Representações da Enfermeira nas Capas da Revista da Cruz
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Representações da Enfermeira nas Capas da Revista da Cruz Vermelha no Período da Primeira Guerra1
Guaracy Carlos da SILVEIRA2
Maria Carla Vieira PINHO3 Egídio Shizuo TODA4
Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, SP
Resumo Norteado pela proposta interdisciplinar da Educação, Arte e História da Cultura, analisa-se a construção imagética e conceitual da Enfermeira na sociedade, considerando que esta contribui para o referencial, expectativas e conceitos acerca da prática profissional do enfermeiro. No presente estudo analisaram-se as capas da Revista da Cruz Vermelha no período da Primeira Guerra Mundial. Como metodologia de análise empregou-se a interpretação da construção estratégica de persuasão publicitária. Verificou-se que a Revista contribuiu para a construção do conceito e da imagem da enfermeira e da sua atividade, apresentando a enfermeira como um ser divino, que conforta e que cuida, conduzindo à uma imagem de doação e sacerdócio, geralmente associados à profissão. Palavras-chave: Historia da Mídia Visual; Enfermeiro; Revista da Cruz Vermelha; Persuasão Publicitária; Análise Semiótica.
Introdução
O presente estudo insere-se na proposta interdisciplinar que investiga a
interpelação entre Educação, Arte e História da Cultura. Baseado na premissa de
constructo cultural investiga-se a miríade de fontes que contribuíram para o papel
profissional da enfermeira no Brasil, buscando compreender este construto e sua
correlação com as expectativas acerca da práxis profissional do enfermeiro. Para tal
realizou-se a investigação de fontes que contribuíram para a formação deste constructo,
1 Trabalho apresentado no GT História da Publicidade e da Comunicação Institucional integrante do 11º Encontro Nacional de História da Mídia. 2 Doutorando em Educação, Arte e História da Cultura pela UPM Mackenzie, e-mail: [email protected] 3 Doutorando em Educação, Arte e História da Cultura pela UPM Mackenzie, e-mail: [email protected] 4 Doutorando em Educação, Arte e História da Cultura pela UPM Mackenzie, e-mail: [email protected]
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compreendendo que esta inclui entre outros: manifestações artísticas, de cunho
publicitário, e cultural.
Levou-se em conta o imaginário construído em torno da profissão em suas
representações (dimensão artística), a influência nas expectativas do enfermeiro em
formação (dimensão educacional) bem como nos pacientes e outros profissionais com a
qual os enfermeiros atuarão (dimensão cultural), tendo impacto direto na práxis do
profissional.
Inspirados nos estudos seminais de Judith Kinchi-Woods, organizadora da
exposição Shine On: Nurses in Art5, constatou-se uma carência de levantamentos acerca
da representação da Enfermeira na Arte. A hipótese levantada é de que tais
representações, considerando-se a intencionalidade de seus produtores e a impregnação
do contexto histórico que foram desenvolvidos, tem importante papel na edificação da
imagem do enfermeiro. O presente estudo insere-se em corrente de pesquisa que
considera tanto a propaganda como as expressões artísticas como fonte de compreensão
histórica.
De modo a possibilitar o diálogo interdisciplinar buscou-se fundamentação no
olhar de diferentes profissionais, sendo seus autores oriundos da área da enfermagem,
da publicidade e das artes visuais.
Referencial Teórico
A construção de qualquer estudo na área interdisciplinar é sempre um desafio,
devido ao fato da metodologia interdisciplinar estar em processo de construção.
Consideramos basilares as contribuições de Nicolescu (1999), Morin (2005) e Japiassu
(1976) e apontamos a produção do programa de pós graduação em Educação, Arte e
História da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie na última década como
modelo.
No tocante aos estudos da representação do enfermeiro, referenciaram-se nos
trabalhos de Gomes e Oliveira (2010) no estudo das dimensões que compõem o campo
representacional da enfermagem para enfermeiros que desenvolvem atividades nos
contextos hospitalares ou da saúde pública, em Porto e Santos (2010) acerca de 5 Columbus Museum of Art. (20 de março a 21 de junho, 2015).
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propagandas de remédio na imprensa ilustrada e a imagem da enfermeira brasileira no
período de (1920-1925), e no estudo de Luchesi e Mendes (2010) acerca da percepção
dos alunos do ensino médio sobre a imagem do enfermeiro.
Referente à análise de representações históricas e da linguagem da propaganda o
embasamento e dos trabalhos de Carrascoza (2009) e Marcondes (2001, 1995), e os
artigos de Jesus (2015) acerca de Poesia e Arte na publicidade de medicamentos,
Villegas e Assumpção (2015) com sua proposta de análise descodificada na arte visual e
na arte publicitária tendo como base as obras de Lautrec e Warol e, Andreoli (2009) em
seu estudo da interface entre Arte e Publicidade Pop.
Contextualização da prática da Enfermagem
No mundo moderno, analisando as práticas de saúde, em especial, a de
Enfermagem, sob a ótica do sistema político-econômico da sociedade capitalista é
observado o surgimento da Enfermagem como prática profissional institucionalizada.
Esta análise inicia-se com a Revolução Industrial no século XVI e culmina com o
surgimento da Enfermagem moderna na Inglaterra, no século XIX (COREN-SP, 2016).
As escolas se espalharam pelo mundo a partir da Inglaterra, mesmo diante das
dificuldades que as pioneiras da Enfermagem tiveram que enfrentar, devido à
incompreensão dos valores necessários ao desempenho da profissão. Nos Estados
Unidos a primeira Escola de Enfermagem foi criada no ano de 1873 (COREN-SP,
2016).
No Brasil, estabeleceu-se em 1890, no Rio de Janeiro, junto ao Hospital
Nacional de Alienados do Ministério dos Negócios do Interior, a primeira Escola
Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras, para a formação de pessoal de Enfermagem,
inicialmente para atender aos hospitais civis e militares e posteriormente, às atividades
de saúde pública. Denomina-se hoje Escola de Enfermagem Alfredo Pinto, e pertence à
Universidade do Rio de Janeiro - UNI-RIO (COREN-SP, 2016).
Em dezembro de 1908, foi criada a Cruz Vermelha brasileira na cidade do Rio
de Janeiro, que teve como primeiro presidente o médico sanitarista Oswaldo Cruz. Em
1912, foi inaugurada a sua filial no Estado de São Paulo (PORTO, CAMPOS e
OGUISSO, 2009).
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Em 1916 a Escola da Cruz Vermelha do Rio de Janeiro, começou com um curso
de socorrista para atender às necessidades prementes da I Guerra Mundial, mas logo foi
evidenciada a necessidade de formar profissionais da área (COREN-SP, 2016).
Posteriormente, em 1923, estabeleceu-se a enfermagem moderna, por meio da
Escola de Enfermeiras do Departamento Nacional de Saúde Pública, que surge no
contexto do movimento sanitarista brasileiro do início do século XX, hoje denominada
Escola de Enfermagem Anna Nery (EEAN), da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ) (EEAN, 2016).
Ao pensar a enfermagem moderna, percebe-se que o avanço da medicina
favoreceu a reorganização da Instituição Hospitalar e o posicionamento do médico
como o principal responsável por esta reordenação, deixando as raízes do processo de
disciplinarização e seus reflexos na Enfermagem. Entretanto, a evolução crescente dos
hospitais não melhorou, as suas condições de salubridade, havia predominância de
doenças infectocontagiosas e falta de pessoas preparadas para cuidar dos doentes, sendo
este o cenário de atuação da Enfermagem, quando Florence Nightingale foi convidada
pelo Ministro da Guerra da Inglaterra para trabalhar junto aos soldados feridos em
combate na Guerra da Criméia (COREN-SP, 2016).
Com a sua atuação, Florence Nightingale foi considerada a pioneira da
enfermagem moderna, estabelecendo um sistema formal de ensino para as enfermeiras,
visando mudanças na formação e garantia de uma educação de qualidade, com
tecnologia e ética, para uma assistência humanizada e segura (ALARCÓN, 2010).
Assim, a enfermagem passou a se desenvolver através dos anos, progredindo
enquanto ciência e aumentando os recursos profissionais desta área.
Persuasão Publicitária no Brasil no inicio de século XX
Há uma linha tênue que separa a expressão artística e seu uso para fins
persuasivo-comerciais, os estudos contemporâneos acerca do tema têm focado-se em
discussão acerca da diferenciação entre Publicidade e Propaganda, sendo que a primeira
seria de caráter mercadológico e a segunda de cunho ideológico/político, nesta acepção
os cartazes de espetáculos de Toulouse-Lautrec e as embalagens de produtos de
Alphonse Mucha estariam na esfera da publicidade e os filmes de Leni Riefenstahl para
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o partido nazista na esfera da propaganda6. Não é objeto de este estudo aprofundar-se na
discussão, e sendo assim, consideramos que os objetos analisados circunscrevem-se ao
campo da Publicidade compreendida como mensagem de cunho mercadológico.
Perez (2004) afirma que a análise de imagens mercadológicas e quase um
trabalho etnográfico ou arqueológico, visto que as imagens de produtos e marcas
publicitárias são portadoras de traços de uma época, de mitologias, de fragmentos de
vida social, e do trabalho da imaginação de seus criadores.
Para Carvalho (2001) o ponto de partida para a construção da mensagem
publicitária é na maioria das vezes um estereótipo cultural, utilizado com referência pela
coletividade, capitalizando a relação entre organização da sociedade e a questão de
identidade, levando o leitor a tomar consciência de tais associações.
Salientamos que o período analisado (início do século XX) caracteriza-se por
seu caráter estruturante e germinal da prática publicitária no Brasil, e como tal, destaca-
se o modo experimental na construção destas estratégias e principalmente pela
emulação e incorporação de modelos internacionais.
Em seu levantamento histórico Marcondes (2001), demonstra que a mídia
impressa na forma de jornal dominou o primeiro quarto do século XX, sendo que os
anos de 1900 marcam o nascimento das primeiras revistas no brasil. Segundo ele, os
registros históricos da primeira agência de propaganda surgida especificamente com o
fim de produzir comunicação comercial apontam para sua fundação por volta de 1913.
Ainda segundo o autor os anúncios das companhias internacionais são de melhor padrão
que maior parte da comunicação das empresas brasileiras, que importam o know-how e
técnicas desenvolvidas dos EUA, onde o processo já está consolidado, fazendo algumas
poucas adaptações locais. Considerando-se ainda o fraco estágio de desenvolvido
industrial do país, a importação de produtos traz em seu bojo a forma (e cara) da
mensagem publicitária.
Ainda para Marcondes (1995) no período da primeira guerra mundial não se
notam significativas mudanças na propaganda no cenário brasileiro, em sua maioria são
anúncios de remédios, que possuem apenas alguns avanços na visualização. A penúria
produtiva do período no Brasil também é apontada por Sarmento (1990) que afirma que 6 Para estudo aprofundado desta diferenciação ver o já citado trabalho de Villegas e Assupção (2015)
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se comparado ao que era produzida na Europa, principalmente Inglaterra, França e
Alemanha, as ideias e produção de anúncios publicitários eram rudimentares.
Carrascoza e Santarelli (2009) destaca a influência que produtos estrangeiros como
Nestlé, Colgate, Parker e GM – que trouxeram seus respectivos departamentos de
propaganda e padrões internacionais – tiveram na consolidação da propaganda
brasileira.
Neste cenário e possível afirmar que a produção americana, em especial da
Revista da Cruz Vermelha, contribuiu para a formação da imagem do enfermeiro no
Brasil.
A Revista da Cruz Vermelha Americana
Em seu livro Dumenil (2017) analisa a forma como as mulheres americanas
ajudaram os EUA a mobilizar a maior empreitada militar na história da nação, que se
deu através de uma rede de diversas organizações que angariavam seus membros de
uma ampla gama de programas. Organizações como a Câmara de Comércio, a Cruz
Vermelha, Associação Cristã de Moços, os Mações e os Cavaleiros de Columbus,
adaptaram suas instituições para o esforço de guerra, tornando-se veículos de
disseminação de mensagens do poderoso Wartime Propaganda Office.
Segundo a autora: Embora poucos americanos tenha experimentado o sofrimento, sacrifício ou drama da primeira guerra pessoalmente, eles foram constantemente lembrados pelo governo de que estavam em guerra. Agências governamentais, associações voluntárias, e a mídia bombardeavam os cidadãos com relatos do front. (...) Espaços públicos e ruas eram inundados com posters de propaganda, criando imagens contundentes e poderosas para os americanos que experimentavam uma guerra travada a milhas de distância. Considerados com a perspectiva atual, eles iluminam não só a forma como a mídia representa as mulheres, mas também os papeis de gênero de cidadãs defendendo a nação [...] Imagens que apresentavam jovens mulheres modernas, que eram femininas, mas também independentes e resolutas (DUMENIL, 2017, tradução nossa).
De acordo com o estudo de caso da ANA - Association of National Advertisers,
publicado pela AEF – The ANA Educational Foundation (2005), durante a Primeira
Guerra mundial a Cruz Vermelha americana enfrentou uma necessidade nacional sem
precedentes por seus serviços, conseguir fundos para entrega-lo exigiu que a
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organização utilizasse da publicidade como forma de apelar diretamente aos cidadãos
americanos, valendo-se de todos os meios possíveis, muito dos quais nunca havia usado
antes, para encorajar doações e voluntários, esta campanha se provou extremamente
efetiva.
O Departamento Nacional da Cruz Vermelha Americana empreendeu duas
iniciativas de levantamento de fundos: as campanhas “The War Fund” e o “Roll Call”,
solicitando doações. No total as campanhas trouxeram cerca de 250 milhões de dólares.
A Cruz Vermelha americana conseguiu conquistar um terreno pouco familiar
solidificando suas técnicas de campanhas publicitárias anteriores a primeira guerra. Esta
postura agressiva, foi a primeira do gênero na história de publicidade da organização,
incluía: posters, revistas, outdoors, brochuras, filmes, porta vozes e eventos públicos.
A revista “Red Cross Magazine” surgiu em 1916 como uma fonte publicitária,
sendo expandida durante a primeira guerra. Após a guerra ela tentou tornar-se um
periódico mensal mais geral, mudando seu nome para “The New Red Cross Magazine”-
a revista para uma América melhor – mas saiu de circulação em 1920. As capas
analisadas neste trabalho cobrem um período de 1917 a 1919.
De acordo com os registros históricos da Cruz Vermelha, no inicio da guerra a
Cruz Vermelha Americana era uma pequena organização que ainda estava no processo
de desenvolver sua identidade e programas. Com a declaração de guerra pelos EUA em
1917 a organização passou por um extraordinário período de crescimento e quando a
guerra terminou em 1918 ela havia se tornando uma organização humanitária nacional
com uma liderança forte, uma imensa base de membros, reconhecimento universal e
uma ampla gama de serviços prestados.
Tabela 01 – Evolução da Cruz Vermelha Americana no Período da Guerra
1914 1918
Capítulos 107 3864
Membros Adultos 16.708 20.390.173
Trabalhadores Voluntários N.A. 8.100.00
Numero de Enfermeiras alistadas pelo exército 23.822
Fonte: Adaptado do “Red Cross Wolrd War I Statistcs at Glance”
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No contexto cultural, as imagens convocatórias coordenadas pelo conselho de
guerra americano, serviram para fundamentar a ideia profissional da enfermeira no
imaginário popular americano, e com a disseminação da cultura americana pelo mundo
e a tendência nacional de reproduzir as práticas publicitárias no período, influenciaria
também o imaginário brasileiro, como mostram os trabalhos de Porto e Santos (2010)
acerca das propagandas de remédios na imprensa brasileira e na análise da
Representação da Enfermagem na Imprensa Cruz Vermelha Brasileira de Mecone e
Freitas (2009).
Metodologia de Pesquisa
A seleção das capas a serem analisadas se deu por conveniência dos
elaboradores escolhendo aquelas consideramos mais expressivas e didáticas, os
exemplos foram retirados da coletânea do período realizada pelo site MagazineArt.org.
A análise das capas é realizada por conta da perspectiva de argumento
publicitário, utilizando como base os parâmetros para elaboração de um anuncio
impresso de acordo com Aitchison (2007), Sampaio (2013) e Santana (2008), onde
busca-se evidenciar a construção persuasiva da peça.
As Capas da Revista da Cruz Vermelha Americana
Imagem 01 – Capa da Revista, Outubro 1917.
http://www.magazineart.org/main.php/v/massmonthlies/redcross/Red+Cross+Magazine+1917-10.jpg.html
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Análise da linguagem publicitária
Por meio da construção da peça, materializa-se a ideia da Enfermeira como
elemento de união entre as forças militares (junta as mãos de ambos). Sua composição
em forma de Cruz, evidenciada pela imagem de fundo, subentende que não se trata de
uma enfermeira qualquer, mas sim uma que pertence a Cruz Vermelha. A neutralidade
das expressões faciais da enfermeira converge para uma ideia de serenidade e
austeridade no desempenho de sua função. Considerado que se trata de uma capa de
revista (que será exposta) o fundo branco em contraste com a imagem colorida atende
ao quesito de chamar a atenção, a construção da imagem funciona em seu intuito de
despertar o interesse do leitor, o inusitado da cena estimula o desejo de buscar-se mais
informações que efetivamente induz a ação (folhear a revista).
Imagem 2 – Capa da Revista, Janeiro 1918.
http://www.magazineart.org/main.php/v/massmonthlies/redcross/RedCrossMagazine1918-01.jpg.html
Análise da linguagem publicitária
A capa caracteriza-se pelo contraste dos tons escuros que formam a moldura de
uma janela onde podem ser vistos galhos desnudos de uma arvore, característicos da
estação do ano na região (inverno) o que ajuda a ancorar a peça ao período. Num plano
simbólico o inverno remete à morte ou fim de um ciclo (relação com a guerra), em
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contraste com a alvura do uniforme da enfermeira, que lembra a pureza e perfeição,
tem-se assim uma construção simbólica da enfermeira como da vida contra a morte. A
imagem não deixa claro o que é o objeto manipulado pela enfermeira, embora este se
assemelhe muito a um Teletipo, neste contexto, supõe-se que a enfermeira está
recebendo notícias do front. Seu olhar transmite certo tom de preocupação, e pode-se
especular que não se tratam de boas noticias. A construção figura de fundo-frente/claro-
escuro, atende o quesito de chamar a atenção. O contexto de preocupação para com as
noticias funciona para despertar o interesse para com a publicação, sendo que o
conjunto total serve para estimular o desejo de leitura e a ação de folhear a revista.
Imagem 3 – Capa da Revista, Novembro 1918.
http://www.magazineart.org/main.php/v/massmonthlies/redcross/Red+Cross+Magazine+1918-11.jpg.html
Análise da linguagem publicitária
Repete-se da estratégia de contraste entre a figura do fundo e a imagem de
frente, numa construção escura - claro. A utilização da imagem da estátua da liberdade,
monumento que na época já contava com mais de 30 anos, tem obvio cunho patriótico e
de ressaltar os valores da cultura americana. A alvura do uniforme da enfermeira
continua a ter representações de pureza. Pela primeira vez a enfermeira é representada
sorrindo, seus braços abertos a receber a mulher concedem-lhe um caráter maternal,
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apropriado para um discurso de acolhimento e suporte, observe que a mulher ao juntar
as mãos adquire postura típica de um suplicante. Embora pelos registros disponíveis
seja impossível precisar a data da criação desta capa, sua veiculação coincide com a
com a declaração do fim da guerra, o que lhe garante não só encorreamento no
momento histórico, como também força ao chamar a atenção do público, a construção
da imagem considerando-se o contexto em que está sendo veiculada certamente atende
aos quesitos de interesse, desejo e ação de uma boa mensagem publicitária.
Ilustração 4 – Capa da Revista, Janeiro 1919.
http://www.magazineart.org/main.php/v/massmonthlies/redcross/Red+Cross+Magazine+119-01.jpg.html
Análise da linguagem publicitária
Nesta peça observa-se a perpetuação da estratégia de oposição claro e escuro. Na
presente capa optou-se pela utilização do fundo vermelho (que remete a sangue)
proposição esta é reforçada pela imagem dos soldados feridos. No topo da capa as
guirlandas remetem ao fim do período de natal (que coincide com o período de sua
veiculação). A postura corporal da enfermeira ao abraçar os soldados, forma uma cruz e
somado o fundo vermelho constitui-se metaforicamente em uma cruz vermelha. A
posição estoica da enfermeira, bem como a estilização de seu rosto, conferem-lhe
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atributos de beleza clássica, aproximando-a de uma figura mais divina do que real.
Contribui para esta percepção a caracterização dos soldados, ambos tendo uma altura
menor do que a enfermeira, de onde pode-se então inferir que esta é mais “poderosa”
que estes. A representação destes com um discreto sorriso, sua postura corporal e a
natureza de seus ferimentos (não mutilatórios) de certa forma ameniza a inferioridade
destes em relação a enfermeira, sugerindo que não são eles homens menores, mas ela
que é algo maior (divina). Da mesma forma o olhar para o horizonte da enfermeira dá a
entender que ela está olhando para o futuro, capacitando-a a mostrar o caminho, ou por
assim dizer guiar os soldados. Os soldados com curativos reforçam a sugestão de
momento de cicatrização e resguardo. A construção como um todo funciona no intuito
de ser uma imagem consoladora, dando a entender que o pior já passou e que daqui para
frente instaura-se o processo de cicatrização, desde que nos permitamos ser guiados pela
enfermeira. Considera-se que a construção da peça atende aos quesitos no sentido de
chamar a atenção, despertar o interesse, criar desejo e estimular a ação.
Conclusão
No tocante a proposta de Constructo Cultural, podemos afirmar que a Revista da
Cruz Vermelha contribuiu para o conceito e imagem da enfermeira e da sua atividade.
As imagens apresentadas em especifico conduzem a um imagem de doação e
sacerdócio, geralmente associados a profissão. A enfermeira é vista como um ser
divino, que conforta, que cuida, que cura e mostra o caminho.
Referente a campanha engendrada nos EUA com base dos dados apresentados
na Tabela 01 é seguro afirmar que esta atingiu amplamente seus objetivos referentes ao
crescimento e sedimentação da Cruz Vermelha. O que deve ser ressalto é que o
momento histórico em que a campanha se desenvolveu se relacionado ao estado da arte
da Publicidade Brasileira no período e a prática de emulação e adaptação de campanhas
internacionais, nos permite afirmar que a campanha desenvolvida pela Cruz Vermelha
Americana influenciou o processo de construção da imagem do enfermeiro no Brasil.
Embora seja difícil precisar a quantidade desta influência, inclusive pela rara presença
de estudos de audiência na época, é possível afirmar que a forma como a campanha se
estruturou lhe concedeu tal capacidade.
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Estudos desta natureza são importantes principalmente se considerado que a
construção da imagem deste profissional se deu ao longo de todo o século passado.
Sendo assim o presente artigo deve ser considerado como germinal numa série de
investigações maiores.
REFERÊNCIAS
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