RESENHA DA OBRA MONARQUIA DE DANTE ALIGHIERI · é o poder espiritual; o poder temporal é a lua;...

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Revista Virtual Direito Brasil – Volu "Se, portanto, ass O presente estudo t formulados por Dante Alig Ressalta-se, que e reconhecimento da central defesa da separação entre o Estado moderno. Antes de se adentra da vida de Dante Alighieri, Dante Alighieri nas sua época, talvez daí ad 1 Mestrado e Doutorado em D Universidade Católica de São Pa 2 No original: De Monarchia. ume 10 – nº 2 - 2016 RESENHA DA OBRA MONARQUIA DE DANTE ALIGHIERI Maria Be sim é, só Deus escolhe, só Deus confirma, porqu tem quem seja superior a ele..." D tem por objetivo destacar e sintetizar os princi ghieri na obra intitulada Monarquia. 2 esta resenha buscará apontar as teses do a lidade do poder com o aprimoramento da idei o poder espiritual e temporal, e sua contribuição ar a abordagem de referido texto, destaca-se alg , o que facilitará a compreensão da obra aqui ana sceu em Florença, no ano de 1265 e foi um polít dvenha seu interesse em escrever o livro M Direito das Relações Sociais, subárea Direito Empresar aulo. Professora de Direito Empresarial e Advogada. ernadete Miranda 1 ue só Deus não Dante Alighiere ipais argumentos autor acerca do ia de governo, a o na formação do gumas passagens alisada. tico influente em Monarquia e sua rial, pela Pontifícia

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Revista Virtual Direito Brasil – Volume 10

"Se, portanto, assim é,

O presente estudo tem

formulados por Dante Alighieri na obra intitulada

Ressalta-se, que esta resenha buscará apontar as teses do autor acerca do

reconhecimento da centralidade do poder com o aprimoramento da ideia de governo, a

defesa da separação entre o poder espiritual e temporal,

Estado moderno.

Antes de se adentrar

da vida de Dante Alighieri, o que facilitará a compreensão da obra aqui analisada.

Dante Alighieri nasceu em Florença, no ano de 1265 e

sua época, talvez daí advenha seu interesse em escrever o livro

1 Mestrado e Doutorado em DiUniversidade Católica de São Paulo. Professora de Direito Empresarial e Advogada. 2 No original: De Monarchia.

Volume 10 – nº 2 - 2016

RESENHA DA OBRA MONARQUIA DE DANTE ALIGHIERI

Maria Bernadete Miranda

Se, portanto, assim é, só Deus escolhe, só Deus confirma, porque só Deus não

tem quem seja superior a ele..." Dante Alighiere

O presente estudo tem por objetivo destacar e sintetizar os principais argumentos

e Alighieri na obra intitulada Monarquia. 2

que esta resenha buscará apontar as teses do autor acerca do

reconhecimento da centralidade do poder com o aprimoramento da ideia de governo, a

defesa da separação entre o poder espiritual e temporal, e sua contribuição na formação do

adentrar a abordagem de referido texto, destaca-se algumas passagens

, o que facilitará a compreensão da obra aqui analisada.

nasceu em Florença, no ano de 1265 e foi um político influente em

lvez daí advenha seu interesse em escrever o livro Monarquia

Mestrado e Doutorado em Direito das Relações Sociais, subárea Direito Empresarial, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professora de Direito Empresarial e Advogada.

Maria Bernadete Miranda 1

só Deus escolhe, só Deus confirma, porque só Deus não

Dante Alighiere

destacar e sintetizar os principais argumentos

que esta resenha buscará apontar as teses do autor acerca do

reconhecimento da centralidade do poder com o aprimoramento da ideia de governo, a

sua contribuição na formação do

algumas passagens

, o que facilitará a compreensão da obra aqui analisada.

foi um político influente em

Monarquia e sua

área Direito Empresarial, pela Pontifícia

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 10

contribuição para a ciência política. Também foi poeta, tendo escrito

que se tornou a base da língua italiana moderna.

Na época, tendo em vista

natal, oportunidade em que escreveu

Dante Alighieri m

retornado à Florença.

Em sua obra Monarquia

separação entre os poderes (temporal e espiritual).

independência entre o poder temporal

poder do governante estava subordinado ao poder da Igreja.

Assim, as ideias políticas de Dante encontraram grande resistência da Igreja, tendo

o livro sido incluído no Index

que os argumentos de Dante serviram de base para a construção teórica dos Estados

modernos. E, nesse sentido, é que Dante Alighieri desenvolve o trabalho sob análise. Seu

objetivo é a elaboração de argumentos históricos e filosóficos que permitam a e

de um Estado laico, deixando claro que as esferas de poder são completamente

independentes.

Sendo Dante Alighieri

entendimento de que os podere

estabelecer de forma separada.

A obra foi dividida em três capít

Monarquia; Livro Segundo:

monarquia e do império e Livro Terceiro:

imediatamente de Deus.

Na primeira parte do livro,

vive em sociedade e, por isso, somente consegue alcançar o seu objetivo no meio social.

Dessa forma, faz a distinção de dois planos um espiritual e outro terreno, separando as

chamadas ordens éticas e isso é o principal

defendida ao longo do texto.

3 Conjunto de poemas escrito em italiano e não em latim como era o costume da época e que se tornou a referência da língua italiana moderna, está dividido em três partes, a saber: Inferno, Purgatório e Paraíso.4 Index Librorum Prohibitorum do Index foi promulgada pelo Papa Paulo IVporém o Index só foi abolido pela Igreja Católica emcontra os dogmas da Igreja e que continham conteúdo tido como impróprio.

Volume 10 – nº 2 - 2016

ibuição para a ciência política. Também foi poeta, tendo escrito A Divina Comédia

que se tornou a base da língua italiana moderna.

Na época, tendo em vista o seu envolvimento com a política foi exilado de sua terra

que escreveu Monarquia, provavelmente no ano de 1313.

morreu em 1321, com 56 anos, em Ravena, sem nunca ter

Monarquia, elaborou um tratado político em que defende a tese da

separação entre os poderes (temporal e espiritual). Dante Alighieri

independência entre o poder temporal e o espiritual, porque até então se entendia que o

poder do governante estava subordinado ao poder da Igreja.

Assim, as ideias políticas de Dante encontraram grande resistência da Igreja, tendo

o livro sido incluído no Index, 4 sendo retirado somente no final do século XIX. Fri

que os argumentos de Dante serviram de base para a construção teórica dos Estados

modernos. E, nesse sentido, é que Dante Alighieri desenvolve o trabalho sob análise. Seu

a elaboração de argumentos históricos e filosóficos que permitam a e

de um Estado laico, deixando claro que as esferas de poder são completamente

Alighieri um pensador social, sua obra foi fundamental para o

entendimento de que os poderes que regem a sociedade (Deus, papa e imperador)

estabelecer de forma separada.

A obra foi dividida em três capítulos, a saber, Livro Primeiro:

; Livro Segundo: Como o povo romano obteve legitimidade e o encargo da

e Livro Terceiro: O encargo da monarquia e do

Na primeira parte do livro, Dante Alighieri parte da explicação de que o homem

vive em sociedade e, por isso, somente consegue alcançar o seu objetivo no meio social.

Dessa forma, faz a distinção de dois planos um espiritual e outro terreno, separando as

chamadas ordens éticas e isso é o principal argumento sob o qual elabora toda a tese

defendida ao longo do texto.

Conjunto de poemas escrito em italiano e não em latim como era o costume da época e que se tornou a referência da língua italiana moderna, está dividido em três partes, a saber: Inferno, Purgatório e Paraíso.

lista das obras literárias que foram proibidas pela IgrejaPapa Paulo IV em 1559 e a última edição do índice foi publicada em

só foi abolido pela Igreja Católica em 1966 pelo Papa Paulo VI. Nessa lista da Igreja e que continham conteúdo tido como impróprio.

A Divina Comédia, 3

foi exilado de sua terra

, provavelmente no ano de 1313.

orreu em 1321, com 56 anos, em Ravena, sem nunca ter

o em que defende a tese da

trabalha com a

até então se entendia que o

Assim, as ideias políticas de Dante encontraram grande resistência da Igreja, tendo

somente no final do século XIX. Frisa-se

que os argumentos de Dante serviram de base para a construção teórica dos Estados

modernos. E, nesse sentido, é que Dante Alighieri desenvolve o trabalho sob análise. Seu

a elaboração de argumentos históricos e filosóficos que permitam a estruturação

de um Estado laico, deixando claro que as esferas de poder são completamente

sua obra foi fundamental para o

imperador) devem se

ulos, a saber, Livro Primeiro: Necessidade da

obteve legitimidade e o encargo da

império provém

parte da explicação de que o homem

vive em sociedade e, por isso, somente consegue alcançar o seu objetivo no meio social.

Dessa forma, faz a distinção de dois planos um espiritual e outro terreno, separando as

argumento sob o qual elabora toda a tese

Conjunto de poemas escrito em italiano e não em latim como era o costume da época e que se tornou a referência da língua italiana moderna, está dividido em três partes, a saber: Inferno, Purgatório e Paraíso.

foram proibidas pela Igreja. A primeira versão última edição do índice foi publicada em 1948,

Nessa lista estavam livros

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A finalidade do homem somente é atingida pela busca e concretização da paz e essa

condição só é alcançada com o estabelecimento de um governo universal, isto é, um

governo que se estendesse por toda a humanidade. Daí, a necessidade de uma única lei

como norma a reger todos os homens.

única lei, necessário que se tenha, por óbvio, um único governante.

Por meio do governo universal poderá a hu

objetivos necessários para a boa convivência entre os homens, quais sejam, a justiça e a

liberdade. Para tanto, o governante deve ser dotado de um poder que lhe confira a

possibilidade de realizar atos de justiça. E, po

governa todas as coisas na terra, nada precisa e nada quer.

No segundo livro, o autor elenca uma série de fatos históricos que comprovam sua

teoria do governo universal. Demonstra que o Império Romano dominou todo

que isso é prova da vontade divina, sendo certo que os romanos fizeram

imposição arbitrária, mas sim por que tinham o direito de fazê

Para Dante Alighieri

proporção: “o direito é uma

serve à sociedade e, corrompida, a corrompe

Por último, no terceiro livro, arremata as ideias defendidas nas passagens

anteriores, ao discorrer que o governo universal é neces

da própria natureza das coisas.

argumentos para defender a dualidade de esferas. De um lado se tem a esfera terrena que

deve ficar sob a responsabilidade do imperado

esfera espiritual cujo cuidado compete aos membros da Igreja. Tais esferas não estão

subordinadas entre si, mas devem buscar cada qual atingir objetivos próprios que podem

5 Importante transcrever algumas passagens da obra que se relacionam com o assunto: relação a essa questão, que o povo romano se atribuiu por de monarca, isto é, o império, sobre todos os mortais. Isso se prova em primeiro lugar como segue: ao povo mais nobre compete dominar sobre todos os outros; ora, o povo romano foi o mais nobre; logo, a ele competia dominar sobre todos os outros.raciocínio: uma vez que a honra é uma recompensa da virtude e que toda forma de supremacia é uma honra, toda forma de supremacia é também uma recompensaenobrecem pelo mérito que deriva da virtude, virtude própria ou dos antepassados.riqueza antiga’, como diz o filósofo em Política e, como diz Juvenal, ‘a nobreza do ânimo é só e únvirtude’. Essas duas máximas se referem, portanto, a duas nobrezas, ou seja, à própria e à dos antepassados. Compete, portanto, aos nobres, por esse motivo, o prêmio da senhoria. Ora, como as recompensas devem ser proporcionais aos méritos, segundo a pserão medidos’ (Mateus, 7:2), ao nobre no mais alto grau compete o supremo comando.”Dante. Monarquia. São Paulo: La Fonte, 2012, p. 706 ALIGHIERI, Dante. Monarquia

Volume 10 – nº 2 - 2016

A finalidade do homem somente é atingida pela busca e concretização da paz e essa

condição só é alcançada com o estabelecimento de um governo universal, isto é, um

esse por toda a humanidade. Daí, a necessidade de uma única lei

como norma a reger todos os homens. Partindo do pressuposto de que deve haver uma

única lei, necessário que se tenha, por óbvio, um único governante.

Por meio do governo universal poderá a humanidade viver em paz e atingir dois

objetivos necessários para a boa convivência entre os homens, quais sejam, a justiça e a

liberdade. Para tanto, o governante deve ser dotado de um poder que lhe confira a

possibilidade de realizar atos de justiça. E, por ser, um governante que tudo tem, já que

governa todas as coisas na terra, nada precisa e nada quer.

No segundo livro, o autor elenca uma série de fatos históricos que comprovam sua

teoria do governo universal. Demonstra que o Império Romano dominou todo

que isso é prova da vontade divina, sendo certo que os romanos fizeram

imposição arbitrária, mas sim por que tinham o direito de fazê-lo. 5

Alighieri o conceito de direito seria o mesmo que a definição de

“o direito é uma relação real e pessoal de homem para homem que,

sociedade e, corrompida, a corrompe.” 6

Por último, no terceiro livro, arremata as ideias defendidas nas passagens

anteriores, ao discorrer que o governo universal é necessário. Em outras palavras, faz parte

da própria natureza das coisas. Sendo a obra um tratado de filosofia política

argumentos para defender a dualidade de esferas. De um lado se tem a esfera terrena que

deve ficar sob a responsabilidade do imperador, do governante temporal, e, do outro lado, a

esfera espiritual cujo cuidado compete aos membros da Igreja. Tais esferas não estão

subordinadas entre si, mas devem buscar cada qual atingir objetivos próprios que podem

Importante transcrever algumas passagens da obra que se relacionam com o assunto: “Afirmo, portanto, em relação a essa questão, que o povo romano se atribuiu por direito e, por isso, não por usurpação, a função de monarca, isto é, o império, sobre todos os mortais. Isso se prova em primeiro lugar como segue: ao povo mais nobre compete dominar sobre todos os outros; ora, o povo romano foi o mais nobre; logo, a ele ompetia dominar sobre todos os outros. A premissa maior do silogismo é demonstrada por sua vez com este

raciocínio: uma vez que a honra é uma recompensa da virtude e que toda forma de supremacia é uma honra, toda forma de supremacia é também uma recompensa da virtude. Ora, é de todo sabido que os homens se enobrecem pelo mérito que deriva da virtude, virtude própria ou dos antepassados. ‘A nobreza é virtude e riqueza antiga’, como diz o filósofo em Política e, como diz Juvenal, ‘a nobreza do ânimo é só e únvirtude’. Essas duas máximas se referem, portanto, a duas nobrezas, ou seja, à própria e à dos antepassados. Compete, portanto, aos nobres, por esse motivo, o prêmio da senhoria. Ora, como as recompensas devem ser proporcionais aos méritos, segundo a palavra evangélica ‘com a mesma medida com que medirem, vocês serão medidos’ (Mateus, 7:2), ao nobre no mais alto grau compete o supremo comando.”

o Paulo: La Fonte, 2012, p. 70-71) Monarquia. São Paulo: La Fonte, 2012, p. 76.

A finalidade do homem somente é atingida pela busca e concretização da paz e essa

condição só é alcançada com o estabelecimento de um governo universal, isto é, um

esse por toda a humanidade. Daí, a necessidade de uma única lei

do pressuposto de que deve haver uma

manidade viver em paz e atingir dois

objetivos necessários para a boa convivência entre os homens, quais sejam, a justiça e a

liberdade. Para tanto, o governante deve ser dotado de um poder que lhe confira a

r ser, um governante que tudo tem, já que

No segundo livro, o autor elenca uma série de fatos históricos que comprovam sua

teoria do governo universal. Demonstra que o Império Romano dominou todo o universo e

que isso é prova da vontade divina, sendo certo que os romanos fizeram-no não pela

seria o mesmo que a definição de

real e pessoal de homem para homem que, observada,

Por último, no terceiro livro, arremata as ideias defendidas nas passagens

sário. Em outras palavras, faz parte

um tratado de filosofia política, arrola

argumentos para defender a dualidade de esferas. De um lado se tem a esfera terrena que

r, do governante temporal, e, do outro lado, a

esfera espiritual cujo cuidado compete aos membros da Igreja. Tais esferas não estão

subordinadas entre si, mas devem buscar cada qual atingir objetivos próprios que podem

Afirmo, portanto, em direito e, por isso, não por usurpação, a função

de monarca, isto é, o império, sobre todos os mortais. Isso se prova em primeiro lugar como segue: ao povo mais nobre compete dominar sobre todos os outros; ora, o povo romano foi o mais nobre; logo, a ele

A premissa maior do silogismo é demonstrada por sua vez com este raciocínio: uma vez que a honra é uma recompensa da virtude e que toda forma de supremacia é uma honra,

da virtude. Ora, é de todo sabido que os homens se ‘A nobreza é virtude e

riqueza antiga’, como diz o filósofo em Política e, como diz Juvenal, ‘a nobreza do ânimo é só e única virtude’. Essas duas máximas se referem, portanto, a duas nobrezas, ou seja, à própria e à dos antepassados. Compete, portanto, aos nobres, por esse motivo, o prêmio da senhoria. Ora, como as recompensas devem ser

alavra evangélica ‘com a mesma medida com que medirem, vocês serão medidos’ (Mateus, 7:2), ao nobre no mais alto grau compete o supremo comando.” (ALIGHIERI,

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ser definidos na realização da justiç

(responsabilidade da monarquia) e preparação para a vida espiritual (responsabilidade da

Igreja).7

Essa independência de esferas e a ausência de subordinação entre o poder temporal

e o poder espiritual são as gr

que o poder do monarca emana diretamente de Deus, ou seja, não depende da interferência,

nem da aquiescência dos membros da Igreja. Até então, repita

entendimento de que o pode

Com efeito, o homem é dotado de duas partes uma mortal e outra imortal e deve,

por isso, ter suporte para atingir os objetivos de cada um desses âmbitos. Cabe ao monarca

conduzi-lo ao fim terreno, à felicidade temporal, e ao papa pre

espiritual.

Depreende-se que a obra em comento, carrega teses importantes para o Direito

como a ideia de governo universal; a separa

conceitos de liberdade, justiça e paz.

Ademais, os fins do homem é que determinam a necess

na terra um que cuidará da promoção das necessidades materiais e outro que cuidará da

preparação para a vida ultraterrena

7 A esse respeito confira-se a passagem extraída da obra: baseiam sobremodo aqueles que afirmam que a autoridade do principado romano depende da autoridade do pontífice romano, é necessário voltar e demonstrar a verdade relativa a esta terceira questão, proposta para discussão desde o início. Essa verdade deverá emergir de modo suficiente se demonstrar, argumentando à luz do princípio prefixado, que a mencionada autoridade imperiaos seres, isto é, Deus. Isso será demonstrado de duas maneiras: negando a autoridade da Igreja sobre a autoridade imperial – de fato, não há contestação a propósito de outra autoridade demonstração positiva, que a autoridade imperial depende imediatamente de Deus. Que a autoridade da Igreja não seja causa da autoridade imperial, demonstranão tem influência sobre outra coisa que , ao contrário, possuidesta. Ora, quando a Igreja ainda não existia ou não tinha influência, o império já possuía integralmente toda a sua força. Logo, a Igreja não é causa da força do império e, por conseguinte, também não o é da autoridade do império, uma vez que nele força e autoridade são a mesma coisa.Monarquia. São Paulo: La Fonte, 2012, 8 Esse trecho comprova a afirmação: sua existência, nem o poder, que é sua autoridade, nem mesmo sua atuação pura e simples. Recebe, sim, do poder espiritual influência para poder agir com maior eficácia mediante a luz da graça que Deus, no céu, e a benção do sumo pontífice, na terra, lhe infuanteriormente pecava na forma, porquanto o predicado da conclusão não coincide com o termo extremo da premissa maior, como aparece claramente. De fato, procede da seguinte forma: a lua recebe a luz do sol que é o poder espiritual; o poder temporal é a lua; logo, o poder temporal recebe autoridade do poder espiritual. Desse modo, no termo extremo da premissa maior colocapalavra autoridade, que são coisas diversas Monarquia. São Paulo: La Fonte, 2012, 9 Nesse sentido, o autor afirma que: seu duplo fim: de um lado, o sumo pontífice q

Volume 10 – nº 2 - 2016

ser definidos na realização da justiça e da convivência pacífica entre os homens

(responsabilidade da monarquia) e preparação para a vida espiritual (responsabilidade da

Essa independência de esferas e a ausência de subordinação entre o poder temporal

e o poder espiritual são as grandes contribuições de Dante para a filosofia política. Afirma

que o poder do monarca emana diretamente de Deus, ou seja, não depende da interferência,

nem da aquiescência dos membros da Igreja. Até então, repita-se, prevalecia o

entendimento de que o poder temporal estava subordinado ao poder espiritual

homem é dotado de duas partes uma mortal e outra imortal e deve,

por isso, ter suporte para atingir os objetivos de cada um desses âmbitos. Cabe ao monarca

lo ao fim terreno, à felicidade temporal, e ao papa prepará

se que a obra em comento, carrega teses importantes para o Direito

como a ideia de governo universal; a separação das ordens éticas (religião e

conceitos de liberdade, justiça e paz.

Ademais, os fins do homem é que determinam a necessidade de dois governantes

na terra um que cuidará da promoção das necessidades materiais e outro que cuidará da

preparação para a vida ultraterrena.9

se a passagem extraída da obra: “Expostos e rejeitados os erros sobre os quais se baseiam sobremodo aqueles que afirmam que a autoridade do principado romano depende da autoridade do

necessário voltar e demonstrar a verdade relativa a esta terceira questão, proposta para discussão desde o início. Essa verdade deverá emergir de modo suficiente se demonstrar, argumentando à luz do princípio prefixado, que a mencionada autoridade imperial deriva imediatamente do vértice de todos os seres, isto é, Deus. Isso será demonstrado de duas maneiras: negando a autoridade da Igreja sobre a

de fato, não há contestação a propósito de outra autoridade ão positiva, que a autoridade imperial depende imediatamente de Deus. Que a autoridade da

Igreja não seja causa da autoridade imperial, demonstra-se desse modo: uma coisa que não existe ou que não tem influência sobre outra coisa que , ao contrário, possui por inteiro sua força, não é causa da força desta. Ora, quando a Igreja ainda não existia ou não tinha influência, o império já possuía integralmente toda a sua força. Logo, a Igreja não é causa da força do império e, por conseguinte, também não o é da

toridade do império, uma vez que nele força e autoridade são a mesma coisa..” (ALIGHIERI, Dante. o Paulo: La Fonte, 2012, p. 120-121)

Esse trecho comprova a afirmação: “Afirmo, portanto, que o poder temporal não recebe do poder espiritual a existência, nem o poder, que é sua autoridade, nem mesmo sua atuação pura e simples. Recebe, sim, do

poder espiritual influência para poder agir com maior eficácia mediante a luz da graça que Deus, no céu, e a benção do sumo pontífice, na terra, lhe infundem. Definitivamente, o argumento mencionado anteriormente pecava na forma, porquanto o predicado da conclusão não coincide com o termo extremo da premissa maior, como aparece claramente. De fato, procede da seguinte forma: a lua recebe a luz do sol que

o poder espiritual; o poder temporal é a lua; logo, o poder temporal recebe autoridade do poder espiritual. Desse modo, no termo extremo da premissa maior coloca-se a palavra luz e, no predicado da conclusão, a palavra autoridade, que são coisas diversas em relação ao sujeito e ao argumento.” (ALIGHIERI, Dante.

o Paulo: La Fonte, 2012, p. 107) Nesse sentido, o autor afirma que: “por esse motivo, o homem teve necessidade de duplo guia em relação a

seu duplo fim: de um lado, o sumo pontífice que, segundo a revelação, conduzisse o gênero humano à vida

a e da convivência pacífica entre os homens

(responsabilidade da monarquia) e preparação para a vida espiritual (responsabilidade da

Essa independência de esferas e a ausência de subordinação entre o poder temporal

andes contribuições de Dante para a filosofia política. Afirma

que o poder do monarca emana diretamente de Deus, ou seja, não depende da interferência,

se, prevalecia o

r temporal estava subordinado ao poder espiritual.8

homem é dotado de duas partes uma mortal e outra imortal e deve,

por isso, ter suporte para atingir os objetivos de cada um desses âmbitos. Cabe ao monarca

pará-lo para a vida

se que a obra em comento, carrega teses importantes para o Direito

ção das ordens éticas (religião e direito) e os

idade de dois governantes

na terra um que cuidará da promoção das necessidades materiais e outro que cuidará da

Expostos e rejeitados os erros sobre os quais se baseiam sobremodo aqueles que afirmam que a autoridade do principado romano depende da autoridade do

necessário voltar e demonstrar a verdade relativa a esta terceira questão, proposta para discussão desde o início. Essa verdade deverá emergir de modo suficiente se demonstrar, argumentando à

l deriva imediatamente do vértice de todos os seres, isto é, Deus. Isso será demonstrado de duas maneiras: negando a autoridade da Igreja sobre a

de fato, não há contestação a propósito de outra autoridade – e provando, com ão positiva, que a autoridade imperial depende imediatamente de Deus. Que a autoridade da

se desse modo: uma coisa que não existe ou que por inteiro sua força, não é causa da força

desta. Ora, quando a Igreja ainda não existia ou não tinha influência, o império já possuía integralmente toda a sua força. Logo, a Igreja não é causa da força do império e, por conseguinte, também não o é da

ALIGHIERI, Dante.

Afirmo, portanto, que o poder temporal não recebe do poder espiritual a existência, nem o poder, que é sua autoridade, nem mesmo sua atuação pura e simples. Recebe, sim, do

poder espiritual influência para poder agir com maior eficácia mediante a luz da graça que Deus, no céu, e ndem. Definitivamente, o argumento mencionado

anteriormente pecava na forma, porquanto o predicado da conclusão não coincide com o termo extremo da premissa maior, como aparece claramente. De fato, procede da seguinte forma: a lua recebe a luz do sol que

o poder espiritual; o poder temporal é a lua; logo, o poder temporal recebe autoridade do poder espiritual. se a palavra luz e, no predicado da conclusão, a

ALIGHIERI, Dante.

por esse motivo, o homem teve necessidade de duplo guia em relação a ue, segundo a revelação, conduzisse o gênero humano à vida

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 10

Para Dante Alighieri

essa paz somente é atingida por meio da harmonia ou ordem. No caso de existência de

conflitos, caberá ao governante universal a resolução da controvérsia, restabelecendo a paz

entre os litigantes.

Na época em que Dante Alighieri

a religião e o Direito, talvez seja essa a maior contribuição da obra para o estabelecimento

dos Estados laicos e o respeito à liberdade

teoria constitucional.

Dessa maneira, fica clara a separação das competências, não cabe ao papa editar

normas de caráter jurídico, nem tampouco cabe ao imperador im

espiritual, são esferas que devem se manter separadas. Ass

viver em paz com a justiça como alicerce da convivência social.

Com isso Dante Alighieri

moderno e na defesa da independência entre os poderes (secular e espiritual).

Destarte, a ideia de governo universal relaciona

conflitos entre os países. A monarquia para Dante não pode ser entendia como direito de

ocupar o poder de forma hereditária, mas sim no sentido de que apenas um deve deter o

poder universal, em contraposição com a ideia de república como governo de muitos.

Nesse sentido, o homem encontraria a paz e viveria em ordem pela submissão de

todos ao imperador. 11 A dupla finalidade do ser humano é vi

a felicidade no céu. Não obstante, o pensamento de Dante

medida em que todos os homens teriam direito de serem livres e de terem sua dignidade

preservada.

eterna e, de outro, o imperador que o conduzisse à felicidade temporal, segundo os ensinamentos filosóficos”. (ALIGHIERI, Dante. 10 Acerca da liberdade, fundamental destacar a seguinte transcrição retirada da obra em comentomais, o gênero humano, quando atinge a máxima liberdade, passa a desfrutar de sua melhor condição. E isso se torna manifesto, sempre que o princípinecessário saber que o princípio primordial de nossa liberdade é o livree tão poucos no intelecto. De fato, chegam a dizer até isto: o livre arbítrio é um juízo livre em relação à vontade”. (ALIGHIERI, Dante. 11 Segundo Dante o estabelecimento de um governo universal é o alicerce do seu pensamento político: gênero humano deve ser governado pelo monarca no tocante às regras válidas para todos e governado por uma norma válida universamente na busca da paz. Essa norma geral ou lei é que os príncipes particulares devem receber do monarca, da mesma forma pela qual o intelecto prático, para chegar a conclusão que se realiza na ação, recebe a proposição particular que é propriamente sua. Desse modo chega à específica ação conclusiva. Ora, isso não apenas é possível a um só, mas é necessário que proceda de um só, de tal modo que seja qualquer confusão na aplicação das normas universaisFonte, 2012, p. 61)

Volume 10 – nº 2 - 2016

Alighieri, a paz é a condição ideal para a humanidade alcançar seu fim,

essa paz somente é atingida por meio da harmonia ou ordem. No caso de existência de

conflitos, caberá ao governante universal a resolução da controvérsia, restabelecendo a paz

Dante Alighieri viveu, ainda não havia uma clara separação entre

a religião e o Direito, talvez seja essa a maior contribuição da obra para o estabelecimento

dos Estados laicos e o respeito à liberdade,10 que anos depois serviu de funda

Dessa maneira, fica clara a separação das competências, não cabe ao papa editar

normas de caráter jurídico, nem tampouco cabe ao imperador impor normas de cunho

são esferas que devem se manter separadas. Assim, o homem tem o direito de

viver em paz com a justiça como alicerce da convivência social.

Alighieri dá o primeiro passo na construção do pensamento

moderno e na defesa da independência entre os poderes (secular e espiritual).

a ideia de governo universal relaciona-se a não internacionalização dos

conflitos entre os países. A monarquia para Dante não pode ser entendia como direito de

ocupar o poder de forma hereditária, mas sim no sentido de que apenas um deve deter o

ersal, em contraposição com a ideia de república como governo de muitos.

Nesse sentido, o homem encontraria a paz e viveria em ordem pela submissão de

A dupla finalidade do ser humano é viver bem na terra para receber

céu. Não obstante, o pensamento de Dante Alighieri é uma utopia na

medida em que todos os homens teriam direito de serem livres e de terem sua dignidade

eterna e, de outro, o imperador que o conduzisse à felicidade temporal, segundo os ensinamentos ALIGHIERI, Dante. Monarquia. São Paulo: La Fonte, 2012, p. 126)

fundamental destacar a seguinte transcrição retirada da obra em comentomais, o gênero humano, quando atinge a máxima liberdade, passa a desfrutar de sua melhor condição. E isso se torna manifesto, sempre que o princípio da liberdade é posto em evidência. Em relação a isso, é necessário saber que o princípio primordial de nossa liberdade é o livre-arbítrio que tantos trazem na boca e tão poucos no intelecto. De fato, chegam a dizer até isto: o livre arbítrio é um juízo livre em relação à

ALIGHIERI, Dante. Monarquia. São Paulo: La Fonte, 2012, p. 57) Segundo Dante o estabelecimento de um governo universal é o alicerce do seu pensamento político:

gênero humano deve ser governado pelo monarca no tocante às regras válidas para todos e governado por uma norma válida universamente na busca da paz. Essa norma geral ou lei é que os príncipes particulares devem receber do monarca, da mesma forma pela qual o intelecto prático, para chegar a conclusão que se realiza na ação, recebe a premissa maior do intelecto especulativo e subordina a essa a proposição particular que é propriamente sua. Desse modo chega à específica ação conclusiva. Ora, isso não apenas é possível a um só, mas é necessário que proceda de um só, de tal modo que seja qualquer confusão na aplicação das normas universais”. (ALIGHIERI, Dante. Monarquia

, a paz é a condição ideal para a humanidade alcançar seu fim,

essa paz somente é atingida por meio da harmonia ou ordem. No caso de existência de

conflitos, caberá ao governante universal a resolução da controvérsia, restabelecendo a paz

viveu, ainda não havia uma clara separação entre

a religião e o Direito, talvez seja essa a maior contribuição da obra para o estabelecimento

que anos depois serviu de fundamento para a

Dessa maneira, fica clara a separação das competências, não cabe ao papa editar

por normas de cunho

im, o homem tem o direito de

dá o primeiro passo na construção do pensamento

moderno e na defesa da independência entre os poderes (secular e espiritual).

se a não internacionalização dos

conflitos entre os países. A monarquia para Dante não pode ser entendia como direito de

ocupar o poder de forma hereditária, mas sim no sentido de que apenas um deve deter o

ersal, em contraposição com a ideia de república como governo de muitos.

Nesse sentido, o homem encontraria a paz e viveria em ordem pela submissão de

ver bem na terra para receber

é uma utopia na

medida em que todos os homens teriam direito de serem livres e de terem sua dignidade

eterna e, de outro, o imperador que o conduzisse à felicidade temporal, segundo os ensinamentos

fundamental destacar a seguinte transcrição retirada da obra em comento: “Além do mais, o gênero humano, quando atinge a máxima liberdade, passa a desfrutar de sua melhor condição. E

ncia. Em relação a isso, é arbítrio que tantos trazem na boca

e tão poucos no intelecto. De fato, chegam a dizer até isto: o livre arbítrio é um juízo livre em relação à

Segundo Dante o estabelecimento de um governo universal é o alicerce do seu pensamento político: “O gênero humano deve ser governado pelo monarca no tocante às regras válidas para todos e deve ser governado por uma norma válida universamente na busca da paz. Essa norma geral ou lei é que os príncipes particulares devem receber do monarca, da mesma forma pela qual o intelecto prático, para chegar a

premissa maior do intelecto especulativo e subordina a essa a proposição particular que é propriamente sua. Desse modo chega à específica ação conclusiva. Ora, isso não apenas é possível a um só, mas é necessário que proceda de um só, de tal modo que seja eliminada

Monarquia. São Paulo: La

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 10

Com uma visão perfeita do ordenamento humano, ou seja, uma utopia política que,

se estabelecida, garantiria a felicidade pessoal e coletiva do homem, Dante acreditava que

a monarquia resolveria os problemas

Alighieri tem como principais teses a necessidade de um único soberano, já que existe

apenas um Deus, a monarquia (como autoridade suprema sobre a humanidade) é a única

forma de governo capaz de assegurar a felicidade temporal.

As provas colecionadas pelo autor, notadamente na segunda parte do livro,

demonstram a predestinação dos romanos e

com o estabelecimento da justiça e do Direito.

Ressalta-se, por fim, que o governo secular não depende nem emana do governo

espiritual, não cabendo, portanto, ao papa escolher o imperador

como o homem é dividido em corpo e alma, devem

temporal, que cabe ao imperador, e outro espiritual, que cabe ao papa.

Fica clara a necessidade de separação entre o Estado e a Igreja (poder secular e

poder papal). A centralidade

fundamento para a verticalização do poder, quando da formação dos Estados modernos,

contribuiu para as ideias de Maquiavel de

possível o estabelecimento de um sistema normativo editado por uma autoridade central.

Dante cria um tratado sem possibilidades de ser aplicado naquele

buscando um passado italiano de predestinação, num momento em

não eram bem aceitos em conjunto. Sustenta uma

temporal e espiritual, não implicando

eles, haja vista o duplo fim do homem, o qual deve ser guiado pelo Imperador e

Por fim, o pensador florentino é prático quando discute sobre a

autonomia da vida terrena, construindo sua teoria partindo de

homens serem cristãos ou não, tanto que

consegue um status próprio

12 Com essa passagem o autor sintetiza os argumentos de sua tese: do monarca temporal deriva, sem qualquer intermediário, da fonte da autoridade universal e essa fonte, compacta na fortaleza de sua pureza, derramajá atingi a meta que me havia proposto. De fato, foi trazida à luz a veprocurava se o cargo do monarca seria necessário ao bem estar do mundo; e também daquela que dizia se o povo romano se atribuíra de direito o império; bem como, finalmente, se a autoridade do monarca depende imediatamente de Deus ou de outro127)

Volume 10 – nº 2 - 2016

Com uma visão perfeita do ordenamento humano, ou seja, uma utopia política que,

lecida, garantiria a felicidade pessoal e coletiva do homem, Dante acreditava que

a monarquia resolveria os problemas do mundo físico. Em síntese, a Monarquia

tem como principais teses a necessidade de um único soberano, já que existe

enas um Deus, a monarquia (como autoridade suprema sobre a humanidade) é a única

forma de governo capaz de assegurar a felicidade temporal.

As provas colecionadas pelo autor, notadamente na segunda parte do livro,

demonstram a predestinação dos romanos e de Roma para governar o mundo, inclusive

com o estabelecimento da justiça e do Direito.

se, por fim, que o governo secular não depende nem emana do governo

espiritual, não cabendo, portanto, ao papa escolher o imperador. 12 Dessa forma, assim

o homem é dividido em corpo e alma, devem-se estabelecer dois governos um

temporal, que cabe ao imperador, e outro espiritual, que cabe ao papa.

Fica clara a necessidade de separação entre o Estado e a Igreja (poder secular e

poder papal). A centralidade do poder defendida por Dante em Monarquia

fundamento para a verticalização do poder, quando da formação dos Estados modernos,

contribuiu para as ideias de Maquiavel de transformar o Estado em objeto, e

possível o estabelecimento de um sistema normativo editado por uma autoridade central.

Dante cria um tratado sem possibilidades de ser aplicado naquele

buscando um passado italiano de predestinação, num momento em que a fé e a lógica

não eram bem aceitos em conjunto. Sustenta uma distinção mais precisa entre o poder

temporal e espiritual, não implicando necessariamente numa oposição ou separação entre

fim do homem, o qual deve ser guiado pelo Imperador e

Por fim, o pensador florentino é prático quando discute sobre a

autonomia da vida terrena, construindo sua teoria partindo de uma indiferença quanto aos

homens serem cristãos ou não, tanto que estrutura todo um novo universo laic

próprio e relativa independência da Igreja, mesmo que teoricamente.

Com essa passagem o autor sintetiza os argumentos de sua tese: “É evidente, portanto, que a autoridade deriva, sem qualquer intermediário, da fonte da autoridade universal e essa fonte,

compacta na fortaleza de sua pureza, derrama-se por muitos canais em abundância de bondade. Creio que já atingi a meta que me havia proposto. De fato, foi trazida à luz a verdade daquela questão em que se procurava se o cargo do monarca seria necessário ao bem estar do mundo; e também daquela que dizia se o povo romano se atribuíra de direito o império; bem como, finalmente, se a autoridade do monarca depende

Deus ou de outro”. (ALIGHIERI, Dante. Monarquia. São Paulo: La Fonte, 2012,

Com uma visão perfeita do ordenamento humano, ou seja, uma utopia política que,

lecida, garantiria a felicidade pessoal e coletiva do homem, Dante acreditava que

Monarquia de Dante

tem como principais teses a necessidade de um único soberano, já que existe

enas um Deus, a monarquia (como autoridade suprema sobre a humanidade) é a única

As provas colecionadas pelo autor, notadamente na segunda parte do livro,

de Roma para governar o mundo, inclusive

se, por fim, que o governo secular não depende nem emana do governo

Dessa forma, assim

se estabelecer dois governos um

Fica clara a necessidade de separação entre o Estado e a Igreja (poder secular e

Monarquia serviu de

fundamento para a verticalização do poder, quando da formação dos Estados modernos,

transformar o Estado em objeto, e com isso foi

possível o estabelecimento de um sistema normativo editado por uma autoridade central.

Dante cria um tratado sem possibilidades de ser aplicado naquele momento,

que a fé e a lógica ainda

distinção mais precisa entre o poder

necessariamente numa oposição ou separação entre

fim do homem, o qual deve ser guiado pelo Imperador e pelo Papa.

Por fim, o pensador florentino é prático quando discute sobre a importância da

uma indiferença quanto aos

estrutura todo um novo universo laico. O homem

greja, mesmo que teoricamente.

É evidente, portanto, que a autoridade deriva, sem qualquer intermediário, da fonte da autoridade universal e essa fonte,

se por muitos canais em abundância de bondade. Creio que rdade daquela questão em que se

procurava se o cargo do monarca seria necessário ao bem estar do mundo; e também daquela que dizia se o povo romano se atribuíra de direito o império; bem como, finalmente, se a autoridade do monarca depende

o Paulo: La Fonte, 2012, p.

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 10

A crença na capacidade do homem para ordenar seus próprios assuntos sem,

necessariamente, recorrer à divindade fez com que nas propostas estudadas não houves

nenhuma instituição superior ao Império, do mesmo modo que não havia nenhuma

instituição acima da Igreja concebida como corpo de crentes. Para o alcance do equilíbrio

perfeito, a soberania era de ambos.

Filósofo e cristão, Dante

felicidade nesta terra, e a bem

prometida aos eleitos na Jerusalém celeste.

sobrepõe-se, assim, à ideia do filósofo

Sabe-se que os medievais, em geral, não dissertam sobre os méritos comparados da

democracia e da oligarquia; eles se interessam apenas pela monarquia. A ideia

a sociedade cristã é dual, que isso não ameaça sua unidade, mas antes a reforça. O homem

é uno e duplo, a sociedade na qual ele vive deve sê

sociedade cristã, ele descobre o seu pluralismo”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALIGHIERI, Dante. Monarquia BÍBLIA. Bíblia de Jerusalém LIBERA, Ailan de. A filosofia medieval SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico

13

LIBERA, Ailan de. A filosofia medievalVolume 10 – nº 2 - 2016

A crença na capacidade do homem para ordenar seus próprios assuntos sem,

necessariamente, recorrer à divindade fez com que nas propostas estudadas não houves

nenhuma instituição superior ao Império, do mesmo modo que não havia nenhuma

instituição acima da Igreja concebida como corpo de crentes. Para o alcance do equilíbrio

perfeito, a soberania era de ambos.

Filósofo e cristão, Dante Alighieri reconhece dois ideais: o sucesso filosófico, a

felicidade nesta terra, e a bem-aventurança segundo os teólogos, a visão bem

s eleitos na Jerusalém celeste. O modelo agostiniano das duas cidades

assim, à ideia do filósofo-rei.

os medievais, em geral, não dissertam sobre os méritos comparados da

democracia e da oligarquia; eles se interessam apenas pela monarquia. A ideia

a sociedade cristã é dual, que isso não ameaça sua unidade, mas antes a reforça. O homem

no e duplo, a sociedade na qual ele vive deve sê-lo também: “Dante não quebra a

sociedade cristã, ele descobre o seu pluralismo”.13

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Monarquia. (Tradução Ciro Mioranza) São Paulo: Lafonte, 2012

Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 1995.

A filosofia medieval. São Paulo: Loyola, 1998.

Vocabulário jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 2009.

A filosofia medieval, São Paulo, Loyola, 1998, p. 452.

A crença na capacidade do homem para ordenar seus próprios assuntos sem,

necessariamente, recorrer à divindade fez com que nas propostas estudadas não houvesse

nenhuma instituição superior ao Império, do mesmo modo que não havia nenhuma

instituição acima da Igreja concebida como corpo de crentes. Para o alcance do equilíbrio

s ideais: o sucesso filosófico, a

aventurança segundo os teólogos, a visão bem-aventurada

O modelo agostiniano das duas cidades

os medievais, em geral, não dissertam sobre os méritos comparados da

democracia e da oligarquia; eles se interessam apenas pela monarquia. A ideia-força é que

a sociedade cristã é dual, que isso não ameaça sua unidade, mas antes a reforça. O homem

“Dante não quebra a

Lafonte, 2012.

. Rio de Janeiro: Forense, 2009.