Representação ao Conselho Nacional de Justiça

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Granja Comary - Usurpação de Logradouros Públicos - Improbidade do Juizado Cível da Comarca de Teresópolis -

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Ao

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

Corregedoria Nacional de Justiça

Ed. Anexo I do Supremo Tribunal Federal, 3° Andar, Sala 360

Praça dos Três Poderes, s/n°, Brasília - DF, CEP: 7 0.175-900

EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO-CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA

BRASIL-LINK, com apoio do COMITÊ DE CIDADANIA E MEIO AMBIENTE (COCIDAMA) e do MOVIMENTO CONSERVACIONISTA TERESOPOLITANO (MCT),

instituições da sociedade civil de interesse público, dedicadas à defesa da cidadania e do meio ambiente, endereços e inscrições no final referidos, empenhadas no restabelecimento de logradouros públicos usurpados à municipalidade , vêm, por seus dirigentes, conforme teor, considerações e elementos de prova a seguir, apresentar

denúncia de improbidade verificada nos Juízos Cíveis da Comarca de Teresópolis, Estado do Rio de Janeiro, em face de condução processual que vem favorecendo a usurpação de privilegiados espaços e logradouros públicos de relevante valor turístico que integram a renomada Granja Comary, localizada no Bairro Carlos Guinle, Município de Teresópolis, RJ.

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SUMÁRIO

1. PRELIMINARES 3 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. VERTENTES DA IMPROBIDADE 4 2.2. DA SEGURANÇA JURÍDICA 6 3. DOS FATOS E DO DIREITO 3.1 RETROSPECTIVA 7 3.2 DAS NORMAS CONCERNENTES 10 3.3 DA INFRAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE 3.4. DA FRAUDE À LEI 13 4. DO PRIMADO DA LEI 20 5. DA RESTAURAÇÂO DA ORDEM JURÍDICA 22 APÊNDICE C FAC-SÍMILES DOS DOCUMENTOS REFERIDOS 25

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1. PRELIMINARES

Preocupa-nos as ofensas que vem sofrendo o Estado Democrático de Direito ameaçado por acontecimentos que vão passo a passo remetendo-o aos primórdios do estado feudal de longíquo passado. Corroboram tal apreensão o freqüente noticiário sobre trabalho escravo, grilagem e usurpação de terras públicas e a presença de organizações criminosas ocupando as lacunas deixadas pelo Estado lerdo, inepto e negligente , em nossa percepção. São temerárias as perspectivas futuras quando se sabe que agentes governamentais se despem de suas identidades funcionais para buscarem a segurança do anonimato. A permissividade, o corporativismo, o despudor, o desrespeito endereçado aos que pagam as contas e a negligência que grassam no seio dos órgãos públicos revelaram ao crime a impotência, a fraqueza e a desorganização do Estado, que em sua agonia apenas esboça reações precipitadas, mais truculentas que inteligentes. A ausência de respostas efetivas diante da inépcia e da decadência moral nas esferas de governo e no organismo social estão arruinando a democracia, inibindo a cidadania, favorecendo a criminalidade, transfor-mando-nos em fantoches atônitos e acuados. Neste cenário, insere-se a usurpação de terras e logradouros públicos, constante na vida nacional que muito afeta o patrimônio público, a organização social e a credibilidade do Estado, na medida em que executivos, legislativos e instâncias judiciárias permitem ou são coniventes no processo de espoliação. De norte a sul listam-se as ocorrências que revelam a ocupação ilegal de expressivas áreas, que, desde a região amazônica, sem respeitar definição de parques nacionais, de áreas de proteção ambiental, de contornos municipais, segue avançando sobre logradouros e espaços públicos, cumulando-os com empreendimentos imobiliários, como espelham casos notórios no Distrito Federal, no Piauí, no litoral nordestino, no sudeste e no sul do País. Valendo-se da ausência, da omissão e da corrupção de aparelhos de governo, os usurpadores aplicam-se na estratégia do fato consumado: invadem, cercam, ocupam, constroem. Tudo fazem à margem da lei, certos de que em algum momento, pressionando o poder público e

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clamando por oportunidade de regularizar os frutos de sua má-fé, conseguirão sensibilizar e mobilizar consciências para se alinharem à sua causa, ignorando ou minimizando o prefácio de violação, isto, quando não negociam o fruto do esbulho e saem ilesos com os ganhos, deixando os prejuízos da ilicitude com os ludibriados de boa fé, para os quais faltou a presença controladora do estado. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 VERTENTES DA IMPROBIDADE

“A cultura do favorecimento de determinados segmentos da sociedade ou de certas pessoas, em detrimento do global, arraigou-se de tal sorte no seio de nossa sociedade que a improbidade vem sendo aceita com certa naturalidade. Tem-se a impressão de que a coisa pública pertence aos mais espertos, que levam vantagens em tudo que fazem ou deixam de fazer. Daí a generalização dos atos de improbidade na Administração Pública nas três esferas do Poder.” Kiyoshi Harada

Num Brasil quase continental não são raras as decisões judiciais que padecem comprometimento com a estrutura de poder local, sobretudo nos centros urbanos de pequena população, onde a proximidade e o convívio porta a porta carreia para os tribunais locais influências que afetam a imparcialidade requerida, principalmente, quando entram em cena relações de camaradagem que remontam à primavera dos magistrados que emergem da própria localidade. De semelhante contexto, decorre uma espécie de improbidade difícil de enfrentar porque resulta de favorecimento gracioso, sem contrapartida de vantagem econômica, cortesia com chapéu alheio, com a nódoa da prevaricação, pois afeta a imparcialidade do trabalho jurisdicional a que tem direito a cidadania, e caracteriza a prestação de um serviço sem zelo e desqualificado, que, por contrariar os princípios constitucionais da eficiência e da segurança jurídica configura ato de improbidade, ainda que não envolva enriquecimento ilícito do agente público, nem prejuízo para o erário. Estamos diante de tribunais que se valem de estratégia perversa, caracterizada por deixar de lado elementos decisivos do processo, tratando-os como se não existissem, esquecidos em relatórios truncados, que justificam dispositivos de sentenças encomendadas, mascarados com fragmentos desarticulados de doutrina e em enfoques distorcidos da

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legislação, com tal despudor, que bem comporta a cínica citação atribuída a Luis XVI – “C’ est légal parce que je Le veux” – reeditando o estado absolutista de remoto passado. Juízes e desembargadores hipócritas que assim procedem, desrespeitam patrono e parte, violam santuário de justiça, frustram e pervertem a corte que se deseja e se espera imune à prevaricação. De pronto, somente esta propensão à ditadura do tribunal, pode explicar o desacato a preceitos constitucionais, à norma especial cogente, à tutela declaratória da sentença de mérito da coisa julgada material, bem como, que decisões judiciais sedimentadas no passado confirmando a ilegalidade dos condomínios artificiosamente instalados em glebas da Granja Comary, sejam desacatadas por recentes decisões de juízes da Comarca e o que é mais grave, ratificadas por instâncias superiores, que sem respeito pelo próprio ministério, contrariam o bom senso e a justiça das sentenças anteriores que traduziam a vontade da lei, como atestam os documentos anexos ( Doc. 01 – fls. 26/33 e Doc. 02 – fls. 34/53) Nos diversos processos movidos pelos que resistem ao vilipêndio que resulta do embuste e da imposição de conivência na prática de ilícitos, despontam decisões que envergonham a magistratura, e mais do que ofenderem a inteligência, ofendem a dignidade dos patronos e dos que buscam a tutela do Judiciário. É de se acentuar, que ao deitar verborragia sobre o processo, esquece esse magistrado que do outro lado há um Advogado e Constituintes íntegros, quiçá com superior competência, sopesando o triste destino de um país que depende de agentes sem dignidade. Se não há texto legal que impeça juiz de fazer justiça, pelo que se nota, também não há texto legal que o impeça de ignorar a verdade dos autos, de prevaricar e praticar injustiça. Não há corporação imaculada, não o foi a dos apostolos do Cristo, não se pode credita-la em outra parte. A corporação não tem humanos predicados, apenas reflete conforme mais ou menos brilha a decência de seus integrantes. O que pode resguardar o cidadão da indecorasa atuação é o altivo e insuspeito controle das instâncias superiores, que em faltando, transforma o estado em odioso algoz. Causa espanto e indignação quando magistrados, desprezando a norma especial impositiva, postam-se a inovar, fazendo apologia do condomínio de fato, como se este não tivesse os mesmos vícios do comércio informal, do contrabando, da milícia de fato, das organizações criminosas que infestam o País, e o fazem, sem dar conta que, ao

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transigir com a informalidade, acatam o desprezo à Lei e incorrem em aviltante conivência com o estado marginal. Isto afeta – mais do que a credibilidade do Judiciário, a fé nos destinos da Nação. E, aí, há que se definir a vocação nacional: ser um País ajustado aos fatos ou ser um País ajustado ao Direito. Ao Poder Judiciário cabe velar pela digna opção. 2.2 DA SEGURANÇA JURÍDICA De modo geral, a segurança provém da garantia que um sistema em desenvolvimento oferece, no sentido de que as expectativas nele depositadas, ocorram com a estabilidade e a regularidade requeridas. No estado de direito, o cidadão e as organizações sociais precisam de probabilidades, de circunstâncias e situações bem assentadas e confiáveis, precisam, enfim, da liquidez derivada de um conjunto de certezas que ofereçam previsibilidade e estabilidade para o passo adiante, a próxima jornada, a próxima parada. Logo, a liquidez e a estabilidade da prestação jurisdicional são fatores essenciais à manutenção da ordem e da paz social no Estado Democrático de Direito, e, não sem razões, a Constituição Cidadã de 1988, em oportunos artigos, blindou o ordenamento jurídico com aptidão de regularidade fundada na estabilidade das coisas assentadas, permitindo ao indivíduo e às suas expressões de organização respaldar com relativa segurança as ações futuras. Portanto, é inerente ao princípio de segurança jurídica que, ao se buscar a tutela jurisdicional, possa-se contar com um mínimo de confiança quanto ao resultado que sobrevirá à postulação perante o Judiciário. Entretanto, como a Lei que disciplina a Ação Civil Pública determina que as ações nela previstas sejam propostas no foro local onde ocorrer o dano, dando ao juízo competência funcional para processar e julgar a causa, as entidades da organização civil que acodem ao chamado da cidadania vêem-se na prática obstadas, quando se dão conta de que os tribunais a que deveriam recorrer são imputáveis de parcialidade porque a distinguem no teor das decisões que pontuam a matéria a postular. Ora, se o tribunal não cultiva respostas estáveis e regulares em

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determinada pauta, torna-se, por quebra de princípio, incompetente para a prestação jurisdicional, por que expõe as partes aos impulsos de julgadores inquinados por interesses de momento, restando aos que carecem da tutela jurisdicional o recurso à denúncia, em boa hora, acredita-se, propiciado numa instância capaz de corrigir desvios. 3. DOS FATOS E DO DIREITO

"Os ladrões de bens particulares passam a vida na prisão e acorrentados; aqueles de bens públicos, nas riquezas e nas honrarias"

Catão, o Censor [–234/–149]

3.1 RETROSPECTIVA O vale em que se localiza a Granja Comary compreende cerca de 300ha aninhados entre contrafortes de elevações da Serra do Mar, que se erguem ao fundo da Baía de Guanabara. Apesar de sofrer com a ocupação urbana, ainda resiste à intervenção apresentando fragmentos significativos remanescentes da Mata Atlântica. O clima ameno, a vegetação ainda exuberante e o relevo gracioso são estímulo para o desenvolvimento turístico do Município, tolhido pela usurpação de logradouros públicos, fechados por cancelas e guaritas e transformados em condomínios piratas. A urbanização dessa área teve inicio nos idos de 1951, quando a propriedade da Granja Comary, que ocupava quase todo o vale, passa por sucessivos desmembramentos, dividindo-se inicialmente em quadras e mais tarde em glebas, umas e outras divididas em lotes para a venda em prestações. O memorial descritivo do plano de loteamento, exigência do Dec. Lei n.º 58/37, depositado em Cartório em 21.04.1951 (Doc. 03 – fls. 54/68), introduz o loteamento denominado Jardim Comary, compre-endendo 239 lotes, e abertura de 15 ruas novas, jardins e praças de retorno .

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Conforme se pode observar na cronologia abaixo, a este memorial foram-se aditando ao longo de anos o depósito de modificações e acréscimo de novas áreas, observando o prescrito no Dec. 3079/38 que regulamentava o Dec. Lei n.º 58/37.

HISTÓRICO DE EVENTOS E REGISTROS

21.04.1951 - Memorial do plano de loteamento do Jardim Comary

04.12.1952 - Modificação das Quadras I, II, III e IV

11.01.1958 - Modificação da Quadra II

05.12.1958 - Modificação da Quadra IV e Inclusão da Quadra V

02.07.1962 - Inclusão da Quadra VI

07.12.1966 - Inclusão da Gleba 2

31.03.1967 - Inclusão da Gleba 3

04.07.1967 - Inclusão da Gleba 4 - Parque das Castanheiras

12.07.1968 - Registro de instrumento particular de contrato de constituição

dos Condomínios Comary

27.02.1969 - Dec. Municipal N.º 7/69 alterando a denominação da Granja Comary

para Bairro Carlos Guinle.

30.03.1975 - Dec. Municipal N.º 286/75 nomeando logradouros públicos do

Bairro Carlos Guinle

31.08.1994 - Ação Popular N.º 1115/94 – Sentença condenando os Condomínios

Comary Gleba VI e VI-A a desobstruíreo acesso das vias públicas

no Bairro Carlos Guinle.

30.05.1996 - Mandado de registro da sentença de cancelamento dos registros

alusivos a constituição do Condomínio Comary.

Averbação de desmembramentos

24.09.1968 - Gleba 6

24.09.1968 - Gleba 8

16.02.1970 - Gleba 6-A e 7

06.03.1970 - Gleba 5

09.12.1971 - Gleba 7-A

02.02.1972 - Gleba 9

03.01.1975 - Gleba 11

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Até 1967, constata-se que os empreendimentos na área observam os trâmites legais, porém, inexplicavelmente relaxados a partir da averbação do desmembramento da Gleba 6, quando arruamentos e vendas de lotes são promovidos a margem das normas impositivas, frustrando-se, de então, em toda extensão o ordenamento federal que rege o negócio imobiliário. A Figura 1, abaixo, mostra uma vista geral do trecho da Serra do Mar onde se destaca o contorno aproximado do atual Bairro Carlos Guinle, correspondente à renomada Granja Comary . Figura 1

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A Figura 2, a seguir, mostra outra vista geral com indicação das áreas espoliadas (partes mais claras) pelos Condomínios Comary Glebas 4; 5; 6; 6-A; 7-B; 7-C; 7-D; 7-E; 7-F; 8-D; 9; 10; 11; 12; 13; 14; 15; correspondendo à usurpação de cerca de 70% da área do Bairro Carlos Guinle. Figura 2

3.2 DAS NORMAS CONCERNENTES

Os diversos equívocos cometidos por julgadores ao apreciarem questões relacionadas à legitimidade de tais condomínios, em se valendo de argumentos desvinculados dos fatos e o tumulto orquestrado em torno do tema tornam conveniente, se enfatize o relato dos vícios que envolvem os artificiosos condomínios da Granja Comary, de fato, usurpação de espaço público de notável valor paisagístico e ambiental, em que pese já terem sido, alhures, suficientemente relatados pelos eminentes magistrados que prolataram as sentenças dos Doc. 01 e 02 em apêndice.

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3.2.1. DAS NORMAS COGENTES

O parcelamento do solo não constitui um mero exercício do direito de propriedade. De há muito, subordina-se ao direito urbanístico, ao direito ambiental, e, mais recentemente, ao direito constitucional, quando se tem em perspectiva a função social da propriedade.

Neste sentido, ensina o saudoso professor HELY LOPES MEIRELLES:

"Tais limitações constituem legítimo condicionamento do direito de propriedade, e especialmente do de construir, aos superiores interesses da coletividade, expressos nos regulamentos administrativos a que alude o artigo 572 do Código Civil...

... Superado o conceito absolutista do direito de propriedade — jus utendi, fruendi et abutendi — que teve o seu apogeu no individualismo do século XVIII, o domínio particular se vem socializando ao encontro da afirmativa de Léon Duguit, de que ‘ a propriedade não é mais o direito subjetivo do proprietário; é a função social do detentor de riqueza’. Com essa característica contemporânea, já não se admite o exercício anti-social do direito de propriedade, nem se tolera o uso anormal do direito de construir ".

Portanto, em nenhuma hipótese, aos proprietários de gleba original rural ou urbana assiste o direito de dividi-la em parcelas, à revelia do Poder Público, sem que antes, atendendo à legislação imperativa, promovam a regularização do loteamento como um todo, cumprindo os procedimentos registrais e obtendo a aprovação do governo local mediante a satisfação das exigências urbanísticas e ambientais.

Importante destacar que o ordenamento jurídico não acolhe a possibilidade de implantação de condomínio de lotes que, apesar de sistematicamente rejeitada pela doutrina e jurisprudência, encontra defensores indiferentes à ordem urbanística.

Também, ao loteamento travestido em condomínio de lotes não

socorre o instituto de direito civil sob o título condomínio geral, porque este pressupõe uma co-propriedade dividida em partes ideais, que não recairia sobre os lotes, por serem exclusivos, mas, sobre o equipamento urbano — ruas , praças, e outras reservas — que a lei define como propriedade municipal.

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De fato, quando se divide uma gleba em lotes perfeitamente definidos como objeto de propriedade individual, exclusiva e distinta, resta prejudicado o rótulo de propriedade condominial por força de expressas disposições legais, em face da abertura de espaços públicos na gleba original.

Nem mesmo se ajusta ao condomínio de lotes (também

denominado especial, deitado ou fechado) a aplicação da lei 4.591/64, que dispõe, sem dúvida, "sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias".

Não bastasse, clara é a lição de um dos autores do projeto do qual resultou esta lei, Caio Mário da Silva Pereira:

"A lei exige a construção sob a forma de unidades autônomas. Esta é uma conditio legis. É mister que cada unidade – apartamento residencial, sala ou conjunto de escritório, de um ou vários pavimentos, loja, sobreloja, vaga em edifício-garagem – constitua unidade autônoma e deve ser tratada objetivamente como tal e assinalada por uma indicação numérica ou alfabética, para efeito de identificação" (Condomínio e incorporações, 10.ed., Forense, 1996, p. 69).

O Conselho Superior da Magistratura (SP), em diversas oportunidades, deixou assentado que

"a instituição da lei 4.591/64, posto que não se aplique somente a edifícios, tem sua existência subordinada à construção de casas térreas, assobradadas ou de edifícios. Sem a vinculação do terreno às construções não há condomínio que se sujeite à lei especial"

Loteamentos travestidos de condomínios especiais mereceram do

eminente João Batista Lopes as seguintes considerações, que se ajustam feito uma luva ao caso presente:

"Nos chamados loteamentos fechados, ocorre tão-

somente parcelamento do solo e alienação de lotes sem qualquer vínculo a edificações, sendo numerosos os loteamentos mal sucedidos em que os adquirentes não se interessam em construir e permanecem na expectativa de futura valorização da área".

"Em conclusão, o chamado ‘condomínio fechado’ não constitui modalidade de condomínio em edifícios (propriedade horizontal) e, assim, fica excluído da incidência da lei 4.591/64" (Condomínio, 4.ed., RT, p.63-64).

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Isto posto, expor-se-á a constatação de

a) fraude à lei 4.591/64, acolhida para efeito de demonstração por absurdo, mesmo em desacordo com a necessária condição de vinculação do terreno à construção;

b) fraude à legislação que dispõe sobre parcelamento do solo: Decreto-Lei Nº 58/37, regulamentado, pelo Decreto Nº 3079 de 15/09/1938 vigentes na ocasião.

3.3 DA INFRAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE O registro imobiliário constitui um sistema preordenado em

função das garantias formais, essenciais à tutela da segurança jurídica, dotado de procedimentos que impedem que uma pessoa arrogue direitos de extensão ou conteúdo diversos do que titula o anotado em registro. Tais procedimentos respondem ao princípio da especialidade que, na lição de Afrânio de Carvalho, significa que "toda inscrição deve recair sobre um objeto precisamente individuado" (Registro de Imóveis, 2.ed., Forense, p. 219)

Verifica-se ter havido quebra absoluta e irremediável do

princípio de especialidade.

3.4 DA FRAUDE À LEI

Para disciplinar o desenvolvimento de loteamentos de terrenos destinados a venda em prestações, diante do deslocamento crescente da população rural para os centros urbanos, entrou em vigor em 10/12/37 o Decreto-Lei N.º 58.

Embora, não objetivando ser em especial um instrumento de planejamento urbano, lançava já alguma disciplina sobre o tema.

Logo, no seu primeiro artigo, obrigava os proprietários, antes de anunciar a venda, a depositar no cartório do registro de imóveis da circunscrição respectiva um memorial contendo em resumo :

— denominação, área, limites, situação e outros característicos do imóvel; — plano de loteamento, de qual conste o programa de desenvolvimento urbano;

— planta do imóvel, assinada também pelo engenheiro que

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haja efetuado a medição e o loteamento e com todos os requisitos técnicos e legais; indicadas a situação, as dimensões e a numeração dos lotes, as dimensões e a nomenclatura das vias de comunicação e espaços livres, as construções e bem-feitorias, e as vias públicas de comunicação; — tratando-se de propriedade urbana, o plano e planta do loteamento deviam ser prèviamente aprovados pela Prefeitura Municipal, ouvidas, quanto ao que lhes dissesse respeito, as autoridades sanitárias, militares e, desde que se trate de área total ou parcialmente florestada, as autoridades florestais.

Note-se que é claro objetivo da norma quanto ao registro público

minucioso e discriminado do que está sendo feito e comercializado, coerente com o princípio de especialidade.

Evidente, também, que sendo a aprovação do loteamento ato da alçada privativa da Prefeitura, incumbe a esta o ordenamento concernente à ocupação do espaço criado, de acordo com as limitações estabelecidas em lei pelo Estado e pela União.

Porém, a nenhuma dessas providências preliminares se procedeu a partir de 1968, quando as Glebas 5; 6; 6-A; 7; 7-A; 8; 9 e 11 foram loteadas e postas a venda.

Por outro lado, operando-se sob hipótese absurda, admitindo a inteligência da Lei 4591/64 para alçar os loteamentos à condição de condomínio de lotes, constata-se na verificação desta hipótese a presença de vício insanável.

Para capitular o instante em que ocorre, cabe destacar as referências cronológicas que faz esta lei, quanto ao procedimento notarial previsto. Eis que, este deve ocorrer em duas etapas distintas:

— etapa preliminar, sob o Título II – DAS INCORPORAÇÕES, relativa à formalização do negócio do empreendimento no âmbito do registro de títulos e documentos, RTD, visando os planos em perspectiva e o atendimento das exigências fiscais e legais encampadas pelo Art. 32º, destaque para as alinhadas nas letras:

d) projeto de construção devidamente aprovado pelas autoridades competentes;

e) cálculo das áreas das edificações, discriminando, além da global, a das partes comuns, e indicando, para cada tipo de unidade, a respectiva metragem de área construída;

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j) minuta da futura convenção de condomínio que regerá a edificação ou o conjunto de edificações;

— etapa conclusiva, sob o Título I – DO CONDOMÍNIO, relativa à formalização do conjunto das unidades autônomas efetivamente estabelecidas ao final do empreendimento, visando sua constituição em condomínio no âmbito do registro de imóveis, RGI, atendendo as obrigações fixadas no Art. 7º, quais sejam:

O condomínio por unidades autônomas instituir-se-á por ato entre vivos ou por testamento, com inscrição obrigatória no registro de imóveis, dele constando: a individualização de cada unidade, sua identificação e discriminação , bem como a fração ideal sobre o terreno e partes comuns, atribuída a cada unidade, dispensando-se a descrição interna da unidade.

ORA, SIGNIFICA QUE A COISA EM NEGÓCIO DEVE SER

TANGÍVEL, CONCRETA, DEFINIDA EM SUAS CARACTERÍSTICAS.

Com efeito, consta da cláusula segunda transcrita na certidão do instrumento particular de contrato (Doc. 08 – fls. 81/84) que os condomínios da Granja Comary oferecem, como a se tratar da peça constitutiva, o seguinte:

“O condomínio Comary, que pretende de futuro a totalidade da Granja,(...), será organizado por etapas mediante sucessivos desmembramentos e urbanização das glebas que tanto quanto possível apresentem características físicas comuns. Com esse objetivo, promoveu (...) o desmembramento da gleba que tomou o nº6 a ela devendo incorporar-se não só as glebas que venham a organizar-se pelo mesmo regime, como também incorporar-se as já desmembradas e vendidas, pelo regime especial do Dec. Lei 58 de 10/12/37, desde que assim o delibere a totalidade de seus adquirentes restabelecendo-se a primitiva unidade geográfica da Granja Comary, sujeita a um só regime jurídico (...)"

Como se vê,

em tão incoerente arquitetura jurídica que pretende a derrogação de normas imperativas, a res in commercium não tem começo, meio e fim, também, não tem medidas, área, localização, coordenadas, NADA .

NESTA CLÁUSULA NÃO SE PODE PERCEBER A INDIVIDUALIZAÇÃO, A DISCRIMINAÇÃO E A IDENTIFICAÇÃO

DO OBJETO QUE A LEI RECLAMA.

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Conforme se apontou acima, constata-se a quebra absoluta e irremediável do princípio de especialidade.

Assim, o instrumento balizador desses condomínios artificiais ao não apresentar a mínima materialização do empreendimento, deixando de localizá-lo, discriminá-lo e quantificá-lo, não passa de delírio, , sonho visionário, desprovido de efetiva substância jurídica.

ASSIM, O DOCUMENTO QUE APRESENTAM COMO A TRATAR-SE

DA CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO, NÃO SERIA MAIS DO QUE A

MINUTA – INCOMPLETA – EXIGIDA NA LETRA J) DO ART. 32, REFERENTE AO REGISTRO DA INCORPORAÇÃO NA ETAPA

PRELIMINAR, SE ESTA TIVESSE OCORRIDO.

Então, ao contrário do indispensável RGI, não se tem mais do que uma declaração de intenções registrada em Títulos e Documentos, não comportando outro entendimento, a não ser que o invente a má-fé.

Não obstante, ainda que na etapa preliminar da incorporação tivessem sido discriminados os lotes como se fossem unidades autônomas, RESTARIA POR SATISFAZER A ETAPA CONCLUSIVA, cuja condição sine qua nom estabelecida no Art. 7°, exigia a inscrição obrigatória no Registro de Imóveis da constituição, dela constando a individualização e a discriminação efetiva de cada unidade, O QUE NÃO

FOI FEITO E NUNCA EXISTIU .

Segue, que

SE A NORMA CONSAGRA A OBSERVAÇÃO DE DUAS ETAPAS DISTINTAS, NÃO SE PODE ADMITIR QUE ESTEJA SATISFEITA COM O CUMPRIMENTO DE SOMENTE UMA .

O comando da norma provém de uma unidade logicamente integrada, e, tal como um automóvel, se privado de algum elemento fundamental, como roda, freio, volante ou motor, não cumpre sua finalidade.

CONCLUI-SE QUE:

Mesmo sob a hipótese absurda de se admitir aplicável a Lei 4591/64,

A NORMA COGENTE FICOU POR CUMPRIR-SE.

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E, mesmo que a unanimidade dos proprietários de lotes das glebas quisessem constituí-las em condomínio não poderiam fazê-lo sobre próprios municipais.

Sem dúvida, só a perspectiva de vantagem pode explicar terem os incorporadores abandonado a formalidade já instalada, bem como a tentativa de reverte-la, para prosseguirem vendendo terrenos sem cumprir as exigências obrigatórias contidas na legislação.

Propaganda de lançamento de Loteamento da Granja Comary, publicada em página inteira do Teresópolis-Jornal de 31.01.1970 (Doc. 05 – fls. 71/72), referindo-se somente à venda de terrenos, com oferta de vantagens, prova, incontestavelmente, o afirmado acima.

ACONTECEU, SIMPLESMENTE, A VENDA DE TERRENOS EM

LOTEAMENTOS QUE FUGIRAM AOS ENCARGOS QUE IMPUNHAM A

LEGISLAÇÃO SOBRE PARCELAMENTO DO SOLO.

Por conseguinte, se houve com competência e responsabilidade a Senhora Oficiala do Registro de Imóveis da 1ª Circunscrição da Comarca de Teresópolis quando, ao perceber erro no assentamento, requereu ao Juízo Corregedor o cancelamento dos registros em tela que atendiam à fase de incorporação e não a de constituição de condomínio.

É, POIS, DE SE NOTAR QUE ASENTENÇA (DOC.1)

PROLATADA PELO EMINENTE JUIZ DE DIREITO DOUTOR

CARLOS OTÁVIO TEIXEIRA LEITE CANCELANDO OS

REGISTROS ALUSIVOS AO REFERIDO CONDOMÍNIO, É UMA

PEÇA DECLARATÓRIA, ESSENCIALMENTE CONSTITUTIVA, E, DIGA-SE ESSENCIALMENTE POR QUE O ATO QUE A ENSEJOU

NÃO COLIMAVA OUTRO OBJETO SENÃO RESTABELECER

CONSTITUIÇÃO, PRODUZINDO EFEITOS EX NUNC.

Sabido é, não sem exceções, que a sentença produz coisa julgada para as partes entre as quais é dada, e não em relação a terceiros (CPC/art.472), todavia, ensina o eminente professor Moacyr Amaral Santos, que por doutrina tradicional, nas causas relativas ao estado das pessoas, as sentenças desde que proferidas entre legítimos contendores, têm eficácia erga omnes e, portanto, a coisa julgada atinge terceiros, não bastasse, no caso, encontrarem-se os terceiros, proprietários no suposto condomínio, em situação de partes, por efeito de serem atingidos pela coisa julgada.

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LOGO, DE TODO O EXPOSTO, NÃO BASTASSE A NATUREZA CONSTITUTIVA DA COISA JULGADA, QUEDOU DEMONSTRADA

A PRESENÇA DE VÍCIO INSANÁVEL NA PRETENSA CONSTITUIÇÃO DE CONDOMÍNIO, EM FACE DA OMISSÃO DA

INSCRIÇÃO OBRIGATÓRIA NO REGISTRO DE IMÓVEIS CONTENDO A DISCRIMINAÇÃO DAS UNIDADES AUTÔNOMAS.

Isto posto, sem distorcer a verdade, desfigurar provas e deturpar processos, não se pode admitir a legitimidade desses condomínios.

Por outro lado, as regras da legislação federal que dispõem sobre o parcelamento do solo urbano são imperativas, de tal sorte que não podem ser derrogadas pela só vontade das partes no negócio imobiliário.

DE SE REGISTRAR, POIS, QUE O EMPREENDIMENTO DA GRANJA

COMARY PROCEDE DE FRAUDE À LEI, quando, em dado momento, furtou-se a um só tempo do cumprimento da Lei 4591 de 16/12/64 referente a constituição de condomínio e da legislação que disciplinava o parcelamento do solo urbano, na época, em especial, o Decreto-Lei nº 58 de 10/12/1937 e o Decreto nº 3079 de 15/09/1938 que evoluíram para a Lei 6.766/79.

Na prática, realizou-se verdadeiro loteamento, em gleba de grande dimensão, com inovação do sistema viário e venda de lotes de terreno a terceiros, tudo à margem da lei, e não sem uma ponderável razão, qual seja — cumprir o Decreto-Lei nº 58/37, significaria submeter-se ao Código Florestal (Lei n.º 4771 de 15/09/65), trazido ao Art. 1º, § 1º daquele Decreto, o que implicaria em expressiva redução da área loteada, posto que, em se tratando de floresta da mata atlântica, teria que comprometer parte de sua superfície para abrigar áreas de preservação permanente, concernentes às nascentes, às margens dos cursos d’ água, aos reservatórios naturais ou artificiais e ao topo das elevações.

EIS QUE, MAXIMIZAR GANHOS DEVE TER SIDO SUBSTANCIAL APELO PARA FRAUDAR A LEGISLAÇÃO

SOBRE PARCELAMENTO DO SOLO.

Assim, temos um caso a se ajustar plenamente no v. Acórdão prolatado pelo Colendo Conselho Superior da Magistratura, quando no julgamento da reconhecida Apelação Cível nº 72.365.0/7-00, da comarca de Atibaia, ressaltou verificar-se, reiteradamente,

“a utilização de expediente aparentemente lícito, qual seja o condomínio tradicional, previsto no código civil, com a alienação de partes ideais não localizadas e sem identificação

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no título, para burla da legislação cogente que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano (...)”, alterando-se “(...) De forma deliberada uma situação de fato para escapar à incidência da norma” e dos deveres desta decorrentes.”

E mais, como salienta o Doutor Francisco Eduardo Loureiro, Juiz de Direito Auxiliar da Corregedoria, no Processo CG 1.536/96 (776/96):

“O que não se admite é a implantação de tais loteamentos sob o rótulo de "condomínios especiais", em manifesta fraude à Lei do Parcelamento do Solo. Não há previsão em nosso direito positivo, de um tertum genus entre "loteamento fechado" e "condomínio deitado". Não se admite que, ao sabor dos interesses do momento, crie-se uma figura jurídica híbrida de loteamento e condomínio, aplicando, tão-só, a parte de cada lei que atenda à conveniência do empreendedor (Cf. parecer do Juiz Kioitsi Chicuta, in Decisões Administrativas da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, ano de 1989, verbete 78)”.

Na boa lição de José Afonso da Silva, que bem se ajusta ao caso concreto

"vale dizer, tais ‘loteamentos fechados’ juridicamente não existem: não há legislação que os ampare, constituem uma distorção e uma deformação de duas instituições jurídicas: do aproveitamento condominial do espaço e do loteamento ou do desmembramento. É mais uma técnica de especulação imobiliária, sem as limitações, as obrigações e os ônus que o Direito urbanístico impõe aos arruadores e loteadores do solo" (Direito urbanístico brasileiro, 2.ed., Malheiros, p.313-4).

Admitir o registro do loteamento como se condomínio fosse significaria aniquilar a Lei do Parcelamento do Solo Urbano. Não mais haveria controle urbanístico e ver-se-ia privada a Municipalidade de expressivo espaço público. A médio prazo, estaria comprometido o próprio sistema viário, uma vez que as cidades estariam totalmente tomadas e cercadas por grandes "guetos" privados.

Some-se à burla da legislação federal, o escancarado desacato ao Dec. Municipal N.º 7/69 transformando a Granja Comary no Bairro Carlos Guinle e ao Dec. Municipal N.º 286/75 nomeando logradouros públicos do Bairro Carlos Guinle ( Doc. 06 – fls.73/74 e Doc. 07 – fls. 75/80), que revela o animus furandi de proprietários que se acreditam imunes e acima da Lei.

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4. DO PRIMADO DA LEI

"Se a força das coisas diferencia a habitação rica da

habitação modesta, não se tem o direito de transgredir regras, que deveriam ser sagradas, reservando-se só aos favorecidos pela fortuna o benefício das condições necessárias a uma vida sã e ordenada. É preciso possibilitar, por uma legislação implacável, uma certa qualidade de bem-estar a cada um, independentemente da questão de dinheiro. É preciso interditar para sempre, por uma estrita regulamentação urbana, que famílias inteiras sejam privadas de luz, de ar e de espaço."

Le Corbusier

Assim, calçados em decisões judiciais viciadas, produto de despreparo ou de animus abutendi, contrariando cinicamente disposições reguladoras federais e municipais, os usurpadores agem impunemente, permitindo-se à celebração e à execução de negócios jurídicos diversos, garantidos pela omissão e improbidade de autoridades que têm por ofício o dever de proteger o cidadão e o patrimônio público.

Portanto, não é demais repetir que pelo mesmo motivo por que não se admite o comércio informal, não se pode admitir o condomínio de fato, a farmácia de fato, o tribunal de fato, a milícia de fato, sob pena de se estar, em tempo, prestando vassalagem a um estado paralelo inclinado ao crime.

E, no tocante, vale ainda destacar com inteira propriedade que

" O uso irregular não pode ser fonte de direito e não configura direito adquirido" ( RT 516/59, 1978 e 526/84, 1979 ), o que, aliás, é muito óbvio, admitir o oposto, levar-nos-ia à pior das selvas.

Por outro lado, não se pense de boa fé ou motivado por interesses lícitos, o empenho de alguns para consolidar este Quasímodo jurídico ao qual não socorre a decência da personagem.

A tese de que tais condomínios atenderiam a um imperativo de segurança, carece de sentido prático. Hoje em dia, diante das limitações que afetam os serviços de segurança pública e da crescente competência da criminalidade, não se pode apelar para tais fórmulas de espaço seguro, pois, como já é de notícia, não o são os quartéis militares, as delegacias de polícia, nem os cofres do Banco Central.

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O propósito dos usurpadores é o de auferir vantagem econômica, na esteira das campanhas publicitárias que transformaram o condomínio fechado num sonho de consumo. Morar em um deles confere prestígio, alimenta vaidades, dá status.

No caso em pauta, esta atmosfera agrega valor econômico às propriedades situadas neste artificial arranjo, enquanto seja mantida a aparência de condomínio fechado, posto que, fatores psicológicos e inclinações sociais são componentes importantes na formação de preços de mercado.

A abusiva situação instalada permite que, absurdamente, toda a publicidade com apelo turístico, incluída a oficial, corra na contra mão, oferecendo como atração o visual do lago Comary, indisponível porque foi afanado e vedado o acesso aos de fora, caracterizando propaganda enganosa como informa o Doc. 04 – fls. 69/70. E, não se poderá estranhar, quando o turista internacional indagar: Que país é esse?

Em resumo, tem-se que o estado negligente, permissivo, pouco civilizado, consente que se instale dois padrões extremos de clandestinidade que refletem desordem urbana e social. São os guetos da modernidade – redutos de pobreza que reúnem em maioria pobres, desfavorecidos, indefesos, e alguns infratores caso típico das favelas e, redutos de riqueza, que reúnem ricos, poderosos, protegidos do sistema e também alguns infratores, caso desses condomínios e de outros espaços discretamente mantidos País afora.

Diante desse histórico de contradições judiciais permitindo que prosperassem esses falsos condomínios, sobra espaço para que se suspeite de programada orquestração para frustrar iniciativas que comprometam tal situação estabelecida à margem da lei.

Não se pode, também, deixar de registrar a ausência ou a indiferença dos Ministérios Públicos Federal e Estadual, desamparando e permitindo o massacre covarde de quantos se insurgiram contra este desavergonhado processo de espoliação.

É dizer, além da improbidade esboçada na vertente levantada, não se pode afastar hipóteses de outras feições e de crimes como falsidade ideológica, estelionato, lavagem de dinheiro e formação de bando em conluio de forças locais, ao qual não faltam as administradoras de condomínio, travestidas em firmas de processamento, todos, violando princípios constitucionais e direitos da cidadania com o objetivo de se locupletarem às custas da usurpação de privilegiados espaços municipais de reconhecido valor paisagístico, turístico e ambiental.

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5. DA RESTAURAÇÃO DA ORDEM JURÍDICA

“Melhor será que a sentença não erre. Mas, se cair em erro, o pior é que se não corrija. E, se o próprio autor do erro o remediar, tanto melhor; porque tanto mais cresce, com a confissão, em crédito de justo, o magistrado, e tanto mais se soleniza a reparação dada ao ofendido.”

Rui Barbosa

Em face da situação instalada, sobressai absurdo dos absurdos, qual seja – ver-se o cidadão consciente compelido pelo próprio Judiciário a manter-se associado a deslavado bando de piratas, tendo sua dignidade ofendida pela imposição de vínculo com um arranjo espúrio que seu foro íntimo reprova.

O Tribunal não pode ser inconseqüente. Registre-se, também, a interferência do Judiciário no Executivo

local que ao contrariar normas estabelecidas e dispositivos constitucionais (Art. 215 e 216) que garantem para todos os sítios de valor paisagístico, reedita na contra-mão o estado totalitário de sombrio passado.

Mais elementar que retóricos apelos à Justiça, invocamos pelo singelo retorno ao reino da sensatez, ressaltando que, se por um lado, nos contagiam e enaltecem a altivez e a competência que exibem os Ministros do Supremo Tribunal Federal nas sessões de seu templo, nossa Casa Esperança, que hoje podemos acompanhar pela televisão, por outro, nos entristecem e enchem-nos de apreensão os exemplos de arrogância, de falta de decoro e de dignidade que alguns magistrados desfilam com desenvoltura e naturalidade, pois sabemos que – se claudica o judiciário, tropeça a democracia, e, sabemos mais – pagamos as contas e temos o direito-dever de exigir prestação jurisdicional de qualidade. A coisa pública não é extensão do quintal da casa de seus servidores. Certos de que tal contexto de ilicitudes não encontrará abrigo nesta Indefectível Instância, solicitamos ao Eminente Ministro – Corregedor,

— que, como preliminar preventiva de Justiça, determine temporária suspensão dos processos em curso naquela Comarca, em que são parte os condomínios instalados em logradouros públicos do Bairro Carlos Guinle, ora identificados pelo prefixo Condomínio Comary;

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— que verificada a cabal procedência desta representação, determine a extinção destes condomínios e dos processos em que são parte, sem prejuízo do cabimento de ações regressivas reparatórias; — que determine a abertura de inquérito policial para apuração dos crimes praticados contra o patrimônio público e a ordem econômica; — que determine o saneamento do tribunal local a fim de garantir o comando constitucional e a necessária segurança jurídica aos que o buscam em defesa da cidadania e do meio ambiente.

O lema está posto, assumimos torná-lo realidade: ORDEM E PROGRESSO.

Teresópolis, 29 de agosto de 2008 BRASIL-LINK Jorge Pinto de Oliveira Manoel da Silva Pereira MCT Vidocq Casas COCIDAMA

André Luiz Rodrigues Pinto

Endereços a seguir:

Coordenação BRASIL – LINK CNPJ n.º 059.159.987/0001-66 Rua Francisco Sá 61, s.306 Ξ Teresópolis, RJ Ξ CEP 25.903-011 Tel.: 2641 6889 / 2642 4725 [email protected] Ξ www.brasil-link.org

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Apoio

MOVIMENTO CONSERVACIONISTA TERESOPOLITANO - MCT Desde 1978 – CNPJ n.º 28.449.494/0001 – 05 Rua Alfredo Rebelo Filho, 1475 – Teresópolis, RJ Tel.: (21) 2642-56557 Ξ CEP 25960-090

COMITÊ DE CIDADANIA E MEIO AMBIENTE - COCIDAMA CNPJ n.º 07.179.735/0001-73 Rua dos Passos 463, Centro – São João da Barra – RJ Tel.: (22) 98221047 / 2741-1893 Ξ CEP: 28.200-000

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APÊNDICE

FAC-SÍMILES DOS DOCUMENTOS REFERIDOS

Doc. 01 – Certidão e Sentença referentes ao Cancelamento dos Registros

alusivos à convenção dos condomínios Comary.

(fls. 26/33)

Doc. 02 -- Sentença determinando a desobstrução do acesso

ao Bairro Carlos Guinle, liberando o trânsito normal

de veículos e do povo.(Processo N.º 1994.061.016375-0)

(fls. 34/53)

Doc. 03 -- Documentos do Memorial Descritivo do Plano de Loteamento

do Jardim Comary em cumprimento do Dec. 58/37

(fls. 54/68)

Doc. 04 – Publicidade, oferecendo como atração turística o visual

indisponível do lago Comary usurpado da municipalidade.

(Jornal O GLOBO de 5/6 de julho de 2008)

(fls. 69/70)

Doc. 05 – Publicidade da venda de terrenos a prazo oferecendo

equipamento urbano do bairro como atrativo . (TERESOPOLIS –JORNAL de 31.01.1970)

(fls. 71/72)

Doc. 06 – Dec. Municipal N.º 7/69 alterando a denominação da Granja

Comary para Bairro Carlos Guinle.

(fls. 73/74)

Doc. 07 – Dec. Municipal N.º 286/75 nomeando logradouros públicos do

Bairro Carlos Guinle. (Relação parcial: folhas de continuação suprimidas referem-se a bairros

fora do escopo)

(fls. 75/80)

Doc. 08 -- Certidão do Registro do instrumento particular de contrato para

a constituição dos Condomínios Comary . (Parcial: folhas pertinentes)

(fls. 81/84)

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Doc. 01 Certidão e Sentença referentes ao Cancelamento dos Registros alusivos à convenção dos Condomínios Comary.

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Doc. 02 Sentença determinando a desobstrução do acesso ao Bairro Carlos Guinle, liberando o

trânsito normal de veículos e do povo. (Processo N.º 1994.061.016375-0)

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Doc. 03 Documentos do Memorial Descritivo do Plano de Loteamento do Jardim Comary em cumprimento do Dec. 58/37

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Doc. 04

Publicidade, oferecendo como atração turística o visual indisponível do lago Comary usurpado da municipalidade. (Jornal O GLOBO/SERRA de 5/6 de julho de 2008)

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Doc. 05 Publicidade da venda de terrenos a prazo oferecendo equipamento urbano do bairro como atrativo . (TERESOPOLIS –JORNAL de 31.01.1970).

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Doc. 06 Dec. Municipal N.º 7/69 alterando a denominação da Granja Comary para Bairro Carlos Guinle. (Fonte: Documentação da Prefeitura Municipal de Teresópolis)

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Doc. 07 Dec. Municipal N.º 286/75 nomeando logradouros públicos do Bairro Carlos Guinle (Fonte: Documentação da Prefeitura Municipal de Teresópolis)

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Doc. 08 Certidão do Registro do instrumento particular de contrato para a constituição dos Condomínios Comary .

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