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Relatório Final de Estágio Mestrado Integrado em Medicina Veterinária EXAME ANDROLÓGICO EM BOVINOS- UTILIZAÇÃO DA ULTRASSONOGRAFIA NO DESPISTE DE PATOLOGIAS Rita Oliveira Gama Soares Orientador Professora Dra. Carla Maria Proença Noia de Mendonça Coorientadores Dr. Dário Guerreiro Dr. Rui Silva Porto 2020

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Relatório Final de Estágio

Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

EXAME ANDROLÓGICO EM BOVINOS- UTILIZAÇÃO DA

ULTRASSONOGRAFIA NO DESPISTE DE PATOLOGIAS

Rita Oliveira Gama Soares

Orientador

Professora Dra. Carla Maria Proença Noia de Mendonça

Coorientadores

Dr. Dário Guerreiro

Dr. Rui Silva

Porto 2020

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Relatório Final de Estágio

Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

EXAME ANDROLÓGICO EM BOVINOS- UTILIZAÇÃO DA

ULTRASSONOGRAFIA NO DESPISTE DE PATOLOGIAS

Rita Oliveira Gama Soares

Orientador

Professora Dra. Carla Maria Proença Noia de Mendonça

Coorientadores

Dr. Dário Guerreiro

Dr. Rui Silva

Porto 2020

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Resumo

Este relatório resulta do estágio oficial do Mestrado Integrado em Medicina Veterinária,

desenvolvido na área de medicina e cirurgia de espécies pecuárias e tem como objetivo a

discussão e descrição de exames andrológicos em touros de cobrição e a utilização da

ultrassonografia no despiste de patologias andrológicas.

O estágio foi realizado sob coorientação de médicos veterinários da área de espécies

pecuárias, o Dr. Dário Guerreiro e Dr. Rui Silva. Com estes dois clínicos tive a oportunidade de

seguir diversos casos clínicos de diferentes espécies pecuárias, no entanto, decidi escrever

acerca do exame andrológico e utilização de ultrassonografia no despiste de patologias, visto

tratar-se um tema pouco abordado em ambiente de formação académica e com grande

relevância na eficiência reprodutiva de explorações de bovinos de carne. Foram recolhidos os

dados de seis exames andrológicos realizados ao longo de dezasseis semanas de estágio na

região da Estremadura/ Baixo Alentejo e Costa Vicentina a touros de carne para a sua avaliação

como reprodutores.

O estágio permitiu-me desenvolver o raciocínio clínico, pôr em prática os conhecimentos

teóricos adquiridos durante a formação académica, adquirir competências técnicas sólidas na

execução de técnicas cirúrgicas, estimular a autonomia e responsabilidade perante diferentes

situações clínicas no campo e consolidar os conhecimentos de maneio de animais de espécies

pecuárias. Também contribuiu para melhorar a capacidade de trabalhar em equipa e desenvolver

atributos e competências interpessoais.

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Agradecimentos

Após 6 anos de estudo e trabalho, um obrigada a todos os que me acompanharam e que

de certa forma me ajudaram a terminar o curso.

À Prof. Doutora Carla Mendonça, por me ter aceite como sua orientanda, pela

disponibilidade, ajuda, apoio e por me ter aconselhado bem em relação aos locais de estágio.

Ao Dr. Rui Silva, por toda a partilha de conhecimentos, pelas técnicas de maneio, pelos

desafios, pelos conselhos e por toda a paciência que teve para comigo. Um especial obrigado

pela contribuição e partilha de material para que este relatório de estágio fosse possível.

Ao Dr. Dário Guerreiro por me ter aceite como sua estagiária e por me ter integrado numa

equipa fantástica, pelo conhecimento e por me ter transmitido que podemos ter hobbies e

trabalhar como veterinário de campo ao mesmo tempo.

Ao Dr. André Parada, pelo conhecimento, pelos conselhos, pelos momentos de

descontração e pela amizade.

A todos os professores do ICBAS, pela formação que recebi.

Às minhas colegas de estágio, Ana Filipa, Ana B., Nathalya e Marina, pela ajuda, partilha

de impressões, amizade e momentos únicos.

Aos meus amigos da faculdade, em especial à Inês F., Marta, Sofia, Catarina J., Catarina

C., Inês M., Francisco, Aline e Mariana, pelo companheirismo, apoio e diversão ao longo destes

6 anos.

Aos meus melhores amigos, Mariana, Janice, Bárbara, Diogo e Lígia, por caminharem a

meu lado desde sempre.

Ao Tiago, pelo carinho e apoio incondicional.

Por último e com maior destaque, à minha família. À minha irmã, pela paciência, pela

ajuda, pelos conselhos, pela hospitalidade, pelo carinho e pela transmissão de valores. À Inês,

por tornar tudo mais fácil. À Tina, por acreditar em mim. Ao Carlos, por transformar tudo numa

comédia. Aos meus pais, porque tudo.

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Índice

CASUÍSTICA ...................................................................................................................................1

EXAME ANDROLÓGICO EM BOVINOS- UTILIZAÇÃO DA ULTRASSONOGRAFIA NO

DESPISTE DE PATOLOGIAS ........................................................................................................5

Introdução ...................................................................................................................................5

Exame andrológico ....................................................................................................................5

Importância do exame andrológico em bovinos ...................................................................6

Critérios do exame andrológico em bovinos .........................................................................7

Avaliação da líbido e capacidade de cópula ...........................................................................7

Exame físico geral ....................................................................................................................7

Exame dos órgãos genitais externos e internos .....................................................................8

Recolha e análise de sémen ..................................................................................................10

Utilização do ecógrafo ............................................................................................................14

Exame ecográfico normal do aparelho reprodutor masculino de bovinos ......................14

Patologias diagnosticadas através da ultrassonografia do aparelho reprodutor

masculino do bovino ...............................................................................................................19

Anomalias testiculares ...........................................................................................................19

Anomalias do escroto e cordão espermático ........................................................................21

Anomalias penianas ...............................................................................................................22

Anomalias das glândulas acessórias anexas ........................................................................22

CASOS CLÍNICOS OBSERVADOS.............................................................................................23

Objetivos ...................................................................................................................................23

Materiais e Métodos ................................................................................................................23

Resultados ................................................................................................................................25

Discussão .................................................................................................................................26

CONCLUSÃO ................................................................................................................................28

BIBLIOGRAFIA .............................................................................................................................29

ANEXOS ........................................................................................................................................31

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Índice de Abreviaturas

ADS Agrupamento de Defesa Sanitária

Aprox. Aproximadamente

IBR Rinotraqueíte Infeciosa Bovina

BVD Diarreia Viral Bovina

DAE Deslocamento de abomaso à esquerda

DAD Deslocamento de abomaso à direita

DHPPI+L Esgana, Adenovirus, Parvovirus, Parainfluenza, Leptospirose

X Cruzado

C.C. Condição Corporal

Mob. Mobilidade

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Índice de Gráficos

Gráfico 1 – Casuística de cirurgia, controlo reprodutivo, clínica e sanidade desenvolvida durante

o período de 02/09/2019 a 25/10/2019 na Sá Guerreiro, Lda…………….……………………...….1

Gráfico 2- Casuística de cirurgia, controlo reprodutivo, clínica e sanidade desenvolvida durante

o período de 28/10/2019 a 20/12/2019 com o Dr. Rui Silva………………………..……..……….…3

Índice de Tabelas

Tabela 1- Resumo de procedimentos realizados na Sá Guerreiro, Lda………………………..….1

Tabela 2- Resumo de procedimentos realizados com o Dr. Rui Silva…………………………..…3

Tabela 3 - Valores mínimos do perímetro escrotal consoante a idade dos touros, segundo a

Society for Theriogenology,USA…………………………………………………………………….….8

Tabela 4 - Dados dos touros que foram submetidos a exames andrológicos durante o meu

período de estágio………………………………………………………………………………………25

Índice de Figuras

Figura 1-Medição do perímetro escrotal……………………………………………..……………..….9

Figura 2- Glândulas sexuais anexas……………..…….…………………………………………...…10

Figura 3- Eletroejaculador no interior do ânus….…………………………………………...……....11

Figura 4- Recolha do ejaculado…..………………….……………………………………..……….…11

Figura 5- Avaliação da mobilidade individual.…………….………..…………………………….…..13

Figura 6- Ultrassonografia caudal de testículos de um touro.….………….………….……………15

Figura 7- Imagem de corte longitudinal do testículo esquerdo.……………………..……………..16

Figura 8- Ultrassonografia da cauda do epidídimo.………………………………………….……….16

Figura 9- Ultrassonografia da cabeça do epidídimo.…………………………………..……...….….17

Figura 10- Imagem de corte longitudinal da próstata……………..…………………….….………..18

Figura 11- Imagem de corte transversal da vesícula seminal..….………………………………..…19

Figura 12- Imagem de corte longitudinal do testículo direito do touro 5..……....…………..………26

Figura 13- Imagem de corte transversal da cauda do epidídimo do touro 5………………..……...26

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CASUÍSTICA

O meu estágio curricular na área de Medicina e Cirurgia de Espécies Pecuárias teve lugar

na Estremadura / Baixo Alentejo e na Costa Vicentina, entre o período de 2 de setembro de 2019

a 20 de dezembro de 2019.

Na Estremadura/ Baixo Alentejo, mais precisamente distrito de Setúbal, acompanhei o

Dr. Dário Guerreiro e Dr. André Parada, durante 8 semanas, os quais fazem parte do corpo

clínico da Sá Guerreiro, Lda. A Sá Guerreiro, Lda faz essencialmente clínica ambulatória de

bovinos, onde se integram a clínica e cirurgia, sanidade animal (ADS da Península de Setúbal)

e controlo reprodutivo com recurso a ecógrafo, mas também fazem parte alguns serviços de

clínica de pequenos ruminantes, equinos, asininos e suínos (Gráfico 1 e Tabela 1).

Gráfico 1 – Casuística de cirurgia, controlo reprodutivo, clínica e sanidade desenvolvida durante o período de 02/09/2019 a 25/10/2019 na Sá Guerreiro, Lda.

Tabela 1- Resumo de procedimentos realizados na Sá Guerreiro, Lda

Bovinos

Procedimentos Quantidade

explorações/animais

Profilaxia Médica e Sanitária

Desparasitação externa e interna,

teste da tuberculina

60 explorações (aprox. 4016

cabeças bovinos de leite e

934 bovinos de carne)

Vacinação contra Clostridioses

/IBR/BVD

58 explorações

11%

14%

38%

37% Cirurgia

Controlo Reprodutivo

Clínica

Sanidade

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Sistema digestivo

Correção de DAE por

piloromentopexia

8 bovinos

Correção de DAD com torção, por

piloropexia

1 bovino

Enterite neonatal 14 bovinos

Timpanismo gasoso 1 bovino

Sistema Reprodutivo

Parto distócico 6 bovinos (Imagem 1-

anexos)

Cesariana 2 bovinos (Imagem 2-

anexos)

Prolapso uterino 3 bovinos

Retenção placentária 4 bovinos

Controlo reprodutivo 24 explorações

Exame andrológico 1 bovino

Metrite 1 bovino

Sistema Respiratório Pneumonia 9 bovinos

Zaragatoas para análise 6 bovinos

Sistema nervoso Lesão do nervo obturador 2 bovinos

Sistema urinário Urolitíase 1 bovino

Sistema cardíaco Endocardite 1 bovino

Glândula Mamária Mamite 1 bovino

Sistema músculo-esquelético Claudicação 1 bovino

Outros Necropsia 1 bovino

Pequenos ruminantes

Profilaxia Médica e Sanitária Vacinação de ovinos e caprinos

para língua azul e/ou clostridioses,

desparasitação interna e externa

7 explorações

Sistema digestivo Timpanismo gasoso 1 ovino

Enterite 1 caprino

Sistema nervoso Quadro neurológico 1 ovino

Sistema respiratório Pneumonia 12 ovinos

Sistema reprodutivo Orquiectomia 4 caprinos e 4 ovinos

Metrite 1 ovino

Outros Necropsia 1 ovino

Equinos e asininos

Profilaxia Médica e Sanitária Vacinação antitetânica,

desparasitação externa e interna

1 asinino

Patologias Podais Laminite 1 equino

Patologias oculares Inflamação da 3ª pálpebra 1 equino

Suínos

Profilaxia Médica e Sanitária Vacinação: Protocolo de Aujesky

e desparasitação interna

1 exploração

Outros animais

Caso Clínico Rena 1

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A segunda parte do meu estágio curricular iniciou-se a 28/10/2019 e terminou a

20/12/2019, onde acompanhei o Dr. Rui Silva pela Costa Vicentina na prática de clínica

ambulatória. Esta baseou-se em clínica e cirurgia, sanidade (ADS Litoral Alentejano) e controlo

reprodutivo com ecógrafo. A maior percentagem de trabalho foi realizada em bovinos de carne

(80%) e uma menor percentagem em bovinos de leite (20%). Também fez parte da clínica

ambulatória a assistência a ovinos, caprinos, suínos e equinos (Gráfico 2 e Tabela 2).

Gráfico 2- Casuística de cirurgia, controlo reprodutivo, clínica e sanidade desenvolvida durante o período de 28/10/2019 a 20/12/2019 com o Dr. Rui Silva.

Tabela 2- Resumo de procedimentos realizados com o Dr. Rui Silva

Bovinos

Procedimentos Quantidade

explorações/animais

Profilaxia Médica e Sanitária

Desparasitação externa e

interna, teste da tuberculina,

recolha de amostras de leite

para despiste de Brucelose

63 explorações

Vacinação

clostridiose/leptospirose ou

clamidiose.

12 explorações

Sistema reprodutivo

Parto distócico 14 bovinos

Parto com torção uterina 1 bovino

Cesariana 2 bovinos

Prolapso uterino 6 bovinos (Imagem 3 –

anexos)

Retenção placentária 3 bovinos

Controlo reprodutivo 11 explorações

5%4%

65%

26%

Cirurgia

ControloReprodutivo

Clínica

Sanidade

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Exame andrológico 5 bovinos

Sistema digestivo

Enterite neonatal 56 bovinos

Acidose 10 bovinos

Timpanismo gasoso 11 bovinos

Timpanismo cecal 1 bovino (Imagem 8- anexos)

Sistema respiratório

Pneumonia 51 bovinos

Infeção respiratória do trato

superior

6 bovinos

Glândula mamária Mamite 4 bovinos

Sistema circulatório Insuficiência cardíaca 1 bovinos

Sistema nervoso Lesão do nervo obturador 1 bovino

Vaca caída 4 bovinos

Sistema tegumentar Patologias podais 6 bovinos

Descorna 2 bovinos (Imagem 5- anexos)

Patologias parasitárias Casos clínicos 29 bovinos (Imagem 7 –

anexos)

Patologias sistémicas Transfusão sanguínea 2 bovinos

Infeção umbilical 6 bovinos

Sistema músculo-esquelético

Artrite 4 bovinos

Fratura na articulação do

cotovelo

1 bovino (Imagem 6-anexos)

Alterações metabólicas Cetose 1 bovino

Hipocalcémia 1 bovino

Outros Necropsia 6 bovinos

Pequenos ruminantes

Profilaxia Médica e Sanitária

Vacinação contra língua azul /

clostridioses, desparasitação

externa e interna

7 explorações

Sistema Músculo-esquelético Fraturas diversas 2 caprinos

Patologias virais Suspeita de ectima contagioso 1 caprino

Suínos

Profilaxia Médica e Sanitária

Vacinação: Protocolo de

Aujesky e desparasitação

interna

3 explorações (Imagem 4-

anexos)

Patologias bacterianas Mal rubro 3 suínos

Equinos

Profilaxia Médica e Sanitária

Vacinação antitetânica e

desparasitação externa e

interna

1 equino

Patologias parasitárias Casos clínicos 1 equino

Patologias podais Abcesso subsolar 1 equino

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EXAME ANDROLÓGICO EM BOVINOS- UTILIZAÇÃO DA ULTRASSONOGRAFIA

NO DESPISTE DE PATOLOGIAS

Introdução

O ponto-chave da produção animal, tanto no regime extensivo como no regime intensivo

de bovinos de leite ou carne, é o controlo reprodutivo (Gnemmi & Lefebvre, 2009). As

explorações pecuárias de bovinos de carne para serem rentáveis, sustentáveis e lucrativas,

necessitam que a produção de vitelos seja elevada. Desta forma, é imperativo que a importância

que se presta ao touro seja igual ou superior à que se presta às fêmeas de uma vacada. Assim,

a fertilidade e a saúde do touro são dos maiores determinantes para o sucesso reprodutivo de

uma exploração (Bettencourt & Romão 2009). No entanto, a fertilidade do touro é frequentemente

a última a ser considerada quando há uma diminuição no desempenho reprodutivo numa vacada

(Gnemmi & Lefebvre, 2009). Considera-se então que o exame andrológico no ato de compra, ou

antes de inserir o touro numa vacada seja fundamental para que a eficiência reprodutiva numa

exploração agropecuária seja garantida (Bettencourt & Romão 2009), e como complemento

deste exame deve-se utilizar a ultrassonografia, de forma a localizar e identificar com mais

precisão possíveis alterações nos órgãos envolvidos (Hopper, 1987).

Exame andrológico

O exame andrológico em bovinos tem sido utilizado ao longo dos anos como um método

rápido e económico de avaliação do potencial reprodutivo de touros em situações de cobrição

natural e também na identificação de problemas de fertilidade no touro (Hopkins & Spitzer, 1997).

A Society for Theriogenology, USA estabeleceu procedimentos e critérios para a

realização do exame andrológico em bovinos. Este é constituído por 3 partes gerais: a primeira

parte consiste num exame físico geral, focado nas partes do corpo do touro que podem

comprometer a eficiência reprodutiva, como por exemplo, os membros posteriores ou anteriores;

em segundo lugar, é realizado o exame do sistema reprodutor, onde são examinados os órgãos

genitais externos, é feita a medição da circunferência escrotal e a palpação retal para analisar

as glândulas acessórias anexas; por último é realizada a recolha e análise do sémen (Hopkins &

Spitzer, 1997). Em adição a estes exames, pode ser feita uma avaliação da líbido do touro e

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também podem ser despistadas diversas doenças reprodutivas infeciosas, como por exemplo a

Campilobacter fetus venerealis e Trichomonas foetus (Fricke & Lamb, 2002).

O exame andrológico deve ser realizado 60 dias antes do touro entrar para cobrição, uma

vez que é aproximadamente o tempo que leva a uma nova espermatogénese (54 dias mais

precisamente) (Youngquist & Threlfall, 2007). Há que ter em conta a saúde e historial do animal,

visto que febre ou níveis de stress elevado podem levar a uma termorregulação inadequada,

obtendo-se consequentemente níveis baixos de volume de ejaculado, motilidade baixa e

aumento de formas anómalas de espermatozoides (Bettencourt & Romão, 2009).

Importância do exame andrológico em bovinos

Segundo Barth, da revisão de diversos estudos foi estimado que pelo menos 1 em cada

5 touros de uma população aleatória de bovinos não cobre eficientemente as fêmeas ou produz

sémen de fraca qualidade (Barth, 2006). Nestes estudos, a líbido também foi estudada e estimou-

se que 1 em cada 4 touros é insatisfatório neste parâmetro (Barth, 2018). Desta forma, torna-se

evidente a importância da realização de exames andrológicos: identificação de touros não aptos

para monta natural ou touros inférteis (Barth, 2018).

O exame andrológico também permite diagnosticar animais subférteis (touros capazes

de originar descendência e detetar vacas em cio, mas que exibem fertilidade inferior ao que seria

esperado, devido a uma má qualidade de sémen ou possuírem alguma anormalidade física que

condicione a monta). A existência de touros subférteis leva a um aumento do intervalo entre

partos, à diminuição no número de vitelos nascidos/vaca e ao alargamento da época de

cobrições. Isto vai causar prejuízo financeiro para o produtor, uma vez que há diminuição de

vitelos desmamados por vaca e por ano (Bettencourt & Romão, 2009) (Parkinson, 2004).

Concluindo, a realização do exame andrológico permite identificar e eliminar os machos

inférteis e com fertilidade baixa, diminuindo o número de machos reprodutores e reduzindo o

período de cobrições e de partos, de forma a aumentar o número de vitelos desmamados e a

fertilidade da exploração (Bettencourt & Romão, 2009).

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Critérios do exame andrológico em bovinos

Avaliação da líbido e capacidade de cópula

Este é um parâmetro muito importante para a fertilidade em touros de monta natural.

Durante o cio (estro) da vaca, ou próximo deste, o touro deve manifestar comportamentos

específicos: é desejável que o touro se aproxime, através de estímulos olfativos (feromonas)

para ver se a vaca está recetiva, pode também encostar o queixo, elevar o lábio superior (reflexo

de Flehmen) (Houpt et all, 1989) e lamber ou farejar a zona perineal. Aquando esse processo, o

prepúcio pode expulsar secreções pré-espermáticas. Podem haver várias tentativas de monta

até que a fêmea fique parada e o touro copule (Chenoweth, 1983) (Ball & Peters, 2007).

Contudo, a avaliação da líbido pode ser influenciada por vários fatores, tais como o

número de vacas presentes, a presença de outros touros, tendências comportamentais

(supressão do nº de montas pela presença de um touro dominante), condição corporal,

experiência, raça e fatores climáticos (Hopper, 1987).

Exame físico geral

A avaliação deste parâmetro deve começar pela correta identificação do animal (Hopkins

& Spitzer, 1997). Devem-se examinar os olhos do animal, incluindo a capacidade de visão e a

existência de feridas ou doenças (queratoconjuntivite infeciosa, carcinoma das células

escamosas, como por exemplo); a olfação; a audição e depois examinar os dentes e a boca

(Hopkins & Spitzer, 1997).

Em relação à condição corporal, esta pode ser influenciada pela idade do animal, a altura

do ano em que o touro é submetido ao exame, a raça, o tipo de pastagem, a duração da época

de cobrição e número de vacas por touro. A condição corporal recomendada durante a época de

cobrição deverá ser de 5-6, numa escala de 1-10. (Parker et al, 1999).

Os membros anteriores e posteriores, assim como os cascos, também devem ser

examinados, visto que condicionam a locomoção e a monta nas vacas em cio. Defeitos nos

aprumos, como por exemplo, curvilhões fechados, problemas de cascos, artrite ou fibroma

interdigital, afetam negativamente a performance reprodutiva do touro (Hopkins & Spitzer, 1997).

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Exame dos órgãos genitais externos e internos

O escroto, os testículos e o cordão espermático devem ser examinados, para aferição do

tamanho, da conformação, da simetria e da textura destes componentes, e para além disso

devem ser explorados minuciosamente, para a identificação da existência de fluídos ou tecidos

fibróticos (Hopper, 1987).

O escroto deve ter elasticidade e deve ser examinado para a presença de cicatrizes ou

fibroses; os testículos devem ter textura fibroelástica e devem ser palpados para a identificação

de zonas com fibrose ou inflamação; o cordão espermático deve ser palpado desde o anel

inguinal externo, para tentar encontrar possíveis hematomas, hérnias, fluídos ou fibrose. O

prepúcio deve ser também inspecionado, para uma eventual existência de abcessos, hematomas

ou inflamações (Hopper, 1987).

De seguida, deve-se fazer a medição da circunferência escrotal. Os testículos devem ser

posicionados na base do escroto, lado a lado, e a fita métrica escrotal mede o diâmetro maior

dos dois testículos (Figura 1). Se a circunferência escrotal for inferior aos valores mínimos

requeridos (Tabela 3, (Hopkins & Spitzer, 1997)) o exame andrológico não tem continuação

(Hopper, 1987) (Barth, 2006).

Tabela 3 - Valores mínimos do perímetro escrotal consoante a idade de touros, segundo a Society for Theriogenology,

USA (Hopkins & Spitzer, 1997)

Idade (meses) Circunferência escrotal mínima (cm)

>12-15 30

>15-18 31

>18-21 32

>21-24 33

>24 34

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Figura 1-Medição do perímetro escrotal (Fotografia de Rita Soares)

O exame dos genitais internos (Figura 2) é realizado por palpação transretal e esta pode

ser complementada com recurso a ultrassonografia. Desta forma, a primeira estrutura a ser

palpada é o músculo uretral, pelo que se deve verificar se este contém massas ou abcessos.

Depois são encontradas as vesículas seminais, onde se analisam as estruturas lobulares. As

anomalias associadas às vesículas seminais são a alteração de textura, alteração de tamanho,

a presença de adesões ou fibrose e perda de lobulação (Barth, 2006). Deve-se efetuar também

o exame das ampolas, para despistar certas anomalias, como a aplasia ou hipoplasia, quistos

ou duplicação da glândula. Aquando o exame das ampolas, deve-se efetuar a massagem das

mesmas, visto que ajuda na ejaculação (Hopper, 1987). As glândulas bulbouretrais ficam

posicionadas caudalmente ao músculo uretral junto à região anal e normalmente não são

palpadas. A próstata é palpada à volta da extremidade cranial da uretra (Barth, 2006).

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Figura 2 – Glândulas sexuais anexas. Am- ampola; Vs- Vesiculas seminais; P- Próstata; Bu- Glândulas Bulbouretrais; Ub- Bexiga. Chapter 1- Anatomy of the Reproductive System of the Bull (Hopper, 1987).

Recolha e análise de sémen

Para a recolha de sémen, normalmente é utilizado um eletroejaculador, no entanto, a

recolha pode também ser obtida através da estimulação/massagem dos órgãos sexuais anexos

internos, por palpação transretal ou com uma vagina artificial e uma vaca ou touro que se deixe

montar (Schrag & Larson, 2016) (Hopper, 1987).

Em relação às caraterísticas do eletroejaculador, este deve ter 6,5 a 7,5 cm de diâmetro

para touros jovens com 550-990 kg de peso vivo, e em touros adultos, maiores e mais velhos

utiliza-se um aparelho com 9 cm de diâmetro, de forma a garantir uma adequada estimulação

para que haja ereção do pénis e ejaculação (Barth, 2006).

Antes de inserir o eletroejaculador, deve-se massajar a ampola, como já foi referido

anteriormente, e para além disso deve-se pressionar o músculo uretral e glândula bulbouretral,

para que haja um relaxamento do pénis de forma a começar a expelir líquido seminal. Depois

desta estimulação, insere-se o eletroejaculador (Figura 3) e molda-se manualmente a frequência

e amplitude de pulso de acordo com a reação do touro (Hopper, 1987). Foi realizado um estudo

em 1975, onde concluíram que uma amplitude de 4 ms provoca a protusão do pénis e para que

ocorra ejaculação é necessário utilizar-se frequências elevadas (50-80 Hz) (Furman, et al, 1975).

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Figura 3- Eletroejaculador no interior do ânus (Fotografia de Rita Soares)

Antes da recolha do ejaculado, deve-se efetuar o corte dos pelos prepuciais e a assepsia

e secagem do prepúcio. As primeiras porções de ejaculado não devem ser colhidas, deve-se

esperar que este ganhe a coloração marfim. Se houver ereção do pénis, deve-se aproveitar para

observar a existência de anomalias (Hopper, 1987). O ejaculado deve ser recolhido para um tubo

de ensaio de plástico acoplado a um funil de silicone, limpo e seco (Figura 4). A temperatura

desejável de armazenamento do sémen para posterior avaliação é 30ºC-35ºC (Hopkins &

Spitzer, 1997).

Figura 4- Recolha do ejaculado (Fotografia de Rita Soares)

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Nesta fase, é importante avaliar macroscopicamente o ejaculado quanto à sua cor,

densidade, volume e concentração (Hopkins & Spitzer, 1997). Normalmente um touro ejacula em

média 4 ml, mas este valor pode variar de 1 a 15 ml, dependendo da raça, idade, genética do

animal e método de recolha do sémen. Em relação à concentração, em média um touro ejacula

1200 x 10⁶ espermatozoides por ml, mas este valor pode variar entre 300 a 2500 x 10⁶ de

espermatozoides/mL (Fayrer-Hosken, 1997). Assim, em relação à densidade, o ejaculado pode

ser avaliado como “Muito bom” se apresentar aspeto cremoso/granuloso com 750 milhões a 1

bilião de espermatozoides por mL, “Bom” se tiver aspeto leitoso, com 400-750 milhões de

espermatozoides por mL, “Razoável” com aspeto quase leitoso, com 250-400 milhões de

espermatozoides por mL e “Pobre” se o sémen for translúcido com menos de 250 milhões de

espermatozoides por mL (Youngquist & Threlfall, 2007).

A mobilidade dos espermatozoides depende da temperatura (ótima entre os 30ºC-35ºC),

do pH (6,5-6,9), da osmolaridade média e da concentração adequada de nutrientes e iões no

líquido seminal (Barth, 2006)(Teixeira, 2009). Para a avaliação da mobilidade massal, coloca-se

uma gota de sémen numa lâmina e observa-se ao microscópio na ampliação total de 40x a 200x,

com o diafragma fechado para aumentar o contraste (Hopper, 1987). A mobilidade massal

depende de 3 fatores: a percentagem de células móveis progressivamente, a concentração e a

velocidade com que se dá a progressão dos espermatozoides. Esta é avaliada como “Muito bom”

se apresentar ondas rápidas e escuras, “Bom” se contiver ondas mais lentas, “Razoável” sem

ondas, mas com movimento individual proeminente e “Pobre” com pouco ou nenhum movimento

individual (Barth, 2006).

A mobilidade individual deve ser avaliada com uma gota de sémen numa lâmina com uma

lamela sobre a gota, e observado ao microscópio ótico (Figura 5) na ampliação de 200x a 400x

(Hopper, 1987). A estimativa da percentagem de mobilidade individual vai fornecer informações

acerca da integridade morfológica dos espermatozoides e integridade da membrana dos

espermatozoides (Barth, 2006). A Society for Theriogenology, USA classifica então o sémen de

“Muito bom” quando apresenta mobilidade individual superior a 70 %, “Bom” entre 50-69%,

“Razoável” entre 30-49% e “Pobre” com mobilidade inferior ou igual a 29% (Hopkins & Spitzer,

1997).

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Figura 5- Avaliação da mobilidade individual de espermatozoides bovinos, ampliação total x400 (Fotografia ao microscópio ótico de Rita Soares)

A avaliação da morfologia dos espermatozoides é realizada através de um esfregaço de

uma gota de sémen misturada com uma gota de Eosina-Negrosina, onde a eosina penetra a

membrana de células danificadas, não-viáveis ou mortas; os espermatozoides viáveis repelem a

eosina e exibem cor branca (Barth, 2006). Para uma amostra de sémen ser classificada de

satisfatória necessita de apresentar pelo menos 70% de células normais (Hopkins & Spitzer,

1997).

De uma forma geral, os touros podem então ser classificados como:

Satisfatório- Touro livre de anomalias físicas que possam afetar a fertilidade, assim como

defeitos no sistema reprodutor. A circunferência escrotal deve ter o valor mínimo ou ser superior

para a sua idade. A mobilidade massal deve ser no mínimo Razoável ou a mobilidade individual

ter no mínimo 30 %. A análise da morfologia dos espermatozoides deve ter no mínimo 70% de

células normais (Hopkins & Spitzer, 1997).

Insatisfatório- Touro falha 1 ou vários critérios para satisfatório. Assume-se que é improvável

que os problemas do touro alguma vez sejam resolvidos (Hopkins & Spitzer, 1997).

Classificação diferida- Touros que não foram classificados como Satisfatórios, mas podem vir

a ser com tempo ou terapia (Hopkins & Spitzer, 1997).

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Utilização do ecógrafo

A ecografia é um bom meio de diagnóstico complementar, visto ser uma técnica não

traumática, não invasiva e que não envolve riscos para o potencial reprodutivo dos touros

(Hopper, 1987).

O ecógrafo pode ser utilizado em situações específicas após a realização do exame

andrológico: na presença de um número elevado de anomalias morfológicas nos

espermatozoides, azoospermia, piospermia, hemospermia, oligospermia, volume de sémen

diminuído, tamanho ou forma anormal dos órgãos reprodutores e dor sem motivo aparente

(Gnemmi & Lefebvre, 2009). Previamente a este exame, é de extrema importância a recolha do

historial do touro, o exame físico completo e as informações do exame andrológico detalhadas

(Hopper, 1987). A ultrassonografia permite estabelecer a localização da patologia, fazer um

diagnóstico e posteriormente um prognóstico (Gnemmi & Lefebvre, 2009).

Para a realização do exame ecográfico no exame andrológico é utilizado um ecógrafo

com sonda linear, frequência 5-7,5 MHz, em modo B, que pode ser utilizada também no reto para

exame completo do trato reprodutivo (Gnemmi & Lefebvre, 2009).

Exame ecográfico normal do aparelho reprodutor masculino de bovinos

O touro deve estar bem contido e após o exame andrológico executa-se o exame

ecográfico. Começa-se por palpar cuidadosamente os testículos, identificar o epidídimo e o

cordão espermático. Depois, um testículo é puxado ventralmente contra a parede do escroto e a

sonda pode ser encostada na face cranial, lateral ou caudal (com aplicação de gel na sonda),

para que o testículo seja examinado transversal e longitudinalmente (Figura 7) (Hopper, 1987).

Na ecografia do testículo é possível observar-se uma estrutura com ecogenecidade homogenia

(parênquima testicular) com uma estrutura mais hiperecogenica no centro, correspondendo ao

mediastino testicular (Hopper, 1987). Após os dois testículos serem examinados individualmente,

ambos são puxados para a base do escroto e a sonda é movida sobre os órgãos, de forma a

compara-los (Figura 6). De seguida, os epidídimos podem ser observados com a colocação da

sonda perpendicularmente à face longa do testículo, de forma a ser visualizado também o

diâmetro do testículo, o parênquima testicular, a túnica vaginal, a cabeça e cauda do epidídimo

e o cordão espermático. A visualização longitudinal do testículo é conseguida com a sonda

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colocada paralelamente à face longa do testículo, onde é analisado o comprimento do testículo

(se a sonda for comprida o suficiente), o parênquima testicular, a túnica vaginal, e por fim, a

cabeça e cauda do epidídimo. Por vezes, a visualização da cabeça e cauda do epidídimo é difícil

e pode ser facilitada pela abordagem ecográfica lateral e caudal (Figura 8 e Figura 9) (Gnemmi

& Lefebvre, 2009).

O cordão espermático é observado após o exame da cauda do epidídimo, se a sonda for

mantida no plano horizontal e movida dorsalmente para além da cabeça do epidídimo. Desta

forma, é possível a visualização transversal dos ductos deferentes, plexo pampiniforme e

músculo cremáster (Gnemmi & Lefebvre, 2009).

Figura 6- Ultrassonografia caudal de testículos de um touro. Vista transversal. 1- Rede testis. 2- Septo escrotal. (Imagem ecográfica da autoria de Rui Silva)

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Figura 7- Imagem de corte longitudinal do testículo esquerdo. 1- Rede testis. 2- Parênquima do testículo. 3- Túnica albugínea. (Imagem ecográfica da autoria de Rui Silva)

Figura 8 – Ultrassonografia da cauda do epidídimo. 1- Cauda do epidídimo. 2- Parênquima testicular. (Imagem ecográfica da autoria de Rui Silva)

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Figura 9- Ultrassonografia da cabeça do epidídimo. 1- Cabeça do epidídimo. 2- Plexo pampiniforme. (Imagem ecográfica da autoria de Rui Silva)

De seguida, pode ser efetuado o exame do pénis. Após a tricotomia do prepúcio a sonda

é colocada perpendicularmente ao pénis para obter uma imagem transversa deste. Esta análise

permite o diagnóstico de patologias do pénis, tais como abcessos, hematomas, uretrites, onde a

dilatação do pénis é um achado clínico habitual no diagnóstico destas anomalias (Gnemmi &

Lefebvre, 2009).

O exame ecográfico dos órgãos reprodutores internos (próstata, uretra pélvica, ampolas,

glândulas vesiculares e glândulas bulbouretrais) deve ser feito com muita cautela e, se

necessário, o animal pode ser sedado. Após a remoção prévia das fezes, deve ser efetuada uma

análise da consistência, tamanho e topografia dos órgãos. A sonda deve ser envolvida por uma

luva de palpação para sua proteção. Para melhor qualidade de imagem sem artefactos, deve-se

aplicar bastante gel à sonda (Gnemmi & Lefebvre, 2009).

No exame das glândulas bulbouretrais, a sonda deve ser posicionada ventralmente com

o polo caudal da sonda virado para o ânus num angulo ligeiramente lateral. Estas têm aspeto

ovoide a fusiforme. Após a observação das glândulas bulbouretrais, é possível visualizar-se a

uretra pélvica, movendo a sonda cranialmente e mantendo-a ventralmente no eixo longo, de

forma a gerar uma imagem longitudinal da uretra pélvica. A uretra pélvica tem normalmente 3 cm

de diâmetro e 20 cm de comprimento e palpa-se e visualiza-se facilmente, não só devido ao seu

tamanho, mas também devido às suas contrações musculares rítmicas quando é estimulada

(Gnemmi & Lefebvre, 2009).

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Após a visualização da uretra pélvica, procede-se ao exame da próstata, avançando a

sonda para o polo cranial da uretra pélvica em direção ao corpo da próstata, podendo esta ser

visualizada transversal e longitudinalmente (Figura 10). Esta é constituída por duas partes, a

pars disseminata e o corpo da próstata. O corpo contém dois lobos (têm aproximadamente 3,5

cm por 1,5 cm) e a pars disseminata (não palpável) tem cerca de 12 cm de comprimento (Gnemmi

& Lefebvre, 2009).

Figura 10- Imagem de corte longitudinal da próstata. 1-Músculo uretral dorsal. 2- Próstata (pars disseminata). 3- Músculo uretral ventral. (Imagem ecográfica da autoria de Rui Silva)

As vesículas seminais podem ser identificadas após o corpo da próstata ser visualizado,

avançando cranialmente e rodando lateralmente a sonda (Figura 11). Estas são facilmente

detetadas dorsolateralmente à bexiga, porque têm aspeto irregular e lobulado. Num touro de 24

meses estas têm sensivelmente cerca de 12 cm de comprimento e 1,7 cm de largura, e à medida

que o touro envelhece tornam-se maiores (Gnemmi & Lefebvre, 2009).

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Figura 11- Imagem de corte transversal da vesícula seminal. 1- Parênquima da glândula vesical. 2- Ducto da glândula. (Imagem ecográfica da autoria de Rui Silva)

As ampolas podem ser visualizadas, aumentando a profundidade com a sonda

posicionada cranialmente à próstata. Estas são dilatações dos ductos deferentes, que vão junto

da face medial dos testículos e passam pelo anel inguinal dorsalmente à bexiga. Normalmente

têm 12 cm de comprimento e 1,5 de largura, têm forma tubular e paredes espessas (Gnemmi &

Lefebvre, 2009).

Patologias diagnosticadas através da ultrassonografia do aparelho reprodutor masculino

do bovino

Anomalias testiculares

As anomalias associadas aos testículos incluem doenças inflamatórias, como orquites e

epididimites (normalmente envolvem a cauda do epidídimo), ou então torções, quistos, traumas,

atrofias e neoplasias. As acumulações de fluídos estão associadas a patologias do escroto

(hematocelo, hidrocelo e piocelo), podendo haver também formação de hérnias escrotais

(Gnemmi & Lefebvre, 2009).

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Degenerescência testicular

A degenerescência do parênquima testicular pode ser temporária ou definitiva (Hopper,

2014). É uma das maiores causas de infertilidade se for permanente e é descrita como uma

condição onde há perda de integridade do parênquima testicular, podendo haver também

diminuição do testículo envolvido. Estão envolvidos vários fatores para esta condição acontecer,

como temperaturas extremas, tanto quentes como frias, inflamações e gordura no escroto. Está

descrito noutras espécies que a administração crónica de certos fármacos, como por exemplo a

enrofloxacina, pode também provocar esta anomalia (Gnemmi & Lefebvre, 2009). Na ecografia

é visualizada a perda de ecogenecidade no parênquima testicular, visto que há perda da

arquitetura do tecido testicular (Gnemmi & Lefebvre, 2009).

Orquite

A orquite é uma inflamação do testículo onde geralmente apenas um testículo está

afetado; o outro testículo pode entrar em degenerescência por lesão térmica secundariamente

ao testículo afetado. Normalmente, a orquite pode ser diagnosticada através do exame físico e

história clínica, mas a ultrassonografia permite descartar outro tipo de patologias mais dolorosas

como a torsão testicular ou saber se a inflamação advém do testículo ou do epidídimo. A orquite

pode ser consequente a um trauma ou então pode haver o envolvimento de um organismo

hematogeno proveniente de outra infeção, como por exemplo, de um abcesso hepático, de uma

ruminite ou de uma cistite. Desta forma, pode haver a necrose do parênquima testicular

associada à incapacidade elástica da túnica albugínea quando o testículo inflama (Gnemmi &

Lefebvre, 2009).

Esta patologia pode ter imagens ecográficas bastante diferentes, dependendo do estadio

da doença. Em imagens com corte transversal, pode-se observar uma textura heterogénea e

aumento do testículo afetado. Em estadios mais severos, podem ser visualizadas estruturas

redondas, pequenas e hipoecogenicas, e para além disso, o parênquima pode apresentar

sombra acústica devido à existência de estruturas densas ecogénicas espalhadas pelo testículo.

Numa fase crónica da doença é possível haver mineralização de algumas zonas do testículo

(Gnemmi & Lefebvre, 2009).

Abcessos testiculares

Os abcessos testiculares caracterizam-se por dor à palpação na fase aguda e hipertrofia

testicular. Esta patologia é confirmada com ultrassonografia através da presença de uma massa

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anecoica ou hipoecoica, sem parênquima visível, com algumas áreas hiperecoicas (material

fibrinoso) e margens não definidas (Gnemmi & Lefebvre, 2009).

Neoplasias testiculares

As neoplasias testiculares mais frequentes nos touros são seminomas, tumores das

células intersticiais e tumores das células de Sertoli. Estes podem aparecer nas imagens

ecográficas como estruturas circunscritas, nodulares, pequenas a grandes, estruturas anecoicas,

hiperecoicas ou mistas e facilmente distintas do parênquima testicular (Gnemmi & Lefebvre,

2009).

Epididimite

É a patologia mais vulgar do epidídimo e normalmente envolve a cauda do epidídimo.

Neste caso, o epidídimo é visualizado no ecógrafo com perda da ecogenecidade e mais

ingurgitado. Se for um processo crónico, o tecido do epidídimo aparece hipoecogenico, com

zonas hiperecogenicas e mais heterogéneo, devido à presença de transudado ou edema

(Gnemmi & Lefebvre, 2009).

Anomalias do escroto e cordão espermático

Hérnia inguinal

A patologia mais conhecida em bezerros machos são as hérnias inguinais e estas

aumentam a base do escroto. No interior da túnica vaginal, podem estar contidas ansas

intestinais, pelo que se torna importante a utilização de ultrassonografia para verificação. Na

ultrassonografia podem ser observadas as ansas intestinais contidas na hérnia inguinal, e por

vezes, pode ser observado conteúdo gasoso (Gnemmi & Lefebvre, 2009).

Hidrocelo

O hidrocelo é uma patologia dolorosa com inflamação do testículo caracterizada por

acumulação de fluído (>2mm) entre a túnica vaginal parietal e visceral. Esta acumulação de

líquido pode estar associada à infeção, torção do testículo, neoplasia do testículo, doenças

sistémicas do coração ou rins ou doenças idiopáticas. Aparece na imagem ecográfica com uma

zona anecoica com fluído à volta do testículo entre a cavidade vaginal parietal e visceral. No

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hematocelo, a ecografia apresenta fluído localizado com ecogenicidade mista, mas mais tarde

pode tornar-se mais hiperecogenica. Esta hiperecogenicidade está associada à acumulação de

sangue, que pode advir de um trauma ou torção testicular (Gnemmi & Lefebvre, 2009).

Varicocelo

O varicocelo é uma patologia frequente em animais mais velhos em que não está

associada a diminuição da fertilidade. É definido como uma dilatação e aumento da tortuosidade

das veias testiculares, podendo estar associada a diminuição de volume do testículo. Na imagem

ecográfica, este aparece com áreas hipoecogenicas na periferia do cordão espermático, sem

sinais de circulação sanguínea (Gnemmi & Lefebvre, 2009).

Anomalias penianas

O hematoma peniano é a patologia mais comum e a patofisiologia resulta da rutura da

superfície dorsal da túnica albugínea e consequentemente do extravasamento de sangue do

corpo cavernoso. Esta patologia pode também estar associada a um prolapso do prepúcio, e

neste caso, ao exame físico é possível observar cranialmente ao escroto uma inflamação

simétrica do pénis. Na imagem ecográfica do hematoma peniano é possível observar uma massa

com ecogenecidade mista, multilobada e uma cápsula com margens bem definidas na área

dorsal do pénis (Gnemmi & Lefebvre, 2009).

Pode haver a formação de um abcesso, entre o prepúcio e o escroto, como complicação

de um hematoma, habitualmente superior a 15 cm de diâmetro. Já na ultrassonografia desta

anomalia, pode-se visualizar uma estrutura bem delimitada, organizada, com parede e aumento

da ecogenecidade localizada no corpo do pénis. Há sua volta podem existir estruturas com

ecogenecidade mista. Quanto mais antigo for o abcesso, maior a ecogenecidade (Gnemmi &

Lefebvre, 2009).

Anomalias das glândulas acessórias anexas

A vesiculite é a patologia mais comum das glândulas acessórias anexas, apesar de ter

uma prevalência baixa (9%) (Gnemmi & Lefebvre, 2009). Tem uma etiologia desconhecida, mas

touros com infeções por bactérias como Arcanobacterium pyogenes, Brucella abortus e

Haemophilus somnus e por vírus (IBR), têm maior incidência desta patologia. Na fase aguda o

principal sinal clínico é a dor, pode existir peritonite localizada e as glândulas encontram-se

aumentadas de tamanho, enquanto na fase crónica se identifica fibrose. As ecografias a

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vesiculites demonstram um aumento da glândula, perda da lobulação, da ecogenecidade e

parede espessada comparando com a glândula contralateral. No exame ao sémen, há a

persistência de fluído com exsudado purulento. Deve-se ter em conta que em touros com mais

de 10 anos a hipertrofia vesicular é habitualmente observada e normal (Gnemmi & Lefebvre,

2009).

CASOS CLÍNICOS OBSERVADOS

Objetivos

Ao longo do estágio, realizei diversos exames andrológicos (um com Dr. André Parada e

cinco com Dr. Rui Silva). Desta forma, esta discussão tem como objetivo a demonstração dos

resultados dos exames andrológicos que realizei e tirar conclusões acerca destes, tendo em

conta certos fatores, como a idade, raça, história, volume de ejaculado, diâmetro da

circunferência escrotal, cor do ejaculado, exame do aparelho reprodutor, mobilidade massal,

mobilidade individual, concentração, vitalidade e percentagem de anomalias morfológicas. Só foi

utilizada a ultrassonografia num caso (touro 5), uma vez que este apresentava atrofia testicular

direita e atrofia do epidídimo direito. Os outros touros apresentaram um exame andrológico

normal, com exceção do touro 4 que apresentou uma percentagem de anomalias morfológicas

superior a 30%.

Materiais e Métodos

Os bovinos examinados (seis no total) são provenientes de explorações diferentes, com

exceção dos touros 3, 4 e 6. O touro 1 pertencia a uma vacada na região da Estremadura e os

outros touros faziam parte de explorações da Costa Vicentina.

Os touros analisados tinham idades compreendidas entre os 20 meses e 7 anos e os

exames andrológicos foram todos efetuados à pré-entrada, ou seja, antes da época de cobrição.

Os exames andrológicos foram realizados com a seguinte sequência:

- Contenção do touro em manga e sua identificação;

- Exame físico geral: exame da visão, do olfato e da audição, assim como a avaliação da condição

corporal. Foi também efetuado o exame dos membros e cascos e foram despistados outros

defeitos do foro hereditário ou de desenvolvimento, como por exemplo, tilomas, hérnias

umbilicais entre outros;

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- Exame do aparelho reprodutor, onde foi examinado: o escroto, para verificar se continha

aderências ou espessamentos, os testículos para examinar se havia atrofia, fibrose ou algum

testículo ectópico, a cabeça, corpo e cauda dos epidídimos para verificar padeciam de

epididimites, e finalmente, o prepúcio para verificar se se encontrava prolapsado e se o pénis

continha hematomas, abcessos ou aderências. Nesta fase, também foi medida a circunferência

escrotal. As glândulas sexuais acessórias foram examinadas via transretal, tendo como principal

objetivo o despiste de vesiculites.

- Colheita de sémen por eletroejaculação, com a utilização de um eletroejaculador (“Eletrojac 6”

- Neogen, modo manual- 40 ciclos no total, cada um com 2 segundos, seguidos de 2 segundos

de pausa- voltagem variável consoante a resposta do touro). A colheita de ejaculado foi feita para

um tubo de ensaio que ia rapidamente para um recipiente em banho-maria a 35ºC.

- Análise macroscópica do sémen: cor e volume.

- Análise microscópica: Mobilidade massal- colocou-se uma gota de sémen sobre uma lâmina e

com a ampliação de 200× avaliou-se o sémen em relação à mobilidade massal. O método de

avaliação da mobilidade massal foi diferente da técnica mencionada na revisão bibliográfica.

Assim, este foi avaliado numa escala de 1 a 5, onde 5 se apresentava com ondas rápidas e

escuras, os espermatozoides batiam na “parede” (fim de lamela) e voltavam, 4 se continha ondas

mais lentas, os espermatozoides batiam na “parede” e permaneciam na parede, 3 sem ondas,

mas com movimento individual proeminente, 2 com pouco movimento individual e 1 sem

movimento (Cottle & Kahn, 2014). Mobilidade Individual- colocou-se uma gota de sémen sobre

uma lâmina com uma lamela por cima, e com a ampliação de 400× avaliou-se a mobilidade

progressiva dos espermatozoides. O sémen foi classificado de “Muito bom” quando apresentava

mobilidade individual superior a 70 %, “Bom” entre 50-69%, “Razoável” entre 30-49% e “Pobre”

com mobilidade inferior ou igual a 29%.

- A concentração foi calculada com a utilização da câmara de Neubauer. Inicialmente a amostra

foi diluída com o fator de diluição 1:2 em Equipro (solução de enriquecimento). Depois esta

cultura celular foi diluída numa solução fixadora (vermelho de fenol 2mg, citrato de sódio 1%, 2

ml de formol) na diluição 1:200. Posteriormente, foi colocada uma lamela sobre a câmara de

Neubauer e preencheu-se o espaço entre a lamela e o hemocitómetro com uma gotinha da

solução resultante em cada lado. Observou-se ao microscópio na ampliação de 400× e calculou-

se a concentração com a fórmula:

Fator de diluição x nº de espermatozoides contados x 1000 x 50.

- Anomalias morfológicas - foi depositada uma gota de sémen e uma gota de eosina-negrosina

numa lâmina. Procedeu-se à mistura das gotas para depois fazer um esfregaço. Secou-se a

lâmina e depois observou-se ao microscópio ótico na ampliação de 400×. A percentagem de

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anomalias morfológicas foi contabilizada através do registo das diversas anomalias em 100

espermatozoides (como por exemplo, cabeças destacadas, gota citoplasmática proximal ou

distal, cauda enrolada ou partida, entre outras), tanto em espermatozoides vivos, como em

espermatozoides mortos.

- A percentagem de vitalidade foi calculada através das lâminas do esfregaço, onde se contaram

no mínimo 100 espermatozoides em cada lâmina e foi assinalado se os espermatozoides

estavam vivos ou mortos (eosina penetra células com membranas não viáveis ou

espermatozoides mortos, exibindo cor rosa). Foram analisadas 2 lâminas de esfregaço por touro,

e foi efetuada a respetiva média das duas lâminas.

- Exame ecográfico touro 5 – Utilização do ecógrafo “Imago”, com sonda linear, frequência 5-7,5

MHz, em modo B. Foi realizado o exame dos testículos em corte transversal e longitudinal e os

epidídimos foram observados com a colocação da sonda perpendicularmente à face longa do

testículo.

Em relação ao touro 1, a vitalidade, a concentração e a percentagem de anomalias

morfológicas não foram calculadas.

Resultados

Tabela 4 - Dados dos touros que foram submetidos a exames andrológicos durante o meu período de estágio

Touro 1 Touro 2 Touro 3 Touro 4 Touro 5 Touro 6

História/motivo Pré-entrada

Pré-entrada

Pré-entrada

Pré-entrada

Pré-entrada

Pré-entrada

Idade 2 anos 20 meses

3,5 anos 20 meses 7 anos 1,5 anos

Raça X Limousine

Charolês X Limousine

Sallers Limousine Limousine

C.C. 7 6 5 6,5 5 6

Diâmetro C. E. 41 cm 39,5 cm 42 cm 40,5 cm 40,5 cm 39 cm

Exame ao aparelho

reprodutor

Normal

Normal

Normal

Normal

Atrofia testicular direita e

atrofia do epidídimo

direito

Normal

Volume ejaculado (ml)

5 ml 3 ml 5 ml 5 ml 6 ml 4 ml

Cor ejaculado Leitoso/ Marfim

Marfim Marfim Leitoso/ Marfim

Leitoso/ Marfim

Leitoso

Mob. Massal 4 2,5 3 2,5 3,5 3,5

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Mob. Individual 70% 60% 65% 50% 50% 60%

Concentração espermatozoides/

ml

- 160x106 200x106 312x106 100x106 770x106

Vitalidade % - 59,55% 67,5% 61,35% 58,4 % 63,2 %

% de anomalias morfológicas

- 25,75% 22,8% 36,2% 27,7% 25,95%

Discussão

Os touros avaliados tinham circunferências escrotais superiores aos valores mínimos

requeridos para cada idade, pelo que foram todos aprovados neste aspeto, com exceção do

touro 5 que no exame ao aparelho reprodutor apresentou atrofia testicular direita e atrofia do

epidídimo direito.

Na avaliação da mobilidade massal, pode-se aferir que todos os touros tiveram resultados

superiores a 2,5, ou seja, praticamente todos os touros continham sémen com espermatozoides

com movimento individual proeminente e, no touro 1 os espermatozoides conseguiam fazer

ondas lentas. Em relação à mobilidade individual dos touros foram avaliados como “Bons”, visto

que todos os touros tiveram percentagens compreendidas entre os 50% e 70%.

Segundo Youngquist & Threfall, o touro 6 foi considerado “Muito bom” em relação à

concentração de espermatozoides, o touro 4 Razoável e os restantes touros Pobres. No entanto,

Figura 12-Imagem de corte longitudinal do

testículo direito do touro 5. Atrofia testicular. 1-

Rede testis dilatada e hipoecóica, com pontos

de hiperecogenecidade - fibrose. (Imagem

ecográfica da autoria de Dr. Rui Silva)

Figura 13 – Imagem de corte transversal da

cauda do epidídimo do touro 5. 2- Cauda do

epidídimo com zonas hiperecoicas, sugestivas

de fibrose. (Imagem ecográfica da autoria de

Dr. Rui Silva)

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este parâmetro não é eliminatório, uma vez que o método de recolha utilizado foi o

eletroejaculador, que é considerado intrusivo e nem todos os touros respondem bem a este.

Além disso, a recolha pode não ter sido a mais indicada, podendo resultar num ejaculado com

oligospermia ou azoospermia porque se recolheu uma quantidade elevada de líquido prostático.

A percentagem de anomalias morfológicas é um parâmetro eliminatório, sendo que a

percentagem das células normais deve ser no mínimo 70%. Desta forma, apenas o touro 4 é

insatisfatório neste parâmetro, pelo que foi marcada uma reavaliação para 60 dias depois (tempo

de uma nova espermatogénese). Pensou-se no envolvimento de um processo febril que possa

ter afetado aquela espermatogénese.

Concluindo, todos os touros foram avaliados como satisfatórios no geral, com a exceção

do touro 4 devido à percentagem de anomalias morfológicas e o touro 5 que apresentou atrofia

testicular direita no exame do aparelho reprodutor. Para os touros satisfatórios, espera-se que

durante um período de cobrição de 9 semanas, num efetivo de 50 vacas cíclicas, estes consigam

94% de gestações, sendo 60% resultantes das 3 primeiras semanas de cobrição (Penny, 2009).

O caso mais relevante deste relatório de estágio foi o touro 5. Apresentava à palpação no

exame do aparelho reprodutor, atrofia do epidídimo direito e atrofia testicular direita. Desta forma,

recorreu-se à ultrassonografia testicular para visualizar e diagnosticar o problema do animal.

Nas imagens ecográficas presentes nos resultados, é possível observar-se diminuição da

ecogenecidade com pontos hiperecoicos sugestivos de fibrose na rede testis (Figura 12). A

cauda do epidídimo encontra-se aumentada com zonas hiperecogenicas, também compatíveis

com fibrose (Figura 13). Apesar de não terem sido feitos mais exames complementares (como

citologia, por exemplo), segundo Harry Momont and Celina Checura, a imagem ecográfica pode

ser correspondente a um granuloma da cauda do epidídimo. Doenças traumáticas, congénitas e

inflamatórias são habituais neste local anatómico, onde há estase do sémen e

consequentemente formação de granulomas (Chapter 9, Hopper, 1987). Apesar da patologia,

este touro apresentou um espermograma normal, visto que o outro testículo funcionava bem e

conseguia compensar a anomalia apresentada. Crê-se que sempre que este ejaculava, o sémen

que provinha do testículo direito passava o corpo do epidídimo, batia no granuloma da cauda do

epidídimo e voltava para trás. A atrofia do testículo teve origem neste processo que já era crónico.

Em teoria, este touro seria reprovado no exame andrológico devido à atrofia testicular, no

entanto, o dono gostava dele pelo seu historial genético, pelo que este ficou como cobridor de

poucas fêmeas (10-15) sem cios concentrados, e o retorno ao cio das vacas deve ser

posteriormente avaliado.

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CONCLUSÃO

Com a realização deste relatório de estágio tornou-se ainda mais evidente a importância

do exame andrológico e a utilização da ultrassonografia neste. Para além de nos ajudar a

diagnosticar touros inférteis ou subférteis, ajuda também a identificar animais com bons

resultados no exame andrológico mas com patologias não visíveis no exame físico, apenas

diagnosticadas com auxílio do ecógrafo. Este meio complementar de diagnóstico, melhora a

acuidade do diagnóstico e podemos definir as hipóteses de recuperação do animal.

O Médico Veterinário tem um papel muito importante na identificação de bons touros

férteis e no melhoramento da fertilidade em explorações, de forma a que as explorações

diminuam o intervalo entre partos e os períodos de cobrição e, consequentemente, aumentem o

número de vitelos desmamados por ano.

É de referir que com este estágio os meus objetivos foram conquistados, visto que adquiri

técnicas de maneio com animais com os quais raramente tinha contacto (bovinos de carne).

Também adquiri mais conhecimentos teóricos e competências para além da formação

académica, que me vão ajudar no diagnóstico de patologias em animais com que futuramente

irei trabalhar.

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ANEXOS

Imagem 1- Parto distócico, desproporção Imagem 2 – Sutura da pele após

feto- materna de origem materna cesariana

Imagem 3 – Prolapso uterino com rutura Imagem 4 – Sanidade em suínos

da artéria uterina

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Imagem 5 – Descorna de novilho Imagem 6 – Tala de Thomas

Imagem 7 – Vaca infestada por Hyalommas Imagem 8 – Resolução timpanismo cecal