Resenha - A Onda

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FAJE - Departamento de Filosofia Disciplina: Psicologia - 2014 - 1º S. Professor: José Paulo Giovanetti Aluno: João Elton de Jesus Data: 26/03/2014 RESENHA: FILME "A ONDA" O filme alemão "A onda" lançado em 2008 é inspirado em fatos reais e conta a aventura de um grupo de estudantes do ensino médio que liderados pelo professor Rainer Wagner, que leciona a disciplina de autocracia, entram numa "onda" onde a simulação de um governo fascista criado por esse professor em sala de aula, para que os alunos melhor entendam esse tipo de governo, extrapola os muros da escola e afeta a cidade e principalmente as vidas dos alunos e professores, de modo que o mimetismo escolar acaba se transformando em algo real e extremamente perigoso. Em uma observação crítica em relação ao contexto e aos personagens do filme, é possível observar uma série de características e aspectos que demonstram a nossa sociedade, bem como as pessoas que a compõe. Percebe-se que no contexto em que se passa o filme, a Alemanha pós-guerra, há uma grande influência estrangeira em sua cultura, é possível observar que as músicas que tanto o professor, quanto os estudantes escutam, são de origem americana, bem como as marcas das roupas e dos objetos pessoais como telefones e computadores. Não há uma identidade própria daquela sociedade, tudo está muito fragmentado, isso pode-se atestar por meio dos diversos grupos que compõe os alunos da escola. No entanto, há uma busca de identidade destes, observa-se alguns "guetos" ou "tribos": os do time de pólo aquático; aqueles que se consideram "bad boys"; ou aqueles que vêm do interior "Alemanha oriental", alem dos "nerds" ou dos que "cuidam do jornal da escola". Enfim, uma série de grupos com sua identidade própria. Assim, é possível notar que muitos não conseguem se enquadrar em um grupo determinado, alguns se sujeitando a crimes para serem bem aceitos, tal como um personagem que oferece gratuitamente maconha para alguns colegas a fim de ser aceito por estes. O filme apresenta também, uma crítica quanto aos valores ou desvalores contemporâneos, tal como as relações amorosas com falta de confiança, ciúme e/ou baseada somente no sexo; a falta de respeito por pessoas mais velhas, ou seja, um choque 1

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FAJE - Departamento de FilosofiaDisciplina: Psicologia - 2014 - 1º S.Professor: José Paulo Giovanetti

Aluno: João Elton de JesusData: 26/03/2014

RESENHA: FILME "A ONDA"

O filme alemão "A onda" lançado em 2008 é inspirado em fatos reais e conta a aventura de um grupo de estudantes do ensino médio que liderados pelo professor Rainer Wagner, que leciona a disciplina de autocracia, entram numa "onda" onde a simulação de um governo fascista criado por esse professor em sala de aula, para que os alunos melhor entendam esse tipo de governo, extrapola os muros da escola e afeta a cidade e principalmente as vidas dos alunos e professores, de modo que o mimetismo escolar acaba se transformando em algo real e extremamente perigoso.

Em uma observação crítica em relação ao contexto e aos personagens do filme, é possível observar uma série de características e aspectos que demonstram a nossa sociedade, bem como as pessoas que a compõe.

Percebe-se que no contexto em que se passa o filme, a Alemanha pós-guerra, há uma grande influência estrangeira em sua cultura, é possível observar que as músicas que tanto o professor, quanto os estudantes escutam, são de origem americana, bem como as marcas das roupas e dos objetos pessoais como telefones e computadores. Não há uma identidade própria daquela sociedade, tudo está muito fragmentado, isso pode-se atestar por meio dos diversos grupos que compõe os alunos da escola. No entanto, há uma busca de identidade destes, observa-se alguns "guetos" ou "tribos": os do time de pólo aquático; aqueles que se consideram "bad boys"; ou aqueles que vêm do interior "Alemanha oriental", alem dos "nerds" ou dos que "cuidam do jornal da escola". Enfim, uma série de grupos com sua identidade própria. Assim, é possível notar que muitos não conseguem se enquadrar em um grupo determinado, alguns se sujeitando a crimes para serem bem aceitos, tal como um personagem que oferece gratuitamente maconha para alguns colegas a fim de ser aceito por estes.

O filme apresenta também, uma crítica quanto aos valores ou desvalores contemporâneos, tal como as relações amorosas com falta de confiança, ciúme e/ou baseada somente no sexo; a falta de respeito por pessoas mais velhas, ou seja, um choque de gerações; a questão familiar, cujos pais são indiferentes aos seus filhos ou não os conhecem muito bem; observa-se também um problema com a formação da juventude, principalmente na primeira fase escolar, onde crianças com idade em torno de 10 anos, apresentam um comportamento extremamente agressivo (fumando e falando palavrões) e desrespeitoso, tanto com seus familiares quanto com desconhecidos.

É possível identificar em algumas cenas, fatores como uma forte concorrência entre as pessoas (time de pólo aquático); dificuldade em trabalhar em grupo e cumprir regras (ensaio de teatro onde um dos atores se nega a utilizar a fala que lhe era atribuída no texto original); individualismo (jovem que faz planos de viagem pela Espanha e não se importa com a opinião do namorado); falsa juventude (professor Reiner que se comporta como um adolescente usando roupas e escutando músicas típicas da idade da juventude); e insatisfação com o emprego (namorada do Prof. Reiner que também trabalha na escola mas tem de tomar calmantes para enfrentar sua missão).

No desenrolar do filme, é possível notar que a juventude apresentada perdeu o seu sentido de vida, não encontra alguma causa pelo qual lutar. Essa constatação é afirmada por um dos personagens do filme que diz o seguinte: "Contra o quê realmente se deve rebelar hoje em dia? Hoje não tem mais importância, certo? Todos já tem só os seus prazeres na cabeça. O que falta à nossa geração é um objetivo comum, que nos una a todos.". Assim, observa-se que há uma energia reprimida mas não se encontra onde gastar. Pode-se observar na psicologia que a espiritualidade é inerente ao ser humano, contudo o mundo individualista muitas vezes impedem as pessoas de assumirem uma causa para lutar. Esse mesmo personagem continua dizendo "Este é o espírito-da-época, olhe em volta de você. A pessoa mais procurada no

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Google é quem? Paris do-caralho Hilton". Portanto, não é difícil concluir que pela falta de sentido ou de um lugar onde aplicar as energias para algo que realmente contribua para a construção de um mundo melhor, as pessoas, principalmente a juventude pós-moderna, acaba por gastar seu vigor, colocar o foco em assuntos supérfluos e efêmeros, que não lhes dará a resposta que precisam para encontrar o sentido da vida.

Conforme destacado no início deste texto, o professor Reiner, para abordar o tema da autocracia, simula em sala a vivência deste tipo de governo e encontrará em seus alunos, tendo em vista o contexto apresentado, o público perfeito para tornar esse mundo real, pois observa-se que mesmo num pano de fundo onde se busca a liberdade, a individualidade e o relativismo, há uma necessidade, muitas vezes inconsciente de disciplina, de referências, de uma identidade e de um sentimento comunitário. Essas carências, somadas ao que lhes foi oferecido, mesmo de maneira mimética, resultará na formação de um grupo com características opostas ao que anteriormente era defendido pelos jovens: adota-s um uniforme onde os grupos e guetos são extintos; o individualismo é destruído, todos trabalham por uma causa comum; cria-se a identidade sonhada, um logotipo, uma forma de cumprimento, um meio de comunicação; passa-se a impor o pensamento para os outros, excluindo e até sendo agressivo àqueles que não concordam com esse novo modo de viver, enfim, vai se instaurando um regime totalitarista, onde até fanáticos vêm a tona, bem como seus comportamentos extremistas que causarão sérias conseqüências para todos.

O filme traz uma série de questionamentos sobre a nossa sociedade, mas também mostra as consequencias de uma mudança de paradigma que não seja adequado. Muitas pessoas reclamam dos problemas pós-modernos e defendem um retorno às raízes, aos "velhos tempos" no entanto, nem sempre esse retorno é bom, há de se cuidar das pessoas e de suas peculiaridades, mas como fazer isso sem relativizar tudo ou sem ser totalmente absolutista ou extremista? a resposta seria em um meio termo, mas como fazer isso, qual referência deve-se tomar, qual paradigma é o mais equilibrado?

Nos últimos três anos, o mundo viveu uma série de revoluções e quebra de ditaduras. Foi possível assistir diariamente nos noticiários a chamada "primavera árabe", as manifestações pelas cidades brasileiras e as oposições frente ao governo venezuelano, sírio e russo, contudo, nem sempre se obtém o resultado esperado. Em alguns casos muitas mortes acontecem e poucas alterações são feitas nos governos "democráticos" instaurados e eleitos pela população manifestante. Será que a solução das crises atuais está nos governos ou deve-se também ter uma mudança de paradigma das pessoas que compõem a sociedade? onde pode-se colocar a energia humana, muitas vezes ociosa, em prol de uma causa onde os interesses pessoais ou de alguns grupos não estejam acima dos interesses de todos? critica-se o capitalismo e a sua falta de valores, mas qual seria o modelo ideal de vivência? voltaríamos para o comunismo? ou seria necessário a criação de um novo tipo de sociedade? isso é possível? Enfim, muitas questões são abertas e poucas respostas, ou melhor, quase nenhuma resposta é dada. Resta-nos pelo menos perguntar? pelo menos questionando e observando, não caímos em uma "normose" e não corremos o risco de deixarmos ser levados por qualquer correnteza, ou como diz o filme, por qualquer onda.

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