repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2,...

153

Transcript of repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2,...

Page 1: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...
Page 2: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...
Page 3: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...
Page 4: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...
Page 5: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

AGRADECIMENTOS

Neste espaço dedico uma menção especial a todos aqueles que possibilitaram a

criação desta dissertação.

Em primeiro lugar, um obrigada ao professor Dr. Heitor Alvelos pela orientação.

Um obrigada aos DJs Twin Turbo (Nuno Pinto e Pedro Pinto) por possibilitarem a

minha estreia em VJing. Ao Nuno em particular, pela amizade e interesse.

À comunidade do Plano B, em específico ao Filipe Teixeira, pela oportunidade de

comparecer no espaço assim como, a todos os que participaram nos inquéritos e

presenciaram as performances.

Ao Jorge Ribeiro e ao Luís Sarmento pelo interesse e incentivo. À Ana Carvalho

pelas interlocuções sobre VJing.

À Elisabete Anastácio e à Sandra Passos, pela amizade e carinho, pelas conversas

entusiastas e partilha de grandes momentos. Ao Nuno Ferreira pela amizade e

prestabilidade.

E aos meus pais e restante família pelo carinho, compreensão e apoio sempre

presentes.

A todos, o meu sincero obrigada.

Page 6: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...
Page 7: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

RESUMO

O Vídeo Jockeying é um produto recente da cultura visual, que se processa pela

produção e manipulação de imagens vivas em ambientes performativos. O VJing

é uma expressão artística que compõe experiências sensoriais audiovisuais, nas

quais o áudio, a imagem, e o público se entrelaçam de uma forma peculiar.

Nestes últimos vinte anos, o aperfeiçoamento na arte de Vídeo Jockeying gravita

essencialmente pelo progresso tecnológico, desenhado pelo advento de novas

extensões multimédia capazes de ampliar as possibilidades de criação de imagens

e vídeos, além de ostentar alternativos formatos de apresentação e interacção.

Por ser um fenómeno novo, são notórias algumas incongruências no sucesso de

representação desta arte, pelo que, neste momento mais do que um fomento na

evolução tecnológica de VJing, é exigido um trabalho de filosofia e teoria, como

consciencialização crítica e de progresso.

Palavras-chave: Vídeo Jockey, VJing, Visuais, Música, Conceptualidade, Espaço,

Performance, Arte, Tecnologia.

Vídeo Jockeying | Resumo i

Page 8: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

ABSTRACT

Video Jockeying is a product of an existing visual culture, which demands the

production and manoeuvring of images in live performance environments. The

VJing is an artistic expression that creates audiovisual sensorial experiences in

where the audio, the image and the public intertwine in a peculiar way.

Over the past twenty years, the improvements in the art of Video Jockeying are

being done mainly by technological progress, designed by the advent of the new

multimedia extensions capable of enlarge the possibilities of creating static and

moving images, and comprise alternative formats of presentation and interaction.

As a new phenomenon, today there are some notorious inconsistencies in the

practice of this art form, and it is now needed - more than a further step in

technological evolution - a work of philosophy and theory as critical awareness

and progress.

Key Words: Video Jockey, VJing, Visuals, Music, Conceptuality, Space,

Performance, Art, Technology.

ii Vídeo Jockeying | Abstract

Page 9: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

ÍNDICE

Resumo

Abstract

Índice de Imagens

Introdução geral

a. Motivação

b. Objectivos

c. Estrutura da Dissertação

1. A Era da Imagem e do Movimento

1.1. A Projecção e o Cinematógrafo

1.3. Color Music & Visual Music

1.4. Cinema Experimental

1.4. Videoarte

1.5. A Musica Electrónica e a Evolução Digital

1.6. Vídeo e Performance em Portugal

2. Uma Nova Expressão: O VJing

2.1. Performance Visual

2.1.1. Caracterização do VJ

2.1.2. Performances Visuais e Tecnologias

2.2. Cultura ou Subcultura?

2.2.1. Idiossincrasias da Cultura Digital

2.2.2. Práticas de Recombinação

2.2.3. Contextualização no Ambiente: o Clube

3. VJing: Desconstrução e Análise Qualitativa.

3.1. VJing e Música

3.1.1. A Imagem

3.1.2. O Som

3.1.3. Imagem e Música: Convergências

3.1.4. Sinestesia em VJing

3.2. VJing e Conceptualidade

3.2.1. Figurativo versus Abstracto

3.2.2. A Montagem

3.2.2.1. Loop, Sampling e Remix

3.2.2.2. Teoria da Montagem

i

ii

v

1

3

4

5

7

8

11

13

15

17

19

23

24

25

27

30

30

33

37

41

44

45

48

51

55

58

59

61

62

63

Page 10: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

3.2.3. Composição da Imagem

3.2.3.1. Semiótica

3.2.3.2. Cores

3.2.3.3. Efeitos Visuais

3.2.4. Mensagem e Sensação

3.3. VJing e Espaço

3.3.1. Caracterização do Espaço em VJing

3.3.1.1. Espaço Físico

3.3.1.2. Espaço Digital

3.3.1.3. Espaço de Projecção

3.3.1.4. Espaço de Performance

3.3.1.5. Espaço Luz e Som

3.3.1.6. Espaço Imersivo

3.3.2. Projecção Espacial e Validade sensorial

3.4. VJing e Performance

3.4.1. Performer e Audiência

3.4.2. Intensidade na Construção Audiovisual

3.4.3. Tecnologias e Interactividade

4. VJing: Potências

4.1. Quadros Relacionais e Hierarquias

4.2. VJing e Arte

5. VJing: Perspectiva Prática

5.1. Performances

5.2. Reflexão Sobre os Resultados

6. Conclusões

6.1. Conclusão Geral

6.2. Novas Direcções Criativas

7. Bibliografia

8. Glossário

9. Anexos

68

68

70

73

75

78

79

79

80

81

82

82

83

85

87

88

90

92

97

97

100

103

106

110

111

111

113

115

121

129

Page 11: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

ÍNDICE DE IMAGENS

Img.1. Lanterna Mágica, 1671, da Ars Magna Lucis et Umbrae, por Jesuit Athanasius Kircher

[http://www.fulltable.com/VTS/i/imsc/ak/34.jpg]

Img.2. Phantasmagoria 1798, por Etienne-Gaspard Robertson

[http://education.eastmanhouse.org/discover/kits/images/3/EDDK00010051.jpg]

Img.3. Cinematógrafo por Auguste e Louis Lumière em 1985

[http://telao.zip.net/images/cinematografo.jpg]

Img.4. Interior do teatro nickelodeon in Pittsburg. The Moving Picture World, 30, 1907, p. 629.

[http://z.about.com/d/inventors/1/0/d/S/nickelin.jpg]

Img.5. Color-Organ, 1983, associação de cores de Alexander Rimington

[http://www.paradise2012.com/visualMusic/musima/]

Img.6. Imagem do filme em 35 mm Circles, 1933, por Oskar Fischinger's

[http://www.tate.org.uk/images/cms/12612w_fishchinger_circles.jpg]

Img.7. Lumia com o Clavilux por Thomas Wilfred

[http://pr.caltech.edu/periodicals/CaltechNews/articles/v39/lumia4.jpg]

Img.8."Composition VII", 1913, Wassily Kandinsky

[http://www.gis.net/~scatt/clavilux/clavilux.html]

[http://www.glyphs.com/art/kandinsky/comp7640.jpg]

Img.9. Berlin, Symphony of a City, 1927 de Walter Ruttman

[http://www.denge.co.uk/images/20080901231012_andalou.jpg]

Img.10. Un Chien Andalou, 1929, de Luis Buñuel e Salvador Dalí

[http://www.mdln.hws.edu/german/moderne/berlin.jpg]

Img.11 Nam June Paik, TV Cello (1971), with Charlotte Moorman

[http://meganmcmillan.typepad.com/photos/uncategorized/nam_june_paik.jpg]

Img.12. Megatron/Matrix (1995) Vídeo Instalação, com 215 monitores. Nam June Paik

[http://www.paikstudios.com/gallery/4.html]

Img.13. Illuminations 1.1., Marius Watz, Club Transmediale 2008

[http://workshop.evolutionzone.com/tag/visuals/]

Img.14. Edirol V-8 Vídeo Mixer

[http://proaudio.com.es/wp-content/uploads/2009/02/edirolv8f.jpg]

Img.15. Resolume 2.4. VJ Software Interface

[http://i18.tinypic.com/8c01929.jpg]

Img.16. Max/Msp Software Interface

[http://www.arquitetura-interativa.com/4dfuture/images/4d_ames4_800.jpg]

Img.17. A Fonte, 1917, Ready-made de Marcel Duchamp

[http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Fontaine_Duchamp.jpg]

Img.18. Licença Creative Commons icones

[http://msugrads.wikispaces.com/file/view/CreativeCommonsIcons.jpg]

Img.19. Prisma Óptico

[http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Dispersion_prism.jpg]

9

9

9

10

11

12

12

13

14

14

15

16

25

27

28

39

33

36

46

Vídeo Jockeying | Índice de Imagens v

Page 12: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.20. Ritmos musicais e visuais numa possibilidade sinestésica de “ver” a música

Img.21. Granular Synthesis, “Pole”, 1998

[http://www.mediaartnet.org/works/pol/]

Img.22. Festival Corps Urbain, les Brigittines, 2008, Illan Katin.

[http://www.flickr.com/photos/23933237@N05/3086833558/]

Img.23. Planos da Experiência do Efeito Kuleshov, por Lev Kuleshov (1899 – 1970)

[http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/1a/Kuleshov.jpg]

Img.24. Síntese Aditiva RGB

[http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Synthese%2B.svg]

Img.25. Diagrama cores frias e cores quentes

[http://br.geocities.com/sessa_wq_a_cor/images/recurs8.jpg]

Img.26. Círculo cromático de Ostwald, determinação de pares harmónicos

[http://www.univ-ab.pt/~bidarra/hyperscapes/video-grafias-215.htm]

Img.27. Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art)

[http://www.masterworksfineart.com/inventory/vasarely/#295]

Img.28. Possível configuração espacial em VJing.

Img.29. The Special Player, instalação interactiva, festival Transmediale Berlin 2008

[http://www.02l.net/projects/interactive_set/the_special_player]

Img.30. Alexander Rishaug & Marius Watz – concerto no Ballhaus Naunynstrasse (GE) 2008.

[http://www.flickr.com/photos/watz/2247544732/]

Img.31. Configuração Espacial: Plano B (Porto) – Sala Cubo

Img.32. Potências: Quadro Relacional Primário

Img.33. Potências: Quadro Relacional Completar

Img.34. Potências: Quadro Relacional Variáveis Externas

Img.35. Potências: Quadro Relacional Global

Img.36. Perspectiva Prática – Performance set 1 exemplo 1

Img.37. Perspectiva Prática – Performance set 1 exemplo 2

Img.38. Perspectiva Prática – Performance set 2 exemplo 1

Img.39. Perspectiva Prática – Performance set 2 exemplo 2

Img.40. Perspectiva Prática – Performance set 3 exemplo 1

Img.41. Perspectiva Prática – Performance set 3 exemplo 2

Img.42. Perspectiva Prática – Performance set 4 exemplo 1

Img.43. Perspectiva Prática – Performance set 4 exemplo 2

Img.44. Perspectiva Prática – Performance set 5 exemplo 1

Img.45. Perspectiva Prática – Performance set 5 exemplo 2

Img.46. Perspectiva Prática – Performance set 6 exemplo 1

Img.47. Perspectiva Prática – Performance set 6 exemplo 2

Img.48. The Light Surgeons, True Fictions no The Big Chill Festival, Reading, 2008

[http://lightsurgeons.com/2008/07/30/true-fictions-on-tour/]

56

60

61

64

70

71

72

74

78

94

96

98

98

99

100

106

107

107

107

107

108

108

108

108

109

109

109

109

114

vi Vídeo Jockeying | Índice de Imagens

Page 13: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VIDEO JOCKEYING |INTRODUÇÃO GERAL

Vivemos numa sociedade reafirmada digitalmente. Como efeito desta existência,

nascem fenómenos híbridos presentes diante de uma imensa sensação de que

‘tudo é possível’, interpondo, neste caso, o mundo da arte. As novas tecnologias e

o idealismo da cultura digital ampliam continuamente as possibilidades criativas e

ao mesmo tempo, reformulam os impactos visuais. Na indispensabilidade de se

diversificar formas de expressão, o universo do audiovisual tem apresentado um

fenómeno cada vez mais proeminente na cultura popular: o Vídeo Jockeying, ou

VJing, o qual é ostentado pelo VJ. VJing é uma mescla de acções que constroem

uma performance visual. Esta é arquitectada por um conjunto de vídeos que se

manipulam ao vivo, em eventos compartilhados por um DJ ou banda musical,

oferecendo assim, em contíguo, um espectáculo audiovisual. VJing é um trabalho

de criação imagética, envolvendo comummente outras disciplinas para além da

performance, como design de imagem, tecnologia e engenharia. VJing é baseado

em tempo e partilha um certo número de códigos com os do cinema tradicional,

por outra via, é descrito como radical no sentido em que permite a síntese de

elementos que são anteriormente distintos. Vídeo Jockeying baseia-se assim num

comportamento e numa experiência pós-cinemática, conjugando uma relação

entre a projecção e a imagem, como uma actividade de díspares elementos, tais

como ritmo, formas, estrutura e referências, observando a sua concretização.

Introdução Geral 1

Page 14: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Este fenómeno, a nível comportamental, procura oferecer experiências únicas

sensoriais, desenhadas por estímulos imagéticos, através de técnicas exclusivas a

um momento performativo. Por outro lado, a nível contextual, VJing possui um

papel sociocultural, o que demanda o seu enquadramento perante o mundo do

vídeo, da arte e da música. Neste ponto, pode falar-se de uma arte emergente,

mas que, por outra perspectiva nem sempre é definida como tal. Isto acontece

por se construir exterior aos valores espaciais de evidência dado pelas galerias ou

outros lugares na qual a presença artística é notada, e prefere assim, enquadrar-

se em contextos da cultura popular, num 'pseudo-entretenimento'. Mas certo é

que, VJing como fenómeno funciona bem neste enquadramento, possibilitando a

aquisição e crítica dos fenómenos artísticos. Como Timohty Jaeger [1] descreve, o

Vídeo Jockeying é “uma ‘forma de arte total’ que engloba música/som, imagens,

e instalação. Inspira-se a partir de uma linhagem fundada pelos construtivistas

russos em não ser uma forma de arte 'pura', mas uma que tem uma clara função

social.” (Jaeger, Timothy; VJ: Live Cinema Unreveled, 2005, p. 4)

A arte tem uma função social como um catalisador, mas muitas vezes elementos

díspares são considerados em separado. VJing emerge como uma alternativa à

esfera tradicional da arte porque combina diferentes elementos como conteúdo

artístico, performance, instalação e ambiente festivo, tudo num só volume. Ainda

assim, é difícil para as empresas e corporações compreenderem este desafio para

o modelo tradicional da arte, que se baseia em design ou consultas com designers

e outros criativos, ensaios, amostras, maquetas, resultando, por fim num produto

acabado. Contudo, pertence ao VJ o completo controlo de modificar e criar ao

vivo os mais exclusivos e diversos conteúdos.

VJing é algo activo, envolve acção e resposta a estímulos visuais. Baseia-se em

imagens, ritmo, técnica e software para formar uma nova 'linguagem'. Para além

disso, é um fenómeno social, e esta é uma variável mutável. Neste contexto, é

imprescindível uma análise para se compreender quais as potencialidades desta

expressão. VJing forja a potencial obsolescência de um certo número de campos,

e esses campos são o que o definem, que o erigem, que o potenciam ou aviltam,

dependendo da sua orquestração. Posto isto, nesta dissertação, incita-se essa

consciencialização crítica perante esta forma expressiva, para que se encontre

validade na sua execução.

[1] Timothy Jaegar: (US),

Criativo Multidisciplinar/

Director/ Developer;

BFA Syracuse University em

Video e Media Studies; MFA

UC San Diego;

Desenvolve trabalhos com

vídeo, motion graphics e

performances audiovisuais.

2 Introdução Geral

Page 15: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

a) MOTIVAÇÃO

Perante a definição do papel prático do VJ como uma forma expressiva que se

especula pela composição de experiências sensoriais conforme um conglutinado

produto audiovisual, observam-se algumas incongruências que interferem no

sucesso de representação do VJing. Considerando-se uma delimitação lógica, a

controvérsia centra-se na subvalorização presente desta forma expressiva, em

particular do papel do VJ na construção de ambiências e mensagens sensoriais,

reforçado pela sua contextualização espacio-cultural, e sobretudo vincada pelo

desconhecimento dos seus potenciais artísticos e interventivos. Sendo assim, e

defendendo a prática de VJing como uma prática artística, procura-se responder

a um conjunto de variáveis que o definem e que lhe são indissociáveis.

As comunidades de Vídeo Jockeying proliferam mas continua a evidenciar-se uma

lenta aceitação e valorização perante os cenários onde actuam, quer pela cultura

popular onde ainda são confundidos com os DJs, como pela comunidade artística.

Além disso, existe uma tendência social em oferecer uma valorização exacerbada

a qualquer evento com uma produção imperante tecnologicamente, isso faz com

que os espectáculos visuais se consagrem mais pela dimensão e cada vez menos

pela conceptualidade.

A investigação demanda portanto, um desenvolvimento crítico, abrangente e

incisivo, nas questões relacionadas com o vídeo como intervenção/performance,

no conceito aplicado de VJing. Procura-se aqui, articular um conjunto de focos

inter-relacionais que caracterizam, aprovam e desaprovam a amplitude do VJ na

construção de ambiências espacio-temporais.

A problemática em si, gravita assim pela dúbia funcionalidade presente de VJing

como parte notória, integrante e interventiva nos espaços e eventos propícios à

sua expressão. Aceitando como certa esta dispensabilidade, a ênfase assumida

perante este desenvolvimento crítico, inicia-se numa contextualização histórica,

seguido por uma definição e enquadramento social, passando pela desconstrução

e análise de uma proposta de variáveis que se aglutinam na construção de VJing,

oferecendo portanto, uma possibilidade de se assegurar um papel potenciador de

uma arte atraente, consciente, controlada, estimulante, funcional e coerente. Em

suma, a abordagem centra-se num desenvolvimento crítico e uma tomada de

consciência das diversas disciplinas que VJing comporta, para que de tal forma se

eleve o seu estatuto presencial no mundo cultural e artístico.

Introdução Geral | Motivação 3

Page 16: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

b) OBJECTIVOS

A imagem digital, com os seus níveis de iconicidade, é o reflexo de uma sociedade

actual imersa em tecnologia. Dentro de um contexto cultural multidisciplinar, as

performances com imagética e sons, fazem parte de uma extensão comunicativa

e artística. Vídeo Jockeying são imagens que se constroem, que alcançam sentido

numa acção ao vivo e em tempo real. Existe pois, um potencial artístico e criativo

por de trás destes acontecimentos performativos efémeros, contudo é necessário

descobrir em que estrutura se constroem e qual é o grau de solidificação que

possuem. O que se encontra, todavia, é a subsistência de uma errada gestão de

potências por parte de alguns artistas performativos e de uma incerta anuência

pela arte e cultura. Posto isto, perante a análise de problemáticas que se podem

apresentar, o objectivo primordial de todo o desenvolvimento da dissertação,

baseia-se na construção de uma nova postura do VJing, de carácter consciente,

controlado e potencializado. Para tal, processa-se à sua desconstrução, pela

apresentação de um misto de correlações, em especial VJing e Música, VJing e

Conceptualidade, VJing e Espaço e VJing e Performance. Através de uma análise

dos dissemelhantes factores que as caracterizam, e respectivas inter-relações, a

dissertação debruça-se por uma exploração crítica e aprofundada sobre esta

temática, para que após a exploração destes factores seja possível criar em bases

sólidas, um conjunto de soluções coerentes que visam maximizar a presença

artística e cultural de VJing. Sumariamente, os objectivos baseiam-se em:

Avaliar o conceito (qual o interesse) e prática (como se estrutura) do Vídeo

Jockeying;

Compreender qual o papel do VJ na concepção de mundos complementares

e/ou independentes do impulso musical;

Compreender o potencial criativo da imagética por um processo conceptual;

Compreender como o espaço interfere na dinâmica da construção visual;

Compreender o diálogo entre audiência e o artista performativo na sintaxe da

obra com potencial artístico;

Interpretar a coexistência das variáveis correlatas, para que o somatório das

partes consagre o todo;

Obter sentido crítico sobre a acção da imagem perante a era digital, pelos

conceitos de apropriação, efemeridade e ready-made;

Compreender o processo de integração desta forma expressiva no contexto

da cultura e arte, através da identificação e reafirmação das suas potências.

Evoluir na aprendizagem do conceito de VJing, apresentando uma base sólida

de conhecimento coerente como potencial evolutivo na esfera das artes.

4 Introdução Geral | Objectivos

Page 17: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

No entanto, a investigação adoptou-se no sentido de ser um trabalho relevante e

sistemático, na tentativa de descobrir, interpretar, rever factos, eventos, compor-

tamentos e teorias que poderão ser mais ou menos exequíveis. Este coleccionar

de informação talvez não viva sem a necessidade de a experienciar, e por tal, a

questão prática é conjuntamente pertinente na sua definição. Atendendo assim à

versatilidade do tema, alguns dados explorados e testados ao longo do percurso

da tese foram importados para duas experiências práticas realizadas, cujo intuito

se baseia em determinar um conjunto de valores compreendidos. A dissertação

procura assim, uma função crítica e apelativa para a comunidade de VJs, para que

se ofereça um renovado estatuto ao VJ ou se reforce um preexistente.

c) ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO

A dissertação foi construída baseando-se num fluxo lógico de abordagens. Assim,

os capítulos que se apresentam nesta dissertação reflectem as fases do processo

metodológico consecutivo, com o objectivo de sistematizar toda a informação

recolhida e processada. A divisão desses capítulos processa-se por um aglomerar

de informações verosímeis, que se entrelaçam frequentemente no dissecar desta

temática de VJing. Sendo assim, existe uma divisão em seis partes fundamentais,

dentro dos quais coabitam capítulos e subcapítulos. Esta divisão inicia-se por uma

contextualização histórica, passando por uma definição de VJing e integração no

contexto cultural, sucedendo-se uma análise abrangente sobre um conjunto de

variáveis que compõem esta temática. Seguidamente vai-se de encontro com um

procedimento onde se faz uma inter-relação dessas variáveis na procura das suas

potências. Apresenta-se depois uma perspectiva prática e por fim chega-se às

conclusões onde se constrói o somatório da aprendizagem e se enquadra o tema

nas novas possibilidades de abordagem. De uma forma mais esquematizada,

apresenta-se a seguinte ordem estrutural:

Primeiro capítulo – A Era da Imagem e do Movimento – Trata da contextualização

no tempo e espaço cultural, focando-se na relação histórica de VJing com o inicio

das imagem em movimento. Contextualiza as primeiras experiências entre som e

imagem, como a color music, visual music e o cinema experimental. Aborda ainda

a videoarte, a música electrónica e evolução digital e uma contextualização breve

do vídeo e performance em Portugal.

Segundo capítulo – A Apresentação De Uma Nova Expressão: Os VJing – Define

conceitos sobre a função do VJ como prática e suas necessidades, objectivos e

Introdução Geral | Estrutura da Dissertação 5

Page 18: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

tecnologias. Procura uma contextualização no ambiente e cultura digital, e foca-

se nas idiossincrasias da mesma, passando por práticas de recombinação (remix),

e a inserção na cultura dos clubes.

Terceiro capítulo - VJing: Desconstrução e Análise Qualitativa – Opera a função de

desconstrução da prática de VJing em quatro variáveis fundamentais: Música,

Conceptualidade, Espaço e Performance. Esta desconstrução exige uma análise

abrangente sobre cada uma das variáveis. VJing e Música caracteriza a imagem e

o som, e respectivas correspondências, potenciando seguidamente processos

sinestésicos. VJing e Conceptualidade, trata da distinção entre imagem figurativa

e abstracta, de considerações teóricas sobre a montagem em vídeo, seguindo

pela composição da imagem, no seu grau semiótico, de cores e efeitos visuais,

terminando num sentido crítico sobre mensagens e sensações. VJing e Espaço

procede à caracterização dos diferentes espaços que criam todo o ambiente de

VJing, abordando de seguida a relação da projecção espacial e validade sensorial

como espaço imersivo. Por fim em VJing e Performance, trata da relação entre

audiência e performance no evento ao vivo e em tempo real, procurando depois

abordar a intensidade na construção visual, e dissecar sobre as tecnologias e as

construções interactivas.

Quarto capítulo – Potências – procede à inter-relação entre as quatro variáveis

anteriores: música, conceptualidade, espaço e performance. Resulta na análise

de distintos quadros relacionais: primários, complementares, externos e globais.

Refere hierarquias e potências de VJing como arte.

Quinto capítulo – Perspectiva Prática – refere as experiencias práticas de VJing

realizadas, escolha estrutural e reflexão sobre resultados.

Sexto capítulo – Conclusões – menciona as principais críticas anteriores e sugere

novas direcções criativas, como o Open Jam e o Vídeo Band.

6 Introdução Geral | Estrutura da Dissertação

Page 19: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |1. A ERA DA IMAGEM E DO MOVIMENTO

Existe um paradigma histórico que associa projecções de vídeo contemporâneas

em clubes com concertos do século XIX e concertos performativos da década de

1960, entre outras manifestações artísticas. Esta aproximação epistemológica é

definida tanto pelo apelo não narrativo dos trabalhos audiovisuais ao vivo, assim

como pelas circunstâncias de exibição de uma performance de Vídeo Jockeying,

na qual a mensagem é gerada, editada e composta em tempo-real, sendo esta a

estratégia tradicional que associa imagética a apresentações musicais ao vivo. A

verdade é que, a origem das performances visuais, está inerente à presença das

primeiras considerações de tecnologia e performance. Logo, para se enquadrar

historicamente o VJing é necessário perceber as diferentes experiencias na era da

imagem em movimento. Por ser uma forma de expressão ainda algo embrionária,

o delineamento da sua origem diverge consoante a focalização pretendida por

cada autor. Contudo, de uma forma geral, é possível considerar alguns momentos

contundentes, apreciados cronologicamente: as primeiras experiências em

projecção até ao cinematógrafo, posteriormente os conceitos de color music e de

visual music, o cinema experimental, a videoarte, os desenvolvimentos na música

electrónica e o pulsar da era digital.

A imagem como registo visual sempre foi um tema indicativo para o Ser Humano,

já evidente nos primórdios desenhos das cavernas. Após a tomada de consciência

por Platão (428/27 – 347 a.C.) que teorizou a existência de dois tipos de imagem

A Era da Imagem e do Movimento 7

Page 20: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

uma objectiva, detectada pelos nossos sentidos da consciência, e uma outra

subjectiva, sobrevinda de uma ideia, de um pensamento, registar uma realidade

objectiva por uma perspectiva subjectiva começou a ser um desafio. Na verdade,

desde cedo que o homem se interessa pela imagem e as suas potencialidades,

sempre foi um acto natural procurar o registo puro e simples dos acontecimentos

à sua volta. Quando as experiências com imagens em movimento se começaram

a despoletar, registar e comunicar o mundo atingiu uma nova dimensão, a qual

suscitou o nascer de novas formas criativas que se principiaram a proliferar

multidisciplinarmente.

Neste progresso temporal, as performances visuais marcam agora presença nas

actividades contemporâneas, e são vincadas por uma influência comunicativa e

criativa que se aponta proeminente. Na última década o conceito e filosofia do

Vídeo Jockeying além de se ter convertido como parte integrante da cultura de

entretenimento, volveu-se conjuntamente num laboratório para a exploração de

conceitos e estéticas relacionadas com a comunicação visual.

VJing como arte depende de como a experiência é vivida, portanto, para se poder

enquadrar todos os seus possíveis potencias artísticos, demanda-se uma viagem

pela era da imagem em movimento na descoberta da necessidade expressiva que

o homem, como criador, desenvolveu em diferentes disciplinas que facultaram o

insurgir desta prática.

1.1. A PROJECÇÃO E O CINEMATÓGRAFO

As práticas performativas visuais baseiam-se numa projecção para uma audiência

e em imagens em movimento. Logo, as primeiras conquistas nestas matérias são

as pioneiras da expressividade do contemporâneo VJing. Diferentes formas de

projectar imagens têm sido utilizadas ao longo dos séculos. Inicialmente o sol era

o projector, criando sombras sobre o chão numa situação natural e ao vivo. Mais

tarde foi o fogo que serviu de fonte luminosa para as projecções como no Teatro

de Sombras, onde uma lâmpada em óleo projectava figuras decorativas para o

público. Neste sentido, está presente o primeiro conceito de performance para

uma audiência. Mas foi na Idade Média, que se desenvolveram as primordiais

experiências de projecção de imagens. Um dos principais inventos foi a lanterna

mágica, a qual foi considerada como a primeira forma de um projector de slides.

A primeira imagem do aparelho apareceu na Ars Magna Lucis et Umbrae, por

Jesuit Athanasius Kircher [1] em 1671. No seu processo, as imagens eram pintadas

em vidro e projectados nas paredes, em cortinas de pano, e, por vezes, sobre um

[1] Athanasius Kircher (GE)

(1602-1680) foi um jesuíta,

matemático, físico,

alquimista e inventor

alemão. Alguns dos seus

inventos foram o megafone e

a lanterna mágica.

8 A Era da Imagem e do Movimento | A Projecção e o Cinematógrafo

Page 21: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.1 Lanterna Mágica, 1671.

Img.2 Phantasmagoria, 1798.

Img.3 Cinematógrafo 1885

pano molhado por trás do ‘tela’. Modelos mais avançados utilizavam três lentes

separadas e foram aptos de efeitos ópticos, como as dissolvências e mistura.

Alguns slides foram capazes de alcançar animações simples sequenciais. Ao longo

dos séculos XVII e XVIII físicos desenvolveram práticas ópticas, e coincidiram

algumas experiências de projecção e.g., espelhos esféricos com uma imagem

pintada na superfície e lanternas que permitiam projectar sombras na parede. Em

1798 o proeminente ilusionista, magico, físico e balonista belga, Etienne-Gaspard

Robertson (1763 – 1837), levou a projecção da lanterna mágica para um novo nível

ao criar os seus espectáculos phantasmagoria.Neles usava muitas vezes múltiplos

projectores, direccionando-os sobre uma fumaça e usava sons assustadores para

reforçar os efeitos globais, Robertson criou o primeiro horror show que frequen-

temente causava tensões aos espectadores.

Estas primeiras experiências são precursoras de alguns efeitos visuais, mas em

especial da ideia de performance assim como consequentemente, das práticas de

projecção de imagem ao vivo. Quanto ao registo de imagens, em Outubro de

1888, Luis Le Prince, um inventor que é considerado por muitos historiadores do

cinema como o verdadeiro inventor do cinema, filmou as sequências de imagens

em movimento intituladas Roundhay Garden Scene, Traffic Accross Leeds Bridge,

Accordion Player e Man Walking around a Corner, usando uma câmara de lente

única com uma película de papel. Porém, e oficialmente reconhecida está a data

de 28 de Dezembro de 1895, quando Auguste e Louis Lumière apresentaram, em

Paris, no Grand Café, situado no Boulevard des Capucines, a primeira projecção

fílmica com “La Sortie de l'usine Lumière à Lyon” (A Saída da Fábrica Lumière em

Lyon). O que os irmãos Lumière inventaram foi uma câmara portátil de captação

de imagens em movimento, com uma unidade de revelação do filme e um

projector chamado de Cinematógrafo, ou seja, três funções abrangidas numa só

invenção. A invenção do cinematógrafo constitui um marco na história do

cinema. Na descrição dos próprios inventores, tal aparelho permite registar uma

série de instantâneos fixos, em (fotogramas), concebendo a ilusão do movimento

que durante um certo tempo ocorre diante de uma lente fotográfica e depois

reproduz esse movimento, projectando as imagens animadas sobre um anteparo

(e.g. tela, parede). Convencionalmente, a ilusão é produzida pelo fenómeno da

persistência retiniana.

Os irmãos Lumière, não foram os primeiros a projectar filmes. Em 1891,o grande

inventor Thomas Edison (1847 - 1931), apresentou o Kinetoscopio. Mais tarde em

1896, Edison anunciou o Vitascopio. Para além destes, existiram outros como o

Eidoloscopio (1895), Phantoscopio (1895), Projectoscopio (1896), etc.

A Era da Imagem e do Movimento | A Projecção e o Cinematógrafo 9

Page 22: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Durante as primeiras exibições cinematográficas de 1895 a 1907, o cinema não

era uma prática localizada. As primeiras projecções de cinema foram realizadas

em locais públicos tradicionalmente dedicados ao entretenimento, tais como

feiras, parques de diversões, vaudevilles e cafés. Por tal, os locais de exibição

cinematográfica desta época podem ser divididos em três categorias principais,

historicamente sucessivas: os do ‘cinema de atracções’, tais como feiras e

parques de diversões, onde o filme coabita com outras actividades de lazer; os

nickelodeons, os primeiros estabelecimentos a exibir exclusivamente filmes e ao

tratá-los como produtos, e os ‘palácios de filmes’, construídos como óperas, que

promoveram a exposição como um evento cultural.

Originalmente, o cinema não tinha um público específico, os públicos eram

‘emprestados’ pelos locais onde se projectava. Contudo brotaram os primeiros

espaços para projecção: os nickelodeons, um termo que combina a palavra grega

para teatro, Odeon, para a moeda cujo valor correspondia ao do bilhete, o níquel.

Os nickelodeons tornaram-se num refúgio para a população das classes laborais,

que procuravam estes espaços para socialização. Desta forma, a exposição dos

filmes funcionavam como um ambiente, já que era difícil controlar a atenção do

público. Por outras palavras, era a audiência que controlava as exposições. Ao

longo dos tempos, os projeccionistas tentaram controlar o comportamento dos

espectadores e elevar o estatuto da plateia. No entanto, os nickelodeons foram os

que estabeleceram um padrão para a distribuição cinematográfica, e os que

construíram a base para uma vasta audiência, sem a qual a exibição cinematográ-

fica nunca teria alcançado o seu pleno potencial (Em 1910, existiam cerca de

10,000 cinemas nos E.U.A., com uma procura de 150 filmes por semana).

Ao se aliar estas condições de exibição ao público desatento das primeiras

projecções cinematográficas, obtêm-se uma imagem semelhante aos espaços

contemporâneos de VJing. A estrutura económica do cinema, por sua vez, foi

nesta época muito semelhante à das performances audiovisuais hoje em dia. Os

fabricantes de aparelhos cinematográficos, não faziam somente os filmes para os

seus equipamentos, mas também assumiam o papel de projeccionistas. Para

além disso, os projeccionistas tinham um controle criativo sobre uma variedade

de elementos que agora chamamos de pós-produção. O espaço de VJing pode ser

considerado como uma influência no passado, uma vez que traz até à data as

características do cinema de atracções. VJing recria pois, certas possibilidades

que eram a simples realidade das primeiras exibições cinematográficas, uma

realidade que foi suprimida ao longo dos anos pela progressiva cristalização das

salas de cinema.

Img.4 Nickelodeon em Pittsburg

10 A Era da Imagem e do Movimento | A Projecção e o Cinematógrafo

Page 23: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.5 Color - Organ: associação de

cores

1.2. COLOR MUSIC & VISUAL MUSIC

A relação da música com as cores já há alguns séculos que intriga e seduz artistas

e pensadores. Esta relação está profundamente ligada ao conceito de VJing, pois

o mesmo articula-se pela mistura de visuais que operam em ritmos luminosos e

coloridos com as sonoridades, embora num conceito performativo. Aristóteles e

Pitágoras, na Grécia antiga, já especulavam sobre a relação entre a escala musical

e as cores do arco-íris. Essa ideia fascinou artistas como Leonardo da Vinci ou

Athanasius Kircher e as suas apresentações com a lanterna mágica. As tradições

da color music e da visual music focalizam-se numa experiência de sinestesia, que

descreve a condição neurológica de misturar os sentidos. Em sinestesia pode-se

e.g. ouvir cores, ver sons, sensações tácteis e sabor. Isso significa que a percepção

de um estímulo evoca uma segunda percepção, i.e., a música pode ser ‘vista’ com

cores e as cores podem ser ‘ouvidas’ como som.

As primeiras experiências concretas datam o século XIII, com Louis-Bertrand

Castel (1688 – 1757) considerado o precursor na concretização do instrumento

que possibilitou “tocar cores” – o Clavecin Oculaire, que era um quadrado de 1,80

de altura com 60 janelas de vidro colorido, cada uma delas ligada a um órgão

comum, por engrenagens. Ao tocar determinada tecla, a cor correspondente era

revelada no quadrado de janelas. Castel pode ser considerado um dos pioneiros

no campo da arte tecnológica. Em 1870, Frederick Kastner arquitecta e apresenta

o seu Pyrophone, constituído por treze longos tubos de cristal ligados a um órgão.

Ao tocar numa tecla, uma corrente eléctrica explodia um gás colorido num tubo

correspondente. Por sua vez, em 1883, Alexander Rimington constrói o seu Color-

Organ. O instrumento baseava-se num órgão que não produzia som, conectado

electronicamente a 14 orifícios num quadro de madeira de 3 metros de altura.

Um complexo mecanismo controlava a relação da nota tocada no órgão e a cor e

intensidade de luz que surgia nos orifícios. O termo color organ torna-se, a partir

daí, genérico para esse tipo de instrumento.

A Color music baseava-se portanto, na criação de escalas cromáticas que ligavam

directamente específicas cores a específicas notas, onde as relações particulares

de cor-tom são justificadas pelos artistas alegando que a conexão é uma absoluta

e empírica relação reflectindo fatos sobre a natureza da luz e som, em vez de

uma decisão estética arbitrária. Os inventores deste conceito sentiram que o seu

trabalho demonstrou válidos princípios científicos sobre a natureza da luz e do

som resultante das vibrações: os rácios do som harmónico aplicados a luz criaram

a Color music, pela existência de um princípio de ordem harmónica.

A Era da Imagem e do Movimento |Color Music & Visual Music 11

Page 24: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Estas primeiras investigações e experiências provam que, mesmo anteriormente

ao cinema se ter desenvolvido, muitos se fascinavam com a ideia da experiência

audiovisual, sem a ligarem a narrativas. Todo este conceito de relacionar música e

cores foi o princípio da analogia que se faz hoje entre efeitos visuais e música.

Paralelamente às experiências da color music, teóricos e artistas dos movimentos

modernistas construíam novas formas de percebermos o mundo através da arte.

Marinetti [1], no Manifesto Futurista (1909) disse – “o mundo está a enriquecer-se

com uma nova beleza: a beleza da velocidade". Por este parecer, surge no início

da década de 1920 o conceito da visual music, criado Oskar Fischinger. Todas as

ideias deste artista plástico e animador experimental alemão giravam em torno

da busca deste “ritmo absoluto” e universal criando filmes que fossem a perfeita

união entre o movimento das imagens e a música. Fischinger fazia filmes mudos

inspirados em música (jazz ou erudita, sincronizados em performances ao vivo),

até os anos 30, quando foi possível sonorizar directamente sobre a película.

Contemporâneos de Fischinger, os teóricos russos da montagem cinematográfica,

faziam frequentes analogias musicais para explicar o seu método de produção

cinematográfico. Para Kuleshov, fundador da primeira escola de cinema, “o que

distingue o cinema de outras artes é a capacidade da montagem para organizar

fragmentos dispersos numa sequência rítmica e com sentido.” (Kuleshov, cit. por Stam,

R.; Introdução à Teoria do Cinema, 2003, p.55) Eisenstein, por sua vez, estabeleceu a

relação dos conceitos musicais com o cinema. Para ele existiam vários tipos de

montagens (métrica, rítmica, tonal, harmónica, intelectual e vertical), cada uma

delas com efeitos específicos sobre os espectadores. A visual music é sim, a busca

do “ritmo absoluto” nas imagens, que encantaram alguns artistas experimentais

como Len Lye, Man Ray, Marcel Duchamp, Walter Ruttmann, etc.

Enquanto os projectores de filmes e o cinema continuavam a triunfar, encontrar

correlações entre cor e som, continuava a fascinar artistas, inventores, cientistas

e músicos. Em 1922, Thomas Wilfred cria o famoso instrumento o Clavilux

(composto por 6 projectores regulados por um teclado ligado a um banco de

slides) e começa a construir argumentos sobre a sua nova forma de manipulação

óptica, a Lumia. Segundo Wilfred, o termo color music era apenas uma metáfora.

Para ele, a arte de “tocar cores” incluía factores como tempo e ritmo, como na

música. Lumia por sua vez, são pedaços, como músicas criadas pelos artistas.

Alguns são essencialmente de composição na sua estrutura, outros incluem

elementos improvisados. Lumia é o resultado, em parte, do fascínio do artista

visual com o impacto da música. Lumia são pedaços dinâmicos, baseados

Img.6 Circles (1933), Oskar

Fischinger.

Img.7 Lumia por Thomas Wilfred

[1] Filippo Tommaso

Marinetti: (IT) (1876- 1944)

escritor/ poeta/ editor/

ideólogo/ jornalista /activista

político iniciador do

movimento futurista, cujo

manifesto publicou no jornal

parisiense Le Figaro, em 20

de Fevereiro de 1909.

12 A Era da Imagem e do Movimento | Color Music & Visual Music

Page 25: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.8 Kandisnky 1913

essencialmente em ilimitadas combinações de elementos simples, são capazes de

manifestar uma ampla gama de emoções humanas e experiências, e podem ser

criados em tempo-real. Com Lumia, os artistas começaram a construir pinturas a

moverem-se como a música, e inclusive liga-las com a música.

A verdade é que, estes conceitos de sinestesia desempenham um papel central

no desenvolvimento do abstraccionismo na pintura e no cinema. Essas histórias

evoluíram paralelamente – visual music, pintura abstracta e cinema – o que

intersectou tendências e artistas. Wassily Kandisnky, pioneiro na introdução do

abstraccionismo no campo das artes, desenvolve na década de 1910 os seus

primeiros estudos não figurativos, fazendo com que seja considerado o primeiro

pintor ocidental a produzir uma tela abstracta. Kandisnky utilizava a cor de uma

forma altamente teórica associando tom com timbre, tonalidade com pitch, e

saturação com o volume do som. As pinturas de Kandinsky foram consideradas

partes integrantes destes movimentos baseados em sinestesia.

É muito fácil desenhar uma ligação entre estas ideologias e as primeiras ideias

contemporâneas de projecção audiovisuais em clubes, que combina música,

luzes, imagens e fumo. A Colour Music, nascida pela curiosidade de se associar

cor e música, e a Visual Music originada por uma busca pelo “ritmo absoluto” nas

imagens, influenciaram directamente os conceitos construtivos de VJing.

1.3. CINEMA EXPERIMENTAL

Neste processo evolutivo historicamente, é importante considerar brevemente o

cinema experimental pois ele é impulsionador de algumas directrizes conceptuais

presentes numa performance audiovisual nos dias de hoje. Cinema experimental

é um termo usado para descrever um estilo que geralmente transgride as regras

cinematográficas. Conotado como “avant-garde” ou “urderground”, é geralmente

caracterizado pela ausência de uma linearidade narrativa, que usa várias técnicas

abstractas, como e.g. desfocado, pintar e arranhar o filme, rápida montagem, o

uso de som não diegético, ou ausência de som. O objectivo desta expressão é a

de colocar o observador numa postura mais activa e mais pensante em relação ao

filme. Filmes experimentais ou não narrativos influenciam performances visuais

como VJing, pois conduzem-se pelo mesmo princípio: o ritmo.

O cinema experimental surgiu na década de 1920, quando o cinema em si tinha

amadurecido como espectáculo, e os movimentos avant-garde nas artes visuais

estavam a florescer. Sendo assim, o dadaísmo, o surrealismo e o abstraccionismo

em particular, acabaram por se infiltrar no cinema.

A Era da Imagem e do Movimento | Cinema Experimental 13

Page 26: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

O que caracteriza o cinema experimental é o foco no processo fílmico, insistindo

num ou em vários dos procedimentos do filme, levando-os a um ponto extremo.

Com isto, sugere-se um papel activo da montagem figurando-se ritmos visuais,

como em Berlin, Symphony of a City (1927), de Walter Ruttman que retrata a vida

quotidiana na cidade do amanhecer até ao entardecer. Os artistas soviéticos, por

sua vez, encontraram interesse nos movimentos das artes visuais, que aliaram às

suas teorias da montagem fílmica. Os filmes de Dziga Vertov, Sergei Eisenstein,

Lev Kuleshov, Alexander Dovzhenko e Vsevolod Pudovkin surgem como uma

alternativa aos modelos narrativos clássicos, pelas construções intensamente

rítmicas e exacerbados efeitos visuais. Por sua vez, realizadores franceses avant-

garde, como Marcel Duchamp, Francis Picabia, Fernand Léger, Man Ray, Jean

Cocteau, bem como outros pioneiros do cinema não-narrativo como Hans Richter

e Viking Eggeling exploraram a abstracção, repetitivas imagens, experiências

imagéticas simultâneas e texturas.

Filmes como Un Chien Andalou (1929) de Luis Buñuel e Salvador Dalí, Napoleon

(1927) de Abel Gance, e Man With a Movie Camera (1929) de Dziga Vertov, são

marcos na história do cinema experimental, sendo que, a maioria desses filmes

foram feitos com um orçamento baixo, auto-financiados, ou financiados através

de pequenas subvenções, com um número reduzido de participantes muito

frequentemente às vezes só o cineasta.

O sentido do cinema experimental baseia-se no explorar das possibilidades que a

imagem em movimento pode ter. Certo é que, actualmente argumenta-se que

um filme experimental já não é de facto “experimental” pois transformou-se num

género cinematográfico. Muitas das suas características mais típicas – como a não

narratividade, estética impressionista ou abordagens centradas na poética da

construção dos filmes – procuram a definição do que realmente é entendido por

“experimental”.

Numa análise contemporânea, esta necessidade de experimentar e muitas vezes

de se mostrar uma postura oposicionista à cultura (como aconteceu pelo menos

até à década de 1960 com alguns cineastas experimentais) enquadra-se nas

performances contemporâneas como o VJing. As construções formais, por sua

vez, vincam tal-qualmente essa semelhança pois os vídeos dos novos artistas

visuais performativos baseiam-se analogamente nesta necessidade de ritmo,

variabilidade de efeitos, abstracção e não-narratividade.

Img.9 Berlin, Symphony of a City,

1927

Img.10 UN Chien Andalou ,1929

14 A Era da Imagem e do Movimento | Cinema Experimental

Page 27: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.11 Nam June Paik, TV Cello

(1971), with Charlotte Moorman

[1] Fluxus foi um movimento

artístico caracterizado pela

mescla de diferentes artes,

primordialmente das artes

visuais. Iniciou o conceito de

performance.

1.4. VIDEOARTE

“Da mesma forma que a colagem tornou obsoleta a pintura a óleo, também o

tubo de raios catódicos substituirá a tela.” (Paik, Nam cit. por Martin, Sylvia; Video Art,

2006)

A videoarte é uma forma de expressão artística que utiliza a tecnologia de vídeo

em artes visuais e que se situa numa posição mais imediata ao VJing. A videoarte

supõe uma nova linguagem, uma nova interligação entre imagem e espectador,

na qual a imagem sai da tela para interagir com o resto do meio, integrando as

imagens com os elementos do espaço, moldando a ambiência absoluta. É uma

forma de arte contemporânea que se desenvolveu nas décadas de 1960 e 1970,

estando desde então associada a correntes de vanguarda, além do que, foi a

pioneira no uso generalizado de vídeo em instalações. Como um produto avant-

garde, que se produz com tecnologia e se desenvolve sob um vínculo intelectual,

a videoarte experimentou um rápido crescimento inicial e de aceitação. Emergiu

como ideia de subverter a televisão como meio artístico, dentro de um contexto

no qual os artistas procuravam uma arte contrária à comercial. Entre as suas

ideologias estava uma vontade crítica relativa à televisão, o que apresenta, de

certo modo, algo que ainda se figura na cultura actual.

Uns dos primeiros artistas da videoarte foram o alemão Wolf Vostell e o coreano

Nam June Paik, ambos integrantes do Grupo Fluxus [1] no final da década de 1960.

As realizações Fluxus, por sua vez, baseiam-se em performances que justapõem

não unicamente objectos, mas também sons, movimentos e luzes numa

convocação simultânea dos diferentes sentidos: visão, olfacto, audição e tacto.

Nelas, o espectador deve participar dos espectáculos experimentais, que em

regra se apresentam descontínuos, sem foco definido, não verbais e sem uma

sequência previamente estabelecida. Todas estas características pertencem ao

conceito de happenings, que são eventos em tempo-real, cuja acção é delineada

por uma estrutura flexível e inspirados por improvisações.

Como efeito destas novas filosofias e práticas na imagem em movimento pelos

primeiros vídeo artistas, aparece um conceito que procura ampliar a experiência

que o cinema oferece: O Expanded/Extended Cinema, como Gean Youngblood

explica: “quando dizemos expanded cinema, realmente queremos dizer

consciência expandida *…+ Expanded cinema não é um filme de todo: tal como a

vida é um processo de transformação, o curso histórico do homem leva-o a

manifestar a sua consciência para fora da sua mente, em frente aos seus olhos.”

(Youngblood, Gean; Expanded Cinema, 1970, p.41). Os artistas do Expanded Cinema

procuravam ampliar as possibilidades criativas restaurando a experimentação

A Era da Imagem e do Movimento | Videoarte 15

Page 28: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

e dinamismo que o cinema possuiu primordialmente, em vez de o normalizarem

a uma construção narrativa. As experiências destes artistas envolviam em regra,

situações efémeras e frágeis, desenhadas por lâmpadas intermitentes em frente

de telas, jactos de fumo, múltiplas projecções, e performances que se concebiam

em ‘mini-cinemas’ aproveitando outras sensações além da visão, como o toque e

o cheiro. Tal como outras manifestações da arte performativas de 1960 e 70, as

experiências eram específicas, pontuais em tempo e espaço, o que as traduzia em

irrepetíveis na experiência. Expanded Cinema é um conceito que procura assim,

usar diversas projecções, misturar diferentes meios de comunicação, variar dos

pressupostos narrativos, além de procurar estimular os diferentes sentidos numa

busca pela sinestesia. “O cinema sinestésico é um contínuo de espaço-tempo. Ele

não é nem subjectivo, objectivo, nem não objectivo, mas em vez disso é uma

combinação de todos esses: isto é, extra-objectivo.” (Youngblood, op. cit., 1970, p.81).

O vídeo, o cinema e a televisão entraram com muita força no trabalho artístico,

frequentemente associados a outras médias e linguagens. O desenvolvimento da

arte pop, do minimalismo e da arte conceptual caracteriza o progresso na arte

das décadas de 1960 e 1970, sobretudo nos Estados Unidos. Cada vez mais as

obras começaram a articular diferentes modalidades de arte como dança, música,

pintura, teatro, escultura, literatura, o que desafia as classificações habituais e

questiona o carácter das representações artísticas e a própria definição de arte.

Artistas como Josef Beuys, Yoko Ono e John Cage usaram a mistura de diferentes

média como parte do movimento Fluxos. O desenvolvimento de gráficos e de

vídeo sintetizadores (como o PaikAbe de Nam June Paik) por alguns entusiastas

electrónicos no início dos anos 60 e 70 proporcionaram as primeiras experiência

com gráficos de vídeo.

Certo é que, a introdução do vídeo nesse universo trouxe novos elementos para o

debate sobre a criação artística. As imagens projectadas começaram a ampliar as

possibilidades de se pensar a representação, além de transformarem as relações

da obra de arte com o espaço físico. A videoarte parte da ideia de espaço como

campo perceptivo, enfatizando-se no ponto de vista do observador como porção

fundamental para a apreensão e produção da obra. Logo, se o trabalho de arte é

definido como o resultado de relações entre espaço, tempo, luz e campo de visão

do observador, o uso do vídeo ambiciona assim, transformar de modo decisivo as

coordenadas desse campo perceptivo, dando um novo significado ao espaço de

projecção e às relações do observador com a obra. Deste modo, colocado numa

posição intermediária entre o espectador do cinema e o da galeria, o espectador

Img.12 Megatron/Matrix, 1993,

Nam June Paik

16 A Era da Imagem e do Movimento | Videoarte

Page 29: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

[1] Laurie Spiegel: (US)

Compositora. Conhecida pela

suas inovadoras composições

de música electrónica e a sua

composição algorítmica com

o software Music Mouse.

da obra é convocado ao movimento e à participação. Se a videoarte interpela o

espaço, visa igualmente alterar as formas de apreensão do tempo na arte. As

imagens, em série como um enredo ou projectadas simultaneamente, almejam

multiplicar as capacidades que o trabalho artístico possui ao lidar com as

coordenadas temporais.

Comunicar através de arte, possui portanto, directrizes marcadas por um carácter

organizacional orquestradas com criatividade, contudo, a videoarte pode ter um

papel característico na criação de ambiências artísticas em espaços previamente

estáticos e inalteráveis, apelando a universos absortos de forte componente

sensorial. Estas novas relações do vídeo com o espaço, o tempo e o observador,

são sem dúvida uma marca nas recentes relações com projecções de imagem,

como o VJing. Por sua vez, a contextualização social e espacial de VJing difere da

videoarte, pois estrutura-se num novo sentido i.e., sai da galeria e invade espaços

mais ‘populares’.

1.5. A MÚSICA ELECTRÓNICA E A EVOLUÇÃO DIGITAL

Atendendo à evolução crescente da tecnologia e da conceptualidade artística

inerente ao conceito de videoarte, o VJing tem detido uma relação particular com

a música, em característico com o progresso da música electrónica. No contínuo

evolutivo das artes, nos anos 70 são criados os primeiros sintetizadores de vídeo

pelo trabalho conjunto de cientistas e músicos. O projecto de Laurie Spiegel [1]

com o GROOVE (Generated Real-time Output Operations on Voltage-controlled

Equipment) e o VAMPIRE (Video And Music Program for Interactive Realtime

Experimentation) retomou a manipulação plástica musical que se consagrara há

mais de um século com a color music.

O sintetizador de vídeo funciona pelo princípio do sintetizador de som i.e.,

modulando correntes eléctricas, o que permite trocar informações entre os dois

meios, assumindo uma relação entre imagem e som. Com o VAMPIRE, Spiegel

podia transformar as modulações eléctricas geradas pelo GROOVE (sintetizador

de som) em imagens. As experiências com sintetizadores concretizam a relação

indissolúvel entre imagem e música.

No início dos anos 80, surge o scratching, uma técnica desenvolvida pelo DJ

Grand Wizard Theodore e o DJ Grandmaster Flash, com o intuito de acrescentar

mais um elemento ao DJing. Os discos de vinil eram manipulados com as mãos,

ritmicamente para frente e para traz, produzindo barulhos como se ‘arranhasse’

A Era da Imagem e do Movimento | Música Electrónica e a Evolução Digital 17

Page 30: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

o disco. Esta prática ampliou-se para o vídeo, surgindo o scratch video, no qual,

pequenos clips de vídeo eram manipulados em sofisticadas ilhas de edição.

Diferente do virtuosismo manual dos DJs, a habilidade dos vídeo artistas era

testada na capacidade de reeditar, com efeitos e montagens, as imagens que

eram geralmente pirateadas da televisão broadcasting. Os primeiros grupos de

scratch video surgiram em Londres, na década de 1980, com claros objectivos

políticos, i.e. a de fazer uma caricatura cómica da vida pública retratada na TV.

Artistas como os Kraftwerk e o Jean-Michel Jarre foram pioneiros na criação de

deslumbrantes concertos visuais no final dos anos 70. Até à década de 80, as

projecções audiovisuais em grandes concertos tornaram-se norma. Entre os mais

inovadores concertos visuais, foram os dos Pet Shop Boys com imagens de Derek

Jarman, e os concertos dos Depeche Mode, após se estrearem na colaboração

com o realizador Anton Corbijn. Mas foi só a partir da década de 1990 que o VJing

ganhou forma. A manipulação electrónica e a projecção de imagens para

acompanhar a música ampliaram-se desde essa época, permitindo o crescimento

do VJing pela confluência destes dois factores. Para além disso, as tecnologias

multimédia tornaram-se mais acessíveis e simultaneamente de maior qualidade.

Na segunda metade dos anos 90, com a explosão da Internet e as formas de

produção artísticas à distância, inauguraram-se novas possibilidades de diálogo

entre as tecnologias de vídeo digital e a performance musical. Cresceu uma nova

geração de artistas que se permeia pela conglutinação entre várias áreas fora da

profissão do vídeo, como programadores e designers, descobrindo na música

electrónica um novo campo criativo para imagens em movimento. Estes artistas

começaram a intitular-se de VJs, e sua arte o Vídeo Jockeying. O VJing, como uma

performance, estabelece novas regras de partilha entre produtores e audiência.

Em termos simples, o VJing tem o mesmo princípio de mixagem do DJ, i.e. passar

de uma imagem em movimento para outra, sem perder o ritmo da música que

toca na pista de dança. Para tal, os VJs usam as mais variadas configurações de

equipamentos: mixes de imagens, câmaras de vídeo, controladores MIDI,

computadores e uma variada quantidade de software e aplicações ao vivo.

Entretanto, todos eles compartilham uma regra simples e comum durante as suas

performances: o VJ loop. Estas pequenas peças gráficas de vídeo, de poucos

segundos de duração, são mostradas repetidas vezes e montadas em tempo-real.

Produto típico da ‘Cultura do Remix’, o VJ loop surge na música electrónica como

sinónimo do sampler musical para as artes visuais. Necessariamente estes loops

são criados para serem constantemente refeitos (na cor, velocidade e outros

parâmetros reguláveis) e remixados no diálogo com outros loops numa constante

18 A Era da Imagem e do Movimento | Música Electrónica e a Evolução Digital

Page 31: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

actualização de sentidos promovida pelo VJ e o seu fausto de recepção, a área

videográfica. A existência de produtos como o VJ loop, a sua proliferação e a sua

implantação na vida social colocam em crise os conceitos tradicionais e anteriores

sobre o fenómeno artístico, exigindo formulações mais adequadas a este novo

tipo de sensibilidade que emerge.

O VJing, como acto de manipulação de sentido do VJ loop, mantém relações

complexas e dinâmicas com os géneros anteriores: a subversão técnica em prol

da instrumentalização das imagens em movimento que se figuram na color music,

na busca do ritmo absoluto da visual music, na não-narratividade do cinema

experimental, e nos princípios críticos e interventivos da videoarte. Desta forma,

o VJ loop do VJing estabelece-se como uma nova prática das artes visuais, num

diálogo profícuo, ao ritmo da música electrónica, com a poética do DJ e a sua

conexão com a cibercultura.

1.6. VÍDEO E PERFORMANCE EM PORTUGAL

Numa contextualização nacional, a relação da arte portuguesa com a videoarte é

na sua generalidade tardia e houve alguma resistência em integrar esta nova

linguagem no sistema artístico do mercado. Na segunda metade do século XX em

Portugal, com a situação social, política e económica do país, marcado por uma

ditadura fascista, não se faziam sobressair preocupações estético-artísticas de

vanguarda. Neste quadro, as artes sofriam um clima pouco propício para o seu

desenvolvimento, o que fez com que o vídeo tivesse uma expressão reduzida no

contexto artístico português antes de meados da década de 1990. Todavia, alguns

artistas usaram esse médium pontualmente nos anos 60 e 70, logo que tiveram

acesso a equipamento vídeo, como modo de experiência de gravação imagética

de performances ou trabalhos, facto este, limitado a uma pequena elite com

possibilidades económicas e com facilidade em viajar. Artistas como Ernesto de

Sousa, Ângelo de Sousa, Julião Sarmento, Fernando Calhau, António Palolo, ou

artistas mais novos como José de Carvalho, José Conduto ou Joana Rosa são

alguns nomes das primeiras considerações de vídeo em arte em Portugal. O vídeo

surge apenas como mais um suporte para reflexão conceptual das temáticas que

se trabalham, não sendo um meio exclusivo, mas antes um veículo flexível de

ideias que acompanha o restante corpo de trabalho. Até então, os artistas que se

tinham interessado em trabalhar com a imagem em movimento recorreram ao

filme, em especial ao Super-8.

A Era da Imagem e do Movimento | Vídeo e Performance em Portugal 19

Page 32: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Durante os anos 80, verificou-se uma hegemonia das disciplinas tradicionais

(pintura e escultura) e uma reacção ao experimentalismo que havia prevalecido

na década anterior, deste modo, o vídeo enquanto médium artístico viu-se, em

consequência, relegado para uma posição quase de invisibilidade. O vídeo e a

fotografia mantiveram-se assim, numa posição ingrata até aos anos 1990, pois

para além do mais, estas formas de arte pressupõem alguns condicionalismos

económicos e técnicos.

Com a década de 1990, o contexto da produção de vídeo arte em Portugal sofre

profundas alterações: há uma necessidade de ruptura, de confronto, estratégico

e político, nas práticas artísticas então sobrevindas e que haviam sido quase

diminuídas a um estruturalismo formal da década de 1980. Sendo assim, nos anos

90 a vídeo arte parece renascer associada às novas condições económicas e

sociais do país. A partir daqui, o vídeo é trabalhado de uma forma cada vez mais

descomplexada, começado a ser usado por jovens artistas. Estes artistas são cada

vez mais influenciados pela televisão e pela cultura vídeo, e vivem na procura

experimental de um conjunto de tecnologias e em se manterem a par do que se

faz nas artes internacionais. Neste contexto, toda uma nova geração passa a ter

acesso a melhores condições de produção, bem como às correntes internacionais

e à própria tecnologia vídeo, em especial depois da segunda metade da década

de 1990. Esta geração é marcada por uma verdadeira cultura videográfica. Uma

das manifestações mais recorrentes disso mesmo foi, justamente, a apropriação

de excertos de filmes, que muitos artistas interessados em trabalhar com esse

médium tiveram curiosidade em experimentar. Assim, desde a segunda metade

da década até aos nossos dias, a comunidade artística, criadores e críticos de

arte, estão abertos a novas tendências. Pela primeira vez e descomplexadamente,

trabalha-se com todos os métodos e tecnologias audiovisuais (vídeo,computador,

internet) às vezes quase sem consciência da ruptura concretizada de maneira tão

radical há tão pouco tempo no país.

O recurso ao vídeo por parte de um número cada vez maior de artistas nacionais,

a partir dessa altura, levanta, desde logo, a questão do acesso à tecnologia, da

sua democratização e acabou por reflectir, com algum desfasamento cronológico,

o que se passava na cena artística internacional. O que é importante para o

desenvolvimento de um artista visual não passa mais sobre a criação de imagens,

mas sobre o controlo como aparecem as imagens, usando fotografia, o desenho,

o filme e os novos meios de comunicação para adquirir controlo. A visualização

tornou-se assim, uma noção cada vez mais popular, como modo para pensar o

mundo por meio das suas imagens. A utilização deste médium pela maioria dos

20 A Era da Imagem e do Movimento | Vídeo e Performance em Portugal

Page 33: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

jovens artistas, está ligado à definição e afirmação de universos autorais. Os

artistas têm tendência para a individualização, para a construção de universos

autorais e singularizados.

Ainda a nível nacional, por último, surgiram nos finais dos anos 90 alguns artistas,

com um pendor interdisciplinar, provenientes das mais diversas práticas de arte:

da música, do design, da programação digital ou das artes performativas. Sem se

poderem incluir directamente em qualquer categoria, têm desenvolvido um

trabalho com uma ligação e uma sensibilidade muito próxima ao meio do vídeo

artístico, abordando-o de uma forma expandida, redefinindo fronteiras nas

diversas áreas, como o cinema, artes performativas e a vídeo performance. Neste

entrelaçar de diferentes campos criativos e na apropriação de elementos e

referências da sociedade tecnológica, novas formas expressivas como o VJing

começam a dar os primeiros passos, mas demandam uma reformulação iminente.

No contexto nacional e com o emergir da música electrónica, as performances

VJing são um produto de uma cultura multimédia ainda em desenvolvimento.

Certo é, que neste ponto, não existe para já uma constância de valorização e

interesse nesta forma expressiva. O necessário, é compreender o desfasamento

do desenvolvimento da videoarte no panorama nacional, que juntamente com a

necessidade dos novos artistas em aceder a tecnologias e integrar novas parti-

cularidades conceptuais estético-artísticas, se desenvolva gradualmente um

acesso à integração de Vídeo Jockey no contexto cultural artístico, como um

potencial expressivo da cultura e do imaginário contemporâneo.

A Era da Imagem e do Movimento | Vídeo e Performance em Portugal 21

Page 34: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

22

Page 35: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING | 2. UMA NOVA EXPRESSÃO: O VJING

“Vivemos numa realidade com estruturas definidas pelas invenções dos média –

imagens electrónicas e impressas são as pedras angulares da nossa evolução

cultural.” (Tambellini, Aldo, cit. por. Martin, Sylvia op. cit., 2006)

Num mundo desenhado pela era digital, as representações artísticas comportam

uma crescente multiplicidade de formas e aplicações na vertente conceptual que

as caracteriza. Ao longo das últimas décadas o desenvolvimento tecnológico tem

evidenciado o crescimento das plataformas de produção na arte, que evoluem a

um passo veloz e diverso, reforçando a expressão artística de uma forma efémera

e redundante com variável grau imperante. As manifestações de arte estão assim,

cada vez mais subtis e presentes, embora muitas vezes subvalorizadas, sendo que

é um reflexo puro de um exagero de diversificação ou pelo contrário da ausência

de um efeito impactante de uma inovação.

Num espaço global, cada vez mais imerso em tecnologia, a arte propende a

desenvolver-se eminentemente recorrendo ao uso do computador. Sendo assim,

pelo conceito de arte multimédia desenham-se vincos de dinamismo, delineados

pelas múltiplas facetas da criatividade digital. Nesta espaço mediado, milhares de

imagens digitais são criadas por dia, as quais promovem um novo estigma na

construção artística, oferecendo uma nova possibilidade criativa que passa pela

reciclagem e reutilização dessas imagens em diferentes contextos, proclamando a

Uma Nova Expressão: O VJing 23

Page 36: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

existência de uma cultura definida pela remistura. As Imagens são transformadas

em digitais mescladas com imagens electrónicas captadas de diferentes meios de

comunicação, sendo depois baralhadas, reconstruídas e renascidas sobre uma

outra forma criativa. Nessa abordagem, com a necessidade de usar os média

como expressão de arte de característica dinâmica e quase que ilimitada, alguns

conceitos modernos como performance e arte interventiva, têm feito as delícias

de alguns novos artistas digitais.

Num tempo actual, mais do que nunca, as artes performativas e de intervenção

espácio-temporal, pronunciam um conjunto de intenções e sensibilidades que se

unem com extensões multimédia, desabrochando um novo leque de criatividade,

originando assim, obras artísticas híbridas com uma abordagem sensorial e

estimulante. Consultando a evolução das técnicas digitais, o vídeo afirma-se

como potencial criador de mundos sedutores marcando presença neste tipo de

interposições. O vídeo artístico tem um poder intrínseco, e perante isso, tomando

como certa a altivez das tecnologias média sobre estas expressões artísticas,

afirma-se subliminarmente uma recente forma criativa e expressiva descendente

desta ampliação: o Vídeo Jockeying (ou VJing).

2.1. PERFORMANCE VISUAL

Uma performance visual é sem dúvida uma das extensões culturais da sociedade

digital. Um visual performer é aquele que oferece num tempo e espaços fixados,

um espectáculo visual expressivo, singular e efémero. Um performer visual está

atento ao momento e à reacção da audiência, de forma a que, conduza a sua

performance procurando reagir positivamente com o espectador. Sendo assim, o

termo VJing ou performance visual é comummente compreendido como o acto

de manipular vídeos num evento ao vivo, usualmente com presença de música,

percebido como entretenimento ou uma prática artística, associado em regra a

espectáculos, performances em bares e discotecas, instalações interactivas e

exposições performativas. Definições relativas a esta prática estão em aberto, já

que diferentes activos desta arte tendem a olhar para a sua prática através do

seu pertencente contexto pessoal e profissional. De qualquer forma, VJing prevê

a presença do VJ ou Vídeo Jockey, que é a denominação dada aos profissionais

responsáveis pela mistura (remix) dos vídeos nos eventos ao vivo, vídeos esses,

que demandam a nível funcional, na maioria das ocasiões, a ilustração de músicas

e a transmissão de sensações diversas para o público.

24 Uma Nova Expressão: O VJing | Performance Visual

Page 37: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.13 Illuminations 1.1., Marius

Watz, Club Transmediale 2008,

[1] Transmediale (GE) festival

anual internacional para arte e

cultura digital, situado em

Berlim, Alemanha. Originado

como festival de cinema e

vídeo para a arte

contemporânea, teve a sua 1ª

edição em 1988.

2.1.1. CARACTERIZAÇÃO DO VJ

O significado do acrónimo ‘VJ’ é muito discutido, devido a uma variedade de

sugestões de nomenclaturas encontradas nas comunidades de discussão sobre

esta expressão. VJ pode ser a denominação de Vídeo Jockey, frequente quando a

perspectiva se centra no suporte de expressão, o vídeo. Pode ser denominado de

Visual Jockey, habitual quando se associa ao objecto da expressão, i.e. imagens,

estáticas ou em movimento em conjunto com luz, por outras palavras, quando se

reporta a tudo ao que é visível de representar.

VJing aparece ainda muitas vezes como Vídeo Jam ou Vídeo Performance, no qual

existe a ideia de jamming. A palavra jamming, por sua vez, surge da ideia cultural

musical das jam sessions,que é o acto de juntar músicos sem uma pré-preparação

extensa ou organização predefinida, levando portanto em regra à performance

de músicas por improvisação. As jam sessions musicais são criadas geralmente

baseadas em músicas pré-existentes ou formas musicais, podem ser sugeridas

por um participante ou simplesmente basearem-se no improviso. Em VJing essa

associação é igualmente possível, já que os VJs possuem um conjunto de imagens

pré-estabelecidas, que são manipuladas por improviso visando ou não

sincronismo musical na performance ao vivo. O cognome Visual Jam está assim

iminentemente associado ao momento de improvisação dos shows.

Uma conotação mais recente para esta prática surge pelo nome de Live Cinema

ou Cinema ao Vivo. No arquivo de imprensa do programa Live Cinema do festival

transmediale [1] em 2005 define-se: “O termo ‘Live Cinema’ até agora tem sido

usado para descrever o acompanhamento musical ao vivo dos filmes mudos. ‘Live

Cinema’ hoje em dia, pertence à criação simultânea de som e imagem em tempo

real pelos artistas visuais e sonoros que colaboram para elaborar conceitos em

igualdade de condições.” Live Cinema apesar de semelhante ao VJing manifesta-

se em geral, identificado a condições espaciais mais idênticas ao cinema, i.e., em

salas ou auditórios propícios a essa experiência. Os parâmetros tradicionais da

narrativa cinematográfica são aqui expandidos por uma concepção muito mais

ampla do espaço cinematográfico, rompendo com formas de narração lineares e

da ideia focada na construção pelo olho da câmara, da realidade tal como ela é.

A diferença entre cinema e cinema ao vivo reside nos seus contextos e objectivos.

Live Cinema é diferente de cinema, não usa uma forma linear de contar histórias,

não é em regra baseado em diálogos ou actores. A situação ao vivo impõe as suas

necessidades e exige assim, a liberdade de uma estrutura linear cinematográfica,

da sintaxe e gramática da narrativa presentes em normas de filmagem e edição.

Sendo assim, Live Cinema baseia-se em imagens fortemente visuais, efeitos e

Uma Nova Expressão: O VJing | Caracterização do VJ 25

Page 38: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

repetições, deixando de lado os plot points narrativos e interagindo com

mensagens visuais, pois “o termo ‘Cinema' está agora a ser compreendido como

um aglomerado de todas as formas de configurar imagens em movimento,

começando pela animação de imagens pintadas ou sintéticas.” (Club Transmediale

2005; [Consult. 2009-04-24])

A definição de VJing está longe de ser unívoca, podendo existir por vezes alguma

distinção entre VJing e Live Cinema, já que os activos de Live Cinema defendem a

criação praticamente integral dos vídeos, e em VJing tende-se a misturar imagens

criadas pelo próprio artista com imagens adquiridas de diferentes média, contudo

em termos de método, características e expressão são análogos.

Na definição do VJ, e perante as diferentes perspectivas da expressão existentes,

Ziv Lazar [1] distingue dois tipos de VJ: o Club VJ e o Artist VJ. Nesta distinção, o

“Club VJ” é aquele que se focaliza nas performances em bares e discotecas, e

neste contexto, a imagem em si é a parte mais importante do espectáculo, quer a

nível estético como de projecção. A sequência, a ordem dos vídeos e o design dos

visuais são o que constroem o espectáculo. O Segundo tipo de VJ, o “Artist VJ”

geralmente faz parte de um grupo ou empresa, cujos objectivos se prendem em

explorar diferentes tipos de expressões como cinema, instalação, performance,

saindo do contexto do clube, e conotando-se como um artista multimédia. (Lazar,

Ziv ; VJ A Pseudo Subculture , 2008)

O termo VJ tem crescido ao longo dos tempos e tem abrangido uma variedade de

estilos artísticos e tecnológicos. Em VJing está-se constantemente a ultrapassar

limites e a redefinir-se o que é um VJ e qual a sua função. O VJ é visto como uma

artista arquétipo emergente. Como um poeta performativo, o VJ actua num

tempo em detrimento de uma audiência. Com uma poética do vídeo artístico, o

VJ trabalha no domínio cinematográfico numa sintonia híbrida com outras artes.

VJing é ainda frequentemente orquestrado com a prática da mistura, na busca da

fusão equilibrada entre música, imagem e momento. Na maioria dos casos, o VJ

mistura um contínuo fluxo de imagens em detrimento da música local. Os VJs

usam frequentemente pequenos clips de vídeo em repetição temporal (loop)

para a criação de um contínuo imagético, criando um ritmo visual, usando um

computador com software específico para a performance, entre outros recursos.

A actividade dos VJs corresponde assim, à manipulação de imagens fixas ou em

movimento, figurativas ou abstractas, que são apresentadas em diversos espaços,

a partir de improvisações com um banco de imagens previamente seleccionado.

VJing é um fluxo de imagens que cintila em velocidade, na combinação tempo e

ritmo em espaço, um conjunto de imagens-luz, imagens-paisagens, originando

micro-narrativas construídas por associação num contínuo estímulo sensorial.

[1] Ziv Lazar: (UK) MA Digital

Média; Artista contemporâneo

de Digital Media e

Interactividade.

26 Uma Nova Expressão: O VJing | Caracterização do VJ

Page 39: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.14 Edirol V-8 Vídeo Mixer

2.1.2. PERFORMANCES VISUAIS E TECNOLOGIAS

Em Vídeo Jockeying todos os elementos da performance têm um papel na criação

da experiência, na construção do momento, pois cada performance é única. Estes

elementos incluem VJ (s), som, imagens, luzes, espaço e audiência, todos com as

suas inerentes características. Na construção audiovisual, a par de um artista de

som, os sentidos são mesclados e a mente é seduzida para um mundo que gira

em torno das imagens projectadas e da existência no local. Talvez seja essa

sensação de imediato e imersão que é tão gratificante para os artistas e para os

públicos. Talvez seja o intenso bombardeio dos sentidos que o faz, ou talvez seja

a riqueza do diálogo entre a tecnologia, o ordenamento da arquitectura e

expressão humana que fala tão poderosamente.

Uma performance visual ao vivo pode usufruir ainda de imagens em tempo-real,

quando usa câmaras para captar a ambiência do espaço. Uma performance em

tempo-real deve evidenciar o seu processo, i.e. a sua visibilidade, permitindo-lhe

ser experienciada por uma audiência. Esta acção em tempo-real pode, por sua

vez, desenhar-se interactiva, recorrendo-se a tecnologias emergentes.

‘Setup’ é o termo usual usado pelos VJs para descrever o contíguo técnico que

usam para as performances visuais ao vivo ou em tempo real. O VJ ‘setup’ é

extremamente interessante, pois reúne uma vasta gama de objectos técnicos,

desde software e hardware pré-existentes a dispositivos criados pelo próprio VJ.

Os equipamentos básicos utilizados pelos VJs têm funções equiparadas aos dos

DJs, visto que em VJing também se fazem misturas e scratching como em DJing.

Para isso, usam-se computadores portáteis para armazenar as imagens e um

misturador de vídeo. Câmaras de vídeo digital podem ser utilizadas para pré-

fabricar vídeos ou captar imagens em tempo-real durante a performance. O

computador portátil, software de imagens ao vivo, o leitor de DVD, e efeitos

digitais são unidades padrão no kit de muitos VJs.

Novas perspectivas como as DIY (Do It Yourself) parecem ser apelativas para os

VJs, já que permitem personalizar os seus trabalhos. DIY assenta no pressuposto

que uma só pessoa pode fazer correctamente o trabalho de vários profissionais, e

nesta abordagem, as evoluções tecnológicas, irremediavelmente dos software,

têm permitido essa individualização ao VJ. As tecnologias são o fio condutor

desta expressão que juntamente com a diversidade de plataformas criativas

existentes, têm permitido materializar ideias e desmistificar complexidades nas

construções digitais.

Uma Nova Expressão: O VJing | Performances Visuais e Tecnologias 27

Page 40: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

"Tal como um ‘artista – engenheiro ‘ construtivista, os VJs inovam e modificam

existentes ferramentas e software para atender às suas necessidades. Muitas

vezes eles constroem novas ferramentas personalizadas e software, elevando

assim o ‘ofício’ para outras dimensões." (Danto, C. cit. por Spinrad, The VJ Book, 2005)

Os software são pedras angulares para o performer digital. No progresso de

produção visual, ao longo destes últimos anos, têm emergido diversos software

de construção de imagem, que possibilitam ao VJ criar previamente construções

artísticas, assim como outros para reforçar a sua dinâmica durante performance.

Na constante evolutiva nas áreas digitais da imagem, o processo criativo de VJing

passa pela afirmação de fases de produção da construção visual. Sendo assim, é

possível distinguir software de criação e edição de imagem, software dedicados

em exclusivo para performances VJing e software de arquitectura aberta com uso

de programação. Com a articulação destes três grupos de ferramentas multi-

média, alguns criativos têm vindo a orquestrar as faculdades dadas por esta era

digital, ousando obras cada vez mais atraentes e com caris interactivo.

Os software de edição de imagem, por sua vez, procuram oferecer soluções para

orquestrar ideias relativas à pré-produção dos pequenos vídeos para VJing. Com

diversas ferramentas, as possibilidades de exploração da imagem são infindáveis.

Os software de edição de imagem podem ser discriminados em software de

criação e tratamento de imagem estática, software de criação e tratamento de

imagem vídeo, e software de produção de animações (2D ou 3D). Alguns dos mais

usados software de imagem para vídeo e consecutivamente em VJing podem ser

e.g.: Adobe Premiere, Adobe After Effects, Apple Motion, Apple Final Cut, (para

vídeo); Adobe Photoshop, Adobe Illustrator (imagem fixa/vectorial); Adobe Flash

(animação 2D); Autodesk 3D Max (animação 3D), etc.

Existem múltiplos software dedicados a performance de VJing. Todos eles partem

do princípio de ‘live’ e são estruturados por uma arquitectura inerente à

necessidade construtiva de pequenos clips de vídeo. Os diferentes clips são assim,

importados e manipulados em tempo-real, manipulações estas que se processam

através de variações de ritmos, apresentações sequenciais, detalhes e efeitos

visuais existentes no software. Existe ainda a possibilidade de associar o ritmo da

música presente com o vídeo através de ferramentas específicas. Software de

VJing como e.g. Resolume, Flowmotion, Modulat8, VDMX, VJamm, Neuromixer e

Arkaos, são semelhantes na sua lógica e interface como alguns deles propiciam a

manipulação de músicas e vídeo, originando apresentações musicais e cénicas.

Relativamente aos software de arquitectura aberta com uso de programação,

estes parecem ser a escolha preferencial dos novos artistas digitais para a criação

Img.15. Resolume 2.4. Interface

28 Uma Nova Expressão: O VJing | Performances Visuais e Tecnologias

Page 41: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.16 Max/Msp Interface

de efeitos visuais vivos e esteticamente estimulantes. Na necessidade de inovar e

oferecer um novo estatuto ao VJ, o criador de vídeo tem procurado ultrapassar

barreiras até então inalteráveis, da tela fixa e do conteúdo da imagem constante

e impenetrável pelas variáveis externas. Sendo assim, estes software têm

permitido evoluir para a interactividade artística, e para a exploração das novas

formas de arte, como a arte generativa. Com especial destaque temos e.g. Max

/Msp Jitter, KeyWorx, Isadora, Pure Data, Processing, etc.

Esta variedade de programas permite que o VJing se aproxime da programação e

do design digital, por possibilitarem que os artistas gerem visuais sem inputs

externos. O uso de diferentes software criativos e hardware cada vez mais

capacitados e com uma plural de capacidades, a necessidade de experimentação

de efeitos visuais, a filosofia do loop e de pequenos vídeos, fazem com que exista

na construção sensorial de imagens patenteada pelos VJs uma tendência à

abstracção visual das composições. Como resposta a software cada vez mais

potenciais e músicas mais abstractas, as construções de VJing tendem a envolver

em estímulos multi-sensoriais a audiência. As performances visuais são assim, um

aglomerar de ideias e tecnologias que se alinham para interpretarem um ensejo

irrepetível. A diversidade dos conceitos, técnicas e qualidades estéticas é notável,

o que sugere que esta prática não é alicerçada a uma particularidade, mas em vez

disso, surge a partir de uma ampla gama de trajectórias convergentes que estão

dentro de uma forma contemporânea de desempenho baseada na arte média.

No entanto, a mistura ou remixing de vídeo ao vivo procura satisfazer uma sede

de imersão e experiencias de sinestesia entre som e imagem, de forma a criar um

todo que está para além da soma das partes.

O termo VJ agora incorpora realizadores de videoclips, editores, animadores,

designers de software, designers de interactividade, de palco, de luz, entre outros.

As tecnologias desenham as performances e tornam cada vez mais híbridas as

criações visuais. Os VJs têm portanto, convergido para todas as artes visuais onde a

tecnologia está envolvida.

Uma Nova Expressão: O VJing | Caracterização do VJ 29

Page 42: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

2.2. CULTURA OU SUBCULTURA?

Uma cultura visual estabelece-se por tendências, conceitos e estilos, perante um

contexto. VJing nem sempre tem sido definido como uma forma de arte devido à

subserviência ao contexto do clube, o que por outro lado é contrastante com a

característica do VJ multifacetado criativamente pela era digital. O cenário do VJ

tem crescido rapidamente mundialmente, contudo, nem sempre valorizado, o

que exige que se desenvolva uma plataforma sólida e edeificante. O objectivo é

que as audiências almejem novas experiências audiovisuais, e que neste contexto

social e espacial se identifique uma cultura. No acto criativo dos VJs a tecnologia

e a digitalização, permitiram ao VJ aceder rapidamente a conteúdos e a ampliar

as suas performances. Do mesmo modo, a era digital permite o acesso a milhares

de imagens com e sem direitos de reprodução e perante isso mostra-se relevante

interpretar como VJing se assume perante estas ambivalências.

2.2.1. IDIOSSINCRASIAS DA CULTURA DIGITAL

A fusão das capacidades de reprodução de realidades externas e a produção de

ambientes sintéticos, juntamente com uma multi-linearidade instantânea de

acesso a arquivos (Random Access) e com a cada vez maior idoneidade de

armazenamento de informação e dados, o computador e consequentemente a

digitalização impulsionam novos formatos, e com isso, novas formas de contar

histórias, mesmo que não sejam necessariamente novos temas. É possível ver

que, em obras criadas com computadores, tudo se move ou se manifesta num

conjunto de algoritmos e de dados. Uma vez que ambos os elementos podem ser

claramente diferenciados, pode-se dizer que o primeiro funciona como um

motor, enquanto o segundo se torna um dos combustíveis. É neste fluxo que a

arte digital se tem desenvolvido exponencialmente.

A presença artística do vídeo prevalece já há algumas décadas, contudo só depois

da década 1990 com a evolução do hardware e do software e sua acessibilidade,

foi possível melhorar experiências em diferentes áreas videográficas, incluindo

VJing. A evolução técnica e a diminuição dos preços alteraram perspectivas para a

arte e para os seus produtores, que começaram a realizar múltiplas possibilidades

criativas. A digitalização foi a viragem decisiva, que permitiu que várias artes

como música, fotografia, vídeo e cinema, fossem misturadas para a produção de

uma única peça de trabalho. Perante esta vertente digital, Couchot [1] discursa

sobre técnicas de figuração numérica e em como conseguem"modificar a arte, no

sentido em que elas são utilizadas para controlar todas as imagens automáticas

[1] Dr. Edmond Couchot (FR)

Artista Digital/ Teórico de

Arte. Interessado na ligação

entre arte e tecnologia e

interactividade.

30 Uma Nova Expressão: O VJing | Cultura ou Subcultura | Idiossincrasias da Cultura Digital

Page 43: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

(fotografia, cinema, televisão), porque as mesmas serão transformadas em

figuras que serão então registadas, tratadas, difundidas, conservadas e

manipuladas." (Couchot, Imagem-Máquina: A Era das Tecnologias do Virtual, 1993)

A mudança do analógico para o ambiente digital possibilitou ainda, que os VJs

viajassem de forma mais leve, facilitando e proliferando as performances com

pequenos e poderosos equipamentos. Dessa forma, volumosos equipamentos,

tais como os leitores de vídeo VHS, mesas de mistura vídeo, monitores e

projectores foram substituídos por computadores portáteis e alguns cabos, para

além disso, a maioria dos espaços de VJing (bares e discotecas) já instalaram a

técnica necessária para a configuração visual dos espectáculos (e.g. projectores,

monitores e telas). A digitalização, permitiu assim, compactar ferramentas físicas,

aglomerar dados diversos e facilitou a mistura e recombinação desses mesmos

dados. O que se observa, é que a cultura das imagens em movimento é uma

cultura que está em desenvolvimento e continua a aumentar em tamanho e

alcance. É importante considerar a multiplicidade de formatos de imagens que

estão agora disponíveis nesta sociedade de informação, desde inúmeras imagens

na internet, imagens em PDAs, protectores de ecrã, animações geradas por

computador, renderings OpenGL, filmes, televisão, vídeo não-linear, etc. O que

importa reforçar nesta diversidade de imagens e tipo de imagens, é que colocam

os VJs como Tim Jaeger diz, qualificados como os “hiperindivíduos” do século XXI.

O surgimento do termo “hiperindividuo” foi instituído em numerosos contextos

actuais, mas tem uma ressonância especial para a comunidade das imagens em

movimento. Um “hiperindividuo“ é uma metáfora biológica que funciona como

uma forma de estender o corpo para grandes sistemas, que são cada vez mais

globais. Poder-se-á dizer que um VJ é um “hiperindividuo”porque está interligado

a diversas fontes imagéticas, numa inconstância de impulsos que funcionam

como objectos da sua extensão criativa. “Hiperindivíduos: aqueles com a

capacidade de se adaptar, sobreviver, e manterem-se em ambientes formados

por uma grande quantidade de barulho, mudança e instabilidade.” (Jaegar, Tim; VJ as

a Hiperindividual, 2008)

Para se assumir a cultura VJ como modular e “hiper”, é necessário compreender a

densa rede de comunicações vincada pela cultura digital, sendo ela desenhada

por vários cruzamentos artísticos e políticos das imagens num contexto completo,

desde a produção para consumo, ambientes, comunidades e inerentes contextos.

A produção para o consumo está aliada a diferentes software e hardware, e outro

tipo de dispositivos apelativos para VJing. Como reflexo desta presença

tecnológica, o VJ pode rapidamente criar protótipos de obras de arte utilizando

Uma Nova Expressão: O VJing | Cultura ou Subcultura | Idiossincrasias da Cultura Digital 31

Page 44: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

diversos software. Alguns software (e.g. Max/MSP, Resolume) oferecem assim,

rapidez e flexibilidade permitindo uma veloz articulação de conceitos, sequências

de imagens e vídeos, permitindo visualizar o que acontece. Esta ‘prototipagem

rápida’ dos fluxos de informação permite que praticantes e audiência se liguem a

um fluxo de imagens e a ritmos de repetições de presença e ausência de imagens,

reconhecíveis em descontinuidades.

Os ambientes são igualmente modulares em VJing, variando desde ambientes de

projecção, generativos, Web, arte pública, cinema, etc. Os contextos podem ser

colaborativos, modulares, singulares, espaciais, e outros mais. As comunidades,

por sua vez, sucedem desde redes e websites de VJs, clubes, espaços alternativos,

festivais, entre outros. O que encontramos aqui é uma necessidade de articulação

de diferentes factores que caracterizam o “hiper”VJ, que estão confrontados com

a construção conceptual e performativa, desenhada pela cultura digital.

As comunidades de VJing proliferam e propiciam a incitação de uma nova cultura,

a cultura da partilha (share). Um dos principais responsáveis pela diversidade e

difusão de dados é a Internet, que merece ser mencionada aqui, como um meio

imprescindível aos VJs, devido à sua importância para a propagação da cultura

VJing. Na Internet, é possível fazer o download de software, participar em fóruns

de discussão como VJCentral.com e ver e adquirir uma grande variedade de

imagens. Tim Jaegar fala-nos desta nova cultura digital: “Espaço e tempo são

importantes para os praticantes de média ao vivo, mas as novas formas que esta

crescente modularidade e flexibilidade preenchem no esquema das coisas, não é

um esforço para desenvolver um futuro orientado no cosmopolitismo, mas a nova

capacidade electrónica de simular uma paisagem tribal, que faz parte de algumas

das tradições que o homem tribal um dia experimentou […] Nesta mística tradição

tribal que tem sido renascida na forma de batidas em círculos, DJ jam sessions,

raves, festivais e outros eventos, onde as ‘tribos’ temporais formam uma duração

e de seguida se desmantelam naturalmente.” (Tim Jaeger op. cit., 2008)

É nessas “tribos electrónicas”que as pessoas cultivam o seu conteúdo sinestésico.

Estas comunidades são frequentemente auto-organizadas, e permitem a rápida

divulgação da informação, e de ligação (potencialmente) “de todos para todos”.

O benefício destes sistemas é que autorizam a acumulação de mais dados, mais

informação, e através desde amplo recurso, o trabalho do VJ desenha-se cada vez

mais dinâmico. O espaço é aqui uma rede descentralizada que possibilita uma

rápida partilha de ficheiros, como o peer-to-peer (P2P), que é uma forma de

acesso, acelerando-se assim esta descentralizada rede tribal. É precisamente esta

sinestesia que caracteriza a mudança, o movimento relativo ao aumento de redes

e espaços onde todos os sentidos estão sintonizados e activados.

32 Uma Nova Expressão: O VJing | Cultura ou Subcultura | Idiossincrasias da Cultura Digital

Page 45: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.17 A Fonte, 1917, Ready-

made de Marcel Duchamp

Hoje em dia é relativamente fácil aceder a ficheiros e partilhar através destas

comunidades que se ampliam, reforçando-se esta “hiper” característica que o VJ

pode ter. A digitalização veio assim, sublinhar o crescimento de plataformas e

aumentar a dinâmica criativa dos artistas média, facilitando o acesso e ampliando

possibilidades de representar imagens nas performances.

2.2.2. PRÁTICAS DE RECOMBINAÇÃO

Os conteúdos imagéticos de VJing podem ser retirados da internet, filmados,

digitalizados, extraídos de filmes e vídeos e usados com ou sem direitos de

reprodução (copyright). "Elas [as imagens] são propriedade universal das redes de

informação interligadas nos tempos modernos." (Mello, Christine, Imagens Vivas,

[consult.2009-05-22])

Nesta extensão corporal, um dos produtos desta sociedade digital é o “ready-

made”, que surgiu com as obras de Marcel Duchamp, o qual se fundamenta no

transporte de um elemento da vida quotidiana, à priori não reconhecido como

artístico, para o campo das artes. Duchamp procurava romper com a artesania da

operação artística, uma vez que se trata da apropriação de algo que já está feito:

escolhia produtos industriais, realizados com finalidade prática e não artística

(e.g. urinol de louça, pá, roda de bicicleta), e os elevava à categoria de obra de

arte. Desta forma, no contexto da cultura digital, a ideia de apropriação de algo

que já está feito marca presença de forma mais ou menos subliminar perante

recentes manifestações artísticas como o VJing. Nesta perspectiva, os produtos

adquiridos podem ou não ser artísticos, mas serão de certo recombinados e

alterados de modo a produzir uma “nova” obra. Na característica de VJing como

performance, essa obra é apenas uma expressão finda em espaço e tempo, onde

as recombinações se produzem de forma pontual.

Existe uma abordagem para se criar a "nova" arte, que começa por empregar

existentes reproduções de outras artes, sejam imagens, sons, filmes ou texto e,

em seguida, recombina os mesmos num hábito, utilizando esse material pré-

existente como a fonte para um novo trabalho. Esta acção tem sido apelidada de

diversas formas como sampling, apropriação, cut-up, mash-up, remix, colagem,

montagem, e cada um desses nomes reporta-se a uma das suas múltiplas

encarnações históricas. Esta remontagem de reproduções é uma característica

das respostas artísticas à emergência da proliferação tecnológica ao longo do

século XX e estende-se a utilizações actuais das tecnologias digitais.

Neste contexto, numa sociedade actual de multi-plataformas, sendo um VJ um

“hiperindivíduo” e dirigido pela “remixologia”, o que encontramos diariamente

Uma Nova Expressão: O VJing | Cultura ou Subcultura | Práticas de Recombinação 33

Page 46: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

são trabalhos de diferentes artistas/criativos que são misturados de modo que,

criam novas narrativas, novos contos. Remix é o acto modificar algo, baseia-se na

capacidade de reunir dados numa imagem,sendo esta depois codificada com uma

assinatura pessoal de estilo e efeitos, com o intuito de dar um sentido ou “novo”

sentido a essa montagem. Lucas Bambozzi [1] sublinha que"[…] amostragem, copiar,

colar, transformar ao vivo, têm sofisticado os fenómenos da reprodutibilidade.

Estamos no ready-made e era digital remixing". (Bambozzi, Lucas; A Era do Ready-Made

Digital ; [consult.2009-05-22])

As práticas de recombinação vulgarmente encontradas nos média constituem um

desafio para as convenções tradicionais de autor/espectador. O que é igualmente

marcante sobre o padrão de repetição desta reutilização artística é alegação cada

vez mais estridente de que esta abordagem constitui um "questionamento da

autoria", especialmente evidente nas obras que aparecem no final do século XX

em torno da ideia de "arte de apropriação". Nas artes visuais, a terminologia

apropriação refere-se muitas vezes, à utilização de elementos ‘emprestados’ na

criação de novos trabalhos. Os elementos ‘emprestados’ podem incluir imagens,

formas e estilos da história da arte ou da cultura popular, ou materiais e técnicas

de contextos não artísticos. Desde a década de 1980 que o termo tem-se referido

mais especificamente, ao acto de usar o trabalho de outro artista para criar um

novo trabalho. Neste ponto, o novo trabalho não afecta o original permanecendo

acessível e sem alterações. Em VJing esta apropriação é culturalmente uma

ferramenta de trabalho, traduzindo o VJ como um re-autor performativo.

Michael Betancourt [2] fala sobre novos actos digitais de re-autoria:" *…+é possível

reconhecer que, em vez de impugnar ou criticar as convenções tradicionais de

autor/ espectador, práticas de recombinação servem para reafirmar essas

posições e afirmar um papel autoritário para a fonte original do material.”

(Betancourt,Michael, VJ Wallpaper and Art, 2008)

Estas práticas de apropriação tornaram-se, em regra, banais e não perturbadoras,

já que estas abordagens encontraram êxito no entretenimento popular. Contudo

a recombinação levanta uma “questão de autoria”. Perante este sentido, estas

repetições assumem um duplo carácter: aparecem através da reutilização de

reproduções (o ‘bruto’ material do trabalho), e ao nível conceptual como um

procedimento específico de adopção e remontagem. Estas práticas procuram

sempre atingir um observador, e desta forma o que anuncia ser relativo é como

atingem o interesse do observador, i.e., devem basear-se na forma como o novo

trabalho reconfigura o antigo. Estas práticas convidam a audiência a criticar o

trabalho, incitando que a audiência faça uso do seu ‘passado enciclopédico’

mental perante a “nova” obra.

[1] Lucas Bambozzi: (BR, UK)

vídeo artista/ artista

multimédia /professor. MPhil

Universidade de Plymouth,

Inglaterra. Trabalha com

vídeo, cinema, instalação e

médias interactivas, com

exibições em mostras em

mais de 40 países. Dedica-se

à exploração crítica de novos

formatos de média

independente.

[2] Michael Betancourt (US)

teorista /critico/ historiador

de arte/ artista

multidisciplinar. Ph.D

Interdisciplinary Studies,

University of Miami. Possui

vários livros editados sobre

Visual Music.

34 Uma Nova Expressão: O VJing | Cultura ou Subcultura | Práticas de Recombinação

Page 47: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Para melhor compreender esta noção, Umberto Eco fala-nos das “variações ao

infinito”: “ *…+ A variabilidade ao infinito tem todas as características de

repetição, e muito pouco de inovação. Mas é o ‘infinito’ do processo que dá um

novo sentido para o dispositivo de variação. O que deve ser desfrutado, sugere a

estética pós-moderna, é o facto de que uma série de possíveis variações é

potencialmente infinita.” (Eco, The Limits of Interpretation, cap.5 Varions to Infinity, 1994)

Eco assume assim, que qualquer repetição é consagrada por uma conotação de

grandiosidade pelo seu poder de infinitude, inerentemente entrelaçada com

novos sentidos. Eco conclui ainda que: “ *…+ O que se torna célebre aqui é uma

espécie de vitória da vida sobre arte, com o resultado paradoxal de que a era da

electrónica, em vez de enfatizar os fenómenos de choque, interrupção, novidade,

e a frustração das expectativas, pode produzir um retorno para a continuidade, o

Cíclico, o Periódico e Regular.” (Eco, op.cit., cap.5, 1994)

Sendo assim, estas repetições, em vez de perturbarem concepções de autoria,

originalidade, e outros valores, servem como um meio de afirmação desses

valores através do princípio da "variação". Com a mudança para a "variabilidade",

quanto mais explícita a conotação, mais o público pode esperar reconhecê-la e,

portanto, mais directamente se desempenha a nova instância contra o original.

As variações impostas pelo artista tornaram-se o foco crítico em relação à obra

original. Em vez de eliminar a autoria, ou mesmo criticar, o trabalho de remix /

apropriação enfatiza o papel do autor, e são justamente as diferenças (se

existirem) que são relevantes: “o papel do artista como autor não é minimizada

aqui, é maximizada. O artista restabelece posições tradicionais para ambos

artista e espectador: o artista domina, transformando um trabalho existente em

algo ‘novo’. “ (Betancourt,Michael op. cit., 2008)

Dessa forma, o trabalho tradicional estabelecido que está a ser objecto de

transformações é elevado em estatuto, e a apropriação do artista serve para

redefinir esse estatuto, enquanto os espectadores, cientes da convencional

variabilidade no centro da apropriação, reconhecem nas acções do artista uma

afirmação de uma posição dominante autoral sobre a obra original, bem como,

paradoxalmente, uma subserviência a esse trabalho.

Esta recombinação de imagens é uma das vertentes que costuma vincar os

trabalhos de VJing. Certo é que, para alguns VJs usar material apropriado pode

ter uma conotação política, quando falamos da sociedade de excessos. O que

encontramos hoje em dia é um exagero de diversificação, o que impulsiona a

reutilização do que está feito, em vez de se criar algo de origem. Neste sentido,

ao assumirmos esta sociedade de partilha e de recombinação, os direitos de

reprodução (copyright) continuam a vincar-se, embora distantes das barreiras

Uma Nova Expressão: O VJing | Cultura ou Subcultura | Práticas de Recombinação 35

Page 48: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

que procuram assumir. A barreira existente entre adquirir imagens e fazer uso de

imagens já existentes, é clara para alguns VJs. Nesta comunidade existem duas

perspectivas distintas. Para uns, usar trabalhos realizados por outros VJs é como

tirar algo que já foi mostrado numa performance ao vivo. Mas algo diferente é

por exemplo, apresentar excertos de um filme na performance, sabendo que

todos os que o contemplam, compreendem que os VJs ao usarem essas imagens

não estão a assumir que realizaram esse filme, mas sim, que apenas se estão a

expressar através dele. E esta é a fronteira entre adquirir algo e desenhar algo

inspirado no original. Por outro lado, alguns VJs não se vincam à propriedade dos

seus trabalhos, sendo cada vez mais frequente, que VJs coloquem o seu próprio

material na Internet para que outros possam fazer uso.

Para tal existe uma organização não lucrativa que permite expandir a quantidade

de obras disponibilizadas livremente e estimular a criação de novas obras com

base nas originais, recorrendo a um conjunto de licenças padrão que garantem a

protecção e liberdade. Estas denominam-se por Licenças Creative Commons –

com alguns direitos reservados. As Licenças Creative Commons situam-se entre os

direitos de autor (todos os direitos reservados) e o domínio público (nenhum

direito reservado). Têm âmbito mundial, são perpétuas e gratuitas. Através das

Licenças Creative Commons, o autor de uma obra define as condições sob as

quais essa obra é partilhada, de forma proactiva e construtiva, com terceiros,

sendo que todas as licenças requerem que seja dado crédito ao autor da obra, da

forma por ele especificada. Posto isso, alguns VJs recorrem a estas licenças para

partilharem os seus visuais pois assumem que tal pode ser uma forma publicitária

a si próprio, e a uma incitação ao aumento das comunidades de VJing. É certo

que, usar material existente acaba por ser significativo, pois é um requisito para

reutilização.

Copyright é portanto, uma ideia não muito exaltada em VJing, pois o seu papel é

a de misturar imagens, além disso as comunidades divulgam e partilham, e as

imagens adquiridas, são em género, modificadas e alteradas, arquitectando-se

diferenças perante a original. Contudo, em paralelo, as leis de copyright tendem a

ser mais restritas, o que faz com que este tipo de arte apropriada se torne mais

difícil e ilegal. Certo é, que nesta sociedade de informação estigmatizada pelas

extensões tecnológicas, a internet por exemplo, tornou-se o lugar mais vasto e

desorganizado de informação, sendo que, plataformas como e.g. o youtube,

proliferam a possibilidade de aquisição de vídeos, complicando ainda mais a

possibilidade de controlar este tipo de recombinações. Em regra, este vínculo

legal é controverso, contudo estamos na era das reproduções onde podemos

Img.18 Creative Commons icones

36 Uma Nova Expressão: O VJing | Cultura ou Subcultura | Práticas de Recombinação

Page 49: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

[1] Critical Art Ensemble (US)

fundado em 1987, é um

colectivo de 5 artistas

galardoados, dedicados à

exploração das intersecções

entre arte, tecnologia,

politicas radicais e teoria

crítica. Trabalham com

computer graphics, Web

design, vídeo, fotografia, text

art, book art e performance.

encontrar “variações ao infinito” como Umberto Eco refere. Este é o reflexo do

homem digital que desenvolveu coisas demasiado amplas para poder controlar.

O colectivo Critical Art Ensemble[1] acredita que "pode verificar-se que hoje plagiar

é aceitável, e até mesmo inevitável, no contexto da existência pós-moderna, com

a sua estrutura tecnológica". Eles sublinham, "um dos principais objectivos do

plágio é restaurar o fluxo instável e dinâmica dos sentidos, tirando fragmentos da

cultura e recombinando-os." (Ensemble 2001, cit. por Tordino, Daniela op. cit., 2007).

Nos nossos dias, é fácil aceder a ferramentas de vídeo e adquirir imagens, mas a

verdade é que, nesta controvérsia dos direitos de reprodução, experimentações

com imagens, quer sejam próprias ou adquiridas, é com o que os VJs geralmente

se ocupam. Existem alguns VJs que apenas misturam fragmentos de materiais

existentes, mas estes seleccionam e combinam imagens de forma a criarem uma

nova e apelativa coerência. Mas no fim, critérios de qualidade para os VJs estão

acoplados na arte de criarem imagens próprias, originais e em misturá-las.

Somente copiar imagens de diferentes fontes não costuma ser satisfatório para a

comunidade VJing. VJs que criam o seu próprio material são assim, geralmente

considerados. Mas certo é, que o importante em VJing é poder oferecer à

audiência uma experiência de algo novo, apelativo e satisfatório.

2.2.3. CONTEXTUALIZAÇÃO NO AMBIENTE: O CLUBE

A par da conceptualidade e irreverências da era digital em VJing, está a sua

contextualização espacial. A associação ao espaço tem se mostrado controversa

quando se considera VJing como uma prática artística. Ziv Lazar fala-nos de duas

culturas diferentes para VJing: a cultura dos clubes e a cultura de arte. A distinção

entre estas duas baseia-se irremediavelmente pela distinção dos espaços da

performance, uma para o bar ou discoteca e outra exterior às condicionantes dos

clubes, evidenciando outro tipo de performance. Na cultura do clube, o VJ está

directamente condicionado pelo som do DJ ou banda. O que se tem notado,

porém, é a crescente evolução do Vídeo Jockeying para fora do cenário do clube,

abrangendo outras disciplinas artísticas como a vídeo arte, arte performativa e

interactiva. Mas é ao clube, bar ou discoteca ao qual se associa frequentemente a

prática de VJing. Contudo, as filosofias destes espaços de entretenimento

parecem chocar ou pelo menos questionar a invocação de novas formas de acção

artística, ou de linguagens de expressão perante a ambiguidade que o clube como

contexto pode oferecer. Na cultura do clube, o papel do VJ é muito similar ao do

DJ num sentido em que ambos se envolvem numa performance ao vivo: o DJ

Uma Nova Expressão: O VJing | Cultura ou Subcultura | Contextualização no Ambiente: O Clube 37

Page 50: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

mistura musica e o VJ projecta visuais. As culturas dos clubes são caracterizadas

por oferecerem diferentes estilos musicais para diferentes tipos de cultura. Neste

ponto, o DJ é visto como o representante óptimo destas sonoridades, enquanto

que, o VJ é identificado pela simples função estética. O VJ como estereótipo é um

performer ao vivo que trabalha lado a lado com o DJ, misturando visuais ao ritmo

da música. Todavia, o VJing evoluiu patenteado, em norma, por uma presença

secundária, sendo possuidor de um potencial artístico que nem sempre é

valorizado. Isto acontece pelo contexto do clube, já que as pessoas são atraídas

para estes espaços para dançar e alienar-se, e não, numa primeira instância, para

ver arte ou prestar atenção à estética dos vídeos. Sendo assim, como validar

conceptualmente VJing perante este contexto?

Considerando a evolução de VJing nestes espaços, Ziv Lazar acrescenta que os VJs

“estavam a mostrar os seus trabalhos para as massas com pouco ou nenhum

criticismo artístico e por fazerem isso, eles organizaram naturalmente o

desenvolvimento de uma subcultura.” (Lazar, op. cit., 2008).

Em sociologia, antropologia e estudos culturais, uma subcultura é um grupo de

pessoas com características distintas, com comportamentos e convicções que os

diferenciam de uma cultura mais ampla da qual fazem parte. Por outras palavras,

são pequenos grupos ou uma cultura não totalmente desenvolvida, que cultivam

ideias similares relacionadas com um determinado factor. De acordo com Sarah

Thornton [1] "a palavra 'subcultura' [é] um sinónimo para as práticas que os

clubbers chamam de 'underground'. (Thornton, S., Club Cultures. Music, Media and

Subcultural Capital, 1996) Para completar, Hebdige [2] declara que uma subcultura tem

de ser identificada pelo seu próprio estilo e Ziv Lazar fala-nos da tecnologia como

um estilo: “Se temos de aceitar a alegação de Hebdige de que o estilo é o que

define uma subcultura, em seguida, usando a tecnologia como um estilo, o VJ está

a reivindicar a sua singularidade como uma subcultura. […] Ao utilizar a

tecnologia como um estilo do VJ, está-se a "vender" a cultura do clube para fins

de comercialização, originando assim em si uma pseudo subcultura.” (Lazar, op. cit.,

2008)

Para Ziv Lazar, VJing tem um potencial comercial e isso está irremediavelmente

ligado à tecnologia e à inserção de publicidade nos vídeos, mas para um artista VJ

faz mais sentido concentrar-se em criar um conteúdo que a audiência aprovará

em vez dos poderes comerciais que o VJing pode ter. Por outro lado Ziv Lazar

contrapõe, “a tecnologia não pode ser um estilo e o resultado é que o VJ não

definiu o seu estilo correctamente, e de acordo com Hebdige, não pode ser uma

subcultura.”

[1] Sarah Thornton (US, UK)

escritora / sociologista da

cultura. Os seus trabalhos

recentes são sobre clubes,

raves, hierarquias culturais e

subculturas na arte e no

mercado da arte.

[2] Dick Hebdige (UK) teorista

dos média/ sociologista.

M.A., Centre for

Contemporary Cultural

Studies de Birmingham,

United Kingdom. Centra-se

no estudo das subculturas.

38 Uma Nova Expressão: O VJing | Cultura ou Subcultura | Contextualização no Ambiente: O Clube

Page 51: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

A verdade é que “As culturas dos clubes comemoram tecnologias [...] e levam à

formação de novas estéticas e juízos de valor.” (Thornton, op. cit., p. 4) Mas, "Em vez

de festejar a convergência da tecnologia [...] devemos utilizar novos meios

tecnológicos como uma oportunidade para questionar os nossos conceitos e

modelos aceites em crítica." (Manovich, “The Language of New Media, 2001, p. 291) Através

destas opiniões, é perceptível que, é muitas vezes na falta de acesso a tecnologia

que surgem os trabalhos mais interessantes, pois a carência de tecnologia pode

ajudar na focalização e na construção de um processo criativo.

De qualquer forma considerar VJing como uma subcultura é uma controvérsia.

Certo é, que ao longo das últimas décadas os VJs querem vincar-se como artistas,

como criativos visuais, e enaltecer VJing como uma cultura. Esta necessidade é

uma exigência natural, visto que preparam performances cada vez complexas e

visualmente estimulantes. Mas para isso é indispensável compreender o valor do

VJ perante estes contextos. Um dos factores de contraste com outros tipos de

arte, é reconhecer que os VJs inventaram o espaço artístico em vez de se

converterem a uma galeria. Nos clubes, os VJs tem a oportunidade de fazer

chegar arte a diferentes pessoas, fora do contexto inerente das galerias. Além do

mais, os visuais, em regra, funcionam bem com o cenário de clube. O conteúdo

torna-se o centro do trabalho do VJ, e oferecer a estes espaços um ambiente de

estilo cinematográfico, é visto como um resultado satisfatório. O factor efémero

e único das performances, aliado à capacidade de estimular e conduzir uma

audiência com imagens, criando experiencias de sinergia e transmitir mensagens

para além de sensações, é um dos potenciais de VJing. É uma forma de expressão

poderosa, por permitir imersividade e proporcionar momentos gratificantes, quer

para o artista, pelo seu poder reaccionário, quer para audiência, pela experiência.

Os VJs abraçam a tecnologia e usam-na para se infiltrarem em novas práticas,

novos conceitos e novas ideologias. A tecnologia tornou-se o fio condutor por

detrás do Vídeo Jockeying pela necessidade de se explorarem novos métodos da

criatividade visual, o que fez com que o VJing se difundisse para outras disciplinas

artísticas encontrando pontos de convergência com outras culturas. Por outro

lado, ao se desvincular um pouco da tecnologia, pode-se assim oferecer uma

abertura para novos estigmas de performance, induzindo-se encontros entre a

imagem e mensagens, tal como uma obra artística. A necessidade premeia-se

então, em procurar alternativas estéticas e conceptuais, na criação de formas de

apresentação de VJing.

Uma Nova Expressão: O VJing | Cultura ou Subcultura | Contextualização no Ambiente: O Clube 39

Page 52: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

40

Page 53: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |3. DESCONSTRUÇÃO E ANÁLISE QUALITATIVA

Ao longo das últimas década as experiências em VJing têm proliferado, existindo

actualmente uma vasta dimensão de obras singulares. VJing é um acontecimento

efémero, que não se repete na sua integridade. Por tal, as sintaxes visuais devem

saber obedecer a esta variável mutável e orquestrarem-se com legitimidade no

espaço e na experiência. O que se demanda actualmente é um argumento que

assuma criticamente esta forma de expressão numa possibilidade ideológica.

Assumir VJing como arte e como parte integrante de uma cultura, deve atender a

um procedimento de consciencialização das suas potências e numa reformulação

do seu papel fruitivo na cultura audiovisual. Desconstruir esta actividade e

qualitativamente valida-la, adopta-se como uma tarefa necessária para a

compreensão da sua complexidade construtiva, pois é edificada em algo que

aparentemente parece menor do que o que na sua verdadeira acepção o é. VJing

é um complexo organismo que se delineia por uma vasta área de domínios, dos

quais se podem destacar os musicais, os conceptuais, os espaciais, e os

performativos possuindo intrinsecamente um conjunto de considerações sobre

ciência, tecnologia, psicologia, sociologia, filosofia, teoria da arte e teoria da

comunicação, que o englobam num intricado mundo de possibilidades. O que se

procura consagrar é a compreensão de que a arquitectação de distintas variáveis

Desconstrução e Análise Qualitativa 41

Page 54: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

em Vídeo Jockeying, possibilita a configuração de dissemelhantes propósitos e

sucessos performativos. Inclusive os praticantes de VJing estão a despegar-se de

questões ligadas a aspectos práticos da produção, e a interessarem-se por ideias

mais complexas de como e porque um determinado processo, por exemplo, se

reveste de significado para o espectador.

A cultura electrónica, presenteada por um carácter dinâmico oferece múltiplas

possibilidades criativas, pela facilidade de acesso a dados e pela aglutinação de

diferentes áreas criativas e tecnológicas como design, música, programação,

engenharia, etc. Esta multidisciplinaridade amplia as possibilidades de criação,

mas nem todos os VJs assumem estes recursos, pelo contrário, existe ainda um

longo caminho a exercer sobre o papel do VJ na cultura visual. Nick Currie [1] cita

VJ Ambrose White, que descreve dois erros comummente realizados por alguns

VJs: “Primeiro, eles baseiam-se num base de dados de imagens muito pequena, o

que faz com que loops familiares apareçam constantemente sem permitir um

progresso na experiência. Segundo, eles falham na criação de uma narrativa

coerente, com sentido e razão. Em VJing pode-se despender horas alterando e

alienando o espaço do palco. Isto pode ser divertido de produzir, mas para a

audiência é geralmente um insucesso […] A possibilidade de sucesso para os VJs é

a de produzirem algo fantástico, coerente e relevante.” (Currie, Nick; VJ Culture: Design

Takes Center Stage, 2005, p.5)

Como o VJ Ambrose White refere, existe uma indispensabilidade de se encontrar

um ponto de coerência e relevância nas construções visuais, e para tal é essencial

um processo de consciencialização sobre as potencialidades de VJing. O espaço

da experiência, as imagens em correspondência com os sons e o tecnicismo na

materialidade produtiva dos visuais, garantem ao trabalho dos VJs características

que indagam a sua exploração. Existem, porém alguns artistas performativos que

exploram as potencialidades da imagem de forma quase extrema, consagrando

diferentes obras, complexas e singulares. Mas será que existe uma ideologia

nesta cultura apelidada de “underground”?

Ideologia é um termo inventado por Destutt de Tracy, em 1796 em Project

d’Élements d’Idéologie, querendo significar ciência das ideias, o estudo

sistemático, crítico e erapêutico dos fundamentos das ideias. Genericamente,

erige-se num conjunto de ideias, pensamentos, objectivos, doutrinas e visões

particulares de uma temática por um indivíduo ou de um grupo encaminhado

para as suas acções sociais, sendo o seu principal objectivo o impulsionar de uma

mudança social, i.e., a ideologia é um sistema de ideias conexas com a acção,

exigindo uma estratégia para a actuação.

Os pensamentos ideológicos constroem-se por pensamentos abstractos, fala-se

[1] Nick Currie (UK) nome

artístico Momus. Autor/

Compositor/ Jornalista/

www.imomus.com

42 Desconstrução e Análise Qualitativa

Page 55: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

[1] Patricia Moran (BR)

Artista de vídeo experimental/

professora. Ph.D. Comunicação e

Semiótica, Universidade S. Paulo.

Esvolvida no estudo chamado “A

metáfora dos Sentidos” na

poética do VJ.

da realidade sobre um leve fundamento factual, pois prevalece a subjectividade,

onde as ideias são construídas, no caso de VJing, por um grupo. A comunidade

dos VJs tem uma estrutura híbrida, na qual subsiste uma divergência de

perspectivas práticas e teóricas, que torna complexa a caracterização da função

do VJ. Para alguns, o Vídeo Jockeying é apenas um momento de entretenimento,

uma circunstância agradável que se constrói com imagens para complementar o

espaço. Para outros, VJing é uma forma artística com fundamento crítico e um

complexo trabalho técnico e criativo. Dada esta ambivalente perspectiva, não

existe uma linearidade ideológica nestas comunidades, mas existe por parte de

alguns criativos e teóricos, a vontade de se elevar esta prática para um patamar

onde exista reconhecimento das suas idoneidades.

Posto isto, tomar consciência de domínios e idealizar conceitos apresenta-se

necessário para um possível progresso nas práticas de VJing. Primeiramente é

necessário compreender como se constitui VJing para posteriormente ser

desconstruído e analisado. VJing é um acontecimento ao vivo, que compreende

uma acção num espaço perante uma audiência, envolve-se com a música e

constrói-se em tempo-real, baseando-se em estímulos e sensações. Patricia

Moran [1] fala-nos da existência de pactos: “O mergulho [imersão] num livro de

ficção, num filme, numa exposição, num videojogo ou num trabalho de arte

interactivo pressupõe alguns pactos. Alguns priorizam aspectos ilusionistas,

outros a manipulação física e intelectual, outros um jogo ligado mais estritamente

à compreensão.” (Moran, Patricia; VJ Scene: Spaces With Audiovisual Score , 2009)

Esta noção de pactos assume-se como um conjunto de limites contextuais e

objectivos que impulsionam a uma aceitação subentendida dessa execução por

parte de um indivíduo. Como exemplo, VJing difere do pacto/situação do cinema.

“Situação do cinema” é o termo definido por Hugo Mauerhofer em 1983 em A

Psicologia da Experiência Cinematográfica. Este termo, procura resolver a

visualização especial do regime do cinema, determinado como o mais completo

isolamento do mundo exterior e das suas fontes de perturbações cognitivas,

captando a atenção da plateia e orientando-a para o filme.

Em VJing o espaço da performance visual é configurado através da promoção da

dispersão cognitiva. Ao negociarem com estas condições, as performances

audiovisual ao vivo estabelecem um regime de visualização que é praticamente o

contrário da “situação do cinema”negando a sua evolução histórica e valorizando

a construção inicial do cinema. Posto isto, o processamento em tempo-real das

performances visuais parece estar directamente oposto à dinâmica convencional

das imagens em movimento: o cinema. Enquanto em performances audiovisuais

Desconstrução e Análise Qualitativa 43

Page 56: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

ao vivo a imagem transforma-se no mesmo momento em que é criada, no cinema

a imagem (o filme) é gerado meses antes da sua instanciação, (durante a

projecção ), num processo complexo que vai desde guião à pós-produção, e pode

levar anos para ser concluído.

Contudo, por uma perspectiva prática, a diferença entre ambas as situações é

subtil. Projecções de filmes não são uma operação automática, mas um esforço

activo que exige grande conhecimento técnico pelo operador. Envolve mudança

de reels dos filmes, ajustar o áudio, monitorizar e corrigir as conjunturas da

imagem. O projeccionista, tal como o VJ, opera em tempo-real para transmitir a

mensagem. Num certo sentido, ele próprio é igualmente um performer, embora

com caris negativo: ele deve prevenir que o filme não perca coerência durante a

exibição. O VJ, por outro lado, apropria-se de uma performance positiva: ele cria

coerência através de particulares samples visuais.

Compreendendo esta diferença de pactos que VJing possui face a diferentes

formas expressivas que a ele parecem análogas e assumindo a compreensão das

directrizes que o constituem para se poder proceder a uma evolução crítica e

construtiva desta actividade, analisam-se nas páginas a seguir uma perspectiva

pelas variáveis correlatas que compõe VJing e o potenciam, nomeadamente VJing

e música, VJing e conceptualidade, VJing espaço e VJing performance.

3.1. VJING E MÚSICA

No contexto de VJing, as imagens e a música articulam-se no espaço da

experiência. As construções performativas visuais possuem intrinsecamente um

valor musical, i.e., assumem correspondências com a música, através da qual

originam a experiência total audiovisual. Ao se desconstruir a prática do VJ, é

imprescindível considerar a possibilidade de pensar a imagem em convergência

com o som. As sequências imagéticas são construídas para uma experiência

efémera e envolvem-se em ritmos electrizantes, em ostracizadas narrativas,

complementando assim, a filosofia experiencial dos clubes. No espaço articulado

audiovisualmente, “o som, os seus contextos espaciais e elementos visuais

tornam-se num só, criando um espaço multi-sensorial.” (Minard, Robin; Resonances:

Aspects of Sound Art, 2002) O objectivo de VJing é criar um outro ambiente, através da

recriação do espaço onde ele actua, sendo este espaço enredado pela mística dos

visuais.

As músicas dos clubes são cada vez mais abstractas, desenhadas por impulsos de

dança por parte da audiência. Os visuais, por sua vez, devem obedecer a esses

44 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música

Page 57: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

rítmos constantes, procurando impelir a experiência pulsante, orquestrando

coerência com o ambiente. De facto, "a audiência olha para espaços multimédia,

numa mistura de música, imagens e socialização." (Emmerson, 2001, cit. por Daniela

Tordino op.cit., 2007) Pensar em imagem e som, erigidos em separado e aglutinados

posteriormente num momento performativo, é pensar numa probabilidade

sinestésica. A entropia dos sentidos constrói-se em momentos congeminados em

tempo, pelas linguagens auditiva e visual, nos sucessivos encontros entre elas.

Falar de música, é compreender o princípio do som nas suas propriedades físicas

e semânticas, e é compreender igualmente, neste contexto visual, os graus de

proximidade com a imagem construída e manipulada em tempo real. A verdade é

que, em VJing existe uma proximidade formal entre ambos, já que se encara com

musicalidade a evolução das formas visuais no tempo. Musicalidade é assumir

ritmos, vibrações, tons, harmonias, construir sentidos figurados, melodias visuais,

i.e., é possível ‘ver’ a música. Este reequilíbrio constante performativo está

iminentemente ligado a noções de ritmo, tempo e sincronismo. Nestes ambientes

onde a prioridade é multissensorial, as imagens assumem-se com ‘sonoridades’.

"Uma vez que só existe no tempo, incluindo o tempo real e presente, a imagem

electrónica é pura duração, pura dromosphere, velocidade de inscrição,

mantendo-se, portanto, uma forte relação com a música, pela própria estética da

duração, do que com o as artes plásticas ou visuais." (Machado, Arlindo; Máquina e

Imaginário: o Desafio das Poéticas Tecnológicas, 1996, p. 55) Tomando a abordagem de que o

timing é o factor determinante para essa conexão, é preciso reforçar que "a vida

das imagens é directamente determinada pela duração das imagens, os seus

ritmos, frequências, as lacunas e outros sintagmas da linguagem musical."

(Domingues, Diana 1993; cit. por Daniela Tordino op. cit. 2007) Esta relação permanente entre

imagem e música estrutura e valida a performance visual, mas para melhor se

compreender estas convergências e possibilidades sinestésicas, é importante

reconhecer-se os conceitos de imagem e do som nas suas dinâmicas formas

construtivas.

3.1.1. A IMAGEM

Vivemos numa sociedade onde a informação e a cultura têm um tratamento

predominantemente visual. A comunicação contemporânea assenta numa

panóplia de imagens com características distintas, cujo crescimento desenfreado

dos meios de comunicação coloca em realce um carácter de imediatismo, de

aparente reflexo contemplativo e de duplicação da realidade. Em VJing, a imagem

é o centro criativo. É através dela que se expressam ideias e estímulos para uma

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | A Imagem 45

Page 58: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

audiência. Nesta civilização da imagem, subsiste uma duplicidade presente numa

inflação icónica que assenta na redundância, e por outro lado numa ocultação,

distorção ou manipulação de certas imagens, de tal forma que, estas em vez de

serem um meio para descortinar a realidade, ocultam-na. A imagética das

performances visuais, assume tal-qualmente essa dupla existência da sociedade

dos média, embora num contexto muito próprio. A redundância e a manipulação

são integralmente acedidas quando se fala em experiência efémera e de sintaxe

não linear na construção performativa dos VJs. Não existe um realce óbvio a um

conteúdo, mas existe um reforço da presença desse conteúdo, através do qual se

desconstrói a realidade por fragmentos e se mascara essa existência por

princípios estéticos, i.e., por efeitos visuais.

Quando se fala em imagem como parte integrante de um sistema cultural, está-

se a reportar a imagens estáticas e dinâmicas produzidas intencionalmente. Para

melhor se compreender este predomínio visual, é imprescindível falar-se sobre a

sua fenomenologia originária, ou seja, a luz e o processo da visão.

A luz na forma como a conhecemos é uma gama de comprimentos de onda a que

olho humano é sensível. Trata-se de uma radiação electromagnética pulsante, i.e.

corresponde a qualquer radiação electromagnética que se compreende entre as

radiações infravermelhas e as radiações ultravioletas, exibindo simultaneamente

propriedades de ondas e partículas. Isaac Newton (1643-1727) foi dos principais

teóricos e cientistas a demonstrar de forma clara e precisa, que a luz branca é

formada por uma banda de cores (vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, anil e

violeta) que podiam separar-se por meio de um prisma, estudando igualmente os

seus fenómenos de refracção, reflexão e dispersão. O fenómeno da luz, implica a

existência da visão, e com base nas propostas realizadas por Imbert (1983), Henry

(1983) e Blackmore (1973), o processo de visão centra-se na interacção entre o

conjunto das superfícies físicas e o seu comportamento na absorção ou reenvio

da energia luminosa, e na captação pelo olho humano, da luz que chega dos

objectos que se encontram no campo visual. O olho humano (córnea, cristalino,

íris e pupila, humor aquoso e vítreo, retina) constitui um canal fisiológico e é o

meio natural de passagem entre a emissão de uma mensagem e sua sensação

resultante. A imagem, em si, é o resultado de um estímulo luminoso que afecta

os nossos os olhos. Aquilo que vemos, é na realidade, uma imagem formada no

cérebro a partir deste estímulo, sendo portanto o órgão cerebral, o responsável

pela interpretação do estímulo do qual temos consciência. Embora limitada a

percepção visual, esta é uma percepção vibratória, tal como o som, e faz parte do

mesmo paradigma. Assim, a percepção de formas e cores está profundamente

associada à luz. Em termos físicos, a forma mais simples de definir esta instância é

Img.19 Prisma Óptico

46 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | A Imagem

Page 59: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

considerar a unidade de frequência, o Hertz (ciclos por segundo). A luz é medida

por esta unidade, e o número de vibrações da onda luminosa por segundo

determina a tonalidade da luz, ou seja, a sua cor. Por sua vez, a amplitude da

onda determina a intensidade dessa mesma luz.

Em todo o acto perceptivo está assim implícito, um sujeito com a capacidade de

percepção enquanto Ser histórico e cultural. A teoria da percepção enfrenta

portanto,uma problemática de condicionalismos culturais. Estes condicionalismos

culturais estabelecem normas associativas aos produtos visuais e formatam

determinadas construções visuais. Umberto Eco, em 1984 na sua publicação

Semiótica e Filosofia da Linguagem mostrou como a percepção do espectro

cromático está baseado em princípios simbólicos, ou seja culturais. Para Eco a

percepção situa-se entre a categorização semiótica e a descriminação baseada

em processos sensoriais. O Ser Humano tem grande capacidade para descriminar

as cores mas grande dificuldade em categorizar as fronteiras entre as mesmas.

Para se resolver esta discrepância e torná-la operativa, cada cultura adequa a

valorização do espectro cromático às necessidades da vida prática que assentam

em princípios culturais simbólicos.

A partir do momento em que se entende a percepção como um processo activo,

próprio ao ser humano, não se pode deixar de parte a relação existente entre

estruturas cognitivas e o espaço onde estas actuam. No contexto das artes é

necessário pensar em imagem estética, a qual se apresenta ao espectador e que

sem dúvida possui instâncias sensíveis muito mais abrangentes que o simples

estímulo visual. Quando observamos um produto estético, o estímulo visual é na

verdade uma pequena parte de um processo, uma fonte de conhecimento que

pertence a uma enorme e intrínseca ‘rede’ de informações e cujas relações se

estabelecem mentalmente no espectador. Neste caso, em VJing, existe uma

presença estética bastante vincada e nesse jogo frenético de imagens, propõem-

se sensações ao espectador, i.e., a imagem funciona com um pendor sensorial

mais do que um simples processo de visualização. Em VJing, o sentido cultural e

artístico estão vagamente determinados, de qualquer forma, as construções

visuais desenvolvem-se perante condicionantes do próprio meio, formatando a

imagem em movimento para uma não linearidade e para uma presença estética e

espacial. A forma de percepção da audiência é assim determinada por encontros

casuais e não por um olhar fixo imersivo na imagem como acontece, por

exemplo, com o cinema.

A interpretação da realidade é sempre modificada por quem a cria, pela técnica e

pelo ponto de vista do observador. Falar em imagem, em particular da imagem

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | A Imagem 47

Page 60: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

estética, é considerar um amplo número de possibilidades representativas e

criativas. As imagens podem representar coisas que existem na realidade como

outras que nunca tiveram entidade total. Há imagens no entanto que detêm um

significado óbvio e único, que não oferecem ao espectador outras possibilidades

de leitura do que aparece representado. Estas imagens denominam-se por

monosémicas. O que acontece, normalmente, é que recorre-se a imagens

polissémicas pensadas previamente, que proporcionam diferentes interpretações

de acordo com o grupo social que as recebe. Por sua vez, o poder evocativo de

uma imagem não é o mesmo para todos, em linha de conta estão experiências e

contextos próprios a cada pessoa, incluindo as condicionantes culturais, fazendo

que cada uma delas receba essa imagem de forma diferente.

Na sociedade cultural, a imagem criada condiciona a percepção da realidade

possuindo intricadamente qualidades próprias definidas num acto conceptual.

Falar de imagem estética implica assumir sensações e emoções, que se podem

potenciar pelo vínculo com o som, erigindo sinergias.

3.1.2. O SOM

Na sociedade moderna, os produtos originados sonoramente pela realidade

tecnológica e digital proliferam constantemente. Quando se considera o contexto

de entretenimento, em particular os clubes e eventos análogos, é praticamente

inexequível não se cogitar na presença sonora. A cultura dos clubes em específico

cria essa aura mística devido ao tipo de sonoridade abstracta e energética que

oferece ao público. Estes novos sons tecnológicos possuem uma particularidade

relevante na estrutura da performance em VJing. É cada vez mais frequente que

os músicos produzam a sua música a partir da digitalização, amostragem e da

reordenação de sons, algumas vezes trechos inteiros, previamente obtidos do

stock das gravações existentes. Em geral, a presença predominante é a da música

electrónica, que é toda a música criada através do uso de equipamentos e instru-

mentos electrónicos como sintetizadores, gravadores digitais, computadores,

software de composição. Recentemente, a popularidade crescente da música

electrónica, levou um renascimento da Musica Concreta.

Nos ambientes sonoros dos clubes, predomina porém a música electrónica. A

música electrónica é toda música que é criada ou modificada através do uso de

equipamentos e instrumentos electrónicos, tais como sintetizadores, gravadores

digitais, computadores ou software de composição. Perscrutando neste sentido,

Marco Costa em Electrosonoro, Electrovisual: Contributo Para o Estudo e

Compreensão do Ambiente Audiovisual Em Aplicações Reactivas (2007) fala de

48 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | O Som

Page 61: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

um certo tipo de música electrónica que se constrói por um fractal sonoro,

seguindo os princípios da retroalimentação, auto-organização e auto

similiaridade. Este tipo de música electrónica é aqui relevante, já que os seus

princípios, possuem de certo modo valores similares ao que acontece com os

fractals de VJing, i.e., os loops.

Neste tipo de composição musical electrónica, a retroalimentação consiste no

princípio de que cada música final é usada como matéria-prima para a

composição das próximas, pois a gravação deixou de ser o principal fim ou

referência musical. A auto-organização vem da ideia de que não existe um

‘músico’ que faz a composição na íntegra, mas sim um colectivo de pessoas que

se alimenta do stock musical existente. Cada um é ao mesmo tempo produtor,

transformador, autor, intérprete e ouvinte num circuito instável e auto-

organizado de criação cooperativa. Por fim, a auto-similaridade baseia-se na não

existência de uma ‘música final’, mas sim referências intermediárias num fluxo

contínuo em circulação na vasta rede ‘tecno-social’. Essa matéria é misturada,

organizada, transformada e depois materializada na forma de uma peça nova no

fluxo de música digital em circulação. Com esta dinâmica da música electrónica,

surgem diversos géneros musicais como Techno, House, Trance, Acid, Drum ‘n’

bass que constituem as sonoridades vibrantes da actualidade. Posto isto, o som,

tal como o vídeo, é uma forma expressiva que recria um ambiente e apela às

sensações. Como Robin Minrad refere, “liberto o som do seu contexto original,

criou-se uma estrutura onde o som é um novo material para o artista, um ser

moldado com todas as formas abstractas do processo criativo." (Minard, Robin op. cit.

2002, p.48) Esta particularidade criativa dos novos artistas sonoros, aliada a um

espectáculo visual, é o que institui o cenário desta cultura “underground”.

Ao falar-se de música, é necessário compreender o acontecimento sonoro, i.e., as

suas propriedades fisiológicas. O som, assim como a luz, chega igualmente ao

cérebro através de um canal transmissor, o ouvido. Este é responsável por

estabelecer uma conexão entre a vibração externa, que acontece dentro do seu

limite de percepção, e o cérebro. Usualmente referimo-nos ao som audível, que é

a sensação de uma pequena e rápida variação na pressão do ar acima e abaixo de

um valor estático, i.e., a pressão atmosférica. Contudo, o campo sonoro difere do

campo visual. Em primeiro lugar, o campo sonoro faculta um nível de envolvência

superior ao campo visual. Devido às nossas características perceptivas, o nosso

ângulo de visão limita-se a um máximo de 180 graus. Por outro lado, a nossa

amplitude auditiva possibilita-nos a captação de sons a 360 graus.

O som, tal como a imagem, caracteriza-se pela sua natureza vibratória expondo

semelhanças do ponto de vista da frequência. Utilizando a mesma medida (Hertz)

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | A Imagem 49

Page 62: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

no caso do som, a frequência em Hertz determina a altura deste, ou seja, a nota, e

a amplitude da onda a sua intensidade. Genericamente, o som é particularmente

definido por 4 características elementares: Intensidade, Altura, Timbre e Duração.

A intensidade em som e em luz é comparativamente diferente, já que, quanto à luz,

para intensidades diferentes de uma mesma frequência podem considerar-se cores

diferentes, o que já não acontece com a música, pois a nota, até ao limite auditivo,

é reconhecida como sendo a mesma, qualquer que seja a sua dinâmica.

Relativamente à altura, uma nota pode ser percepcionada com exactidão pelo

ouvido, por sua vez a frequência da luz i.e., a sua cor, não pode ser detectada com

essa rigor pelo olho humano, pois a frequência electromagnética da luz é muito

menor e mais subtil do que a mecânica do som. O mesmo se aplica à sobreposição

de cores e de sons. Na onda mecânica sonora, é possível identificar a

simultaneidade de frequências sobrepostas e com alguma prática, consegue-se

determinar com precisão as notas que compõe determinado acorde. Na luz não é

possível determinar com exactidão as cores nas suas intensidades e frequências

concretas que compõem uma mistura cromática. Isto deve-se ao facto de diversas

combinações de cores poderem resultar numa mesma cor predominante, além

disso, não vemos a sobreposição delas mas, sim apenas o resultado total dessa

combinação.

Da mesma forma, a luz não possui timbre. O Timbre é a “cor” do som. Cada objecto

ou material possui um timbre que é único, assim como cada pessoa possui um

timbre próprio de voz. A luz por sua vez, neste fluxo de comparação, possui

qualidade de luz. A qualidade de luz é o termo utilizado para definir a fonte

emissora, podendo ser suave, produzindo sombras ténues ou ser ‘dura’ produzindo

sombras acentuadas. Sendo assim, sabemos que a imagem é produto de um

estímulo luminoso, e o som produto de vibrações mecânicas que se propagam num

meio, sendo, portanto, distintas em essência, mas, apesar disso, muito

semelhantes quanto à manifestação.

As imagens e os sons justapõem-se frequentemente em tempo, criando produtos

sinérgicos. O som assume diversos papéis no audiovisual transmitindo variadas

sensações ao espectador. Enquanto que, o espectador é capaz de distinguir os

vários elementos visíveis de uma imagética, com o som não consegue ser tão

analítico. O som é percepcionado como um todo agindo de forma subliminar. É

esta incapacidade que, correctamente manipulada induz sensações e envolvência

emocional ao espectador. Em VJing, embora não exista um ininterrupto vínculo

entre a criação visual e a música, existe porém a similaridade de construção, isto é,

ambos se articulam por ritmos e fragmentos que sobrepostos induzem a uma

experiência temporal. A equação emocional do som traduz exactamente este

50 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | O Som

Page 63: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

aspecto. Algumas frequências sonoras, por sua vez, induzem sensações mais

concretas, e.g., frequências baixas têm um impacto mais dramático, propiciando

sensações de e.g. ameaça, força, perigo, do que as frequências altas.

Som é vibração e ritmo, e em VJing tal como as imagens, o som é aquele que

desenha o espaço, com a música electrónica. Imagens e sons relacionam-se

constantemente, dai ser necessário pensar em correspondências e convergências

para que se consiga responder às suas mais variadas potencialidades.

3.1.3. IMAGEM E MÚSICA: CONVERGÊNCIAS

Nesta era digital, a ligação entre o mundo sonoro e o visual vive numa segura

proximidade e multiplicidade. Pensar em imagem sem som, em particular em

imagem em movimento, é agora quase inconcebível. As sinergias entre estas

duas disciplinas são demasiado vincadas, de tal forma que, quando aglutinadas

constroem complementaridades e experiências singulares. Historicamente,

apesar da separação entre áudio e visual que os média impuseram numa fase

inicial, sempre existiu uma vontade de se fazer corresponder som e imagem,

como nas experiências de color music, visual music, no cinema experimental e na

videoarte, mas agora, qualquer barreira ou dificuldade na sintetização de sons e

imagens desapareceu no advento da tecnologia digital, flexibilizando as relações

intermedia entre som e imagem, que os artistas e pioneiros procuravam.

Uma das questões transversais a esta procura de relações entre som e imagem

prende-se com a tentativa de estabelecer uma correspondência ‘absoluta’ entre

audição e visão, levando muitos artistas a procurar um fundamento na física ou

na psicologia da percepção. No entanto, os sistemas desenvolvidos aproximam-se

invariavelmente da subjectividade sinestésica, fazendo com que cada artista

desenvolva os seus próprios parâmetros de correspondência sensorial. Falando

em VJing, a imagética, por sua vez, funciona numa formalidade abstracta, o que a

faz corresponder ao som. Certo é que, a exploração de uma paridade sensorial

começou a ganhar relevância no aparecimento da abstracção visual, quando o

abandono progressivo da figuração conduziu à procura de uma linguagem

‘universal’ da forma abstracta, inicialmente aproximando a pintura da música,

hoje em dia aproximando o objecto visual dinâmico das sonoridades eléctricas.

Nas artes audiovisuais realizadas ao longo do século XX existe no entanto uma

orientação paralela ao tipo de analogia e harmonia que Castel configurava. Essa

orientação relaciona-se com a noção de correspondência sensorial: a tentativa de

traduzir graficamente o som, de produzir uma marca ou materialização visual da

sonoridade. A perspectiva de ‘visualização’ do som particulariza assim, a procura

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | Imagem e Música: Convergências 51

Page 64: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

de equivalência sensorial em algo que implica a transformação física de um

medium no outro através de meios eléctricos. Esta orientação está na génese das

explorações intermedia, que se diferenciam da mera coexistência audiovisual,

evidenciando a noção de conversão entre som e imagem, segundo uma possível

reversibilidade, i.e., a materialização do som em forma visual e o uso destas para

produção de fenómenos sonoros. Esta noção de intermedialidade implica a ideia

de uma equivalência entre fenómenos, associada à exploração técnica em torno

da conversão e ao fascínio da visualização do som. Em VJing, essa estruturação

visual do áudio pode ser realizada por momentos sinestésicos performativos, ou

de uma forma mais linear através de tecnologias que ‘desenhem’ o som.

A verdade é que, nas experiencias performativas dos novos artistas digitais, em

especial em VJing, essa proximidade formal entre a imagem e o som é bastante

delineada, seja em termos conceptuais ou performativos. A luz e o som, ambos

são frequência, e como Arlindo Machado refere, os " padrões de estimulação de

retina são muito semelhantes aos padrões rítmicos da música". (Machado, A televisão

Levada a sério, 2000). Certo é que, a arte de Vídeo Jockeying está profundamente

ligada à linguagem musical, quer na sua origem, como no processo de elaboração

de imagens, na interface do software, no acto de colar as amostras e misturá-las,

assim como na capacidade de reconstruir o espaço presenteando-lhe uma

ambiência particular.

O cineasta francês dos anos 20 Marcel L´Herbier definiu o cinema como a “música

da luz”. A cena electrónica dos VJs produz a música da luz na raiz, ou seja, a luz

estimulação-cor, a luz-matéria que sofre refracção no encontro com os corpos

físicos, humanos ou não. A imagem luz que diluída no ambiente é rebatida ganha

poderes semelhantes ao som, é vista e sentida mesmo quando não olhamos para

ela directamente. É a imagem-luz para ser lida num regime de visibilidade que

pode ou não incluir significados, é em suma, uma luz estímulo. Os sons por sua

vez ganham uma materialidade visual.

Cada época tem uma cultura visual, um regime de visibilidade, a nossa inclui a

audiovisão. Audioimagem, audiovisão, visuaudição, síncrese, extensão e

temporalização são ideias propostas pelo teórico, professor, compositor e

realizador francês, Michel Chion, numa série de trabalhos que culminam na obra

L’audio-vision em 1991. Falamos da áudio-imagem quando algo que acontece

fora do ecrã, mesmo fora do espaço físico onde tudo é ajustado, algo externo aos

elementos que se compõem, algo que ao acontecer, interfere no espaço mental

de quem quer que esteja a realizar uma interacção. Este fenómeno que Michel

Chion define como síntese do audiovisual, ganha autoridade e é explorado por

ser uma construção puramente mental.

52 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | Imagem e Música: Convergências

Page 65: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

O som traz constantemente, ao longo de uma série de efeitos, os sentimentos e

os significados de como um fenómeno é atribuído à imagem parecendo

‘naturalmente’ pertencer a essa imagem. A definição do audiovisual é proposta

pelas circunstâncias onde a percepção é focalizada conscientemente sobre o

audível e em cima do qual o contexto visual aplica uma influência predominante,

enriquecendo ou deformando a percepção. A condição do audiovisual como

consequência dos sons e das imagens combinados não se pressupõe à posteriori,

pois a sua percepção é diferenciada. Os sons e as imagens combinados são

percebidos como uma organização do espaço-tempo. A imagem tem na sua

natureza o espaço enquanto o som tem o tempo.

O trabalho com múltiplas projecções dos VJs e com um fluxo e pulsação de

imagens, de gráficos e de luzes é mais próximo do videoclipe do que do cinema

figurativo. Tanto a evolução da imagem quanto a sua vinculação directa com o

som, no sentido de acompanhar ou ser por ele acompanhado, diz respeito a

outro regime audiovisual. Arlindo Machado aponta caminhos para pensarmos

esta cultura como tendência da produção contemporânea na qual a sua estrutura

não é imagem ou som, só pode ser entendida em termos do audiovisual, ou por

uma “estrutura motovisual”: “As imagens do [vídeo] clipe têm sido tão

esmagadoramente contaminadas pelas suas trilhas musicais, que acaba por ser

inevitável a sua conversão em música, isto é, numa calculada, rítmica e

energética evolução de formas no tempo. Nesse sentido, pode ser muito útil

observar como o [vídeo] clipe está a evoluir de um mero adendo figurativo da

música para uma estrutura motovisual que é, ela também, em essência, de

natureza musical”. (Machado, op. cit. 2000, p.178)

Esta “estrutura motovisual” está profundamente ligada com as noções de ritmo

consagradas por imagem e som. Estando directamente associado ao movimento,

o ritmo é uma sequência de eventos temporais justapostos que criam uma

unidade métrica, que pode ou não ser repetida. A ideia de ritmo é bastante

abrangente e pode ser analisada de diversas formas, desde a organização do

movimento, até às sensações temporais. De qualquer forma, o ritmo interessa-

nos aqui pela correspondência directa que exerce sobre os movimentos visuais. É

segundo uma perspectiva de ‘unificação’ sensorial que Michel Chion na sua obra

Le Son (1998) classifica o ritmo como uma forma de “trans-sensorialidade”, que

diferencia da “inter-sensorialidade” ou do simbolismo que pode regular uma

correspondência entre sentidos. A trans-sensorialidade é relativa a uma

percepção que se define de forma una e partilhada entre os diferentes domínios

perceptivos, implicando todos sentidos mas transcendendo-os. Os sentidos são

assim considerados como veículos de uma sensação que transcende a sua

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | Imagem e Música: Convergências 53

Page 66: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

especificidade. O ritmo pode então considerar-se uma forma de trans-sensoria-

lidade, a principal conforme Chion, bem como as sensações tácteis, de matéria e

textura. Esta abordagem trans-sensorial torna-se útil para a compreensão de

possibilidades de articulação entre som e imagem que jogam com uma

consciência de equivalência sensorial produzida por ambos os estímulos, mas que

ao mesmo tempo os transcendem numa percepção unificada. Embora o ritmo

tenha natural afinidade com a imagem e movimento, não apenas pela própria

afinidade temporal que partilham som e imagem, está também presente nas

imagens estáticas. O ritmo é igualmente responsável pela dimensão temporal de

uma obra. Tanto na arte electrónica como na música, a disposição rítmica é um

factor de relevância ímpar, que acrescenta ou diminui a sensação de tempo do

espectador/ouvinte. DJs e VJs constroem um conglutinado rítmico sonoro e

visual. Pode haver complementaridade, quando os dois funcionam em ritmos

semelhantes, ou ao contrário cada um dos dois segue caminhos próprios e em

alguns momentos cruzam-se. Este é a “estrutura motovisual” desenhada pela

sincronia e/ou assíncronia. Como as manipulações das imagens e dos sons se

proporcionam ao vivo, é a partir do jogo entre os dois que acontece a montagem,

que estabelece o ritmo como um todo e se desenha um espaço.

Existe uma assinalada ligação entre um objecto fílmico, como o cinema ou vídeo,

e a junção de áudio. Em audiovisual, existe a capacidade de se estabelecerem

relações entre imagem e som através da síncrese. A síncrese, por si, permite que

as imagens em movimento sugiram corpo e presença espacial. A noção de corpo

está associada à massa do objecto, enquanto que, a presença espacial está

associada à localização no espaço fílmico. A expressão material do objecto é

devidamente percepcionada quando, mentalmente, se funde aquilo que ouve

com aquilo que se vê. Em VJing, por sua vez, não existe essa linearidade, embora

se possam construir momentos em que a imagem sugira a sonoridade que está a

ser ouvida, por exemplo, o VJ pode usar imagens de um DJ a fazer scratch no cd, e

nesse preciso momento o DJ estar realmente a fazer tal. Aqui existe a síncrese, a

junção do áudio e da visão.

Som e imagem não podem ser pensados separadamente, são simultâneos e

interligados, são audiovisão. A imagem parece musical, a música soa visual.Somos

sugeridos para momentos onde a sinestesia predomina. As convergências entre

imagem e som, constituem assim, as experiências audiovisuais oferecidas pelas

novas produções performativas artísticas, tal como em VJing. As artes do espaço

e as artes do tempo convergem-se assim, em novas formas artísticas integrais

fazendo com que as linguagens estéticas se concentrem perante os fenómenos

perceptivos e respectivos sentidos por estes convocados.

54 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | Imagem e Música: Convergências

Page 67: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

3.1.4. SINESTESIA EM VJING

A sociedade contemporânea apresenta e oferece uma extensa gama de produtos

audiovisuais, porém integra as suas linguagens constituintes em diferentes níveis

de resolução. Na Era denominada da Imagem, assistimos e escutamos a

diferentes formas de relação entre som e imagem: em alguns casos a submissão

dos sons à imagem, em outros o domínio do som. Para além destes, existem

outros onde predomina o diálogo entre essas expressões. Ao considerar-se estas

relações entre música e som é possibilitar construções sinestésicas. Sinestesia é

uma figura de estilo ou semântica que relaciona planos sensoriais diferentes e.g.

visão com a audição, visão com tacto, i.e., uma série de fenómenos provocados

por uma condição neurológica. De uma forma geral, baseia-se numa sensação

secundária que acompanha uma percepção, ou seja, uma sensação num lugar

originário de um estímulo proveniente de um outro estímulo. Este processo de

englobar um conjunto geral de percepções e sensações interconectadas por

processos sensoriais, está presente nas performances de Vídeo Jockeying, e por

tal é elementar compreender qual o seu potencial.

A sinestesia baseia-se na Teoria da Correspondência, neste caso, das artes. A

verdade é que, em questão é praticamente impensável a pureza em arte, um

sistema semiótico comporta várias vertentes, sendo que, a intermédialidade é

uma tendência de trabalhos mais complexos. Como o filósofo, Etienne Souriau

disse “os dados sensoriais de que se servem as artes, nunca chegam a uma

purificação de fato, a um isolamento prático daquele jogo de qualia. As cores do

quadro têm formas, diferentes de luminosidade e mesmo relações com os valores

tácteis evocados pela manipulação do pigmento colorido. O corpo do dançarino

em movimento não é puro caleidoscópio de atitudes, deslocamentos suaves,

transferências no espaço. ” (Souriau,1983 cit. por Moran, Poéticas das Correspondências, 2009)

Esta “impureza” da arte como compiladora de correspondências entre outras

artes, esta presente em VJing. A imagem tem um forte poder icónico, sugerindo

sensações diversas, dependendo do que representa, além disso, baseia-se em

movimento e ritmo, logo possui características musicais. O som, por sua vez,

pode sugerir imagens, cores, dependendo da sonoridade e das suas frequências

baixas ou altas. O compositor Richard Wagner, por sua vez, no pequeno e clássico

artigo-manifesto de 1849 The Artwork of the future defendia o drama como uma

forma de arte completa, i.e., atingir todos os sentidos, promover uma experiência

estética integral pela afectação sensória e inteligível de todos os sentidos. Richard

Wagner solicita para si o legado sinestésico, nele o múltiplo está no uno, cada

obra, cada arte corresponderia a todas as outras desde que atinjam os sentidos

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | Sinestesia em VJing 55

Page 68: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

como um todo. Logo, existe uma vontade de se consagrar uma obra “absoluta”,

consagrando todos os sentidos, oferecendo assim uma experiência bastante rica.

Aqui, sons, imagens, cheiros, tacto e paladar estão misteriosamente correlacio-

nados, sendo esta ligação intrínseca à natureza das coisas, potencialmente

perceptível pelo ser humano. Há uma evolução de cores, formas e ritmo no

tempo, seja ele através de palavras, imagens e sons ou todos simultaneamente.

Se o campo sonoro e o campo visual contêm uma natureza vibratória, eles estão

sujeitos a leis semelhantes, como por exemplo: reflexão, refracção, absorção,

transmissão, difracção. Estas características são apenas plausíveis de serem

observadas em movimento, ou seja, em plena manifestação sonora ou luminosa.

Esta condição é muito importante para se considerar a questão temporal que é

comum entre ambas. No caso das imagens em movimento podemos encontrar

uma arte sem tema, onde prevalece o ritmo e o deslocamento. Neste exemplo a

correspondência está no trabalho audiovisual em si. Portanto, para se pensar em

VJing, é preciso considerar a proximidade formal das suas imagens à música. São

imagens musicais tanto pelo ritmo como pela tendência à abstracção. O que

acontece em VJing é isso mesmo, existe essa actuação em tempo, em duração e

ritmo, compondo a linguagem da performance. O papel do VJ, neste sentido, é de

poder oferecer a tal experiência gratificante ao espectador, pelo que, ao construir

momentos sinestésicos, consegue que a sua obra se enquadre na densidade

espacial e musical, ministrando sensações ímpares.

Sendo assim, como se pode realmente invocar esses momentos de sinestesia na

performance? Uma das possibilidades por parte do VJ, através da orquestração

de ritmos, é de propiciar ao espectador ‘ver’ sons. Na manipulação imagética ao

vivo, é possível optar por um sincronismo musical, consagrando complementari-

dade, mas por outro lado, é possível inserir ritmos assíncronos com a música, no

sentido de proporcionarem a sensação de se estar a ‘ver’ ritmos que não estão

presentes na música, mas que são ‘tocados’ pela sequencia imagética ritmada

pela mão do VJ. Quando se fala em algo assíncrono, isso não impede que a

imagem e som não se encaixem em ritmos, apenas não estão os dois a desenhar-

se em simultâneo, mas a funcionarem num jogo. A relação de ritmo de ambos os

média, é o que possibilita as suas potenciais correspondências ao vivo. Outras

possibilidades sinestésicas patenteadas pelos VJs prendem-se com o conteúdo

visual das suas performances. As imagens têm um forte poder sugestivo, em geral

consagram uma tendência à abstracção, daí induzirem a musicalidades. Contudo,

optando por imagens que saibam confundir os sentidos, sejam elas abstractas ou

concretas, garante-se assim um envolvimento do público em estímulos.

Img.20 Ritmos musicais e visuais

numa possibilidade sinestésica

de “ver” a música.

56 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | Sinestesia em VJing

Page 69: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

A sinestesia oferece assim, possibilidades construtivas às performances

audiovisuais. Articular imagem e música é concretizar experiências mescladas em

capacidades criativas para os performers, e em sensações gratificantes para a

audiência. No entanto, existem outras características que se podem assimilar e

que suprem sensações semelhantes, ou seja, agrupamentos paradigmáticos

comuns segundo a organização física manifestada. São instâncias materializadas

tais como: cores, timbre, contraste, dinâmica, forma, ritmo e harmonia.

“A harmonia dentro do campo da sinestesia pode ser vista de duas formas distin-

tas mas que se relacionam. A primeira advém do campo científico que combina

frequências sonoras e actua também no espectro cromático pelo mesmo modo. A

segunda liga-se ao sentido pitagórico de harmonia, usado e recalcado por

filósofos e teóricos da arte, com o objectivo de designar as combinações entre

elementos que compõe uma obra e determinam a sua razão, conteúdo, equilíbrio

e forma.” (Costa, Marco op. cit. 2007) Neste ponto, o valor não depende apenas da

manipulação e do ritmo ao vivo, mas sim equitativamente das considerações do

acto conceptual.

Gene Youngblood no seu Expanded Cinema fala-nos igualmente da expansão dos

sentidos como um estágio de consciência. Mas para ele, a sinestesia pode até

acontecer nas experiências dos artistas, mas um dos princípios destes trabalhos

de experimentação é o jogo com os materiais do fazer, sejam eles a palavra, a

imagem, a música, o movimento, etc. Não está na sinestesia, mas no trabalho

formal, na exploração da estrutura constitutiva da organização expressiva, a

capacidade de oferecerem uma boa experiência. Nesta perspectiva, a prioridade

não é sinestésica, mas obedece sim à capacidade construtiva desses mesmos

materiais, e na sua articulação. Por tal, nesta temática do VJing, é igualmente

importante compreender o processo conceptual e performativo, para a

construção do espaço da experiência, i.e., a sua investigação artística através da

exploração da materialidade dos seus meios expressivos e das relações formais

do seu fazer.

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Música | Sinestesia em VJing 57

Page 70: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

3.2. VJING E CONCEPTUALIDADE

A concepção prévia da imagética em VJing é talvez o ponto central de toda esta

actividade. VJ é um fluxo de imagens que cintila em velocidade, em tempo e

ritmo no espaço, que constrói micro-narrativas por associação. A organização

desses visuais deve ser uma prioridade, já que “ *…+ bons visuais funcionam

melhor em sequência, em contexto. As imagens podem estragar-se mutuamente

se forem mostradas de forma incorrecta, em combinação com temas conflituosos,

cores e estilos.” (VJ Anyone cit. por D-Fuse, VJ Audio-Visual Art + VJ Culture, 2006, p. 84) Por tal,

é essencial predefinir uma estética, um conteúdo, e um objectivo para construir

sensações e potenciais mensagens. A conceptualidade é uma consecução de uma

consciência criativa perante o papel expressivo de uma forma de arte. Definir

uma temática, organizar uma fronteira estética, compreender a linguagem de

composição da prática de VJing, são conhecimentos que determinam o sucesso

de uma sessão performativa.

As imagens, manipuladas e tratadas ao vivo, estabelecem temporalidades pela

evolução de formas. Bancos de dados alteram-se soltando sequências de imagens

digitalizadas, geradas no computador, gravadas, capturadas da Internet, etc.

Certo é que, o fluxo digital de dados dos meios de comunicação proporciona uma

inesgotável fonte de material, que está disponível para ser usado e manipulado.

Isto sugere um incerto aspecto final do vídeo, pois o vídeo é uma quimera que

pode assumir muitos aspectos, já que é de natureza mutável. Em 1980 Bill Viola[1]

registou nas suas notas “Não tem começo/ Não tem fim/ Não tem duração – O

vídeo como mente”. (Viola cit. por Sylvia, Martin op. cit. 2006) O conjunto da imagética

criativa provém assim, do acesso a diferentes recursos (independentemente da

questão da apropriação de imagens) e das possibilidades de criação e

manipulação de diferentes ferramentas, aliadas à ideologia do próprio VJ. Todas

estas articulações, cedem ao Vídeo Jockeying um perfil dinâmico, multifacetado,

e abrangente em termos conceptuais.

A efemeridade e a envolvência sensorial por processos de associação pertencem

à invenção de ritmos, de imagens que instrumentam espaços e temporalidades

descontínuas. Tudo muda em tempo, a permanência está no ritmo da sucessão

de imagens, no piscar, pois “o que continua é o olho marcado indicialmente pela

luz criando um olhar manchado.” (Moran, Patricia op. cit., 2009) Esta característica

performativa vinca a existência de uma propensão ao abstraccionismo visual,

assumindo-se assim, uma estética da sugestão e lógica do vago. O momento da

conceptualidade será o de construir uma coerência dos visuais com base nessa

particularidade onde a figuração procura resistir e não se dá necessariamente em

[1] Bill Viola (US) vídeo artista

contemporâneo.

Considerado uma figura

importante na geração de

artistas cuja expressão

artística depende da

tecnologia electrónica do

som e da imagem.

58 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade

Page 71: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

termos da visibilidade da imagem, mas as sequências e o movimento, ou seja, o

ênfase não está naquilo que se vê, mas em como sucedem volumes, escalas e

luminosidade. A composição visual exige a consciência das particularidades

performativas e a predefinição de um objectivo visual. As estéticas, por sua vez,

são variantes, mas aos desconstruir-se a imagem conceptualmente, consegue-se

assumir um maior controlo expressivo na experiência em tempo-real.

3.2.1. FIGURATIVO VERSUS ABSTRACTO

A diversidade de perfis conceptuais dos VJs é elevada e presentemente assumida

pelo seu conteúdo criativo. Em imagem, porém, podem considerar-se dois

grandes grupos de constituição do visível, a figuração icónica, ou seja, com algum

grau de semelhança visual, e o abstracto, no qual as formas não chegam a

constituírem-se como referência. Distinguindo conceptualmente por dicotomias,

pode-se diferenciar o narrativo ou figurativo, do atmosférico ou abstracto. Estas

diferentes representações fazem parte de um sentido visual que exprime a

mensagem estimulante e orquestra-se por um lado distinto e por outro, similar.

No regime de figuração, a representação tem alguma correlação com objectos

materiais, e por vezes busca sequências narrativas. Certo é que, a situação de

VJing é diferente da ”situação de cinema”, pois não procura absorver o olhar da

audiência de forma permanente. O sentido narrativo assumido em VJing, pode

ser considerado pela imagética ser realçada pelo seu conteúdo, no qual a

audiência está prevista para observar o seu conjunto e aprecia-lo tanto quanto a

música. O acto de observar não significar um olhar permanente, mas encontros

entre olhar e projecção que se estabelecem periodicamente. O sentido narrativo,

raramente existe na sua verdadeira acepção. Usualmente, a imagem contém

fragmentos de narrativas, acções, que sugerem diferentes interpretações pelo

processo associativo desenhado pelo “olhar manchado”. A narratividade poderá

construir-se por processos associativos potencialmente sugeridos pelo VJ, e por

outros realizados subjectivamente por cada elemento do público. A narrativa é

um fragmento, e esse fragmento é apresentado por uma acção, sendo depois

associado a outros fragmentos, construindo novos sentidos ao primeiro. A

figuração e a acção dessa figuração constroem assim, intervalos entre processos

de identificação e mensagens, aliadas ao ritmo e sensação que o VJ transmite

pela performance. Relativamente a uma narrativa mais concreta, esta poderá

surgir pela montagem em tempo real durante a performance, mas deve assumir

uma organização prévia. Os exemplos narrativos oferecidos por um VJ, na grande

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Figurativo versus Abstracto 59

Page 72: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

parte das vezes, reúnem um conjunto de imagens de cenas fílmicas, pois é mais

fácil sugerir uma lógica narrativa.

Por outro lado, existem estéticas mais abstractas, as quais se preocupam em

norma com o ambiente visual, e na proposta de conteúdos que oferecem coesão

com o espaço e a politica da música. As estéticas abstractas, não representam

objectos próprios da nossa realidade concreta exterior, pelo contrário, usam as

relações formais entre cores, linhas e superfícies para compor a realidade da obra.

Usar conscientemente imagens sem recorrer muito à figuração, cria experiências

estéticas e experiências com imagens-luz, que erigem o espaço-experiência. Estes

ambientes abstractos podem potenciar experiências imersivas e algo hipnóticas,

mediante o ritmo da sucessão de imagens e efeitos da performance. O colectivo

Granular Synthesis recorre a experiências de imagens-luz nas suas performances

imersivas, nas quais se usam ritmos exacerbados de imagens em constante flicker

aliadas a sons abstractos que reforçam esse poder imersivo, sugerindo uma certa

força alucinogénica pelos seus visuais obsessivos.

A evanescência das imagens, a desfiguração, ou seja, a tendência de se romper a

figuração, é uma marca das projecções dos VJs. Há uma propensão à perda do

movimento e da forma, com a velocidade e a descontinuidade do movimento que

quebra a figuração usual. O que acontece é que a experiência visual em Vídeo

Jockeying é rítmica, musical e as imagens estão impregnadas desta situação. A

verdade é que, independentemente do conteúdo imagético ser mais ou menos

figurativo, existe fortemente a presença de uma tendência ao abstraccionismo.

Esta tendência é semântica i.e., a sucessão de ideias e a contemplação não se

sustentam na sequência visual em si. A abstracção semântica é uma espécie de

estética de sugestão, em que “não se conta mais nada, indica-se. O que permite o

prazer de uma descoberta e de uma construção. Mais pessoal e sem entraves, a

imagem organiza-se.” (Epstein 1983, cit. por Moran, Patricia op. cit. 2009) O processo

associativo joga com um sentido pré-existente que se coloca em diálogo com

outros, não se constituindo assim como sentido fechado, mas como um lugar de

sugestão, de interpretação aberta, estabelecendo o vago. A abstracção visual

cria-se pela sequência de imagens em movimento, ou de movimentos por cortes

na sucessão de frames que fazem com que a figuração praticamente desapareça.

A mudança da velocidade altera a natureza e a qualidade do acontecimento. Em

alguns casos o acontecimento em si desaparece. O acontecimento aqui falado é o

movimento decomposto, i.e., o deslocamento espácio-temporal.

A experiência de VJing é um articular de diferentes variáveis, mas é o olhar da

audiência que se cruza com a imagem e lhe dá sentido. As imagens figurativas,

Img.21 Granular Synthesis, “Pole”,

1998

60 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Figurativo versus Abstracto

Page 73: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.22. festival corps urbain, les

Brigittines, 2008, Illan Katin.

por sua vez, podem suscitar predisposição para ver no memento experiencial. As

figuras pressupõe um conhecimento, uma associação, um estimulo mais concreto

que a imagética puramente abstracta. Contudo, apesar de figurativas, este tipo

de representações podem igualmente caracterizar-se por abstractas, pois elas

instauram um fluxo temporal pontuado por interrupções na visibilidade pelo

piscar de luzes e pela decomposição do movimento. A verdade é que, as figuras

projectadas representam menos aquilo que apresentam visualmente e mais o

movimento no tempo. Obviamente que nem sempre há uma ausência de tema,

ou de referencialidade da figuração visual, mas os exemplos dão prioridade a

trabalhos não-figurativos, trabalhos abstractos, mesmo quando existe um tema,

há tendencialmente um grau de abertura nas composições visuais, que apelam

por si a subjectivas criações pelo público. Patricia Moran, complementa que “se a

figuração tende a desaparecer, as imagens abstractas stritu sensu tendem a

sugerir figuras, como acontece nas artes plásticas. Assim estamos numa rua de

mão dupla em termos de sugestão, a abstracção tende à figuração e a figuração

à abstracção.” (Moran, Patricia op. cit. 2009) Posto isto, temos o exemplo de trabalhos

do desenhista, performer e animador, Illan Katin, no qual existe um forte grau de

abstracção, mas com uma tendência figurativa (Img.22).

A união de figurativo e abstracto é ainda uma das possibilidades de combinação.

O ritmo da manipulação de imagens oferece esse perfil híbrido à relação entre

figuração e abstracção, e essa capacidade pode ser experimentada de formas

atractivas. Logo, construir ambientes usando essas duas vertentes prolifera os

processos criativos, embora se devam conjugar entre montagem, composição e

objectivos.

3.2.2. A MONTAGEM

O vídeo é sem dúvida, um meio artístico explicitamente baseado em tempo. De

acordo com Couchot, "a ordem numérica torna possível uma hibridação quase

orgânica das formas visuais e sonoras, de texto e imagem, das artes, das línguas,

conhecimentos práticos e modos de pensar e de perceber." (Couchot, 1993 cit. por

Tordino, Daniela op. cit., 2007) Proceder a métodos de montagem, quer a imagem seja

criada pelo VJ ou apropriada pelo mesmo, serve-se de uma organização em fluxo

temporal, uma ordem que constrói diferentes capacidades de converter o público

ao potencial ao visuais. A montagem em VJing, a nível conceptual, é uma pré-

organização sobre os dados de imagens, que posteriormente são ‘activados’ pela

performance. Uma montagem, independentemente da presença narrativa ou

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | A Montagem 61

Page 74: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

não, baseia-se em noções de sentido e coerência. Em VJing tudo é efémero, mas

para uma performance de sucesso, um VJ deve saber articular e agrupar os seus

visuais de modo a apelar a diferentes construções visuais. É aconselhável, que o

VJ, em norma, esteja consciente do seu banco de dados e de como pode divisar o

seu objectivo para com o espaço, música e o público.

3.2.2.1. SAMPLING, LOOP E REMIX

As práticas de recombinação, já referidas no capítulo 2.2.2., são características

iminentes da reprodução tecnológica ao longo das últimas décadas. Reutilizar

fragmentos que provêm do acesso a diferentes tipos de dados, em especial após

a glória das plataformas digitais, encerra alguma controvérsia, correspondente às

‘novas’ obras que se geram sobre a original. Esta cultura de recombinações, ou

cultura remix, é uma das características indissociáveis da experiência de VJing.

Articular a imagem para a construção de significados distintos, e perceber até que

ponto se pode adulterar uma imagem adquirida e transformá-la numa diferente e

pessoal, são algumas particularidades que a montagem e a composição em VJing

podem oferecer. A linguagem conceptual de VJing, baseia-se portanto, em três

fundamentais princípios através dos quais a montagem se vai basear: o sampling,

o loop e o remix.

As imagens projectadas pelos VJs estão situadas nas, como Bellour chama,"Entre-

Imagens": espaço onde a fotografia, o cinema e o vídeo se enlaçam e se reúnem

numa multiplicidade de super posições e configurações que são dificilmente

previsíveis (Bellour, 1997 cit. por Tordino op. cit. 2007). Isto acontece, porque a estrutura

das performances faz-se por um amplo número de pequenas porções de vídeos,

que possuem intricadamente uma vasta variedade de possibilidades construtivas.

Nesta cultura, existe um pendor para a reutilização de imagens e exacerbação de

ritmos, o que faz com que se recolham e se produzam trechos de imagens, pois

essa capacidade fraccionada em duração dinamiza a performance. Os fragmentos

imagéticos são assim, editados pelo software, misturados e recombinados com o

objectivo de gerar novos significados, diferentes dos originais. Estes fragmentos

são samples, tal como na música, pequenas porções de dados que são retirados

de uma obra e reutilizadas em ciclos de tempo, em repetições em tempo: loop.

O loop é uma possibilidade na qual, geralmente, períodos de tempo mais curtos

podem ser colocados numa série de repetições sem fim. Assim, a visualização do

trabalho não tem de se concluir após o termo de uma sequência. Pelo contrário, a

repetição permanente torna-se frequentemente aparente apenas depois de uma

observação mais demorada. Deste modo, os segmentos de tempo podem parecer

62 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | A Montagem | Sampling, Loop e Remix

Page 75: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

idênticos, ou mudanças mínimas podem ser introduzidas em cada segmento da

narrativa em VJing criando níveis de reflexão adicionais. Os VJs usam os loops de

vídeo como base construtiva das suas performances, alicerçados por motivos

estéticos e de dinâmica musical, criam temporalidades distintas, permitindo a

criação de múltiplas e desiguais micro-narrativas por associação.

Considerar a amostra (sample) que provém de um ‘recorte’ de um produto visual

pré-existente, que é depois reorganizado sequencialmente em tempo, isso

demanda a existência de uma mistura, i.e., o remix. O termo remix, é hoje

utilizada para descrever diversas disciplinas culturais, possuindo uma faceta

alegórica, na qual o objecto cultural depende do reconhecimento de um código

cultural pré-existe. O produto do remix para um público deve atender a um traço

histórico, o qual de alguma forma pode ser reconhecido. “Geralmente, a cultura

remix pode ser definida como a actividade global que consiste no criativo e

eficiente intercâmbio de informação tornada possível pelas tecnologias digitais

que é apoiado pela prática de cortar / copiar e colar.” (Navas, Eduardo Remix The Bond

of Repetition and Representation, 2009)

Em VJing, o remix é uma mistura de imagens, uma característica que é alterada

num produto original e reformulada numa nova estrutura. As pessoas partilham

dados, reutilizam os anteriores e constroem novas obras. E é nesta capacidade de

reutilizar o produto visual que o VJ, através da montagem e da composição da

mesma, proporciona experiências únicas.

3.2.2.2. TEORIA DA MONTAGEM

Para tal consciencialização, o VJ poderá ampliar o seu trabalho ao possuir noções

imbricadas de diferentes tipos de montagem existentes. A montagem ou edição é

um processo que consiste em seleccionar, ordenar e ajustar os planos de um filme

ou outro produto audiovisual a fim de alcançar o resultado desejado, quer seja

em termos narrativos, informativos, dramáticos, visuais, experimentais, etc. Ao

contrário do cinema, ou de outra produção audiovisual, a montagem em Vídeo

Jockeying não é parte integrante do processo da pós-produção, mas sim da pré-

produção e da realização em si, i.e., a edição é organizada antes da performance

e realizada posteriormente em tempo real e ao vivo. A montagem permanece

directamente relacionada com o tempo, e é uma linguagem de estruturação

audiovisual por associações, pois "editar é mais uma arte do que uma ciência."

(Watts, Harris. Direcção de Câmara – Um Manual de Técnicas de Vídeo e Cinema, 1999) Quando se fala em montagem, é imprescindível reportarmo-nos aos teóricos

russos das primeiras décadas do século XX, nomeadamente Lev Kuleshov (1899-

1970), Sergei Eisenstein (1898-1948) e Dziga Vertov (1896-1954). Estes cineastas

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | A Montagem | Teoria da Montagem 63

Page 76: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

contribuíram para a consciencialização do poder da imagem pela montagem.

Dziga Vertov, por sua vez, incidiu-se sobre a montagem de registos visuais e

sonoros. Para ele, o cine-olho ou cinema verdade, era um meio de registar a vida,

o movimento, os sons e organizá-los através da montagem. Baseava-se assim, no

registo da vida por improviso, rodada sem nenhum tipo de direcção documental.

Vertov sugeriu a noção de improviso e efemeridade dos acontecimentos, tal

como eles são. Em Vídeo Jockeying existe essa necessidade de improviso inclusive

num sentido de captura de imagem para além do performativo.

Pela perspectiva de Lev Kuleshov, como cineasta russo e grande estudioso de

teorias cinematográficas, fundador e professor da primeira escola do cinema do

mundo (a Escola de Cinema de Moscovo), desenvolve-se teoricamente um efeito

realizado pela justaposição de imagens: o Efeito Kuleshov. Assim, sem essa

justaposição, a imagem tal como capturada é apenas um material bruto, escasso

de sentido. Portanto, a justaposição de planos têm um poder de criar uma nova

significação, inexistente nos planos isolados. O exemplo do efeito foi realizado

com um mesmo plano de um actor com expressão neutra, que era alternado com

planos carregados de diferentes significações afectiva (criança = ternura; mulher

num caixão = tristeza; prato de sopa = apetite), que influenciavam a interpretação

dos espectadores, fazendo-os acreditar que a expressão do actor tinha mudado.

A justaposição de imagens em VJing funciona em ritmos e sugere igualmente

sensações. As apresentações visuais performativas, constroem-se por associações

de forma não tão linear como no cinema, pois é construída para os olhares se

encontrarem esporadicamente com a projecção, mas para tal é necessário

construir sequências e evidenciar sentidos. Sendo assim,pode sugerir-se a mesma

imagem com ritmos de performance diferente, oferecendo diferentes sensações,

antagónicas por vezes. Imaginando planos curtos de fragmentos figurativos, num

ritmo lento ou quase parado podem insinuar sensações mais suaves, mais

contemplativas. Por outro lado, um ritmo acelerado dessa mesma imagem induz

a algo mais intenso. Fazer a alternância desses ritmos e jogar com justaposição de

sequências, cria pequenas associações narrativas que com o ritmo de troca de

imagens, origina interpretações distintas, i.e., os ritmos e intensidades desiguais

reproduzem o mesmo como diferente, onde a temporalidade funciona como

comentário da sequência já vista.

Posto isto, o domínio sobre a conjugação dos vídeos, i.e., a forma como são

apresentados em ordem e ritmo, é aquele que potencia a aperfeiçoamento das

pequenas narrativas, das sensações, e de um sentido, não só estético e sensorial,

mas igualmente criativo e coerente no ambiente. Em suma, a influência da teoria

do efeito Kuleshov na prática das performances visuais pode ser reforçada por

Img.23 Efeito Kulushov

64 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | A Montagem | Teoria da Montagem

Page 77: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

variações de ritmos dos loops e repetição de planos. O responsável pela teoria da

montagem em si é Sergei Eisenstein. Com ele, surgiram diferentes tipos de

montagem que oferecem distintas interpretações. Obviamente que estas teorias

brotaram para o cinema, mas na sua maioria são intrínsecas ao cinema

experimental, e nesse sentido existe semelhança com o conceito de VJing. Sendo

assim, Eisenstein, teorizou seis tipos de montagem: a métrica, a rítmica, a tonal, a

harmónica, a intelectual e a vertical. Este cineasta chegou à conclusão que a

dialéctica do cinema baseia-se numa unidade fundamental: o plano, tal como

uma frase, tem um núcleo básico, que é a palavra. Para ele, o plano, só por si, e

tal como a palavra, tem um significado limitado e reduzido, mas quando ligado a

outros planos poder-se-á então formar uma ideia, transmitindo-se uma

concepção através da sequência, tal como acontece com as palavras interligadas

no interior de uma frase.Tal como em VJing, a imagem por si é muito pouco, mas

agregada e misturada com outras criam a experiência inteira.

Segundo Eisenstein, a montagem métrica está no comprimento dos fragmentos

de montagem e na proporcionalidade entre os vários comprimentos desses

fragmentos sucessivos, tal como um compasso musical. A tensão é originada a

partir de uma aceleração de tipo mecânico, reduzindo a duração dos fragmentos

de filme, embora mantendo uma proporcionalidade de base. Esta característica é

perfeitamente identificativa em Vídeo Jockeying e na sua relação com a música,

já que existe essa necessidade de cortes, ritmo e de sinergia.

A montagem rítmica, por sua vez, tem relação com a importância do movimento

no interior de cada fragmento que, mais tarde, irá determinar a métrica dos

mesmos. Daí que neste tipo de montagem existam dois tipos de movimento: o

dos cortes de montagem e o real no interior dos planos. Eisenstein explorou

profundamente não só as concordâncias desses dois movimentos como, acima de

tudo, os conflitos entre eles. Esta articulação em VJing é visível, pois a montagem

rítmica é a conjugação do ritmo do conteúdo das imagens, sejam elas mais ou

menos figurativas, com o ritmo exterior, o da performance. Ao usar a montagem

rítmica, conjugam-se sensações pautadas pelo jogo rítmico entre a sucessão de

imagem, cadência e cortes, igualmente estabelecidos pelo conteúdo dos vídeos.

Quanto à montagem tonal "o movimento é percebido num sentido mais lato. O

conteúdo de movimento abarca todos os efeitos de fragmento da montagem. Aí a

montagem baseia-se no som emocional característico de cada fragmento - do seu

dominante. O tom geral do fragmento.” (Eisenstein, Sergei, Da Revolução à Arte, da Arte à

Revolução, 1974, p.43) A montagem tonal é o resultado do conflito entre os dois tipos

de movimento na montagem rítmica. Para a exemplificação da montagem tonal é

muito comum citar-se a sequência do nevoeiro de “O Couraçado Potemkin”

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | A Montagem | Teoria da Montagem 65

Page 78: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

(1925), na qual o som emocional dominante é dado pelas vibrações luminosas

dos planos, contrastando com a calma componente rítmica da envolvente,

expressa pela suave agitação das águas, pela ligeira movimentação dos barcos,

pelo vapor em lenta elevação e pelas gaivotas que voam sossegadamente. A

montagem tonal cria assim uma musicalidade, uma sonoridade rítmica pelos

sucessivos ritmos contrastantes. Este tipo de montagem em VJing pode ser

assumido por momentos de sinestesia entre imagem e música, pelas variantes de

ritmo, pois é possível ‘ver’ a música na imagem.

Relativamente à montagem harmónica, esta parte das dissonâncias da montagem

tonal, isto é, dos conflitos entre dois tons dominantes numa mesma cena.

Eisenstein inclui aqui como factores determinantes do processo de montagem

“todos os recursos dos fragmentos.” (Eisenstein. op. cit. 1974, p. 56) Este tipo de

montagem só é perceptível com a visão em movimento dos planos sucessivos, ou

seja, só após uma sequência completa. Verifica-se uma certa semelhança com o

caso da música e as harmónicas que surgem quando se ouve um conjunto de

instrumentos a tocar em simultâneo.

A montagem harmónica poderá ser entendida, como uma composição, e em

VJing pode ser associada ao grau de abertura das composições visuais i.e., os

diferentes ritmos quer interiores à imagem, quer exteriores através da

performance, assim como a relação desses ritmos com a música oferecem

diferentes possibilidades interpretativas e sensoriais ao público, mediante a

composição melodiosa que oferecem.

Um outro tipo de montagem, a montagem intelectual, como Eisenstein a

caracterizou, "é a montagem não dos sons harmónicos geralmente fisiológicos,

mas de sons harmónicos de um tipo intelectual, isto é, conflito-justaposição de

efeitos intelectuais paralelos.” (Eisenstein. op. cit. 1974, p. 61) Enveredando por uma

concepção científica, o cineasta pretende mostrar que não existe diferença entre

o movimento de um homem balançando sob a influência de uma montagem

métrica elementar e o processo intelectual em si, porque o processo intelectual

trata-se da mesma agitação ao nível dos mais altos centros nervosos. Para a

percepção desta categoria da montagem, exige-se o entendimento intelectual

dos símbolos representados. Por exemplo, na sequência dos deuses em

“Outubro” (1927), Eisenstein foi contestado por não ter tido em conta a

influência da cultura do espectador no seu processo de relacionamento com o

filme. Muitos dos espectadores não descodificaram as cenas do filme “Outubro”

quando o visionaram pois não possuíam suficientes bases literárias nem

conhecimentos cinematográficos. A montagem intelectual pode ser associativa

em VJing quando se precede a alguma figuração, usando elementos que o público

66 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | A Montagem | Teoria da Montagem

Page 79: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

reconheça. Além disso, este grau identificativo e interpretativo pela audiência,

pode suscitar uma dupla atenção à imagem, além de provocar um processo

identificativo aquando do uso de imagens apropriadas, reforçando que a imagem

está apenas a ser usada e não assumida como criada pelo VJ (e.g. imagens de

filmes). O processo intelectual da audiência é um factor determinante na pré-

composição das performances do VJ. Uma estratégia de apelo à atenção

imagética pode passar por esse processo de identificação, exigindo apenas do

público um processo associativo entre as imagens e o seu conhecimento

intelectual, potenciando estimulações subjectivas, dependendo do impacto desse

conhecimento e associação.

Por último, a montagem vertical que surgiu a Eisenstein em 1938, estando

relacionada com a concepção global de um filme, mais do que com a relação

entre os seus vários planos. Este tipo de montagem nasce da relação entre o som

do filme e a cor das imagens. “Alexandre Nevsky” (1938), também da sua autoria,

é muitas vezes referido como exemplo deste tipo de montagem, pela forte

relação entre a música de Prokofiev e a narrativa visual e verbal das imagens de

montagem. Aqui o todo aparece como mais importante que as partes. Pode

dizer-se que ela é, sobretudo, um meio de criar os efeitos desejados pela

relacionação de imagens visuais e sonoras incluindo o efeito da cor. Este tipo de

montagem sugere ao VJ a escolha de uma linha estética, de uma coerência

performativa, de um sentido global, de uma performance inteira. A articulação

entre imagens, sons e cores, efeitos, são enaltecedores da condição da

experiência.

Considerar VJing de forma conceptual e orquestrar teorias imagéticas como uma

pré-preparação de uma performance, é determinante para um maior controlo e

sucesso oferecido pela manipulação posterior em tempo real. Sendo assim,

escolher as imagens, i.e., fazer o seu sampling, ordená-las posteriormente e

remisturá-las para a criação de um objectivo, pressupõe essa pré-organização, ou

pré-montagem. A verdade é que existe sempre um objectivo, mesmo que o

conteúdo imagético seja completamente abstracto. VJing é uma intervenção, é a

criação de uma experiência, com uma aura singular e irrepetível, portanto é

vantajoso assumir os pressupostos que as teorias da montagem podem oferecer

para se vigorar a performance.

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | A Montagem | Teoria da Montagem 67

Page 80: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

3.2.3. COMPOSIÇÃO DA IMAGEM

A nível conceptual, para além da organização preconcebida das sequências

imagéticas para a mistura em tempo real, é igualmente relevante compreender

como o conteúdo da imagem pode determinar o efeito de uma projecção. A

composição visual reúne elementos isolados, unindo-os para resultarem num

todo, diferençado das partes. Em Vídeo Jockeying existe composição digital, que

é o processo de juntar digitalmente múltiplas imagens originando outras imagens

completas, para exibir na projecção. Considerar significação, estéticas e estímulos

perante esse domínio visual, pode robustecer uma valorização performativa.

A imagem possui uma linguagem icónica procurando não só uma representação,

mas um apelo e muitas vezes uma persuasão. Abraham Moles desenvolveu um

conjunto de características que permitem uma diferenciação das diversas

espécies icónicas em termos quantitativos: grau de figuração de uma imagem,

grande iconicidade, grau de complexidade, grau de ocupação do campo visual,

espessura da trama e do grão, distintas qualidades técnicas, presença ou ausência

da cor, dimensão estética e grau de normalização. Estas características assumem

a imagem, conferindo-lhe particularidades distintas. Uma imagem, por sua vez,

pode ser constituída por elementos originais ou redundantes. Segundo a teoria

da imagem, quando se criam novas imagens deve ter-se igualmente em conta

certos elementos, dois quais se destacam: as características do destinatário, e o

grau de contraste que se pretende alcançar ao comparar a imagem original com

outras que abordam o mesmo tema e a finalidade da mensagem.

Posto isto, é notável a existência de uma complexidade do poder de uma imagem

na sua representação. Considerando estas teorias aplicada aos artistas visuais,

nomeadamente os performativos, usufruir de uma consciência criativa mostra-se

marcante na presença visual.

3.2.3.1. SEMIÓTICA

Compor uma imagem confere-lhe significação, e a construção dessa significação

atinge a ciência dos signos: a semiótica. Alguns teóricos como Charles S. Pierce,

Umberto Eco e Roman Jakobson desenvolveram várias e complementares teorias

sobre esta ciência. A semiótica é a doutrina dos signos, dedica-se ao estudo do

processo de significação ou representação, na natureza e na cultura, do conceito

ou da ideia. Devido aos desenvolvimentos das últimas décadas na linguística e

semiótica, o estudo dos signos ganhou uma grande importância no âmbito da

teoria da comunicação. Sendo assim, quando relacionada com a imagem na

68 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Composição da Mensagem | Semiótica

Page 81: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

cultura dos novos média, a semiótica, é moldada para construir novas soluções, e

mesmo os VJs respondem activamente a este valor nas suas imagens.

É considerado um signo, qualquer elemento que seja utilizado para exprimir uma

dada realidade física ou psicológica, e comporta um significante e um significado.

É importante realçar que os signos só por si, nada significam, para se tornarem

compreensíveis obrigam à existência de um código que estabeleça, dentro duma

dada comunidade, a totalidade das relações entre significantes e significados, de

forma a se tornarem interpretáveis.

Para se analisar ou ler uma imagem deve-se diferenciar claramente dois níveis

fundamentais: o da denotação e o da conotação. O nível denotativo refere uma

enumeração e descrição dos objectos num determinado contexto e espaço. O

nível conotativo refere-se à análise das mensagens ocultas numa imagem, e na

forma como a informação aparece escondida ou reforçada.

Perante isto, muitos teóricos comparam a linguagem fílmica com a língua falada e

escrita, e decompõem-na num tipo de gramática. Na língua, uma frase é

composta de palavras, as palavras são compostas por letras, e quando se colocam

em conjunto de diversas formas, criam significado. Os novos produtos dos média,

tais como CDs, DVDs, hipertextos, trabalhos artísticos multimédia, etc., partilham

igualmente esta mesma relação com a semiótica. Lev Manovich leva-nos a

compreender como o cinema tradicional tal como língua é composto de sinais,

presentes na nossa nova “base de dados da realidade”. (Manovich, The language of new

media, 2002) E aqui, a criação de objectos dos novos média pode ser entendido em

termos semióticos, do ponto de vista de ambos, criador e utilizador/audiência.

Os signos, pela construção de Charles S. Pierce, podem ser ícones, símbolos, e

índices. O ícone é aquele que mantém uma relação de proximidade sensorial ou

emotiva entre o signo, representação do objecto, e o objecto dinâmico em si. Um

ícone possui uma denotação com o objecto que refere, e não pode exceder essa

função. O símbolo, por sua vez, refere-se ao objecto que denota em virtude de

uma lei, impelindo a associação de ideias permitindo que o símbolo se interprete.

O índice, em si, representa um indício que é interpretativo, do qual tiramos

conclusões, consoante a nossa experiência subjectiva ou herança cultural. Indiciar

é representar algo sem o representar concretamente, mas demanda a presença

do que representa por esse mesmo indício. Os ícones, símbolos, e índices, fazem

parte das composições visuais dos artistas performativas e oferecem estímulos à

audiência. Por exemplo, o grau de abertura das composições visuais de VJing, i.e.,

a tendência à abstracção. A tendência à abstracção, pode ser interpretada pela

semiótica, no sentido em que se indiciam situações, i.e., de concreto pouco têm,

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Composição da Mensagem | Semiótica 69

Page 82: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

sendo articuladas com ritmos energéticos entre música e imagem, pois apenas se

reforça a presença de temáticas e estéticas, que são interpretativas pelas

experiências subjectivas do observador.

A verdade é que, as composições visuais performativas podem assumir narrativas

por processos de identificação e associação, i.e., narrativas psicológicas por parte

dos diferentes elementos da audiência. Existem metodologias que um VJ pode

seguir no crescer da música e dos visuais ao longo da noite, levando-o tanto a um

pequeno ou a um grande clímax. Estes métodos de desenvolvimento de ritmos e

conteúdos ao longo do tempo, jogam com ritmos e signos que se identificam e se

interpretam, e são trabalhados em conjunto com as expectativas do público, bem

como a música, para criar momentos de conotações e denotações, ampliando as

possibilidades expressivas.

VJing é uma arte essencialmente sintagmática, onde os espectadores vêm apenas

uma sucessão de imagens em vez de uma totalidade de escolhas. Num domínio

psicológico, as mentes do VJ e da audiência são enquadradas num final aberto,

com diferentes possibilidades de jogo entre ambos, onde a semiologia se integra

e se activa consoante os objectivos e improvisos da performance. Considerando

estes pressupostos da semiótica na aplicação das performances visuais, é

imprescindível perceber que estas características contribuem activamente para

as decisões visuais dos artistas performativos.

3.2.3.2. CORES

A cor tem um papel fulcral na intenção e intensidade de uma imagem. A nível

fenomenológico, a cor aparece pela frequência da luz e nem sempre é facilmente

discriminada. Ao longo dos séculos, alguns cientistas interessaram-se sobre a

percepção cromática. Primeiramente Thomas Young, em 1801, propôs a primeira

versão de uma teoria tricromática da visão, ou seja, a percepção cerebral a partir

de 3 cores fundamentais, Vermelho, Verde e Azul. Mais tarde, Young-Helmholtz

aperfeiçoou esta teoria, mantendo a posição de que o olho possuía 3 “foto-

receptores”, um para cada cor, que se sobrepunham e eram então interpretadas

pelo cérebro. Estas teorias foram importantes para definirem a imagem de vídeo.

Neste sentido, falamos de cor-luz baseada, em regra, no sistema RGB, usado para

a projecção de cores em monitores e projectores. O RGB é um sistema aditivo, no

qual o vermelho, o verde e o azul (Vermelho + Azul + Verde = Branco) se

combinam de várias formas para reproduzirem outras cores.

Numa perspectiva estética, uma das mais presentes características conceptuais

em VJing é a presença de cores vivas, ou preto e branco, acentuadas por fortes

Img.24 Síntese Aditiva RGB

70 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Composição da Mensagem | Cores

Page 83: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.25 Diagrama de Cores Frias e

Quentes

contrastes, para demarcar a sua presença nos ambientes escuros em que

geralmente actua. A necessidade da componente cromática nas composições

visuais está ligada com o estímulo retiniano e pelas sensações associadas a cada

cor. A projecção dos VJs faz-se através de imagens-luz, imagens que piscam, que

se destacam no ambiente escurecido. Na composição visual, a escolha de

determinadas cores, como as cores quentes e frias, podem reforçar diferentes

estímulos sensoriais.

A cor é percebida através da visão, das células que se denominam por cones.

Além destes, existem os bastonetes que possuem maior sensibilidade a variações

de intensidades luminosas. A percepção da cor é muito importante para a

compreensão de um ambiente, neste caso, do ambiente performativo em si. A

cor é mais do que uma simples capacidade de visão, desfruta ainda de estímulo

cerebral, e nessa associação, impulsionam-se sensações. As cores quentes e frias

podem literalmente proporcionar essas sensações, mas em regra associam-se a

processos identificativos intelectuais.

O primeiro passo para se aprender a combinar as cores é conhecer um pouco os

efeitos psicológicos que elas exercem sobre as emoções. O interessante é que,

em alguns casos, a mesma cor tem o poder de expressar sensações antagónicas.

O que define essa característica é a contexto em que se inserem, e.g., o violeta,

utilizado num evento festivo, reflecte as características de espiritualidade e

realeza. No entanto, associado à tragédia, reforça o sentido de dor.

As composições dos visuais do artista performativo podem evocar emoções pela

cor. Os processos associativos provêm não só da nossa sensibilidade subjectiva,

mas igualmente de algum código social. Culturas distintas podem ter diferentes

significados para determinadas cores. Como exemplo, a cor vermelha foi utilizada

no Império Romano, pelos nazis e comunistas, pode estar associadas a certos

produtos comerciais, e num sentido mais lato representa o sangue, provocando

reacção e atenção aos observadores. O estímulo pela cor deve obedecer assim,

ao conteúdo da imagem.

No contexto cultural das artes visuais, as cores possuem diversos significados, e

alguns estudiosos confirmam esse poder identificativo de evocar lembranças e

sensações. Para o artista visual é importante que se usem as cores de maneira

intuitiva, especialmente num acto performativo. No entanto, está cientificamente

comprovado que determinadas combinações provocam efeitos visuais mais

agradáveis do que ao se usarem as cores de forma aleatória. São as chamadas

harmonias, ou seja, as possíveis combinações entre as cores e seus tons, que

transmitem ou ajudam a reforçar sensações e emoções. A harmonia cromática

pode ser conseguida quando o conjunto de cores utilizadas completa o espectro,

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Composição da Mensagem | Cores 71

Page 84: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

ou seja, quando se utiliza dois grupos de cores que são complementares. Se

consideramos um círculo cromático de 24 cores, e considerarmos duas no mesmo

diâmetro, quaisquer que sejam, são cores harmónicas, também designadas por

parelhas cromáticas (Img.26).

Independentemente das questões estéticas e representativas, as cores possuem

uma forte presença emocional e sugestiva. No papel de criativo visual, o VJ pode

arquitectar, juntamente com o ritmo, a imagem com mais significação e intenção,

aliando-a à sensação cromática. Em lista, seguem algumas cores e respectivas

associações sensoriais mais encontradas:

Cinzento: elegância, humildade, respeito, subtileza;

Vermelho: paixão, força, energia, amor, liderança, masculinidade, perigo, fogo,

raiva, revolução, proibição;

Azul: harmonia, confidência, conservadorismo, austeridade, monotonia,

dependência, tecnologia, liberdade, saúde;

Ciano: tranquilidade, paz, sossego, limpeza, frescura;

Verde: natureza, primavera, fertilidade, juventude, desenvolvimento, riqueza,

dinheiro, boa sorte, ciúme, ganância, esperança;

Amarelo: velocidade, concentração, optimismo, alegria, felicidade, idealismo,

riqueza (ouro), fraqueza, dinheiro;

Magenta: luxúria, sofisticação, sensualidade, feminilidade, desejo;

Violeta: espiritualidade, criatividade, realeza, sabedoria, resplandecência, dor;

Laranja: energia, criatividade, equilíbrio, entusiasmo, diversão, ludismo;

Branco: pureza, inocência, reverência, paz, simplicidade, esterilidade, rendição;

Preto: poder, modernidade, sofisticação, formalidade, morte, medo,

anonimato, raiva, mistério;

Castanho: solidez, segurança, calma, natureza, rústico, estabilidade,

estagnação, peso, aspereza.

A cor tem vida em por si mesma, e sempre atraiu e causou no ser humano

predilecção por determinadas harmonias de acordo com factores de civilização,

evolução do gosto e particularmente pelas influências e directrizes que a arte

marca. Em Vídeo Jockeying, potenciar a criação dessas harmonias, exige algum

conhecimento, especial sobre contrastes. Embora o objectivo não seja apenas

estético, mas sobretudo o de oferecer as mais variadas sensações. Certo é que,

na composição visual, a cor faz parte integrante de estímulo sensorial,

contribuindo para o reforço da presença imagética.

Img.26 Círculo cromático de

Ostwald, determinação de pares

harmónicos

72 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Composição da Mensagem | Cores

Page 85: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

3.2.3.3. EFEITOS VISUAIS

Os efeitos visuais oferecem à performance diferentes possibilidades estéticas. Os

filtros são cada vez mais específicos para o reino digital, especialmente em VJing.

Efeitos como o solarize, tint, sépia, keying, entre vários, estão iminentemente

presentes nos software de imagem. Existe um paradoxo relativamente aos filtros

e a imagem, já que, numa cultura contemporânea os filtros são vistos como um

ornamento ou um complemento de um sinal preexistente, como Timothy Jaeger

refere, “em alta arte tem de ser a ‘artificialidade certa’ a apelar a discriminação

dos consumidores culturais. O paradoxo existe, no sentido em que, se podem

adicionar filtros ad infinitum, mas o resultado final continuará a ser um sinal. É a

nossa consciência cultural que pensa que um sinal que tenha sido modificado por

um filtro é algo ‘diferente’ do que aquilo que normalmente vemos. É a conotação

que ainda vence e não a denotação; é o significado, não o sinal que permeia.”

(Jaegar op. cit. 2005)

VJs agem muitas vezes como mágicos, conjugando patches de software e filtros.

Os VJs só desenvolvem significados, uma vez que entram na língua dos códigos

culturais. Nas performance ao vivo, pode facilmente reconhecer-se quando as

imagens são desfocadas, ou invertidas, mas por outro, alguns efeitos sobre a

imagem podem, acentuadamente, criar novas significações por si mesmos. Os

efeitos visuais reforçam assim a modificação de um trabalho, criando um ‘novo’ e

múltiplo ao longo da performance. Esta alteração visual acarreta significados que

a imagem em bruto não possui.

Historicamente podemos pronunciar alguns efeitos que se elaboraram com um

sentido próprio. Alguns dos mais populares podem ser: sobreposições (overlay),

criação de padrões (pattern making), escalamento e profundidade (subject scale

and depth), distorção óptica (optical distorsion), entre outros que influenciam as

cores como o sépia, tint, solarize, etc. O objectivo dos efeitos visuais é dinamizar

as possibilidades de expressão, e numa performance ao vivo, responderem à

necessidade de improvisação para com a reacção do público.

Relativamente às sobreposições (overlays), a maioria dos software usados pelos

VJs oferecem opções para misturar camadas sobrepostas de acordo com a cor do

seu conteúdo. A opacidade e modo de mistura destas camadas nesta ideologia de

sobreposição, talvez sejam umas das principais marcas dos VJs, pela cultura da

mistura, da repetição e da confusão num sentido pós-modernista.

O pattern making baseia-se num padrão geométrico visual, e é um truque que

permite a criação de um ambiente infinitamente, pela repetição de um pequeno

modelo. É possível recorrer a estas mesmas regras para sugerir um visual infinito

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Composição da Mensagem | Efeitos Visuais 73

Page 86: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

onde a tela é apenas uma pequena janela que vai revelando esse ambiente.

Efeitos análogos à repetição de padrões, são os da divisão da imagem projectada

em infinitas partes repetidas. Ambos os anteriores, criam sentido espacial. Para o

campo de projecções visuais, há a preocupação da integração das imagens com o

meio ambiente. Ao contrário do cinema e da televisão, nos quais os visuais são

criados assumindo que o público os está a observar de uma posição óptima, os

artistas visuais performativos, têm como objectivo desenvolver um estilo gráfico

que permaneça eficaz apesar de possíveis constrangimentos como: complexos

ângulos de visualização, combinação com a luz ambiente existente, posição dos

artísticas e densidade do público e movimento. Algumas estratégias poderão

prender-se sobre a atenção dada ao tamanho dos elementos e complexidade do

conteúdo. Com o escalamento e profundidade (subject scale and depth), noções

de imponência no espaço são imbricadas, dependendo do tipo e conceito dos

planos da imagem e da distância ao olhar do observador. Por vezes, usar imagens

mais simples graficamente, assegura-se a sua integração numa gama mais ampla

de configurações, os visuais são previstos para permitirem um olhar disperso,

onde os detalhes, quando reforçados, são apelados.

A distorção óptica, por sua vez, está mais relacionada com noções estéticas

abstractas, de ilusões ópticas e hipnose. Por volta das décadas de 1960 e 1970,

algumas experiências cativantes em imagética foram realizadas derivadas da Op

Art, a arte óptica, que já tinha alguma presença desde a metade do século XX. Os

trabalhos de Op Art são em geral abstractos, e muitas das peças mais conhecidas

usam apenas o preto e o branco. Quando são observados, dão a impressão de

movimento, clarões ou vibração, ou por vezes parecem ganhar 3 dimensões ou

deformar-se. O trabalho do teorista Victor Vasarely (1908-1997), pai da Op Art,

pode ser ligado a diversas experiências visuais de sucesso desta época. Este,

experimentou o uso de transparências e cores em projecções, os seus quadros

combinam variações de círculos, quadrados e triângulos, às vezes com gradações

de cores puras, para criar imagens abstractas e ondulantes. Para além da estética,

estes grafismos foram experimentados como estimulantes visuais psico-activos,

introduzindo estados de transe aos observadores. A prossecução deste tipo de

efeitos visuais permanece uma preocupação importante para muitos artistas

visuais actuais.

A lista de efeitos visuais existentes é inúmera, e nesta sociedade digital, os efeitos

são usados quer na pré-produção dos vídeos, assim como durante a performance

visual. O importante a denotar é que eles conferem versatilidade conceptual e

edificam múltiplas significações. Construir narrativas por associação, apelar a

sensações, orquestrar ordens nas sequências de visuais para impelir intensidades,

Img.27 Duo-2, 1967 Victor

Vasarely (Op Art)

74 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Composição da Mensagem | Efeitos Visuais

Page 87: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

responder aos pressupostos semióticos estabelecendo pactos comunicativos com

a audiência, jogar com cores e efeitos invocando a emoções e significados, são

diferentes variáveis que integralmente podem compor a criação das obras dos

VJs, enaltecendo a sua presença no espaço da experiência.

3.2.4. MENSAGEM E SENSAÇÃO

As performances visuais inseridas no seu contexto social e cultural, demandam a

existência de um propósito na sua configuração e experimentação. Existe um

vasto número de estéticas e ideologias performativas e isso está intimamente

ligado com a principal questão: qual é a função do VJ? A definição desta função

performativa nem sempre é linear, é uma área em contínuo aperfeiçoamento,

patenteada particularmente pelas políticas de autor, daí a divergência de um

conglutinado performativo dos artistas. Independentemente desta definição, os

visuais interferem no espaço-experiência e procuram estabelecer pactos de

comunicativos com o público. Para tal, conceptualmente, é possível dirigir um

sentido estigmatizado por mensagens e sensações.

É muito comum na pista a decomposição do movimento, a sua explicitação pela

sucessão de estados estáticos do movimento com duração perceptível, ou seja, o

movimento é transformado numa sucessão sequenciada de fotogramas. Para

além disso, as imagens energéticas repetem-se ritmadamente, consagrando uma

proximidade musical na performance dos VJs. A percepção em si, entendida nos

seus aspectos psico-fisiológicos é pois, alterada pelo ritmo que a imagem oferece.

Tendencialmente, e encarando esta energia de ritmos que levam a um sentido

em grande parte abstracto, as sensações são o principal mote em VJing. Ao

buscar as festas, o público está interessado numa experiência de entretenimento,

uma fruição estética e artística que lhes provocará estímulos. Estes estímulos são

conjuntamente movidos pelo consumo de estimulantes químicos e bebidas

alcoólicas. Há uma busca de prazer que se aproxima das propostas analisadas por

Gene Youngblood no seu Expanded Cinema. Há uma proposta de se alcançarem

outros estágios de consciência neste ambientes potencialmente imersivos. Uma

estimulação multissensorial oferece-se por correspondências de sinestesia entre

música e imagem, de ritmos e conteúdos imagéticos que invocam formas, cores e

efeitos que circundam experiências de imersão, em suma, toda a experiência

audiovisual do clube é formatada para presentear o público dessa forma.

Por outro lado, ainda prevalece nos discursos de alguns VJs a proposta de se

desenvolverem trabalhos que vão ter o seu sentido apreendido num momento

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Mensagem e Sensação 75

Page 88: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

posterior, ou seja, há aí uma menção a processos de associação. A pré-montagem

e a manipulação em tempo real, podem conjugar sequências compreendidas em

acções, que apresentadas de determinada forma, arquitectam mensagens. As

imagens, por seu grau de abstracção e velocidade atentam os sentidos, e mesmo

em trabalhos com imagens figurativas o pacto é de experimentação sensorial, de

vivência. Esta experiencia “mais que uma extensão, é uma exacerbação dos

pactos tradicionais, mas é, contudo, ainda um pacto, sem o qual nenhuma

vivência criará o registo poético.” (Moran, op. cit. 2009-2) O registo poético a que

Moran se refere, é a criação de uma mensagem congeminada esteticamente.

A verdade é que, o VJ pode procurar criar essas sensações, como um processo

reflexivo muitas vezes não imediato, podendo comportar-se ao subconsciente.

Neste ponto, pode-se falar de mensagens subliminares. Mensagem subliminar é a

definição usada para o tipo de mensagem que não pode ser directamente

captada pelos sentidos humanos. Subliminar é tudo aquilo que está abaixo do

limiar, no subconsciente. Toda mensagem subliminar pode ser dividida em duas

características básicas: percepção e persuasão. A percepção subliminar é a

capacidade que o ser humano tem de captar de forma inconsciente mensagens

ou estímulos fracos demais para provocar uma resposta consciente. Segundo a

hipótese, o subconsciente é capaz de perceber, interpretar e guardar uma

quantidade muito maior de dados que o consciente. Como exemplo, imagens que

possuem um tempo de exposição pequeno demais para serem percebidas

conscientemente, ou sons baixos demais para serem claramente identificados.

Dados que passariam despercebidos pela mente consciente seriam na verdade

interpretados e guardados. Nas performances de VJing, o ritmo inconstante de

imagens pode provocar essa mesma percepção subconsciente.

A repetição desses fragmentos de imagem permite o impulsionar determinadas

mensagens, dependendo do conteúdo em si. O espectador constrói as suas

próprias narrativas subjectivamente e hipoteticamente pode armazenar alguma

informação ou sensação que posteriormente se figura.

Relativamente à persuasão subliminar, esta centra-se na capacidade que uma

mensagem tem como influência no receptor. Não está provada cientificamente,

ao contrário da percepção subliminar, e por tal, segundo a hipótese qualquer

mensagem subliminar tem um determinado grau de persuasão, e pode vir a

influenciar tanto as vontades de uma forma imediata (fazendo por exemplo, uma

pessoa sentir vontade de beber ou dançar), como até mesmo a personalidade ou

gostos pessoais de alguém a longo prazo (e.g. mudando o seu comportamento

transformando uma pessoa tímida em extrovertida). Esse grau de persuasão

deveria variar de acordo com o tempo de exposição à mensagem e com a

76 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Mensagem e Sensação

Page 89: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

personalidade do receptor . Em VJing faz sentido uma influência imediata, pelo

seu elevado grau de efemeridade. Por exemplo, induzir mensagens cujo conteúdo

são acções muito particulares como beber, dançar, beijar, sorrir, chorar, podem

suscitar mudanças de estados de espírito e impelir a vontades. Obviamente que

faz mais sentido considerar esta influência quando existe um certo grau de

persistência sobre essa determinada acção, i.e., quando existe repetições pelo

ritmo performativo.

Actualmente o termo subliminar tem sido usado com um sentido diferente da sua

definição original. O termo subliminar é muitas vezes usado como um sinónimo

de subentendido. Pode ser subentendida toda mensagem que não está expressa

de forma imediata, tendo seu significado implícito. Ela pode ser percebida

directamente por dedução, associação ou análise de contexto. Mensagens menos

óbvias correspondem de certo modo, à grande maioria dos visuais pela tendência

ao abstracto e pela ausência de narrativas fechadas. No campo das artes visuais

performativas, a experiência não é óbvia para o consciente, mas antes sim, uma

constância de estímulos e de construções ilusionistas. Em muitos casos, as

pessoas são induzidas a encontrar um significado qualquer onde necessariamente

não há nenhum. É um exemplo de pareidolia também definida como validação

subjectiva ou uma forma de auto-ilusão. Nesse caso, uma pessoa costuma usar o

seu conhecimento, vivência e suas opiniões pessoais, imprimindo suas ideias

naquilo que está a ver, causando uma distorção. O resultado é que a mesma, cria

um novo significado para aquilo que ela está a ver.

O objectivo da evolução sensorial, emocional e cognitiva, aliada a um processo de

identificação na melodia das imagens, no ritmo, das formas e figuras mais ou

menos concretas, comportando uma evolução no estágio de experiências, é tudo

aquilo que figura o poder dos visuais na sua consciência conceptual. As inúmeras

possibilidades criativas existentes nas artes da imagem em movimento, tornam-

se activas a partir do momento que a imagética se estrutura e se interioriza nas

suas capacidades expressivas.

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Conceptualidade | Mensagem e Sensação 77

Page 90: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

3.3. VJING E ESPAÇO

Para além da simbiose entre som e imagens, as características do espaço de

realização, como arquitectura, iluminação, bem como a quantidade, tamanho e

disposição dos ecrãs onde são projectadas as imagens, determina o sucesso da

performance audiovisual, bem como, consequentemente, o tipo de diversão para

o público. A combinação destes diversos factores variáveis estimula os sentidos e

transforma o local num ambiente de sinestesia composto pela mística activa da

imagem e do som. O espaço aqui assumido define-se como aquilo que demarca o

entre, subsistindo com visualidade material. O espaço entre é perceptível

visualmente, coabitado por luzes, projecção, sons e movimento, que reduzem o

espaço ao restringir o campo de visão, criando um ambiente circunscrito. Este

ambiente constitui portanto, como Moran refere, pactos com o público.

Quando se discursa sobre pactos, assume-se um conjunto de validades perante

um determinado contexto. Pactos, no contexto de VJing, são delimitações de

variáveis que podem ser assumidas em prática e se constroem numa negociação

reactiva entre público e performance. Ambientes imersivos, ilusionistas,

intelectuais, são exemplos de alguns pactos possíveis. O cinema, por sua vez, é

mestre em narrativas ilusionistas cujo pacto passa pela elaboração de um enredo

segundo técnicas e recursos expressivos da cinematografia. As vídeo-instalações

e outros diversos trabalhos com performance, possuem um pacto diferente, mais

próximo ao que os VJs promovem. Estes pactos passam pela aglutinação de luzes,

sons, quantidade de pessoas, disposição de telas, oferecendo uma ambiência que

procura jogar com intensidades de imersão.

É importante referir que o espaço de projecção e o espaço físico de cada local é a

variável menos controlável nas actuações de VJing. A maioria dos VJs enquadra-

se perante a pré-definição do local, pois para assim não ser, o VJ necessitaria de

transportar equipamento como telas e projectores, o que não se figura acessível

para uma actividade ainda insuficientemente valorizada. A verdade é que, apesar

das condicionantes de cada local, através da conceptualidade, da performance e

da relação musical, o VJ pode criar outros espaços, isto é, o espaço imaterial,

aquele que se estabelece pela mente do público, embutidos em experiência e

estímulo.

O meio é assim modelador de nossa percepção e é modelado por ela. O espaço

existe em função de como o percebemos e a nossa percepção é por ele dirigida.

Por outras palavras, o espaço é um “produto de complexos processos mentais” ou

um “construtor mental que condiciona a nossa relação com o mundo.” (Anders,

Peter 2003, cit. por Moran op. cit., 2009) O espaço é assim, resultado de uma elaboração

Img.28 Possíveis configurações

espaciais em VJing.

78 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Espaço

Page 91: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

[1] Mia Makela (Solu)

Professora/ pesquisadora/

Artista de origem finlandes e

dedica-se à prática e essaio da

arte audiovisual em tempo-real,

investigação independente, e

activismo cultural. Residente em

Berlim. (www.solu.org)

mental e hoje em dia ampliam-se igualmente espaços imateriais e espaços-

-imagens. A distribuição de telas no lugar e a constância de luzes cromáticas

criam o espaço-experiência, o espaço-estímulo, dentro de projecções-espaço,

proporcionando uma experiência que por um lado é imersiva (e.g. semelhante ao

cinema, realidade virtual e jogos) mas que por outro lado é um quadro vivo e

artístico, por ser caracterizado por imagens-luz, fulgurantes e ritmadas,figurativas

ou não figurativas.

3.3.1. CARACTERIZAÇÃO DO ESPAÇO EM VJING

A organização espacial de Vídeo Jockeying, não apresenta a projecção num lugar

completamente privilegiado, e isso deve-se ao facto de se procurar criar uma

relação particular entre o olhar do público e experiência ‘cinematográfica’. Esta

organização espacial não tenta canalizar a atenção do espectador para a imagem,

já que, espectador e imagem estão em movimento contínuo, reencontrando-se

esporadicamente no decorrer da projecção. Pode-se dizer que, em performances

audiovisual ao vivo, o mecanismo de projecção, o espaço e a audiência em si são

movimentados numa condição virtual. O espaço em VJing funciona como uma

sala de protecção que, em vez de tentar conectar o olhar do espectador ao filme

através da ‘situação do cinema’, deixa-os livres, para que possam encontrar-se

reciprocamente por si mesmos, numa nova forma de exploração cinematográfica:

imagem e espaço, homem e máquina absorvem-se mutuamente.

Para caracterizar o espaço que envolve a acção do VJ é necessário pensá-lo nas

diferentes partes que o constroem. Tomando a abordagem de Mia Makela [1] na

sua tese Live Cinema : Language and Elements(2006), na qual a mesma o

considera em cinco partes distintas: digital, desktop, performance, projecção e

físico, aqui propõe-se outra sequência baseada em seis espaços mais ou menos

palpáveis: físico, digital, projecção, performance, luz e som e imersão. Esta

divisão tem como pretensão abordar os espaços menos lineares, aqueles que se

impulsionam perante o papel activo e singular de cada observador.

3.3.1.1. ESPAÇO FÍSICO

O espaço em VJing é assim, uma complexa organização de diferentes espaços que

proporcionam na sua totalidade o espaço-experiência. O primeiro espaço a ser

considerado é o espaço fisco em si, aquele que é partilhado pela audiência e o

artista performativo. O espaço físico define o set do VJ. Este espaço é definido

por questões arquitectónicas que devem ser consideradas pois podem influenciar

o factor de visibilidade da projecção e consequentemente o sucesso sensorial da

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Espaço | Caracterização do Espaço | Espaço Físico 79

Page 92: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

imagética do performer. Para o VJ é importante analisar o espaço físico antes de

realizar a performance, especialmente se lhe for dada a possibilidade de o

compor com projectores e telas, controlando superiormente a particularidade

visual do seu trabalho. A verdade é que, grande parte das vezes, esse controlo

espacial não se aplica, já que os espaços pré-definem esse detalhe, e o VJ nem

sempre possui possibilidades económicas para possuir e transportar telas e

projectores. É preciso ter uma atenção especial para que os projectores não

afectem directamente a audiência com os raios de luz, e em alguns casos, usam-

se espelhos para redireccionar as projecções evitando esse desconforto visual.

O espaço físico, para algumas artistas visuais, é o ponto de inicio para planear a

performance. A projecção pode ser realizada num canto ou à volta do espaço e as

imagens podem ser planeadas de tal modo que transformam o espaço, ou dão a

ilusão de um novo espaço. Projectar imagens 3D no na tela, por exemplo, pode

resultar na ilusão de que o espaço continua com a projecção. Os visuais podem

igualmente ser projectados em fumo, mas neste caso a superfície é espacial. Este

pormenor do fumo dá a ilusão de que a audiência pode tocar literalmente na

projecção. O espaço físico é também condicionado pelo público, pela quantidade

e movimentação, reduzindo ou ampliando a noção espacial. O VJ pode jogar com

essa peculiaridade apresentado visuais que reforcem essas diferenças ou

similaridades, ampliando a noção espacial.

3.3.1.2. ESPAÇO DIGITAL

A presença tecnológica e o domínio do digital são atributos iminentes em

performances como estas. O espaço digital é onde se situa o software e a

respectiva imagética do VJ. Este espaço digital, por sua vez, deve ser organizado.

Uma dos principais alicerces de uma boa performance provém da compressão

dos vídeos. A compressão é um conjunto de normas práticas que reduzem o

tamanho digital do ficheiro e com isso procura-se economizar espaço no disco

rígido do computador, i.e., economizar tempo de processamento para se atingir

rapidez no acto performativo. No processo de compressão, os dados da imagem

como a resolução (pixels), framerate e cores, são reduzidos. Esta redução resulta

num ficheiro mais pequeno, que não propicia apenas o armazenamento, mas

também acelera a o processamento em tempo-real do material de vídeo. Nas

performances de VJing o material de vídeo não é apenas reproduzido mas sim

processado por efeitos em tempo-real, requerendo uma elevada performance

pelo computador portátil. Uma compressão com sucesso é a chave para uma

performance de sucesso.

80 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Espaço | Caracterização do Espaço | Espaço Digital

Page 93: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

No universo digital, a interface do software ou aplicação deve ser optimizada

para um uso intuitivo e para um modo rápido de trabalho. Durante ao acto

performativo não há tempo para encontrar objectos perdidos, logo a interface

deve ser estruturada de tal forma que os principais controlos devem estar

sempre visíveis, enquanto que, os controlos menos usados podem ser activados

caso sejam necessários.

Cada performance é diferente e a interface pode igualmente variar. Isto origina

um maior sentido de liberdade de imaginação sobre o que pode ser feito, já que é

possível começar a criar de raiz. Certo é, que diversos VJs e outros artistas

performativos criam as suas próprias aplicações, desenhadas consoante os seus

objectivos, proporcionando assim uma outra liberdade criativa. Por outro lado,

software como o Resolume ou o Arkaos, oferecem uma interface com vídeos e

efeitos que podem ser activados e controlados, possuindo atalhos com o teclado,

possibilitam um show visual onde diferentes vídeos podem ser alterados com

rapidez, optimizando experiências visuais.

O VJ segue constantemente dois espaços: o espaço de projecção (output) e o

espaço da interface no computador. A verdade é que, pode acontecer que o VJ se

encontre num local onde não consiga visualizar a projecção, e neste caso, os

monitores da interface ou de um monitor externo oferecem-lhe uma vista da

performance.

3.3.1.3. ESPAÇO DE PROJECÇÃO

O espaço de projecção é variável, e é uma das principais condicionantes espaciais

para VJing. A projecção é o factor que contacta directamente com o público, é

aquele que é capaz de oferecer uma experiência gratificante, mas tudo isso

poderá depender da disposição das telas, tamanho e grau de visibilidade. Muitas

performances de VJing são apresentas num set bidimensional, onde um ou vários

ecrãs rectangulares se direccionam para o público. Embora, existem outras

possibilidades criativas na qual a superfície de projecção não tem que ser plana.

As projecções podem ser ajustadas a espaços específicos e podem igualmente

criar a ilusão de um novo espaço. Certo é, que novos artistas performativas estão

a explorar as possibilidades de expandir o ecrã e mudar a experiência audiovisual

para experiências espaciais num ambiente audiovisual. O uso de telas

transparentes, ambientes circundados por imagens, o uso de diferentes

tamanhos de telas que repetem pormenores de imagens, são algumas

possibilidades criativas que podemos encontrar. Genericamente o factor espaço

de projecção tem um papel muito activo na construção da experiência de VJing.

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Espaço | Caracterização do Espaço | Espaço De Projecção 81

Page 94: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Considerando apenas uma ou duas telas (que é o mais usual), a sua posição é

relevante para a determinação do impacto visual no espaço. A direcção óptima da

projecção deve jogar com a localização do DJ. Na cultura dos clubes nocturnos

e outros espectáculos ao vivo, existe a tendência do público se posicionar na

direcção do artista musical. Atendendo a um espaço rectangular por exemplo, as

telas podem posicionar-se em qualquer desses quadrantes, embora os laterais e

o dianteiro façam mais sentido, pois permitem um maior contacto do olhar da

audiência com as imagens.

3.3.1.4. ESPAÇO DE PERFORMANCE

O espaço performativo é aquele onde se situa o VJ e todo o seu equipamento e

pode ser variável. Há uma inconstância na ligação entre VJ e DJ, pois dependendo

da configuração espacial, o VJ pode situar-se ao lado do DJ, do lado oposto ou

outro local, podendo mesmo o VJ não ser visível. Isto acontece, novamente, pela

constante subvalorização desta actividade, que faz com que várias vezes não seja

oferecido um protagonismo ao VJ. Seja como for, para uma performance mais

controlada pelo artista performativo, procura-se que o mesmo esteja num local

com visão privilegiada para o espaço de projecção. Esta necessidade prende-se

pelo objectivo de se potenciar uma performance, jogando com a reacção do

público perante a imagética apresentada.

O espaço da performance articula-se especialmente com o espaço de projecção.

Em muitos casos, o espaço de projecção esta atrás do palco onde se situa o VJ, o

qual apenas pode visualizar a imagética pelo seu computador, mas esta

configuração, por sua vez, proporciona à audiência apenas uma direcção do

olhar. O espaço performativo é assim relevante pois é aquele que enquadra o VJ

em todos os espaços externos ao seu computador, o que, dependendo das

condicionantes, pode influenciar o sucesso performativo.

3.3.1.5. ESPAÇO LUZ E SOM

O espaço organiza e propicia um determinado tipo de apropriação dos elementos

expressivos. As músicas, as imagens, as luzes, vêm corroborar a constituição de

uma experiência de percepção onde o terceiro olho de Merleau-Ponty, aquele

olho que vê as imagens materiais e mentais oscila entre a pista e a tela. (Merleau-

Ponty 1999 cit. por Moran op. cit. 2009)

O espaço luz e som, para além de marcar presença física, erige-se subjectivo para

o espectador. O som, nos clubes é caracterizado por uma sonoridade bastante

alta, as luzes coloridas estão em constante flicker, o que sugere uma configuração

82 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Espaço | Caracterização do Espaço | Espaço Performance | Luz e Som

Page 95: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

espacial diferente da sua origem para o espectador envolvido em estímulos.

O que acontece é que as luzes e o som oferecem ao espaço uma aura particular e

indissociável da mística da cultura dos clubes, que se articula com toda a poética

visual. O espaço luz e o espaço som, não se delineia, mas compõe o espaço físico

e mental de toda a performance. As luzes reforçam o sentido visual da pista, e o

VJ reforça essa presença do espaço-imagem. A visualidade colorida, intermitente,

ritmada e abstracta mesclada com a sonoridade constante, pulsante e inquieta,

apresentam um espaço físico alterado, enevoado por frequências rítmicas e

sensoriais. Pode considerar-se que na pista, no ambiente material também há

uma sinfonia. O ambiente funciona como melodiosa construção visual, ou seja,

instrumenta a composição do espaço pela construção de um ritmo de visuais,

áudio e luz pulsante. Esta ideia sugere noções imersivas, as quais contribuem

para uma validação espacial.

3.3.1.6.ESPAÇO IMERSIVO

Vivemos a ampliação de espaços ilusionistas, físicos ou não e a criação de espaços

imateriais funcionando como interfaces. Nesta idoneidade híbrida de criação, um

conceito que tem sido gasto recorrentemente nos últimos tempos, é a ideia de

imersão.O seu potencial uso está relacionado à proliferação de espaços imateriais

propiciados pelo computador. A imersividade é um estado de consciência no qual

a noção do espaço físico é diminuída ou totalmente perdida pelo observador, por

este estar cativado e envolvido perante um ambiente, que pode ser artificial. Este

estado é frequentemente acompanhado por um excesso espacial, um foco

intenso, um distorcido senso de tempo e uma acção sem esforço. A imersão pode

ser espacial, psicológica, emocional, e hiperboliza a particularidade do VJing como

expressão visual no seu contexto social e cultural.

Imersão é assim, uma discussão subjacente ao espaço, material ou não, e a nossa

relação com ele, caracterizada por ser uma experiência temporal. Este fenómeno,

passa necessariamente pelo contacto do corpo físico e dos sentidos com o meio

em que se localiza o observador. Os espaços, físico e imaterial, organizam a

percepção de forma a se complementarem ou estabelecerem atritos. Novas

noções e experiências de espaço somam-se ao espaço tradicional, i.e., ao espaço

físico. As trocas e a percepção resultantes do convívio com os computadores e

espaços a eles contíguos têm os seus termos definidos por pactos ilusionistas

construídos pelas performances de VJing.

Tanto as noções de imersão quanto as de ilusão e ilusionismo definem-se numa

negociação entre o sensível e inteligível.Para Oliver Grau a imersão é um conceito

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Espaço | Caracterização do Espaço | Espaço Imersivo 83

Page 96: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

algumas vezes “opaco e contraditório” pois “proporciona uma experiência

complexa e multifacetada dependente da posição do observador.” Grau coloca

ainda a imersão como “um processo estimulante intelectualmente, ao mesmo

tempo uma mudança, um processo de absorção mental em que há trânsito de um

estado mental a outro, caracterizado pela distância crítica em relação ao que está

a ser mostrado, e o crescimento emocional naquilo que está a acontecer.” (Oliver,

Grau, Virtual Art. From Illusion to Immersion, 2003 p.13)

A imersão pode assim ser entendida como uma zona instável dos sentidos, i.e.,

uma zona de instabilidade de preceitos estritamente racionalistas. Referindo

Patrícia Moran, é uma “zona sensorial, de sinestesia, região de trânsito capaz de

proporcionar insigths e propiciar a construção de descobertas.” (Moran, op. cit. 2009)

Mais, ou menos, dirigida em função do evento no qual é promovida, a imersão é

a experiência de relações multifacetadas. Um ambiente físico ou intelectual

envolve a pessoa de tal modo que ela submerge noutra realidade, produz outra

realidade, sem abrir mão por completo de suas referências mais concretas. O

pacto ilusionista pressupõe portanto, a aquiescência do cognitivo.

Em VJing, esta experiência que produz a sensação de se estar a circular por outra

realidade, que envolve todo o nosso aparelho de percepção, é administrado pelo

potencial da performance em arquitectar público, música e espaço, juntamente

com o conceito visual pré-definido. No contexto espacial e social do clube, a

presença de imagem gera-se em norma, com um caris secundário face à música.

A possibilidade de construir rasgos imersivos, e envolver o público em diferentes

realidades, é uma possibilidade criativa para alguns VJs que compreendem que

situação de Vídeo Jockeying implica a efemeridade, a não-narratividade e o vinco

da sensação. Todos estes parâmetros reforçam o poder da imagem e veiculam-na

como parte integrante de um complemento espácio-cultural.

Um espaço imersivo em VJing é sobretudo um espaço imersivo sensorial, no qual

imagens se constroem pelo apelo à sinestesia, entre ritmos, formas, padrões,

cores, luzes e sons oferecendo uma nova noção espacial. O produto imersivo não

é provocado linearmente em VJing, pois implica sensibilidade performativa,

embora existam determinados factores que reforcem a sua exaltação. Imagens

abstractas, padrões que se repetem por ritmos e cores, quase num sentido

hipnótico, delineiam essa construção mental do espaço. A imersividade é pois,

um reforço do poder da manipulação da imagética, oferecendo ao público uma

experiência única e particular, completando a filosofia do espaço. Neste ponto, é

importante definir como se impulsiona essa imersividade e validade espacial.

84 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Espaço | Caracterização do Espaço | Espaço Imersivo

Page 97: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

3.3.2. PROJECÇÃO ESPACIAL E VALIDADE SENSORIAL

No processo criativo, uma construção espacial oferece uma ligação forte entre

público e imagem, e dessa ligação por pactos deverá sobressai uma experiência

válida e gratificante. A manipulação espacial material, imaterial e de estágios de

consciência pode ser assim traçada de forma a proporcionar sucesso sensorial.

Sucesso ou validade sensorial determinadas pelo espaço visam, portanto, assumir

a capacidade imersiva. Um espaço para evidenciar imersão deve jogar com a

dimensão e disposição das telas de projecção.

O VJing é um acontecimento no espaço material temporizado, construído por

projecção, luzes, sons, pessoas e movimento. Por outras palavras, existe um

espaço sensorial, onde o sentir e o pensar se cruzam. O estímulo constante dos

sentidos numa presença espacial deve atribuir-se pela singularidade do espaço de

projecção estar sempre visível ao olhar do público. Este é o primeiro ponto que

potencia a validação sensorial perante o espaço. Para além disso, o continuado

estímulo de luzes, das projecções, da música, das imagens que cintilam e das

pessoas em profusão, cria um ambiente dispersivo orquestrado pela estimulação

retiniana.

Conquanto, a iconografia dos VJs nem sempre é narrativa, o que autoriza

espacialmente uma distribuição consciente dos elementos da performance,

potenciando o uso de múltiplas telas de projecção. Mas na verdade, predomina

ainda o palco italiano, ou seja, todo o público voltado para uma única direcção.

Pode haver no palco um tríptico, ou uma tela central e pequenas televisões ao

lado, ou mesmo telas cenográficas que se estruturam em formas, mas ainda

prevalece a projecção unidireccional. Nestes casos, as luzes estroboscópicas e

coloridas fornecem ao ambiente uma imersão que poderia ser conquistada

também com as telas, maximizando-se o papel das projecções no conjunto dos

elementos utilizados para se montar o espaço.

A arquitectura do espaço sensorial consolida-se perante as particularidades do VJ

que se apresenta. A natureza do trabalho, as suas cores, a sua proposta, criam o

ambiente, solicitam movimentação espacial determinada em função da proposta

da projecção. Existem, por sua vez, múltiplas capacidades de composição espacial

que figuram deferentes possibilidades sensoriais. O uso de múltiplas projecções,

atingindo mais de 180 º, é uma possibilidade não tão comum, mas existente.

Estas projecções são impossíveis de serem visualizadas numa única tomada de

olhar mas reforçam substancialmente o espaço-experiência.

Experiências com projecções múltiplas e manipulação de imagens não são uma

ocorrência que se reduz aos dias de hoje. Pelo contrário, na história das

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Espaço | Projecção Espacial e Validade Sensorial 85

Page 98: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

vanguardas cinematográficas, como Peter Weibel, Gene Youngblood e outros

autores, são recorrentes trabalhos projectados em multi-direcções. Assim, o

espaço físico onde estão as pessoas e as projecções, e o espaço da projecção em

si, fazem-se presentes no conteúdo das imagens, alterando a óptica privilegiada

na apresentação. Isso é resultado tanto da velocidade impressa à imagem,

quanto das cores e da relação de conteúdos entre telas.

Ainda em múltiplas projecções podem-se encontrar variadas configurações, como

alterar dimensões de telas, permitindo oferecer experiências que concebem

composições de modo a permanecer no campo de visão uma tela inteira e

pedaços de outras. É de reforçar que a dimensão da tela interfere na construção

visual do cenário, i.e., o tamanho da tela altera a percepção do movimento: em

telas maiores o movimento parece mais lento, em telas menores o movimento

parece mais rápido. Esta conjugação de diferentes dimensões, oferece

temporalidades distintas à performance, permitindo ampliar as explorações

conceptuais da intervenção, já que o tempo de evolução da imagem imprime

sentidos temporais e intensidades variadas à imagem e ao som.

Nem sempre a dimensão e disposição das telas é suficiente para a constituição de

um espaço imersivo, é preciso considerar igualmente a conceptualidade, a

performance e as ligações de sinestesia com a música para se potenciar essa

experiência. Estas outras variáveis são substancialmente consideradas quando se

considera um espaço de projecção unidireccional. Quando a presença da imagem

se faz sentir apenas numa pequena parte de todo o espaço da performance, a

força sensorial deve ser experienciada pela capacidade criativa do VJ. O conteúdo

da imagética é ponto fulcral da obra visual. A performance, por outro lado, é

aquela que dá vivacidade à imagética, construindo experiências únicas e

efémeras para a audiência, pois a imagem impõe-se não apenas em função

daquilo que mostra, mas igualmente em função de como é mostrada. Em alguns

momentos é importante provocar uma reacção ao público, em função do ritmo e

estimulação que as imagens provocam, tanto pela velocidade na manipulação

quanto pela natureza da imagem. Potenciar uma projecção unidireccional pode

conceber-se assim, provocando choque físico produzido pela imagem, de forma a

‘inserir’ a pessoa da pista no vídeo projectado.

O espaço em VJing é um conjunto de soluções criativa que depende da intenção

visual. O espaço nem sempre pode ser controlável, mas é possível orquestrar

todas as particularidades presentes e dinamizar o sucesso da sessão de VJing. O

espaço é assim o entre, entre luzes, entre imagens, entre sons, entre pessoas,

entre a certeza de se estar numa festa e a experiência de visitar paisagens físicas,

pessoais e imaginadas.

86 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Espaço | Caracterização do Espaço | Espaço Imersivo

Page 99: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

3.4. VJING E PERFORMANCE

O que distingue VJing de outras performances é a construção visual em tempo-

-real, pois na verdade estamos diante de um evento profano, mas com aura, e se

esta aura for entendida como um acontecimento único, que não se pode repetir,

a experiência é sempre distinta. O acto da performance envolve improvisação,

interacção, sinestesia, imersão, possibilidades narrativas, e uma infinidade de

outras faculdades. Em VJing há um trabalho criativo, um trabalho que adquire

corpo e estrutura em tempo-real. As telas piscam, imagens nervosas repetem-se

proporcionando uma contemplação bucólica. Há uma primazia da acção sobre a

duração contínua, as imagens instalam temporalidades pela evolução das formas.

O ritmo vem pela mão dos VJs, que alteram bancos de dados, por sequências de

imagens construídas e adquiridas das mais diversas tecnologias. O ambiente, este

é uma pista de dança, um lugar construído pelo som do DJ e pelos visuais do VJ.

Sabemos que a tecnologia está estreitamente ligada à obra criativa, permitindo

que seja possível propiciar experiências inefáveis, demandando incessantemente

um papel activo por parte de um indivíduo. O Vídeo Jockeying é uma expressão

desta mudança e representa um contínuo desejo de intersecção dos sentidos,

como a visão e audição, bem como da performance e interface, do corpo humano

com a tecnologia e expressividade.

Sendo assim, nesta atmosfera audiovisual, a base performativa baseia-se no

Jamming, i.e., a improvisação pelo VJ. Assim, a improvisação e a imprevisibilidade

de sons e imagens, combinadas com o público e o espaço em si, transformam o

momento de performance num evento singular, impossível de ser revivido em

toda sua profundidade. Ao se compreender esta capacidade temporal e efémera,

podem-se combinar um conjunto de teorias e práticas criativas que se articulam

pela música, conceptualidade e espaço, garantindo a validade da experiência.

A performance constrói-se como um processo comunicativo. Pegando no modelo

simples de C.E.Shannon e W.Weaver (1949), há um emissor, neste caso o VJ, o

qual é responsável pela codificação da mensagem, existe a mensagem em si que

é construída de em tempo-real pelo próprio VJ durante o momento performativo,

mensagem esta que é enviada por um canal, neste caso pela projecção, existindo

um receptor, i.e., a audiência, à qual se quer promover uma experiência, e que

detém a aptidão de descodificar essa mensagem. Neste processo comunicativo

existe igualmente ruído, oferecido pela quantidade de luzes estroboscopias,

fumo, quantidade de pessoas, e qualquer outra variável que prejudique o acesso

à mensagem. Mas após a recepção dessa mensagem por parte do público, este

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Performance 87

Page 100: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

emitirá um feedback, e esse tem que ser perceptível pelo VJ, já que é através das

reacções do público que constrói o contínuo e diversidade de mensagens. Nessas

reacções efémeras da audiência perante os visuais e a música, o VJ é capaz de

proporcionar intensidades performativas, as quais têm um efeito impactante na

evolução da experiência. Em VJing, não existe um contacto visual permanente da

audiência com a projecção, e por tal a performance deve ser pensada e edificada

nesse sentido. Falar em performance em VJing é assumir a sua base construtiva

em tempo real e marcá-la como a característica que a avulta de todas as outras

performances artísticas fundamentadas em imagética.

3.4.1. PERFORMER E AUDIÊNCIA

No momento performativo constrói-se a obra, a qual o VJ desenha consoante o

contacto com a pré-concepção da imagética e através de decisões impulsivas e

reactivas perante a audiência. Este evento é transitório, move-se em tempo-real

e ao vivo, e demanda uma incessante comunicação entre o performer e o público.

Ao longo do contínuo e efémero instante performativo estabelecem-se conexões

entre estes dois elementos. Há um duplo diálogo entre as imagens e os sentidos

da audiência, e entre a audiência e a sensibilidade do VJ. Por este prisma, a obra

em si apenas se figura através desta interacção. Contudo, uma comunicação de

sucesso nem sempre é exímia, pois subsistem graus de aleatoriedade e de

imprevisibilidade, desenhadas pelo improviso. Christine Mello, no seu artigo

Imagens ao vivo, afirma sobre este assunto que "quando projecções incluem a

participação da audiência e tempo-real no próprio núcleo de significado e

construção sensorial, elas tornam-se numa espécie de arte que não é orientada ao

objecto, transitória e efémera, em oposição à arte relacionada com um produto

específico (como um videoclip), para o resultado final de uma peça ou a

contemplação de um espectador." (Mello, op. cit, consult. 22-05-2009)

O objecto artístico em si, não é suficiente como estudo, pois este ganha corpo nas

relações momentâneas, e o valor artístico, por sua vez, conquista significado com

base na experiência.

Uma das marcas do trabalho realizado ao vivo é sua relação com a pista. Mesmo

previamente definida, a sequência dos sets de imagens dependerá da atenção

ou dispersão da pista. A esta atenção e vibração do público é cognominada de

Temperatura de pista, sendo uma expressão próxima à temperatura de cor, mas

aqui procura-se um tipo de tom, cor, ritmo e qualidade visual para se constituir

um ritmo de fruição, uma evolução de estímulos. O performer é responsável pela

escolha do que projectar, quando projectar, o momento de retirar a imagem e

88 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Performance | Performer e Audiência

Page 101: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

deixar apenas a cor branca ou outra cor, relacionando-se à construção do ritmo

com o público. O modo como está a atenção do público, a quantidade de pessoas

ali presentes e a música tocada vai criar a experiência.

Não existem regras que delineiam para qual imagem mudar ou não, mas existe

um processo cognitivo: a cognição situada. Esta é-nos apresentada como um acto

cognitivo resultante de uma simbiose quase perfeita entre o aprendiz e o meio

envolvente, criado para favorecer uma aprendizagem, baseada em circunstâncias

interactivas e em tempo real. A cognição situada define que todo ato cognitivo é

um ato experiencial, e, portanto, situado, resultante do acoplamento estrutural e

da interacção congruente do organismo no seu ambiente, ou seja, organismo e

ambiente constituem uma unidade inseparável, e a dinâmica de interacção

ocorre contínua e simultaneamente. Esta teoria ajuda a explicar estas pressões

de tempo, escolhas em tempo-real, bem como a importância das acções no

contexto destas práticas criativas. Como se activa a desempenho cognitiva no

ambiente usando ferramentas e técnicas, bem como o movimento e espaço em

tais ocorrências realizadas, tem uma importância fundamental na construção de

experiências reactivas ao trabalho realizado. Aprender em tempo-real quais as

imagéticas, efeitos, e ritmos que funcionam num determinado momento entre a

música e o público, é o que permite ao VJ tornar-se mais consciente da imagem

performativa, potenciando posteriormente as suas apresentações.

VJing cria reinos improvisados, onde os participantes se envolvem na criação

momentânea do performer. Certo é que, para a audiência uma imagem passa, tão

rápido, sendo difícil de afirmar a sua função, o seu contorno, numa primeira vista,

e volta associada com outra, permanecendo agora por mais tempo, mas mesmo

assim a imagem volta a escapar. A falta da imagem, aquela imagem que se tornou

a companheira sequencial, passa a funcionar como uma solicitação para o ver.

A construção visual funciona em sequências e ritmo, e essa articulação permite a

construção de narrativas por cada elemento da audiência, pois trata-se de uma

obra aberta a múltiplas interpretações, independentemente das suas medidas de

abstracção ou figuração. A performance não conta histórias, mas sim induz à sua

criação, i.e., o público é convidado a explorar a imagem e respectivas mensagens.

A criação de narrativas é apenas uma amostra do poder imagético. O performer

deve assim, contactar o público e convidá-lo a olhar mais vezes para a projecção

usando repetições de imagens,sugerindo uma construção colectiva de um espaço

e tempo. Apesar de não existir uma narratividade vincada, como no cinema, onde

existe gradações de clímax, plot points e resoluções, existe igualmente essa noção

de ritmo evolutivo. Pode considerar-se um progresso temporal, não só vincado

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Performance | Performer e Audiência 89

Page 102: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

pela resposta da audiência, mas igualmente desenvolvida pela expressividade do

artista performativo, o VJ.

A construção visual deve obedecer a um conjunto de processos de aprendizagem

ao vivo, baseados na configuração visual e na reactividade de um público. O acto

performativo é a base estrutural de todo o trabalho de VJing, é o que proporciona

momentos sinestésicos, a construção de um ambiente imersivo, e a comunicação

das mensagens que foram previamente arquitectadas num momento conceptual.

A performance é um contacto, uma capacidade de criar laços entre as sensações

e as imagens, é de facto, o momento criativo. O sucesso performativo envolve

assim, experiência e conhecimento de causa, que apenas poderá ser harmonioso

com treino da prática. Falar em VJing e nas correspondências entre audiência e

performance é acima de tudo, saber dialogar.

Concluindo esta ideia, segundo Edmond Couchot, “a imagem é, uma actividade

que põe em jogo as técnicas e um sujeito (artesão, artista...) que, além de operar

com estas técnicas, possui um savoir faire que leva um ‘traço’, voluntário ou não,

de uma certa singularidade. Como operador, este sujeito controla e manipula as

técnicas, mas ele também é ‘operado’ por elas, é modelado pelas técnicas através

das quais ele vive uma experiência íntima que transforma a percepção que ele

tem do mundo: é a experiência ‘tecnestésica’. As técnicas não são somente modos

de produção; são também modos de percepção do mundo. As técnicas novas não

se entranham necessariamente numa nova imagem, mas fazem surgir as

condições da sua aparição.” (Couchot, op. cit., 1998)

3.4.2. INTENSIDADE NA CONSTRUÇÃO VISUAL

Durante a performance, a ‘vibe’ do público interfere na lista do DJ, o VJ, por sua

vez, selecciona as imagens consoante as músicas que são tocadas e perante a

reacção dos participantes. A escolha de cores e velocidade, como exemplo, pode

estimular a audiência com maior ou menor intensidade, permutando a sensação

do ambiente. A intensidade é a forma que o VJ possui para atrair a audiência, de

captar a sua atenção, fazendo com que sinta o que a imagem produz, podendo

incluir uma possibilidade dramática. A intensidade está directamente relacionada

com o nível de energia expressa ou modelada através de um sistema. Variar

intensidades funciona como atracção cognitiva.

Na visão, estudos psicológicos mostram que não é cor, mas o contrastaste em

intensidades luminosas que é importantes para a percepção de movimento,

profundidade, perspectiva, movimento relativo de objectos, sombreamento e

90 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Performance | Intensidade na Construção Audiovisual

Page 103: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

gradações de textura. Criar tensão dramática e manter a atenção em práticas

como VJing, pode ser assim, conseguida, variando contrastes ou através da

construção de intensidade. Exemplos deste incluem velocidade e movimento,

mudanças de direcção ou de qualidade de movimento, as formas e as mudanças

de forma, tonalidade, brilho e saturação, timbres e qualidades tonais, ritmo e

outros dispositivos composicionais.

Uma estrutura dramática em narrativa é forjada ao longo do conflito e plotpoints,

subindo a acção e resolução desses conflitos que constroem a intensidade para

um clímax. O drama é criado através de intensidade. A simples exposição de

forma dramática invoca um grande clímax e resolução. Em VJing não existe uma

narrativa concreta, mas existe um conjunto de factores que determinam picos de

ritmo e intensidade. Nesse ponto, quando se associa uma presença dramática em

VJing, está-se a reportar a um conjunto de variáveis rítmicas que se aglomeram

com o som, e criam momentos mais marcantes na experiência performativa.

No design de som, por sua vez, a articulação do som em tempo é chamado de

"envelope". O envelope possui ataque, suspensão, decadência e libertação.

Envelopes são meios familiarizados para moldar e manipular sons em samplers e

num software ao longo do tempo. O envelope é também utilizado para conceber

diferentes timbres ou tonalidades de som. Em termos de percepção, alguns dos

neurónios envolvidos na audição só são sensíveis ao início de um som e outros ao

final de um som. Isto significa que processamos o som de forma temporal e em

situação “envelope”, o que influencia a percepção do timbre. Outros métodos

gerais de produção de intensidade dramática na música são frequência ou pitch,

intensidade sonora ou amplitude, do espaço e timbre. Posto isto, as práticas de

VJing devem ter em consideração estas diferentes intensidades existentes na

música e na imagem. As intensidades, em especial na imagem, podem conseguir-

se articulando conteúdos imagéticos fortes, efeitos em ritmo. Por outro lado, os

artistas de VJing não devem recear usar a tela vazia, tal como um compositor usa

o silêncio ou pausa nas notas da música.

Intensidade é assim, um elemento importante da arte do movimento, não exige

convenções da história, sendo importante para a criação e exploração de novas

práticas que convergem áudio e visual e físico e corporal num trabalho

socialmente interactivo.

Compreender como a intensidade funciona é, também importante em termos de

modelagem de formas mais expressivas. Isto é especialmente verdade em termos

de formas musicais, que contêm diferentes intensidades e contrastes delimitadas

frequentemente por uma série de secções. Usando intensidade expressivamente

em multimédia, significa que se entende como expressar intensidade no

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Performance | Intensidade na Construção Audiovisual 91

Page 104: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

som, com a luz, nas imagens em movimento, bem como o modo como estas

formas podem ser misturadas e moldadas de forma a criarem um trabalho mais

apelativo e expressivo.

A intensidade expressiva pode ser realizada através de diversas configurações

performativas, contudo existem algumas predominâncias. Como exemplos, usar

ritmos diferentes com a mesma imagem numa agrupada sequência induzindo

sensações opostas como serenidade e confusão. Um outro exemplo pode ser o

de tentar provocar choque físico pela imagem, de forma a ‘inserir’ a pessoa da

pista no vídeo projectado. Para tal, a imagem pode prolongar a noção espacial,

acontecendo especialmente com visuais em 3D. Estas configurações dependem

sempre da intenção performativa, embora o momento intensivo se crie por um

processo de alguma capacidade de sensibilidade e improviso.

Existem inúmeras possibilidades de configuração das performances, contudo é

certo que a intensidade é a forma de se estabelecer diálogo entre VJ e público.

Este diálogo funciona em parelha com o musical, e arquitecta igualmente, uma

experiência que é distinta. VJing constrói-se nesse jogo de sensibilidades entre o

que é projectado e como se proporciona a reacção, de tal forma que, se adeqúe

seguidamente o continuo da performance a essa reacção. Intensidade é assim, a

ferramenta das performances.

3.4.3. TECNOLOGIAS E INTERACTIVIDADE

No curso deste século, verificamos um deslocamento das funções instauradoras

pelo artista para funções da sensibilidade receptora, o que produz na esfera das

artes uma certa desordem conceptual caracterizada pela mistura e hibridação de

géneros, poéticas e atitudes artísticas. A verdadeira qualidade da nossa relação

com o real não reside agora portanto, na impressão visual, mas sim nos modelos

formalizados dos objectos e o espaço que o cérebro cria a partir das sensações

visuais. Essas sensações visuais são lançadas pela aspiração a uma sinestesia e sua

correspondência sensorial, assim como o fascínio pela visualização do som e sua

materialização. Estas distintas propriedades criativas têm contribuído para

arquitectação de diferentes configurações artísticas. Por um lado, produzem-se

obras que procuram estruturar a experiência sensível do espectador, i.e. que se

constituem como dispositivos de percepção. Esta vertente implica o espectador

como ‘suporte’ da construção perceptiva, sendo nele que esta se projecta.

Paralelamente, existe a possibilidade de criação de um dispositivo de interacção,

com funcionamento análogo ao sistema sensorial e que vai implicar a acção ou

92 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Performance | Tecnologias e Interactividade

Page 105: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

actividade do espectador na gestão dessa relação de analogia. Nestas duas

vertentes o espectador é integrado na trama constitutiva da obra, tanto passiva

como activamente,mas sobretudo implicado numa extensão do sistema sensorial.

Em VJing as sintaxes visuais, podem assim obedecer apenas a construções

orientadas para a criação de sistemas e dispositivos perceptivos, que modelam a

experiência sensível do observador, por outro lado, podem igualmente construir

a experiência orientada no desenvolvimento de sistemas e dispositivos para uma

performance, que implicam o corpo e a acção. Neste último ponto cruzam-se

questões sobre interactividade na obra artística, na qual existe uma necessidade

reactiva por parte do receptor.

O tema da interactividade, por sua vez, percorre quase todo o século XX. Marcel

Duchamp já defendia que era o espectador que realizava a obra, o que faz indicar

uma preocupação com a recepção. Este sentido receptivo e de introdução do

receptor na obra de arte, pode seguir esta linha de percurso: participação passiva

(contemplação, percepção, imaginação, evocação, etc.), participação activa

(exploração, manipulação do objecto artístico, intervenção, modificação da obra

pelo espectador), participação perceptiva (arte cinética) e interactividade, como

relação recíproca entre o utilizador e um sistema inteligente.

Pode afirmar-se que toda a arte é interactiva pois toda a expressão artística é

fruto da interacção entre a obra, o artista e o interpretante. Os signos que

compõem a obra de arte são expressos pela interacção entre a subjectividade do

artista, o meio pelo qual ele dispõe para materializar a obra. Com base na teoria

dos signos de Pierce, pode considerar-se que o signo artístico, como qualquer

outro, só obtém realmente sentido de arte quando exposto a um interpretante

ou um agente inter-relacional capaz de dinamizar a obra de arte. Assim, o

processo artístico é um complexo de inter-relações, uma troca de signos entre

múltiplos elementos integrados no diálogo em constante movimento, onde

cooperação e conflito originam uma linguagem estética que comunica uma ética

inerente a cada cultura e a cada época, mas que está presente em todas

manifestações criativas.

Contudo, o advento da tecnologia, permitiu pensar em novas formas de se pensar

em comunicar artisticamente. Estes artistas tecnológicos, por sua vez, estão mais

interessados nos processos de criação artística e de exploração estética do que na

produção de obras acabadas. Interessam-se acima de tudo, pela realização de

obras inovadoras e ‘abertas’, onde a percepção, as relativas dimensões temporais

e espaciais representam um papel indubitável na maioria das produções da arte

ligada à tecnologia. Nesta vontade participativa surgem as artes interactivas, as

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Performance | Tecnologias e Interactividade 93

Page 106: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

quais inserem na análise performativa, uma capacidade construída por interfaces

técnicas com noção de programação. O termo “arte interactiva” expande-se no

começo dos anos 90 com a aparição das tecnologias apropriadas, ligadas por

rede, expostas em inúmeras feiras e exposições de arte de tecnologia electrónica.

Esta perspectiva interactiva em arte alicerçada por interfaces e programação,

pode ser apelativo para a performance de VJing, embora o papel da audiência se

figure activamente na construção da obra. A performance nesta perspectiva, não

se centra apenas no improviso e sensibilidade do VJ perante a reacção do público,

mas o próprio público é o performer. Nesta configuração, o artista performativo

tem um papel mais reduzido, visto que a tecnologia processa-se muitas vezes

autonomamente, ficando apenas responsável por alguns ajustes. Esta é um dos

dilemas tecnológicos, pois é necessário questionar, até que ponto a tecnologia

complementa ou destrói a arquitectura da obra e o momento criativo.

Primeiramente, é necessário compreender a dinâmica interactiva. A obra, na sua

génese, abre-se ao público e pode reproduzir-se sem limites. Contudo, existe um

papel híbrido entre autor e criador nestes ambientes interactivos. Os sentidos da

obra artística aqui, são produzidos durante o curso de um processo de diálogo,

lançado pelos autores, actores, co-autores como ‘agentes inteligentes’ da obra.

Nas artes da interactividade, o destinatário potencial torna-se co-autor e as obras

tornam-se um campo aberto a múltiplas possibilidades e a desenvolvimentos

susceptíveis, imprevistos numa co-produção de sentidos. É assim que nasce a

chamada inteligência distribuída ou colectiva. A questão da autoria é vista por

Couchot da seguinte forma: “num processo dialógico ou de troca interactiva, o

estatuto da obra do autor e do espectador sofrem fortes alterações. Na metáfora

geométrica ou no triângulo delimitado pela obra, o autor e o espectador vêem a

sua geometria questionada, pois esse triângulo pode tornar-se um círculo onde os

três elementos não ocupam posições definidas e estanques, mas trocam

constantemente estas posições, cruzam-se, opõem-se e se contaminam.” (Couchot,

op. cit., 1998)

Uma obra de arte interactiva é um espaço latente e susceptível de todos os pro-

longamentos sonoros e visuais. O cenário programado pode modificar-se em

tempo-real ou em função da resposta dos utilizadores. Existe assim uma inter-

relação permanente entre o autor e o co-autor, ou seja, o público.

O modelo de interactividade vigente é o modelo estabelecido hoje em dia em

grande escala e nos meios digitais interactivos massificados. É um modelo que

une o ramo do sujeito e da obra e marca fronteiras exactas através dos interfaces.

Em VJing, configurações interactivas compõe-se através de um ecrã, no qual se

visionará a obra; uma ou mais câmaras medidoras de movimento da audiência

Img.29. The Special Player,

instalação interactiva, festival

Transmediale 2008

94 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Performance | Tecnologias e Interactividade

Page 107: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

[1] Philip Galanter:

(US),(MFA). Artista/

Professor. Ensina

"Foundations of Generative

Art Systems", no curso

"Interactive

Telecommunications", na

New York University, US.

(geralmente de infra-vermelhos); um computador que possui a aplicação à qual

chega o movimento captado pela câmara, que interpretará e produzirá

visualmente o resultado dessa interacção. O artista performativo, neste sentido,

não possui um papel tão activo na performance, visto que é partilhado quer pelo

público, quer pela aplicação.

De certo modo, a interactividade não é somente uma comodidade técnica e

funcional. Ela implica igualmente uma prática de transformação física, psicológica

e sensível do espectador. Embora, em performances como o VJing, esta evidência

pode alterar a ideologia das performances. VJing implica uma acção em tempo-

real, uma construção visual que se concretiza ornamentada pelo som e pelo papel

receptivo de um público. O VJ é aquele que dá corpo ao momento, que figura a

mensagem. Assumir um objecto interactivo é oferecer ao público a possibilidade

de criar, de ver visualmente o resultante dos seus movimentos. Por um lado,

pode parecer bastante atractivo, mas por outro pode imaginar-se cansativo e

desinteressante. Quando se pensa em VJing sem este papel de interacção prática,

pensa-se em encontros esporádicos entre audiência e imagem, permitindo que se

criem narrativas mentais. A interactividade por sua vez, pode funcionar como um

aparato tecnológico, o interessante dessa performance é a resultado dessa

actividade, e não tanto o conteúdo. A interactividade em Vídeo Jockeying pode

ser considerada sim, como uma sugestão criativa ao público, mas carece de

algum domínio visual, de mensagem e sensação, que geralmente uma obra sem

este fausto técnico transmite.

De qualquer forma, a interactividade faz parte das novas fronteiras criativas, e

através dela podem construir-se experiências incríveis. O que se deve reforçar é

capacidade criativa e multidisciplinar do artista. A interactividade como relação

recíproca entre utilizadores e interfaces computacionais inteligentes, suscitada

pelo artista,permite uma comunicação criadora fundada nos princípios sinérgicos,

uma colaboração construtiva, crítica e inovadora. A interactividade aparece como

uma nova condição da recepção para interpretar a obra, como índice de um

desejo colectivo de suavizar os limites impostos tanto do ponto de vista da

concepção com da recepção.

A arte é isso mesmo, um mundo de possibilidades criativas. Com a proliferação

da tecnologia nos meios artísticos, surgem novas representações artísticas, como

os ambientes generativos. A arte generativa aqui, não é referida como objecto de

estudo, mas sim mencionada como uma possibilidade criativa da Era Tecnológica,

e como probabilidade integrante das performances visuais. Segundo, Philip

Galanter [1] “A Arte Generativa refere-se a qualquer prática de arte onde o artista

use um sistema — tal como um conjunto de regras naturais da linguagem, um

Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Performance | Tecnologias e Interactividade 95

Page 108: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

programa de computador, uma máquina ou outra invenção de procedimentos,

que são postos em movimento com algum grau de autonomia e que contribuam,

ou resultem num completo trabalho de arte." (Galanter, What is Generative Art?,2003)

A arte generativa propõe assim a existência de automação, sendo gerada,

composta ou construída de formal algorítmica, por sistemas algoritmos definidos

e oferecidos por uma aplicação ou software, que define assim um processo

autónomo. A arte generativa não é só um meio de comunicação. Ela é vista como

a matéria-prima para a interpretação, num caminho absolutamente arbitrário e

para um público culturalmente heterogéneo. A arte generativa na sua real

compreensão, deve ser entendida como um processo computacional e não é o

seu resultado final que deve ser o mais valorizado, mas sim todo o processo de

desenvolvimento. Projectos de arte generativa, são trabalhos de arte complexos,

porque articulam o espaço dentro de diferentes possibilidades de criação pela

escolha. A tecnologia está pensada como uma partitura com as estruturas

definidas para sua realização, como uma performance dentro de determinadas

regras. Na realidade, são campos de relação de causa e efeito numa sequência

não linear, já que a arte generativa trabalha a relação temporal, o tempo

cronológico e o tempo dentro do projecto.

Temos o exemplo do artista performativo Marius Watz que tem trabalhos de

ambientes generativos, fazendo parceria com um DJ (Img.30).

A arte generativa vive assim, dos artistas que variam determinadas regras e

propriedades de uma obra, e das suas possibilidades consideradas por um meio

de visualização, onde são definidas um conjunto de formas, aliadas a um número

de propriedades variáveis.

Todas estas possibilidades tecnológicas baseadas no diálogo entre um autor e um

receptor, que se apresenta como um co-autor em alguns casos, contribuem para

a compreensão da grandiosidade tecnológica na construção de alternativas

artísticas. É imprescindível considerar a força que a tecnologia exerce sobre as

novas manifestações artísticas. Através dela ampliam-se sentidos criativos e

moldam-se experiências que outrora pareciam impossíveis.

Em VJing, mostra-se necessário considerar-se estas alternativas como ponto de

partida para uma escolha organizada e conceptual, por parte de todos os

interessados nesta prática. Certo é, que esta multidisciplinaridade do VJ,

oferecem-lhe um reconhecimento quando compreendidas e retidas as suas

potencialidades como criador artístico.

Img.30 Alexander Rishaug &

Marius Watz, 2008.

96 Desconstrução e Análise Qualitativa | VJing e Performance | Tecnologias e Interactividade

Page 109: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |4. POTÊNCIAS

O conglutinado imagético de Vídeo Jockeying apresenta-se adjectivado por uma

sensibilidade performativa aliada a um longo processo criativo. Considerar a

presença de potências, prende-se na necessidade de encontrar pontos de válidos

na estrutura visual destes artistas. As potências são valores notórios oferecidos

pelas etapas de elaboração criativa. Para isso, procura responder-se a um grupo

de conexões inter-relacionais entre as variáveis anteriormente dissecadas, para

se assimilar a marca activa do VJ. Consequentemente, considera-se o contexto

das artes na intersecção entre a validade formal e ideológica destas construções

visuais performativas. Ao se conjugar um certo número de variáveis, é possível

assim compreender como são realizadas as apresentações visuais, i.e., através da

forma como são apresentadas, entende-se a sua intencionalidade construtiva.

4.1. QUADROS RELACIONAIS E HIERARQUIAS

Operando neste sentido, é proeminente figurar como as variáveis de VJing se

conjugam na edificação criativa e singular. Relacionar música, conceptualidade,

espaço e performance complementa o conhecimento sobre o que interfere na

prática e sucesso desta expressão. Estas variáveis estão emaranhadas entre si, e

por tal uma divisão linear nem sempre é possível, contudo é exequível apresentar

algumas relações particulares entre elas, que estipulam hierarquias no momento

97

Potências | Quadros Relacionais e Hierarquias 97

Page 110: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

performativo. Sendo assim, primeiramente, apresenta-se um quadro de relações

primárias que determina a configuração base da estrutura de VJing.

Neste quadro de relações considera-se a conceptualidade com o centro relacional

pois é através dela que se proporcionam todos os outros campos. A relação da

conceptualidade está iminentemente ligada com a variável da performance, já

que é por esta última que se processa uma estrutura e um sentido performativo

dos visuais. O acto performativo, varia inevitavelmente com a música e o espaço,

sendo a música a mais evidente no decorrer da performance, visto que é através

dela que se orquestram ritmos e se buscam encontros sinestésicos. O espaço, por

sua vez, nomeadamente, o espaço da projecção, é o responsável pela incidência

da imagem na audiência, a qual é capaz de oferecer uma resposta reactiva ao VJ,

que por tal determinará a sua actuação performativa.Contudo, a conceptualidade

pode ser pensada pela relação com a música i.e.,se houver um pré-conhecimento

da sonoridade do DJ ou banda, determinando a escolha de certos conteúdos em

detrimento de outros. O acto conceptual pode ainda relacionar-se directamente

com o espaço, isto se possuir um papel de intervenção espacial, na construção de

uma ambiência concreta. Esta última relação acaba por ser a mais afastada, pois

esta implícito ao acto performativo criar a ambiência,embora a existência de uma

configuração espacial como o uso de múltiplas telas possa interferir na momento

da conceptualidade. Este quadro de relações aproxima-se da sugestão de uma

hierarquia de condições de base estrutural que interfere na postura do VJ.

Continuamente, apresenta-se um quadro de relações complementares. Neste, as

relações que são estabelecidas provêm das principais dicotomias inerentes às

variáveis apresentadas. A existência destas dicotomias pode alterar formalmente

as configurações hierárquicas. Considerando a conceptualidade, esta em termos

genéricos pode ser pensada de forma mais figurativa ou mais abstracta. Sendo

assim, a relação posterior na performance será a de realizar micro-narrativas ou a

de se estruturar num fundamento mais estético e imersivo. A performance em si,

pode ser caracterizada pela relação com a audiência, determinando a conduta da

acção do VJ, ou pela relação musical, buscando acompanhamento. Por sua vez,

existe ainda uma terceira variável que é o factor improviso, que constrói ambas

as possibilidades criativas. Quando à musica, esta está intrínseca à presença da

performance e pode edificar-se procurando sincronismo musical ou libertando-se

deste, oferecendo momentos de ‘independência’ visual. O espaço em si, é fulcral

para a condicionante performativa e conceptual, i.e., a posição das telas interfere

nas composições mais figurativas, nas quais há uma possibilidade de narrativa,

pelo que, a as telas devem estar numa posição mais presente para o olhar da

Img.31 Quadro relacional

primário.

Img.32 Quadro relacional

complementar.

98 Potências | Quadros Relacionais e Hierarquias

Page 111: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.33 Quadro relacional

variáveis externas.

audiência, o que já não se mostra tão relevante quando o conteúdo é abstracto e

os contactos entre o olhar da audiência e a tela se fazem de forma esporádica,

por estes orquestrarem especialmente a ambiência, complementando o espaço

juntamente com as luzes coloridas existentes no local. Hierarquicamente as

correspondências entre as variáveis interiores às variáveis maiores, podem ser

delineadas de formas diversas porque vão depender das prioridades conceptuais.

Exemplificando, uma performance que se envolva numa construção de carácter

mais abstracto, pode procurar primeiramente um sentido musical, e outra mais

figurativa, um sentido mais espacial. As hierarquias não são exímias, pois estes

campos estão constantemente interconectados, mas aqui apenas se delineia uma

perspectiva prática genérica. Este quadro de relações complementares, objectiva

assim, as condicionantes intrínsecas a cada uma das variáveis e em como elas se

cruzam constantemente numa lógica performativa.

Para se relacionar estas variáveis é importante citar igualmente, a presença de

variáveis externas. Estas varáveis interferem na acção performativa e são, em

geral, incontroláveis pelo VJ. Nomeadamente podem ser a arquitectura do

espaço, o público, o DJ, e a tecnologia. A arquitectura do espaço condiciona a

variável do espaço da projecção,se está ao não numa posição óptima para o olhar

do público, e na posição espacial do VJ, i.e., se ele se encontra num local onde vê

a projecção ou se está longe desta e apenas a visiona pelo seu monitor. Esta

condicionante pode interferir no momento performativo, especialmente pela

necessidade do contacto visual entre o VJ e o público, factor que determina o

desenrolar do acto performativo. O publico, por sua vez, interfere no sentido do

espaço ter muita ou pouca afluência de pessoas, o que pode desmotivar um

empenho na performance se a assistência for mínima e além do mais, pode

figurar-se incontrolável obter uma resposta visível do publico perante os visuais

que se apresentam, daí ser um acto que envolve substancialmente um caris de

improviso. O DJ, por seu lado, pode conduzir a musicalidades imprevisíveis que

dificultem uma busca ritmada dos visuais com a música. Regra geral, os VJs

raramente estão inteirados dos sets dos DJs, e por isso as construções visuais no

acto conceptual, funcionam de forma independente da sonoridade que

posteriormente se articulará com eles.

Por fim, a tecnologia pode interferir e prejudicar significativamente a acção do VJ.

O que pode acontecer, é presenciar-se é um mau funcionamento destes set ups

do VJ, nos quais e.g., o computador pode bloquear em algum momento e o

publico ficar a olhar para uma tela vazia, ou outra imagem oferecida pelo próprio

projector. Para se minimizar acidentes com a tecnologia é importante usar-se

Potências | Quadros Relacionais e Hierarquias 99

Page 112: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

uma boa compressão de vídeos, para se processarem mais rápido, assim como

usar apenas um tipo de codecs de vídeo, facilitando o desempenho.

Sendo assim, ao considerar este quadro de variáveis externas, procura-se tomar

consciência das adversidades que interferem na performance, maximizando-se a

probabilidade de controlo e sucesso.

Globalmente, e assimilando todos os anteriores quadros relacionais, obtemos um

quadro genérico que relaciona todas as condicionantes apresentadas. Posto isto,

obtemos uma conjugação de valores que acciona a apresentação prática do VJ. A

conceptualidade continua no centro desta articulação, seguida da performance

que estabelece ritmos e temporalidades, seguidamente a música e espaço como

valores presentes da arquitectura performativa. As variáveis externas e internas a

estes quatro valores principais, quando conjugadas, expõem validações diversas,

as quais vão depender da intenção do VJ e do seu grau de consciência perante as

possibilidades e imprevisibilidades da performance. As hierarquias variam em

especial, com o conteúdo conceptual reposicionando continuamente o VJ.

Esta análise de relações propõe assim uma vontade de validação desta forma

artística, pela sua consciencialização. Falar de Vídeo Jockeying como uma prática

artística é assumir directrizes múltiplas, mas é acima de tudo, olhar para ele com

um potencial interessante, embora muitas vezes camuflado. Procurar sentido

nesta expressão artística é fundamentar a sua existência. Ao se analisar com

coerência as suas inerentes potencialidades está a abrir-se uma porta para um

progresso e para novas configurações artísticas.

4.2. VJING E ARTE

Na análise proposta pelo conjunto de variáveis apresentadas, é perfeitamente

visível a multiplicidade de disciplinas que envolvem o acto criativo e expressivo de

Vídeo Jockeying. Como somatório desta multidisciplinaridade, mostra-se

relevante considerar o potencial emergente encontrado nas mais diversificadas

abordagens. Deste modo, a capacidade de produção criativa das construções

visuais é profundamente ampliada quando inserida num processo consciente do

potencial oferecido pelo aglutinar das várias áreas que se podem entrelaçar na

construção da experiência para ambos, VJ e audiência. Talvez seja o ordenamento

de tecnologia, filosofia, criatividade, juntamente com o bombardeio dos sentidos,

que se mostra tão gratificante para aqueles que se convertem a esta prática.

Img.34 Quadro relacional global.

100 Potências | VJing e Arte

Page 113: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Por tal, esta constante reformulação e crescente interesse tem questionado o seu

valor como arte, i.e., até que ponto VJing é identificado e assumido com um valor

artístico. A verdade é que, VJing como arte depende de como a experiência é

vivida. Pode conseguir um potencial artístico quando se destaca de outras formas

expressivas por oferecer momentos sensoriais, produzidos por um diálogo num

ciclo de energias de mensagens e respostas emocionais (feedback). Posto isto,

esta ligação nem sempre é possível com outras formas de arte já que, em VJing é

possível interpretar humores e conduzir o público numa viagem, e neste sentido

é tanto uma acção performativa como uma forma de arte. Por outro lado, por se

inserir no contexto dúbio dos clubes, marca-se uma certa resistência como arte.

Um dos contra sensos actuais, prende-se exactamente nessa questão, sendo que,

hoje em dia, não existe ainda uma profunda valorização cultural pelo contexto de

expressão em que está inserido (os clubes nocturnos, ambientes de diversão). Por

tal, uma das possibilidades de evidenciar esta prática como arte, relaciona-se

inevitavelmente com o vínculo criativo da imagética e com o factor do espaço de

projecção, que deve mostrar-se sempre acessível ao olhar do espectador. Os

visuais são o centro criativo, e a performance dá corpo a essas imagens, existe um

grau de liberdade criativa muito marcante, mas cabe ao próprio VJ saber conjugar

todo o potencial que a ele está inerente.

VJing constrói um ambiente que propõe uma qualidade de sinestesia, numa

relação entre os sentidos, oferecendo às pessoas presentes uma experiência

potencialmente imersiva, algo que evolui em torno das necessidades e das

subjectividades presenteadas pelas novas formas de comunicação do mundo

contemporâneo, o qual é marcado em geral, por uma multiplicidade e velocidade

nas artes. Esta capacidade activa e sinérgica, envolve diversos momentos de

produção, desde a captura de imagens ou apropriação de samples, até ao

momento performativo em que se cria uma obra ‘aberta’. A acção do VJ não é um

produto pronto, acabado, para ser apreciado pelo público, como acontece com o

cinema em geral, ou um quadro ou uma escultura tradicional, ele, por sua vez,

possui este carácter performativo e está sempre a renovar-se, a ajustar-se de

acordo com as contingências do momento. É um trabalho acima de tudo volátil,

que nunca está terminado, mas constrói momentos, e nesses momentos

aglomeram-se um conjunto de capacidades que com outras disciplinas artísticas

não se consegue. É uma arte em tempo, e como Riddell afirma "o nosso século

transformou a instalação numa forma de arte" onde os conceitos começaram a

ser experienciados por meio de lugar, imagem e som. (Ridell, 2001, cit. por Tordino,

2007) Sendo assim, o Vídeo Jockeying pode ser considerado “a origem dos

Potências | VJing e Arte 101

Page 114: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

‘happenings’, realizadas na cultura dos clubes nocturnos." (Emmerson, 2001, cit. por

Tordino, 2007) Como catalisador de uma obra momentânea, o VJing pode e deve ser visto como

forma artística, já que se desenvolve em constante improviso e em sensibilidade

estética. Para além disso, VJing é um conjunto de disciplinas num só, envolve um

trabalho metódico de construção ou reformulação de imagens, exige a presença

de uma consciência comunicativa e acima de tudo, é capaz de desenhar múltiplos

universos para cada espectador. Por outro lado, os espaços que se reinam pela

música electrónica, figuram-se inadequados para as necessidades artísticas da

sociedade contemporânea, já que no espaço, é apenas uma segunda alternativa,

estando a audiência mesclada pela envolvência da música, das imagens e da

socialização. Isso não implica porém, que as formas artísticas não se vinculem,

apenas estão camufladas em experiências.

Sendo assim, talvez não seja a galeria o lugar do VJ, estes espaços implicam uma

certa adaptação que destitui o mística realizada na performance. Para além disso,

a marginalidade em relação aos circuitos oficiais de arte pode ser algo positivo e

indicativo da marca média no VJing. A busca de alternativas para a manifestação

da arte é um tema válido e apelativo para esta sociedade em constante vontade

de recriar e quebrar normas comunicativas.

VJing tem portanto, ganho o estatuto de manifestação artística, afirmando a sua

presença em eventos da cultura electrónica, estando a captar a atenção da arte e

de estudiosos da tecnologia. É um reflexo artístico. Não fosse a arte, um mundo

de possibilidades de sentir o mundo.

102 Potências | VJing e Arte

Page 115: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |5. PERSPECTIVA PRÁTICA

Para completar os pressupostos analisados e intrínsecos à prática de VJing, a

prática assume-se como necessária. Para tal, propuseram-se duas performances

estruturadas por um conglutinado de diferentes articulações que é indicado pelas

diferentes variáveis que adjectivam a prática de VJing.

Considerando primeiramente em singularidade cada variável, foi possível definir

as suas principais particularidades no conceito global performativo. Analisando a

correlação VJing e música, ou de uma forma mais exacta, a relação entre imagem

e som num espaço e tempo performativo, os principais pontos centralizam-se na

dicotomia sincronismo e ausência do mesmo, na parelha audiovisual.

O sincronismo do ritmo visual com a música mostra-se como um complemento

da mesma, reforçando a sua existência, originando uma experiência harmoniosa.

Por outro lado, é possível igualmente, divergir dessa necessidade linear de ritmo,

e agenciar experiências de sinestesia, fazendo com que o ritmo da imagem se

torne mais um instrumento da música, oferecendo ao espectador a possibilidade

de ‘ouvir’ a imagem, ou ‘ver’ a música. Este mostrou-se um dos objectivos para

testar em performance. Tendo em conta que a linguagem musical visual nestas

práticas é muito similar à linguagem da música, pois baseia-se em ritmo, duração,

frequência, composição, traduz-se conceptualmente uma necessidade presencial

predominantemente abstracta. Esta particularidade vinca assim, a existência de

uma sinestesia pelo trabalho colaborativo entre a música e a acção realizada.

Perspectiva Prática 103

Page 116: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Aceitando como válido, este pacto que autoriza a vivência audiovisual, as

experiências práticas desenvolvidas procuram assim, demandar visibilidade à

performance e visuais, pelo aproveitamento desta relação dependente, ousando

sobressair os visuais perante a música, em determinadas partes da performance.

Quanto à conceptualidade, esta resulta num dos principais centros da actividade

de um VJ. A pré-preparação de conceitos e ideologias performativas são o ponto

fulcral para a determinação do sucesso da experiência. A primeira relação prática

delineia-se pela indispensabilidade de se definir sequências visuais organizadas e

contextualizadas, pois a ênfase não está naquilo que se vê, mas como sucedem os

volumes de imagens, i.e., determinados visuais justapostos potenciam momentos

experienciais, e se esses visuais não forem ‘complementares’ podem estragar-se

mutuamente. Sendo assim,a pré-montagem e a definição de objectivos sensoriais

e mensagens, procurou basear-se na característica exposta pelo público neste

contexto, i.e., o olhar ‘manchado’, demandando a criação de performances que

procuram uma apresentação ‘vaga’, i.e., não se procura contar histórias, mas sim

indicar-se algo. A aquisição de um banco de imagens e a sua prévia manipulação

estética e organizacional, foi o primeiro ponto para a construção das experiencias

práticas.

Por tal, nesta definição, procurou-se oferecer uma performance desenhada pela

estética abstracta na sua generalidade, jogando com cores, efeitos visuais, ritmos,

com um intuito, em primeira instância, sensorial. Como alternativa para o teste

prático, usaram-se igualmente imagens mais concretas e identificativas, como por

exemplo, excertos de filmes, induzindo a pequenas acções na imagem, que visam

sugerir fragmentos narrativos. Estas últimas, procuram sublinhar a arquitectura

visual de VJing que se instaura por processos de associação i.e., imagens que se

repetem, que se justapõem, incitando a visão. Por tal, ao se procurar jogar com o

subconsciente do observador é possível consagrar-se experiências imersivas, e

por outro lado marcar impacto no mesmo, por intensidades e pela possibilidade

de transmitir mensagens, tal como uma qualquer obra artística. Certo é que, o

público é sempre o centro de toda a performance, sem ele nada faz sentido, é

através dele que se conduz a performance e se procura converte-lo à atenção

imagética. Esta dualidade na configuração da exposição visual concede ao Vídeo

Jockeying uma enorme potência criativa. O que se encontra, geralmente, é uma

necessidade de romper com a figuração, porém, a abstracção tende à figuração, e

a figuração tende à abstracção. Nas performances, pretendeu-se analogamente

verificar se a tendência abstracta se traslada ou não para figurativa.

104 Perspectiva Prática

Page 117: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

No conceito espacial, a disposição dos locais da tela e do espaço de performance

do VJ foram condicionados pela configuração do espaço em particular. Uma das

principais características para demarcar a performance VJing, é a necessidade das

telas se apresentarem sempre visíveis ao público, impulsionando o olhar. Para

além disso, a dimensão da projecção interfere igualmente, é certo que em telas

maiores o movimento parece mais lento, e em projecções minúsculas, a imagem

pode apenas assumir-se como ruído e indispensável. Posto isto, e contando com

alguns factores externos imprevisíveis, a conceptualidade deve ser pensada num

tom neutro, adaptável às várias situações espaciais, embora o ideal seja uma tela

de médias dimensões, como foi no caso do espaço das experiencias realizadas.

A nível espacial existe ainda uma abordagem menos palpável, que se apresenta

pela capacidade imersiva oferecida pelos visuais. A imersão é a criação de um

novo espaço, um espaço que fica entre o real e o imagético, aquele que se situa

entre os dois, pois o observador oscila entre a pista e a tela, ou seja, a ambiência

é gerada pelo espaço entre-imagens, mas igualmente pelo espaço-luz e o espaço-

som. Partindo deste pressuposto, a prática destas sessões performativas procura

assim, jogar com o espaço e a projecção, de forma que se consiga criar mundos

híbridos. A experiência para o observador deve ser positiva, aprazível, gratificante

e ao possibilitar a imersão o público ‘integra-se’ na imagem, podendo abstrair-se

das suas condicionantes. Para se proporcionar a imersão, a imagética deve saber

orquestrar ritmos, ou por uma força abstracta ou por uma presença de pequenas

narrativas por associação figurativa.

Relativamente à variável performativa, VJing diferente das similares formas de

projecção, por se enquadrar num momento ao vivo e em tempo-real, i.e., existe

um factor forte de imprevisibilidade e exige igualmente sensibilidade do VJ para

conduzir a performance. Na conceptualidade as imagens são organizadas perante

distintos contextos, na performance essas imagens ganham sentido em sequência

pela variação na sucessão de imagens diferentes, criando desiguais momentos de

intensidade.A intensidade é atingida pela articulação da performance e o domínio

da linguagem performativa, do ritmo, dos efeitos, do movimento, marcados pela

‘temperatura de pista’, i.e., o grau de atenção ou dispersão do público. De uma

forma prática, as performances experienciadas procuraram articular esse acto

comunicativo entre público e imagens. A sequência de imagens na performance

incita uma resposta activa pelo observador. O que projectar, quando projectar,

que efeitos ou não usar, são as principais questões que todo o VJ lida durante o

memento performativo. Esta capacidade efémera e única da experiência visual,

conferem ao VJ a possibilidade de marcar presença, ou ‘atingir’ um determinado.

Perspectiva Prática 105

Page 118: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

observador, cuja experiência é vivida dependendo do local onde se situa no

espaço. O aqui e agora, oferece diversas potencialidades, sendo que, a procura de

maiores ou menores graus de intensidade, é realizada de acordo com a ‘vibe’ do

público, procurando oferecer, em primeira instância,uma experiência aprazível às

pessoas que se deixam ‘atingir’ pelas imagens. Estar atento a esta reacção e

conjugar estética, com música e improviso é tudo aquilo que o acto performativo

procura, e por tal, foi necessário experienciar tais relações.

VJing articula assim diferentes factores indispensáveis à materialização de

momentos agradáveis, potencialmente artísticos, sendo que, o VJ deve conhecer

e dominar o potencial das suas diferentes variáveis, para que consiga oferecer um

novo estatuto à sua prática. Nas experiências práticas realizadas, estas diferentes

variáveis inter-relacionais foram experienciadas, observando-se de perto o papel

da imagem nestes espaços regido pelo som.

Como crítica à cultura actual de partilha e acesso fácil a diferentes tipos de dados,

na performance usaram-se apenas vídeos apropriados, sendo que a maioria deles

possuem uma licença de uso, a chamada Creative Commons, permitindo a sua

utilização e reprodução. A maioria destes vídeos pertence a diferentes criativos

de Vídeo Jockeying, os quais divulgam em websites com o objectivo de partilha.

Para além disso, outra parte dos vídeos foram apropriados de websites como o

youtube e vimeo e foram posteriormente manipulados, fatiados e redesenhados

por efeitos, construindo assim ‘novas obras’. O software usado como preferência

foi o Resolume versão 2.3.

5.1. PERFORMANCES

O espaço onde se realizaram as performances foi o bar Plano B no Porto. Neste

espaço, a configuração da projecção situa-se lateral à pista e perpendicular ao

local do VJ que é ao lado do DJ (Img.35). Posto isto, foram realizadas duas sessões

de VJing em dias distintos. Na primeira testaram-se vários sets performativos,

cada uma para experienciar diferentes valores. Na segunda, sem um guião a

cumprir, apenas se explorou o diálogo entre audiência e imagens. Nesta ultima,

no final realizaram-se alguns inquéritos às pessoas presentes, para compreender

o impacto dos visuais no espaço e na experiência. Apenas se descreve aqui a

primeira performance pela relevância estrutural. O segundo acto performativo

será incluído na reflexão sobre os resultados.

Atendendo a todas as correlações anteriormente identificas e desenvolvidas, a

pré-preparação da primeira performance, i.e., a sua conceptualidade, foi o inicial

Img.35 Plano B – configuração

espacial

106 Perspectiva Prática | Performances

Page 119: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.36 e 37: set 1 exemplo de

imagens

Img.38 e 39: set 2 exemplo de

imagens

ponto de desenvolvimento. Para tal, com um set previsto de durabilidade média

de 3horas, foram decididos diferentes sets visuais, com diferencias nas variantes

e objectivos estimulantes distintos. Organizacionalmente foram divididos pela

categoria hierárquica principal, a conceptualidade. Neste ponto, a divisão fez-se

entre abstracto, em figurativo e a mistura de ambos, figurativo e abstracto. Na

divisão dos sets, estão implicadas particularidades que visam provar a eficiência

de determinados pressupostos. Sendo assim, a divisão dos sets (ver tabela em anexo)

implicou seis partes distintas às quais em média correspondiam cerca de vinte a

trinta minutos.

No primeiro set, conceptualmente procurou-se a abstracção. O objectivo, por sua

vez, prendeu-se com a busca de cor e da luz como estímulo, onde se manipulou

cores saturas e efeitos para evidenciarem a cor e a luz perante o acto musical,

como uma analogia à color music. Este set desenhou-se simples, como iniciador

da performance baseou-se num jogo simples de ritmos e cores, na tentativa de

um sincronismo musical. A proposta deste set foi realizada para se compreender

o efeito das formas simples e diferentes cromáticas da imagem perante o público.

A reacção do público inicialmente foi a de parar e circundar a tela, olhando para a

mesma sem prestar tanta atenção à música. Isto acontece por os públicos se

encontrarem formatados para visualizar vídeos de forma contemplativa, como no

cinema. Passado este momento, a intenção das cores e das formas simples,

parecia funcionar mais como um adereço espacial, como se completasse as luzes

coloridas. Os olhares encontravam-se com a tela, e o sincronismo musical parecia

ser algo importante. Neste set a hierarquia coloca a performance como principal.

No segundo set procurou-se novamente à abstracção, mas neste nível o objectivo

circundou a vontade sinestésica, procurando um diálogo concreto entre imagem

e música. Através do uso de formas e efeitos,buscou-se um rimo para se envolver

com a sonoridade, complementando-a, instruindo ritmo visual, como analogia à

visual music. Existe aqui uma procura de um ‘ritmo absoluto’, uma necessidade

de exagerar em ritmos, ritmá-los com o som, accionando uma presença visual da

música. A sinestesia, por sua vez, não é algo palpável, identificável. Compreender

como o público reagiu será sempre uma postura especulativa. Contudo,é possível

identificar as conexões com o som, i.e., até que nível se cruzaram e se afastaram.

Neste sentido, é observável a complementaridade continua entre ambos, pois os

visuais parecem estar a traduzir o som em imagens e não tanto o oposto. Mas a

criação de ritmos complementares com os visuais, funciona assim como um ritmo

interior à própria musicalidade. A capacidade visual articulada com a música

Perspectiva Prática | Performances 107

Page 120: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

amplia a experiência e isso é perceptível pela reacção do público. Neste set, a

hierarquia coloca a música como principal. No terceiro set, ainda com conteúdo pouco figurativo, tende-se a um momento

imersivo. Para isso, exageraram-se em ritmos e sucessão de efeitos e imagens, na

persecução de um contexto quase que ‘hipnótico’. A imagética tendencialmente

procurou efeitos como distorção óptica, e uma constância de efeitos visuais que

alterem qualquer sugestão figurativa, ou por outro lado uma sugestão figurativa

tal como uma pareidolia. Esta capacidade imagética tentou atrair o público a

‘entrar’ num novo espaço, como uma extensão da consciência. O que se observa

com esta proposta é uma linguagem muito similar à musica, pois ambas se

traduzem em ritmos mais mecânicos que melodiosos. A imersão testada aqui, dá

prioridade a um ambiente estético envolvido em energia. E é essa energia que é

reactiva para o público, que o impulsiona a olhar para a tela, a estimular-se com

essa faceta visual aglomerada com a musical. Novamente os olhares cruzam-se

num encontro com a imagem que sugere um novo espaço. Hierarquicamente

aqui o espaço é a variável conjugada prioritariamente. No quarto set, por sua vez, os visuais ganharam alguma forma figurativa, embora

sempre presente uma tendência de sobreposição de imagens e efeitos, marcando

alguma presença abstracta como em todos os outros. Neste set procurou-se uma

estimulação sensorial e cognitiva, através do uso de imagens de fragmentos de

acções como dançar, tocar, beijar, insistindo na repetição desses planos, num

ritmo sugestivo e continuado. Nesta criação, o acto performativo procurou usar

sequências em repetidos ritmos, funcionando como uma sugestão de um jogo da

memória, solicitando a audiência a olhar mais vez, procurando a imagem que se

repete e que o acompanha. Esta estimulação por imagens concretas, quer apelar

ao subconsciente, numa tentativa de impulsionar a prática das vontades que o

conteúdo dos visuais demonstra. A exacerbação de ritmos e constante repetição

de imagens produz uma sensação concreta ao espectador. Neste ponto, o mesmo

direcciona o olhar algumas vezes mais pois como é figurativo, embora mesclado

em alguns efeitos visuais, sugere um momento de identificação, de associação a

algo em concreto por parte da audiência. A relação musical com esta imagética,

continua a funcionar concretamente, pois existe continuamente a presença de

um ritmo. É esta a analogia que aproxima os visuais da música, a convergência

das linguagens performativas. A hierarquia neste set, passa primeiramente pela

conceptualidade, já que só após a aquisição ou criação de imagens concretas de

acções é que se possibilitam todas as outras variáveis.

Img.40 e 41: set 3 exemplo de

imagens

Img.42 e 43: set 4 exemplo de

imagens

108 Perspectiva Prática | Performances

Page 121: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Img.44 e 45: set 5 exemplo de

imagens

Img.46 e 47 set 5 exemplo de

imagens

No quinto set, continuando com uma presença mais figurativa, agenciou-se a

possibilidade de realizar de uma forma algo concreta, micro-narrativas, baseadas

na justaposição de planos, i.e., pequenos fragmentos de narrativas apelam a

associações /emoções. Para tal, usaram-se efeitos visuais simples, já que a ênfase

é dada ao seu conteúdo e não tanto ao seu efeito visual. Existe aqui um contacto

com a vontade de comunicar pequenas mensagens e impelir emoções para além

das sensações. De uma forma prática, é possível construir pequenas narrativas, e

neste sentido, o olhar da audiência ao cruzar-se com a imagem acaba por olhá-la

mais continuamente, como se tivesse a captar uma acção dentro daquele espaço.

As imagens figurativas sugerindo acções acabam por funcionar num determinado

espaço temporal,pois as audiências são formatadas pela imersão cinematográfica

e neste ponto, a música parece ganhar outro estatuto. Devido à cultura estar

imbricada numa constante correspondência entre som e imagem, na qual o som

funciona como um catalisador de emoções da imagem, em Vídeo Jockeying,

quando se projectam fragmentas de narrativas, inevitavelmente essa ligação

musical acontece, funcionando como a ‘banda sonora’ do que é visível. Por este

ponto, em certos momentos é possível dar a ilusão que a música segue a imagem

e não tanto o oposto. Neste set, a hierarquia dá primazia à conceptualidade, logo

a seguir à performance.

Por fim, para o sexto set, neste continuo evolutivo, preparou-se uma tentativa de

independência visual. Para isso, procurou usar-se um conjunto de imagens de

possível identificação para o observador, i.e., imagens reconhecíveis pela grande

parte da audiência. Este tipo de imagens, são como exemplo imagens televisivas,

marcas de produtos, séries, filmes comerciais, que na sua totalidade fazem com

que o espectador olhe, identifique, comente sobre isso, provocando atenção e

vibração. Aqui usaram-se alguns efeitos visuais, mesclando a abstracção com a

figuração, que foram combinados consoante a ‘temperatura de pista’. De uma

forma geral, estas imagens possuem um impacto momentâneo no processo de

identificação. Contudo, o que é de notar é a continuidade da presença musical,

que seja pelos ritmos das sequências, quer pelo próprio contexto do espaço, o

que de alguma forma não completa uma presença visual. A verdade é que som e

imagem nestes ambientes não são possíveis de se pensar em separado. Pode-se

inverter por vezes a ordem destas correspondências, i.e., a imagem por norma

segue a música, mas em alguns momentos a música pode associar-se ao

seguimento visual. A temperatura, por sua vez, é um factor determinante na

presença destas dualidades construtivas, mas a verdadeira capacidade está num

bom conhecimento da imagética e numa necessidade de improviso. Neste set a

prioridade a nível de variáveis é a performance.

Perspectiva Prática | Performances 109

Page 122: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

5.2. REFLEXÃO SOBRE OS RESULTADOS

Ao se experienciar estas diferentes propostas, a primeira coisa que é visível são as

inúmeras possibilidades criativas,sendo cada uma delas, potenciadora de diversos

efeitos activos perante as variáveis da música e da audiência. O que se perscruta

é a presença iminente da sonoridade na relação com os visuais. Som e imagem

articulam-se de uma forma peculiar independentemente da presença de maior

ou menor grau figurativo visual.

Existe uma tendência à abstracção marcante, mas só assim parece ganhar sentido

a construção imagética. O uso de imagens coloridas, luminosas,emaranhadas com

imagens mais cruas e concretas criam assim novas místicas à linguagem visual. É

visível uma reacção positiva à presença de imagens, o uso das mesmas invoca um

novo espaço que complementa a experiência musical. Contudo, é a criação activa

da conceptualidade que traduz o momento performativo em si.

Ao se realizar a segunda performance, de caris mais intuitivo e de improviso

mostrou-se presente um triplo diálogo, entre música, audiência e imagem. É de

notar que com conteúdos mais abstractos, o olhar da audiência encontra-se por

momentos com a tela, contudo, com conteúdos mais figurativos, o espectador

por vezes pára e fixa mais tempo o olhar, como se seguisse uma narrativa que na

realidade não se figura, mas os fragmentos concretos proporcionam essa criação

mental por parte do observador. Por sua vez, não existe uma unanimidade na

escolha do conceito imagético por parte do público (ver gráficos dos inquéritos em

anexo), para ele o que é relevante é a experiência, o complemento do espaço e da

música. Mas existe igualmente um certo conceito sobre estética, pois a

experiência tem que se desenvolver de forma agradável. Existe um valor médio

(ver gráficos em anexo) dado à atenção dos vídeos, os quais interferem de alguma

forma no seu entretenimento. De uma forma geral, a presença das imagens

parece suscitar o interesse de uma audiência que procura um divertimento

compensador. Em suma, a presença visual tem uma apelação tanto para os

músicos, como para os que presenciam o espectáculo audiovisual. Nota-se porém

que a maioria das pessoas não sabe muito bem o que é o VJing, embora lhes seja

apelativo a presença de visuais de uma forma mais frequente nestes espaços.

Ao se experienciar diferentes abordagens conceptuais, consegue-se compreender

que determinadas variáveis organizadas proporcionam reacções distintas de

outras, o que confirma a existência de uma liberdade para o artista. Porém, saber

conjugar conscientemente todos estes valores atinge uma capacidade superior de

se comunicar artisticamente de forma válida.

110 Perspectiva Prática | Reflexão Sobre os Resultados

Page 123: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |6. CONCLUSÕES

6.1. CONCLUSÃO GERAL

Numa sociedade imersa em tecnologia, esculpida por um desejo iminente de se

romper com as convenções, projectam-se novas expressões artísticas. Como

descendente desta vontade expressiva, surge o Vídeo Jockeying. O VJing, coloca

em jogo formas de se criar, de se produzir representações, descreve uma grande

quantidade de disciplinas embutidas, que são desenvolvidas e cruzadas por uma

acção ao vivo e em tempo-real. Na última década, além de se ter traduzido como

parte integrante da cultura de entretenimento é também um laboratório para a

exploração de conceitos e estéticas relacionadas com a comunicação visual.

Por ser uma recente figura expressiva, questionam-se alguns valores, algumas

dissonâncias que buscam resolução. Com o advento da era digital e das novas

formas de apresentação de arte, os novos impulsos artísticos estão a promover

renovadas estaturas de mensagens artísticas, conferido o pluralismo e a ausência

de um autor integral. Em VJing misturam-se imagens, adquirem-se conceitos e

constroem-se experiências e mensagens singulares. Desdobrado em imagéticas

criadas ou adquiridas, elas são construídas num limite temporal e são irrepetíveis

na sua vivencia. VJing questiona valores sobre apropriação de imagens, gera

distintas opiniões num contexto cultural e artístico, mas acima de tudo, possui

uma validade concreta e relevante quando assumido como potencial construtor

de alternativas perspectivas de criar artisticamente o ‘agora’.

Conclusões | Conclusão Geral 111

Page 124: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJing é um complexo organismo que se delineia por uma vasta área de domínios,

dos quais se podem destacar os musicais, os conceptuais, os espaciais, e os

performativos possuindo intrinsecamente um conjunto de considerações sobre

ciência, tecnologia, psicologia, sociologia, filosofia, teoria da arte e comunicação,

que o englobam num intricado mundo de possibilidades.

Ao se desconstruir e analisar qualitativamente as correlações entre VJing e

música, conceptualidade, espaço e performance, compreende-se a imensidão de

capacidades criativas que fazem parte de um todo complexo. Quando se aborda a

temática da música, é vincada a existência de uma relação indivisível entre som e

imagem, pois ambos funcionam num contíguo. Para completar, as ligações entre

ambos podem ostentar momentos sinestésicos pela performance, erguendo o

diálogo entre a imagem a audiência. Entre Vídeo Jockeying e conceptualidade

está a distância da criatividade. O acto conceptual é a pré-preparação estrutural,

que será depois incorporada, mas é neste momento que se adoptam as intenções

e as propostas artísticas. Englobado por uma mescla de componentes como grau

de figuração e abstracção, conceitos de montagem, semiótica, cores e efeitos

visuais, a conceptualidade é o centro activo da expressividade do VJ.

Ao se considerar o espaço, o que encontramos é uma fusão de condicionantes

físicas que fazem com que se altere a configuração das performances do VJ, mas

acima de tudo, o espaço aqui pensado, adquire uma capacidade singular de se

criarem ambiências imersivas. A imersão abandona a noção espacial e converte o

momento performativo numa segunda realidade. Por fim, perscrutando sobre a

performance, presencia-se uma comunicação latente na sintaxe edificante entre

performer e audiência. Este diálogo profícuo contagia a evolução performativa, a

qual se apresenta como uma obra volátil e inacabada, desenhada pela presença

criativa e sensível do VJ, emaranhado por um banco de imagens pré-existente e

um tom de improviso.

Ao se experienciar na prática o acontecimento de VJing é relevante perceber a

capacidade comunicativa entre a música e a audiência, sendo que se afirma, no

espaço da experiência, uma presença substancial assumida pelo público. È

concreto compreender que a organização prévia da imagética e a sensibilidade

performativa são a essência da actividade do VJ. Por sua vez, é no conhecimento

e consciencialização das possibilidades e potências criativas que se figura a

concretização de um trabalho gratificante e de uma experiência singular.

Toda esta análise gravita assim, perante a existência de um valor concreto,

identificado e assumido na presença activa do Vídeo Jockeying. Sendo assim,

delineia-se um potencial único que se sublinha quando impulsionado por uma

força consciente por parte dos criativos. Assumir uma lógica criativa, quer pelo

112 Conclusões | Conclusão Geral

Page 125: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

uso exacerbado da tecnologia ou pela singular base expressiva, converte o VJing a

uma infinidade de alternativas de apresentação, buscando ao mesmo tempo uma

comparência mais resistente no mundo cultural e artístico.

Em suma, a imagem e som em VJing não se conseguem pensar em separado, são

audiovisão, e mesclam-se em sinestesia pela capacidade performativa. O acto

conceptual oferece uma base sólida para um sucesso performativo. Organizar

visuais, definir estéticas e objectivos amplia a capacidade comunicativa. O espaço

concreto delineia o valor da experiência. A validação espacial é dada pela

transmutação do real em imersivo, pelo conteúdo e ritmo visual. A performance

dá corpo à experiencia, baseando-se na pré-organização, improviso, sensibilidade

performativa e reacção no diálogo com a música e a audiência.

Posto isto, é pela consciencialização das inter-relações e variáveis internas e

externas que se possibilita ao VJ elevar o estatuto desta expressão perante a

experiencia e os contextos culturais e artísticos. VJing é assim, presenteado por

um dinamismo atroz, desenhado pelo pluralismo, desmistificado pela multimédia,

cuja exploração teórica e prática procura ambicionar e oferecer o brilho e valor

correcto a esta prática.

6.2. NOVAS DIRECÇÕES CRIATIVAS

Nas artes performativas visuais como o VJing, têm nascido algumas extensões

criativas que apresentam novas alternativas práticas e ideológicas. No decurso

actual, o conceito de Open Jam tem sido apresentado em alguns eventos que

envolvem performances visuais. O Open Jam baseia-se no princípio de incitar a

todos os interessados a experimentar o acto performativo em imagem. Alguns

eventos como o Share (www.share.dj), propiciam a essa actividade.

Outra das actividades que tem ganho interesse na comunidade de VJing, são as

da partilha de imagens, i.e., todas as pessoas são convidadas a enviar imagens e

vídeos para o evento, no qual o VJ manipulará essas imagéticas potencialmente

chegadas de todo o mundo. Estes eventos podem ser bastante atractivos para o

público, pelo facto de se sentirem parte integrante da ‘obra’, e além do mais, é

um desafio para o VJ que, neste caso, não tem qualquer prévio conhecimento dos

vídeos e sequências, logo a primazia é pelo improviso. Com exemplo, em Portugal

a iniciativa Encontros da Imagem - Image Rave Party (2009) em Braga, suscitou o

envio e partilha de imagens para o evento ao vivo, explorando esta nova vertente

expressiva e criativa.

Conclusões | Novas Direcções Criativas 113

Page 126: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Com o ampliar da presença visual em eventos musicais, e partindo do principio

que ambos funcionam num conglutinado produto, resultando numa experiencia

total, algumas novas alternativas têm sido apresentadas, nomeadamente a Video

Band, ou banda audiovisual. Estas bandas que estão a emergir, funcionam numa

ideologia que dá primazia ao vídeo, em que o evento não é pelo som, mas pelo

equilíbrio concreto entre visuais e música. Esta filosofia de performance possui

uma qualidade na aposta de evidenciar o papel relevante da imagem no mundo

do espectáculo. O desenvolvimento das capacidades técnicas de VJing e das

ferramentas de DJing têm convergido para uma prática híbrida, na qual o papel

performativo do VJ é elevado. O que acontece é que se o VJ pretende melhorar a

sua performance, e por tal, para ele o acto de controlar as especificidades do

áudio, mostra-se uma complementaridade apelativa nestes ambientes

colaborativos da arte audiovisual.

Esta abordagem colaborativa para a produção e performance é impulsionada por

um aumento do número de colectivos interdisciplinares, i.e., artistas gráficos, de

áudio e vídeo trabalham em conjunto para a criação de uma refinada experiência

sinestésica. Um dos exemplos destes novos bandas’ audiovisuais é o colectivo

londrino The Light Surgeons, que arquitecta verdadeiros ambientes audiovisuais,

instalações e performances completas entre a conglutinar da imagética e da

sonoridade.

A energia das performances visuais tem marcado presença na cultura e na arte

dos tempos modernos, pensar em novas formas criativas é considerar o papel

activo da imagem como expressão. A tecnologia é a grande ponte de acesso entre

as ideias e as premências comunicativas, por tal, em VJing existirá sempre esse

vínculo, que correctamente elaborado pode presentear audiências com inúmeras

forças visuais. Pensar num futuro para Vídeo Jockeying é delineá-lo com ideias

criativas, juntamente com tecnologia e uma consciência do potencial intrínseco a

todas as correspondentes disciplinas que o invocam como uma forma original de

construir experiências artísticas.

Img.48 The Light Surgeons, True

Fictions no The Big Chill Festival,

Reading, 2008.

114 Conclusões | Novas Direcções Criativas

Page 127: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |7. BIBLIOGRAFIA

AITKEN, Doug

Broken Screen: 26 Conversations

with Doug Aitken Expanding the

Image Breaking the Narrative

Distributed Art Publishers

NY, 2006

ALBERS, Josef

Interaction of Color

Yale University Press

1975

BAMBOZZI, Lucas

A era do ready-made digital

[Consult. 2009-05-27]

Disponível em:

http://p.php.uol.com.br/tropico/ht

ml/textos/1680,1.shl

BERNARD, David

Visual Wallpaper

2006 [Consult. 2009-05-24]

Disponível em:

http://www.vjtheory.net/web_text

s/text_bernard.htm

BETANCOURT, Michael

Wallpaper versus Art, Performance

and Audience

2008, [Consult. 2009-06-05]

Disponível em:

http://www.vagueterrain.net/jour

nal09/michael-betancourt/01

BETANCOURT, Michael

Visual Music and the Birth of

Abstract Art

[Consult. 2009-06-05]

Disponível em:

http://www.michaelbetancourt.co

m/pdf/sync_form.pdf

BETANCOURT, Michael

From Color Music to Visual Music

[Consult. 2009-06-05]

Disponível em:

http://www.michaelbetancourt.co

m/pdf/color_music.pdf

BETANCOURT, Michael

Same as It Ever Was, Acts of Digital

Re-Authoring

[Consult. 2009-06-05]

Disponível em:

http://www.michaelbetancourt.co

m/pdf/vjtheory_same-as-it-ever-

was.pdf

BETANCOURT, Michael

A Taxonomy of Abstract Form

Using Studies of Synesthesia

and Hallucinations

[Consult. 2009-06-05]

Disponível em:

http://www.michaelbetancourt.co

m/pdf/Leonardo_40.1_betancourt

_taxonomy.pdf

BIRRINGER, Johannes

Media & Performance: Along the

Border

The Johns Hopkins University Press

Londres, 1998

BROADHUST, Susan

Liminal Acts: a critical overview of

contemporary performance and

theory

Cassel

London, 1999

BROUGHER, Kerry

The Cinema Effect: Illusion, Reality,

and the Moving

Smithsonian Hirshhorn Museum

London, 2008

BUCKSBARG, Andrew

VJing and Live A/V Practices

2008 [Consult. 2009-05-24]

Disponível em:

http://www.vjtheory.net/web_text

s/text_bucksbarg.htm

BUTT, Gavin

After Criticism: New Responses to

art and performance Blackwell

Publishing

2005

Bibliografia 115

Page 128: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

BUZZI, Gabriele

The Number-Image

2009 [Consult. 2009-05-24]

Disponível em:

http://www.vjtheory.net/web_text

s/text_buzzi02.htm

CHION, Michel

EL Sonido – Musica, Cine,

Literatura.

Paldos

Barcelona, 1999

COUCHOT, Edmond

Imagem-Máquina: A Era das

Tecnologias do Virtual

André Parente (org) Editora 34

SP, 1993

COUCHOT, Edmond

La Technologie Ddans l’Art: de La

Photographie à la Réalite Virtuelle

Editions Jacqueline Chambon

Paris, 1998

COSTA, Marco

(Tese) Electrosonoro, Electrovisual

2007[Consult. 2009-06-05]

Disponível em:

http://repositorio.up.pt/aberto/bit

stream/10216/7319/2/Marco%20C

osta%20%20Dissertao%20MAM%2

02007.pdf

CRARY, Jonathan.

Techniques of the Observer. On

vision and modernity

MIT press.

Cambridge, 1999

CHRISTINE, Mello

Imagens vivas

[Consult. 2009-05-22]

Disponível em:

http://p.php.uol.com.br/tropico/ht

ml/textos/1645,1.shl

CURRIE, Nick

VJ Culture: Design Takes Center

Stage

2005 [Consult. 2009-04- 08]

Disponível em:

http://www.adobe.com/designcen

ter/thinktank/vjculture/VJ_Culture

.pdf

D-FUSE

VJ Audio-Visual Art + VJ Culture

Laurence King Publishing Ltd.

London, 2006

ECO,Umberto

The Limits of Interpretation

Bloomington: University of Indiana

1994

ECO,Umberto

Obra Aberta

Difel

Lisboa, 1989

EISENSTEIN, Sergei

Da Revolução à Arte, da Arte à

Revolução

Editorial Presença

Lisboa, 1974

EISENSTEISN, Sergei

The film sense

Harcourt, Brace & Company

NY, 1947

EISENSTEISN, Sergei

Film form: Essays in Film Theory

Harcourt, Brace & Company

NY, 1949

GALENTER, Philip

What is Generative Art?

Complexity Theory as a Context for

Art Theory

2003 [Consult. 2009-05-22]

Disponível em:

http://www.philipgalanter.com/do

wnloads/ga2003_

paper.pdf

GOLDBERG, RoseLee

Performance art: from futurism to

the present

Thames & Hudson

London, 2001

GOMBRICH, E. H.

The image & the eye: Further

Studies in the Psychology of

Pictorial Representation

Phaidon

London, 1998

GOMBRICH, E. H.

Art and Illusion: a Study in the

Psychology of Pictorial

Representation

Phaidon, London, 1995.

116 Bibliografia

Page 129: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

GRAU, Oliver

Virtual Art. From Illusion to

Immersion.

MIT Press.

Cambridge, 2003

HAMLYN, Nicky

Film Art Phenomena

British Film Institute,

London, 2003

HEATHFIELD, Adrian

Small Acts: performance, the

millennium and the marking of

time

Black Dog

London, 2000

HEATHFIELD, Adrian

Live: Art and Performance

Tate Gallery Publishing

London, 2004

JAEGER, Timothy

VJ: Live Cinema Unreveled

2005 [Consult. 2009-04-05]

Disponível em:

http://nadassor.net/nonsite_files/l

ivemedia_course/VJ_BOOK.pdf

JAEGER, Timothy

VJ as Hyperindividual

2008 [Consult. 2009-05-07]

Disponível em:

http://www.vagueterrain.net/jour

nal09/tim-jaeger/01

LAZAR, Ziv

VJ – A Pseudo Subculture

2008, [Consult. 2009-06-05]

Disponível em:

http://www.vagueterrain.net/jour

nal09/ziv-lazar/01

LAZAR, Ziv

From The Cinema of Attractions to

VJ culture

2008, [Consult. 2009-06-05]

Disponível em:

http://myweb.tiscali.co.uk/zivlazar

/vjworkshop/pdf/Ziv_Lazar_From_

The_Cinema_of_Attractions_to_VJ

_Culture.pdf

LEE-THORP, Charles

(Tese) Understanding Comtempory

Forms of VJ Performance

2007 [Consult. 2009-04-11]

Disponível em:

http://simstim.co.za/chiba/wp-

content/uploads/2007/08/forms-

of-vj-performance-charles-lee-

thorp.pdf

HANSEN, Mark

New Philosophy for New Media

The MIT Press

London, 2006

HANSON, Matt

The End of Celluloid – Film Futures

in the Digital Age Rotovision

UK, 2004

HEBDIGE, D.

Subculture: the meaning of style

Routledge Publishing

1979

LICHT, Alan

Sound Art: Beyond Music: Between

Categories

Rizzoli International Publications

NY, 2007

MACHADO, Arlindo

Máquina e Imaginário: o Desafio

das Poéticas Tecnológicas.

Edusp

SP, 1996

MACHADO, Arlindo

A televisão Levada a sério

Editora Senac.

SP, 2000

MAGNAN, Nathalie

La vidéo, entre art et

communication

École nationale supérieure des

Beaux-Arts,

Paris, 1997

MAKELA, Mia

VJ Culture_From Loop Industry To

Real Time Scenarios

[Consult. 2009-06-09]

Disponível em:

http://www.solu.org/text_VJ_Cult

ure.html

Bibliografia 117

Page 130: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

MAKELA, Mia

(Tese) Live Cinema Language and

Elements

[Consult. 2009-06-09]

http://www.solu.org/LIVE_CINEMA

.pdf

MAKELA, Mia

The Practice of Live Cinema

[Consult. 2009-05-23]

Disponível em:

http://www.solu.org/text_Practice

OfLiveCinema.pdf

MANOVICH Lev

The Language of New Media, MIT

Press

Cambridge, 2001

MARSHALL, McLuhan,

Understanding Media: The

Extensions of Man

Gingko Press

2003.

MARTIN, Sylvia

Video Art

Taschen,

Alemanha, 2006

MINARD, Robin

Resonances:

Aspects of Sound Art

Bernd Schulz (org), Keher Verlag

Heidelberg

Alemanha, 2002

MAUERHOFER, H.

A Experiência do Cinema,

Graal

Rio de Janeiro, 1983

MENOTTI, Gabriel

2009 [Consult. 2009-05-24]

Disponível em:

http://www.vjtheory.net/web_text

s/text_menotti.htm

MORAN, Patricia

VJ em Cena: Espaços como

Partitura Audiovisual

2009 [Consult. 2009-05-24]

Disponível em:

http://www.vjtheory.net/web_text

s/text_moran02.htm

MORAN, Patricia (2)

Poéticas das Correspondências

2009 [Consult. 2009-05-24]

Disponível em:

http://www.vjtheory.net/web_text

s/text_moran.htm

PALLASMAA, Juhani

The architecture of image:

Existencial Space in Cinema

Building Information, cop.

Helsinki, 2001

PARFAIT, Françoise

Video : Un Art Contemporain

Éditions du Regard

Paris, 2001

PINTO, Cerveira

Observações sobre a cor e a

recepção

Fernandes & Terceiro,

1984

POMPIDOU, Centre George

New media installatons Éditions du

Centre Pompidou

Paris , 2006

POPPER, Frank

Art of the electronic age

Thames & Hudson

London, 1997

RENOV, Michael

Resolutions: contemporary video

practices

University Of Minnesota Press,

Minneapolis, 1997

RIBAS, Luísa

Correspondência e convergência

entre sons e imagens

2007 [Consult. 2009-04-11]

Disponível em:

http://texto.fba.up.pt/?p=55&lp_la

ng_pref=pt

RHODES, Colin

Outsider Art: Spontaneous

Alternatives

Thames & Hudson

London, 2000

118 Bibliografia

Page 131: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

RUSH, Michael

New Media in Late 20th

Century Art

Thames & Hudson

London, 2001

SÁ, Adriana

Vídeo arte e filme de arte & ensaio

em Portugal

Númeru - Arte e Cultura

Lisboa, 2008.

SHAW, Jeffey

Future Cinema: The Cinematic

Imaginary after Film

The MIT Press

Cambridge, 2003

SHUSTERMAN, Richard

Performing Live: aesthetic

alternatives for the ends of art

Cornell University Press

NY, 2000

SPINRAD, P.

The VJ Book:

Feral House Publishing

2005

THORNTON, S.

Club Cultures. Music, Media and

Subcultural Capital

University Press of New England

UK, 1996

TISSELLI, Eugenio

Narrative Motors

2008 [Consult. 2009-05-24]

Disponível em:

http://www.vjtheory.net/web_text

s/text_tisselli.htm

TORDINO, Daniela

Musical Language in the VJing Art

2007 [Consult. 2009-05-24]

Disponível em:

http://www.vjtheory.net/web_text

s/text_tordino.htm

VIEIRA, Elsa

Is There a One or is it a Zero

Ideology in the Digital

Underground

2007 [Consult. 2009-05-24]

Disponível em:

http://www.vjtheory.net/web_text

s/text_vieira.htm

WATTS, Harris

Direcção de Câmara - Um Manual

de Técnicas de Vídeo e Cinema

Summus

1999

YOUNGBLOOD, Gean

Expanded Cinema

E.P. Dutton & CO.

Inc. NY, 1970

Bibliografia 119

Page 132: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

120

Page 133: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |8. GLOSSÁRIO

GLOSSÁRIO DE ARTE

ARTE ABSTRACTA

Movimento das décadas de 1910 e 1920, com os pioneiros Wassily Kandinsky,

Piet Mondrian e Kazimir Malevich. A Arte Abstracta pode ser originalmente não-

figurativa, ou converter formas reais em padrões que podem ser interpretados

como relações independentes das formas iniciais. Frequentemente geométrica,

determina que a arte deve ser a criação de efeitos belos, de puros padrões da

forma, cor e linha.

ARTE GENERATIVA

Arte gererativa refere-se a um tipo de arte que se faz por automação, sendo

gerada, composta ou construída de formal algorítmica, por sistemas algoritmos

definidos e oferecidos por uma aplicação ou software, que define assim um

processo autónomo. Segundo, Philip Galanter “A Arte Generativa refere-se a

qualquer prática de arte onde o artista use um sistema — tal como um conjunto

de regras naturais da linguagem, um programa de computador, uma máquina ou

outra invenção de procedimentos, que são postos em movimento com algum grau

de autonomia e que contribuam, ou resultem num completo trabalho de arte."

(Galanter, op.cit, 2003)

Glossário | Glossário de Arte 121

Page 134: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

ARTE ÓPTICA (OP ART)

Op art é um termo usado para descrever a arte que explora a falibilidade do olho

pelo uso de ilusões ópticas, surgindo na década de 1950. A expressão “op-art”

vem do inglês (optical art) e significa “arte óptica”. Defendia para arte "menos

expressão e mais visualização". Apesar do rigor com que é construída, simboliza

um mundo mutável e instável, que não se mantém nunca o mesmo. Não procura

um apelo ao emocional, mas um apelo cerebral. Os trabalhos de op art são em

geral abstractos e muitas das peças mais conhecidas usam apenas o preto e o

branco. Quando são observados, dão a impressão de movimento, clarões ou

vibração, ou por vezes parecem ‘inchar’ ou deformar-se. (Wikipedia)

ARTE POP (POP ART)

Pop é um movimento nas artes visuais que surgiu na década de 1950, que desafia

a tradição por retirar o material do seu contexto e isolando-o ou combinando-o

com outros objectos para contemplação. Caracterizada por temas e técnicas

oriundos da cultura popular, como publicidade, banda desenhada e outros

objectos mundanos, a Pop Art é amplamente interpretada como uma reacção às

ideias do expressionismo abstracto, bem como uma expansão dessas ideias. A

Pop arte destina-se a empregar imagens populares, por oposição à cultura elitista

na arte, enfatizando os elementos kitschy ou banais de uma determinada cultura,

na maioria das vezes através da ironia. (Wikipedia)

FLUXUS

Movimento que surgiu em 1962, com o artista George Maciunas, inspirado no

movimento Dada, e em torno das aulas de composição experimental de John

Cage, ao qual se associaram George Brecht, Dick Higgins, Jackson Mac Low, Al

Hansen e Toshi Ichijanagi, e mais tarde, Joseph Beuys, Nam June Paik, Gustav

Metzger, Robert Filliou, Emmett Williams, Robert Watts, Ben Vautier, Alice

Hutchins e Yoko Ono. Frequentemente descrito como 'intermedia' (termo

atribuído por Dick Higgins, em 1966), o Fluxus misturava diferentes meios e

disciplinas (the-artists.org, "Fluxus", 2006). Organizava palestras, performances,

música, vídeo e poesia visual. Procurava na interdisciplinariedade um novo

conceito de arte — 'arte total'. Encorajava o 'faça-você-mesmo', valorizava a

simplicidade sobre a complexidade, e contrariava o valor comercial da arte, a

favor da prática criativa centrada no artista.

122 Glossário | Glossário de Arte

Page 135: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

HAPPENING

O happening é uma forma de expressão das artes visuais que apresenta

características das artes cénicas. Neste tipo de obra, quase sempre planejada,

incorpora-se algum elemento de espontaneidade ou improvisação, que nunca se

repete da mesma forma a cada nova apresentação. Apesar de ser definida por

alguns historiadores como um sinónimo de performance o happening é diferente

porque, além do aspecto de imprevisibilidade, geralmente envolve a participação

directa ou indirecta do público espectador. O termo happening, como categoria

artística, foi utilizado pela primeira vez pelo artista Allan Kaprow em 1959.. Como

evento artístico, acontecia em ambientes diversos, geralmente fora de museus e

galerias, nunca preparados previamente para esse fim.

JAM SESSION

Uma Jam Session é um acto musical quando músicos se juntam sem preparação

extensiva ou alguma pré-definição de composição, rege a improvisação.

Jam sessões são frequentemente utilizados para desenvolver novos materiais, ou

simplesmente como uma prática social. Jam sessões podem ser baseadas em

músicas já existentes ou formas musicais,ou podem ser totalmente improvisadas.

MÚSCIA CONCRETA

Musique concrète é o nome dado à um tipo de música electrónica que surgiu nas

no final da década de 40 3 início da década de 50, produzida a partir de edição

de áudio unida à fragmentos de sons naturais e/ou industriais. A música concreta,

engloba todos os processos que incluam a junção de partes completas ou

fragmentos de sons “les objects sonores” e que podem ser sons do ambiente e de

todo o tipo de ruídos até aos instrumentos musicais. Estes fragmentos são

primeiro gravados e modificados posteriormente num estúdio especializado.

Os sons utilizados para fazer música concreta não eram em regra sons obtidos a

partir de instrumentos electrónicos. Uma vez que os sons são gravados antes do

processo de construção da música em si, ao invés da melodia ser escrita antes

que um instrumentista possa transformá-lo em som, pode dizer-se que é o

oposto do modo tradicional de composição. (Wikipedia)

PLOT POINT

Na televisão e cinema, um plot point é um importante evento dentro de um

enredo que afecta a acção levando a narrativa para um novo rumo. Também

pode ser um objecto de importância significativa, em torno do qual gira o enredo.

Glossário | Glossário de Arte 123

Page 136: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

Pode ser qualquer coisa desde um evento ou um item, a uma descoberta de uma

personagem ou motivo. O plot point é um conflito que condiciona a acção para

um novo nível, podendo existir vários numa mesma narrativa.

PÓS-MODERNISMO

Movimento que se impôs contra o Modernismo, por volta da década de 1970.

Iniciado com a Arte Pop, é caracterizado pelo multiculturalismo, e a fusão entre a

cultura de elite e a cultura popular; entre arte e quotidiano. Recusa a existência

de um estilo, ou de qualquer definição de arte.

124 Glossário | Glossário de Arte

Page 137: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

GLOSSÁRIO DE CIÊNCIA

COGNIÇÃO SITUADA

A cognição situada define que todo acto cognitivo é um acto experiencial, e,

portanto, situado, resultante do acoplamento estrutural e da interacção

congruente do organismo no seu ambiente, ou seja, organismo e ambiente

constituem uma unidade inseparável, e a dinâmica de interacção ocorre contínua

e simultaneamente. Resulta numa simbiose quase perfeita entre o aprendiz e o

meio envolvente, criado para favorecimento da aprendizagem.

IMERSÃO

Imersão é relativo mesmo ao verbo imergir, entrar por completo num ambiente.

É o nome usado quando se entra um ambiente de realidade virtual, mas serve

também para ambientes sinestésicos, onde os sentidos são estimulados por

diversos estímulos, como uma rave. No livro Virtual Art, From Ilusion to

Immersion, 2003 o professor alemão Oliver Grau propõe o conceito de imersão

como o conceito chave para compreender o desenvolvimento dos média através

dos tempos. Citando determinados ambientes (criações artísticas) em diversas

épocas, que proporcionavam uma ilusão quase que completa de um novo mundo

ao espectador, para ele, “imersão pode ser um processo intelectualmente

estimulante; no entanto, tanto no presente como no passado, na maioria das

vezes, imersão é um processo, uma mudança, uma passagem de um estado

mental a outro. É caracterizada pela diminuição da distância crítica do que é

mostrado e por um aumento do envolvimento emocional sobre o que está a

acontecer.” (Grau, op.cit. 2003)

MENSAGENS SUBLIMINARES

Mensagem subliminar é a definição usada para o tipo de mensagem que não

pode ser captada directamente pelos sentidos humanos. Subliminar é tudo aquilo

que está abaixo do limiar do consciente. Toda mensagem subliminar pode ser

dividida em duas características básicas, o seu grau de percepção e de persuasão.

A percepção subliminar é a capacidade do ser humano de captar de forma

inconsciente mensagens ou estímulos fracos demais para provocar uma resposta

consciente. A persuasão subliminar seria a capacidade que uma mensagem teria

de influenciar o receptor. Segundo a hipótese, ambas proporcionariam um efeito,

na qual na percepção se guarda a informação, na persuasão pode-se impelir

vontades e acções, variando com o tipo de mensagem exposta e o receptor.

Glossário | Glossário de Ciência 125

Page 138: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

PAREIDOLIA

O termo pareidolia descreve um fenómeno psicológico que envolve um vago e

aleatório estímulo (em geral uma imagem ou som) sendo percebido como algo

distinto e significativo. Exemplos comuns incluem imagens de animais ou faces

em nuvens, em janelas de vidro e em mensagens ocultas em músicas executadas

do contrário. A palavra vêm do grego para – junto de, ao lado de – e eidolon –

imagem, figura, forma. Pareidolia é um tipo de apofenia, que é fenómeno

cognitivo de percepção de padrões ou conexões em dados aleatórios.

PERSISTÊNCIA RETINIANA

Persistência da visão, persistência retiniana ou retenção retiniana designa o

fenómeno ou a ilusão provocada quando um objecto visto pelo olho humano

persiste na retina por uma fracção de segundo após a sua percepção. Assim,

imagens projectadas a um ritmo superior a 16 por segundo, associam-se na retina

sem interrupção. Segundo essa teoria, ao captar uma imagem, o olho humano

levaria uma fracção de tempo para "esquecê-la". Assim, quando os fotogramas de

um filme de cinema são projectados na tela, o olho misturaria os fotogramas

anteriores com os seguintes, provocando a ilusão de movimento: um objecto

colocado à esquerda num fotograma, aparecendo à direita no fotograma

seguinte, cria a ilusão de que o objecto se desloca da esquerda para a direita.

SINESTESIA

É uma associação psicológica espontânea que produz duas ou mais sensações sob

a influência de uma só impressão. Sinestesia é a relação de planos sensoriais

diferentes i.e., a fusão de percepções relativas a dados sensoriais

correspondentes a sentidos diferentes (e.g. para certas pessoas, um determinado

som evoca uma cor determinada ou um cheiro particular, etc.). Em sinestesia há

assim, uma correspondência neurológica que estimula uma acção de dois ou mais

sentidos.

126 Glossário | Glossário de Ciência

Page 139: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

GLOSSÁRIO DE TECNOLOGIA

COPYRIGHT

Copyright dá o autor de uma obra original, o direito exclusivo por um período de

tempo em relação a esse trabalho, incluindo a sua publicação, distribuição e

adaptação no domínio público. Copyright aplica-se a qualquer forma exprimível

de uma ideia ou informação que é fixa num meio. Algumas jurisdições também

reconhecem"direitos morais" do criador de um trabalho, tais como o direito a ser

creditado para o trabalho. Os direitos de autor são descritos sob o termo de

"propriedade intelectual", juntamente com patentes e marcas.

DIGITAL

Desde que a humanidade desenvolveu o processo de contagem, os dedos foram

os instrumentos mais simples e eficientes para contar pequenos valores. O

sistema de numeração Indo-Arábico, o mais usado actualmente, é um sistema de

base decimal (os dez dedos das duas mãos). Com os dedos só é possível contar

valores inteiros, daí que, digital também se refere a qualquer objecto que lida

com valores discretos. Digital, é todo o dispositivo que gera, armazena e

transmite, dados codificados ou convertidos em valores numéricos, utilizando o

sistema binário (dígitos zero (0) e um (1), associados a impulsos eléctricos). É um

sinal com valores discretos (descontínuos) no tempo, e com amplitude. O que

significa, que um sinal digital só é definido para determinados instantes de

tempo, e o conjunto de valores que podem assumir é finito. A Digitalização de

sinais analógicos é obtida em três fases:

– Amostragem — Discretização no tempo do sinal analógico original.

– Quantização — Discretização da amplitude do sinal amostrado.

– Codificação — Atribuição de códigos (geralmente binários) às amplitudes

do sinal quantizado. (Wikipedia)

PEER-TO-PEER

Peer-to-Peer (do inglês par-a-par), entre pares, é uma arquitectura de sistemas

distribuídos caracterizada pela descentralização das funções na rede, onde cada

nodo realiza tanto funções de servidor quanto de cliente. O P2P é o resultado da

tendência natural do desenvolvimento de engenharia de software com a

disponibilidade de tecnologia para a criação de redes maiores.

Glossário | Glossário de Tecnologia 127

Page 140: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

REMIX

Remix é o acto de modificar algo por uma outra pessoa ou pelo próprio produtor.

Em remix musical acrescentam-se sonoridades e efeitos ao original. Em vídeo, o

remix passa pela alteração ou acréscimo de elementos a uma determinada

imagem pelo mesmo princípio de modificar um produto original e criar com ele

uma nova versão.

RENDERING

Rendering é o processo pelo qual pode-se obter o produto final de um

processamento digital qualquer. Este processo aplica-se essencialmente em

programas de modelagem 2D e 3D, bem como áudio e vídeo.

O processo de tratamento digital de imagens e sons consome muitos recursos

dos processadores, e pode tornar-se pesado de forma que a sua realização em

tempo real fica inviável. Neste caso, os software trabalham num modo de baixa

resolução para poder mostrar uma visão prévia do resultado. Quando o projecto

está concluído, ou em qualquer momento que se queira fazer uma aferição de

qual será o resultado final, faz-se o render do trabalho.

RESOLUME

Resolume é uma aplicação para performances de vídeo ao vivo, no qual é possível

usar diferentes tipos de vídeos e imagens, sendo comummente usado em VJing.

RGB

RGB é a abreviatura do sistema de cores aditivas formado por Vermelho (Red),

Verde (Green) e Azul (Blue). O propósito principal do sistema RGB é a reprodução

de cores em dispositivos electrónicos como monitores de TV e computador,

"datashows", scanners e câmaras digitais, assim como na fotografia tradicional.

O modelo de cores RGB é baseado na teoria de visão colorida tricromática, de

Young - Helmholtz e no triângulo de cores de Maxwell. O uso do modelo RGB

como padrão para apresentação de cores na Internet tem suas raízes nos padrões

de cores de televisores RCA de 1953 e no uso do padrão RGB nas câmaras

Land/Polaroid, pós Edwin Land.

SCRATCHING

Scratching é uma técnica usada pelos DJs sobre um gira-discos para produzir sons

distintos pelo mover do disco de vinil para trás e para a frente enquanto

manipula um mixer de som.

128 Glossário | Glossário de Tecnologia

Page 141: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |9. ANEXOS

Anexos 129

Page 142: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |QUADROS RELACIONAIS

Quadro Relacional Primário

Quadro Relacional Variáveis Externas

Quadro Relacional Complementar

Quadro Relacional Global

Page 143: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |TABELA DE SETS

Page 144: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |OUTROS GRÁFICOS

Exemplos de Configuração Espacial

Plano B - Espaço

Ritmos musicais e visuais numa possibilidade

sinestésica de “ver” a música

Page 145: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |PERFORMANCES

Page 146: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...
Page 147: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |MODELO DE INQUÉRITO

Page 148: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...
Page 149: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |GRAFICOS ESTATISTICOS DAS RESPOSTAS

Page 150: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...
Page 151: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...
Page 152: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...
Page 153: repositorio-aberto.up.pt · produção e manipulação de imagens vivas em ambientes ... Duo-2, 1967 Victor Vasarely (Op Art) [ ... Img.31. Configuração ...

VJING |CÓLOFON.

Em anexo à dissertação, um DVD que contém o texto em formato pdf,

justamente com um conjunto de vídeos e fotografias das performances visuais

realizadas.

Contacto: [email protected]