Renato Dagnino - Elementos Para Uma Teoria Crítica Da Tecnologia

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    ELEMENTOSPARAUMATEORIACRTICADATECNOLOGIA

    RenatoDagnino1

    1 Professor Titular no Departamento de Poltica Cientfica e Tecnolgica da UNICAMP. Email:[email protected].

    Resumo:Opresenteensaiodiscutea fragilidadeanalticoconceitualcomque se tem abordado a questo do desenvolvimento de tecnologiasalternativas tecnologia convencional (produzidapelaeparaaempresaprivada) e adequadas ao que se tem denominado, em nosso meio,empreendimentos solidrios. Nosso propsito neste trabalho dar umprimeiro passo na anlise sobre os elementos que deveria abarcar umateoriacrticadatecnologiaparadarcontadessedesafio.Oresultadomaisimportanteaquechegamos,tendoemvistanossoobjetivo,aproposiode que aquilo que caracteriza a tecnologia capitalista ou a tecnologia

    convencionalno

    a

    propriedade

    privada

    dos

    meios

    de

    produo

    e

    sim

    o

    tipodecontrolequeeladetermina.

    Palavraschave:Tecnologiaalternativa;Propriedadeprivada;Teoriacrtica.

    Elementsforacriticaltheoryoftechnology

    Abstract:Thisessaydiscussesthefragilityanalyticalandconceptual ithasaddressedtheissueofdevelopingalternativetechnologiestoconventional

    technology(produced

    by

    and

    for

    the

    private

    company)

    and

    appropriate

    to

    whathasbeencalledinBrazil,solidaryventures.Ouraim inthiswork isafirststep intheanalysisontheelementsthatshouldencompassacriticaltheoryof technology tohandle thischallenge.Themost important resultwe are reaching a view to our goal, is the proposition that whatcharacterizes the capitalist technologyor conventional technology is nottheprivatepropertyofmeansofproductionbutratherthetypeofcontrolthatitdetermines.

    Keywords:Alternativetechnology;Privateproperty;Criticaltheory.

    Introduo

    Amotivaodestetrabalhoaconstataodafragilidadeanalticoconceitualcomquesetemabordadoaquestododesenvolvimentodetecnologiasalternativas

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    tecnologia convencional (produzidapelaeparaaempresaprivada)eadequadas aoquese temdenominado,emnossomeio,empreendimentossolidrios.Estetrabalhotratadeumadasdificuldadesqueissotemimplicadoparaaquelesquenoscolocamosnumaperspectivaacadmica,ao ladodosmovimentossociaisquebuscama inclusosocial. Isto,o fatodequeessadificuldadeno tempermitidoaconcepodeum

    conjuntode

    indicaes

    de

    carter

    scio

    tcnico

    alternativo

    ao

    atualmente

    hegemnico

    capazde viabilizaresseobjetivo. Eque,em conseqncia,no sedisponhadeumaplanilhade clculo capazdeorientarasaesdedesenvolvimento tecnocientficodosatoresenvolvidoscomessesempreendimentos:gestoresdaspolticassociaisedeC&T,professores e alunosque atuamnas incubadorasde cooperativas, tcnicosdeinstitutosdepesquisa,trabalhadoresetc.

    Seuobjetivo,entretanto,notentarconceberesseconjuntodeproposies,coisa que tem preocupado um nmero crescente de pesquisadores do tema e quetemos tentado realizar em outros trabalhos. Isso porque no nos parece possvelavanar muito mais do que aquilo que tem sido sugerido2 caso no se altere aestratgia (ou procedimentometodolgico) que tem sido utilizada para construir omarco analticoconceitual necessrio para a concepo daquele conjunto deproposiescapazdeorientarodesenvolvimentode tecnologias. Isto,aestratgiaque procura construir esse marco e conceber esse conjunto, partindo de umaconsideraodoque seentende como implicaes (ouefeitos) sociais,econmicas,polticas,ambientaisetcnegativasdatecnologiaconvencional(TC)ecolocandocomometaaserperseguidaumatecnologiaquenodetermineestas implicaes.Ouseja,buscandoo desenvolvimento de algoqueno o que no queremos: a TecnologiaAlternativa(TA)3.

    Estamos

    conscientes

    de

    quo

    longo

    o

    caminho

    que

    necessrio

    percorrer

    do

    pontoemqueestamosataqueleemqueseremoscapazesdeconstruiressemarcoeconceberesseconjunto.Sebuscamosdesbravloporqueelenospareceessencialpara atingir o objetivo colocado pelo vis policy oriented que caracteriza nossotrabalho.

    2Paraexemplificar,ecitandocontribuiesdeumdosautoresdestetrabalho,possveldestacarumadasprimeirasrealizadasnoBrasil(Dagnino,1978)eaquelesqueseguemaDagnino(2002),ondetemosdesenvolvidoapropostadeAdequaoSociotcnica.3 Contrariamente ao que temos feito em outros trabalhos, no usaremos agora, quando estamostentandoadotarumaestratgiadistintadaquelaquese temutilizado,aexpressoTecnologiaSocial.Por ter adquirido uma conotao especfica, fruto do processo semitico histrica e espacialmentedeterminadoquetemenvolvidoasuadefinioeemprego,epelofatodeelaserinterpretadapornscomosendomaisumamarcaregistradatilparadesignarecomunicarumaidiadoqueumconceitoadequadoparachegaraconceberoconjuntode indicaesdecartersciotcnicocapazdeorientaras aesdedesenvolvimento tecnocientfico,ousodaexpresso Tecnologia Socialnonospareceuadequado.

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    Nossopropsitonestetrabalhoento,apartirdaestratgiaquepassamosaadotar4, dar um primeiro passo na anlise sobreos elementos que deveria abarcarumateoriacrticadatecnologiaparadarcontadessedesafio.Para isso,elebuscaseafastaromaispossveldatrajetriaqueaquelaestratgiaprivilegia.Epor issoqueele busca identificar, no mbito de um contexto socioeconmico genrico, as

    caractersticasdo

    processo

    de

    trabalho

    em

    que

    se

    envolvem

    os

    seres

    humanos.

    Dentre

    elas,seconsideracomocentraleaomesmo tempovarivel,em funodeaspectosdaquelecontexto,ocontrole5.

    A partirdessaabordagemgenricabuscamosentender asespecificidadesdatecnologia capitalista.O resultadomais importante dessa terceira seo, tendo emvistanossoobjetivodeproporcionarumreferencialparaodesenvolvimentodeTA,aproposio de que aquilo que caracteriza a tecnologia capitalista ou a tecnologiaconvencional no a propriedade privada dosmeios de produo e sim o tipo decontrolequeeladetermina6.

    Umadas

    inovaes

    de

    nossa

    proposta

    que

    a

    propriedade

    privada

    dos

    meios

    deproduodeveserconsideradaparafinsdeanlisecomoumelementoexgenoaoambiente produtivo. Por ser um elemento que condiciona o tipo de acordo socialnecessrioparaqueexistaacooperaoparaaproduoquequalquerconfiguraodo processo de trabalho demanda, a propriedade privada dos meios de produopossibilitaoestabelecimentodocontroleque irpresidiraconcepoeutilizaodatecnologiacapitalista.Tecnologiaqueeestaparansumaquestocentralpodeguardar consigo esse tipo controle mesmo quando deixe de existir esse elementoexgeno.

    4Nonossa intenodar aentenderqueabuscadeumaestratgiadesse tipo seja algooriginal.Vrios autores tm procurado, por exemplo, deslocar o foco de preocupao do marxismo dasimplicaesdatecnologianoempregoenadistribuiodarendaedariquezadestacandoaimportnciadadominao.O resultadomais importantedessa terceira seo, tendo em vistanossoobjetivodeproporcionar um referencial para o desenvolvimento de TA, a proposio de que aquilo quecaracterizaatecnologiacapitalistaouatecnologiaconvencionalnoapropriedadeprivadadosmeios

    deproduo

    e

    sim

    o

    tipo

    de

    controle

    que

    ela

    determina

    e

    da

    alienao

    que

    se

    manifestam

    no

    cho

    de

    fbrica (ou no processo de trabalho), pormuito tempo negligenciada. Entre eles, Burawoy (1979),Braverman(1987),Feenberg(2002),Noble(1979),Thompson(1983),Zimbalist(1989).5EmboraaacepomaiscomumsejaaquelaregistradapeloAurlio:ato,efeitooupoderdecontrolar;domnio,governo.Encontramos,naEnciclopdiaBritnica,umadefiniomaiscoerentecomaquiloquenosinteressaaludir:skillintheuseofatool,instrument,technique,orartisticmdium.6Aidiadequeocontroleumacaractersticaimportantedatecnologiacapitalistanonova.Almdos autores citados na nota 3, podemos indicar, entre outros, Edwards (1990), Hirschorn (1984),Ramalho(1991).Oquesimnospareceoriginalaidiadequeocontrolesejaumatributoinerenteaqualquer formadeproduzir. Idia cujaorigemestemnossa intenodeexplicarporquenobastaparaconstruirformassolidriasdeproduoaaboliodapropriedadeprivadadosmeiosdeproduo.Mais alm desta relao social, seria um obstculo, cuja centralidade desproporcional pouca

    importncia

    que

    ele

    tem

    at

    agora

    merecido,

    o

    tipo

    de

    controle

    que

    o

    acordo

    social

    que

    ela

    impe

    deixa

    impregnadonaformadeproduzir(tecnologia)capitalista.

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    Processodetrabalhoeatoressociais

    Para chegar a um conceito adequado para explicitar a viso crtica queprocuramos desenvolver, iniciamos conceituando processo de trabalho. Ele

    entendidocomo

    uma

    combinao

    de

    trabalho

    vivoou

    da

    fora

    de

    trabalho

    do

    produtor direto e, eventualmente, de outros atores sociais, e trabalho morto(matriasprimas, instalaes, ferramentas,etc resultantesdeprocessosde trabalhoanteriores)comoobjetivodeproduzirumbemouservio(daquiparafrenteproduto).Esse processo se verifica no que denominamos ambiente produtivo, e nesteambienteondeseconcentranossofoco7.

    O trabalho morto, devido a sua caracterstica de coisa construda pelo serhumano (emgeralobjetosmateriais)podeseracumulado;de formaqueummesmoindivduopossaconcentrarasuapropriedade.Apropriedadedotrabalhovivo,porsereleumaqualidadeintrnsecaaoserhumano,necessariamentedistribuda.

    Acaractersticaquetemsidoentendidacomooquediferenciaoserhumanodeoutrosseresvivos,acapacidadedeaprender, implicaquecadavezqueelecogiteemrealizarumaao igualousemelhanteoutraquejrealizou,eleestejasempreinfluenciada pelo aprendizado posterior quela ao pretrita. A capacidade quedecorredesseaprendizadoequepassaa influenciarnomodocomoeledesempenhaassuasaesdenominamoscontrole(habilidaderelativaaousodeumconhecimentointangvel ou incorporado a artefatos tecnolgicos). Isso significa que qualquerprocessodetrabalho,independentementedascondieshistricosociaisedeoutrosaspectosquepresidamaformacomoserealize,implicanaexistnciadealgumtipodecontrole. Significa tambm que so essas condies que iro determinar ascaractersticasdessecontrole.

    Sempre que houver mais de um produtor direto (aquele que operadiretamente os meios de produo que resultaram de processos de trabalhopretritos: trabalhomorto) envolvido num processo de trabalho necessrio que,independentementedecomoa sua relao foradoambienteprodutivo (amizade,rivalidadeetc),ocorranoseumbitoumacordodecooperao.Elaumacondioimprescindvelparaotrabalhocoletivoquepodeserobservadaatmesmoemgruposnohumanos(formigas,abelhas).

    A durao mdia do processo de trabalho necessrio para produzir certo

    produtodepende

    das

    condies

    sociais,

    histricas

    e

    espaciais

    em

    que

    ele

    realizado;

    7O foconoprocessode trabalho,noprocessodeproduodebense serviosque se verificanumambiente produtivo, uma caracterstica de nossa abordagem (como se ver adiante, essacaractersticavai incidirnamaneira como se ir conceituar tecnologia).Elasedeve,porum lado,aoconvencimento de que os fenmenos que ocorrem neste ambiente em funo desse processo sofatoresdeterminantes,senoestruturantes,dasformasdeproduzir,promoverorelacionamentoentrepessoaseinstituies,gerarconhecimento,etcdominantesnumadadasociedade.E,poroutro,porquenossa percepo de que qualquer tentativa de implantar projetos polticos ou estilos dedesenvolvimentoscioeconmicoalternativosdemandaelementosestruturantesrelacionadosquelesfenmenos.

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    por isto se denomina tempo de trabalho socialmente necessrio8. Ele depende,basicamente,daescassezrelativadamatriaprimaedadificuldadeoudahabilidaderequeridaparaasuaproduo.

    Independentemente dessas condies, o proprietrio do trabalho vivo ,

    sempre,

    o

    trabalhador

    direto.

    Quando

    ele

    tambm

    proprietrio

    do

    trabalho

    morto

    (meiosdeproduo),aproduodoproduto sedde forma individualou coletiva,dependendodaescolhadostrabalhadoresdiretos.

    Quandoo trabalhomortodepropriedadedeoutroator social,aproduosertambmumacombinaodessesdoisatores.Tambmnestecaso,aproduospoderocorrerseosdoisatoressociais,independentementedopoderrelativoquelhesconfereapossedosmeiosdeproduo,entrarememumacordodecooperaonoambienteprodutivo, talvezcommaior razo, issoumacondio imprescindvelparatanto.

    Nosso foco, ao examinar o processo produtivo, identificar situaes de

    mudanaoriginadas

    pelo

    controle

    sobre

    ele

    exercido

    pelos

    atores

    envolvidos9.

    Em

    particular as associadas a uma reduo do tempo de trabalho necessrio para aobtenodeumdadoproduto (sempreentendidoem termosquantitativos10,comocertovolumedeproduo),umavezqueelasimplicamumaalteraonaformacomoserealizaotrabalhovivoounaformacomoserealizouotrabalhomorto,incorporadonos insumos e equipamentos que so utilizados no processo de produo daqueleproduto.

    Essa reduodo tempode trabalhonecessrioparaaobtenodeumdadoprodutopodeserentendidacomoumaumentodaquantidadedeprodutoproduzidadurante uma jornada de trabalho de tempo fixado. Ou como um aumento daquantidadedeprodutoproduzidaporunidadedetempodetrabalhoou,ainda,comooaumentodoprodutogeradoao longodeumciclodeproduoemrelaoaocicloanterior11.

    Essareduopodeocorrermedianteumaumentodaenergiafsicaoumentaldotrabalhadordiretoduranteoprocessodeproduodaqueleproduto(intensificaodoritmodotrabalho)oumedianteasubstituiodetrabalhovivoportrabalhomorto.Isto,autilizao,naqueleprocessodeproduo,demeiosdeproduoquetragamincorporadoumaquantidademaiordetrabalhomorto.

    8Tomamosotempodetrabalhocomoconceitobsicoparadesenvolvernossaviso.emrelaoaelequeiremosdefinirgrandepartedosconceitosqueaintegram.9Nossanfasenamudanadomododeproduzirtemavercomoprpriosentidoqueseirconferiraoconceitode tecnologia.Oqualseencontra ligadoauma idiadealgoempermanentemutao,emtudosemelhanteaoconceitodeinovao.10

    No trataremos por enquantodemudanasqualitativasno produto, isto deumamudananascaractersticasdoprodutodeterminadapelaalteraonaformacomoserealizaotrabalho.11

    Privilegiamosotempodetrabalhoenoaquantidadedeprodutoproduzidocomoelementovarivelporque parece ser, o primeiro, aquele que o ator que controla o processo de trabalho, seja ele otrabalhadordiretoouocapitalista,estinteressadoemmodificar.Comoiremosabordarmaisadiante,sobreoprimeiroelementooqueocapitalistapossuigovernabilidade.Esdepoisqueelesemostra

    capazde,

    atravs

    do

    controle

    que

    exerce

    sobre

    o

    processo

    de

    trabalho,

    diminuir

    o

    tempo

    de

    trabalho,

    queelepoderdecidirseexistemcondiespropciasparaoaumentodeproduo.

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    Quandoambosos tiposde trabalho sodepropriedadedomesmoator, suavontadenaturaldediminuirotempodetrabalhonecessrioparaobterumproduto,sejaparadispordemaistempo livre,sejaparaenvolversecomoutrosprocessosdetrabalho,tercomolimiteumadecisoindividual12.

    Pode

    ocorrer

    que,

    em

    condies

    especiais

    (escassez,

    emergncias

    etc),

    o

    trabalhador individualtomeadecisodesacrificarseutempo livreeatasuasadepara reduzir o tempo de trabalho necessrio para obter um dado produto. Ou,inclusive,deaumentarotempoquededicaatrabalhar.

    Nesse caso, como se um elemento exgeno em relao o processo detrabalho em si, e ao ambiente de trabalho, passasse a controlar aquela vontadenaturaldotrabalhadorindividual.

    Quando o processo de trabalho envolve um coletivo voluntrio detrabalhadoresdiretosproprietriosdosmeiosdeproduo,ocontrolenecessrioparaenfrentarcondiesespeciaisno individualouunilateral.Ocontrole,nestecaso,

    umadecorrncia

    de

    um

    acordo

    entre

    trabalhadores

    diretos

    iguais,

    que

    transcende

    aquele acordo de cooperao no ambiente produtivo. Ele envolve laos desolidariedadequesedoemfunodocontexto(social,poltico,econmicoetc),masque,noobstanteseguesendoexercidosobreoprocessode trabalhoquesednointeriordoambienteprodutivo.

    Nestecaso,oslimitesrelativosreduodotempodetrabalhonecessrioparaa obteno de um dado produto so mais elsticos do que no caso do trabalhoindividual,epodem implicarsacrifciosaindamaioresdadoquedependemdaqueleslaos de solidariedade (o que muito diferente de acordos de cooperao) maisamplos,fortesecomplexos.

    de se esperar que, simetricamente, quando no existam esses laos desolidariedadeentreos atoresqueparticipamdoprocesso deproduo, a aceitaodos sacrifcios envolvidos com a reduo do tempo de trabalho necessrio para aobteno de um dado produto, demande um acordo de cooperao interno aoambienteprodutivonumnvelmaiselevado.

    Mais do que isso, quando, ao invs de solidariedade, o que se verifique nocontextosejaumenfrentamentoderivadodapossedesigualderiquezaerenda(e,porconseqncia,noambienteprodutivo,demeiosdeproduo),onveldeacordodecooperaonombitodoambienteprodutivonecessriopara viabilizaraproduo

    terque

    ser

    bem

    superior.

    Esse nvel de acordo de cooperao poder ser alcanado em situaesespeciais, como as de enfrentamento a uma catstrofe natural ou a um inimigocomum, em estados de guerra. Em situaes normais, entretanto, ele exigir umcontrolenumgraubastantesuperiorquelequeexistenoscoletivosdetrabalhadoresdiretos.Essecontrolesupeumacoero ideologicamentelegitimadaeconsolidadano contexto que envolve o ambiente produtivo, que naturalize a existncia deproprietriosdosmeiosdeproduoeavendadaforadetrabalho.

    12 Veblen(1898).

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    Asespecificidadesdocontrolenatecnologiacapitalista

    Nocapitalismo,osbensouserviossoproduzidosparaseremcomercializadospor um preo que, independentemente de seu valor de uso (ou da satisfao quepossacausaraoseucomprador)oscilaemtornodoseuvalordetroca;isto,otempode trabalho socialmente necessrio para produzilos. O controle do processo detrabalhoexercidopeloproprietriodotrabalhomorto (oumeiosdeproduo)quecontrataoprodutordireto remunerandoo comum salrioem trocadousode suaforadetrabalho.

    Essecontrole facultaaoproprietriodo trabalhomorto (ouaseusprepostos)alteraroprocessodetrabalho(introduzirtecnologia)demodoaapropriarsedeumaparcelamaiordovalordamercadoria (bensouserviosproduzidosparaomercado)

    produzida.

    O

    valor

    de

    troca

    da

    mercadoria

    formado

    por

    trs

    elementos

    que,

    no

    decorrerdeumprocessodetrabalhocujaduraootempodetrabalhosocialmentenecessrioparaproduzila, se voaele incorporando.Soeles:o valordo trabalhomortosobreoqualtrabalhaotrabalhadordireto,ovalordotrabalhovivo(salrio)eolucroapropriadopelocapitalista,quecorrespondepartedotempodetrabalhoqueexcedesomadosvaloresanterioresque foramsendo incorporadosmercadoriaeaoseuvalor.

    Olucrocorresponde,ento,aotempodetrabalhoexcedente,ouseja,aqueletempoque,depoisdeseterremuneradoasoutrasduasparcelasotrabalhomortoeotrabalhovivo ,ir,navisodaeconomianeoclssica,remuneraracapacidadedo

    capitalistade

    organizar

    a

    produo.

    Nessa

    viso,

    da

    mesma

    forma

    que

    o

    salrio

    a

    remuneraoconferidaaotrabalhadordiretodevidoaousodesuafora(capacidade)de trabalho, o lucro seria a remunerao que corresponde ao capitalista, no emvirtudedeseupoderdecoeroadvindodapropriedadedosmeiosdeproduo,masemfunodousoquefeitodesuahabilidade(capacidade)deorganizaretomarosriscosinerentesproduodemercadorias.

    Ocapitalismotrazconsigoapossibilidadedequeotrabalhadordireto,quejno sofre violncia fsica no ambiente da produo (pelomenos como ocorria nosregimesescravocratas)adquiraaconscinciadequeaformacomoproduzjnopodesercontroladaporele.Quandoelepercebeque,aindaquenosofracoero fsica,

    existeum

    controle

    a

    ele

    externo,

    personificado

    numa

    pessoa

    a

    quem

    ele

    se

    subordina

    ouquesematerializaeminstrumentos,normasemquinas.Umapessoaresponsvelpela segmentaoehierarquizaodoprocessode trabalhoque seusantecessores,individualoucoletivamente,controlavamdesdea fasedeconcepodoprodutoouprocessoatadedeterminaododestinodoqueeraproduzido.

    Essa possibilidade demorou a sematerializar porque essa forma de produzirhavia adquirido uma caracterstica de intermediao de uma relao de podercoercitivoquenosemanifestavacomotalnoambientedaproduo.

    Mas houve um momento em que essa forma controladora do trabalho do

    produtordireto

    era

    uma

    alternativa

    (nova)

    quelas

    ento

    existentes,

    que

    hoje

    chamaramosautogestionrias(associativas,solidriasoucooperativas).Elaspdese

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    impormedianteuma coeroqueno semanifestava, comoocorriaemmomentoshistricosanteriores,noambientedaproduo.Elasesituavanocontextoexternoaesseambiente.

    Ocontrolesobreaformadeproduzireragarantidopelasrelaessociaisquea

    coero

    vigente

    no

    contexto

    externo

    possibilitava.

    E

    era,

    tambm,

    um

    substituto

    superioraestacoero.Disfaradopelocartercooperativointrnsecoaprocessosdetrabalho coletivos antes existentes, em que trabalhadores associados estabelecemdemocraticamente normas para produzir, esse controle assumia o papel dessasnormasdemodoagarantircolaboraoepaznoambienteprodutivo.

    Esse carter cooperativo intrnseco a qualquer tipo de trabalho coletivo(mesmoquenofossedenaturezaassociativa)era,porumlado,umobstculoparaoaumentodocontrolesobreoprocessodetrabalhoesobreoprpriotrabalhador.Mas,poroutro,eraumpoderosodisfarceparaencobrirocontrole,umavezqueelepodiaaparecer comoumanecessidade inerenteproduo coletivaque,deoutromodo,

    nopoderia

    dar

    se

    de

    modo

    organizado.

    Mas, medida que se desfaziam os laos associativos que caracterizavam aformadeproduziranteriorequepossibilitavamaorganizaodaproduocoletiva,ocontrole passava a ser efetivamente, e no apenas na aparncia, um substitutoimprescindvelparaaquelasnormasdemocraticamenteestabelecidas.

    Quando,nesteambientenocoercitivo,osobjetivosdaproduopassamaserassumidos pelo trabalhador direto, fica pronto o cenrio para que aquele controlepasse a ser entendido como "relaes tcnicas de produo". E no como umsubstituto, apropriado ao imperativo da cooperao, das "relaes sociais deproduo"quecercavamelegitimavamaqueleambiente13.

    Quando, ademais, a figura do proprietrio dos meios de produo que,personificava a relao social de explorao garantida pelo contexto, vai sendosubstituda pelos "tcnicos", aquelas formas de produzir que chamaramos hoje desolidrias (e at autogestionrias), em relao s quais essa forma controladora deproduzireraumaalternativanova,jnomaispodiamserutilizadas.Elassubsistiam,cada vez mais marginalmente, nos ambientes produtivos noindustriais onde apropriedadeprivadadosmeiosdeproduonoeradominante.

    De fato, foi no setor agrcola, onde a propriedade privada dos meios deproduonosegeneralizavatorapidamente,quesemantiverampormaistempoas

    formasde

    produzir

    baseada

    no

    associativismo.

    E

    por

    isso

    que

    seguem

    sendo

    no

    setor

    ruralondeathojeseconcentramdemaneiraavassaladoraaspropostasdeadoodetecnologiasdistintasdatecnologiaconvencional(oucapitalista)eondeosurgimentoe

    13SegundoBurawoy (1979),apossibilidadequefacultadaaos trabalhadores(pelocapitalistaepelo

    Estado)paraorganizaremaproduooque gerao consentimento esteelementoessencialparapermitir que uma idia da classe dominante se transforme em ideologia intrnseca ao modo deproduotornandomenosnecessriaacoero.Aqual,comosesabe,orecursomaiscustosoparao establishment: ao ser ativada, quando fracassa o controle ideolgico, ela desnuda o cartercontraditrioededominaodocapitalismo.Defato,comoressaltamBurawoy(1979)eTragtenberg

    (1987),

    por

    exemplo,

    a

    caracterstica

    do

    capitalismo,

    de

    mesclar

    conflito

    e

    consentimento,

    tambm

    se

    manifestanoambienteprodutivo.Afbricadeveserumlugardcilepacfico",masquandoistocorreoriscodenoacontecer,acoeroutilizada.

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    sobrevivnciadeformasdeproduziralternativasformahegemnicasopossveis.porquealiaindaexistem,senoapropriedadecoletiva,osvestgiosqueeladeixouemtermosdapossibilidadede trabalho cooperativo.Nomeiourbano, snas fabricasrecuperadas,ounascooperativasdecatadoresqueadicionamovalordesuaforadetrabalhoaumcapitalconstantecomumvalorpraticamentenulo,comoocasodo

    lixo,onde

    formas

    de

    produzir

    alternativas

    so

    possveis.

    medidaquevaiseexpandindoomododeproduocapitalistaindustrialeseconsolidando a superestrutura ideolgica que garante a manuteno de sua baseeconmicoprodutiva, se naturaliza, como tantas outras caractersticas intrnsecas aessemododeproduo,oexercciodocontrolesobreoprocessodetrabalhoesobreotrabalhadordiretonoambienteprodutivo.

    Com vimos, o controle j existia nos modos de produo anteriores aocapitalismo.Neles,eleapareciaassociadoaoexercciodacoero(inclusivefsica)noambiente produtivo que o evidenciava e exacerbava para alm de imperativos

    tcnicos.

    em

    virtude

    da

    dissociao

    que

    passa

    a

    existir

    no

    capitalismo,

    entre

    propriedade dos meios de produo e exerccio da violncia (que passa a sermonopolizadopeloEstado),queo controle,aodeixardeestarassociadocoero,pode aparecer de forma encoberta. E passar a ser visualizado como um atributotcnicodaformadeproduzircapitalista.

    Maisumpassoimportantedessatrajetriadenaturalizao,queseverificademodo coorganizado com uma srie de outros processos que estavam ocorrendodentro e fora do ambiente produtivo, dado quando o controle deixa de estarpersonificadoecomeaaserexercido,demodoaindamaisnaturalizadoetcnico,pelasprpriasmquinasepelosmtodosdegestodoprocessodetrabalho.Soelas,

    ento,que

    passam

    a

    materializar

    o

    controle,

    fazendo

    com

    que

    ele

    passe

    a

    ser

    visto

    comoumatributoestritamentetcnicoemfavordamaximizaodaprodutividadeeno como um imperativo colocado pela apropriao do aumento do tempo detrabalhoexcedentequelequeremuneraocapitalconstanteeotrabalhovivo.

    Essa expanso e consolidao do modo de produo capitalista ocorreram,como se sabe,custadadestruiode formasdeproduziranteriores,baseadasnoassociativismo,namanufaturaeemoutrasqueadestruiodospilaresdofeudalismosepultou.Entreelas,aquehaviaderivadodosgrmiosdeartesosequechegouasecolocar,no inciodesteprocesso,comoumaalternativaorganizaocapitalistadotrabalho.

    Contriburam para esse processo de naturalizao as derrotas polticas quesofreuaclasse trabalhadoranasua lutacontraocapital.Masnoporoutrarazoque cada vez que o movimento dos trabalhadores conseguiu alguma vitriaimportante,ocooperativismoeaautogestoemergiram,podesedizerquedascinzas,comoformasdeproduziredeorganizaralutacontraocontroleeopoderdocapital.

    De forma muito provavelmente associada ao entendimento do marxismoortodoxo,dequeexistiriam relaes tcnicasdeproduo,no mbitodo ambienteprodutivo,erelaessociaisdeproduo,quenocontextodasociedadegarantiriamas primeiras, passa a diminuir no seio do movimento socialista internacional a

    importnciarelativa

    da

    proposta

    do

    cooperativismo

    e

    da

    autogesto.

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    Como tentamosmostrar, talvez o noentendimento de que a caractersticafundamental da tecnologia capitalista no a propriedade privada dos meios deproduo,mas a existncia de um tipo particular de controle sobre o trabalhadordiretotenhasidoacausaprimeiradessasituao.Oquenoimplicadesconhecerqueaquilo que garanteo controle, que por sua vez garante a cooperao no ambiente

    produtivo,

    a

    coero

    que

    vigora

    no

    contexto,

    e

    que

    tem

    como

    fundamento

    a

    propriedadeprivadadosmeiosdeproduo.

    Ela, entretanto, no aparece como tal no ambiente produtivo, no umelemento tecnolgico, uma varivel, passvel de ser incorporado prancheta doprojetista da tecnologia ou s planilhas dos responsveis pelos diversos aspectos(estgios, cadeias de produo, tempos emovimentos, layouts etc) do processo detrabalho. Ela no condiciona diretamente as caractersticas da tecnologia (e, porincluso,doprocessodetrabalho).

    A propriedade privada dosmeios de produo uma relao social que se

    estabeleceno

    contexto

    que

    cerca

    o

    ambiente

    produtivo.

    como

    se

    essa

    relao

    social,

    parapoderinterferircomoprocessodetrabalhoeparamoldaratecnologiaprecisassedealgoquearepresentassenoambienteprodutivo.Essetransdutorocontrole.ele,enoapropriedadeprivadadosmeiosdeproduo,quedeterminadiretamenteascaractersticasdomododeproduziredatecnologia.

    Como apontamos acima, uma situao em que produtores diretos,proprietriosdosmeiosdeproduo,cooperamparaproduziralgo,tambmdemandacontrole.Nessecaso,diferentementedoqueocorrequandoosprodutoresdiretosnosoproprietriosdosmeiosdeproduo,ocontroleoresultadodeumacordo14eno de uma autoridade do capitalista, fundamentada na propriedadedosmeios de

    produo.Mas

    esse

    acordo

    ,

    tambm,

    uma

    relao

    social.

    Ela

    se

    estabelece,

    analogamente, forado ambienteprodutivo,neste caso,apartirdeumprocessodetomada de deciso coletivo e democrtico.O qual, analogamente, orientado emltima instncia, pela vontade dos produtores diretos de manter a propriedadecoletiva dos meios de produo, de proporcionar retiradas compensadoras a cadacooperado,etc.Damesmaformaque,numaempresacapitalista,amanutenodocarterprivadodosmeiosdeproduo,aobtenodeumataxamnimade lucro oquemotivaejustificaaatividadeprodutiva.

    Assim posto, fcil de entender que o tipo de controle que ir resultar derelaessociaistodiferentesser,tambm,diferente.

    14Nossa viso, de que existiria um transdutor entre o que ocorre no ambiente produtivo e no seu

    contexto introduz uma nuance na de outros pesquisadores. Claudio Dedecca (2003), por exemplo,ressaltaque"os trabalhadores trabalhamcomaarmadodesempregonacabea", ressaltandoqueotipodecoeroutilizadohojeemdiaodesemprego.MrciaLeite(2003)apontaquearotatividadeda

    mode

    obra

    facultada

    ela

    legislao

    trabalhista

    que

    limita

    os

    direitos

    do

    trabalhador

    acaba

    se

    tornando

    umaformadecoero.

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    Conhecimentoecontrolenocapitalismo

    Esta seo apresenta sumariamente como o conhecimento passa a sermonopolizadonocapitalismocomvistasa,porumlado,potencializarelegitimarasua

    expanso.E,

    por

    outro,

    a

    viabilizar

    o

    tipo

    especfico

    de

    controle

    sobre

    o

    processo

    de

    trabalhoqueocaracteriza.

    Semprehouve,aolongodahistria,certotipodeconhecimentocujaproduosedavadeformarelativamentecentralizada.Issoocorreumesmoemsociedadesondeamaioriadosbenseservioseraproduzidapelosindivduosqueosiriamconsumir;oupelos seus familiares. E que, para melhorar sua qualidade ou aumentar a suaproduo,seencarregavam,porsuaprpriacontaedeformadispersa,deincorporarosaberquepossuamassuasatividades.

    Aquele primeiro tipo de conhecimento se relacionava a atividades no

    diretamente

    ligadas

    produo

    de

    bens

    e

    servios.

    E,

    sim,

    quelas

    que

    garantiam

    as

    condiesgeraisdevidaemsociedade,airrigao,adefesa,easadefsicaementaldosindivduos.

    OsurgimentodoEstadosed,justamente,emsociedadesemqueovolumeeaescaladessetipodeatividades,cujaapropriaoocorredemodocoletivo,adquiriamumadimensoimportanteemrelaoquelasqueseverificamnombitodasfamliasequegarantiamsuasubsistnciaimediata.Umadasatividadesmaistpicasdessetipocentralizadoaqueatendenecessidadedegarantiradefesadeumdeterminadogruposocialdeoutrosquehabitamterritrioscontguos.Noporoutrarazoquea diferenciao e apartamento dessa atividade daquelas cuja realizao se d de

    maneiradescentralizada,

    nas

    famlias

    (por

    sua

    prpria

    iniciativa

    e

    controle)

    o

    que

    originaaForaArmadaemarcaosurgimentodoEstado.

    O Estado capitalista conformado a partir de uma situao em que apropriedade dos meios de produo, j concentrada em mos de uma minoriadetentoradepodereconmico,sedesvinculadoexercciodacoeropolticasobreosindivduos.PassaaserfunodoEstado(capitalista),enomaisdeumaclassesocialparticular,omonopliolegtimodaviolncia.

    essafuno,razoemltima instnciadesuaexistncia,oquefazcomqueelesejacapazdegarantir,nasociedadedaqualsedesprende,arelaodedominao

    caracterstica

    do

    capitalismo.

    Aquela

    que

    se

    estabelece

    entre

    os

    proprietrios

    dos

    meiosdeproduoeosdemais indivduosque,pornoospossuremeestaremporisto incapacitado para produzir os bens e servios com os quais seus antepassadosgarantiamsuasobrevivncia imediata,temquevendersuaforadetrabalho.Aquelarelaodedominaoconstitutivadocapitalismo,legitimadanasociedadepeloEstadocapitalista,quegaranteaordemsociale,nombitodaproduodosbenseserviosquepassamaserfabricadosparaomercado,arelaodecooperaofabril(enodecoero)mediadapelo salrioentreaquelasduas classesde indivduos.Enfim,arelaoentreaclassedominanteeaclassedominada.

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    O Estado garante, tambm, que o conhecimento que passa a ser gerado nocapitalismo15 contribuapara sacramentarenaturalizara separaoentre trabalhointelectualemanual.Apropriedadeprivadadosmeiosdeproduocomeaaocorreremsimultneo,porumlado,segmentaoehierarquizaodoprocessodetrabalho(MARGLIN,1974).E,poroutro,expropriaodoconhecimentoentodisseminado

    entreos

    produtores

    diretos

    que

    at

    ento

    lhes

    permitia

    subsistir

    em

    uma

    economia

    ainda no totalmente monetizada e assalariada. Esse conhecimento passa a sercodificado,sistematizadoeprivatizado16.

    O capitalismo nascente passa a reservar aos proprietrios dos meios deproduoomonopliodotrabalhointelectualecondenaosquetmquevendersuaforade trabalhoaumavida inteirade trabalhomanualnaqualutilizamumapartenfima de sua capacidade inata de refletir e criar. A associao entre trabalhointelectual e posse dos meios de produo pelo capitalista proporciona umaexplicao naturalizada para a apropriao privada do excedente gerado pelotrabalhador no processo de trabalho. E que faz entender o lucro como umaremunerao sua indispensvel contribuio para a produo, oriunda de suacapacidadedeorganizla.

    Antes de passar ao prximo ponto, convm sintetizar os resultados quealcanamos.Talvezomais importanteaquelequechegamosapartirdaabordagemgenrica proposta, acerca das especificidades da tecnologia capitalista. De fato, aproposio de que aquilo que caracteriza a tecnologia capitalista ou a tecnologiaconvencional no a propriedade privada dosmeios de produo e sim o tipo decontrole que ela determina o resultadomais importante para nosso objetivo deproporcionar um referencial para o desenvolvimento de TA. Por ser um elemento

    exgeno

    ao

    ambiente

    produtivo,

    que

    condiciona

    o

    tipo

    de

    acordo

    social

    necessrio

    paraqueexistaacooperaoparaaproduoquequalquerconfiguraodoprocessode trabalho demanda, a propriedade privada dos meios de produo o que faz estabelecer o controle que ir presidir a concepo e utilizao da tecnologiacapitalista.Estatecnologia,portersidogeradanumambientemarcadoporessetipocontrole, passaria a estar contaminada por ele. Ela guardaria consigo ascaractersticas dele decorrentes mesmo quando deixasse de existir esse elementoexgeno.

    15ConcordamoscomMarcosOliveira(2002,p.109)quandoescreveque,porestarodesenvolvimento

    dacinciaedatecnologiamodernaintimamenteligadaaosurgimentoeaconsolidaodocapitalismo,possvel afirmarque a cinciae a tecnologiaque conhecemos souma cincia euma tecnologiacapitalistas.Equeoquehojeconhecidocomocinciarepresentaapenasumaabordagempossvel,motivadaporvaloresatribudossprticasdecontroledanaturezacaractersticasdocapitalismo.16

    Parecepossvel argumentarque a separao estrita, generalizada, sacramentada,naturalizadae

    semretorno

    entre

    trabalho

    intelectual

    e

    manual

    esteja

    relacionada

    com

    a

    secesso

    imposta

    pelo

    capitalismo,deterritrios,hojeseparadosaindaquefronteirios,quevodaartecincia,passandopeloartesanato,pelatcnicaepelatecnologia.

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    Atecnologiacapitalista,afbricaeomercado

    Bens e servios produzidos para serem comprados por indivduos queproduzem outros bens e servios no mbito dessa relao social de produo

    adquiremno

    capitalismo,

    ento,

    um

    valor

    que

    transcende

    a

    satisfao

    que

    seu

    uso

    possibilita. Seu valor de troca, formado mediante um processo de produotipicamentecapitalistapelasomadosmateriaisempregados,pelosalriopagoepelolucrodoempresrio, aqueleem tornodoqual ir flutuar seupreoefetivamenterealizadonomercado.

    Eparadiminuirotempoduranteoqualotrabalhadordiretoretribuicomotrabalho que realiza o seu salrio, que cada empresrio passa a utilizar,crescentemente, conhecimento.Comoo aumento da produtividade do processo detrabalhoderivadodaadiodeconhecimentonumaempresatendeadarsetambmemcadaramodaproduo,oefeitodiretobuscadopeloempresrio,deaumentara

    suataxa

    de

    lucro

    individual,

    se

    soma

    a

    efeitos

    indiretos

    de

    barateamento

    dos

    bens

    consumidospelostrabalhadoresedosmateriaisnecessriosproduo.

    Se,depoisdeserbemsucedidonoempregodeconhecimentoemsuaempresaaumentandosuataxade lucro,oempresrioconseguir impedirqueoutroso imitem,elepermanecerindefinidamenteauferindoolucroadicionalresultantedadiminuiodotempoduranteoqualotrabalhadorretribuioseusalrio;isto,doaumentodataxadeexploraoquepratica.

    Como manter esse tipo de segredo tecnolgico difcil, natural que elerealizeoquepodeserentendido,noplanoanaltico,comoumsegundomovimento.

    Abrirmo

    de

    uma

    parte

    de

    sua

    margem

    de

    lucro

    baixando

    o

    preo

    que

    pratica,

    e

    expulsaralgunsdeseusconcorrentesdomercado.Assim,ecomoresultadocolaterale expost (embora provavelmente desde o incio pretendido) de um bemsucedidoempregodeconhecimentonasuaempresa,oempresrio,ademaisdolucroadicionaloriundodoaumentodaprodutividadedo trabalhoqueexecutam seusempregados,poder aumentar seu mercado. E, assim, novamente, sua margem de lucro. Oresultado de um terceiro movimento ser a diminuio do custo de produo deoutrosempresrios,emoutrosramos.

    Esse mecanismo dinmico, causado por processos de emprego deconhecimentodenaturezaatomizadaenocoordenada,quepermitemaumentara

    taxade

    mais

    valia

    do

    empresrio,

    incessante

    e

    ciclicamente

    perturba

    o

    equilbrio

    concorrencial gerado no mercado. Sua natureza, ao mesmo tempo localizada egeneralizada,semanifestanonvelmacroeconmicodeduasformas:gerando,entreos empresrios, perdedores e ganhadores; e, entre o conjunto dos indivduosenvolvidos com a produo de mercadorias empresrios e trabalhadores umapotencial redundncia demodeobra e de diminuio dos salrios unitrios e damassasalarial.

    compreensvel que esse mecanismo que tem possibilitado a expanso docapitalismo seja posto em evidncia pelo empresrio que dele se beneficia comopertencendo ao nvelmacroeconmico da concorrncia intercapitalista. Imputlo aummovimento que ele desencadeia no nvelmicroeconmico, ao invs de situlo

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    comoumvitoriosoentreosseuspares,desnudariaoresultadobuscado,deaumentodataxadeexploraodeseusempregados.

    Essemecanismoque temorigemnombitodeumcaractersticoprocessodeproduoqueocorrenaempresa,mascujamanutenogarantidapeloEstadoepela

    ordem

    capitalista,

    legitimado

    pelo

    sistema

    de

    dominao

    ideolgica

    que

    dela

    emana.

    Contribuiu para obscurecer o cartermoralmente questionvel do comportamentoempresarial e o consentimento da classe subordinada; contrapartida necessria noprocessode construodahegemonia (ideolgica)edo capitalismo.Aqual conferelegitimidadeaestaformadeutilizaodoconhecimentogeradopelasociedade.

    Acausaprimeiradeproduoeutilizaodesseconhecimentoaumentarotrabalho no pago na rbita da produo no o que aparece com destaque narbita da circulao. E, tampouco, o que parece conferir dinamismo quelemecanismo.De fato,oempregodeconhecimentonaproduosemanifestaapenascomo fruto de uma compulso concorrencial que leva a um dinamismo no plano

    macroeconmico.

    O fato de que o lucro adicional s se realiza na rbita da circulao d aimpressodequeacausaprimeiradessemecanismoaconcorrnciaintercapitalista;da mesma forma que o fato de o valor da mercadoria s se realizar nomercadoobscurece seu carter de relao social. Porque a concorrncia intercapitalista seexpressanomercado viapreos,e leva expulsodosempresriosqueno foramcapazesdeempregaroconhecimento,asociedade tendeaesqueceroqueocorredentro das empresas, na rbita da produo. Originase um fetichismo quefreqentementeseverificaquandoosensocomumprocuraexplicarsituaesquesesituamnasfronteirasentreosocial,oeconmicoeoideolgico.

    A causa daquele mecanismo, entretanto, o ato gerador da maisvaliaextraordinria,sesituanarbitadaproduo.aliondeolucroqueseirrealizarnomercado efetivamente gerado mediante o emprego do conhecimento,desestabilizando, continuamente, demodo localizado,mas tambm generalizado,obalano de foras entre empresrios e trabalhadores e entre os segmentos destasclassessociaisquesesituamemdiferentessetoresdaeconomia.

    Mas como outros fetichismos, esse leva tambm legitimao e aofavorecimentodeumatorpresentenocenriopoltico.Eleaparececomoassociadosduas facetas inerentes ao esprito do capitalismo. A primeira o esprito

    empreendedor(aquilo

    que

    hoje

    se

    repete

    exausto

    usando

    o

    termo

    apologtico

    empreendedorismo), que levaria o empresrio, inquieto e sempre desejoso demelhorar a maneira como se realiza a produo, a aumentar a produtividade doprocesso de trabalho em que esto envolvidos seus empregados. Mediante aintroduo de conhecimento a esse processo tornase possvel produzir, semaumentarajornadadetrabalho,ummaiorvolumedeproduto.Situaoquecostumaser interpretada,emfunodaquelefetichismo,comoumganhoparaotrabalhador,sobretudo seo conhecimento incorporado produo torna o seu trabalhomenospenoso.Defato,casoessemaiorvolumefossedepropriedadedotrabalhador,anovasituao implicariaqueseuesforoestariarendendomais,ouque,porunidadede

    produto,

    ele

    seria

    agora

    menor.

    Ou

    ainda,

    que

    se

    ele

    tivesse

    o

    controle

    daquele

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    processo,elepoderiaproduziraquantidadeoriginalemmenostempoe,assimreduzirsuajornadadetrabalhooufazeraumentarsuaremunerao.

    Aoutrafacetainerenteaoespritodocapitalismoqueseencontraassociadaquelefetichismooespritocompetitivodoempresrio(aquiloquehojeserepete

    exausto

    usando

    o

    termo

    apologtico

    competitividade).

    A

    par

    da

    qualidade

    do

    bomempresrioqueolevariaabuscaroaumentodaprodutividade,masquepodeserentendida comoumabatalha contra seusempregadosvisandoapropriaodeuma parcelamaior do seu tempo de trabalho haveria outra compulso aindamaisvirtuosa.Elaolevariaacompetirincessantementecomseusconcorrentesembuscadeuma parcela maior do mercado. E em situaes que embora cada vez menosfreqentestendemaservistascomoaregra,aaumentaramodeobraocupadaemsuaempresaeabaratearseuproduto.

    interessante que tenha sido Merton, um weberiano pouco afeito aoquestionamentodasrelaesdeproduocapitalistaseconsideradoumdospaisda

    sociologiada

    cincia,

    um

    dos

    poucos

    autores

    a

    se

    referir

    de

    forma

    crtica

    a

    essa

    compulso do empresrio inovador. Diz ele: entre indivduos de nvel social eeconmicoelevado,noraroqueapressoemfavordainovaotorneimprecisaadistinoentreasprticasregulareseirregulares.ComoVeblenobservou:

    Emcertoscasosdifcil,porvezesimpossvel,atnojulgamentodotribunal, dizer que se trata de uma habilidade comercial digna deelogiooudeumadesonestidadequemereceapriso.Ahistriadasgrandes fortunas americanas a histria de indivduos tensos porinovaes de uma legitimidade duvidosa. (ALTER, 2001, p.64 apud

    MERTON,1970)

    Encerrandoessadigresso,e independentementedaperspectiva ideolgicaapartirdaqualsevisualizaessesdoisespritos,importantequeosdoismovimentosqueelesoriginamnoseconfundam.Distinguilosdeumaperspectivaanalticaumacondioparamelhorentenderosresultadosquefreqentemente,masnemsempre,aparecemdeformacombinadanadinmicadereproduocapitalista.

    O que no implica em pensar que historicamente, ao longo da expanso docapitalismo, eles tenham ocorrido em seqncia, um depois do outro. E nem, por

    exemplo,caricaturalmente,

    que

    o

    empresrio

    se

    ocupe

    nos

    dois

    primeiros

    dias

    de

    sua

    semanadetrabalhocomafrenteinternadasuabatalhadaacumulaodocapitalqueeletravatodososdiasno interiordesuaempresacomseusempregados.Eque,nosdois seguintes, se preocupe com a frente externa, onde ele se enfrentaperiodicamente, quando h uma conjuno de situaes favorveis na rbita daproduo da sua empresa e da circulao do mercado, do ambientemacroeconmico ,comoutrosempresrios.Eque,noquintoelevesuasprecesaoscusparaquetudodcerto...

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    Atecnologiaeasduasfrentesdebatalhadocapitalista

    Demodoadeixarmaisclaronossapercepoacercadessesdoisespritosedosdoismovimentosqueelesoriginam,vamosseguircomacaricaturarecmtraada

    adicionandoa

    ela

    outra

    metfora:

    a

    das

    frentes

    de

    batalha.

    Comecemospelafrentedebatalhainterna.Paraabordlapoderamospensarque o capitalista, nas segundas e terasfeiras, nela lutaria preocupandose emmaximizar o tempo de trabalho no pagomediante um processo de introduo deconhecimentonaproduocujascaractersticassodeterminadasporesteambientedeenfrentamento.

    Nesta frente, a resistncia que seu adversrio lhe pode opor , ainda quecontnua, fraca (e,comaglobalizao,decrescente).Adicionalmente,ocapitalistaseencontra nesta frente inteiramente protegido pelo contrato social legitimado pelo

    Estado

    que

    garante,

    legitima

    e

    naturaliza

    a

    propriedade

    privada

    dos

    meios

    de

    produoeacompraevendada forade trabalho.Hmuitopouco riscona frenteinterna.Amaiorpartedasvariveisqueinfluemnoxitonestafrentedebatalha,que de natureza ttica, esto sob seu controle, o ambiente em que ela se trava conhecido,suaautoridadeinquestionvel,seusoficiais(engenheirosegerentes)sode inteira confianaepossuemum critriobaseadonuma cinciae tcnica dura,poucosujeitasagrandesincertezas.

    Esse processo de introduo de conhecimento tende, por isso, a serincrementalecontnuo.Seufocotemestadohistoricamenteconcentradonoprocessoprodutivo:nasegmentaoehierarquizaodoprocessodetrabalhoembenefciode

    seumaior

    controle,

    na

    separao

    entre

    as

    tarefas

    de

    produo

    (manuais,

    repetitivas

    e

    crescentementedesprovidasdosaberquenaturalmentepossuram)edeconcepo(intelectuais,criativasereservadasaosengenheirosquesotreinadosparatornarasdemaisaindamaisrepetitivas).

    Seufocotemestadotambmnacadnciadasoperaesatravsdavelocidadeedoritmodasmquinascujaintroduonoprocessodetrabalhossetornoupossvelpela sua prvia segmentao; nos tempos e movimentos; e na incorporao dedispositivos ou sistemas concebidos para, muitas vezes em prejuzo da eficincia,dificultar um boicote do trabalhador direto em situaes em que o clima decooperao no interior do ambiente da produo perturbado por uma crise de

    hegemoniana

    sociedade

    etc.

    Ou,

    mais

    recentemente,

    nas

    mudanas

    na

    organizao

    dotrabalho,nocontrolecontnuoediludodaqualidade,notrabalhoadomiclioetc.Resumindo e retomando o fio da meada: o empresrio, nesta frente, no estariafocadonascaractersticasdoprodutoquefabricaesimnoprocessodesuafabricao.

    Mas sigamos com a caricatura que nos permite, separando analiticamente,entender aqueles dois movimentos ou compulses que traduzem o espritocompetitivodocapitalismoequesujeitamoempresrioatravar,incessantementeesempedirquartel,abatalhadaacumulaodocapital.

    Vejamosoqueocorrenafrenteexternadabatalhadocapitalista.Aquelaaque

    elese

    dedicaria

    nas

    quartas

    e

    quintas

    feiras.

    Ali,

    naqueles

    dias,

    ele

    perscrutaria

    oportunidadesdemercadosuscetveisdeseremexploradasmediantea incorporao

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    deumtipoparticulardeconhecimentoaoprocessodetrabalho;distintodaquelequeusualmentechama suaatenoquandoatuana frente interna.A isso tendeaestarassociada uma manobra no mais de natureza ttica, mas estratgica, e costumaocorrercoma introduodeumnovoprodutonomercado.Umprodutoparaoqualvisualizaumademandapotencialmenteexistenteou,comoocorrecrescentemente,

    passvelde

    ser

    criada

    mediante

    a

    sua

    iniciativa

    junto

    aos

    consumidores

    e

    para

    cuja

    produoseusconcorrentesnoestocapacitados17.

    Nessecaso,seriamaisfreqentedoquenoanterioradecisodeaumentaracapacidadeinstaladadaempresa,implantarnovaslinhasdeproduo,concebernovosequipamentos etc. A introduo de conhecimento, neste caso, tenderia a estarassociadaaumaumentonaproduoe,por isso,aumacirramentodaconcorrnciaintercapitalista.O que no implica quemesmo nomomento em que o empresrioestejafocadonasuafrente internadeixemdeatuarasrestriesassociadasescaladeproduotimasemprecrescenteque temcaracterizadoahistriada tecnologianocapitalismoem funodabuscaporaumentaronmerode trabalhadoresqueomesmoempresriopodecontrolar(eexplorar).

    De fato, elas fazem com que tenda a haver um impulso ao aumento daproduoemanutenodeumnvelrelativamentealtoaindaquevariveldevidoincidncia,inclusive,defatorestecnolgicosdeconcorrnciaintercapitalista.

    Atentativadeobscureceroquesednaprimeirafrenteinterna debatalhaedestacarocartervirtuosodoqueocorrenasegunda,compreensivelmente,umobjetivodaclassecapitalistanasuacontinualutaporreforarasuahegemonia.Issorealizado,inclusive,pelacriaodenovosconceitos,comoodeempreendedorismo,oupelaresignificaodeoutros,comoodeinovao.

    O conceito de inovao foi cunhado no contexto dos pases de capitalismoavanadoparadesignarumconjuntodeatividadesqueenglobadesdeaP&Datasnovas tcnicas de comercializao (passando pela introduo de novosmtodos degesto da fora de trabalho) que tem como objetivomelhorar a condio de umaempresa frente concorrncia intercapitalista e no para promover o "bemestarsocial".

    Uma caracterstica desse contexto possibilitou a expanso semntica doconceito (com certa propriedade, verdade) para englobar uma condio desuperioridade dos atores empresas e pases inovadores. Essa condio de

    superioridadese

    traduzia,

    no

    caso

    de

    uma

    empresa,

    numa

    maior

    lucratividade

    em

    relao ao momento anterior introduo da inovao, visto que a tecnologiasubstitudaproporcionavaaapropriaodeumamenorquantidadede trabalhonopago (maisvalia relativa); e numa maior competitividade em relao a outrasempresas competidoras que, foradas a abandonar o mercado, possibilitavam sinovadoras um aumento ainda maior de sua lucratividade. No caso de um pas,entendido como um agregado de empresas, instituies, e de outras poresmaissignificativasdeoutroagregado,asociedade,quesepassouadenominarparafins

    17Emboranosejaomomentodefazloaqui,seriainteressantepesquisararelaoquepodeexistir

    entreas

    frentes

    interna

    e

    externa

    e

    os

    conceitos

    de

    tecnologia

    de

    processo

    e

    tecnologia

    de

    produto.

    E,

    tambm,aosconceitosdeinovaoincrementaleinovaoradical.

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    deentendimentodoprocesso inovativocomoumSistemaNacionalde Inovao,decompetitividade emrelaoaoexterior.

    no contexto dos pases de capitalismo avanado onde surge o novoparadigma tecnoeconmicobaseadonaeletroeletrnica,que substituiodaeletro

    mecnica,

    onde

    um

    estado

    do

    bem

    estar

    garantia

    um

    nvel

    razovel

    de

    desenvolvimento social, onde o trmino da Guerra Fria acirra a concorrnciaintercapitalistaeondeo crescimentodependiacadavezmaisdasoportunidadesdeexportaoe,portanto,dacompetitividade(entendidaemrelaoaoexterior).Assim,apesardeaexpressoestarhojecadavezmaispresentenoambientedeelaboraodepolticaspblicas latinoamericano, importantenoperderaprecisoconceitualnecessriaparaaatividadedepesquisaemqueestamosengajados.

    Como compreensvel, tambm no contexto daqueles pases que surgeomarco analticoconceitual que temos denominado de Teoria da Inovao paradesignar um conjunto de elaboraes tericas que tem comoobjetivo, descrever e

    explicaros

    fenmenos

    relativos

    relao

    Cincia

    Tecnologia

    Sociedade

    tpicos

    desse

    contexto.Esseconjunto,queaquireferidomaispelosresultadosquesuautilizaoproduz do que pelos conceitos e relaes especficos que engloba tributrio devisescomoasdaEconomiaEvolucionria,daEconomiadaTecnologia,daVisoneoschumpeterianaedaTeoriadoAtorRede.Apesardesuassignificativasdiferenasemrelao a muitos aspectos, essas vises tm em comum um elemento: como compreensivel,elasnocolocamno seucentrodepreocupaes,nemdopontodevista descritivo e explicativo, nem do normativo, onde seu objetivo prescrevermedidas de poltica de C&T que busquem, atravs do aumento da lucratividade ecompetitividadedasempresasedospases,aquestodainovaosocialedosatores

    sociais

    com

    ela

    envolvidos.

    Cabeparticularizar,dentreessesarranjos,odeSistemaNacionalde Inovao;conceito,cunhadonocontextodospasesdonortecomoummodelodescritivodeumarranjosocietaltpicodocapitalismoavanado(maduro).Arranjoemqueumateiadeatores densa e completa gera, no interior de um ambiente sistmico propcioproporcionado pelo Estado, sinais de relevncia que levam ao estabelecimento derelaes virtuosas entre pesquisa e produo, inovao nas empresas e competitividade do pas. E, naquele contexto e com o apoio de mecanismos deproporcionados por um Estado de bemestar bem conhecidos, a uma relativaigualdadeeconmicaesocial.

    Posteriormente,o

    Sistema

    Nacional

    de

    Inovao

    se

    transforma

    num

    modelo

    normativo para que estes pases semelhantes no plano social, econmico,institucional e cientficotecnolgico, e complementares em termos de comrcio orientassem seus governos e grandes empresas em busca da competitividade emrelaoaoexterior.Aquall,novamentecomcertapropriedade,podeserassimiladacompetitividadedasempresasdeumdadopaseumarelativa,aindaquecadavezmaisprecria,distribuiodosganhosdecompetitividadeentreocapitaleotrabalho.

    Algoparecidoocorreu,tambm,nospasesperifricoscomooBrasil.NelessetentoucriarSistemasNacionais(ouLocais)deInovaoembuscadacompetitividade;

    primeiro

    das

    empresas

    e

    dos

    pases,

    depois

    de

    arranjos

    produtivos

    bem

    variados,

    comoos chamados sistemas locaisde inovaoouarranjosprodutivos locais.E isso

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    como se existissem aqui aquelas condies e aquele arranjo societal e como se aassimilao entre as partes (empresas) e o todo (sociedade) fosse aqui legtima (ecomo se o Estado apresentasse aqui as caractersticas de welfare, accountability,participaoetc.,quelpossui).

    Isto

    como

    algo

    a

    ser

    construdo

    mediante

    aes

    planejadas

    de

    responsabilidade de um tipo particular de Estado capaz de promover oestabelecimentoderelaesvirtuosasentrepesquisaeproduoapartirdoseuplomaisdesenvolvido:eestruturapblicadepesquisaedeensinosuperior.Oque,depoisde mais de quinze anos, e por razes estruturais, apontadas h mais de 40 noocorreu.

    Foi assim que conceitos como os de sistema e arranjo, entre tantos outros,passaramaseraquiutilizadosdeumaformaque,epistemologicamentefalando,muitose distancia daquela dos pases avanados. Isto com um sentido francamenteprescritivo(ounormativo)semquehouvessehavido,antes,algumaanlisedescritivo

    explicativaque

    constatasse

    a

    existncia

    de

    algo

    semelhante

    quilo

    que

    se

    pretende

    emular.

    Poressasrazes,odilogo,entreas idiasqueapresentamosnestetrabalho,como a de propor um conceito genrico de tecnologia (ou, se quisssemos, deinovao) comvistasamaterializarcommaispropriedadea idiadeTecnologia (ouInovao) Socialeomarco analticoconceitualda Teoriada Inovaono tem sidofcil.AscaractersticasdosfenmenosdarelaoCinciaTecnologiaSociedadequesequer explicar, dos atores envolvidos, da orientao que se quer a eles imprimir e,numapalavra,daopo ideolgica inerenteaoconceitode inovao social, tendealimitar a sua simples transposio para o campo que ela privilegia. At mesmo a

    utilizaode

    alguns

    de

    seus

    conceitos

    chave

    e

    das

    relaes

    e

    modelos

    que

    prope

    (aindaqueemmenorgrau)bastantecomplicada.

    No nos parece possvel, portanto, uma simples adaptao da Teoria daInovaoaocampodaInovaoSocial.Parecesernecessrioum"giroconceitual"damagnitudedoquetemospropostoaocunhareutilizaraexpressoinovaosocial(ouaquesetornoumaisconhecidaemnossomeio,deTecnologiaSocial).Eledeveincluira crtica ao prprio conceito de "inovao" freqentemente utilizado de mododescontextualizadopelosque adotam a Teoriada Inovaopara abordaro casodepasesperifricoscomoonosso.Paraproporsoluestecnolgicasvisandoinclusosocial, e por isto que este trabalho foi elaborado, parece ser necessria umaprofunda

    reviso

    acerca

    de

    conceitos

    como

    tecnologia

    e

    inovao.

    Uma

    reviso

    que

    tenhacomocentroacompreensodasrelaessociaisqueseencontramnaraizdoqueatualmentesealudecomessesconceitos. sapartirdeum "giroconceitual"como aquele que este trabalho pretende que ser possvel incorporar aomarcoanalticoconceitual que ele ir conformando os conceitos, relaes e modelosprovenientesdaTeoriadaInovaoquesemostraremteisparaaquelepropsito.

    Outro termo hoje maciamente utilizado no ambiente da elaborao daspolticas de C&T orientadas a estimular os empresrios a inovar e a se tornarem

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    competitivos,schumpeterianosodeempreendedorismo18.Tambmeletendeaobscureceraprimeira frente interna debatalha.Dseaentenderqueapenasosnoempreendedores perdem em funo da operao do mecanismo dinmico deintroduodoconhecimentonaproduo,quandonarealidade,podenosertravadanenhuma escaramua na frente externa. E que no h, entreos trabalhadores que

    combatemna

    frente

    interna,

    quem

    perca

    com

    isso.

    Na realidade, como se sabe,estaperda costuma se verificarempelomenosquatro mbitos. Primeiro, porque as inovaes tendem a intensificar o ritmo daproduo, causar maior tenso, acidentes e doenas e exigir do trabalhadorhabilidadesqueeleatentonopossua.Segundo,porquetendemadiminuirpostosde trabalho gerando um desemprego localizado cada vez mais difcil de sercompensadoemoutrasatividadeseconmicasderemuneraosemelhante.Terceiro,porquenumasituaoemqueodesempregodeixadeserconjuntural,osalriotendea ser comprimido.Quarto, porqueos empresrios quedeixamde produzir por noseremcompetitivosdespedemseusempregados.

    VoltandoporummomentoHistria,sepodeentendercomoumaatividadequeocorreuemtodasassociedadesoempregodoconhecimentoparaaumentaraprodutividadedoprocessode trabalhopassaa serorientadaparauma finalidadeadicional,adeaumentarolucrodoproprietriodosmeiosdeproduoe,emfunodascaractersticasdocapitalismopassaaincorporarcaractersticasdistintivas.

    Amaterializaodeumaidealizaocriadapelocapitalismo osurgimentodeumaesferadomercado,sobreaqualatuapreferentementeaempresaprivada,eumaesferapblica,ondesemanifestaopoderdoEstadocapitalista fazcomque,entremuitasoutras,aatividadedeproduodeconhecimentosecentralizeaindamaisna

    rbitado

    Estado

    e

    seus

    apndices

    (como

    a

    Escola,

    por

    exemplo).

    Assim

    como

    sua

    difusoparaossetoresdasociedadequedeveriamdeleseapropriar,aproduodeconhecimento passou cada vez mais a fazer parte do conjunto de atividades queproporcionavamaospasesacompetitividadesistmicaqueacompetioentreelesdemandava. Sua relativa inapropriabilidade e indivisibilidade fizeram do apoio produodoconhecimentonecessrioproduodebenseserviosumafunodoEstadocapitalista.Eporser,neste tipodesociedade,atribuiodaempresaprivadaessa produo de bens e servios, foi para atender s suas necessidades que esseapoiofoidirecionado.

    natural,portanto,queoEstadocapitalista,cujafunoprimordialutilizarosrecursos

    de

    poder

    que

    concentra

    para

    garantir

    a

    reproduo

    da

    relao

    de

    subordinao que lhe d origem e sentido, oriente o desenvolvimento deconhecimento cientfico e tecnolgico (que como aquele conhecimento que sedestina a ser introduzido no processo de produo de mercadorias passou a serconhecido),nasua formadesincorporada,e incorporadaempessoas,paraatender

    18 A idia em voga de que temos que produzir empresrios schumpeterianos..." soaria para

    Schumpeter (1988) como uma heresia. Para ele, o empresrio (schumpeteriano) seria amaterializao de umprocesso social que ocorre concomitantemente (epormeioda) geraodeinovaes.Ou seja, nenhum empresrio poder ser, em sua prpria essncia, schumpeteriano. a

    empresa,no

    o

    indivduo,

    que

    pode

    estar

    schumpeteriana

    quando

    introduz

    no

    mercado

    uma

    inovaoradical;edeixardesloquandoosefeitosdessainovaosedissiparem.

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    empresaprivada.Oempresrio,aoempregaresseconhecimentoparaaumentaroseulucro estar cumprido sua funo social. Ao repassar parte dele para osconsumidoresbarateando seuprodutoe, atendendoamaiordemanda causadaporestefatorepelaexpulsodosnoinovadores,criar,aindaquenumaproporomenordoaumentodaproduo,novospostosdetrabalho,estarfechandoocrculovirtuoso

    docapital.

    Nele,

    se

    supe

    que

    o

    Estado,

    mediante

    a

    cobrana

    de

    impostos,

    poder

    reverter, mediante mecanismos redistributivos (que incluem o apoio gerao edifuso de conhecimento), a tendncia concentrao de riqueza inerente aocapitalismo.

    Naverdade,nosdiasquecorrem,opapeldasinstituiespblicasnageraode conhecimentopassvelde serapropriadopelaempresaprivadadecrescente.Aempresa , atualmente, responsvel por 70% de toda a pesquisa que se realiza nomundo. Sendo que, desses, 70% realizada por empresas multinacionais (o que,fazendo as contas, aponta que 50% da pesquisa mundial realizada pelasmultinacionais).Emboraimpactantesparaosqueacompanhamaevoluodosgastosem C&T do psguerra, essas cifras no surpreendem aqueles que aceitam aconcepo da inovao aqui proposta. Eles no precisam do trusmoneoschumpeteriano de que a empresa o lcus da inovao para perceber atendnciadocapitalismocontemporneodesubmetercadavezmaisaproduodoconhecimentolgicadaacumulao.

    Sobreanecessidadedeumaabordagemnocapitalista

    Estaseo

    se

    inicia

    explorando

    um

    desses

    obstculos

    que

    hoje

    se

    colocam

    ao

    movimento da TS relacionado ainda escassa compreenso por parte dos atoresenvolvidoscomaES,oumaisamplamente,comconstruodeumaOutraEconomiasobreopapelquepodeassumiraTSnesseprocesso.Papelquenumprimeironvelmaisconcretoe imediatoasituacomoelementoviabilizadordassustentabilidades(econmica, social, poltica e cultura) dos ESs. Num segundo, como um elementoarticulador,pelaviadofortalecimentodaES,deformasdeproduoeorganizaodasociedadepervasivas,alternativasquelasengendradaspelocapital.E,num terceironvel,maisabrangenteede longoprazo,comooncleodo substratocognitivoquedevertomarolugardaTecnocincia,quehojeamalgamaegalvanizaainfraestrutura

    econmicoprodutiva

    e

    a

    superestrutura

    poltico

    ideolgica

    do

    capitalismo,

    no

    cenrio

    emconstruodaOutraEconomia.

    Emfavordabrevidade,sertratadoapenasofatodequenemaqueleprimeironvelfoialcanado.Oquepodeseravaliadopelaquasecompletaausnciadotemanaproduo bibliogrfica dos autores do campo da ES. Os quais interrompem suapreocupao com a rbita da produo nas questes relativas gesto dosempreendimentos e organizao do processo de trabalho sem perceber ainadequaodoconjuntodeaspectosdaTC (inclusiveasuadimensodehardware)como um obstculo sustentabilidade dos ESs.O que parece resultar de uma noassimilao da crtica contempornea viso neutra e determinista do marxismo

    ortodoxoacima

    aludida

    (DAGNINO;

    NOVAES,

    2007).

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    Ofatodequeessasituaopossaseratribudaaumanoassimilaodacrticaformuladanosanosde1970pormaostasetrotskistas(GORZ,1996;CORIAT,1976)forma como o marxismo ortodoxo e o socialismo real entendiam a tecnologiacapitalista (aqual ficou soterradapeloavanodoneoliberalismoeosescombrosdomurodeBerlim),chamaaatenoparaanecessidadedeumaprofundamentoterico

    sobreo

    tema.

    Evidnciadissodescompassoentrea reflexo terica,ea radicalidadecomqueotemavemsendodiscutidoeaatuaoconcretadosatorescomeleenvolvidosnabuscadesoluesparaosproblemasquesecolocamnombitodosESs.

    OrientardemodoeficazasaesatinentespromoodaTS,noplanodaspolticas pblicas, e no plano cognitivo do seu desenvolvimento, supe alterar aestratgia que tem sido adotada at agora. A qual parte das implicaes sociais,econmicas, polticas, ambientais etc negativas da TC buscando por excluso ounegao o desenvolvimento da TS; uma tecnologia que no determine estas

    implicaes.Ou

    seja,

    buscando

    o

    desenvolvimento

    de

    algo

    que

    no

    aquilo

    que

    no

    queremos.

    Concebendoumanovaabordagem

    Temse procurado, nesse sentido, e ainda que sem abandonar a idia deconstruodeumautopiaquecaracterizaomovimentodaTS,adotarumaestratgiaquevnosentidoinverso.Paratantoseestformulandoadhocumaabordagemque ao mesmo tempo genrica, dado que permite o entendimento de qualquer

    tecnologia,e

    especfica,

    na

    medida

    em

    que

    est

    alinhada

    com

    os

    princpios

    da

    TS.

    Por

    isso, ela no se preocupa em explicar a dinmica da inovao (ou tecnologia) deproduto,eoconceitoqueproporcionaselimitaaocasodainovaodeprocesso,quemaisinteressaaocampodaTS.

    Ela parte da considerao do processo de trabalho em que se envolvem ossereshumanosnoambientedaproduodebenseservios,quepermitaderivarascaractersticasquedeveassumir a formadeproduzirpara tornarse funcionalaumcontextosocioeconmicoespecficoeaoacordosocialqueeleengendra.

    Depoisdeexplicaraabordagememostrarqueelaexplicaascaractersticasda

    TCa

    partir

    do

    contexto

    socioeconmico

    capitalista,

    se

    expe

    um

    procedimento

    inverso

    quele proposto pela trajetria at agora seguida, indicando as caractersticas quedeveriateraTSparatornarsefuncionalNovaEconomia.

    Oquadroeodiagramaapresentadosadiante ilustram,partindodoambienteprodutivo,oseuprimeiroemaisimportanteelemento:ocontrole.Entendidocomoahabilidaderelativaaousodeumconhecimento intangvelou incorporadoaartefatostecnolgicos, ele uma caracterstica inerente a qualquer processo de trabalho.Osegundo,tambmpertencenteaoambienteprodutivo,odecooperao(atodeagiremconjuntocomoutro(s)visandoaumbenefciopercebidocomomtuo),verificadoemprocessosdetrabalhogrupais.Oterceiro,relativoaocontratosocialengendrado

    porum

    dado

    contexto

    socioeconmico,

    o

    de

    coero

    (ato

    de

    compelir

    algum

    a

    uma

    ao ou escolha diretamente ou por meio de mecanismos ideolgicos). O quarto,

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    pertencenteaessecontexto,aformadepropriedadedosmeiosdeproduooudotrabalho morto (a qual, nos processos de trabalho grupais pode ser coletiva ouprivada,resultando,nestecaso,navendadeforadetrabalhooutrabalhovivo).

    Formulandoum

    conceito

    genrico

    de

    tecnologia

    Aabordagemconduzaumconceitogenricodetecnologiaoqual,aindaqueheterodoxoequasehertico,permiteentendlademodomaiscoerentecomaidiadeTS.

    Convm iniciarconceituandotecnologiacomooresultadodaaodeumatorsocialsobreumprocessodetrabalhonoqual,emgeral,atuamtambmoutrosatoressociaisqueserelacionamcomartefatostecnolgicosvisandoproduo.E, levandoemcontaapenasa formadepropriedade, isto,comoamodificaonoproduto

    apropriadapelo

    ator

    social,

    pode

    se

    ampliar

    o

    conceito

    dizendo

    que

    tecnologia

    o

    resultado da ao de um ator sobre um processo de trabalho que permite umamodificao (qualitativaouquantitativa)noproduto (nosentidogenricodeoutput)geradopassveldeserapropriadasegundooseuinteresse.

    Apenas para esclarecer o conceito, vale a pena apresentar uma primeiratentativa de diferenciar TC e TS. Ela levaria a um entendimento da TC como oresultado da ao do empresrio sobre um processo de trabalho que permite umamodificaonovalordetrocadoproduto(oudaproduo)geradopassveldeserporeleapropriada(sobaformademaisvaliarelativa).Modificaoestaquepodeseremtermosdequantidade(medianteaintroduodoqueseconhececomotecnologiade

    processo)ou

    de

    qualidade

    (mediante

    a

    introduo

    do

    que

    se

    conhece

    como

    tecnologia

    deproduto).

    E, a TS, como o resultado da ao de um coletivo de produtores sobre umprocessodetrabalhoquepermiteumamodificaonoprodutogeradopassveldeserapropriadasegundoadecisodocoletivo.

    Demodoa sofisticaraanliseparachegaraum conceitomaisadequadoaopropsitodestaabordagemconveniente levaremcontaaspectosdos trsespaosou ambientes em que est inserido o ator social que atua sobre o processo detrabalho.

    NaprimeiralinhadoQuadro1estoostrsambientes,decujaspeculiaridadesresultariam os tipos de tecnologia.Na segunda, os quatro elementos, ou variveis,adstritosaessesespaos.Naprimeiracolunaosatores tpicos (um individuale trsgrupais)dasquatrosituaesqueseaborda.Oquadroresumecomopossvel,emcada umadasquatro situaes,derivar as caractersticasda tecnologia apartirdosvaloresatribudosacadaumadasvariveis.

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    contextosocioeconmico

    contratosocial ambientedeproduoAtorquecontrolaoprocessodetrabalho

    Formadepropriedade

    Coero Controle Cooperao

    Produtor

    direto

    individual

    Coletivodeprodutores

    coletiva associativismo autogesto voluntriaparticipativa

    Senhordeescravos

    privada fsica,pelosproprietriosdosmeiosdeproduo

    coercitivodireto

    forada

    Compradorde

    forade

    trabalho

    privada ideolgica,

    peloEstado

    imposto

    assimtrico

    taylorismo,

    toyotismo

    Quadro1.Aspectosdostrsespaosouambientesemqueestinseridooatorsocialqueatuasobreoprocessodetrabalho.

    Fonte:elaboraoprpria.

    A forma de propriedade dosmeios de produo no a responsvel diretapelascaractersticasdaTC.Elaumelementoexgenoaoambienteprodutivoe,por

    isso,no

    capaz

    de

    determinar

    diretamente

    as

    variveis

    de

    controle

    e

    cooperao

    que

    soasqueefetivamentedefinemestascaractersticas.Issoficaclarocomparamos,porexemplo,osmodosdeproduoescravistaoufeudalcomocapitalista.Emtodoseles,a propriedade dos meios de produo privada. No obstante, o modo como sedesenvolveaproduonoambienteprodutivoconsideravelmentediferente.Entreoutrascoisas,eprincipalmente,pelaimpossibilidadedeque,nocapitalismo,existaalia violncia fsica que caracteriza, sobretudo, o escravismo. O que explica essadiferena a forma como se apresentamas relaesentreEstadoe sociedadequeenvolveepermeiamoambienteprodutivo.Ou,emoutraspalavras,otipodecontratosocialque essas relaes estabelecem e legitimam. Existe, ento,uma categoriade

    mediao

    entre

    a

    varivel

    forma

    de

    propriedade

    (adstrita

    ao

    contexto

    scio

    econmico)easvariveiscontroleecooperao(adstritasaoambienteprodutivo)avarivel coero (adstrita ao contrato social) que tambm responsvel peladeterminaodascaractersticasdatecnologia.

    Aconsideraodessesaspectoslevaaentenderatecnologiacomooresultadodaaodeumatorsocialsobreumprocessodetrabalhoqueelecontrolaeque,emfuno das caractersticas do contexto socioeconmico, do acordo social, e doambiente produtivo emque ele atua,permite umamodificaonoproduto geradopassveldeserapropriadasegundooseuinteresse.

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    Particularizandooconceitogenrico:aTecnologiaCapitalista

    Apresentado o que denominamos de conceito genrico de tecnologia convenientecontrastlocomusualmenteencontradoparamostraraconveninciade

    suaadoo.

    Tanto

    na

    literatura

    especializada

    quanto

    nos

    dicionrios,

    a

    tecnologia

    entendida como a capacidade originada pela aplicao prtica de conhecimentomtodos, materiais, ferramentas, mquinas e processos para combinar recursosvisandoaproduzirprodutosdesejadosdemodomaisrpidoouemmaiorquantidadeouaindaproporcionandoumprodutomaisbaratoecommaiorqualidade.

    O conceito de tecnologia aqui proposto se diferencia do usualmenteencontradoemvriossentidos.Emprimeiro lugarporqueestenoserefereaoatorquemodifica o processo de trabalho e, por isso, no deixa claro que se ele no ocontrola (no sentido tcnico,do ambienteprodutivo)nohaver comoefetivar aintroduodeconhecimento;pormaisinteressante,novo,atrativo,oucientficoque

    eleseja.

    Em

    segundo,

    porque

    o

    conceito

    usual

    implicitamente

    supe

    que

    qualquer

    conhecimento que permita uma modificao no produto gerado (um aumento naquantidade de produto gerado durante certo tempo, por exemplo) poder serutilizadopeloatorquecontrolaoprocessodetrabalho,enquantoqueaquelepeemevidnciao fato de que isso ir ocorrer somente se o ator tiver a possibilidade deapropriarsedo resultadodestamodificao (quantitativaouqualitativa)noprodutogeradosegundooseuprpriointeresse.

    Em terceiro lugar porque chama a ateno para o fato de que essapossibilidade facultada por um acordo social que legitima certa forma depropriedade.Equeseesteacordodeixardeexistir,aindaqueoatorsigacontrolandooprocessode trabalho,eleno ter interesseem introduzirconhecimentonovonoambienteprodutivo.

    fcilperceber,comparandooconceitogenricoapresentadocomousualetendoemcontaasconsideraesacimacomoesteltimo,explcitaouimplicitamente por omisso , abstrai o contexto capitalista que o envolve e d sentido. Essacaracterstica, comobem sabida,comumamuitosoutrosconceitosdas cinciassociais e tambm das cincias duras que, por terem sido definidos sob a gide docapitalismo no fazem a ele referncia. E, nestamedida, propositalmente ou no,emprestamaelesumestatutodeuniversalidadeeatemporalidadequemascaraseu

    carterde

    construes

    histrico

    sociais.

    Odiagrama (Figura1)quesegueapresentaoutravisualizaodaabordagem,agora particularizada para a tecnologia capitalista (ou TC). Ele evidencia que apropriedade privada dos meios de produo no a responsvel direta pelascaractersticasdaTC.Elaumelementoexgenoaoambienteprodutivoe,por isso,no capaz de determinar as variveis de controle e cooperao que so as queefetivamentedefinemestascaractersticas.

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    Figura1.Caractersticasdatecnologiacapitalista.

    Fonte:elaboraoprpria.

    Estes, por sua vez, implicam uma forma de cooperao que preside aconcepoeutilizaodaTC.Tecnologiaqueeestaaquestocentralqueinteressadesdeo incioressaltarpodeguardarconsigoessestiposdecontroleecooperaomesmoquandodeixedeexistiraqueleelementoexgeno.

    Talvez

    o

    resultado

    mais

    importante

    dessa

    tentativa

    de

    entender

    as

    especificidades da tecnologia capitalista seja a proposio de que aquilo quecaracterizaaTCnoapropriedadeprivadadosmeiosdeproduoesimotipodecontrole que esta determinaou faculta. Situar a propriedadeprivadadosmeios deproduocomoumelementoexgenoaoambienteprodutivo,quecondicionaotipode acordo social necessrio para que exista a cooperao para a produo (quequalquer configurao do processo de trabalho demanda), possibilita entender ascaractersticasdotipoespecficodecontroleque irpresidiraconcepoeutilizaoda tecnologia capitalista.Tecnologiaqueeestaaquesto centralque interessadesde o incio ressaltar para avanar com as questes relacionadas TS podeguardar consigo esse tipo controle mesmo quando deixe de existir esse elementoexgeno.

    Em termosconceituais,aparticularizaodoconceitogenricode tecnologiaparao contexto scioeconmicocapitalista leva seguintedefiniodeTC.Elaoresultadodaaodoempresriosobreumprocessode trabalhoque,em funodeum contexto socioeconmico (que engendra a propriedade privada dos meios deproduo)edeumacordo social (que legitimaumacoero ideolgicapormeiodoEstado)queensejam,noambienteprodutivo,umcontrole (impostoeassimtrico)eumacooperao(detipotayloristaoutoyotista),permiteumamodificaonoprodutogeradopassveldeserporeleapropriada.

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    Particularizandooconceitogenrico:aTS

    De maneira anloga, a TS seria o resultado da ao de um coletivo deprodutores sobre um processo de trabalho que, em funo de um contexto

    socioeconmico(que

    engendra

    a

    propriedade

    coletiva

    dos

    meios

    de

    produo)

    e

    de

    umacordosocial(quelegitimaoassociativismo)queensejam,noambienteprodutivo,umcontrole (autogestionrio)eumacooperao (de tipovoluntrioeparticipativo),permite umamodificao no produto gerado passvel de ser apropriada segundo adecisodocoletivo.

    A comparao das duas definies, tornada possvel pela abordagemdesenvolvidaevidenciaoqueestapossuideoriginalepromissor.Isto,aidiadequeocontroleumatributo inerenteaqualquerformadeproduzir,formulaoquenospermite avanar no desvelamento daquilo que qualificamos como uma espcie dehisteresequeenvolveriaa tecnologia.Ela coerente comaobservaodequeno

    basta,para

    construir

    formas

    solidrias

    de

    produo,

    a

    abolio

    da

    propriedade

    privada

    dosmeios de produo.O (tipo de) controle que o acordo social que esta relaosocial (a propriedade privada) impe fica impregnado na forma de produzir(tecnologia)capitalistaefuncionacomumobstculomudanasocial.Aconsideraodessecontrolepossuiumacentralidadedesproporcionalpouca importnciaqueeletematagoramerecido.

    ConsideraesFinais

    Apresentado o que denominamos de conceito genrico de tecnologia convenientecontrastlocomusualmenteencontradoparamostraraconveninciadesuaadoo. Tantona literaturaespecializadaquantonosdicionrios,a tecnologiaentendida como a capacidade originada pela aplicao prtica de conhecimentomtodos, materiais, ferramentas, mquinas e processos para combinar recursosvisandoaproduzirprodutosdesejadosdemodomaisrpidoouemmaiorquantidadeouaindaproporcionandoumprodutomaisbaratoecommaiorqualidade.

    O conceito de tecnologia aqui proposto se diferencia do usualmenteencontradoemvriossentidos.Emprimeiro lugarporqueestenoserefereaoator

    quemodifica

    o

    processo

    de

    trabalho

    e,

    por

    isso,

    no

    deixa

    claro

    que

    se

    ele

    no

    o

    controla (no sentido tcnico,do ambienteprodutivo)nohaver comoefetivar aintroduodeconhecimento;pormaisinteressante,novo,atrativo,oucientficoqueele seja. Em segundo, porque o conceito usual implicitamente supe que qualquerconhecimento que permita aumentar a quantidade de produto gerado durante otempo a ele dedicado poder ser utilizado pelo ator que controla o processo detrabalho, enquanto que aquele pe em evidncia o fato de que isso ir ocorrersomenteseoatortiverapossibilidadededividiraproduoresultantedeacordocomseu interesse. Em terceiro lugar porque chama a ateno para o fato de que essapossibilidade facultada por um acordo social que legitima certa forma de

    propriedade.E

    que

    se

    este

    acordo

    deixar

    de

    existir,

    ainda

    que

    o

    ator

    siga

    controlando

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    oprocesso de trabalhoeleno ter interesseem introduzir conhecimentonovonoambienteprodutivo.

    fcilperceber,comparandooconceitogenricoapresentadocomousualetendoemcontaasconsideraesacimacomoesteltimo,explcitaouimplicitamente

    por

    omisso

    ,

    abstrai

    o

    contexto

    capitalista

    que

    o

    envolve

    e

    d

    sentido.

    Essa

    caracterstica, comobem sabido,comumamuitosoutrosconceitosdascinciassociais e tambm das cincias duras que, por terem sido definidos sob a gide docapitalismo no fazem a ele referncia. E, nestamedida, propositalmente ou no,emprestamaelesumestatutodeuniversalidadeeatemporalidadequemascaraseucarterdeconstrueshistricosociais.

    Apenas para esclarecer o conceito, vale a pena apresentar uma primeiratentativa de diferenciar TC e TS. Ela levaria a um entendimento da TC como oresultado da ao do empresrio sobre um processo de trabalho que permite umamodificaonovalordetrocadoproduto(oudaproduo)geradopassveldeserpor

    eleapropriada

    (sob

    a

    forma

    de

    mais

    valia

    relativa).

    Modificao

    esta

    que

    pode

    ser

    em

    termosdequantidade(medianteaintroduodoqueseconhececomotecnologiadeprocesso)oudequalidade(medianteaintroduodoqueseconhececomotecnologiadeproduto).

    Partindodo conceitogenricode tecnologia,entendida comoo resultadodaaodeumatorsocialsobreumprocessodetrabalhoquepermiteumamodificaono produto gerado passvel de ser apropriada segundo o seu interesse, chegamosinicialmenteaumconceitodeTCquecolocavaemevidnciaaidiadequeumapartedo valordessamodificaopudesse serporeleapropriada.Noteseque seexcluiapossibilidadedequeumatorquenocontrolaoprocessode trabalhooprodutor

    direto,no

    caso

    da

    TC

    venha

    a

    modific

    lo,

    uma

    vez

    que

    a

    ao

    concreta,

    independentementedesuainteno,nopodesertomadaporele.

    Ascaractersticasqueassumeatecnologiaeoprocessodetrabalhodependemda forma como se verifica a propriedade dos dois elementoschave da produo:trabalhomortoe trabalho vivo.Quandoambos sodepropriedadedomesmoatorsocial,oaumentodoexcedentegeradoserapropriadoporesteator(caso1).Quandoa produo se verifica mediante a intervenincia de dois atores sendo cada umproprietrio de um dos elementos, o aumento do produto gerado em funo daincorporaodatecnologiaserapropriadosegundoumaproporoquedependedoseupoderpolticorelativo(caso2).

    Uma situao hipottica como a do caso 1 resultaria numa tecnologia comcaractersticas qualitativas e quantitativas de combinao de trabalho morto etrabalho vivo cuja determinao dependeria da vontade exclusiva (valores einteresses)doatorproprietriodesseselementos.

    Se a partir dessa situao e com o surgimento de um segundo ator, fosseaparecendo uma separao da propriedade desses elementos (caso 2), ascaractersticasdesuacombinao (tecnologia)passariaadependerdacorrelaodeforasexistenteentreseusproprietrios.E,porisso,daevoluohistricadocontextopoltico,socialeeconmicoemquesedaproduo.

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    Otrnsitodocaso1paraocaso2envolveriaumprocessorealimentadoacadaciclodeproduodeadaptaodatecnologia (combinaoqualitativaequantitativados elementos da produo) nova estrutura de propriedade. Completado essetrnsito, o proprietrio do trabalho morto (mquinas e matriaprima) passaria acontratar trabalho vivo (fora de trabalho) e a organizao do processo produtivo,

    assimcomo

    a

    tecnologia

    incorporada

    a

    este,

    obedecer

    aos

    seus

    interesses

    de

    apropriaodoexcedenteproduzido.EstaseraTecnologiaConvencional.

    Para abordar a questo que nos interessa mais de perto, relacionada spossveis alternativas tecnol