmo respiratório.Quando há também a secção do vago ocorrehiperpnéia, provavelmente por falta de im-pulso inibitório para o centro pneumotáxico;

2. A secção no terço superior da ponte,separando os centros pneumotáxico e ap-nêustico, produz uma leve redução na

SARAIVA

Revista Brasileira de Anestesiologia 171

Vol. 46 : N° 3, Maio - Junho, 1996

Page 9: Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo Saraiva, TSA1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics ... Em anestesia ou terapia intensiva, com

freqüência respiratória. Com a secção dovago haverá apneuse por falta de inibição docentro apnêustico pelo centro pneumotáxico;

3. A secção na parte inferior da ponte leva arespiração de ritmo irregular, porque ficasomente o marca passo de estímulo einibição da inspiração e da expiração. Há faltados centros moduladores, apnêustico e espe-cialmente o pneumotáxico;

4. A secção na porção inferior do bulbo leva àapnéia completa.

SENSORES

Existem sensores (receptores) respi-ratórios distribuídos em algumas partes docorpo. Eles geralmente estimulam a respiraçãoquando ocorrem alterações fisiológicas impor-tantes.

São reconhecidos os sensores quími-cos, os de pressão, os de inflação e deflação, osde estiramento pulmonar, os do fuso muscular eos dos estímulos das vias aéreas superiores.

Os sensores químicos são classificadosem periféricos e centrais. Os periféricos estãolocalizados na croça da aorta e bifurcação dacarótida 14-16. Estes sensores têm respostarápida à elevação da pressão parcial de CO2 equeda da pressão parcial de O2 no sangue arte-rial e aumento da concentração de H+ ou aindaredução da perfusão sangüínea destes elemen-tos. Os valores limites nos quais os sensores sãoativados variam com os indivíduos. Em in-divíduos normais, a redução de 20 mmHg daPaO2 ou a elevação de 10 mmHg da PaCO2 jáestimulam os sensores 1,13.

Os sensores centrais são localizadosnas áreas dos órgãos encefálicos do sistemanervoso central 17,18 e podem ser estimuladosatravés das variações de PaCO2, PaO2 e pH nosangue e no líquor. O estímulo quando produ-zido pela redução do pH é feito por via liquóricae é crescente a cada 0,1 unidade de queda deseus valores a partir de 7,332.

SENSORES DE PRESSÃO

Os principais barorreceptores estão lo-calizados no seio aórtico e seio carotídeo. Elessão estimulados quando ocorre queda brusca dapressão arterial levando a mensagem aos cen-tros respiratórios bulbares, o que resulta emhiperventilação. O mesmo mecanismo podeocorrer quando há grande hipertensão arterial econseqüente hipoventilação. Estes sensorespodem ser inibidos pela ação de anestésicos.

SENSORES DE ESTIRAMENTO

Atualmente admite-se que existem ou-tros sensores distribuídos em toda a via aérea etambém alvéolos, que originam estímulos respi-ratórios a exemplo dos sensores do reflexo deinflação e deflação. Estes sensores podem estarrelacionados aos reflexos de inflação ou a outrosreflexos, mas sempre são estimulados por esti-ramento das vias aéreas ou dos alvéolos 19.

SENSORES DE INFLAÇÃO EDEFLAÇÃO ALVEOLAR

O reflexo de inflação alveolar foi des-crito por Hering e Breuer em 1868. Este reflexofoi estudado em coelhos. Há uma lenda na qualum dos autores observou que conduzindo oscoelhos pelos pés traseiros, de cabeça parabaixo, eles morriam. Então passou a estudar oproblema com a ajuda do outro, resultando nadescrição de um mecanismo que inibe a inspi-ração após a inflação alveolar. Em seguida, foiestudado também o reflexo inverso, no qual, aofinal da expiração, há um mecanismo estimu-lador da inspiração, estando este relacionadoà deflação alveolar. Há relatos que, no coelho,o reflexo de deflação pode ser bloqueado poranestésico local aplicado em forma de aero-sol 20.

MECÂNICA RESPIRATÓRIA E CONTROLE DA VENTILAÇÃO

172 Revista Brasileira de Anestesiologia

Vol. 46 : N° 3, Maio - Junho, 1996

Page 10: Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo Saraiva, TSA1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics ... Em anestesia ou terapia intensiva, com

SENSORES DA MUSCULATURAESQUELÉTICA

O trabalho muscular de contração e es-tiramento, notadamente o de estiramento, emque o músculo fica em forma de fuso, produz umestímulo respiratório chamado reflexo do fusomuscular, que tem características de arco re-flexo medular monossináptico com participaçãodos centros respiratórios bulbares a qualquerinstante. A resposta é a inibição da contraçãomuscular que resulta na expiração, sendo estainibida quando o fuso perde a tensão.

O estímulo é conduzido por fibras A-γ ea resposta por fibras A-α.

SENSORES DA VIA AÉREA SUPERIOR

Estímulos de água, amônia e de fumaçade cigarro no nariz podem causar apnéia súbitacomo o reflexo do mergulho. Na faringe, recep-tores mecânicos são estimulados por pressão etato. O mesmo ocorre na laringe, que tambémpode ser estimulada por pressão subatmos-férica. Estímulo mecânico e químico causamtosse, fechamento da laringe e broncocons-trição. Os reflexos de tosse têm origem emestímulos originados principalmente na laringe,traquéia e brônquio fonte.

OUTROS SENSORES PULMONARES

Estímulos originados no alvéolo alteramo ritmo respiratório na embolia pulmonar e nopneumotórax, produzindo respiração rápida esuperficial. Há redução no volume corrente, ele-vação da freqüência respiratória e, conseqüen-temente, pode haver também aumento doespaço morto.

EFETORES

Há três grupos de neurônios motoressuperiores (bulbares e pontinos) que convergem

para as células do corno anterior medular, ondese ligam aos neurônios inferiores que suprem osmúsculos respiratórios 21. A integração entreestes neurônios que fazem o controle respira-tório tem lugar no corno anterior medular e pon-tino bulbar 22.

O primeiro grupo de neurônios motoresé do grupo ventral respiratório do bulbo e estáenvolvido com a respiração rítmica involuntária.Chega à medula e fica no quadrante ventrola-teral.

O segundo grupo está encarregado docontrole da respiração voluntária, especialmenteda fala e da ginástica respiratória. Chega àmedula e fica nos quadrantes dorsolateral e ven-trolateral.

O terceiro grupo está envolvido com arespiração involuntária não rítmica, tosse,soluço e deglutição. Este grupo não tem locali-zação compacta na medula.

As fibras dos neurônios motores são A-αe A-γ. As fibras A-α são as mais utilizadas paraas respostas rápidas, especialmente na respi-ração voluntária.

Há integração entre os controles mo-tores centrais involuntários e voluntários. O con-trole voluntário pode se superpor ao involuntário,no entanto, ao cessar sua ação, inicia-se auto-maticamente o controle involuntário.

Saraiva RA - Mecânica Respiratória eControle da Ventilação

UNITERMOS - RESPIRAÇÃO: mecânica;SISTEMA NERVOSO CENTRAL: bulbo,ventilação, controle; VENTILAÇÃO: con-trole, bulbar, sistema nervoso central.

REFERÊNCIAS

01. Nunn JF - Applied Respiration Physiology. 4th Ed,Oxford, Butterworth, 1993; 36-135.

02. Von Neegaard K - Neue Anffassungen über einenGrundbegrifft der Atem Mechanic. Die RetraktionsKraft der Lunge, Abhängig von der Oberflächen-pannung in der Alveolen. Ges Exp Med, 1929; 66:373.

SARAIVA

Revista Brasileira de Anestesiologia 173

Vol. 46 : N° 3, Maio - Junho, 1996

Page 11: Rev Bras Anestesiol 1996; 46: 3: 164 - 174 Artigo Especial ... · PDF fileRenato Ângelo Saraiva, TSA1 Saraiva RA - Respiratory Mechanics ... Em anestesia ou terapia intensiva, com

03. Marshall R - The physical properties of the lungs inrelation to subdivisions of lung volume. Clin Sci,1957;16:507-509.

04. Strang LB - Neonatal Respiration Physiological andClinical Studies. Oxford, Blackwell Scientific Pu-blications, 1977;69-71.

05. Nelson NM - Neonatal Pulmonary Function. PedClin N Amer, 1 the Newborn, 1966;13:769-799.

06. Nims RG, Connar EH, Conrose JH - Compliance ofhuman thorax in anesthetized patients. J Clin In-vest, 1955;34:744-748.

07. West, J B - Ventilation, Blood Flow and Gas Ex-change. 3rd Ed. Oxford, Blackwell Scientific Publi-cations, 1977; 27-29.

08. Milic-Emili J, Henderson JAM, Dolsvich MB et al -Regional distribution of inspired gas in the lung. JAppl Physiol, 1966, 21:749-759.

09. Legallois C - Experience sur le principe de la vie.Paris, d’Hantel, 1812.

10. Marckwald MKH - Die Athembewegungen des 2Werchfells des Kaninchens. Arch Physiol Leipzig,1880;441-449.

11. Lumsden T - Observation on the respiratory centresin the cat. J Physiol, 1923;57:153-154

12. Pitts RI, Mazonn HW, Ranson SW - Localization ofthe medulary respiration centers in the cat. Am JPhysiol, 1939;126:673-676.

13. Conroe JH - Fisiologia da Respiração, 2ª Ed, Riode Janeiro, Guanabara Koogan, 1977;21-94.

14. Mc Donald DM - Peripheral Chemoreceptors, inHornbein TE - Regulation of Breathing. New York,Marcel Dekker, 1981;93-129.

15. Mc Queen DS, Pallot DJ - Peripheral ArterialChemoreceptors, in Pallot DJ - Control of Respira-tion. London, Croom Helm, 1983;96.

16. Bledsoe SW, Hornbein TF - Central Chemorecep-tors and the Regulation of their Chemical Environ-ment, in Horbein TF - Regulation of Breathing, partI, New York. Marcel Dakker, 1981; 68-92.

17. Labiri S - Physiological Responses: PeripheralChemoreceptors, in Cristal RG, West JB - TheLung: Scientific Foundations. New York, RavenPress, 1991; 1333

18. Sato M, Severinghaus JW, BasBaum AI - MedularCO2 chemoreceptors neuron identification by c.fos immunochemistry. FASEB J, 1991; 5: A1120.

19. Sant’Ambrogio G, Sant’Ambrogio FB - Reflexesfrom the Airway, Lung, Chest Wall and Limbs, inCrystal RG, West JB - The Lung: Scientific Foun-dations. New York, Raven Press, 1991; 1383.

20. Jain SK, Trenchard D, Reynalds F et al - The effectof local anaesthesia of the airway on respiratoryreflexes in the rabbit. Clin Sci, 1973; 44:519-522.

21. Mitchell RA, Berger AJ - Neural Regulation of Res-piration, in Hornbein TF - Regulation of Breathing.New York, Marcel Dekker, 1981;45.

22. Berger AJ, Harnbein TF - Control of Respiration, inPatton HD, Fuchs AF, Hille B et al - Physiology andBiophysics. 21st Ed, Philadelphia, W B Saunders,1987;2:356-359.

MECÂNICA RESPIRATÓRIA E CONTROLE DA VENTILAÇÃO

174 Revista Brasileira de Anestesiologia

Vol. 46 : N° 3, Maio - Junho, 1996