Resenha 01

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  Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix

Curso de Arquitetura e Urbanismo – 8º Período

Planejamento e Gestão – Prof.ª Ana Saraiva

11 

Mudar a cidadeSíntese

Thiago da Silva Freitas

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Referência: SOUZA, Marcelo Lopes. Mudar a cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à

gestão urbanos. 2 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.

Síntese

Aquilo que os anglo-saxões denominam “blueprint planning” corresponde, no Brasil, ao chamado“planejamento físico-territorial” em sua versão convencional. Ele consiste na concepção do

planejamento como a atividade de elaboração de planos de ordenamento espacial para a “cidade

ideal”. Tipicamente, trata-se de planos nos quais se projeta a imagem desejada em um futuro

menos ou mais remoto  – no estilo “a cidade ‘x’ daqui a vinte anos”-, funcionando o plano como

um conjunto de diretrizes a serem seguidas e metas a serem perseguidas (quando aos usos da

terra, ao traçado urbanístico, ao controle da expansão e do adensamento urbanos, à provisão de

áreas verdes e ao sistema de circulação). Trata-se de uma redução menos ou mais acentuada do

planejamento urbano a um planejamento da organização espacial, preocupado essencialmente

com o traçado urbanístico, com as densidades de ocupação e com o uso do solo.

O “planejamento físico-territorial” convencional era e é, ao mesmo tempo,

marcadamente regulatório. Na verdade, o planejamento regulatório clássico, estilo de

planejamento “central na ideologia da profissão de planejamento”, reinou durante muitas

décadas, absoluto como a modalidade de planejamento urbano em todos os lugares onde este

era praticado. A rigor, esse estilo de planejamento compreende duas modalidades bastante

diferentes de planejamento: além do “planejamento físico-territorial”, mais antigo, também o

planejamento sistêmico, que surge nos anos 60. O apogeu do planejamento regulatório se situa

entre o fim da Segunda Guerra Mundial e os anos 70, mas seria um equívoco ignorar que suas

bases intelectuais vinham sendo preparadas desde muito antes dos anos 40: a institucionalização

do Urbanismo como profissão, no começo do século XX e a ascensão das ideias modernistas no

Urbanismo, tendo Tony Garnier e, logo em seguida, Le Corbusier, como pioneiros, foram passos

decisivos. Foi somente após a guerra de 1939-45, no entanto, que grandes sistemas nacionais de

planejamento começaram a se estabelecer. Quanto aos Estados Unidos, dificilmente se pode

dizer, dada a extrema descentralização em função de sua organização federativa, que lá haja um

“sistema” de planejamento. Os anos 50 e 60 podem ser vistos como anos de glória do

planejamento regulatório.

Embora o “blueprint planning” clássico, principal esteio do planejamento urbano

regulatório clássico, tenha florescido institucionalmente, sobretudo depois da Segunda Guerra

Mundial, enquanto o ideário do Urbanismo modernista despontara já mesmo antes dos anos 20,

este último pode ser considerado, sob certos aspectos pelo menos, a encarnação mais acabada do

primeiro. O Urbanismo modernista, cujo expoente foi Le Corbusier, representa, ao mesmo tempo,

o ápice do apriorismo em planejamento urbano.

O modernismo foi o resultado de uma tentativa de melhor adaptação das cidades à era

industrial e, por tabela, às necessidades do capitalismo. Mais do que isso: ele buscava mimetizar

plenamente a racionalidade da produção industrial, transpondo para a produção do espaço

urbano categorias próprias ao universo da produção industrial. O ápice dessa mentalidade foi,

sem dúvida, a sempre citada comparação, feita por Le Corbusier, da casa a uma “máquina de

morar”, ou a um “instrumento”. A metáfora da máquina, na realidade, seria aplicada, no limite, a

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toda a cidade, a qual também deveria “funcionar” como uma máquina. Não é à toa que, ao lado

da preocupação com a higiene, a obsessão com a ordem, bases da harmonia social, seja um dos

pilares do projeto de modernização das cidades preconizado pelos modernistas. A estética

corbusiana caracterizava-se pelo despojamento e pelo primado da função. “A forma segue a

função”, para lembrar a célebre fórmula de Sullivan, tornou-se uma espécie de credo, e Le

Corbusier chegava ao ponto de idolatrar, em seu estilo peculiar, os engenheiros em detrimento

dos próprios arquitetos (pré-modernos), por serem os primeiros grandes representantes e

artífices da Era Industrial. A ideia central do Urbanismo modernista, ladeada e complementada

por outras ideias-força, como de ordem e racionalidade, é a ideia de modernização da cidade. O

Urbanismo modernista está mergulhado inteiramente no imaginário capitalista, daí derivando

uma visão de desenvolvimento urbano que o autor deste livro, em trabalho anterior, havia

denominado “fáustica”, devido ao mito de Fausto, o anti-herói que, ávido por poder, estabelece

um pacto com as forças do Mal, representadas por Mefistófeles. A lembrança do mito de Fausto é

mais que apropriada: Le Corbusier representou o clímax do “fetichismo espacial” no Urbanismo,

pretendendo mudar a sociedade a partir de transformações espaciais  – modernização comoepítome de ordem e higiene, racionalidade e harmonia.

É óbvio que não seria correto taxar o Urbanismo modernista simplesmente de

conservador; em outro certo sentido, ele era isso sim, iconoclasta e pouco tinha de

“conservador”! no entanto, sob o ângulo político, embora o modernismo tenha revelado

preocupações “sociais”, como a produção em massa de habitações higiênicas para a classe

operária e o acesso dos pobres urbanos a moradias dignas, a perspectiva era a de um

disciplinamento e uma melhoria das condições de vida da classe trabalhadora nos marcos do

capitalismo, e não uma superação deste. Le Corbusier, o qual, de resto, é um exemplo lapidar (e

extremo) de arrogância, de autoritarismo tecnocrático e de etnocentrismo, foi também umexemplo do quanto a “mudança” preconizada por meio de cirurgias urbanas e remodelações de

traçado visavam à manutenção do status quo:  “ o equilíbrio da sociedade é uma questão de

construção. Concluímos com esse dilema defensável: arquitetura ou revolução. (LE CORBUSIER,

1998:168). Por tudo isso, também, o Urbanismo modernista era, tipicamente, plenamente

apriorístico. No caso de Le Corbusier, o grau de permeabilidade para com a realidade para a qual

ele imaginava seus projetos era nulo ou próximo de zero. Sua concepção de uma cidade ideal,

simbolizada pelo modelo da ville radieuse, orgulhosamente a-histórica e transcultural,

representava, no fundo, a busca de pasteurização ocidentalizante em escala global; o chamado

“estilo internacional”, em que o mesmo tipo de prédio pode ser encontrado em países e regiões

os mais diversos, ignorado peculiaridades culturais e mesmo ambientais, é um exemplo cabal

disso.

O blueprint plannin, porém não se limitou ao Urbanismo modernista, que dele foi apenas

um subconjunto. Com toda a influência do ideário do Movimento Moderno, que contribuiu

decisivamente pra difundir os zoneamentos de uso da terra pautados na separação funcional,

coração dos másters plans convencionais, o fato é que nem tudo girou em torno do apriorismo

extremado de arquitetos-urbanistas como Le Corbusier. Muito do que se fez e, sobretudo,

continua a se fazer em matéria de blueprint planning - de vez que ele não morreu e, em muitos

lugares, continua a ser a modalidade exclusiva ou dominante de planejamento urbano. O

blueprint planning é, com efeito, compatível com ideais estéticos diferentes do modernismo e não

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precisa ser tão impositivo ou autoritário quanto sugerido pelo radicalismo corbusiano. Na

verdade, aquilo que do Urbanismo modernista sobreviveu e resiste até hoje na prática de

planejamento nos mais diferentes países não é tanto a sua estética, mas sim o espírito

funcionalista de zoneamento do uso do solo. Além do mais, a ideia-força central do Urbanismo

modernista, a modernização da cidade, é, ao mesmo tempo, embora de modo não tão evidente

ou ruidoso, a ideia-força central do “planejamento físico-territorial” clássico em geral, o mesmo

aplicando-se às demais ideias-força como ordem e racionalidade.

Nos anos 60 o blueprint planning começou a ser, como já foi dito, alvo de várias críticas.

Um tipo de crítica que ganha corpo no final da década era essencialmente epistemológico e

metodológico, situando-se, no mais, perfeitamente no interior do ambiente do planejamento

regulatório: tratava-se da crítica “sistêmica”. Mesmo sendo expressão de enfoque positivista da

ciência, o systems planning era bem menos apriorístico que o blueprint planning. Não obstante, o

systems planning permaneceu, no longo prazo, marginal ele próprio. Ao partir do pressuposto de

que a realidade se acha estruturada sob a forma de múltiplos sistemas, a abordagem sistêmica

busca uma entrada no debate científico mais amplo que, na época e já antes, sob a influência da

chamada Teoria Geral dos Sistemas, empolgava diversas disciplinas, influenciando não somente o

planejamento urbano mais o planejamento em geral. A ênfase do systems planning sobre a

necessidade de saber como as cidades e regiões “funcionam”, ênfase essa que representou uma

extraordinária chance para a “cientificização” do planejamento requeria, portanto, uma

formação profissional e predisposição que não eram (como até hoje não são) dominantes entre

os vários tipos de profissionais que lidam com o planejamento e gestão urbanos. Admirado e

citado, o enfoque sistêmico, por conseguinte, não chegou nunca a destronar propriamente o

blueprint planning que permaneceu sendo o porto seguro no quotidiano da grande maioria dos

profissionais, sobretudo aqueles com formação em Arquitetura. No Brasil, em que pese o fato demuitos dos planos elaborados ao longo do século XX não foram implementados, ou só o foram

parcial e tardiamente, o enfoque sistêmico também deixou suas marcas, a começar pelo Plano

Doxiadis, no Rio de Janeiro (1965), representativo de uma transição do planejamento físico-

territorial clássico para uma abordagem de tipo sistêmico.

Quanto ao enfoque racional, ele esteve, via de regra, umbilicalmente ligado ao systems

 planning, sendo fruto do mesmo caldo de cultura histórico-científico, conquanto, trata-se de algo

logicamente distinto. Enquanto o enfoque sistêmico é basicamente substantivo, o enfoque dito  

racional é procedural . Assim como os systems planning, também o rational process view vincula-

se a uma visão de planejamento como um processo. Seja como for, todas essas discussõespermaneceram tendo como terreno comum a racionalidade instrumental.