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RELATÓRIO FINAL DA PESQUISA DE CAMPO DO PROJETO “A IMPLEMENTAÇÃO DO IGD E DAS CONDICIONALIDADES DO BOLSA FAMÌLIA NO MARANHÃO: identificando possibilidades, limites e propostas de melhoria1 EDITAL MCT/MDS-SAGI/CNPq N. 36/2010 PROCESSO: 563630/2010-8 PERÍODO: Janeiro/dezembro 2011 INSTITUIÇÃO: Universidade Federal do Maranhão COORDENADORA: Profa. Dra. Maria Ozanira da Silva e Silva 1 A equipe foi composta pela coordenadora geral, autora e proponente do projeto, que também assumiu atividades de execução: Profa. Dra. Maria Ozanira da Silva e Silva; Profa. Dra. Valéria Ferreira Santos de Almada; Profa. Dra. Cleonice Correia Araújo; Prof. Dra. Annova Miriam Ferreira Carneiro; Dra.Maria Virgínia Moreira Guilhon (Bolsista DTI-A); Mestre Talita Furtado (Bolsista DTI-B); Aluna do Curso de Serviço Social Luna Santos Oliveira (Bolsista ITI). Todos os textos produzidos no âmbito da pesquisa foram apresentados e discutidos com todas as integrantes da pesquisa, embora cada um tenha como autoras as pesquisadoras que foram responsáveis diretamente pela redação do respectivo texto.

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RELATÓRIO FINAL DA PESQUISA DE CAMPO DO PROJETO “A IMPLEMENTAÇÃO DO IGD E DAS CONDICIONALIDADES DO BOLSA FAMÌLIA NO MARANHÃO: identificando

possibilidades, limites e propostas de melhoria”1

EDITAL MCT/MDS-SAGI/CNPq N. 36/2010

PROCESSO: 563630/2010-8

PERÍODO: Janeiro/dezembro 2011

INSTITUIÇÃO: Universidade Federal do Maranhão

COORDENADORA: Profa. Dra. Maria Ozanira da Silva e Silva

1 A equipe foi composta pela coordenadora geral, autora e proponente do projeto, que também assumiu atividades de execução: Profa. Dra. Maria Ozanira da Silva e Silva; Profa. Dra. Valéria Ferreira Santos de Almada; Profa. Dra. Cleonice Correia Araújo; Prof. Dra. Annova Miriam Ferreira Carneiro; Dra.Maria Virgínia Moreira Guilhon (Bolsista DTI-A); Mestre Talita Furtado (Bolsista DTI-B); Aluna do Curso de Serviço Social Luna Santos Oliveira (Bolsista ITI). Todos os textos produzidos no âmbito da pesquisa foram apresentados e discutidos com todas as integrantes da pesquisa, embora cada um tenha como autoras as pesquisadoras que foram responsáveis diretamente pela redação do respectivo texto.

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 2 CARACTERIZAÇÃO DO ESTADO DO MARANHÃO E DOS MUNICÍPIOS INTEGRANTES DA AMOSTRA DO ESTUDO EMPÍRICO

2.1 Um Breve Resgate Histórico da Socioeconomia Maranhense 2.2 O Maranhão e os Municípios da Pesquisa em Dados 2.3 O Bolsa Família no Contexto da Política de Assistência Social no Maranhão e nos Municípios da Amostra da Pesquisa

3 AS CONDICIONALIDADES DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA NO ESTADO DO MARANHÃO

3.1 O Acompanhamento da Saúde 3.2 O Acompanhamento da Educação 3.3 O Acompanhamento da Assistência Social 3.4 A Intersetorialidade como Estratégia de Gestão do Bolsa Família 3.5 Críticas e Sugestões

4 A REALIDADE DA GESTÃO DO ÍNDICE DE GESTÃO DESCENTRALIZADA (IGD) NO ESTADO DO MARANHÃO

4.1 Os dados sobre o IGD e o Repasse dos Recursos em Relação ao Teto Previsto nos Municípios da Amostra 4.2 O Significado do IGD para os municípios: determinantes, configurações, distribuição e aplicação dos recursos recebidos 4.3 Críticas e Sugestões

5 CONCLUSÃO REFERÊNCIAS

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1 INTRODUÇÃO

O presente relatório contém os resultados de estudos de campo realizados em 13 (treze) municípios do Estado do Maranhão sobre as condicinalidades e o Índice de Gestão Descentralizada (IGD) do Bolsa Família (BF), conforme detalhado no projeto, apresentado e aprovado pelo Conselho de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPq em concorrência ao Edital MCT/MDS/SAGI/CNPq n. 36/2010.

O projeto situou-se no tema 3 indicado pelo Edital: Bolsa Família – Estratégias para alívio e superação da pobreza. A proposta foi desenvolver estudo empírico no Estado do Maranhão sobre dois componentes considerados fundamentais na implementação do Bolsa Família (BF) enquanto estratégia de enfrentamento à pobreza no Brasil: a) O Índice de Gestão Descentralizada (IGD) no aprimoramento da qualidade da gestão local do Bolsa Família; b) As estratégias de acompanhamento familiar e de gestão das condicionalidades do BF. O pressuposto foi de que o bom desenvolvimento da gestão do IGD e das condicionalidades pode contribuir para elevar o desempenho e maximizar os impactos do BF em relação a sua população alvo: famílias pobres e extremamente pobres. Portanto a proposta se voltou para contemplar: a) em relação ao IGD: nível de repasse mensal do IGD em relação ao teto previsto para os municípios da amostra; identificação do pessoal responsável pela aplicação do IGD nos municípios; formas de aplicação do IGD, com destaque a sua aplicação para aprimoramento da gestão e nas ações complementares destinadas a membros das famílias beneficiárias; possível contribuição do IGD para o aprimoramento do BF; identificação de situações que possam representar melhorias na gestão do BF com a aplicação do IGD; b) em relação às condicionalidades: ações desenvolvidas no (s) Centros de Referência da Assistência Social - CRAS junto às famílias beneficiárias do BF; identificação da (s) forma (s) de gestão da condicionalidade da educação; identificação da (s) forma (s) de gestão da condicionalidade da saúde; identificação da (s) forma (s) de gestão da condicionalidade da assistência social (PETI); identificação das formas de acompanhamento da família beneficiária do BF, bem como das ações desenvolvidas pelos órgãos responsáveis para realizar esse acompanhamento; identificação dos possíveis impactos das condicionalidades sociais para o desenvolvimento dos beneficiários acompanhados; identificação de estratégias visando à gradativa autonomia das famílias beneficiárias; levantamento de sugestões para melhoria do acompanhamento das famílias. O objetivo central do estudo foi oferecer elementos de avaliação sobre a gestão do BF em nível municipal, considerando o IGD e as condicionalidades, de modo a contribuir para o desenvolvimento e possíveis ajustes desses mecanismos para elevação do padrão de gestão do BF nos municípios e, consequentemente, para incrementar os impactos do Programa junto às famílias beneficiárias.

Em termos da proposta metodológica do projeto, foram adotados os seguintes procedimentos de pesquisa:

A) Estudo de campo realizado numa amostra aleatória simples composta por 13 municípios do Estado do Maranhão que representaram no mínimo 5% dos municípios, considerando os respectivos portes, conforme indicado no projeto.

Os municípios integrantes da amostra foram definidos por sorteio, exceto a metrópole que é São Luís, todos encontrando-se no nível de gestão básica ou plena em relação à Política de Assistência Social. Os municípios sorteados para compor a amostra, num total de 13, foram os seguintes: São Luís, Caxias, Capinzal do Norte, Poção de Pedra, Cajapió, São João Batista, Viana, Alto Alegre do Maranhão, Barreirinhas, Maracaçumé, Cedral, Santa Quitéria do Maranhão e Presidente Vargas.

O estudo de campo teve como espaço de realização os Centros de Referência da Assistência Social - CRAS: tendo sido escolhido o maior CRAS em cada município. Em São Luís e no município de porte grande (Caxias) foram considerados os 2 maiores CRAS, totalizando 15 CRAS. Foram desenvolvidos em cada CRAS o procedimento de pesquisa denominado Grupo Focal, nos seguintes termos: realização de 2 reuniões de grupos focais:

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uma sobre o IGD e outra sobre as condicionalidades, tendo como roteiro os aspectos indicados nos dois eixos configurativos do objeto acima especificados.

O grupo focal foi coordenado por um pesquisador/moderador e as informações do debate foram anotadas e gravadas e, posteriormente, transcritas. Os grupos focais foram compostos por técnicos dos CRAS para o estudo, representantes dos Conselhos Municipais e usuários do BF dos respectivos municípios, não chegando a ultrapassar 15 integrantes em cada grupo. Além do estudo de campo, foram desenvolvidos os seguintes procedimentos de pesquisa:

a) Levantamento Bibliográfico e documental. Nesse aspecto foram considerados publicações e documentos de estudos desenvolvidos sobre o BF, mais especificamente sobre o IGD e as condicionalidades, tendo em vista contextualizar o estado da arte sobre esses dois aspectos do Programa bem como referenciar o estudo proposto.

b) Realização de Entrevistas semi-estruturadas com o gestor estadual e os gestores municipais do BF nos municípios selecionados para compor a amostra da pesquisa. Essas entrevistas foram orientadas por roteiros elaborados considerando os aspectos indicados em relação ao IGD e às condicionalidades do BF conforme indicado nos dois eixos configurativos do objeto de estudo.

Esse relatório apresenta, a seguir, uma caracterização do Estado do Maranhão e dos municípios integrantes da amostra para realização da pesquisa de campo; uma reflexão sobre o BF no contexto da Política Nacional de Assistência Social, seguida da apresentação e problematização do desenvolvimento das condicionalidades e do IGD no Estado do Maranhão, finalizando, na conclusão, com o destaque de aspectos considerados mais relevantes no estudo empírico desenvolvido. 2 CARACTERIZAÇÃO DO ESTADO DO MARANHÃO E DOS MUNICÍPIOS

INTEGRANTES DA AMOSTRA DO ESTUDO EMPÍRICO2

Neste item, a título de contextualização, será efetuada uma caracterização do espaço empírico da pesquisa, destacando-se o Estado do Maranhão em geral e os municípios que compuseram a amostra do estudo. Para tanto, inicialmente, buscar-se-á resgatar historicamente o desenvolvimento da socioeconomia maranhense até os anos recentes. Em seguida, serão apresentados e analisados alguns dados demográficos e sócio-econômicos referentes ao conjunto do Maranhão e aos municípios da pesquisa.

2.1 Um Breve Resgate Histórico da Socioeconomia Maranhense

O Estado do Maranhão está localizado na Região Nordeste do Brasil, ocupando uma

área de 331.983,3 km² e situando-se entre duas regiões climáticas bem distintas: o sertão semi-árido e a Amazônia quente e úmida, sendo, portanto, uma faixa autêntica de transição.

Com o esgotamento dos ciclos das plantations, primeiramente de cana-de-açúcar e depois de algodão – baseados na forma de trabalho escravo, na grande propriedade e na monocultura voltada para a exportação - a pecuária extensiva e a agricultura familiar voltaram a predominar na maior parte do Estado, formando os contornos de uma economia camponesa que, além da agricultura familiar tradicional conta com o extrativismo, a criação extensiva (normalmente apenas de animais de pequeno porte), a pesca e o uso comum dos recursos naturais para sua reprodução (das áreas de uso comum, em geral campos de cerrado, são extraídos lenha, madeira, frutos, fibras, etc.,).

Nas áreas de agricultura familiar, ocupam lugar de destaque os plantios de mandioca consorciada com arroz, feijão e milho, segundo um sistema rudimentar conhecido como

2 Contribuíram para levantamento de informações e para elaboração dos quadros referentes à caracterização socioeconômica do Maranhão e dos municípios da pesquisa o aluno do Curso de Economia da Universidade Federal do Maranhão Rafael Ferreira Vidal e Talita de Sousa Nascimento, aluna do Mestrado em Políticas Públicas da Universidade Federal do Maranhão.

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“roça no toco”, caracterizado pela não utilização de qualquer equipamento que não seja a enxada e o facão. Baseia-se, além disso, a tecnologia em análise, na queima da área para a limpeza e preparação do solo, no plantio de cerca de 1 a 1,5 hectares por família.

A partir da segunda metade da década de 1970, começou no Maranhão a fase dos grandes projetos, que, sobrepondo-se à base da pecuária extensiva e da economia camponesa tradicional, fixaram os contornos socioeconômicos atuais do Estado. Os grandes projetos foram desenhados a partir do II Plano Nacional de Desenvolvimento (Governo Geisel, 1974-1978), sob a bandeira do Projeto Grande Carajás, com a instalação da Companhia Vale do Rio Doce na Ilha do Maranhão, o aproveitamento da estrada de ferro existente e a instalação da Alumar (consórcio multinacional voltado à produção e exportação de alumínio em lingotes), além da expansão, com incentivos e subsídios federais e estaduais de projetos agroindustriais tais como eucalipto e bambu para celulose, pecuária bovina, cana de açúcar e álcool.

A instalação de guserias no Maranhão e no Pará levou também, a partir do início da década de 1980, à expansão da atividade de desmatamento voltado à produção de carvão, que impactou de forma significativa as regiões Central e Leste do Estado. Mais recentemente, a diminuição da oferta de madeira proveniente de matas nativas do Pará e do Maranhão e as crescentes restrições interpostas pela legislação ambiental estão trazendo investimentos no Estado com vistas à produção de carvão a partir de reflorestamento de eucalipto.

Merece ainda destaque, desde o final da década de 1970, uma nova frente de ocupação econômica representada pelo avanço da agricultura graneleira mecanizada (principalmente soja, mas também milho, arroz e algodão) no sul do Estado, a partir da região de Balsas e, ao final da década de 1980, o surgimento de um segundo pólo de agricultura graneleira mecanizada, na região Leste do Estado (nas microrregiões de Chapadinha e do Baixo Parnaíba)

A pressão fundiária gerada pelo avanço dos empreendimentos agroindustriais, de par com a pressão populacional nas áreas de agricultura familiar tradicional, tem trazido reiteradamente à cena conflitos pelo uso e ocupação do solo, além de uma perda de produtividade nas áreas de agricultura familiar. Essa perda de produtividade explica-se, em uma situação de forte diminuição na oferta de terras para o rodízio das plantações, pela conseqüente redução do tempo de pousio da terra e pelo esgotamento do solo. Há evidências incontrastáveis de crescente entropização do meio ambiente (rios secando e desertificação em avanço), explicados em grande medida pelo avanço de lavouras em áreas de mananciais, pelo desmatamento indiscriminado nas áreas de chapada, além da utilização também indiscriminada de queimadas para a preparação de solos.

Existe hoje uma preocupação crescente com a segurança alimentar em várias regiões do Estado. Esta já é, provavelmente, uma das causas mais importantes para movimentos migratórios massivos em direção aos centros populacionais maiores do Estado, resultando em forte adensamento populacional naqueles centros, sem que tenham sido criadas as bases para a absorção dessa mão-de-obra nas grandes cidades. (SILVA et al, 2008, p. 62)

Finalmente, centrando o foco nos anos mais recentes, merece destaque a inflexão experimentada pela economia maranhense a partir dos anos 2000, determinada por fatores locais, mas, sobretudo, pelas políticas econômicas e sociais implementadas pelo governo federal.

De fato, ao longo da década de 2000, a tendência de baixo crescimento econômico que caracterizou os anos de 1990 se reverteu e o Estado passou a apresentar um desempenho superior ao das economias nordestina e nacional. Entre 2002 e 2007, por exemplo, o PIB maranhense experimentou um incremento médio anual de 6,9%, enquanto a taxa média nordestina foi de 4,5% a.a e a taxa média nacional foi de 4,0%.

Entre os fatores que contribuíram para a retomada do crescimento, destaca-se, em primeiro lugar, a expansão da produção estadual de commodities minerais e agrícolas para a exportação, favorecida pelo ciclo expansivo do comércio mundial, ressalvando-se que

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somente os produtos ferro, alumínio e soja responderam por 97,0% da pauta de exportações do Estado entre 2004 e 2008.

Um segundo fator importante foi o crescimento significativo das transferências de recursos federais para o tesouro estadual que favoreceu o aumento dos gastos públicos, refletindo-se no aumento do setor de Administração, Saúde e Educação, o qual foi responsável por 19,2% do incremento do PIB estadual entre 2002 e 2007. Acrescente-se a esses recursos federais os repasses referentes especificamente ao custeio do Programa Bolsa Família, os quais totalizaram em 2008 um valor correspondente a 2,1% do PIB estadual, evidenciando a importância desse Programa para o incremento da renda familiar e para a dinamização da economia estadual, especialmente dos setores de produção e comércio de bens de primeira necessidade.

Um terceiro fator referiu-se à expansão do crédito para o consumo familiar e para o financiamento imobiliário, seguramente viabilizado pela estabilização da moeda nacional e a conseqüente queda da taxa de juros.

Por último, mas não menos importante, deve-se destacar que, ao lado dos Programas Federais de Transferência de Renda de cunho previdenciário e assistencial, a política macroeconômica de reajustes reais do salário mínimo teve importância fundamental para a elevação geral do nível de renda circulante no Estado e conseqüentemente para a dinamização da economia maranhense no período em apreço, já que em 2008, segundo dados da PNAD, 57,6% do total de trabalhadores ocupados no Maranhão percebiam no máximo um salário mínimo. (DUAILIBE, p. 108-109, 2010)

Em termos de perspectivas futuras, há uma expectativa de continuidade desta tendência de crescimento da economia maranhense, a qual deverá ser alavancada por um novo ciclo de investimentos, alguns já em andamento e outros anunciados para o período compreendido entre 2010 e 2016. Tais investimentos se concentram, sobretudo, no ramo de petróleo e gás, com destaque para a construção da Refinaria Premium I da Petrobrás, no Município de Bacabeira, orçada em US$ 19,8 bilhões, com a previsão de geração de 132.000 empregos diretos e indiretos. Em segundo lugar, se destaca o ramo de geração e distribuição de energia elétrica, com a construção de uma Hidrelétrica e mais três Termelétricas, cujo montante de recursos empregados representou 23,7% do total investido no Estado no segundo semestre de 2011. Em terceiro lugar, se situa o ramo de logística, representando 16% do total de investimentos realizados também no segundo semestre de 2011, sobressaindo, dentre outros, a ampliação do Porto do Itaqui e a expansão da Vale-Logística Norte, no município de São Luís.

Cumpre, entretanto, ressaltar o grande desafio que se impõe ao governo do Estado, no sentido de promover uma maior diversificação e um maior adensamento das cadeias produtivas locais, para que tais empreendimentos não se tornem economias de enclave, com maior potencial de geração de emprego e renda apenas em sua fase de implantação, mas sem grandes efeitos multiplicadores a serem internalizados após sua maturação, tal como ocorreu com o anterior ciclo de investimentos realizados no Estado, no bojo do Projeto Grande Carajás.

2.2 O Maranhão e os Municípios da Pesquisa em Dados

Em termos demográficos, segundo dados do Censo de 2010, o Maranhão possui uma população de 6.574.789 habitantes, apresentando uma densidade demográfica de 19,81 hab/km². Conforme demonstrado na tabela seguinte, dentre os municípios selecionados para a pesquisa, São Luís, capital do Estado, se destaca como o mais populoso, com uma população de 1.014.837 habitantes, e o de maior densidade demográfica (1.215,69 hab/km²). Em segundo lugar, do ponto de vista populacional, situa-se o município de Caxias, com uma população de 155.129 habitantes e em termos de densidade demográfica, sobressai na segunda posição o município de Alto Alegre do Maranhão, com 64,18 hab/km². Cedral é o município menos populoso da amostra, com uma população de 10.297 habitantes.

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Tabela 01 - População e Densidade Demográfica

População

Densidade

Demográfica

hab/Km²

Maranhão 6574789 19.81

Municípios

Alto Alegre do Maranhão 24599 64,18

Barreirinhas 54930 17,65

Cajapió 10593 11,66

Capinzal do Norte 10698 18,12

Caxias 155129 30,12

Cedral 10297 35,63

Maracaçumé 19155 30,44

Poção de Pedras 19708 20,13

Presidente Vargas 10717 23,33

Santa Quitéria do MA 29191 15,22

São João Batista 19920 28,84

São Luis 1014837 1215,69

Viana 49496 42,36

Fonte: IBGE - Censo

Demográfico 2010

O Maranhão ainda se destaca como um dos Estados menos urbanos do país, em que pese o significativo crescimento da sua taxa de urbanização observado nos últimos anos. Com efeito, esta passou de 41% em 1992 para 65% em 2005, representando uma variação bem mais expressiva do que a verificada no Brasil nesse interstício, em que essa taxa saltou de 78% para 83%. Atualmente, segundo o censo de 2010, 68% da população maranhense reside no meio urbano. A tabela abaixo apresenta a distribuição da população dos municípios estudados por situação do domicílio, evidenciando, como esperado, que São Luís, por se tratar de uma capital, representa um dos principais centros de atração das populações migrantes, registrando, por conseguinte, a maior taxa de urbanização, qual seja, 94% no ano de 2010. Em seguida, destacam-se os municípios de Maracaçumé, Alto Alegre do Maranhão e Caxias, com taxas de urbanização superiores à média do Estado. Os demais se situam abaixo dessa média e, excetuando-se Viana e Capinzal do Norte, todos são predominantemente rurais, possuindo ainda mais da metade da sua população domiciliada no campo.

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Tabela 02 - População por situação de domicílio

Total Urbana (%) Rural (%)

Maranhão 6574789 68 32

Municípios

Alto Alegre do Maranhão 24599 78 22

Barreirinhas 54930 40 60

Cajapió 10593 36 64

Capinzal do Norte 10698 52 48

Caxias 155129 76 24

Cedral 10297 23 77

Maracaçumé 19155 82 18

Poção de Pedras 19708 42 58

Presidente Vargas 10717 42 58

Santa Quitéria do MA 29191 48 52

São João Batista 19920 26 74

São Luis 1014837 94 6

Viana 49496 54 46

Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010

Considerando-se a população de dez anos ou mais de idade por posição na ocupação no trabalho principal, o Maranhão sobressai pelo baixo grau de estruturação do seu mercado de trabalho. Isto é evidenciado pela pequena participação dos empregados assalariados (42%) em relação aos trabalhadores por conta própria (36%), ou não remunerados em ajuda a membro do domicílio (9%), ou trabalhadores na produção para o próprio consumo (11%), que somados representam 56% do total da população de dez anos ou mais de idade. Acrescente-se a isso o fato de que dentre os empregados, 56% não possuem carteira assinada, representando 24% do total da população de dez anos ou mais de idade, os quais vêm a se somar ao universo daqueles 56% (conta própria, não renumerados ou trabalhadores na produção para o próprio consumo) que, em geral, são desprovidos de qualquer garantia de proteção previdenciária. Conforme consta na tabela a seguir, São Luís figura como o município com maior grau de estruturação do seu mercado de trabalho, já que possui um percentual de empregados assalariados (71%) significativamente maior que a média do Estado, embora ainda conte com um número significativo de empregados sem carteira assinada (38% dentre os empregados e 27% do total) e de trabalhadores por conta própria (25%). Os demais municípios da pesquisa, em sua grande maioria situam-se abaixo da média do Estado, com exceção de Porção de Pedras e Caxias (respectivamente 48% e 46% de empregados assalariados). Em contraposição, Cajapió e Presidente Vargas são os municípios com os mercados de trabalho menos estruturados, possuindo apenas, respectivamente, 12% e 16% das pessoas de dez anos ou mais de idade como empregadas assalariadas e, respectivamente, 88% e 84% enquadradas nas categorias de conta própria, não remunerados ou trabalhadores na produção para o próprio consumo.

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Tabela 03 - Pessoas de 10 anos ou mais de idade, por posição na ocupação no trabalho principal

Total Emprega

dos

Empregados

- com carteira

Empregados

- militares e

funcionários

públicos

estatutários

Empregados

- outros sem

carteira de

trabalho

assinada

Conta

própria

Emprega

dores

Ñ

remunerados

em ajuda a

membro do

domicílio

Trab. na

produção

p/ o

próprio

consumo

Maranhão 1914040 809365 236969 119434 452962 683376 24207 179296 217796

Municípios

Alto Alegre

do Maranhão 5618 1357 212 328 818 1081 - 446 2734

Barreirinhas 14423 2734 629 781 1325 5897 84 4343 1365

Cajapió 4227 499 124 44 331 2036 - 525 1167

Capinzal do

Norte 3990 755 133 110 511 2757 20 392 67

Caxias 45816 20963 4462 3843 12658 15930 473 2634 5816

Cedral 3091 915 50 328 537 1301 22 248 604

Maracaçumé 5013 1997 215 98 1685 1914 81 492 528

Poção de

Pedras 8323 4009 586 527 2896 1028 66 764 2457

Presidente

Vargas 4131 679 77 165 437 2423 3 900 127

Santa Quitéria

do MA 11354 2599 196 399 2004 3867 143 2860 1885

São João

Batista 6031 1349 126 192 1031 2647 - 1434 600

São Luis 300697 213046 101597 29821 81628 75963 6886 3456 1346

Viana 16103 4491 761 883 2847 7416 53 2677 1466

Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010

No que se refere à renda, a tabela seguinte demonstra a distribuição dos

domicílios particulares permanentes por classes de rendimento nominal mensal domiciliar per capita para o conjunto do Maranhão e para os municípios da amostra. Os dados evidenciam que são bastante elevados os percentuais de domicílios com renda domiciliar mensal per capita de até um quarto do salário mínimo. Com efeito, na média do Maranhão, estes representam 27% do total de domicílios, situando-se todos os municípios acima dessa média, com exceção de Caxias (24%) e de São Luís (8%). Nestes o maior número de domicílios se concentra nas faixas de um quarto a meio salário mínimo, no caso de Caxias e de meio a um salário mínimo no município de São Luís, que, por se tratar de uma capital, é o melhor situado também em relação a esse indicador. Em contraposição, o município em pior colocação é Presidente Vargas, com 47% dos seus domicílios possuindo rendimento nominal mensal domiciliar per capita de até um quarto do salário mínimo. Ademais, vale ressaltar que, excetuando-se São Luís, tanto na média do Estado como nos demais municípios da amostra mais de 75% dos domicílios possuem rendimento nominal mensal domiciliar per capita de até um salário mínimo.

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Tabela 04 - Domicílios particulares permanentes, por classes de rendimento nominal mensal

domiciliar per capita, segundo os municípios - Maranhão - 2010

Municípios

Domicílios particulares permanentes

Total

(1)

Classes de rendimento nominal mensal domiciliar per capita (salário mínimo)

(2)

Até 1/4

Mais de

1/4 a

1/2

Mais de

1/2 a 1

Mais de

1 a 2

Mais

de

2 a 3

Mais

de

3 a 5

Mais

de

5

Sem

rendimento

(3)

Total

1 653

701

438

412

449

462

392

254

148

413

39

621

29

146

24

369 131 942

Alto Alegre do Maranhão 5 849 2 156 1 925 1 084 220 36 15 13 400

Barreirinhas

12

133 4 458 2 830 2 234 619 128 87 54 1 723

Cajapió 2 590 1 193 591 398 59 14 9 2 324

Capinzal do Norte 2 880 1 006 768 704 148 32 14 8 199

Caxias

40

155 9 741

12

104

10

397 3 184 885 588 408 2 842

Cedral 2 597 1 111 660 526 125 19 13 10 133

Maracaçumé 4 610 1 457 1 376 1 090 328 61 39 16 243

Poção de Pedras 5 305 1 789 1 427 1 200 327 57 34 22 448

Presidente Vargas 2 511 1 176 542 390 104 23 6 10 260

Santa Quitéria do

Maranhão 6 356 2 740 1 744 1 262 237 42 22 20 289

São João Batista 5 063 2 183 1 299 809 140 32 19 15 566

São Luís

276

812

23

376

67

836

78

290

48

622

16

993

14

849

14

899 11 938

Viana

12

313 4 396 3 450 2 635 685 157 102 64 824

Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010

No que diz respeito ao nível educacional, o Maranhão ainda ostenta uma taxa de

analfabetismo da população de vinte anos ou mais de idade de 24%, situando-se a grande maioria dos municípios estudados acima dessa média, com exceção de São Luís, onde o índice de analfabetismo já caiu para 5%, segundo o censo de 2010, e Cedral e Viana, ambos com taxas equivalentes a 20%.

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Tabela 05 – População de 20 anos ou mais alfabetizadas

População com mais de 20 anos Alfabetizada Taxa de analfabetismo

Maranhão 3 858 462 2 943 639 24% Municípios

Alto Alegre do Maranhão 14060 9362 33%

Barreirinhas 28 408 19 942 30%

Cajapió 6 039 4 303 29%

Capinzal do Norte 6384 4 052 37%

Caxias 93299 66 171 29%

Cedral 6307 5 071 20%

Maracaçumé 10213 7 207 29%

Poção de Pedras 12002 7 676 36%

Presidente Vargas 5465 3 622 34%

Santa Quitéria do MA 15477 9 659 38%

São João Batista 11 995 9 003 25%

São Luis 677529 642 593 5%

Viana 28165 22 440 20%

Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010

A tabela a seguir apresenta a distribuição das pessoas de dez anos ou mais de idade por grupos de anos de estudo. Os dados evidenciam o baixo nível de escolaridade da população maranhense, se comparado ao conjunto do país. De fato, no Maranhão, 22% das pessoas de dez anos ou mais de idade são sem instrução ou possuem menos de um ano de estudo, contra 11% no Brasil. Excetuando-se São Luís (com um percentual de 5%, inferior, portanto, à média nacional), Cedral, São João Batista e Viana, todos os demais municípios ostentam percentuais superiores de pessoas sem instrução ou com menos de um ano de estudo em relação ao conjunto do Estado. Elevando-se o corte de escolaridade para menos de oito anos de estudo, observa-se que, mais uma vez, com a exceção de São Luís, tanto no Estado como um todo, como em cada um dos municípios do estudo, mais de 75% da população de dez anos ou mais de idade possui esse nível de escolaridade, ou seja, o ensino fundamental incompleto, sendo a média brasileira de 64%.

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Tabela 06 - Pessoas de 10 anos ou mais de idade por grupo de anos de estudo (Percentual)

Sem

instrução

e menos

de 1 ano

1 a 3

anos

4

anos

5 a 7

anos

8

anos

9 e

10

anos

11

anos

12

anos

13

anos

14

anos

15

anos

ou

mais

Não

determi-

nados

Brasil 10,95 18,88 15,96 18,33 8,93 6,43 12,74 0,85 0,83 0,89 4,32 0,88

Maranhão 21,55 28,47 11,91 15,59 5,58 4,73 9,22 0,27 0,24 0,23 1,03 1,18

Alto Alegre do

Maranhão 37,76 31,80 9,00 12,84 2,60 2,80 2,14 0,22 - 0,32 0,07 0,46

Barreirinhas 32,81 32,70 12,87 11,10 2,20 2,08 3,76 0,07 0,05 0,16 0,06 2,13

Cajapió 23,99 35,96 13,05 12,45 4,68 3,49 4,95 - 0,15 - - 1,28

Capinzal do Norte 31,10 33,41 11,27 12,71 4,00 2,26 3,77 0,11 - 0,06 0,08 1,24

Caxias 26,09 24,52 11,76 15,92 5,26 4,95 8,13 0,30 0,28 0,38 1,20 1,21

Cedral 17,35 25,52 17,49 20,52 5,35 5,79 7,13 0,06 0,10 0,05 0,29 0,34

Maracaçumé 27,15 34,77 11,09 12,92 4,01 3,44 3,13 0,33 0,13 0,09 0,32 2,61

Poção de Pedras 25,08 34,09 11,54 14,44 3,82 3,28 4,41 0,08 - 0,08 0,04 3,14

Presidente Vargas 23,49 36,77 11,34 14,19 3,97 2,52 5,70 0,12 - 0,03 0,25 1,62

Santa Quitéria do

Maranhão 26,12 40,06 12,20 10,07 2,62 1,89 4,69 0,09 0,09 0,08 0,43 1,65

São João Batista 17,02 34,72 16,72 15,95 3,49 4,76 4,98 - 0,27 0,08 0,19 1,83

São Luís 5,28 13,46 11,09 19,15 10,23 9,22 24,37 0,88 0,81 0,85 4,16 0,51

Viana 16,23 32,21 14,16 16,13 5,14 5,44 8,68 0,13 - 0,14 0,18 1,55

Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010

A próxima tabela demonstra a distribuição da população que freqüenta a escola por nível de ensino, podendo-se verificar a maior concentração no nível fundamental, o que se aplica ao conjunto do país, ao Estado do Maranhão e a todos os municípios pesquisados. Contudo, há que se observar que tal prevalência se manifesta mais fortemente no Maranhão do que no Brasil e que somente nos municípios de Viana, São João Batista, Poção de Pedras, Cedral e São Luís os percentuais de freqüência no ensino fundamental são inferiores à média maranhense. Cumpre destacar o município de São Luís, com o mais baixo percentual de freqüência no nível fundamental de ensino (58%, contra 64% no Brasil e 71% no Maranhão). Por outro lado, enquanto no Brasil 16% dos que freqüentam a escola encontram-se matriculados no ensino médio, no Maranhão este percentual cai para 10%, situando-se apenas os municípios de São Luís, Cedral e Caxias acima dessa média (18%, 14% e 12%, respectivamente).

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Tabela 07 - População que freqüenta a escola por nível de ensino

Municípios Tota

l

Crech

e

Pré-escolar

ou classe de

alfabetizaç

ão

Alfabetizaç

ão de

adultos

Fundament

al

Médi

o

Pré-

vestibula

r

Superior

de

graduaçã

o

Mestrad

o ou

doutorad

o

Brasil 100 2,09 11,57 0,86 63,45 15,55 0,82 5,36 0,3

Maranhão 100 1,31 13,7 1,43 71,06 10,36 0,43 1,67 0,04

Alto Alegre do

Maranhão 100 0,58 6,03 2,93 81,69 7,62 - 1,15 -

Barreirinhas 100 0,12 16,8 2,22 76,45 4,15 - 0,26 -

Cajapió 100 2,38 14,66 2,79 75,06 5,1 - - -

Capinzal do

Norte 100 0,5 10,3 1,14 79,44 8,07 - 0,5 0,06

Caxias 100 1,55 10,57 1,22 72,01 11,66 0,58 2,38 0,02

Cedral 100 0,45 15,66 0,37 68,32 14,12 0,31 0,76 -

Maracaçumé 100 1,08 11,58 0,26 78,28 7,56 0,1 1,14 -

Poção de Pedras 100 1,05 15,83 4,66 69,71 7,92 - 0,82 -

Presidente

Vargas 100 2,09 8,7 0,87 80,42 7,72 - 0,2 -

Santa Quitéria

do Maranhão 100 0,61 20,47 1,36 72,38 4,25 0,29 0,64 -

São João Batista 100 1,26 19,1 2,29 68,32 8,83 - 0,2 -

São Luís 100 1,06 14,63 0,29 57,9 18,77 1,51 5,67 0,16

Viana 100 0,51 17,36 2,05 69,1 10,17 0,29 0,53 -

Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010

Os indicadores relativos ao acesso a serviços básicos estão demonstrados na

tabela seguinte a qual evidencia que o serviço que apresenta a maior cobertura é o de energia elétrica, cuja taxa de cobertura aproxima-se de 100% na capital, São Luís, e supera 90% em todos os demais municípios, com exceção de presidente Vargas, onde 87% dos domicílios dispõem desse serviço.

Por outro lado, verifica-se que, na grande maioria dos municípios, o serviço com maior déficit de atendimento é o de esgotamento sanitário, incluindo-se a ligação à rede geral de esgoto ou a disponibilidade de fossa séptica. Com efeito, no município de São Luís apenas 64% dos domicílios têm acesso a esse serviço, encontrando-se todos os demais municípios muito abaixo dessa média. Somente os municípios de Maracaçumé, Cajapió e São João Batista possuem o maior déficit de atendimento, relativamente aos outros serviços, no abastecimento de água, como é o caso de Maracaçumé, ou na coleta de lixo, o que se aplica a Cajapió e São João Batista, os quais possuem uma cobertura insignificante desse último serviço (5% e 12%, respectivamente).

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Tabela 08 - Domicílios segundo o acesso de serviços básicos

Municípios Número de domicílios

paticulares permanentes

Abastecimento

de água

Rede de esgoto

ou Fossa séptica

Coleta de

lixo

Energia

elétrica

São Luis 276.812 211.360 175.794 252.337 276.337

Barreirinhas 12.133 4.094 1.866 4.359 11.248

Caxias 40.155 30.196 10.571 24.482 38.708

Alto Alegre do Maranhão 5.849 4.383 66 2.868 5.750

Porção de Pedras 5.305 2.418 1.220 2.194 5.175

Capinzal do Norte 2.880 2.169 244 668 2.774

Maracaçumé 4.610 1.457 1.616 2.414 4.548

Cedral 2.597 2.316 41 530 2.569

Presidente Vargas 2.511 787 104 539 2.197

Cajapió 2.590 1245 793 133 2.404

São João Batista 5.063 1.990 1.148 588 4.957

Viana 12.313 4.464 3.422 5.418 12.111

Santa Quitéria do Maranhão 6.356 3.052 190 1.757 5.969

Fonte: MDS (CENSO 2010)

A tabela a seguir apresenta o número de estabelecimentos de saúde por municípios e a sua distribuição entre as redes pública e privada. Os dados permitem constatar que, em termos quantitativos, em geral, há certa relação de proporcionalidade entre o número de estabelecimentos e o porte populacional dos municípios, embora daí não se possa concluir que tais estabelecimentos sejam suficientes para atender as necessidades da população do ponto de vista quantitativo e qualitativo. Contudo, algumas distorções podem ser identificadas, destacando-se o município de Barreirinhas, que, apesar de ser o terceiro em termos de porte populacional, possui apenas 25 estabelecimentos contra 36 existentes no município de Viana, que representa o quarto mais populoso. Da mesma forma, Santa Quitéria do Maranhão, quinto município mais populoso, dispõe de somente 10 estabelecimentos, contra 16 presentes em Porção de Pedras e 12 em São João Batista, respectivamente, oitavo e sétimo municípios do ponto de vista populacional. Quanto à distribuição dos estabelecimentos entre as redes pública e privada, verifica-se, na grande maioria dos municípios, a forte predominância da rede pública municipal, com exceção de São Luís, onde 75% dos estabelecimentos são da rede privada. Caxias, Viana, Poção de Pedras e Barreirinhas são os únicos municípios que, além de São Luís, possuem estabelecimentos privados de saúde, embora com participação minoritária e bem menos expressiva se comparados com a capital.

Tabela 09 - Estabelecimentos de saúde por rede pública ou privada

Municípios Quantidade de estabelecimentos

de saúde

Rede Pública Rede

Privada Federal Estadual Municipal

São Luis 283 3 16 52 212

Barreirinhas 25 0 0 22 3

Caxias 68 0 1 43 24

Alto Alegre do Maranhão 4 0 0 4 0

Porção de Pedras 16 0 0 15 1

Capinzal do Norte 6 0 0 6 0

Maracaçumé 7 0 0 7 0

Cedral 6 0 0 6 0

Presidente Vargas 5 0 0 5 0

Cajapió 4 0 0 4 0

São João Batista 12 0 0 12 0

Viana 36 0 1 27 8

Santa Quitéria do Maranhão 10 0 0 10 0

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FONTE: MDS (CENSO 2010)

No tocante aos estabelecimentos de ensino, a próxima tabela evidencia que, tal

como acontece com os estabelecimentos de saúde, também há certa relação de proporcionalidade entre o número de estabelecimentos de ensino e o porte populacional dos municípios. Uma das distorções identificadas se manifesta no município de Alto Alegre do Maranhão, que apesar de ser o sexto mais populoso, possui apenas 28 estabelecimentos, contra 76 em São João Batista e 75 em Poção de Pedras, que ocupam, respectivamente, a sétima e a oitava posição se considerado porte populacional. Quanto à distribuição por nível de ensino, predomina o ensino fundamental, seguido das creches ou pré-escolas. Já a oferta de ensino médio é bastante residual em todos os municípios, com exceção de São Luís. Do ponto de vista da distribuição entre as redes pública e privada, tanto na pré-escola quanto no ensino fundamental há forte predominância da rede pública municipal, com exceção de São Luís, em que prevalece a rede privada nesses níveis de ensino. Já no ensino médio, são predominantes os estabelecimentos da rede pública estadual inclusive em São Luís.

Finalmente, para caracterizar e medir a situação de pobreza nos municípios

pesquisados optou-se por utilizar, além dos indicadores anteriormente expostos, o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M) – (IPEA/PNUD, 2001) - e o Índice de Desenvolvimento Municipal (IMESC, 2010)

Isto porque a pobreza é aqui entendida como um fenômeno multidimensional que se expressa na privação de condições necessárias a uma vida digna. Nesse sentido, é vista não só como ausência de condições materiais, mas também, como a negação de condições para uma vida aceitável. Daí decorre a inadequação de identificar-se e transformar-se o problema da pobreza em apenas algumas dimensões da vida humana (como por exemplo: linha de rendimentos mínimos), mesmo sem deixar de reconhecer a importância desse indicador.

Nessa perspectiva, levando-se em conta primeiramente o IDH-M, trata-se de um

Tabela 10 - Estabelecimentos de ensino por nível e por rede pública ou privada

Municípios Tota

l

Ensino Pré Escolar Ensino Fundamental Ensino Médio

Fede

ral

Esta

dual

Munici

pal

Privad

as

Fed

eral

Estadu

al

Munici

pal

Privad

as

Fed

eral

Estadu

al

Munici

pal

Priv

adas

São Luis 944 0 0 78 322 1 112 100 261 4 68 0 61

Barreirinhas 168 0 0 161 1 0 3 170 2 0 4 0 1

Caxias 311 0 0 35 9 0 21 250 10 0 19 0 5

Alto Alegre do

Maranhão 28

0 0

22 0 0 1 27 0 0 1 0 0

Porção de Pedras 75 0 0 57 0 0 2 61 0 0 6 0 1

Capinzal do Norte 39 0 0 19 0 0 2 24 0 0 2 0 0

Maracaçumé 27 0 0 16 2 0 0 22 2 0 3 0 1

Cedral 24 0 0 16 0 0 1 17 0 0 1 1 0

Presidente Vargas 39 0 0 32 0 0 2 52 0 0 1 0 0

Cajapió 34 0 0 23 0 0 2 24 0 0 2 0 0

São João Batista 76 0 0 68 0 0 1 72 0 0 0 2 0

Viana 106 0 0 87 7 0 6 90 6 0 6 0 2

Santa Quitéria do

Maranhão 92

0 0

68 2 0 1 70 2 0 2 0 1

FONTE: MDS (CENSO 2010)

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índice composto obtido através da média aritmética simples de três sub-índices, respectivamente, IDH-Educação, IDH-Longevidade e IDH-Renda3.

Com base nesse índice, que tomou por base dados do censo de 2001, constata-se, pelo exame da tabela abaixo, que São Luís, por se tratar de uma capital, ocupa o primeiro lugar no ranking do Estado e, por conseguinte, da amostra pesquisada. Cedral e Viana são os segundos colocados, se considerado apenas o universo dos municípios estudados, sendo seguidos por Caxias e Maracaçumé que ocupam juntos a terceira posição nesse universo. Já a pior situação em termos de desenvolvimento humano é ostentada pelos municípios de Alto Alegre do Maranhão, Presidente Vargas e Capinzal do Norte, todos com um índice de 0,54.

Tabela 11 – Índice de Desenvolvimento Humano Municipal

Municípios IDH

São Luis 0,78

Barreirinhas 0,55

Caxias 0,61

Alto Alegre do Maranhão 0,54

Porção de Pedras 0,58

Capinzal do Norte 0,54

Maracaçumé 0,61

Cedral 0,62

Presidente Vargas 0,54

Cajapió 0,56

São João Batista 0,59

Viana 0,62

Santa Quitéria do Maranhão 0,56

FONTE: IPEA/PNUD, 2001

O Índice de Desenvolvimento Municipal, construído pelo Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e Cartográficos (IMESC), ligado à Secretaria de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão, se constitui em uma iniciativa recente, cuja última atualização foi feita com base em dados de 2009, visando a subsidiar a formulação de políticas públicas em âmbito municipal, mediante o uso de indicadores socioeconômicos disponíveis para os 217 municípios maranhenses. Sua vantagem está na multiplicidade de indicadores de que se utiliza para mensurar as condições de desenvolvimento

3 - Sub-índice do IDH relativo à dimensão Renda. É obtido a partir do indicador renda per capita média, através da fórmula: [ln (valor observado do indicador) - ln (limite inferior)] / [ln (limite superior) - ln (limite inferior)], onde os limites inferior e superior são equivalentes a R$3,90 e R$1560,17, respectivamente. Estes limites correspondem aos valores anuais de PIB per capita de US$ 100 ppp e US$ 40000 ppp, utilizados pelo PNUD no cálculo do IDH-Renda dos países, convertidos a valores de renda per capita mensal em reais através de sua multiplicação pelo fator (R$297/US$7625ppp), que é a relação entre a renda per capita média mensal (em reais) e o PIB per capita anual (em dólares ppp) do Brasil em 2000. A sigla ppp utilizada refere-se ao ajuste pela Paridade de Poder de Compra, uma metodologia,que permite corrigir a taxa de câmbio entre os países pelo poder aquisitivo da moeda em relação a uma cesta de bens diversificada de consumo geral. Sub-índice do IDH relativo à dimensão Longevidade. É obtido a partir do indicador esperança de vida ao nascer, através da fórmula: (valor observado do indicador - limite inferior) / (limite superior - limite inferior), onde os limites inferior e superior são equivalentes a 25 e 85 anos, respectivamente. Sub-índice do IDH relativo à Educação. Obtido a partir da taxa de alfabetização e da taxa bruta de freqüência à escola, convertidas em índices por: (valor observado - limite inferior) / (limite superior - limite inferior), com limites inferior e superior de 0% e 100%. O IDH-Educação é à média desses 2 índices, com peso 2 para o da taxa de alfabetização e peso 1 para o da taxa bruta de freqüência.

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socioeconômico de cada município. Trata-se de um conjunto de 48 indicadores distribuídos entre dois grandes grupos de indicadores correlatos que expressam aspectos relevantes no conceito de Desenvolvimento: Índice de Desenvolvimento Econômico (IDE) (composto pelos subgrupos infraestrutura, qualificação da mão-de-obra e produtividade e produção municipal) e Índice de Desenvolvimento Social (IDS) (constituído pelos subgrupos saúde, educação, oferta de serviços básicos e meio ambiente). (IMESC, 2010)

Segundo esse índice, São Luís também ocupa o primeiro lugar do ranking estadual, sendo seguido pelo município de Caxias (segunda posição na amostra pesquisada e décima terceira no ranking estadual). Em terceira e quarta posição na amostra encontram-se, respectivamente, Cedral e Maracaçumé, enquanto Presidente Vargas ostenta o último lugar do universo de estudo, tal como em relação ao IDH-M.

Tabela 12 - Índice de desenvolvimento municipal e ranking Municípios IDM Ranking

São Luis 0,770 1º

Barreirinhas 0,319 97º

Caxias 0,474 13º

Alto Alegre do Maranhão 0,335 84º

Porção de Pedras 0,348 71º

Capinzal do Norte 0,308 117º

Maracaçumé 0,356 59º

Cedral 0,381 44º

Presidente Vargas 0,272 170º

Cajapió 0,305 122º

São João Batista 0,299 138º

Viana 0,327 91º

Santa Quitéria do Maranhão 0,279 158º

FONTE: IMESC, 2010

Todo esse cenário aqui apresentado sobre o Estado do Maranhão e sobre os Municípios da pesquisa, per si, já justifica a necessidade de se desenvolver um Programa de Transferência de Renda, a exemplo do Bolsa Família, aliado ao fato de que em vários municípios do Maranhão o Fundo de Participação dos Municípios é a principal fonte de receita. Somada esta fonte com as demais transferências de recursos federais e estaduais (das quais se evidenciam as aposentadorias rurais e o Programa Bolsa-Família), em certos casos, o montante obtido chega a explicar quase a totalidade da renda gerada nesses municípios.

Isto posto, uma possibilidade de reversão da situação de pobreza e de extrema concentração da renda e da riqueza estaria na articulação da transferência monetária de renda com ações estruturantes nos campos da educação, da saúde, do acesso aos serviços básicos e do trabalho que pudessem romper com o ciclo da pobreza. 2.3 O Bolsa Família no Contexto da Política de Assistência Social no Maranhão e nos

Municípios Integrantes da Amostra da Pesquisa

O entendimento que orientou a pesquisa é de que o BF, enquanto o maior programa de transferência de renda em implementação no Brasil, em termos do público atendido e da natureza das ações, é considerado um serviço integrante da modalidade de proteção social básica no contexto da Política de Assistência Social - PAS. Os benefícios de transferência de renda objetivam o repasse direto de recursos dos Fundos da Assistência Social aos beneficiários, como mecanismo de acesso a renda, visando o enfrentamento da pobreza, da fome e demais formas de privação de direitos que conduzem a situações caracterizadas

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como de risco e vulnerabilidade. Visam ainda, oportunizar o acesso a serviços sociais básicos, bem como protagonismo e a emancipação das famílias tendo como horizonte a redução das desigualdades sociais.

A pesquisa evidenciou que, no geral, os municípios desenvolvem os principais Programas de Assistência Social financiados com recursos federais, destacando-se o BF, o Benefício de Prestação Continuada – BPC, os Serviços de Convivência, o PróJovem Adolescente, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI e Serviços de Acolhimento. Destes, o BF constitui o Programa de maior amplitude na PAS nos municípios em razão da cobertura a um amplo contingente de famílias.

Informações disponibilizadas no site do MDS em 23/01/2012 dão conta de que o total de famílias atendidas no Estado Maranhão, em dezembro de 2011, conforme demonstrado no quadro 01, era de 916.313 famílias, chegando a representar 110,44% do total de 833.084 famílias pobres estimadas pela PNAD 2006, considerando o perfil do BF que é de até CR$140,00 de renda per capita familiar mensal. Segundo essa mesma fonte, o total de recursos transferidos pelo BF para o Estado do Maranhão, em dezembro de 2011 foi de R$ 117.924.549,00. Se considerada a renda das famílias maranhenses, as transferências sociais representaram 21,3% do rendimento da população do estado, enquanto a média nacional foi de 19,3%, produzindo significativo impacto sobre a economia local (IPEA, 2010b). Igualmente considerando que cada família pobre atendida pelo BF tenha em média 04 pessoas, isso representa um total de 3.665.252 pessoas incluídas no BF, ou seja, 55% da população do estado.

Os dados acima expressam a significativa focalização do BF na pobreza no Maranhão que se configura como um dos estados mais pobres da Federação. Dados do IPEA (2010), que consideram o crescimento da pobreza por região e estados em período considerado de estabilidade, (1995-2008), informam que o Maranhão, em 1995, apresentou a maior taxa de pobreza absoluta (77,8%), seguido pelo Piauí (75,7%) e pelo Ceará (70,3%). Em 2008, Alagoas passou a assumir o primeiro lugar no ranking da pobreza absoluta (56,6%), passando o Maranhão para o segundo lugar (55,9%) e em terceiro lugar o Piauí (52,5%). Contudo, a pobreza extrema manteve o Maranhão na mesma segunda posição com uma taxa de 27,2%, permanecendo na frente também de Alagoas, com 32,3%. Configurando esse quadro, no estado do Maranhão são registradas as rendas per capitas mais baixas do Brasil, situação agravada com a precariedade do acesso a renda, a terra, ao trabalho e aos serviços básicos. No período entre 2002 a 2008, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita, segundo dados do IMESC (2009), manteve o estado no 26º lugar no ranking se considerados todos os estados brasileiros. Todavia, o estudo do IPEA (2010), considerando a expansão do PIB, no período 1995-2008, verificou que o Maranhão ostentou o terceiro maior crescimento (6,2%) entre os estados brasileiros, ficando atrás apenas de Tocantins (9,2) e do Distrito Federal (6,5%). Apesar da expansão no PIB, no período, o Maranhão manteve grande desigualdade de renda, medida pela queda média anual no índice de Gini entre 1995 a 2008 de apenas -0,75, enquanto Rondônia foi o estado com maior queda nesse índice (-1,3). Essa posição relativa do Maranhão é reafirmada pelo IDH de 2009, quando o estado obteve 0,683, seguido apenas de Alagoas com 0,677, sendo estes os únicos estados brasileiros a situarem-se num nível médio-baixo de desenvolvimento humano.

Se considerada a insegurança alimentar da população do Maranhão, embora esta tenha sido reduzida de 69,1% em 2004 para 64,6% em 2009, ainda população vive uma situação bastante preocupante haja vista que o índice de insegurança alimentar grave, reveladora da fome, atinge a 14,8% da população (IMESC, 2009).

Dentre os 13 municípios que compuseram a amostra da pesquisa de campo, o quadro 01 revela que, a exceção da capital São Luis, os demais municípios apresentam um percentual de cobertura de mais de 100%, quando considerada a população pobre perfil BF, destacando-se Poção de Pedras com 147,19%, Barreirinhas com 143,00%, São João Batista com 137,60% e Cedral com 131,42%. Portanto, chama a atenção o fato de São Luís apresentar uma cobertura do BF de apenas 79,95% em relação às famílias pobres com perfil para inserção no BF. Esse dado pode ser relacionado com o baixo desempenho do

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município quando considerada a gestão das condicionalidades do BF para composição do Índice de Gestão Descentralizada (IGD), conforme expresso no item 4 deste relatório, o que indica a necessidade de realização de um estudo específico sobre o BF em São Luís.

Quanto aos recursos transferidos aos treze municípios, todos os de Pequeno Porte I receberam, no mês de dezembro de 2011, mais de R$ 200.000,00, com destaque a São João Batista que recebeu R$ 499.678,00 por ter 3.034 famílias pobres com perfil BF e Poção de Pedras que recebeu R$ 440.688,00 por contar com uma população de 2.469 famílias pobres com perfil para inserção no BF. Os três municípios de Pequeno Porte II pesquisados receberam valores superiores s R$ 500.000,00, com destaque a Viana que chegou a receber R$1.094.826,00, tendo um total de 7.105 famílias pobres com perfil BF; Barreirinhas, o município de Porte Médio pesquisado, recebeu R$1.310.830,00; Caxias, município de Porte Grande, recebeu R$2.837162,00 e a metrópole, São Luís, apesar da baixa cobertura já registrada, recebeu também em dezembro de 2011, R$ 9.397.957,00. Esses dados expressam uma capacidade de focalização do BF na população pobre extremamente positiva e o significado dos recursos transferidos para dinamização das economias locais, principalmente dos menores municípios.

Portanto, pelo montante de recursos e amplitude de metas percebe-se que o BF é o programa socioassistencial de maior expressividade, podendo-se mesmo afirmar que é o Programa que maior visibilidade vem conferindo à Política de Assistência Social nos municípios, constituindo-se na demanda mais expressiva dessa Política, o que pode ser explicado pela cobertura e pela materialidade do Programa nas condições de vida das famílias mediante a transferência de renda.

Quadro 01 PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA

MUNICÍPIO ESTIMATIVA DE FAMÍLIAS

POBRES (PERFIL BF)

Nº DE FAMÍLIAS

ATENDIDAS PELO BF

Repasse em dez/2011 Em R$

COBERTURA DO BF %

ALTO ALEGRE DO MARANHÃO

3.505 4.032 516.656,00 (PII) 115,04

CAJAPIÓ 1.571 1.867 241.930,00 (PI) 118,4

CAPINZAL DO NORTE

1.580 2.021 245.120,00 (PI) 127,91

CAXIAS 19.664 21.990 2.837.152,00 (G) 111,83

CEDRAL 1.1.941 1.477 217.858,00 (PI) 131,42

BARREIRINHAS 6.597 9.374 1.310.830,00 (M) 143,00

POÇÃO DE PEDRAS

2.469 3.634 440.688,00 (PI) 147,19

PRESIDENTE VARGAS

1.442 1.718 240.462,00 (PI) 119,14

MARACAÇUMÉ 2.580 2.958 414.014,00 (PI) 114,65

SÃO JOÃO BATISTA

3.024 4.161 499.678,00 (PI) 137,60

SÃO LUÍS 98.644 78.868 9.397.957,00 (Met.)

79,95

SANTA QUITÉRIA DO MA

3.830 4.908 658.102,00 (PII) 128,15

VIANA 7.105 8.369 1.094.826,00 (PII) 117,79

MARANHÃO 833.084 916.313 117.924.549,00 110,44

Fonte: www.mds.gov.br acessado em: 23/01/2011

O BPC também apresenta expressividade no contexto da Política de Assistência Social nos municípios. Caracteriza-se por uma transferência monetária mensal, no valor de um salário mínimo, previsto pela Constituição Federal de 1988, no seu artigo 203, e assegurado pela Lei Orgânica de Assistência Social — LOAS (Lei nº 8.742, de 07.12.1993), nos artigos 21 e 22. Foi regulamentado pelo Decreto nº 1.744 de 11/12/1995, passando a ser concedido a partir de janeiro de 1996.

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Constitui-se como um benefício pago a pessoas idosas a partir de 65 anos de idade e a pessoas com deficiências, consideradas incapacitadas para a vida independente e para o trabalho. Os critérios para concessão do BPC, segundo o artigo 20 da LOAS, são: ter renda familiar mensal per capita inferior a 1/4 do salário mínimo; não possuir vínculo com nenhum regime de previdência social e, estar impossibilitado de prover sua manutenção ou tê-la provida por sua família. O benefício pode ser pago a mais de um membro da família, desde que comprovadas todas as condições exigidas, de modo que, para o cálculo da renda familiar, o benefício concedido ao outro membro passa a compor a renda, para efeito de cálculo da renda per capita familiar para concessão do novo benefício.

O quadro 02, abaixo, apresenta os números do Benefício de Prestação Continuada (BPC) no estado do Maranhão e nos municípios da amostra do estudo realizado, evidenciando um total de idosos e pessoas com deficiência atendidas no estado de 182.673 pessoas, com um total de repasse de recursos acumulados de janeiro a novembro de 2011 de R$ 1.081.562.718,86, representando uma média mensal de R$ 98.323.883,45.

Quadro 02 BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - BPC4

MUNICÍPIO Nº DE PESSOAS IDOSAS

ATENDIDAS

Nº DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

ATENDIDAS

TOTAL

ALTO ALEGRE DO MARANHÃO

100 131 231

CAJAPIÓ 21 59 80

CAPINZAL DO NORTE 26 46 72

CAXIAS 3.362 3.300 6.662

CEDRAL 33 43 76

BARREIRINHAS 135 515 650

POÇÃO DE PEDRAS 89 308 397

PRESIDENTE VARGAS 16 34 50

MARACAÇUMÉ 708 667 1.375

SÃO JOÃO BATISTA 106 301 407

SÃO LUÍS 28.349 15.349 43.698

SANTA QUITÉRIA DO MA 134 450 584

VIANA 846 1.005 1.851

Maranhão 89.517 93.156 182.673

Fonte: www.mds.gov.br acessado em: 17/12/2011

Em razão de o benefício monetário transferido pelo BPC aos idosos e pessoas com deficiência ser equivalente a um salário mínimo, montante significativamente superior aos valores transferidos pelo BF, mesmo com um quantitativo significativamente inferior ao público atendido pelo BF, os recursos financeiros transferidos pelo BPC chegam a se aproximar dos recursos transferidos ao estado pelo BF, recursos que somados com os do BF produzem impactos não apenas na dinamização da economia do estado e dos municípios, mas, sobretudo, propiciam mudanças, ainda que insuficientes, nas condições de vida das famílias em situação de pobreza e vulnerabilidade.

Outro programa de proteção social básica em implementação nos municípios espaço da pesquisa de campo é o Projovem. Trata-se de um serviço sócio-educativo de convívio, destinado a complementar a proteção social básica, propondo-se a criar mecanismos para garantir o direito à convivência familiar e comunitária. Visa também a criar condições para a inserção e permanência do jovem no sistema de ensino na perspectiva de sua inclusão, qualificando e valorizando a sua participação social através de atividades sócio-educativas. O público alvo é o jovem de 15 a 17 anos, preferencialmente de famílias beneficiárias do BF, ou que tenham participado do PETI, esteja vinculado ou tenha sido inserido no serviço de enfrentamento ao abuso e a exploração sexual (Sentinela), ou seja, egresso ou em cumprimento de medidas sócio-educativas (de internação e de proteção).

4 Incluindo a Pensão Mensal Vitalícia (PRMV)

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Como evidencia a quadro abaixo, o total de jovens atendido nos treze municípios é de 8.575, com volume maior de atendimento nos municípios de São Luís (4.600), seguido de Caxias (425), Barreirinhas e Viana, com 400 jovens cada.

Quadro 03 PROJOVEM ADOLESCENTE

MUNICÍPIO Nº DE COLETIVOS

Nº DE JOVENS ATENDIDOS

ALTO ALEGRE DO MARANHÃO 10 250

CAJAPIÓ 08 200

CAPINZAL DO NORTE 07 175

CAXIAS 57 1.425

CEDRAL 08 200

BARREIRINHAS 16 400

POÇÃO DE PEDRAS 08 200

PRESIDENTE VARGAS 05 125

MARACAÇUMÉ 08 200

SÃO JOÃO BATISTA 08 200

SÃO LUÍS 184 4.600

SANTA QUITÉRIA DO MA 08 200

VIANA 16 400

Fonte: www.mds.gov.br acessado em: 17/12/2011

Destacam-se ainda, no contexto da Política de Assistência Social nos municípios pesquisados os Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos no contexto da Proteção Social Básica. Compreende um conjunto integrado de serviços em diferentes áreas (educação, saúde, lazer, trabalho etc.), organizados por faixa etária que têm como objetivo a prevenção de possíveis situações de risco da família como um todo ou de seus membros, conforme identificação da situação de vulnerabilidade apresentada. Os serviços são organizados e articulados em torno do Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família – PAIF e caracterizam-se pela prevenção da segregação de crianças, jovens, pessoas com deficiência e idosos mediante ações grupais ou coletivas que viabilizem acolhimento, trocas culturais, vivências, experiências, socialização de famílias e indivíduos e convivência comunitária.

Os Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos devem oportunizar espaços de reflexão e convivência na perspectiva de inserção nos direitos, fortalecimento do protagonismo e dos vínculos familiares e comunitários, bem como reconstrução de projetos de vida (individuais e coletivos). Neste sentido deve possibilitar o acesso aos diferentes serviços socioassistenciais a ser organizados em rede, de modo a inseri-las nas diversas ações ofertadas.

O quantitativo contido no quadro abaixo totalizou, nos treze municípios pesquisados, 80.578 atendimentos a crianças, idosos e famílias, com destaque para São Luís (33.098 atendimento), seguido de Caxias (12.005 atendimentos) e Barreirinhas com 5.222 atendimentos, sendo que na tabela não são registrados atendimentos para os municípios de Capinzal do Norte, Cedral e Santa Quitéria do Maranhão.

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Quadro 04 SERVIÇO DE CONVIVÊNCIA DO IDOSO E/OU CRIANÇA ATÉ 06 (SEIS) ANOS

MUNICÍPIO Nº DE CRIANÇAS E/OU IDOSOS E SUAS FAMÍLIAS

ALTO ALEGRE DO MARANHÃO 1.983

CAJAPIÓ 887

CAPINZAL DO NORTE -

CAXIAS 12.005

CEDRAL -

BARREIRINHAS 5.222

POÇÃO DE PEDRAS -

PRESIDENTE VARGAS 1.144

MARACAÇUMÉ 1.579

SÃO JOÃO BATISTA 1.774

SÃO LUÍS 33.098

SANTA QUITÉRIA DO MA -

VIANA 2.789

Fonte: www.mds.gov.br acessado em: 17/12/2011

A Proteção Social Básica - PSB tem como principal unidade de execução os Centros de Referência da Assistência Social - CRAS que se caracterizam como unidades públicas estatais responsáveis pela oferta de serviços socioassistenciais continuados a famílias em situação de vulnerabilidade social. Nos CRAS devem ser ofertadas ações do PAIF, bem como ações relativas à segurança de renda, convivência social e prevenção contra riscos pessoais e sociais em consonância com a modalidade da PSB. O objetivo da PSB é a prevenção de situações de risco mediante o desenvolvimento de potencialidades e aquisições de serviços e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. Destina-se à população que vive em situação de vulnerabilidade decorrente da pobreza, ausência de renda, sem acesso ou acesso precário aos serviços públicos ou que apresentem fragilização de vínculos afetivos (discriminações etárias, étnicas, de gênero ou por deficiências, dentre outras).

Conforme o quadro 05, abaixo, nos treze municípios integrantes da pesquisa de campo, tem-se um total de 39 CRAS, com capacidade para atendimento de 34.600 famílias, destacando-se a capital São Luis com maior número de CRAS, 20 no total, e consequentemente com maior capacidade de atendimento. O município de Caxias aparece em seguida com 06 CRAS; Poção de Pedras e São João Batista com 02 CRAS cada um. Os demais municípios dispõem apenas de um CRAS.

Quadro 05 CENTRO DE REFERÊNCIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL – CRAS

MUNICÍPIO Nº DE CRAS CAPACIDADE DE ATENDIMENTO DAS

FAMÍLIAS

ALTO ALEGRE DO MARANHÃO 01 700

CAJAPIÓ 01 500

CAPINZAL DO NORTE 01 500

CAXIAS 06 6.000

CEDRAL 01 500

BARREIRINHAS 01 1.000

POÇÃO DE PEDRAS 02 1.200

PRESIDENTE VARGAS 01 500

MARACAÇUMÉ 01 500

SÃO JOÃO BATISTA 02 1.500

SÃO LUÍS 20 20.000

SANTA QUITÉRIA DO MA 01 700

VIANA 01 1.000

Fonte: www.mds.gov.br acessado em: 16/12/2011

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Além da PSB, considerada de caráter preventivo, a Política de Assistência Social também se materializa mediante a Proteção Social Especial - PSE que se destina a famílias e indivíduos em situação de risco pessoal ou social, cujos direitos tenham sido violados ou ameaçados. Para integrar as ações da PSE, é necessário que os indivíduos ou grupos estejam enfrentando situações de violações de direitos decorrentes de violência física ou psicológica, abuso ou exploração sexual; abandono, rompimento ou fragilização de vínculos ou afastamento do convívio familiar.

Diferentemente da PSB que tem um caráter preventivo, a PSE é de natureza protetiva. Constitui-se de ações que requerem o acompanhamento familiar e individual e maior flexibilidade nas soluções dos problemas. Comportam encaminhamentos efetivos e monitorados, apoios e processos que assegurem qualidade na atenção.

As atividades da PSE são diferenciadas de acordo com níveis de complexidade (média ou alta) e conforme a situação vivenciada pelo indivíduo ou família. Os serviços atuam diretamente ligados com o sistema de garantia de direito, exigindo uma gestão mais complexa e compartilhada com o Poder Judiciário, o Ministério Público e com outros órgãos e ações do Executivo. Cabe ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), em parceria com governos estaduais e municipais, a promoção do atendimento às famílias ou indivíduos que enfrentam adversidades.

No total dos municípios pesquisados observou-se que a PSE apresenta um atendimento mais restrito expresso nos serviços (PETI e Acolhimento) e no número reduzido de Centros de Referência Especializado da Assistência Social – CREAS (quadro 07) como unidades de atendimento da PSE. Apenas a capital São Luis e Caxias, que se encontram em nível de gestão plena, apresentam estrutura técnico-operacional para implementação de ações de PSE. Os treze municípios, conforme apresentado no quadro 06 desenvolvem como programa da PSE o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI, isto decorre, por um lado em razão de que muitos municípios já desenvolviam esse Programa o qual foi redirecionado para a PSE com a reorganização da Proteção Social a partir do Sistema Único da Assistência Social - SUAS em 2004. De outro lado, pela exigência de acompanhamento do BF na Assistência Social mediante o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos do PETI.

É neste sentido que se destacam entre as ações de PSE nos municípios da amostra as ações sócio-educativas e de convivência desenvolvidas pelo Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI). São ações que se destinam a crianças/adolescentes, em horário complementar ao da escola, mediante recreação, reforço escolar, artes, músicas, esporte, complementação alimentar. A intenção é manter crianças e adolescentes ocupados durante todo o dia, a fim de inviabilizar o seu retorno a atividades consideradas penosas, insalubres ou degradantes.

O quadro abaixo indica o número de crianças e adolescentes atendidos por ações sócio-educativas do PETI nos treze municípios considerados no estudo, evidenciando maior quantitativo dessas ações em São Luís (3.635), seguido de Poção de Pedras (1.575) e Maracaçumé (1.062).

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Quadro 06 AÇÕES SOCIOEDUCATIVAS E DE CONVIVÊNCIA DO PROGRAMA DE ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL – PETI

MUNICÍPIO Nº DE CRIANÇAS/ADOLESCENTES ATENDIDOS

ALTO ALEGRE DO MARANHÃO

675

CAJAPIÓ 224

CAPINZAL DO NORTE 151

CAXIAS 312

CEDRAL 34

BARREIRINHAS 196

POÇÃO DE PEDRAS 1.575

PRESIDENTE VARGAS 337

MARACAÇUMÉ 1.062

SÃO JOÃO BATISTA 341

SÃO LUÍS 3.635

SANTA QUITÉRIA DO MA 503

VIANA 289

FONTE: www.mds.gov.br acessado em: 16/12/2011

O CREAS é a unidade pública estatal que oferta serviços da PSE, especializados e

continuados, gratuitamente a famílias e indivíduos em situação de ameaça ou violação de direitos. Além da oferta de atenção especializada, o CREAS tem a função de coordenar e fortalecer a articulação dos serviços ofertados com a rede de assistência social e as demais políticas públicas referenciando determinado número de beneficiários por territórios locais ou de abrangência regional.

O quadro abaixo indica a existência de 13 CREAS no total dos municípios pesquisados, destacando-se que São Luís dispõe de 05 CREAS, quatro municípios não apresentam CREAS e os demais só dispõem de um CREAS em funcionamento. O total de famílias/pessoas atendidas em dezembro de 2011 foi de 780, enquanto o número total de adolescentes atendidos foi de 640. Quadro 07 QUANTITATIVO DE CREAS E DE FAMÍLIAS/PESSOAS E ADOLESCENTES ATENDIDOS

MUNICÍPIO Nº DE CREAS FAMÍLIAS/PESSOAS ATENDIDAS5

ADOLESCENTES ATENDIDOS6

ALTO ALEGRE DO MARANHÃO

01 50 40

CAJAPIÓ 0 - -

CAPINZAL DO NORTE 0 - -

CAXIAS 01 80 80

CEDRAL 0 - -

BARREIRINHAS 01 50 40

POÇÃO DE PEDRAS 01 50 -

PRESIDENTE VARGAS 0 - -

MARACAÇUMÉ 01 50 40

SÃO JOÃO BATISTA 01 50 -

SÃO LUÍS 05 400 440

SANTA QUITÉRIA DO MA 01 50 -

VIANA 01 50 40

Fonte: www.mds.gov.br acessado em: 16/12/2011

5 As famílias/indivíduos são atendidas pelo serviço de Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos –

PAEF e pelo Serviço de Abordagem Social. 6 Os adolescentes são atendidos pelo Serviço de Proteção ao Adolescente em Cumprimento de Medida

Socioeducativa em Meio Aberto – MSE.

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Destaca-se ainda nos serviços socioassistenciais da PSE ofertados nos municípios pesquisados os serviços de acolhimento. O Serviço de Acolhimento Institucional é o acolhimento efetuado em diferentes equipamentos sociais para famílias ou indivíduos com vínculos familiares rompidos ou fragilizados decorrente de abandono, maus tratos, negligência dentre outros, visando à garantia de proteção integral. A organização dos serviços mediante o abrigamento temporário deve assegurar a privacidade e o respeito às diversidades. Os serviços de acolhimento priorizam crianças e adolescentes, adultos e famílias, pessoas com deficiência, idosos e mulheres em situação de violência.

O atendimento deve ser prestado em pequenos grupos em unidades inseridas na comunidade visando favorecer o convívio familiar e comunitário. Os espaços devem apresentar características residenciais, com estrutura física adequada de modo a propiciar um ambiente acolhedor com condições de habitabilidade, higienização, salubridade, segurança e privacidade, respeitando as especificidades do público atendido.

Trata-se de serviços cuja complexidade requer uma estrutura que a maioria dos municípios maranhenses não possui considerando a sua reduzida capacidade de gerenciamento administrativo, a pouca densidade econômica, as desigualdades socioeconômicas entre eles e a também reduzida tradição administrativa. Soma-se a esses elementos fatores de ordem política e cultural, além da dificuldade de recursos e capacidade institucional para ofertar serviços condizentes às diferentes demandas sociais. (ARRETCHE, 2000).

O quadro abaixo evidencia que a oferta de Serviços de Acolhimento encontra-se restrita a quatro dos treze municípios da pesquisa, com o registro de um total de 540 atendimentos, em dezembro de 2011, com maior destaque para São Luís, com 400 atendimentos, seguido de Caxias com 100 atendimentos.

Essa restrição pode ser explicada, conforme assinalado anteriormente, pelo nível de gestão em que se encontram a maioria dos municípios, a gestão básica, o que evidencia a ausência de estrutura técnico-operativa compatível com as exigências e níveis de complexidade da PSE. Apenas São Luis e Caxias por apresentarem nível de gestão plena, com capacidade técnica e operacional para implementação dos serviços, conseguiram avançar na consolidação da PSE com uma rede de serviços de média e alta complexidade.

Quadro 08 SERVIÇO DE ACOLHIMENTO MUNICÍPIO FAMÍLIAS E INDIVÍDUOS

ATENDIDOS

CAPINZAL DO NORTE 20

CAXIAS 100

POÇÃO DE PEDRAS 20

SÃO LUÍS 400

FONTE: www.mds.gov.br acessado em: 16/12/2011

Ainda na Proteção Social Especial os municípios de Caxias e São Luís ofertam Serviços para Pessoas com Deficiência, Idosas e suas Famílias, atendendo, respectivamente, a 112 e 356 pessoas com deficiência e idosos em situação de dependência. Registra-se, também, que a capital desenvolve o Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua, atendendo a um total de 160 famílias/indivíduos.

A institucionalização da PAS nos municípios maranhenses revela um processo que avança em meio a adversidades em termos políticos e estruturais o que se reflete na oferta, ainda insuficiente, fragmentada e segmentada dos serviços socioassistenciais nas diferentes modalidades de proteção: básica e especial.

Nesse contexto merece destaque a centralidade assumida pelos programas de transferência de renda, especificamente o BF, com uma considerável expansão de metas e cujo protagonismo tem conferido grande visibilidade a Assistência Social chegando a ser identificado com esta. Nos municípios pesquisados cabe assinalar que a referência de atendimento da Assistência Social é a unidade em que é feito o atendimento do BF, a exemplo de Viana e São João Batista em que o órgão gestor constitui-se referência para as

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famílias no atendimento ao BF. Nesses municípios os CRAS, por não realizarem esse atendimento, apresentam procura restrita, sendo até mesmo desconhecidos pelas famílias (confira-se no item 03 deste Relatório).

Considerando que o BF se configura como o programa de maior abrangência no contexto da PAS e dos serviços socioassistenciais coloca-se como desafio um processo investigativo que busque compreender e explicitar o BF na consolidação da Assistência Social. 3 AS CONDICIONALIDADES DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA NO ESTADO DO

MARANHÃO

Condicionalidades, no contexto do Programa Bolsa Família (BF), representam compromissos assumidos tanto pelas famílias beneficiárias quanto pelo poder público. As famílias devem cumprir determinadas exigências na área educacional e de saúde para permanecer recebendo o benefício financeiro. Os beneficiários também devem cumprir requisição na área de assistência social, ainda que o seu descumprimento não implique em risco de perda do benefício. Já o poder público deve ofertar os serviços educacionais, de saúde e de assistência social no intuito de assegurar e ampliar o acesso dessas famílias a direitos sociais básicos.

Neste item, apresentam-se os resultados da pesquisa de campo no qual se sintetiza e analisa informações sobre o acompanhamento das condicionalidades nos 13 municípios da amostra, considerando: as entrevistas realizadas com os gestores municipais do BF, assim como os gestores estaduais e municipais de cada condicionalidade; as discussões nos grupos focais nos municípios, com a participação de técnicos dos Conselhos Regionais de Assistência Social (CRAS), representantes dos Conselhos Municipais de Assistência Social (CMAS) e usuários do BF. Estas informações são complementadas por observações dos pesquisadores feitas durante sua permanência nos municípios. Embora se analise e problematize objetivamente os dados da pesquisa, procura-se ser fiel às concepções dos entrevistados, tentando reproduzir sua própria visão sobre seu trabalho e as condições concretas em que ele ocorre. 3.1 O acompanhamento da Saúde

Na saúde, os compromissos assumidos pelas famílias são, no caso de crianças menores de 7 anos, os de manter atualizado o cartão de vacinação e acompanhar o seu crescimento e desenvolvimento (por meio de pesagem, medição e exames). No caso de mulheres entre 14 e 44 anos, estas são obrigadas a realizar o pré-natal, acompanhando sua saúde e a do bebê.

Cabe ao município realizar o acompanhamento da agenda de saúde da família e, para isso, torna-se fundamental que haja articulação e organização do fluxo de trabalho entre a secretaria de saúde e o responsável pelo BF na instância municipal. O processo de acompanhamento inclui ações para verificação periódica do cumprimento das condicionalidades (duas vezes ao ano), devendo os resultados do acompanhamento ser registrados no sistema informacional disponibilizado pelo Ministério da Saúde – Sistema de Gestão do Programa Bolsa Família na Saúde. O Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN) na assistência à saúde é também utilizado no acompanhamento da condicionalidade, o qual é efetuado pelo município mediante registro semestral. Os efeitos do descumprimento das condicionalidades repercutem de forma gradativa no âmbito federal (por meio de advertência, suspensão e cancelamento) utilizando o Sistema de Condicionalidades (SICON). Igualmente, é função dos municípios oferecer ou restabelecer a oferta regular e com qualidade dos serviços de saúde, bem como apoiar as famílias mais vulneráveis, com maior dificuldade em acessar esses serviços.

O processo de acompanhamento, em âmbito local, se inicia com o envio do Mapa de Acompanhamento às Secretarias Municipais de Saúde pelo Ministério da Saúde contendo a lista das famílias beneficiárias do BF com perfil saúde (famílias com crianças menores de 7

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anos e com prováveis gestantes – mulheres entre 14 e 44 anos). Esse Mapa é distribuído pelo coordenador municipal do Programa na Saúde às Unidades de Saúde e/ou equipes de Saúde da Família para registrar as informações. Tais informações são devolvidas em prazos que devem ser estipulados como rotina à Coordenação Municipal do Programa na Saúde a qual as repassa aos setores competentes.

Os serviços são ofertados como rotina pelo Sistema Único de Saúde – SUS - na perspectiva da integralidade, universalidade e gratuidade. O acompanhamento da agenda de saúde das famílias do BF busca, nesse contexto, assegurar que famílias mais vulneráveis tenham assegurada a efetivação desses direitos sociais aos quais, sem esse apoio do Estado, elas não teriam acesso.

O que a pesquisa de campo mostra é que a Saúde é a área menos estruturada dentre as que realizam o acompanhamento dos beneficiários do BF nos municípios que compuseram a amostra, o que pode ser demonstrado pelas precárias condições de infraestrutura para a realização do controle das contrapartidas exigidas das famílias (precariedade de espaço físico e inexistência ou insuficiência de equipamentos, recursos materiais, humanos e financeiros), bem como pelo não reconhecimento e incorporação dessa função como parte da dinâmica de prestação rotineira dos serviços de saúde, observando-se certa improvisação, ou seja, a não rotinização das ações de acompanhamento dessa condicionalidade, tendo o gestor do BF na Saúde que lidar com a não habituação dos sujeitos sociais quanto aos procedimentos necessários. Essa não habituação acaba por levar tais sujeitos, nos vários níveis hierárquicos, a considerar o acompanhamento das famílias do BF como uma tarefa a mais, que representa um sobre-trabalho.

Apenas no município de Viana o gestor declarou que as ações solicitadas pelo BF não se constituem novidade no trabalho dos agentes de saúde, pois todos os procedimentos de acompanhamento já são comumente utilizados pelas equipes de Saúde da Família, como se pode ver no depoimento a seguir:

“...a avaliação antropométrica, a gente já trabalha desde os primórdios da avaliação nutricional. Assim também a parte de imunização, a parte do pré-natal. A gente tem as equipes de Saúde da Família que atuam diretamente nessa área: os agentes de saúde, os enfermeiros, médicos, técnicos em enfermagem (coordenador do SISVAN no município).

Em Caxias, por seu turno, pelo depoimento da responsável pela condicionalidade da Saúde depreende-se que as tarefas dos agentes de saúde na dinâmica de acompanhamento das famílias beneficiárias do Bolsa Família fluem de forma contínua e sistemática como se vê:

“na saúde é mais fácil porque o agente de saúde entra na casa daquela família, já tem aquele ciclo de amizade...a gente treina o agente de saúde para explicar que é preciso fazer o acompanhamento. Eles visitam, fazem o acompanhamento”.

A situação comum, contudo, é uma preocupação centrada somente na coleta e no repasse das informações solicitadas pelo Ministério do Desenvolvimento Social (MDS). Mesmo que todos afirmem acompanhar o calendário vacinal, do crescimento e do desenvolvimento das crianças menores de 7 anos e as mulheres no pré-natal e as nutrizes, a situação apontada aparece claramente quando os gestores restringem o processo ao controle burocrático ou quando reconhecem realizar mutirões no momento das vigências e da necessidade de inserir os dados no sistema, como se vê no depoimento a seguir: “Tem também o mutirão, a gente avisa, eu vou e faço entrevista na rádio, avisando do mutirão”. (Gestora do PBF na Saúde de Alto Alegre)

Por outro lado, apenas dois municípios (Santa Quitéria e Presidente Vargas) declaram que as equipes realizam ações de promoção da saúde que incluem as famílias do BF e que visam melhoria da qualidade de vida destas, envolvendo alimentação saudável, atividade física, oficinas de alimentação alternativa e outras. Ainda que as equipes de saúde possam estar realizando esse trabalho, este, caso exista, não parece ser reconhecido como

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parte do BF, como um fator necessário (ainda que não suficiente) ao rompimento do ciclo da pobreza ao permitir o desenvolvimento social da população mais vulnerável.

Pelo desenho do Programa, cabe à Secretaria Municipal de Saúde capacitar as equipes de saúde para realizar o acompanhamento de gestantes, nutrizes e crianças das famílias do PBF na sua área de atuação, bem como estimular e mobilizar as famílias para o cumprimento da condicionalidade, realizando ainda junto a estas, ações educativas visando melhoria das suas condições de saúde.

Contudo, apenas São Luís e Alto Alegre afirmam ter realizado algum processo de capacitação mais sistemático, mas este parece não ter alcançado o resultado desejado, provavelmente em razão de sua pouca frequência (apenas um e no início do trabalho) e da pouca eficácia das ações de capacitação em termos de mudança significativa no posicionamento dos sujeitos sociais em relação à tarefa que lhes cabe no acompanhamento dos beneficiários do Bolsa Família que residem na sua área de atuação. Pode-se levantar a hipótese de que o Programa tem se beneficiado dos processos de capacitação aos quais os profissionais têm tido acesso no contexto da Atenção Básica de Saúde, mas não são complementados por atividades que os habilitem a cumprir o papel que lhes cabe no âmbito do Programa. Por outro lado, também não foi identificada preocupação com a capacitação do pessoal que lida com os sistemas de informação.

Os gestores de Cajapió e Presidente Vargas se referem a reuniões e a planejamentos para repasse de informações, porém essas iniciativas não parecem suficientes para atender a essa necessidade. Não se pode afirmar que os demais municípios não realizam treinamentos, mas o próprio fato de os gestores não o declararem talvez seja um indício da não priorização dessas ações no contexto da operacionalização da Política.

Quanto à mobilização das famílias, esta é feita através da colocação de faixas, da utilização de carros de som, de notícias em rádios comunitárias, mas ficam restritas aos períodos de vigência da condicionalidade, quando se realizam mutirões para atualizar a agenda de saúde das famílias. Apesar desses esforços, há gestor que reconhece que a falta de divulgação e de um esclarecimento mais amplo dos beneficiários é um dos principais entraves ao alcance dos índices desejáveis de acompanhamento do cumprimento da condicionalidade pelas famílias, sendo um desses o gestor da Saúde do município de São Luís.

Mas, em geral, as baixas taxas de famílias com acompanhamento apresentadas, no âmbito da condicionalidade da saúde, são atribuídas às próprias famílias as quais só cumpririam as condicionalidades, na visão dos entrevistados, quando em ameaça de suspensão ou bloqueio do benefício, tal como se pronuncia o gestor de Alto Alegre:

“Geralmente quando tem advertência, eles nem ligam. Eles não passam nem na secretaria de Assistência Social para saber o que está acontecendo. Mas aí dois meses depois vem suspensão, aí todo mundo vai, quando mexe com o dinheiro! Mas quando tem lá no papelzinho só “advertência”, mas ainda não tem problema nenhum no benefício, tá tudo bem!”

Assim, o não alcance das metas de acompanhamento ocorreria, segundo esse raciocínio, unicamente pelo fato do beneficiário não querer ou não gostar de ir ao hospital ou ao posto de saúde, como diz o gestor de Santa Quitéria. Na mesma linha de raciocínio se coloca digitadora do SISVAN de Cajapió, segundo a qual os baixos índices de acompanhamento se devem ao fato de os beneficiários não comparecerem ao hospital. Uma fala síntese dessa visão é a da gestora do PBF de Capinzal: “de certa forma, as famílias estão mal acostumadas com o Bolsa”

O Secretário de Assistência Social que é também gestor do BF no município de Cedral destacou, inclusive, que a assistente social ameaça tomar o cartão quando verifica o não cumprimento de condicionalidades ou quando identifica que o dinheiro recebido não é “aplicado corretamente”, o que denota visíveis mecanismos de controle sobre as famílias pobres.

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Essa é, portanto, uma visão generalizada, dela não sendo exceção São Luís, onde os técnicos

acreditam que a própria concepção dos beneficiários minimiza o potencial para seu desenvolvimento pessoal e familiar a partir do cumprimento das condicionalidades porque os impedem de ver “além do benefício” (técnico do CRAS da Cidade Olímpica em São Luís). Para esses técnicos, “a grande maioria tem uma visão focada no benefício em si” (técnico do CRAS da Cidade Olímpica em São Luís). Portanto, os beneficiários não se sentiriam

motivados a cumprir as exigências do Programa, particularmente na área da saúde. A gestora de São

João Batista evidencia que a dificuldade do acompanhamento da condicionalidade na saúde

está ligada ao fato das famílias não terem clareza dos benefícios de manter atualizada sua agenda de saúde.

Com isso, o acompanhamento assume um caráter controlador e mesmo punitivo, dentro de uma concepção moralista e conservadora. Mesmo que os entrevistados não afirmem explicitamente que “cada um deve obter na sociedade somente o que vier pelo suor do seu trabalho”, essa visão culpabiliza os beneficiários pelo não cumprimento das exigências que lhe são impostas. Por meio dessa concepção se omitem problemas estruturais do funcionamento das três principais políticas envolvidas, não levando em conta que o acompanhamento das famílias tem como objetivo contribuir para assegurar o compromisso do poder público em prover e garantir o acesso das famílias a serviços de qualidade que contribuam para a sua saída da condição de vulnerabilidade.

Especificamente sobre a condicionalidade da saúde, os beneficiários revelam que não conseguem ter acesso aos serviços por falta de médicos e outros profissionais, carência de material e de equipamentos nas unidades de saúde. Assim eles se expressam:

“a gente vai para o hospital, mas não tem médico ou tem muita fila ou não tem mais vaga e aí vai hoje, vai amanhã... Aqui é difícil porque às vezes nem vacina tem” (beneficiário do CRAS Bacanga em São Luís). Acrescentam: “vem de manhã, vem de tarde; quando consegue marcar a consulta, descobre que não pode fazer o exame porque a máquina está quebrada há dois meses” (beneficiário do CRAS Bacanga em São Luís).

Como estratégia para não perder o benefício, os beneficiários recorrem aos serviços de outros bairros, mas que também têm problemas. Por isso, em sua ótica, “a gente faz o que é para ser feito, a gente faz o que eles querem, mas eles não fazem a parte deles, não fazem o que deve ser feito” (beneficiário do CRAS Bacanga em São Luís). Os beneficiários mostram nos seus depoimentos que existem mecanismos que “obrigam” as famílias a cumprirem sua parte no “acordo” entre elas e o poder público. Contudo, não existem formas de assegurar o compromisso do poder público nesse mesmo “acordo”. Ademais, com o descumprimento do poder público de sua parte nesse “acordo” as famílias é que poderão ser “punidas” ao serem impossibilitadas de acessar os serviços em razão da precariedade, insuficiência ou mesmo inexistência destes.

Por isso, não basta os setores específicos responsáveis pela verificação das contrapartidas se estruturem para realizar o acompanhamento das famílias. É preciso que o poder público se responsabilize em prover serviços de qualidade e com regularidade, sobretudo nas áreas da saúde e da educação, as quais não têm garantido o acesso aos mais vulneráveis, mesmo que tais serviços sejam formalmente universais.

Nesse aspecto em particular observam-se melhorias muito tímidas nas Políticas Públicas, estando elas ainda distantes do objetivo de inclusão efetiva dos segmentos mais vulnerabilizados, tal como preconizado pelo Bolsa Família. Identificam-se poucos gestores, tal como a de Presidente Vargas, que entendem que a pressão para realizar um maior controle do cumprimento das condicionalidades pode vir a contribuir para a estruturação da Saúde e da Educação, pois, para a gestora “isso faz com que as políticas comecem a funcionar”, Ela ainda menciona que no seu município “antes não tinham local para consulta, mas agora têm um espaço aonde os agentes de saúde vão, marcam o dia e aí vai e aplica vacina, as gestantes fazem o pré-natal, tem o peso [...]” (gestora de Presidente Vargas).

Pelos depoimentos fornecidos infere-se que os problemas identificados no processo de acompanhamento são, em parte, um reflexo da baixa efetividade das Políticas Públicas

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em geral e da de Saúde, Educação e Assistência Social em particular. Agente de saúde que participou do grupo focal em Barreirinhas afirma que os problemas detectados no acompanhamento devem-se às fragilidades do sistema de saúde do município, pois o trabalho “fica na ação técnica, pois quando é detectado algum problema de saúde mais sério, este não é resolvido por falta de médicos e enfermeiros nos postos de saúde dos bairros. Além disso, o município só possui um hospital que é destinado a atender emergências e não para fazer consultas” (agente de saúde – grupo focal em Barreirinhas). De acordo com a entrevistada o próprio PSF realiza uma assistência limitada: “[...] Eu sou uma agente de saúde, eu vou ser bem clara. Não tá como a gente gostaria que estivesse, está andando, mas precisa melhorar, precisa muito.” (agente de saúde).

O que acontece nesse município é representativo dos demais: cobra-se dos usuários o cumprimento das condicionalidades sem que o próprio município consiga efetivar o direito à saúde, pois não oferece as condições de acesso aos serviços por falta de médicos, enfermeiros ou carro para atendimento. Quanto aos usuários, estes em sua maioria parecem estar cumprindo as exigências, mesmo que por medo de perder o benefício, mas percebem que há distância entre a intencionalidade e as reais condições de acesso aos serviços de saúde, educação e assistência social nos municípios já que o Programa não tem conseguido induzir os gestores locais a investirem em expansões e melhorias desses serviços. Na verdade, os municípios parecem estar realizando apenas aquilo que consideram necessário para cumprir as exigências, muito mais de caráter burocrático, do que foi pactuado com o governo federal.

Vê-se, então, que os serviços não são prestados com a regularidade necessária e a qualidade exigida nos municípios pesquisados, embora alguns possam estar mais bem situados do que outros nesse aspecto. Se o BF considera essa prestação como condição para o rompimento do ciclo intergeracional da pobreza esse fato compromete o sucesso dessa Política como política social de caráter estrutural.

Além dos serviços de saúde não serem oferecidos a contento, o próprio trabalho de acompanhamento, conforme dito antes, é desenvolvido dentro de uma estrutura desfavorável a uma real institucionalização do acompanhamento como responsabilidade do poder público, ainda que haja esforços nessa direção. Nesse quadro, as situações mais críticas são aquelas de municípios nos quais nem sequer existem responsáveis da área da saúde para coordenar o processo (Cajapió, São João Batista), que têm pouco ou nenhum domínio sobre a dinâmica de acompanhamento (Santa Quitéria, Capinzal, Poção de Pedras) ou que têm uma visão de acompanhamento centralizada na gestão de sua área específica e, sobretudo, no manuseio do sistema informacional (Alto Alegre).

Nos municípios maranhenses que fizeram parte da pesquisa, incluindo São Luís, que é a capital do estado, o acompanhamento da agenda de saúde é desenvolvido sem maior integração com as demais áreas, tendo sido identificado um município, inclusive, no qual a gestora municipal nem sequer conhece o responsável local pelo PBF na Saúde (São João Batista). Os municípios atuam com pessoal restrito, funcionando em salas improvisadas e inadequadas, muitas vezes sem dispor de materiais e equipamentos suficientes para o desenvolvimento do trabalho. Por outro lado, em relação às instâncias que devem realizar o acompanhamento diretamente junto às famílias podem ser detectadas situações variadas. Existem municípios em que tais instâncias, mesmo realizando o acompanhamento, ainda não o incorporaram plenamente na sua rotina de trabalho, ainda que já se observe ligeiro avanço nessa direção, como por exemplo, em São Luís: “As próprias unidades já estão traçando novas estratégias, já estão percebendo a necessidade de ir acompanhando essas famílias ao longo do semestre e não apenas naquele período que a vigência está em curso”.

Em Caxias há uma situação diferente, pois apesar do sentimento do gestor de Saúde de desenvolver seu trabalho de certa forma um tanto isolada e dentro de uma estrutura mínima, isso, certa forma, é compensado pelos níveis executivos (agentes de saúde, postos de saúde e técnicos dos CRAS), nos quais se observa certo nível de habituação dos encarregados quanto aos procedimentos relativos ao acompanhamento das

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condicionalidades e ao repasse das informações às instâncias devidas, além de articulação entre as áreas do Programa.

Outra situação é a apresentada por municípios em que a coordenação do trabalho não é realizada por pessoal que responda pela função de gestão junto ao BF, tal como ocorre no município de Capinzal no qual são os digitadores do sistema que praticamente coordenam o acompanhamento. Segundo a psicóloga de Capinzal que participou do grupo focal, “são eles que distribuem os mapas aos agentes de saúde os quais, por sua vez, fazem as visitas domiciliares para acompanhar a vacinação, o peso e o pré-natal”.

Em Cajapió na falta de um coordenador da área da Saúde, o próprio gestor do BF e os encarregados do sistema de informação é que fazem o controle. Convém dar destaque ao fato de que em Cajapió os agentes de saúde não realizam visitas domiciliares na zona urbana do município, sendo o atendimento realizado unicamente no hospital, resultando em alto percentual de famílias sem acompanhamento da agenda de saúde. Quanto a isso, posiciona-se a digitadora do SISVAN: “Não vem, não veio. Fica por isso mesmo. Às vezes, nem sempre, mas quando a gente pode, a gente comunica o agente de saúde pra tentar localizar os usuários.” (digitadora do SISVAN). Já na zona rural o acompanhamento, mesmo não sendo o ideal, funciona um pouco melhor, pois os agentes de saúde se deslocam até os povoados, montam um posto de atendimento e convocam as famílias fazendo com que a maior parte das famílias acompanhadas no município esteja localizada na zona rural.

É importante também enfatizar que em Caxias os gestores adotam muito claramente a ideia de acompanhamento como presença do poder público enquanto um suporte para as famílias no enfrentamento de suas dificuldades, observando-se que o foco da proteção

social está na família, como preconiza a Política de Assistência Social. Os técnicos atribuem a amplitude do trabalho assistencial “a ter toda essa equipe técnica de psicóloga, assistente social, advogada, nutricionista, direcionada a essas famílias. Há um trabalho em conjunto”. Apesar disso, não existem elementos que permitam afirmar se essa abordagem representa de fato uma superação da ideologia que toma o indivíduo isolado de suas relações sociais e que culpa as próprias famílias por sua situação de pobreza por considerá-las incapazes de aproveitar as oportunidades oferecidas pelo Estado para resolverem seus problemas. Além desses diversos problemas identificados, o monitoramento referente ao cumprimento das contrapartidas por parte das famílias até então realizado, no conjunto dos municípios pesquisados, não tem também servido como instrumento capaz de (re)orientar as Políticas Públicas, pois os dados coletados e o acompanhamento feito não têm um uso estratégico ao não representarem subsídios importantes em outras iniciativas, como por exemplo, naquelas relacionadas à Atenção Básica ou à própria assistência prestada pelos agentes de saúde. Visto por esse prisma, tal monitoramento parece se constituir muito mais numa estratégia de controle dos beneficiários (que sofrem diversas punições) do que de garantia de direitos sociais, por meio do acesso aos serviços básicos.

Algumas falhas no acompanhamento dizem respeito ainda às dificuldades em localizar os beneficiários. Isso se dá, por um lado, em razão de constantes mudanças de endereço por parte das famílias sem a devida comunicação à Secretaria de Assistência Social ou à coordenação do Bolsa Família e, por outro, por erros no Mapa de Acompanhamento enviado pelo Ministério.

Da mesma forma se coloca o gestor de Barreirinhas segundo o qual as falhas no fluxo das informações, às vezes, vêm do próprio Ministério, tais informações ou são incompletas, ou falsas ou desencontradas. Complementa: “Outra dificuldade é o fato de o próprio sistema SISVAN não manter atualizada a lista de beneficiários. O que ocorre é que pessoas que não recebem mais o benefício constam em lista para serem acompanhadas, e pessoas que estão recebendo não aparecem na lista. Ou seja, nunca são acompanhados 100% dos beneficiários”.

O gestor da Saúde de Maracaçumé ressalta a mesma dificuldade relacionada a problemas na base de dados, como se observa: “a gente tá com um problema muito grande para alimentar e atualizar os dados, famílias que não recebem, mas estão tendo acompanhamento. Quer dizer aí tá algo desatualizado”.

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É relevante recolocar que não se verificam esforços na direção de uma gestão compartilhada nos municípios investigados. No caso específico da Saúde, os esboços de articulação encontrados parecem ocorrer mais por necessidade sentida pelos gestores dessa área, quando buscam os responsáveis dos CRAS, da Secretaria de Assistência Social ou do próprio BF no município visando sua contribuição na potencialização do acompanhamento da sua condicionalidade, o que se configura muito mais como uma estratégia de resolução de alguns gargalos na localização e abordagem dos beneficiários, como se vê no depoimento do gestor da São Luís, segundo o qual seu desempenho pode melhorar “com essa estratégia de entregar para o CRAS porque a assistência social tem uma abordagem diferenciada da enfermeira. E as áreas de abrangência dos CRAS são maiores que as das estratégias”.

Poucos são os impactos da condicionalidade de Saúde para o desenvolvimento dos beneficiários apontados pelos entrevistados. O gestor do BF na Saúde em São Luís afirma que não foram identificadas modificações significativas, tendo sido considerados como fatores determinantes dessa situação: fragilidades do próprio sistema de saúde em termos de possibilitar o acesso e garantir a qualidade da atenção prestada e a falta de clareza das famílias quanto aos benefícios de manter atualizada sua agenda de saúde. Quando apontados, os impactos citados referem-se exatamente a mudanças nesses dois aspectos: alterações, ainda que pequenas, nos serviços municipais de saúde e maior conscientização dos beneficiários quanto à necessidade de manter atualizada a agenda de saúde da família.

Alguns entrevistados citam como impacto o fato das famílias estarem tendo a iniciativa de cumprir de forma mais rigorosa a agenda de saúde, tal como exigido pelo Programa, mas atribuem negativamente essa mudança ao medo de perderem o benefício, como se detectou do depoimento da gestora de Poção de Pedras. Sobre os possíveis impactos da exigência das condicionalidades na vida das famílias beneficiárias se expressa na mesma linha operadora da Assistência Social de Caxias: “o medo de perder o benefício força a cumprir as condicionalidades”. Para a gestora do Bolsa Família na Saúde desse município só há impacto pelo fato de eles se “sentirem ameaçados” por saberem que são acompanhados.

Na verdade, vistas dessa perspectiva, as mudanças citadas não podem ser consideradas como impactos, tal como os define DRAIBE (2001, p. 17-21), visto que não representam alterações efetivas e duradouras na concepção e nos comportamentos dos beneficiários; representam, quando muito, um cumprimento forçado pelas instâncias envolvidas no acompanhamento, motivado pelo medo das famílias de perder o benefício.

Apesar das críticas, tanto beneficiários quanto técnicos consideram positiva a relação entre benefício e condicionalidade, ou seja, concordam com as contrapartidas exigidas pelo Programa, pois impedem que “as famílias se acomodem e não façam o que deve ser feito”, mas, para os usuários, as condicionalidades acabam por se constituir muito mais num preço a pagar pelo recebimento do benefício, do que o acesso a serviços que contribuam para melhoria na sua condição de vida, pois o retorno para eles não acontece na forma de serviços com a regularidade e a qualidade necessárias. Por outro lado, o que fica claro a partir dos depoimentos é que, para os gestores e técnicos, se o Programa deixasse de “punir” os beneficiários, estes não cumpririam mais as exigências porque não as percebem como um bem em si. Portanto, não haveria mudança na sua forma tradicional de pensar e agir, mesmo que possa ter aumentado o nível de procura pelos serviços de saúde.

O gestor de Capinzal, em outra linha, relata “que as mães já procuram os agentes, às vezes, para anotar o peso ou a vacina”, sem atribuir essa mudança ao medo das famílias perderem o benefício. O responsável pelo SISVAN de Viana afirma que é possível ver mudanças na forma das famílias lidarem com sua saúde, destacando maior conscientização destas acerca do aleitamento materno e da vacinação, expressando-se também na realização cada vez mais frequente do pré-natal. Diz ele que isso se dá também devido às ações de cunho educativo realizadas com as comunidades nos polos de Saúde da Família.

Mudança nos serviços de saúde é apontada por um conselheiro que participou do grupo focal em Santa Quitéria, segundo o qual por causa do acompanhamento da condicionalidade “já é possível observar equipe médica no interior, enfermeiros, programas

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de saúde bucal... Eu acho que a saúde deu um passo muito grande. A gente vê equipe médica no interior, vê um enfermeiro, o PSF tá funcionando. Na saúde a gente vê um avanço” (Conselheiro do CMAS de Santa Quitéria). Participantes do grupo focal realizado na Cidade Olímpica, em São Luís, consideram que as condicionalidades têm conseguido, ainda que não a contento, forçar um certo atendimento do poder público, sobretudo da Política de Saúde, e especialmente no que diz respeito à vacinação e ao acompanhamento da gestante, mas isso se dá, sobretudo, em razão de articulação, mesmo que incipiente, entre o CRAS e os postos de saúde do bairro, o que vem contribuindo para divulgação dos prazos de vigência dessa condicionalidade. Na mesma direção se posiciona a gestora de Presidente Vargas para a qual o maior controle das condicionalidades faz com que as políticas comecem a funcionar, “criando uma consciência das políticas públicas”. Nesse município foi criado um Centro de Referência para avaliação e acompanhamento da condicionalidade da Saúde, absorvendo as atividades de pesagem, vacinação e pré-natal, utilizando, inclusive, recursos do IGD.

Em raciocínio semelhante, a gestora de Presidente Vargas entende que as condicionalidades são importantes para o desenvolvimento das famílias, posto que atualmente elas buscam com mais assiduidade os serviços para manter a agenda de saúde atualizada. Assim, para ela se constitui num aspecto positivo do Programa gerar maior preocupação das famílias com a saúde e educação.

“Bom, a diferença é muito grande. Quando eu comecei aqui, por exemplo, em 1997 a gente tinha um trabalho com a Pastoral da Criança, na questão das crianças desnutridas e eu lembro que para a mãe trazer para pesar era uma luta; hoje não, hoje mudou, pois a Pastoral diz que a mãe é que vem cobrar: “hoje não era dia do peso, porque não teve?”! Há uns meses atrás eu estava na Secretaria e chegou um senhor reclamando: olha, eu fui ali no hospital vacinar minha esposa que tá gestante, cheguei lá e não tinha vacina. E aí? Olha, quando a senhora fez a palestra do Bolsa Família a senhora disse que precisava vacinar..!” Isso tem um saldo muito positivo porque você já vê que tem um compromisso, vê que estão ali os pais, as gestantes, a família indo para reunião da Pastoral da Criança, por exemplo”.

Esse depoimento deixa evidente que os impactos observados sobre o poder público são decorrentes, algumas vezes, da pressão das famílias que têm que responder às exigências feitas pelo próprio Estado. Nesse particular, ocorre uma situação, no mínimo, curiosa: o município cobra o cumprimento de condicionalidades pelas famílias, e estas passam a cobrar dele que coloque os serviços à sua disposição para poder cumprir as condicionalidades que lhe são exigidas pelo mesmo. Um impacto positivo na vida das famílias beneficiárias colocado pela gestora de Alto Alegre não se refere especificamente a nenhuma das condicionalidades, mas merece ser destacado, pois se refere ao papel da mulher no contexto do Programa. Acredita essa gestora que o fato de ser a mulher/mãe a titular do benefício, tem se refletido direta e indiretamente na qualidade de vida delas e de suas famílias, mas, sobretudo na sua motivação para cumprir as condicionalidades. 3.2 O Acompanhamento da Educação

No que diz respeito à exigência da condicionalidade da educação, esta consiste, por um lado, no compromisso dos beneficiários de garantir a frequência de 85% da carga horária mensal para crianças e adolescentes entre 6 e 15 anos e de 75% para adolescentes entre 16 e 18 anos. O poder público se compromete, por outro lado, a ofertar esses serviços e a apoiar as famílias mais vulneráveis nos momentos de dificuldade de cumprimento dessas exigências. Os serviços educacionais são entendidos como condições de ruptura do ciclo reprodutor da pobreza. Assim sendo, o BF se orienta pela perspectiva de promoção do acesso, bem como

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da permanência das crianças e adolescentes das famílias beneficiárias nesses serviços, esperando como impactos a sua busca, por parte das famílias e sua oferta com qualidade, por parte do poder público.

O processo de acompanhamento no município, uma responsabilidade do setor educacional, ocorre a cada dois meses, cinco vezes ao ano e tem início quando o operador municipal máster da frequência escolar acessa o sistema de informações do Sistema de Acompanhamento da Frequência Escolar do BF – Sistema Presença, baixa e imprime as listas com os nomes dos alunos e as escolas correspondentes. Em seguida, essas listas são enviadas às escolas que possuem alunos beneficiários do BF para que seja feito o registro de crianças e adolescentes com percentuais de falta superiores ao mínimo exigido pelo Programa, em cada período definido em calendário. Os diretores das escolas devem anotar ainda os motivos correspondentes às faltas e atribuir à condição de “não localizados” aos beneficiários não reconhecidos como alunos das suas escolas. Os dados coletados podem ser digitados diretamente no sistema pelos diretores ou estes podem entregar suas listagens com as informações coletadas ao operador máster na Secretaria de Educação. Nesta última os dados enviados pelas escolas são inseridos no sistema e ao final do período é emitido, via Sistema Presença, um relatório geral de toda a rede municipal, estadual, federal e privada dos alunos residentes em São Luís do BF com baixa frequência e os respectivos motivos da mesma. Esse relatório é enviado de volta à escola para que o diretor ou alguém por ele designado faça o encaminhamento necessário a cada situação identificada.

Nos municípios visitados durante a pesquisa, a área da educação parece um pouco mais estruturada do que a da saúde para realizar o processo de acompanhamento do cumprimento das exigências do BF pelos beneficiários, ainda que se observem situações que se afastam do esperado.

Em primeiro lugar, as condições concretas de funcionamento parecem mais favoráveis: da parte dos que coordenam o processo, não se encontram muitas referências à inadequação dos espaços de trabalho, como acontece com a área da saúde, nem destaques significativos à falta de condições materiais para operacionalizar o controle.

O gestor do BF na Educação de São Luís, por exemplo, considera que são boas as suas condições de trabalho, afirmando que seu setor é bem estruturado (tem sala para trabalhar, equipamentos e materiais de consumo suficientes) e que possui uma equipe qualificada e suficiente para realizar o trabalho exigido. Entre os municípios nos quais foram relatadas as situações mais afastadas do preconizado pela Política estão: Caxias, Santa Quitéria, São João Batista, Viana e Presidente Vargas.

O gestor do BF na Educação de Caxias afirma: “lá onde eu trabalho, Secretaria de Educação, eu tenho internet de alta velocidade, computadores em quantidade suficiente, o meu problema é a falta de pessoal, eu trabalho praticamente sozinho.” A consequência dessa situação é que “eu acabo ficando bem limitado nesse aspecto. Eu tenho que fazer a parte operacional e a parte gerencial. Só que se eu me dedicar somente à parte gerencial, o operacional, que é alimentar o sistema, fica sem fazer. Eu queria poder visitar as famílias que tiveram baixa frequência, porque além de ser operador do Bolsa Família eu também sou conselheiro do Bolsa Família. Eu queria poder ministrar treinamentos para as escolas.”

Além disso, o gestor reconhece que “precisava um trabalho mais intenso da Secretaria com os diretores das escolas para eles se sentirem parceiros também, como são os agentes de saúde”. Uma das principais implicações de não haver um trabalho junto aos diretores das escolas é a existência de muitas dúvidas dos beneficiários quanto ao benefício e as condicionalidades. Apesar de se encontrarem falhas no processo de gestão no campo da educação, isso, contudo, não se reflete no controle da frequência escolar sobre o qual são obtidos melhores indicadores de acompanhamento do que os da saúde, nos locais visitados.

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Já em Santa Quitéria, apesar da existência de condições satisfatórias para realização do acompanhamento (pela disponibilidade de sala e equipamentos), o trabalho se restringe ao repasse das informações através do sistema em razão do pouco domínio acerca do funcionamento da Política, por parte do responsável pela gestão no município. A cadastradora máster do município ainda informou que o setor que tem a função de coordenar as ações locais não realiza nenhuma atividade com as famílias beneficiárias e nem tem nenhum contato com as mesmas diretamente ou nas escolas. A gestão fica resumida a imprimir os formulários, levá-los até as escolas, e depois buscá-los, ficando a resolução dos problemas de infrequência sob a responsabilidade da diretoria das escolas.

Em São João Batista, constata-se a não incorporação da função de acompanhamento da frequência de alunos do PBF pela Secretaria de Educação municipal expressa, sobretudo, no fato de que o gestor do PBF na educação não conta nem sequer com sala para funcionar, estando o seu setor localizado em espaço cedido pela Secretaria de Assistência Social, nas suas próprias dependências.

Em Viana, os entrevistados se ressentem da falta ou da insuficiência de recursos físicos, financeiros e de equipamentos, além de uma equipe maior para fazer o acompanhamento necessário, realizado pelas operadoras máster e auxiliar da frequência escolar, e este acaba se resumindo ao simples controle indireto da frequência escolar, mediante o diário de classe repassado pelos professores (no caso das escolas municipais) e pelos diretores (no caso das escolas estaduais).

Já em Presidente Vargas, é a Secretaria de Assistência Social que erroneamente tem a responsabilidade de acompanhar a frequência escolar dos beneficiários do BF porque, segundo argumento da gestora do BF, essa é a primeira Secretaria que o beneficiário procura em busca de soluções. Além disso, a Secretaria de Educação não faria corretamente o controle levando a frequentes bloqueios e cancelamentos. O mau desempenho da área educacional, inclusive, de acordo com seu depoimento, teria levado o município a ser chamado, em 2008, para uma espécie de auditoria, “porque na frequência escolar todos os alunos de Presidente Vargas tinham 99% de frequência. Quer dizer, quem estava assumindo a frequência, informava no sistema 99% para todos!”.

Mesmo que essa providência possa ter diminuído os bloqueios, como é afirmado, constata-se um desvirtuamento de funções no processo de gestão do Programa, além da incapacidade do município em estabelecer qualquer tipo de articulação intersetorial, com efetivo comprometimento e partilha de responsabilidades.

Considerando todas essas situações, deduz-se que, nesses casos, o apoio efetivo às famílias mais vulneráveis no acesso aos serviços educacionais, como condição necessária (ainda que não suficiente) para o rompimento do ciclo intergeracional da pobreza, não é dado, tal como previsto no desenho do Programa. Sobre esse assunto se posiciona o gestor de São Luís: “Em relação a isso aí a gente pode dizer que praticamente nada é feito”, pois a escola apenas faz o registro dos alunos com baixa frequência em formulário próprio, especificando o motivo. Apesar disso, a situação mais geral parece ser de certa aceitação dos diretores de escola e outros agentes educacionais em realizar os procedimentos relativos ao acompanhamento das condicionalidades e repasse das informações às instâncias devidas. Quanto a isso, é importante ressaltar que os setores diretamente responsáveis pelo acompanhamento in loco das famílias nas áreas da educação não parecem tão resistentes quanto os da saúde em dar acesso preferencial e tratamento diferenciado aos mais vulneráveis no contexto da Política que executam. Esse é o caso, por exemplo, de Alto Alegre.

A principal estratégia de divulgação junto às famílias utilizada é a de reuniões periódicas com estas nas escolas no intuito de informá-las sobre a importância da presença assídua do aluno. Municípios como Presidente Vargas e São João Batista, se referem a palestras como principal recurso para tentar conseguir o cumprimento da condicionalidade da educação pelas famílias, conforme também se pode constatar através da colocação do gestor do BF na educação de Maracaçumé: “Fazemos nas escolas palestras para cobrar tanto a presença do aluno lá mesmo e também com os pais – as escolas particulares também pedem essas palestras”.

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Além das reuniões, outras atividades também são realizadas, tais como mapeamento das famílias beneficiárias, plantão de informações e encaminhamento para as outras ações dentro do BF, como foi verificado em Maracaçumé. O gestor da área educacional de Alto Alegre também informou sobre a organização frequente de palestras informativas e acrescentou que tal ação tem repercutido em resultados positivos.

É importante ressaltar que já há certa rotina para realização do acompanhamento da condicionalidade da educação até porque as escolas devem, por dever de ofício, acompanhar a frequência de seus alunos e até mesmo tentar descobrir os motivos pelos quais ocorrem as faltas. A gestora da área do município de Cedral, por exemplo, ressalta que é feito tanto um trabalho diretamente com as famílias como com os diretores das escolas, pois são estes que chamam as famílias para conversar, para explicar o papel da família no compromisso do filho estar na escola.

Aliás, os gestores municipais do BF na educação parecem ter uma concepção relativamente ampla de acompanhamento, que não fica restrita ao controle da frequência escolar. O gestor de São Luís, por exemplo, acredita que o acompanhamento não se reduz a alimentar o sistema, nem mesmo a fornecer informações com qualidade, pois “não basta gerar dados, a gente precisa fazer alguma coisa por essas crianças que estão em situação de infrequência, que estão em situação de evasão, que estão geralmente com problemas, como alcoolismo dos pais, que são situações que levam essa criança a faltar”.

Contudo, essa visão ainda atribui a responsabilidade do cumprimento da condicionalidade apenas aos beneficiários, na medida em que os gestores entendem que o não alcance do percentual mínimo de frequência escolar se deve à falta de clareza das famílias quanto aos benefícios de manter os filhos na escola e que, consequentemente, basta esclarecê-las sobre a importância de mantê-los nesse espaço para que o Programa obtenha o sucesso esperado.

Nos municípios pesquisados as taxas de famílias acompanhadas na área educacional são, em geral, mais altas do que as de saúde. O responsável pelo controle da frequência escolar das crianças e jovens do BF de São Luís atribui isso ao fato de o Programa ter nascido na Secretaria de Educação, sendo esta anteriormente a gestora municipal. Nos demais esse fato parece estar relacionado à maior organização do processo de acompanhamento no contexto de uma área mais habituada a procedimentos de controle como parte de sua rotina de atuação.

Apesar disso, não se registrou nenhum município que tenha conseguido ter um quadro completo da situação da frequência escolar de todos os beneficiários do Bolsa Família com perfil educação, mesmo quando são consideradas boas as condições de infraestrutura e suficiente o quadro de pessoal para realizar o trabalho. A gestora de São Luís atribui esse fato ao elevado número de beneficiários. Afirma:

“A gente tem na rede municipal mais de 40.000 alunos, na estadual, quase 30.000 e na federal, em torno de 156 alunos, [fora os] da rede particular. Essa é nossa grande dificuldade, esse ano como meta nós vamos tentar uma ação pra atingir esses alunos. As escolas comunitárias, nas associações de moradores, [constituem] o público mais complicado da gente alcançar”.

A partir do grupo focal realizado em Barreirinhas identificam-se dois fatores que contribuem para que os municípios não acompanhem 100% do previsto. Problemas de cadastro determinam que certo percentual de alunos situe-se entre os não localizados, constituídos por aqueles que já completaram a idade de saída do Programa, mas continuam na lista para ser acompanhados e alunos que mudaram de cidade ou de escola e não fizeram a transferência no cadastro. Há uma expectativa positiva nesse município e também em Cajapió com relação à implantação da versão 7.0 do sistema de cadastro no sentido de que este propicie maior agilidade na comunicação entre o município e o MDS e também contribua para a resolução de problemas relativos à gestão local do Programa, tais como duplicidade de cadastro e dificuldade de localização de usuários, mediante rapidez de acesso ao NIS. Essa é a mesma expectativa da gestora de Maracaçumé para quem os

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problemas podem diminuir com a nova versão porque tudo será realizado on line, fazendo com que a informação esteja sempre atualizada e não seja necessário enviar arquivo, o que, não raro, ocasiona transtornos.

Aliás, a existência de diferentes bases de dados tem sido alvo de críticas dos responsáveis locais, pois como diz a gestora do PBF de Maracaçumé “eu tenho uma informação, a saúde tem uma informação e o Projeto Presença tem outra informação, as informações não batem”. Na mesma linha se colocam os entrevistados da área de Educação de Viana:

“O sistema do cadastro, na assistência eles têm um e nós temos outro, às vezes não acompanha. Eu lanço aqui que o aluno tal mudou de série e eles só vão saber disso daqui uns dois meses. Eu acho que o sistema devia ser mais ágil.” (Operadora Máster)

Essa reflexão condiz com o que pensa o gestor do BF na Educação de São Luís para o qual a existência de diferentes sistemas, destinados especificamente ao cadastramento/recadastramento e ao acompanhamento de cada condicionalidade, parece não favorecer a agilidade necessária ao fluxo das informações dentro do município e gerar duplicidade de tarefas, além de não favorecer uma dinâmica intersetorial. Dessa forma, o município atribui à instância federal parte dos problemas no acompanhamento local.

A gestora do BF de Poção de Pedras aponta dificuldades frequentes na alimentação do sistema de Cadastro Único (CadÚnico) gerado pela inoperância e desatualização dos dados nos níveis estadual e federal. Segundo essa mesma gestora, a equipe municipal, por estar em contato direto com as famílias, é quem recebe as reclamações e tem que resolver as faltas erroneamente computadas ou achar os alunos que aparecem como não localizados, não sendo visto pela instância federal as limitações locais, sobretudo dificuldade de transporte para visitas e buscas e, especificamente para o próprio atendimento à população, que é tarefa diária da equipe da Assistência Social. Por outro lado, também se observam dificuldades no nível intragovernamental de gestão em razão das dificuldades de comunicação e compartilhamento das informações.

A coordenadora do BF de Presidente Vargas também ressaltou que o fato do Programa estar vinculado a 03 (três) sistemas distintos constitui-se numa dificuldade, o que conduz a pensar na necessidade de integração desses sistemas para elevar a qualidade de gestão e reduzir os problemas existentes, o que favoreceria, inclusive a intersetorialidade.

Outro fator que contribui para que os municípios não alcancem o percentual de 100% de alunos acompanhados diz respeito à falta de acesso à internet de qualidade nos municípios, em razão da adoção de formas de conexão precárias. Os entrevistados em Barreirinhas, só para dar um exemplo, afirmam que a internet cai muito, principalmente em tempos de chuva. A cadastradora máster de educação de Santa Quitéria destacou que o próprio site que abriga o Sistema Presença frequentemente fica fora do ar, apresenta erros na página, o que faz com que o trabalho seja interrompido, às vezes, por vários dias.

Isto posto, mesmo que se possa reconhecer que o acompanhamento realizado pelo setor educacional pareça mais institucionalizado nos municípios pesquisados, ainda se identifica precariedade de condições estruturais para o desenvolvimento dessa tarefa.

Dessa forma, apesar de haver um discurso mais otimista dos gestores do PBF na educação e de poderem ser identificados avanços no que diz respeito ao acompanhamento realizado por essa área, sobretudo se comparado ao realizado pela Saúde, não pode ser afirmado que o processo esteja de fato satisfatoriamente institucionalizado nos municípios visitados. Como foi reconhecida pelo próprio gestor de São Luís, esta parece ser uma situação mais evidenciada nos níveis mais elevados de gestão, não sendo a realidade de toda a rede de ensino, especialmente das escolas, cuja função de preencher os formulários de dados relativos à frequência escolar dos alunos beneficiários do PBF de suas respectivas escolas, como foi visto, é fundamental para o sucesso dos resultados a serem alcançados.

Pesquisa realizada por Ramos (2010) mostra que os gestores educacionais têm certa dificuldade em aceitar que, no contexto da política educacional, deva ser dada atenção preferencial às famílias do BF a fim de potencializar sua emancipação. Para essa estudiosa, historicamente, a política educacional nunca foi descrita como especificamente voltada ao

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enfrentamento da pobreza e, por isso, seus sujeitos têm resistência em se enxergarem como participantes desse objetivo. Constatando esse obstáculo, o setor que coordena esse processo no município de São Luís vem tentando desenvolver algumas estratégias para aumentar a eficiência e mesmo a eficácia do acompanhamento. De acordo com o gestor:

“A gente tem feito um trabalho de conscientização desses diretores. A gente faz reuniões periódicas, faz planejamento no início do ano, vê as escolas que têm mais baixa frequência. Fazemos reuniões com os pais. Toda vez que os diretores vão buscar esses relatórios, tem uma equipe pra recebê-los, para orientar, isso é uma conquista”.

O operador máster da educação de São João Batista atribui à “má preparação” dos diretores das escolas alguns dos problemas de acompanhamento identificados. Já segundo o responsável pela condicionalidade de educação de São João Batista, o acompanhamento não se realiza a contento pela dificuldade de manter os adolescentes a partir de 15 anos na escola, já que estes nessa idade começam a perder o estímulo de estudar.

Outro fator que acarreta prejuízos ao acompanhamento adequado é apontado pela gestora do BF de Alto Alegre e se relaciona às constantes mudanças de endereço das famílias, sem o devido informe à Assistência Social ou à Secretaria de Educação. Essa constatação coincide com a feita pelo entrevistado da área de educação de Cajapió, que, tendo afirmado que o índice de acompanhamento do município apresentou resultados satisfatórios, atingindo 97%, considera não ter alcançado 100% em razão da dificuldade de localização de alunos que mudaram de escola ou migraram para outro município sem a devida comunicação aos setores responsáveis pelo acompanhamento, o que também foi destacado em Cedral e Viana. A geração de um grande número de alunos não localizados impede, pelo menos em parte, que as taxas de acompanhamento não atinjam a meta de 100% dos alunos acompanhados.

Essa dificuldade de localização dos beneficiários é potencializada, em alguns municípios, pela falta de comunicação e de efetiva articulação entre a Assistência e a Educação, como reconheceu a gestora do BF de Alto Alegre. Ainda em Alto Alegre, o responsável da área da educação aponta a necessidade de ações de capacitação dos técnicos e funcionários do Programa para que estes possam assimilar efetivamente o processo de acompanhamento da condicionalidade da educação e dos operadores do Sistema Presença para saber lidar com o sistema informacional. Já o operador máster da educação de São João Batista, apesar de mostrar mais domínio sobre a dinâmica do Bolsa Família revela a falta de investimento do município em capacitação.

Tal como se identifica na área de Saúde, não há um trabalho muito articulado do setor de educação com os gestores do Programa nos municípios e nem com as demais áreas envolvidas no acompanhamento das famílias. Pode-se citar o caso de Capinzal, onde a coordenadora do BF afirma não conhecer o Projeto Presença e nem ter conhecimento sobre as formas de acompanhamento da frequência escolar dos beneficiários do BF. Por outro lado, a gestora do BF na educação desse município não demonstra conhecimento abrangente sobre as condicionalidades, tendo prestado informações restritas à sua área de atuação. Contudo, segundo a assistente social do CRAS desse município que participou do grupo focal, a frequência escolar aumentou desde o começo de 2010 porque o CRAS participa de forma constante desse processo, fazendo reuniões com os pais e estimulando a presença na escola.

A despeito dessas situações, identifica-se na maioria dos municípios maior aproximação entre os encarregados do acompanhamento da condicionalidade da educação e os gestores do Bolsa Família do que entre estes e os responsáveis pelos acompanhamento do cumprimento da agenda de saúde. A gestora do BF de Poção de Pedras relata que há um “intercâmbio” mais próximo com a Educação comparativamente à Saúde, o que resulta em satisfatório conhecimento a respeito da gestão da frequência escolar.

Apesar disso, algumas vezes a articulação entre os gestores do Programa e da educação só acontece, por meio do desenvolvimento de ações conjuntas, devido ao fato

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das Secretarias de Assistência Social e de Educação estarem localizadas no mesmo prédio, sendo Cajapió um exemplo dessa situação. Segundo os gestores a proximidade física facilita o diálogo, a discussão conjunta e o acesso dos beneficiários. Em algumas situações, como a que se observa em São Luís, quando o gestor do Programa na Educação tenta se articular com os CRAS no trabalho de acompanhamento da condicionalidade sob sua responsabilidade, o faz não por outro motivo, mas “porque a gente ficava muito sobrecarregado e dividido entre a SEMCAS e a Superintendência”.

Como consequência da falta de aproximação entre os setores envolvidos no Programa, os dados coletados não têm servido como subsídios importantes num processo de planejamento conjunto entre as três Secretarias envolvidas, já que o planejamento, quando é feito no município, como é o caso de Caxias, não obstante possa até representar um avanço face à histórica falta de enfrentamento da questão da gestão no âmbito da Assistência Social, é realizado isoladamente por esta área. Os entrevistados apontam como principais impactos gerados em razão da exigência da condicionalidade no campo educacional o aumento significativo na frequência e a diminuição da evasão escolar.

Nesse aspecto, é importante dar atenção ao fato de que a condicionalidade visa não apenas favorecer o acesso à escola, mas, sobretudo, contribuir para a permanência das crianças e adolescentes das famílias beneficiárias nos serviços educacionais para propiciar uma trajetória uniforme de rendimento escolar. Esse objetivo, portanto, parece estar sendo alcançado.

Ramos (2010) argumenta, porém, que não se pode atribuir a redução do número de faltas dos alunos de famílias que participam do BF unicamente à exigência de um percentual mínimo de frequência feita pelo Programa, pois haveria indícios de que apenas a transferência de renda poderia gerar esse aumento no comparecimento à escola independente de se constituir numa contrapartida da família.

Certamente não por acaso, a melhoria das condições financeiras dos pais que resulta na possibilidade de dar aos filhos uma alimentação melhor em casa e de comprar roupas e insumos adequados, ainda que não seja um efeito direto dessa condicionalidade, mas do próprio Programa, é percebida como um efeito positivo pelo gestor de Alto Alegre: “Tem sim, porque o aluno agora ele tem uma melhor condição dentro de casa, a alimentação também melhorou, a forma da criança se vestir também. Então é positivo para ele (aluno), ele se sente melhor a partir do momento que tá dentro do Bolsa Família”

O próprio gestor do BF na Saúde do município de Poção de Pedras confere ao recebimento do benefício o efeito nas melhorias identificadas na frequência das crianças e adolescentes às escolas: “Teve sim porque a gente sabe que na nossa região a dificuldade que a gente tem e que o Bolsa Família tem ajudado também é que as crianças tenham mais condição, com material escolar, roupa e a alimentação também, porque alguns têm dificuldade”.

Além destes efeitos, o gestor do Bolsa Família na Educação de Caxias destaca que na comparação entre alunos beneficiários e não beneficiários do Bolsa Família os primeiros apresentam os menores índices de reprovação: “os alunos que ficam reprovados são justamente os que não são do Bolsa Família”.

Apesar disso, os gestores generalizadamente destacam como fator limitante das possibilidades de potencialização dessa contrapartida a falta de conscientização das famílias quanto à importância do ensino e a concentração da sua atenção no benefício financeiro. como se observa no depoimento do gestor do BF na Educação de Alto Alegre: “Eu acredito que sim, ainda que tenha coisas para discutir. No caso, a conscientização. Ainda vivemos numa mentalidade de querer só o dinheiro. A gente vê ainda pais que só vão à escola quando perde o benefício! Tirou isso? Daí eles vêm: ah, tirou meu dinheiro, então é uma luta mesmo”. De toda forma, esse gestor mostra o aumento da preocupação dos pais

com a vida dos filhos no ambiente escolar, mesmo que motivado pelo medo de perder o benefício.

Essa dupla perspectiva é claramente expressa na fala da gestora do BF de Presidente Vargas segundo a qual a diminuição da evasão e aumento da frequência escolar

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entre os alunos beneficiários do Programa é resultado da preocupação de algumas famílias com o futuro dos seus filhos, mas, ao mesmo tempo, o estímulo dado pelos pais para os alunos irem de forma assídua à escola e estudar de forma séria, teria como pano de fundo apenas o desejo de obter ou não perder o recurso. O gestor de educação de Viana tem raciocínio semelhante ao afirmar que é o medo de perder o benefício que tem acabado por manter os alunos na escola.

Apenas uma gestora do BF na Educação – a de Capinzal – destacou algum impacto da condicionalidade sobre o sistema de ensino, afirmando que as escolas estão trabalhando para dar melhores condições aos alunos no que se refere inclusive à alimentação, além de todo o trabalho de acompanhamento da condicionalidade da frequência escolar.

Contudo, o que se observa em São Luís, por exemplo, é que o cumprimento dessa exigência por parte das famílias do bairro Cidade Olímpica vem sendo impossibilitado por falta de vagas nas escolas, o que redundou em suspensão dos benefícios. Diz o coordenador do CRAS do território: “mais ou menos 150 crianças, que saíram da pré-escola para o ensino fundamental, ficaram sem vagas e acabaram sendo punidas. Houve audiência pública, o CRAS participou com o Conselho Tutelar para ver uma solução”.

Dessa forma, verifica-se que a dinâmica de implementação dessa condicionalidade vem mostrando que a universalização do ensino fundamental é um processo ainda não concluído. Apesar do aumento no oferecimento de vagas, a oferta nem sempre está aonde se encontra a criança excluída. Portanto, os municípios expressam fragilidades no que diz respeito à disponibilização de uma estrutura de serviços básicos que deem suporte às famílias no atendimento dessa exigência do Programa. Mais do que isso: nem sempre vem garantindo um direito social básico – o da educação – que é condição necessária para o pleno exercício da cidadania e um melhor posicionamento no mercado de trabalho.

Sobre a condicionalidade da educação se expressam da seguinte forma os beneficiários presentes ao grupo focal realizado no CRAS Bacanga de São Luís:

“a educação é outra; é cobrada das famílias, mas elas são esquecidas. As escolas são sujas, quebradas, sem carteiras suficientes, sem condições de higiene. Além do mais, não tem professores, há quatro meses a escola da minha filha não funciona porque não tem professores. As crianças ficam prejudicadas”. Acrescenta ainda: “a crianças já nem gostam de ir para a escola desse jeito, é uma humilhação para nós”.

Assim sendo, a questão da qualidade do ensino e das condições de funcionamento da rede escolar também não aparecem no debate como componente do direito à educação, ficando a reflexão restrita à ideia de que basta incluir o aluno no sistema e de que se a criança ou jovem não estuda é por única responsabilidade dele ou dos seus pais. É bem verdade que os beneficiários ainda entendem o benefício como uma ajuda. Assim se expressam: “é uma ajuda, é pouco, mas é uma ajuda”. Mas, por outro lado, beneficiários de Cedral que fizeram parte do grupo focal afirmaram concordar com essa condicionalidade pela importância da escola, citando a “aprendizagem” como necessária para os filhos “crescerem sabendo e podendo ser alguém na vida, né?”. 3.3 O Acompanhamento da Assistência Social

Na área de Assistência Social, o compromisso exigido das famílias participantes do BF é a frequência mínima de 85% da carga horária relativa às ações de convivência e fortalecimento de vínculos que devem ser oferecidas pelos municípios para crianças e adolescentes de até 15 anos em risco ou retiradas do trabalho infantil, atendidos pelo Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI.

O Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos do PETI, que deve ser ofertado no CRAS ou em uma unidade da rede sócio-assistencial do território de abrangência deste, constitui-se, no desenho do Programa, num espaço de convivência e de formação para a participação e cidadania, onde devem ser desenvolvidas experiências

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lúdicas, culturais e esportivas como formas de expressão, interação, aprendizagem, sociabilidade e proteção social dos beneficiários, sendo a frequência destes registrada no Sistema de Controle e Acompanhamento do SCFV do PETI (SISPETI).

No Maranhão, em relação às condições concretas de execução do acompanhamento aos beneficiários do PETI, pôde ser identificada a seguinte situação: os setores que fazem a gestão da condicionalidade da Assistência, talvez por estarem institucionalmente vinculados à coordenação do BF dos municípios, parecem apresentar as melhores condições de trabalho entre os responsáveis pela tarefa de acompanhamento das famílias no cumprimento das demais exigências do Programa. Esse é o caso de Caxias, como se vê no depoimento do gestor municipal: “lá no Bolsa Família a gente tem equipamentos bons, recebeu novos equipamentos, tem o pessoal, a gente passou por um processo de mudança de internet pra ter mais rapidez. A gente tem essa preocupação: a de melhorar os equipamentos e de capacitar o pessoal.”

Sobretudo nesse município, existem condições diferenciadas na gestão das condicionalidades, com evidente vantagem para a Assistência Social, o que pode estar relacionado à estruturação da Secretaria na operacionalização da Política, como se pode ser observado in loco e provavelmente está ligado ao fato de ser essa Secretaria a gestora dos recursos do IGD, detendo mais poder de direcionar maior montante para a gestão dessa condicionalidade.

Em Barreirinhas, também se pode perceber que, das três áreas, a Assistência Social é a mais organizada, apesar das dificuldades que enfrenta no desenvolvimento dessa tarefa. Maracaçumé, por sua vez, conta com boa estrutura física para desenvolvimento das ações, com equipamentos e pessoal suficientes para desenvolver o trabalho, demonstrando o setor responsável pelo acompanhamento muita organização nos registros e no atendimento às famílias. A pesquisadora que visitou o município percebeu grande movimentação de beneficiários no espaço onde funcionam o CRAS, o PETI e o Projovem, o que, para ela, demonstraria a visibilidade que a assistência social tem no município, constituindo-se, inclusive, em espaços de referência para as famílias. Especificamente sobre o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos – SCFV/PETI, este é bem organizado, podendo ser positivamente destacados, segundo a mesma pesquisadora, a equipe responsável, os instrumentais utilizados para acompanhamento da criança/adolescente atendido, o espaço e materiais didático-pedagógicos usados, o que apontaria para um investimento na Política de Assistência Social e no BF que ultrapassa os valores repassados pelo Governo Federal.

Em Presidente Vargas, a assistência social apresenta-se igualmente de forma organizada, com uma estrutura física ampla para funcionamento dos programas, projetos, serviços e benefícios, inclusive para realização do acompanhamento da condicionalidade relacionada ao PETI. Além disso, possui recursos humanos suficientes para o desenvolvimento dos trabalhos, contando com uma secretária municipal de assistência social que é assistente social concursada do município e que já passou por 04 administrações permanecendo no mesmo cargo. Esse fato tem particular importância conisiderando-se a histórica persistência de relações patrimonialistas no âmbito da adminstração pública brasileira, e na maranhense em particular, resultando em que a ocupação de cargos diretivos ocorra por indicação política ou em função de relações de parentesco. Em pesquisa sobre O Sistema Único de Assistência Social no Brasil: um estudo avaliativo de sua implantação, foram identificadas gestoras municipais com algum grau de parentesco com os prefeitos (esposas, irmãs e outros parentes), caracterizando a existência de relações nepotistas, que se constitui no favoritismo de parentes na ocupação de cargos comissionados, sobretudo nas regiões Norte e Nordeste. (ver COUTO et al, 2010))

O CRAS de Santa Quitéria, cuja equipe realiza o acompanhamento da condicionalidade da Assistência Social, possui uma estrutura física considerada boa pelos entrevistados, disposta em sala de espera, salas para assistentes sociais, psicólogas e atendimento psicossocial, sala de reuniões, cozinha, despensa, banheiro e salas para realização de atividades com pessoas idosas e pessoas com deficiência, além de equipamentos suficientes. Os cômodos são pequenos, mas bem distribuídos. Embora seja um prédio alugado, foi adaptado com rampas de acesso. Ainda que os membros da equipe

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possuam contratos temporários, sem vínculos efetivos com o município, a equipe parece ser suficiente para realizar o trabalho, estando constituída por 01 psicóloga, 02 assistentes sociais e 01 pedagoga, além de duas técnicas administrativas e duas operacionais, sendo que uma atua como recepcionista.

Essa, porém, não é a situação de municípios como Cajapió, cuja Secretaria de Assistência Social funciona em imóvel alugado com estrutura física precária, constituída por uma única sala onde se acomodam a gestora municipal da Política, o coordenador do Bolsa Família e os cadastradores do Programa, além da assistente social e da recepcionista e cujo espaço ainda é dividido com a Secretaria de Educação. Em termos de equipamentos, a pesquisadora que esteve no município observa que havia apenas dois computadores, sendo que apenas um estava em funcionamento. Assim sendo, a visita in loco mostra que o município de Cajapió apresenta considerável fragilidade na sua estrutura de gestão não só do BF, mas da Política de Assistência Social com um todo, concretizando-se nas dificuldades de acompanhamento da condicionalidade sob sua responsabilidade.

Na coordenação estadual do PBF na assistência social as condições de trabalho não são muito diferentes das encontradas nos municípios: a equipe é pequena, sendo composta da coordenadora, duas técnicas e uma administrativa. Além do mais, a coordenadora não tem disponibilidade integral de tempo para realização da tarefa. Já a estrutura administrativa criada pela secretaria de educação para o desenvolvimento dessa tarefa é diferenciada das outras secretarias, segundo a coordenadora: “é a única condicionalidade que tem uma equipe específica que foi ampliada a partir de 2007. Nós temos salas próprias e um carro com motorista”. Contudo, a “nossa maior dificuldade é a questão de orçamento, porque o IGD vai para a secretaria de desenvolvimento social e não existe na educação, ainda, um recurso específico para o Bolsa Família que é um programa do Ministério do Desenvolvimento Social”.

Mesmo que em Barreirinhas a Assistência Social apresente condições de funcionamento mais satisfatórias do que a Saúde e a Educação, enfrenta o problema de inadequação do seu espaço físico. A sala onde o cadastramento é feito apresenta precária estrutura em razão da má ventilação e do tamanho insatisfatório do espaço físico. A casa que serve de sede para a secretaria é alugada e com salas pequenas.

Aliás, essa é outra limitação comum nos municípios, tendo sido abordada também pela gestora do programa Bolsa Família na Assistência (também Secretária de Assistência Social) de Poção de Pedras. Vê-se que os municípios, em geral, não possuem espaços próprios e não há casas originalmente adequadas (em termos de estrutura e distribuição de espaço) para funcionamento das ações. A situação geral é a de espaços alugados e mal adaptados para funcionamento das atividades.

Esse é o caso do CRAS de São João Batista que apresenta estrutura física incompatível com as ações sócio-assistenciais devido ao espaço reduzido: quatro cômodos no total. Além disso, o CRAS possui pouca visibilidade no município, inclusive para os beneficiários do Bolsa Família que acabam por recorrer preferencialmente à Secretaria de Assistência Social, em caso de dúvidas e de busca de resolução de problemas relacionados ao Programa. “Na verdade a gente vê que o CRAS é esquecido pela população de São João Batista, porque às vezes eles não sabem nem o que é o CRAS”. (Conselheiro CMAS de São João Batista).

A própria coordenadora do CRAS do município afirma que “pelo fato do Bolsa Família estar lá na Secretaria de Assistência Social, o CRAS acabou esquecendo de que é competência dele chamar essa família.”.

Na verdade, no momento de realização da pesquisa, o trabalho do CRAS se encontrava paralisado, Apesar de já fazer oito meses da atual administração, a justificativa dada para esse fato foi que o município estaria passando por um período de transição decorrente da mudança de gestão político-administrativa, já que o prefeito anterior havia sido cassado e substituído, juntamente com a equipe de secretários.

Nesse município, foi constatada forte influência das relações políticas no processo de gestão dos programas sociais. Nesse processo, a diluição entre público e privado se revela tanto na apropriação de informações, documentos e equipamentos da gestão anterior no

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processo de mudança, quanto na centralização das informações e recursos referentes ao PBF da gestão atual, com acontece, por exemplo, com os repasses do IGD.

Outra expressão dessa influência se observa na composição dos cargos para coordenação dos programas sociais determinada, predominantemente, pelas articulações e compromissos políticos ou pessoais em detrimento de critérios técnicos e institucionais como preceitua a NOB/RH-SUAS de 2006. A realização de concursos, bem como a distribuição de cargos e funções em consonância com formações profissionais compatíveis não tem se constituído uma prática nos municípios pesquisados, de modo geral. Como consequência da predominância de critérios políticos em detrimento dos técnicos, a dinâmica administrativa do BF como programa integrante da Política de Assistência Social de São João Batista, nessa fase de reestruturação, vem sendo orientada pela lógica de uma formalidade burocrática pautada em padrões mínimos de funcionamento e de qualidade dos serviços, dissociada, portanto, das orientações e normativas da Política e do Programa e de uma perspectiva de garantia de proteção social e emancipação para as famílias beneficiárias.

A centralização dos recursos nas mãos do executivo local também é uma prática política muito usual no Maranhão, constatando-se, em função disso, em Maracaçumé, a falta de autonomia do secretariado para usar diretamente os recursos o que, no caso da gestão do Bolsa Família e demais ações da assistência social, limita a visibilidade da Política de Assistência Social, enquanto uma política pública, pois muitos beneficiários a entendem como “política do prefeito”, personificando ou personalizando a “coisa pública”.

Município em que também se observa forte influência de relações políticas é Viana aonde o CRAS atua de forma dissociada e paralela à Secretaria de Assistência Social em razão do poder da primeira dama do município, que teria o intuito de “fazer politicagem” com o BF através do CRAS, gerando duplicidade de ações e desperdício de recursos. O prédio do CRAS da área urbana desse município, que fica localizado em área caracterizada como de risco por apresentar níveis elevados de pobreza, violência, tráfico e uso de drogas, assaltos, latrocínios e homicídios, não possui estrutura adequada em termos de espaço físico para atendimento ou realização de atividades com diferentes grupos de beneficiários. Nesse contexto, a pesquisa identifica que o acompanhamento das condicionalidades é, em geral, uma tarefa das equipes dos CRAS, os quais devem realizar um trabalho de acompanhamento familiar no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) que deve ser articulado a outras políticas setoriais com o objetivo é contribuir para a superação das vulnerabilidades sociais que impedem ou dificultam o cumprimento dos compromissos previstos pelo Programa, por parte das famílias. Apenas Maracaçumé declarou que o acompanhamento da condicionalidade da assistência social ocorre por meio de parceria entre CRAS e CREAS. Também em apenas um município, o de Viana, a Secretaria de Assistência Social informou a existência de parceria com o Conselho de Assistência e com o Conselho Tutelar para realização do trabalho de acompanhamento das 8.494 famílias beneficiárias, na sua função de Controle Social: fiscalização, apuração de denúncias e encaminhamentos. Já em Presidente Vargas, supõe-se que a maior parte da responsabilidade do acompanhamento da condicionalidade da Assistência Social fica na própria coordenação do BF. Sobre o monitoramento do cumprimento das condicionalidades pelas famílias, a coordenadora do CRAS Bacanga, em São Luís, afirma que este é realizado por meio das atividades e projetos implementados no CRAS (Projeto Fortalecer, Projeto para Gestantes, Comemoração de Datas Festivas, etc), de visitas domiciliares e também de atividades especialmente destinadas para isso, sobretudo Reuniões de Orientação. Ao lado disso, procura articular a rede de proteção social da área de abrangência do CRAS na perspectiva de inclusão socioeconômica e cultural das famílias mais vulneráveis. Além dessas ações, procura oferecer Cursos de Capacitação Profissional com direção para o mercado de trabalho, o que é semelhante ao que acontece no CRAS da Cidade Olímpica

Aliás, reuniões e palestras de esclarecimento se constituem nas estratégias de acompanhamento mais utilizadas pelos municípios em pauta. Além destas atividades, segundo os entrevistados em Barreirinhas, o acompanhamento também se dá mediante a

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oferta de cursos de capacitação visando geração de trabalho e renda, contando com a parceria dos agentes de saúde e do Sindicato dos trabalhadores. Em Cajapió, como informou a assistente social, o acompanhamento da Assistência também é feito de forma sistemática pelo CRAS, que realiza visitas domiciliares, atendimentos, preenchimento do CadÚnico, oficinas e eventos festivos com os beneficiários.

O gestor do BF e Secretário municipal de Assistência Social de Cedral mostra que, além do desenvolvimento de atividades lúdicas e esportivas, do reforço escolar e do lanche com as crianças e adolescentes no PETI, são realizadas ações junto as famílias do Bolsa Família, especialmente as mães como: acompanhamento físico, caminhadas e oficinas.

O trabalho realizado pela coordenação estadual do BF no campo da saúde consiste no acompanhamento dos dados através de relatórios gerados a partir da alimentação do sistema de informação do BF (módulo gestão) e no monitoramento in loco em alguns municípios e capacitação. A gestora destaca que a seleção dos municípios para a realização do monitoramento e da capacitação ocorre mediante o critério de baixa cobertura de informação do sistema apresentado pelo município. Contudo, ressalta que a abrangência desse trabalho não é grande, por conta do tamanho reduzido da equipe.

Já segundo a coordenadora estadual da assistência social “a gente não faz acompanhamento direto aos beneficiários”, mas “a identificação de famílias mais vulneráveis através do SICON (Sistema de Gestão das Condicionalidades do BF) que favorece a interlocução entre os sistemas da saúde, educação e assistência social e possibilita visão integral das famílias a partir das problemáticas identificadas” Além dessa ação, a coordenadora promove e participa de monitoramentos específicos, seminários e outras ações junto aos municípios visando a melhoria da gestão destes. A coordenação estadual da área da educação é responsável por monitorar o processo de informação da frequência.

“Então, nós temos acesso ao sistema, o Projeto Presença, que é o sistema do MEC no qual os municípios trabalham e a gente acompanha o processo de informação deles diariamente. Agora nós também já criamos aqui na secretaria da educação uma estrutura on-line de atendimento. Nossa equipe técnica tem, tipo assim, como se fosse um chat, um MSN, hospedado no próprio site do governo do estado”.

Contudo, a coordenadora se depara com dificuldades constantemente identificadas nos municípios do interior do Maranhão: a questão de acessibilidade, a cobertura de internet!”.

O monitoramento também inclui eventos periódicos com os municípios, aonde “a gente trabalha direto com a população a questão do esclarecimento, da sensibilidade [para que o beneficiário seja] conhecedor dos seus deveres e direitos”, além de se constituir numa estratégia para obtenção de índices melhores. A entrevistada considera que há fidedignidade nas informações da educação, o que impulsionou a saúde e deu maior qualidade ao CadÚnico. Isso é considerado por ela um fato por causa da confiabilidade do censo escolar e dos demais bancos do MEC. Considerando que o pagamento do benefício é mensal e que os prazos de vigência da educação são mais curtos do que os das demais condicionalidades, sendo para ela praticamente mensais, essa coordenadora considera que “a educação hoje faz a folha de pagamento do Bolsa”, porque a maior parte da população do Programa é acompanhada pela educação, num processo de atualização cadastral quase automático.

Torna-se importante dar destaque ao fato de que independentemente de o município reunir ou mão boas condições de funcionamento, os técnicos, em geral, apontam dificuldades para realizar satisfatoriamente o acompanhamento da Assistência Social.

Os responsáveis pela condicionalidade da Assistência Social de São Luís reconhecem que não há como os CRAS realizarem um trabalho de acompanhamento sistemático do conjunto das famílias vulneráveis identificadas nos diversos sistemas do Bolsa Família porque “eu vejo assim, está indo para o CRAS, mas o CRAS não tem como abarcar isso”. Os técnicos entendem que o foco da proteção social é a família, sendo esta o

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princípio ordenador das ações no âmbito do SUAS, mas percebem que nas atuais condições têm apenas “a possibilidade de atenuar porque com certeza [só têm] a possibilidade de trabalhar o PETI.”

Essa é a mesma opinião dos que realizam, na ponta, o acompanhamento. De acordo com os participantes do grupo focal da Cidade Olímpica em São Luís “o número de profissionais no CRAS não é suficiente pra fazer esse trabalho. [o CRAS] não tem estrutura adequada porque nós temos limites com recursos humanos, com recursos financeiros, uma demanda de área todo dia, um grande número de vulnerabilidade”.

Os técnicos, no grupo focal realizado em Caxias, reconhecem que os CRAS não têm condições de acompanhar todo o público dos seus territórios que participa do BF, mas consegue atingir “uma boa parte” por meio de um conjunto de ações direcionadas às famílias em seus diferentes subgrupos: crianças, jovens, gestantes, idosos.

Em entrevista realizada com a psicóloga do CRAS de Viana foi colocada a dificuldade da equipe em transitar na área e até mesmo permanecer no CRAS em determinados dias e horários, pois ele fica localizado em área caracterizada como perigosa, sobretudo pela violência, tráfico e uso de drogas, assaltos, latrocínios e homicídios, o que inviabiliza o trabalho por falta de segurança, além da falta de recursos, como relata a pesquisadora que visitou o local.

Segundo o coordenador do BF de São João Batista, o acompanhamento das famílias é feito basicamente por meio de reuniões divulgadas na rádio comunitária e algumas visitas feitas pela equipe do CRAS com carro e moto alugados, pois nem a secretaria e nem o CRAS possuem veículos próprios. O próprio CRAS, em seu trabalho rotineiro, utiliza veículos cedidos pela Secretaria, quando disponíveis. ´ Essas são situações que remetem a problemas estruturais do funcionamento da própria Política de Assistência Social, a qual acaba por não assegurar o compromisso do poder público em prover e garantir com a presteza e regularidade necessárias o acesso dos mais vulneráveis a serviços de qualidade que contribuam para a sua saída da condição de vulnerabilidade.

É conveniente relembrar que os CRAS devem realizar rotineiramente, no contexto da Política de Assistência Social e do SUAS, acompanhamento de famílias vulneráveis residentes em seu território de atuação e lhes oferecer serviços e benefícios sócio-assistenciais que lhes possibilitem promoção e proteção em suas necessidades básicas. Em consonância com essa orientação, os CRAS já atuam junto a uma população em situação de vulnerabilidade, mas cujo universo não coincide necessariamente com os beneficiários do BF.

Sendo assim, parece haver dificuldade dos técnicos de sistematizar um trabalho de acompanhamento porque muitas famílias, embora sejam beneficiárias do Bolsa Família, não estão necessariamente inseridas nos serviços e nas atividades do CRAS por falta de condições concretas para realizar o atendimento. Esse problema se apresenta mesmo em relação aos beneficiários do PETI, cuja condicionalidade é de responsabilidade direta da Assistência Social, o que aproxima essa situação daquela dificuldade sentida pelos operadores da Saúde e da Educação de inserir o acompanhamento da condicionalidade numa rotina de trabalho já anteriormente estabelecida. Sendo assim, a não rotinização do acompanhamento parece dizer respeito muito mais a questões de caráter histórico e estrutural que se constituem em obstáculos ao “desenvolvimento de uma prática consistente e condizente com as diretrizes da LOAS e da PNAS”, tal como identificado em pesquisa sobre a implantação do Sistema Único de Assistência Social (COUTO et al, 2010). Segundo identificado por essa pesquisa, tais dificuldades “estão relacionadas com a inexistência de sistemas regulares de capacitação dos profissionais, aos reduzidos quadros de pessoal, aos baixos salários, o que redunda em relações de trabalhos precarizadas e equipes incompletas”. (COUTO et al, 2010, p.131)

Os técnicos em sua maioria reclamam da falta de condições de trabalho, pois os CRAS, no geral, contam com estrutura física incompatível com as ações a serem desenvolvidas, equipe reduzida, pouco material de consumo e equipamentos, além de ter dificuldades de deslocamento dentro do território, geralmente extenso, por falta de

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transporte. Dessa forma, reproduz-se nesse espaço a mesma situação de precariedade e fragilidade no desenvolvimento da Política de Assistência Social já identificada na citada pesquisa realizada sobre a implantação do SUAS, na qual se destacou disponibilidade reduzida ou mesmo inexistência de veículos, falta de recursos financeiros e número insuficiente de profissionais para as atividades, dentre outros fatores que dificultam a implementação da Política. (COUTO et al, 2010).

Em Poção de Pedras aparece explicitamente uma questão comum no Maranhão no contexto da Política Social: a dificuldade de manter de forma permanente os profissionais no município. Segundo as assistentes sociais e a própria gestora do PBF, haveria necessidade de uma “ajuda de custo” para os profissionais, pois os baixos salários pagos à categoria não são suficientes para suprir as necessidades de sobrevivência dos técnicos, de deslocamento e estadia no município, o que influencia na eficiência do trabalho.

A coordenadora estadual do BF na educação mostra que a questão da equipe técnica no Maranhão é um retrato do nordeste: “no município o mesmo que digita aplica a frequência, muitas das vezes, digita o sistema do SISVAM, muitas vezes é ele que trabalha no CADúnico na assistência”.

Na pesquisa anteriormente referida (COUTO et al, 2010, p.116), identifica-se que a quantidade de profissionais, a sua remuneração e capacitação representam ainda sério obstáculo ao desenvolvimento da Política de Assistência Social nas regiões Norte e Nordeste. Com efeito,

“historicamente a Assistência Social tem configurado um campo social marcado pela restrição de recursos financeiros, dificultando a oferta de serviços [..] com incidência sobre a gestão do trabalho, a qualidade dos serviços prestados e a garantia de direitos. Determinantes históricos que, associados aos atuais processos de Reforma do Estado, vêm impondo a redução da contratação de pessoal nas três esferas de governo, bem como a redução de recursos financeiros. Em decorrência tem-se a incapacidade de consolidar carreiras públicas, rotatividade, desvalorização do funcionalismo público e precarização do trabalho” (COUTO et al, 2010, p.116-117).

Uma expressão dessa situação aparece no reconhecimento das técnicas do CRAS de Maracaçumé quanto à necessidade de aumento da equipe de trabalho para a operacionalização do Programa no município em função da demanda apresentada.

“A questão dos recursos humanos é um desafio para toda a administração pública, mas assume características específicas na assistência social, pela sua tradição de não-política, sustentada em estruturas institucionais improvisadas e reduzido investimento na formação de equipes permanentes e qualificadas para efetivar ações que rompam com a subalternidade que historicamente marcou o trabalho nessa área. Acrescente-se a isso a realidade da maioria dos municípios brasileiros que, sendo de pequeno porte, contam com frágeis estruturas institucionais de gestão, rotinas técnicas e administrativas incipientes e recursos humanos reduzidos e pouco qualificados” (COUTO et al, 2010, p.57).

Sobre as limitações financeiras, a gestora do BF e a assistente social do município de Poção de Pedras ainda colocam as dificuldades de manutenção da estrutura do CRAS e das ações relativas ao BF (Pró-Jovem e PETI, por exemplo). Já o secretário de Assistência Social que é também gestor do PBF de Cedral é de opinião que os municípios de menor porte têm maior carência de recursos, mas um número relativamente maior de pobres, devendo-se, por isso, fazer uma discussão acerca dos critérios de repasse do governo federal aos municípios, de forma a contemplar mais generosamente esses municípios, sobretudo no que diz respeito às despesas de custeio. Para as técnicas do CRAS de Maracaçumé haveria maior eficiência do trabalho se o recurso oriundo do Ministério fosse repassado mensalmente sem atraso.

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Uma dificuldade encontrada pelos gestores de Barreirinhas, que também é comum face às precárias condições dos municípios maranhenses, diz respeito às exigências para a criação de Centros de Convivência. De acordo com os entrevistados, o Ministério faz exigências que o município não tem condições de cumprir, o que acaba fazendo com que novos polos não sejam implantados..

Outra dificuldade explicitamente apontada pelos entrevistados de Barreirinhas e de Cajapió no acompanhamento da Assistência se refere às visitas domiciliares que não acontecem na periodicidade necessária ao acompanhamento das famílias: não existem técnicos (a equipe é reduzida), nem tempo suficientes (há sobrecarga de trabalho), assim como carro de forma constante para o deslocamento dos técnicos (não há carro próprio). Assim, os gestores do Programa contam mais com a boa vontade das famílias irem até a secretaria informar alguma mudança, obrigando os técnicos a acreditar na veracidade das informações prestadas.

Tal como observado para a Política de Assistência Social como um todo, identificam-se críticas à instância de gestão estadual no que se refere ao apoio aos municípios e coordenação entre eles. Essa foi a crítica feita em Barreirinhas, acrescentando que na maioria das vezes essa instância só faz cobranças e exigências, sem entender a realidade do município, e sem sequer fornecer a ajuda necessária A falta de investimento na constituição e na capacitação de equipes de trabalho para realizar as ações acordadas com o governo federal é outro problema apontado pelos responsáveis pelo acompanhamento da condicionalidade da Assistência de São Luís, já que, para eles isso não acontece principalmente nos setores que trabalham com os sistemas de informação.

É válido dar destaque ao município de Caxias. Neste chama a atenção o grau de articulação, no nível de execução, entre os diferentes setores envolvidos no acompanhamento das famílias no contexto da gestão das condicionalidades, como se depreende de várias de suas falas. O estágio de estruturação da Política de Assistência Social em Caxias parece se constituir num fator facilitador dessa articulação, potencializando o acompanhamento das famílias em geral e do Bolsa Família em particular, inclusive na zona rural. Assim, o município parece contar com uma estrutura de atendimento dinâmica, observando-se fortes indícios de que a gestão das condicionalidades obedece, se não à intersetorialidade em razão de problemas de isolamento nos níveis mais altos de gestão, pelo menos a uma consistente articulação entre os setores diretamente encarregados do acompanhamento.

Um aspecto importante a destacar é referente ao planejamento que parece se constituir realmente numa ferramenta de trabalho que direciona as ações, o que representa um avanço no campo da Assistência Social, que se ressente historicamente, de um processo sistemático de intervenção em razão da persistente falta de “condições e de meios financeiros e técnicos dos municípios para enfrentar a função de planejar e executar ações assistenciais”. (COUTO et al, 2010, p.111).

Convém mostrar, contudo, que a maioria dos técnicos nos municípios pesquisados acredita que o trabalho que cabe à Assistência Social não tem o peso e o caráter de exigência de uma condicionalidade “porque o nosso, que é o SISPETI, Pró-jovem...é uma coisa mais leve, que não pesa como condicionalidade em si para bloqueio e cancelamento, o que pesa mais é a saúde e a educação.” O depoimento do operador do controle da frequência do PETI de São Luís, reforça essa visão:

“para eu fazer a gestão da assistência eu preciso efetivamente daquilo que vem da saúde e daquilo que vem da educação. Porém a gente sempre esbarra nisso, nós não recebemos nenhuma informação da saúde, nenhuma informação da educação para que a gente possa montar uma estratégia de acompanhamento.

Mais do que dar um caráter de quase não condicionalidade ao controle desenvolvido pela Assistência Social por não implicar em penalidades, a gestão da própria Assistência é colocada como dependente do desempenho das demais condicionalidades.

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Em síntese, o processo de acompanhamento da condicionalidade da Assistência Social é visto pelos operadores de São Luís como restrito, sem maior repercussão na vida dos beneficiários. Assim eles se posicionam: “eu vejo que a gente alimenta o sistema, vem um técnico e envia as informações para a Caixa, a Caixa vai e envia para o Governo Federal e aí? O acompanhamento está sendo só isso. Tudo é muito difícil, aquisição de materiais, a aquisição de pessoal”.

Assistente Social da Cidade Olímpica em São Luís vê a condicionalidade da Assistência Social como frágil (pois não implica em nenhuma punição) e secundária no conjunto das demais, já que “você acaba cobrindo condicionalidades de outras políticas e a nossa política fica esquecida”. A mesma concepção é compartilhada pelos técnicos do CRAS Bacanga também de São Luís quando afirmam que a condicionalidade da Assistência Social é mais frágil do que as demais, já que seu descumprimento não implica em nenhuma punição (advertência, suspensão ou desligamento), o que, para os técnicos do CRAS, desvaloriza o trabalho educativo que tentam realizar com a população.

A assistente social do CRAS de Alto Alegre considera que o recebimento do benefício deveria também estar condicionado à participação das famílias nas ações e atividades do PETI ou nos cursos de capacitação, mesmo que isso envolvesse punição ou até mesmo a perda do benefício. Segundo ela, somente isso, de fato, tornaria a estratégia de acompanhamento no campo da Assistência Social uma “verdadeira” condicionalidade do Programa.

A apatia social e política dos beneficiários e a necessidade de aumentar a eficiência da gestão seriam fortes justificativas para impor a condicionalidade com um caráter punitivo, como se depreende do depoimento da assistente social do CRAS de Capinzal:

“a família ainda reclama quando tem que participar de alguma coisa, [...] não cumpre as obrigações do Bolsa Família, não aparece para as reuniões, mesmo a gente indo atrás. Então acho que ainda tá muito solto essa questão das condicionalidades. Eu acho que acaba sendo uma coisa negativa”.

Talvez por isso os entrevistados não vislumbrem muitos resultados concretos em termos de alterações na situação de vida das famílias acompanhadas. Em São Luís, os técnicos entrevistados consideram que essa circunstância deve ser conferida a não inserção no mercado de trabalho, o que, por sua vez, ocorreria pela acomodação do beneficiário que “não quer participar, ele é chamado, mas não vai.”. O técnico considera que deveria haver maior pressão sobre as famílias, estabelecendo-se um rígido período para ela permanecer no Programa, além de dar à Assistência o real caráter de uma condicionalidade, passível de advertência, suspensão e cancelamento. Apesar de apontar o beneficiário como em parte responsável pelo não alcance dos objetivos visados, o técnico reconhece as dificuldades enfrentadas pelas famílias para participar das Oficinas, Cursos e Palestras, entendidos como estratégias de autonomização. Diz ele:

“em alguns casos [ele] não tem dinheiro para pagar transporte, ou não tem com quem deixar a criança, se o curso for de manhã ela tem casa para cuidar, tem comida para fazer. Se for de tarde ela vai, mas não pode passar das 17:00 horas porque aí gera outra dificuldade que é o medo de voltar para casa por causa das áreas onde elas moram.”

Já em Barreirinhas, apesar dos técnicos afirmarem que realizam um trabalho de conscientização das famílias visando sua autonomização, este se restringe a esclarecer aos usuários que o benefício tem prazo determinado e a oferecer cursos de capacitação, não tendo sido depreendido a existência de resultados efetivos e objetivos desse trabalho.

Em relação aos possíveis efeitos do acompanhamento na vida das famílias, os técnicos de Caxias apontam o ingresso de um número expressivo de participantes do Pró Jovem na Universidade via PROUNI e no mercado de trabalho. Eles afirmam: “Eles eram aprendizes e agora já estão se profissionalizando”. A nutricionista que trabalha no município procura mostrar o que, na sua concepção, representa um progresso e um efeito benéfico do trabalho de orientação às famílias no seu campo específico de atuação:

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“em relação à alimentação, houve uma evolução muito grande. Eu vou tentando adaptar uma alimentação saudável dentro do poder aquisitivo deles. E então muitas vezes eles consomem as próprias frutas que têm no seu quintal. A procura aumenta cada dia mais e ela abrange todos, desde a infância até o idoso. E fora as palestras que eu dou nos CRAS quando eles pedem. Então, tem melhorado muito essa questão da alimentação saudável, pois se a pessoa não tem condições de ir para uma academia, então faz uma caminhada. Se eu vejo que uma família que tem uma renda muito baixa, tem uma alimentação precária, eu vejo uma forma de equilibrar a proteína, a gordura, para que ela não se sinta desprezada em não poder comprar certos alimentos”.

Em Maracaçumé, por seu turno, os entrevistados atribuem ao SCVF//PETI significativa redução do número de crianças e adolescente na rua ou no trabalho infantil. Conselheiros de Presidente Vargas concordam “pois é raro ver agora uma criança na rua, no geral eles estão ocupados nos dois horários”. Nesse sentido, entrevistados em Maracaçumé citam uma situação: “Eu sei, porque eu acompanho e conheço caso de um menino que saiu da rua e hoje é oficial de justiça”.

Mas esse efeito seria mais do que anulado por situações nas quais o trabalho de acompanhamento não surte nenhuma influência positiva, como se vê nesses depoimentos de participantes do grupo focal do município: “também conheço caso que não posso falar o nome até por questão de estar em segredo de justiça de um menino que é acusado como fugitivo, até como assassino” (participante do grupo focal). “Nós temos um caso do serviço de convivência que assaltou o próprio serviço de convivência, o PETI” (participante do grupo focal).

Conselheira do município cita a saída do trabalho doméstico como resultado das intervenções da Política, mas, em contrapartida, constata um efeito inesperado do processo: “saiu do trabalho infantil e entrou para a prostituição infantil, [...] mas a questão do trabalho infantil diminuiu muito! Ainda tem, mas diminuiu! O Programa foi muito bem-vindo!” (conselheira). Dessa forma, o aumento da prostituição após a saída de crianças e adolescentes da atividade doméstica aponta para a ineficácia das ações e para a necessidade de realização de um trabalho de prevenção, como reconhece uma técnica do CRAS. Para essa técnica, ao não ter um trabalho preventivo eficaz, o Estado transfere a sua responsabilidade para a família que acaba tendo que resolver questões que merecem respostas do poder público.

Outros efeitos são citados por duas beneficiárias de Santa Quitéria, os quais, no entanto, não podem ser atribuídos estritamente ao acompanhamento, mas ao próprio recebimento do benefício. Vejam-se as colocações: “Minha condição mudou um pouquinho” (Beneficiária do BF 1). “Na minha casa eu comprei geladeira e uma TV, mas foi com o dinheiro do meu marido. O Bolsa Família é pra comprar caderno, uma roupinha quando ela tá precisando, e também comida, porque a gente precisa se alimentar, também” (Beneficiária do BF 2).

Segundo a psicóloga que trabalha no CRAS de Viana já é possível notar melhoria na vida dos usuários, sobretudo nas condições de moradia:

“[...] A primeira vez que a gente fez cadastramento [...] pra esse último cadastramento que a gente ta fazendo, eu já pude perceber uma grande mudança na qualidade de vida dos usuários. Muita gente já não recebe mais. Você percebe melhoria na casa quando você vai visitar, tem ruas que você lembra daquele aspecto e nota como está mudado, como as casa estão melhores.”(Psicóloga do CRAS)

Apenas o município de Santa Quitéria não reconhece nenhum impacto obtido pelo acompanhamento da condicionalidade da Assistência Social na vida dos beneficiários. A dificuldade de atendimento da totalidade das famílias vulneráveis inseridas nos diversos sistemas do Bolsa Família em razão de questões estruturais de funcionamento da Política

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de Assistência Social seria o principal fator explicativo desse fato, já que o acompanhamento acabaria por se restringir a uma mera rotina formal de visitas às famílias e ao pólo do PETI.

Os responsáveis estaduais pelas condicionalidades também se pronunciaram sobre as condicionalidades. A coordenadora da assistência social assim se colocou:

“o que a gente tem observado de mais concreto nos municípios é que o cumprimento das condicionalidades pelas famílias beneficiárias de fato tem se materializado nos cuidados com a saúde, no aumento a escolarização e no fortalecimento da família em seu papel protetivo. Isso é um avanço concreto que a gente tem observado nos municípios”.

Já a pessoa encarregada da saúde observa que os índices que informam a cobertura de acompanhamento das famílias beneficiárias do BF têm tido um aumento gradativo a cada ano, representando uma curva ascendente. Essa melhoria gradual no acompanhamento, conforme a gestora é confirmada pela redução do número de municípios com 0% (zero por cento) de informação, ou seja, sem alimentar o sistema. Para a coordenadora estadual da educação, os programas federais repercutem na educação no momento em que essa área tem que fazer o monitoramento da frequência escolar do Bolsa Família. Argumenta ela: “só para te dar um exemplo, 54% de toda matrícula de educação básica de todo o Maranhão é beneficiária do Bolsa Família. Hoje nós temos quase um número de 1 milhão e 400 crianças de 6 até 17 anos sendo acompanhado por essa condicionalidade”. Em compensação, houve melhoria nos índices de abandono e de evasão, com consequente melhoria no que diz respeito à permanência do aluno na escola e até mesmo no seu rendimento escolar. “Melhorou a frequência em função disso: diminuiu o abandono e a evasão. Nos índices que aparecem no próprio censo, tu vês os índices de abandono e de evasão diminuindo consideravelmente”. Conclui ela: “se 54% das matrículas da atenção básica, para receber o “Bolsa” tem que estar estudando, é claro que a gente vai ter mais aluno em sala de aula, né?!”.

A questão dos impactos do acompanhamento da condicionalidade da vida dos beneficiários remete diretamente às estratégias de autonomização das famílias, vistas como forma dos beneficiários terem condições de cruzar a porta de saída do Programa.

O que a pesquisa constata é que a principal e mais disseminada estratégia utilizada nessa perspectiva pelos municípios é a de cursos de Qualificação e Capacitação Profissional como resultado dos esforços de articulação dos CRAS ou das Secretarias de Assistência Social com outros órgãos governamentais e privados porque estas ações podem “dar condições de aumento da renda familiar” (assistente social do CRAS da Cidade Olímpica – São Luís), trazer “um meio de a família sobreviver” (assistente social do CRAS Bacanga – São Luís), “estimular a geração de renda” (participante do grupo focal de Capinzal). Uma das entrevistadas em Maracaçumé também destaca os cursos direcionados para beneficiários do BF como forma de propiciar a geração de renda.

Nesse particular, porém, alguns municípios (Capinzal, Cajapió) priorizam uma ação centrada praticamente na simples orientação dos beneficiários para cumprir rigorosamente as exigências do Programa e no estímulo para que eles próprios procurem alternativas de geração de emprego e renda, sem que projetos direcionados a esse fim sejam implementados, embora possam até terem sido planejados. Em Barreirinhas, ainda que sejam realizadas algumas ações de capacitação, a autonomização se confunde com a estratégia de esclarecimento das famílias sobre o caráter temporal do benefício. Sobre a autonomização das famílias, a gestora de Presidente Vargas menciona que faz reuniões para que os beneficiários despertem para a necessidade de não dependerem do Programa indefinidamente.

Sobre a autonomização das famílias, a gestora de Presidente Vargas mencionou que faz reuniões para que os beneficiários despertem para a necessidade de não dependerem do Programa indefinidamente. A gestora ressalta que alguns A gestora do município ressalta que alguns beneficiários se preocupam em buscar alternativas de vida para melhorar sua situação. Mas destaca também que vê muita acomodação, “muita família que acha que

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aquilo ali é eterno e se acomoda com aquilo”. A psicóloga do mesmo município afirma que precisa ser trabalhada mais a conscientização das famílias, pois segundo ela a falta de clareza do que consiste o Programa e qual é seu objetivo consiste num problema. “Tem muitas famílias que quando visitamos vemos os pais deitados numa rede a tarde toda, cheio de filhos, só esperando o benefício cair. Fazemos um trabalho nas visitas, fazemos reuniões, mas famílias numerosas apresentam isso”.

Essas colocações permitem inferir que, mesmo subliminarmente, há entre os gestores do campo da Assistência Social uma concepção liberal de renda mínima, de acordo com a qual Programas de transferência de renda como o BF desestimulam o trabalho, devendo-se, em função disso, criar simultaneamente barreiras para não incentivar os indivíduos a “escolher” permanecer fora do mercado de trabalho. Mesmo naqueles municípios nos quais há um trabalho sistemático de realização de cursos, como é o caso de São Luís, os técnicos acreditam que se trata de conscientizar a população sobre a necessidade de capacitação profissional para que haja “o mínimo de base”, já que o nível de escolaridade é extremamente baixo. Esse trabalho sistemático de convencimento da população extrapola o titular do cartão se estende a toda a família e é desenvolvido na tentativa de inclusão produtiva, já que muitos cursos incluem encaminhamento ao mercado de trabalho.

A gestora de Viana ressalta a necessidade de um extenso trabalho de conscientização das famílias sobre a importância da capacitação para geração de renda e inserção no mercado de trabalho. Como contrapartida, em sua opinião, o município deveria ofertar de cursos de interesse da população, em horário que ela possa participar, devendo ser ministrados em locais próximos da residência dos candidatos.

Contudo, todo o esforço de realização dos cursos não é precedido de nenhum estudo das tendências do mercado de trabalho nem seguido de um acompanhamento pós-Curso. Portanto, os CRAS não detêm nenhuma informação sobre as perspectivas de inserção dos treinandos nem dos eventuais benefícios das ações de capacitação após os cursos. Mais uma vez a questão das condições estruturais de operacionalização da Política de Assistência Social no contexto do SUAS coloca-se como elemento chave para compreender os limites desse trabalho, como se depreende do depoimento a seguir reproduzido:

“o ponto x mesmo para a gente poder fazer esse acompanhamento é a questão dos recursos. Essa falta de recursos reflete de forma bem considerável. Você tenta, você acompanha a família, faz todo um trabalho, você insere ele num determinado curso e aí você fica sem feedback. O que aconteceu? Será que conseguiu? A gente fica sem retorno. Essa é uma questão crítica, a questão dos recursos humanos e mesmo material” (Coordenadora do CRAS).

Além dos cursos, outras iniciativas são desenvolvidas na intenção de autonomizar as famílias: no CRAS do Bacanga foi priorizada a participação dos beneficiários do Bolsa Família no Arraial da Praça Maria Aragão para venda de seus produtos. Ao ser perguntado sobre que estratégia exatamente é realizada e quem está fazendo esse trabalho, o gestor de Saúde de Poção de Pedras complementou: “Como a maioria da população do município vive da agricultura teve aí um projeto de compra de materiais e aí compra e incentiva mesmo eles a produzirem, é o próprio município mesmo que faz [...]”.

Caxias organiza hortas, além de cursos. Em Maracaçumé, um projeto de construção de casas em função das enchentes que atingiram o município permitiu uma articulação para realização de um curso de ajudante de pedreiro com a finalidade de preparar a mão de obra local, aumento suas chances de contratação no referido projeto. Além disso, por ser a agricultura, junto com o emprego na prefeitura, o principal meio de subsistência do município de Maracaçumé, há uma articulação do Programa Bolsa Família com o setor da agricultura no sentido de estabelecer parcerias com as famílias para plantar verduras (cheiro-verde, alface etc) no quintal a serem vendidas por eles nas escolas, para merenda, e cujos recursos sejam revertidos para os beneficiários.

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Em Presidente Vargas também há uma tentativa de um trabalho intersetorial entre as políticas de assistência social, agrícola e de educação, representando um esforço concentrado para enfrentamento à pobreza das famílias atendidas pelo Bolsa Família. Todavia, também não se pode desconsiderar que o percentual de famílias participantes no projeto é muito reduzido face ao número de famílias atendidas pelo Bolsa Família no município que até o mês de outubro/2011 totalizava 1.679 famílias.

Em Santa Quitéria, foi informado pelos entrevistados que no período da pesquisa o CRAS estava desenvolvendo um projeto em parceria com o Banco do Nordeste, no qual este iria fornecer empréstimos para as famílias do PBF, para que estas pudessem investir em projetos agrícolas. Trata-se de um esforço articulado de capacitação e financiamento entre o CRAS, o órgão gestor da assistência social e instituições financiadoras de projetos como o Banco do Nordeste do Brasil - BNB.

Sobre estratégias e ações referentes à autonomia familiar alguns participantes do grupo focal de Presidente Vargas apontam o Projeto Quintal da Cidadania como uma experiência que tem essa finalidade.

É bom listar os cursos ministrados mais citados nos municípios da amostra: Cabelereiro, Sabonete, Bombons e Camareira, Artesanato, Cestas Decoradas, Ovos de Páscoa, Chocolate, Material de Limpeza, Carpintaria, Manicure, Salgados, Biscuit, Reciclagem, Sandálias, Bolsas, Corte e Costura, Reciclagem de Vassouras e Doces. Sobre isso, verifica-se que tal como detectado na pesquisa de Couto et al (2010) anteriormente citada, “...há que se destacar que as ações de capacitação profissional desenvolvidas nos CRAS são largamente representadas por cursos tradicionais para o desenvolvimento de habilidades que levam, quando levam, a uma inserção precária e instável no mercado de trabalho” (COUTO et al, 2010, p.81-82).

Por outro lado, em consonância com as novas tendências no campo educacional, os gestores, em geral entendem que a inserção ou exclusão no mercado de trabalho depende tão somente das capacidades e competências individuais ou da sua falta que possam levar ou não ao triunfo na hora de concorrer pelos empregos disponíveis, senão vejamos a fala de técnico do CRAS: “levando em consideração a cultura do brasileiro, se depois que ele perder o benefício ele vai continuar, isso eu não sei”.

Na mesma linha de argumentação assim se expressa a responsável pelo acompanhamento da condicionalidade da Assistência Social de Caxias: “existem casos de beneficiários que conseguem se desligar, ter sua própria autonomia com aquilo que eles aprenderam e tirar seu próprio dinheiro”. Sobre a geração de renda uma beneficiária de Cedral afirma que “nos cursos que a gente tá fazendo a gente aprende e já consegue uma renda, né?”. A conselheira do poder público afirmou que os cursos ofertados pelo CRAS são um incentivo para as mulheres aprenderem e montarem o próprio negócio.

Essas colocações mostram-se coerentes com o ocorre no contexto atual, no qual os programas de qualificação restringem-se a melhorar as condições de empregabilidade dos trabalhadores, deixando a estes, a partir daí, a responsabilidade pela sua situação de emprego ou desemprego. Na situação destacada, essa circunstância é agravada pelo fato de os cursos definidos e os conteúdos ministrados somente permitirem formas inserção em empregos precários e com pouca sustentabilidade sem perspectivas concretas de autonomização.

Em síntese, aos cursos representam uma estratégia para dar condições aos educandos de gerar renda, mas estes cursos ficam restritos a conteúdos voltados para áreas de atuação com poucas possibilidades de uma real alteração nas condições de inserção no mercado de trabalho.

Contudo, os fracos resultados são comemorados. O gestor do município de Alto Alegre afirma ter conhecimento de vizinhos e colegas que estão desenvolvendo aptidões e montando negócios pequenos a partir da oferta de cursos e capacitações que o CRAS realizou com o dinheiro do IGD: “Olha, posso falar de vizinhos que moram lá no meu bairro, que eu tenho conhecimento, que aprenderam a pintar e vendem panos de pratos, outras

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fizeram manicure e tá como manicure mesmo. Outras que fizeram curso de cabeleireiro têm umas que já têm seu salãozinho mesmo” (Gestor da Assistência Social).

O mesmo acontece em Caxias, aonde assim se posiciona a assistente social: “a gente tem exemplo concreto de pessoas que fizeram o curso de cabeleireiro, manicure e vai para o salão comunitário, que tem dois CRAS que têm esse salão. Fizeram o curso, se aperfeiçoaram e já colocaram seu próprio salão. Elas fazem essa capacitação, e a gente firmou uma parceria com a Secretaria do Trabalho para divulgar o trabalho delas. Tem salões que iam buscar dentro do CRAS a profissional”.

Sobre os cursos ministrados em Maracaçumé, a gestora menciona a experiência do

curso de cabeleireiro, após o qual também foi montado um salão no prédio aonde funciona o CRAS. As beneficiárias concludentes do curso, então, podem ter um espaço onde utilizam equipamentos e materiais. Em sistema de revezamento podem trabalhar e ganhar dinheiro colocando em prática o que aprenderam.

A técnica do CRAS de Maracaçumé entrevistada entende que os cursos realizados contribuem para a autonomia das famílias:

“a gente trabalha muito preparando eles para que eles não fiquem só nesses R$ 120,00, R$ 100,00. Temos muita conscientização disso: que é preciso melhorar. Por exemplo, pegamos adolescentes do Pró-Jovem e também mães para fazer o curso de salão e montamos o salão, porque elas não tinham onde e como fazer! Daí as meninas entram na área de psicologia e mostram que é importante, incentivam elas a serem empreendedoras, a atender bem, tudo pensando nessa geração de renda delas próprias, né?”

Participante do grupo focal no município acrescenta: “O curso de cabeleireiro foi o que mais chamou atenção, porque elas podem usar o salão e têm essa possibilidade de fazer uma escova e ganhar seu dinheiro”. A técnica do CRAS complementa:

“É aquela coisa [...] quando a pessoa tira uns R$ 300,00, R$ 400,00 depois de um curso desse, onde ela aprendeu e tá trabalhando, mesmo que pouco, ela não vai querer receber mais só cem, duzentos reais, só de Bolsa, ela vai gostar e vai querer mais e quem sabe se torna uma empreendedora mesmo! Então acho que tudo isso é muito bom e só acontece porque tem recurso mesmo, senão era difícil montar essa estrutura e manter”.

Ela destaca outra experiência que considera exitosa: a partir de participação em curso de horticultura uma beneficiária consegue após o curso fazer uma horta e vender sua produção. A entrevistada em Viana informa que há beneficiários empregados em panificadoras e salões de beleza, além da identificação de várias casas com as placas de “vende-se salgados” em decorrência da participação dos beneficiários do Bolsa Família em cursos ministrados pelo CRAS, o que sinalizaria para avanços no padrão de autonomização e consumo das famílias.

Entre as dificuldades para realizar os cursos e as demais atividades que objetivam a autonomização das famílias encontram-se aquelas referentes às condições estruturais de funcionamento da Política de Assistência Social, inclusive limitações financeiras e de recursos materiais e humanos, e a pouca capacidade dos municípios maranhenses de integrar um conjunto de Políticas Públicas em torno de uma política de desenvolvimento com ênfase numa Política de Trabalho que tenha condições de ampliar do mercado de trabalho e garantir o emprego para a maioria dos trabalhadores de forma a favorecer a superação da pobreza de forma sustentável.

Ademais, as iniciativas têm pouca amplitude, atingindo somente um número reduzido de famílias. Acrescente-se o fato de que os CRAS passam a ser vistos como uma espécie de locus de qualificação profissional, o que é um equívoco, face a pouca eficácia de tais ações em razão das circunstâncias em que são operadas – com limitações de ordem

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técnica, operacional e de recursos, além de isoladas de uma política mais ampla de desenvolvimento.

A gestora de assistência social de Viana aponta com uma dificuldade o fato de os próprios beneficiários desistirem dos cursos no decorrer do processo, resultando em elevada evasão Contudo, é a pouca divulgação dessas ações que é considerada um ponto falho em Cedral. O depoimento abaixo revela também outra falha na gestão dos cursos, especificamente a falta de planejamento das ações, no caso, em Poção de Pedras, revelada pela compra de máquinas de costura sem que existam, no município, pessoas capacitadas para lidar com as máquinas compradas, inclusive com recursos do IGD, para oferecimento de curso de costura: “os nossos problemas aqui, de não ter começado o curso ainda, é que nós não conseguimos ainda alguém para ensinar, que saiba mexer nesse tipo de máquina, pois são todas industriais mesmo” (assistente social). 3.4 A intersetorialidade como Estratégia de Gestão do Bolsa Família

As condicionalidades são a maior expressão do desenho intersetorial do BF, ao requerer a integração dos Ministérios e das Secretarias estaduais e municipais de educação e saúde na gestão do Programa e a articulação de Políticas no sentido de favorecer o acesso dos mais vulneráveis a direitos sociais básicos. Ultrapassando o caráter de alívio imediato da pobreza que é favorecido pela assistência direta concretizada no benefício financeiro, as condicionalidades representam uma segunda dimensão do Programa: uma dimensão que configura a ideia de promoção social, cujo impacto objetivado é o de ruptura do ciclo intergeracional da pobreza favorecido pelo acesso a direitos sociais garantidos na Constituição.

Sua gestão intersetorial implica em atuação conjunta das áreas de Saúde, Educação e Assistência Social no registro fidedigno do acompanhamento das condicionalidades e na identificação de problemas relacionados à oferta e/ou ao acesso aos serviços, cuja resolução deve ser alvo de ações específicas definidas e operacionalizadas em parceria. Exige ainda a coordenação das Políticas na perspectiva de apoio ao desenvolvimento das famílias mais vulneráveis visando sua emancipação.

Intersetorialidade, porém, não corresponde apenas à articulação entre setores de Políticas, mas inclui ainda, de forma prioritária, o estabelecimento de mecanismos decisórios permeáveis à participação social e ao diálogo com a sociedade civil. Nesse sentido, envolve mudança gerencial ampla, intimamente ligada às estratégias de descentralização, envolvendo os diversos estágios ou momentos do processo da política.

Portanto, a intersetorialidade torna-se um instrumento estratégico de gestão das condicionalidades das quais depende, em grande parte, o sucesso do BF. Isto porque o pressuposto do Programa é o de que, ao contribuir para a oferta com regularidade e qualidade dos serviços de saúde e educação e o acesso a outros direitos sociais, as condicionalidades constituem-se em condição para o rompimento intergeracional da pobreza. Assim sendo, possíveis problemas na gestão das condicionalidades pode condenar esse Programa ao fracasso como política de caráter estrutural.

Considerando os dados coletados na pesquisa de campo, vê-se que a intersetorialidade é um processo ainda não incorporado à prática de gestão nos municípios da amostra. Embora muito citada, tal estratégia gerencial aparece predominantemente no negativo, ou seja, como algo que não acontece.

A mais frequente manifestação dos entrevistados sobre a inexistência de processos intersetoriais na gestão das condicionalidades está retratada nos problemas de contato e integração entre o gestor do Bolsa Família e os responsáveis pelas condicionalidades da Educação e da Saúde.A fala da gestora de Alto Alegre mostra, inclusive, a dificuldade que têm os envolvidos de se perceberem como parte de um objetivo comum:

“Então hoje a maior crítica que eu faço é essa questão da intersetorialidade, é a Assistência Social sozinha, assumindo mesmo. Tanto que eu vi lá no evento uma pessoa lá que disse que o Bolsa Família não é um programa da Assistência. É de

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onde então o Bolsa Família? Ele é da Assistência, o recurso é do Fundo Nacional de Assistência. Mas o que eu quero colocar é mesmo essa questão: a intersetorialidade não acontece na prática”.

É interessante notar que a defesa do Bolsa Família como programa que é propriedade da Assistência Social serve de argumento para gestores de outras condicionalidades considerarem como incômodo ou como indevido o acompanhamento que devem realizar, como aparece no discurso da responsável estadual da educação: “a gente acompanha uma população que não é nossa! Essa população, ela passa a ser diferenciada porque ela é uma população específica para o programa do Ministério do Desenvolvimento Social, a gente só acompanha. Porque a população da educação tá onde? No censo!”.

A pessoa que prestou informações em Santa Quitéria informa que não ocorre nenhum trabalho articulado da Secretaria de Assistência Social com as outras Secretarias, nem quando alguma família não é localizada. Segundo seu relato: “Articulação com as três secretarias não tem. O que a gente tenta fazer é localizar a família. A gente só não localiza quando ela muda de Santa Quitéria. Mas se ela estava na área de alguma enfermeira e mudou pra área de outra enfermeira a gente vai e informa” (Nutricionista).

Os problemas de interação entre os responsáveis pelos processos de acompanhamento do cumprimento das condicionalidades reflete o pouco intercâmbio entre as instâncias governamentais locais. Isso acontece até nos casos em que há utilização das mesmas instalações físicas pelas Secretarias, como é a situação de Poção de Pedras. Neste município, a falta de assimilação da ideia de articulação efetiva das Secretarias e Políticas envolvidas como uma necessidade gerencial própria do âmbito municipal pode ser percebida quando a entrevistada lamenta a inexistência de trabalho conjunto, em primeiro lugar, por não permitir “o alcance da intersetorialidade demandada pelo governo federal, a obtenção de taxas satisfatórias no Índice de Gestão Descentralizada (IGD)” referindo-se só depois à consequência de não atingir as metas referentes ao cumprimento das condicionalidades e melhoria da qualidade de vida das famílias beneficiárias do programa.

No contexto das instâncias estaduais onde deveria haver maior articulação entre ações e responsáveis, a gestora estadual de saúde ressalta a inexistência de um planejamento intersetorial entre saúde, educação e assistência social para o desenvolvimento de ações necessárias à gestão integrada do referido Programa de forma.

Confirmando a hipótese de não habituação (até mesmo de não aceitação) quanto aos procedimentos necessários ao acompanhamento dos beneficiários já apresentada neste relatório, sobretudo nos níveis hierárquicos que lidam mais diretamente com as famílias, a gestora de Presidente Vargas mostra que a cooperação entre as áreas não é exercitada no cotidiano da execução do Programa, pois [...] “raramente conseguimos que um profissional da saúde venha fazer uma fala à família. Os operadores da frequência (Educação) até conseguimos, mas da saúde é mais difícil. A gente consegue sentar e conversar com o secretário, mas trazer o profissional mesmo na reunião, na sede, é mais difícil”.

É importante ressaltar a situação específica de Caxias, aonde se encontram indicações de certo isolamento entre os setores administrativos encarregados da gestão das condicionalidades. Nos demais municípios, quando apontada, a articulação entre as instâncias locais de governo (articulação que é mais frequente entre a Assistência e a Educação, sendo a Saúde a área mais isolada, na maioria dos municípios) é exemplificada por ações conjuntas, por trocas de informações e relatórios, por consultas nos sistemas de informação de outras áreas, que é o que ocorre, por exemplo, em Cajapió. Contudo, essa articulação se resume a contatos formais e informais para resolução de questões operacionais relacionadas, sobretudo, a dados para alimentação do sistema.

Os municípios citam a utilização comum de espaços físicos entre Secretarias como forma de criar condições para a integração entre as Políticas, o que seria uma forma de favorecer o trabalho intersetorial, pois, como foi dito no grupo focal de Barreirinhas “Se fosse tudo no mesmo local seria mais fácil, porque nós iríamos conhecer o trabalho de cada um. [...]”. Esse fato seria positivo porque os técnicos teriam a oportunidade de conhecer melhor a dinâmica de funcionamento e as dificuldades de cada área, facilitando a orientação aos

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beneficiários, mas também por representar uma facilidade para estes que não precisariam ir a vários lugares diferentes na tentativa de resolver algum problema com o benefício. Sobre Barreirinhas, é válido destacar que na época da pesquisa o município estava com seus recursos do IGD bloqueados em razão do baixo cumprimento da condicionalidade da saúde, o que fez avançar o trabalho intersetorial, já tendo acontecido uma primeira reunião com todos os envolvidos, tendo sido definido que a cada dois meses haveria uma nova reunião. Essa única reunião já havia servido para todos conhecerem as dificuldades de cada área, e para ajudar a solucioná-las.

Em Viana e Santa Quitéria, o que é citado como exemplo de trabalho intersetorial é unicamente a busca de informações sobre as famílias, pelos responsáveis pelas condicionalidades de saúde e educação, no banco de dados da assistência social. Aliás, registra-se que esboços de articulação entre os setores envolvidos no Programa, como se constata em São Luís, ocorrem mais pela necessidade sentida pelos gestores da Saúde e da Educação de buscar a contribuição da Assistência Social na potencialização do acompanhamento das suas respectivas condicionalidades e se configuram como uma estratégia de resolução de alguns gargalos na localização e abordagem dos beneficiários. Assim sendo, se, por um lado, o Programa é compreendido como “coisa da Assistência Social”, por outro, a intersetorialidade não é vista como uma estratégia de gestão que atravessa todo o ciclo das Políticas Públicas.

Para a digitadora do SISVAN, em São João Batista, é exatamente a falta de um trabalho articulado entre Secretarias que leva os agentes de saúde para a Secretaria de Assistência Social a fim de obter informações fidedignas através do cadastro. Para mudar essa situação, a entrevistada diz “que tinha que ter uma articulação entre as secretarias que acompanham”.

Alguns municípios consideram estar iniciando um processo de intersetorialidade em âmbito local. De acordo com a gestora do BF de Capinzal a intersetorialidade é essencial para a gestão das condicionalidades e ainda está sendo “trabalhada”: “Não vou dizer que está perfeito, a gente está caminhando. Até porque as três secretarias estão conscientes de que se não houver um trabalho juntos, em parceria, o trabalho não fica perfeito, né? [mas] a gente já vê uma melhora”.

A própria gestora estadual do PBF na assistência social acredita no caráter inicial assumido pela intersetorialidade como estratégia de gestão quando o qualifica de razoável, acrescentando que “poderá ser melhorada se forem consideradas as agendas das demais áreas para uma ação conjunta. A maior dificuldade é a gente conseguir se agendar, reunir; é meio difícil com as demandas que todo mundo tem”. O entrevistado em Maracaçumé reconhece o caráter instrumental das articulações empreendidas “porque, por exemplo, a gente se reúne mais é só para resolver problema”, mas considera que isso já representa certa aproximação entre assistência social, educação e saúde, tal como preconizado pelo Programa.

É fator fundamental, para reunir condições de coordenação de Políticas, a criação e o fortalecimento de instrumentos e espaços que privilegiem a ação intersetorial. Contudo, não existem, nos municípios investigados, mecanismos institucionais minimamente estruturados que possam dar lugar ao debate coletivo de forma sistemática e como parte integrante do próprio processo da Política. Reuniões ou encontros entre os gestores das três áreas para discussão acerca das condicionalidades ou qualquer outro assunto em comum raramente são mencionados. Quando o são, revelam seu caráter pouco formalizado: “Olha, aqui nós trabalhamos todo mundo juntos, mas é mais informa” (gestor da condicionalidade da educação de Poção de Pedras).

Esse caráter pouco formalizado das iniciativas de integração pode ser evidenciado até nas instâncias estaduais de coordenação: “a gente troca informações, quando tem algum problema a gente tenta obter informação pra saber como encaminhar”. É válido citar a inciativa da coordenação estadual do PBF na assistência social de realizar um Seminário Intersetorial que agregou as Políticas de Educação, Saúde, Assistência, Segurança Alimentar e o Controle Social, o que pode fazer avançar a articulação e a

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integração entre as áreas, representando um passo importante na direção da intersetorialidade.

Em que pese inexistência de instâncias para realização de um trabalho menos isolado, implicando no reconhecimento da urgência de melhorar esse aspecto, o gestor do PBF na Saúde do município de Presidente Vargas, tem clareza do próprio caráter integrado do Programa, como se pode constatar na sua fala: “Na Saúde, por exemplo, temos um problema nacional, né? Se a atenção básica não funciona, não vai funcionar mais nada. Se eu não tenho cobertura vacinal, se não tem pré-natal, aí a comunidade fica no risco”.

O mesmo reconhecimento se depreende da fala de conselheira de Assistência Social de Maracaçumé “Eu vejo assim: que a Secretaria de Assistência, Educação e Saúde são um elo, quando uma falha a outra vai falhar também. Então têm que andar todas de mãos dadas para resolver os problemas e avançar”. Convém destacar que muitas dificuldades enfrentadas pelos e nos municípios poderiam ser melhor equacionadas se um importante mecanismo institucional introduzido pelo PBF – criação de instâncias intersetoriais de negociação – tivesse de fato sido instituído.

Somente em São Luís existe um Comitê Gestor (do qual participam os Secretários da Assistência, da Saúde e da Educação) e um Comitê Executivo (congregando coordenadores e superintendentes das respectivas áreas que compõem o BF), tendo este último sido pensado em razão do não funcionamento efetivo do Comitê Gestor. Entretanto, essas instâncias, segundo os depoimentos, funcionam de forma limitada e intermitente. Isso denota a pouca experiência dos sujeitos sociais em estabelecer processos decisórios compartilhados como parte de uma prática de gestão intersetorial. A disposição para um trabalho nessa direção parece depender de variáveis que não estão no campo técnico, quer dizer, só ocorre quando o governante consegue ver nele um elemento de motivação política da sua administração. Os técnicos reconhecem que não há intersetorialidade na gestão das condicionalidades quando dizem: “eu vejo que essas condicionalidades são acompanhadas pelas exigências do sistema e cada um por si e Deus por todos”.

Chama atenção o fato de o Conselho, enquanto instância de controle social e cuja participação é fundamental para a democratização das decisões, não ser lembrado como parte da estratégia de gestão intersetorial, na maioria dos casos, o que pode indicar alguma dificuldade dos municípios em dividir o poder com setores da sociedade civil.

Com efeito, em que pese a grande relevância dos Conselhos no contexto da PNAS no sentido destes se constituírem como instâncias de controle e em espaços políticos de expressão e de negociação de interesses sociais em disputa, aumentando a poder da população de influenciar nos processos de decisão, assim como de fiscalizar o Estado na execução das ações, a presença e a participação qualificada dos representantes da sociedade civil aparece como um aspecto frágil e desafiador no âmbito dessa Política. (COUTO et al, 2010, p.247).

Acontece de forma idêntica no contexto do BF em relação às condicionalidades, mas sobretudo no que diz respeito ao IGD. De fato, só para dar um exemplo, a presidente do CMAS de Cajapió demonstra, no grupo focal, pouco entendimento sobre as questões discutidas – condicionalidades e IGD. Os depoimentos dados por conselheiros de Caxias (aliás, único município a ter relatado a criação uma instância de controle específica do Bolsa Família) sugerem que, embora caiba ao Conselho discutir e encaminhar questões ligadas à ação do poder público no monitoramento das condicionalidades, “não adianta nem colocar a palavra condicionalidade porque eles não sabem o que é. A gente tem que colocar o que eles têm que fazer”. Apesar da evidente fragilidade de segmentos da sociedade civil em termos de participação nessa instância e do tom diretivo dos funcionários da Secretaria de Assistência Social, um representante do poder público afirma: “eles cobram muito, eles participam”.

Os próprios conselheiros reconhecem que “de gestão a gente não discute muito, a gente discute mais a questão dos usuários”. Na sua função de fiscalizadora, essa instância toma conhecimento dos relatórios da Secretaria de Assistência Social que mostram o desempenho do município no que se refere à gestão das condicionalidades, mas “o conselho só age quando tem denúncia”.

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Dessa forma, os conselhos parecem ter um papel apenas homologador das decisões tomadas pelo executivo. Nesse sentido, os Conselheiros parecem apenas tomar conhecimento de como estão sendo executadas as ações e de que forma estão sendo usados os recursos, sem questionar sua forma de distribuição e nem mesmo participar das deliberações quanto a sua aplicação..

Essa situação não é exclusiva de Caxias, aonde o processo de participação social até se encontra mais avançado relativamente a municípios com estrutura mais precária. Ao contrário, ela revela um padrão histórico de relação do Estado com a sociedade civil, caracterizado, por um lado, por limites relacionados à tessitura do tecido associativo (ainda esgarçada) e, por outro, uma orientação tecnocrática do Estado, historicamente impermeável à participação, apesar de se identificar avanços nesse aspecto.

Finalmente, um importante aspecto pode ser depreendido da fala de um dos conselheiros de Caxias: “eu sou conselheiro de assistência social, conselheiro da criança e adolescente, faço parte do FUNDEB aqui e faço parte de mais dois conselhos em São Luís. Eu tenho que dar conta do meu emprego. Tem condições de eu sair para fazer palestras para entidade? Não tem”. Essa situação é representativa do que foi apontado como um problema em relação à participação social no âmbito da Política de Assistência Social pela pesquisa realizada sobre o processo de implantação e implementação do Sistema Único de Assistência Social (ver COUTO et al, 2000), já que “tal fato cria dificuldades em termos de conciliação de tempo para realizar as atividades exigidas e da compreensão de várias temáticas pelos conselheiros” (COUTO et al, 2000, p.121). 3.5 Críticas e Sugestões

Uma primeira e importante sugestão, dada pelos sujeitos da pesquisa, decorre da

constatação da persistente insuficiência de recursos – a despeito da ampliação do investimento federal - como obstáculo à operacionalização da Política de Assistência Social como um todo, do BF, em particular e, sobretudo, do acompanhamento das condicionalidades. Trata-se da recomendação ou até da exigência de ampliação dos recursos dos municípios para o campo assistencial e do co-financiamento por parte da esfera estadual. Ao mesmo tempo, é solicitado o aumento dos recursos do IGD pelo MDS, assim como repasses de forma contínua e regular, em outras palavras, sem atraso. Além dos recursos, também são sugeridas melhorias efetivas nas condições de trabalho para o acompanhamento das condicionalidades, incluindo-se aí aumento dos salários dos profissionais.

Considerando a percepção dos técnicos de que a condicionalidade da assistência social é frágil, ou melhor, que não tem propriamente o caráter de condicionalidade, uma proposta disseminada, especialmente entre os assistentes sociais, é a de que o não cumprimento da exigência da frequência mínima da carga horária relativa aos serviços de convivência oferecidos pelo PETI deveria ser passível de punição (advertência, suspensão e cancelamento). Para além, é sugerido que a própria participação das famílias em ações voltadas para a geração de trabalho e renda que, nas diretrizes do Programa, se constituiriam numa das estratégias de autonomização dos beneficiários, deveria configurar, por si só, como condicionalidade. Essa equivocada proposta é, provavelmente, oriunda do desânimo dos técnicos ao atribuir os parcos resultados positivos decorrentes dessas ações ao desinteresse e desmotivação dos beneficiários. Vale acrescentar que essa proposta expressa uma concepção de condicionalidade orientada pela lógica punitiva dissociada do direito. A pesquisa revela que, no geral, as ações de “conscientização” realizadas por gestores e técnicos junto às famílias do BF em relação ao cumprimento das condicionalidades reforçam essa lógica ao enfatizar esse cumprimento como condição para permanência no Programa. Ademais, a exigência de acessar serviços restritos, precários que não vêm produzindo melhorias substanciais no padrão de vida das famílias e a pouca viabilidade das ações de capacitação ofertadas podem reforçar muito mais um caráter de obrigatoriedade, sem efetivas contrapartidas do poder público do que propriamente o acesso a direitos. Ressalta-se, ainda, que a restrição por parte do poder público na oferta de

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serviços de qualidade, bem como do acesso a estes, configura-se em uma punição histórica a que as famílias pauperizadas vêm sendo submetidas.

As evidentes falhas no processo de acompanhamento propriamente dito detalhadas ao longo deste relatório motivaram sugestões para seu aperfeiçoamento através, principalmente, da realização de um trabalho sistemático e permanente com os trabalhadores diretamente responsáveis pelo acompanhamento nos territórios: operadores do sistema de ensino – professores, diretores, etc – e agentes e outros profissionais da saúde, sobretudo os de PSF. Nesse contexto, alguns sugerem maior dedicação a famílias com situações específicas de vulnerabilidade. Além disso, foi sugerida a implementação de um projeto de estímulo da presença dos alunos nas escolas visando sua aprendizagem, independentemente do recurso.

A ideia subjacente impulsiona o trabalho na direção de dar maior prioridade ao acompanhamento propriamente dito, secundarizando as tarefas afetas aos sistemas de informação – registro e repasse dos dados coletados nas instâncias de execução. Contudo, outros entrevistados preocupam-se com as falhas constantes dos sistemas de informação ligados ao monitoramento do cumprimento das condicionalidades – do Sistema Presença, do SISVAN, e do Cadastro. Por isso, sugerem, pelo lado do MDS, melhorar os próprios sistemas e do lado dos municípios, propiciar formas de acesso de maior qualidade.

Quanto ao cadastramento, sugerem maior “precisão” das informações de forma a se focalizar de fato nas famílias mais pobres. Isto porque “tem muita família que tá lá dentro e não se encaixa por não precisar” Essa imprecisão, inclusive, teria possibilitado, segundo conselheira de Capinzal, desvios de recursos do programa, o que exigiria também maior controle por parte do Ministério do Desenvolvimento Social: “Tem pessoas que têm comércio, tem dinheiro, tem moto, tem tudo e tá recebendo Bolsa Família”.

No que se refere à questão da intersetorialidade, cuja fragilidade foi enfatizada tanto nos municípios quanto nas coordenações estaduais do BF, os entrevistados reconhecem a necessidade de fazer avançar o trabalho conjunto entre as diferentes secretarias envolvidas na gestão das contrapartidas exigidas pelo BF por meio de: um processo de planejamento integrado que possibilite a identificação de problemas relacionados à oferta e/ou ao acesso aos serviços e sua resolução através de ações específicas definidas e operacionalizadas em parceria; utilização de uma estratégia voltada para a prática de encontros locais, regionais e estaduais envolvendo minimamente as três áreas, devendo se estender àquelas que possam contribuir para o desenvolvimento e a autonomização dos beneficiários; administração compartilhada dos recursos oriundos do IGD.

No processo de construção de uma dinâmica intersetorial foi lembrada a necessidade de maior aproximação entre as equipes responsáveis pelas condicionalidades e os conselhos, o que não apenas favoreceria que estas equipes pudessem captar “o olhar” dos beneficiários através de seus representantes presentes nessas instâncias, como daria a estas condicionalidades um caráter de “reforço positivo e não coercitivo”. Além disso, ações no sentido de possibilitar maior clareza e conhecimento do Conselho quanto às suas funções também são sugeridas, até mesmo como estratégia que permitiria uma fiscalização mais efetiva do conselho, resultando no uso correto e mais apropriado dos recursos.

Levando em conta o grau de centralização das decisões e de recursos nas mãos dos prefeitos, foi sugerido um processo mais aberto e mais democrático de tomada de decisão nos municípios pesquisados. 4 A REALIDADE DA GESTÃO DO ÍNDICE DE GESTÃO DESCENTRALIZADA (IGD) NO

ESTADO DO MARANHÃO

No BF, a transferência monetária é centralizada no governo federal, enquanto que a implementação do Cadastro Único para Programas Sociais - CadÚnico (cadastramento, seleção, renovação, suspensão e desligamento das famílias) e o acompanhamento do cumprimento das contrapartidas pelos beneficiários é descentralizado e constitui responsabilidade dos municípios, onde são oferecidos os serviços de saúde e educação. Este acompanhamento realizado pelos municípios é monitorado e avaliado pelo governo

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federal através de índices especialmente criados para esse fim, os quais são agregados em um indicador sintético: o Índice de Gestão Descentralizada (IGD).

O IGD foi criado em 2006 pelo governo federal na intenção de incentivar a qualidade de gestão do Programa na esfera municipal, constituindo-se num estímulo financeiro para melhoria da relação da gestão local, além de representar uma ferramenta de monitoramento do desempenho municipal. Em relação às variáveis que compõem às condicionalidades, o objetivo é monitorar e reforçar o empenho do município no acompanhamento e garantia do acesso das famílias do BF aos serviços de saúde e educação, vistos como fundamentais para a superação da pobreza. Já no que diz respeito aos aspectos vinculados ao CadÚnico, sua finalidade é verificar e intensificar a capacidade de os municípios coletar dados e informações com integridade, qualidade e com a devida atualização, que possam identificar as famílias de baixa renda, a fim de incluí-las nos diversos programas sociais em funcionamento. Dessa forma, o IGD combina as informações sobre o cumprimento das condicionalidades (por meio da taxa de crianças com informações de frequência escolar e taxa de famílias com acompanhamento da agenda de saúde) e as informações do Cadastro (através da taxa de cobertura qualificada de cadastro e taxa de atualização do cadastro).

Todo esse processo é acompanhado da disponibilização de sistemas de informatização que foram estruturados com o intuito de permitir o compartilhamento da gestão e favorecer o trabalho cooperado, com coordenação tanto intersetorial e intragovernamental quanto entre diferentes esferas de governo.

Neste item, tal como ocorreu com o tema das condicionalidades, são apresentados os resultados da pesquisa de campo no qual se sintetiza e analisa informações sobre o IGD e sua possível contribuição no aprimoramento da qualidade da gestão local do BF nos 13 municípios da amostra. A coleta de dados consistiu igualmente em entrevistas realizadas com os gestores municipais do BF, assim como os gestores estaduais e municipais de cada condicionalidade; em discussões nos grupos focais nos municípios, com a participação de técnicos dos CRAS, representantes dos Conselhos Municipais e usuários do BF).Estas informações são complementadas por observações dos pesquisadores feitas durante sua permanência nos municípios. Embora se analise e problematize objetivamente os dados da pesquisa, procura-se ser fiel às concepções dos entrevistados, tentando reproduzir sua própria visão sobre seu trabalho e as condições concretas em que ele ocorre.

Além disso, foram coletados, no site do MDS, dados que representam os resultados obtidos pelas instâncias locais sobre as diversas variáveis que compõem o IGD dos municípios contemplados na pesquisa de forma a se ter um quadro do desempenho municipal, expresso nos índices parciais referentes ao cadastro e às condicionalidades, bem como no índice sintético que mostra, em sentido global, a qualidade de gestão dos municípios. 4.1 Os dados sobre o IGD e o Repasse dos Recursos em Relação ao Teto Previsto nos

Municípios da Amostra Convém destacar, inicialmente, que o cálculo do IGD, que varia de 0 a 1, resulta da

média aritmética das quatro variáveis: taxa de cobertura e taxa de atualização de cadastro, taxa de crianças com informação de frequência escolar e taxa de famílias com acompanhamento das condicionalidades de saúde. Para definir os valores a serem repassados aos municípios é feita uma multiplicação do seu IGD pelo valor de referência de R$ 2,50 e após, pelo número de beneficiários do BF, desde que não ultrapasse a estimativa de famílias pobres7. Assim sendo, os valores efetivamente transferidos pelo MDS variam de acordo com o desempenho dos municípios, resultando que, quanto maior for o IGD, maior será o volume de recursos recebido; em sentido oposto, quanto menor for o Índice, menores serão os recursos repassados.

7 Os municípios de pequeno porte, em geral com número menor de beneficiários, recebem recursos

em dobro por até 200 famílias as quais devem ser, no cálculo, somadas ao número de participantes do BF.

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O quadro 8, abaixo, contém o IGD sintético dos municípios que compuserem a amostra para a pesquisa de campo, demonstrando que a média, no período jan./out./2011, situa Poção de Pedras, município de Porte Pequeno I, com o maior índice sintético (0,92), recebendo, em valores acumulados jan/out/2011, R$ 63.684,84, seguido de Santa Quitéria do Maranhão, município de Porte Pequeno II, com 0,91, recebendo em valores acumulado jan./out./2011, R$ 91.250,38, e Presidente Vargas, município de Porte Pequeno I, com 0,90, , recebendo em valores acumulado jan./out./2011, R$ 36.897,40. Chama a atenção a capital, São Luís, apresentar o menor índice sintético do IGD no mesmo período (0,61), mesmo assim recebendo em valores acumulados jan./out./2011 R$ 1.239.075,03. Quadro 08 Índice Sintético do IGD por município da amostra em outubro/2010 e média no período janeiro/outubro/2010

Municípios Out/2010 Jan/out/2010

Repasse acumulado até out/2010 em R$

São Luís (metrópole) 0,58 0,61 1.239.075,03

Poção de Pedras (Pequeno I) 0,91 0,92 63.684,84

Caxias (Grande) 0,78 0,75 370.507,00

Viana (Pequeno II) 0,94 0,88 155.214,81

Cedral (Pequeno I) 0,85 0,84 34.251,00

Presidente Vargas (Pequeno I) 0,90 0,90 36.897,40

Cajapió (Pequeno I) 0,73 0,84 37295,71

Capinzal do Norte (Pequeno I) 0,87 0,88 38.756,55

Barreirinhas (Barreirinhas) 0,74 0,80 121014,59

Alto Alegre do Maranhão (Pequeno II) 0,84 0,83 74.965,78

Maracaçumé (Pequeno I) 0,89 0,89 59.292,85

Santa Quitéria do Maranhão (Pequeno II) 0,90 0,91 91.250,38

São João Batista (Pequeno I) 0,86 0,83 65.415,25

Maranhão 0,82 (IGDE) 189.360,00 (IGDE)

Fonte: www.mds.gov.br acessado em 23/01/2012

Os valores máximos previstos de recursos do IGD a serem repassados aos municípios e os valores efetivamente recebidos pelos mesmos, de acordo com os depoimentos dos entrevistados, durante a realização da pesquisa de campo são apresentados no quadro 09. De modo que os dados registrados reproduzem informações prestadas por sujeitos da pesquisa, de sua inteira responsabilidade, expressando, possivelmente, valores aproximados.

Quadro 09 Valores dos Tetos e Recebidos do IGD pelos municípios Municípios Teto mensal

informado em R$ Valor Recebido em R$

Diferença em R$ Diferença %

Alto Alegre 9.300,00 7.745,89 1.554,11 16,71

Capinzal 5.000,00 3.000,00 2.000,00 40,00

Poção de Pedras

9.000,00 5.000,00 4.000,00 44,44

Barreirinhas 42.000,00 32.000,00 10.000,00 23,81

Cajapió 4.427,50 3.896,20 531,30 12,00

Caxias 48.000,00 38.000,00 10.000,00 20,83

Cedral 3.692,50 3.100,00 592,50 16,05

Maracaçumé 6.000,00 5.400,00 600,00 10,00

Presidente Vargas

3.900,00 3.200,00 700,00 17,95

Santa Quitéria 10.000,00 8.617,50 1.382,50 13,83

São João Batista

7.000,00 3.000,00 4.000,00 57,14

Viana 18.262,50 16.696,00 1.566,50 8,58

São Luís Não informou Não informou _ _

Fonte: pesquisa de campo, set.out.nov. 2011

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Como se vê no quadro acima, nenhum município alcançou o teto de recursos previstos de acordo com o cálculo definido pelo governo federal, o que indica deficiências na gestão, sobretudo das condicionalidades, evidenciando-se uma situação mais favorável em relação às variáveis do CadÚnico.

A gestora do BF na Assistência Social de Viana (que experimentou uma perda de apenas 8,58%, a menor entre os municípios) afirma que o município não recebe o valor máximo de recursos, devido ao baixo índice da condicionalidade da saúde, que é inferior a 0,60:

“O teto previsto é de R$ R$18.262,50, e a gente tá recebendo R$16.696,00. Há uma falta de quase dois mil reais que nós estamos perdendo. Não por conta da assistência, mas você sabe que no IGD são três níveis de condicionalidades: saúde assistência social e educação. E a gente ainda tá tendo falha na área da saúde. A gente não ultrapassa os 61%. Não por conta da capacidade da saúde, mas porque os usuários têm um fluxo muito grande de se mudar e isso prejudica muito. Mas, segundo a secretária de saúde junto com o coordenador, já estão tentando resolver”.

De fato, as deficiências na gestão do BF implicam em perda de recursos pelos municípios. O município de Barreirinhas, inclusive, estava com seus recursos suspensos na época da pesquisa por ter apresentado taxas de famílias com acompanhamento da agenda de saúde de 0,16, enquanto deveria atingir IGD mínimo de 0,55 e apresentar em todas as taxas que compõem o IGD um valor igual ou superior a 0,20 constituem-se em dois dos requisitos para os municípios receberem os recursos financeiros. Essa punição levou as instâncias municipais a empreenderem um esforço de trabalho conjunto e mais qualificado para reverter a situação.

O município com maior perda de recursos do IGD é o de São João Batista, com perda de 57% em relação ao teto. Em que pese o município de Poção de Pedras ter tido uma perda idêntica de R$ 4.000,00, sua perda em percentual foi menos acentuada (de 44,44%) por possuir um teto menor. A primeira situação parece estar relacionada ao fato de que no período da pesquisa de campo o município passava por um momento de transição de gestão política, considerando que o prefeito havia sido cassado e substituído juntamente com toda a equipe de secretários, tendo sido evidenciado que a assistência social se encontrava na ocasião bastante desarticulada.

No segundo município, a situação de perda parece ter motivado o município a introduzir mudanças positivas no processo de gestão de tal forma que, entre a entrevista quando foram informados o teto e o repasse do MDS (1º semestre de 2011) e outubro de 2012, para o qual se tem dados sobre o IGD, observa-se uma melhora significativa nos índices, chegando a colocá-lo como apresentando um dos melhores desempenhos entre os participantes da pesquisa.

Considerando essa circunstância somada à de Barreirinhas anteriormente referida, percebem-se efeitos positivos da estratégia que vem sendo implementada pelo MDS de estímulo financeiro aos municípios que vem sendo implementada pelo MDS, havendo fortes indícios de que a utilização dos recursos do IGD tem contribuído para a melhoria de gestão do BF, tanto em relação ao acompanhamento das condicionalidades quanto no que diz respeito a ações de cadastramento das famílias.

Capinzal também experimentava uma elevada perda de recursos, representando 40% do que poderia acessar considerando seu teto. Essa ocorrência provavelmente está relacionada ao que foi visto pela pesquisadora que esteve no local: os operadores dos sistemas da saúde e da educação trabalham em precárias condições de funcionamento e não conseguem repassar as informações aos setores competentes, mas não se podem descartar problemas no registro das informações das famílias pobres pelo município. Não por acaso, portanto, esse município tem o terceiro pior resultado no acompanhamento da agenda de saúde (0,62) e na taxa de atualização do cadastro, inclusive com média abaixo da registrada para o Maranhão (0,71).

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Deve-se registrar que os dados apresentados na tabela 3, foram fornecidas diretamente pelos entrevistados nos municípios, sem a devida apresentação de documentos de comprovação, não tendo, portanto, o caráter de informação oficial.

Analisando-se os dados contidos na tabela 1 e 2 destaca-se incialmente que São Luís é o município com o pior desempenho no conjunto dos que participaram da coleta de dados: seu IGD de 0,58 em outubro de 2010 era o mais baixo entre os 13 municípios da pesquisa, sendo que os demais apresentaram IGD nesse mês acima de 0,70. Ademais, a capital do estado apresentava as piores taxas de crianças com informações de frequência escolar (0,72 enquanto todos os outros apresentavam índices superiores a 0,80), de cobertura qualificada de cadastro (0,70, muito abaixo dos restantes, com taxas além de 0,90) e de atualização de cadastro (0,64 ao passo que o segundo pior colocado apresentava taxa de 0,70), apresentando ainda o segundo pior índice (de 0,26), somente superior ao de Barreirinhas (que foi de 0,16) em termos de famílias com acompanhamento da agenda de saúde. Pode-se ainda acrescentar que essa é uma situação constante em dez meses do ano de 2010 (janeiro a outubro), pois nesse período a média do IGD de São Luís foi de 0,61, configurando-se também como a mais baixa no conjunto dos municípios.

Em pesquisa que analisa o IGD em Minas Gerais (MONTEIRO, FERREIRA e TEIXEIRA, 2009), foi identificada relação inversa entre o tamanho da população e o valor do IGD, o que poderia sugerir maior dificuldade dos municípios maiores em gerir programas de transferência de renda e combate à pobreza. Sem poder apontar a existência necessária entre essas variáveis, os pesquisadores, no entanto, confirmam que tanto quanto os menores, os municípios maiores também demonstram fragilidades na gestão desses Programas, provavelmente pelas dificuldades de focalização da Política Pública e de acompanhamento das famílias. Por um lado, o crescimento desordenado das cidades maiores aumenta e intensifica os problemas sociais tornando mais complicado o acesso a regiões de risco e a atualização dos cadastros. Por outro lado, o número maior de famílias a serem atendidas torna mais complexo e, portanto, mais difíceis as tarefas de coordenação e de articulação e mesmo a integração entre as Secretarias de Assistência Social, de Saúde e de Educação.

Um dado que reforça essa ideia é o fato de a taxa de cobertura qualificada alcançar escore máximo (de 1,00) em nove dos treze municípios pesquisados, menos nos dois maiores, São Luís e Caxias, que obtiveram, respectivamente, os índices 0,70 e 0,94 nessa variável. Entre os municípios de pequeno porte, somente Capinzal não alcançou o escore máximo nessa taxa. Nesse município a gestora do BF na Assistência Social que é também coordenadora local do BF deixa perceber pouco domínio sobre a questão do IGD quando diz: “Essa questão do IGD eu não estou muito por dentro não, fica mais com o secretário da Assistência mesmo. Eu fico na parte de coordenação do Bolsa, mais na parte do CadÚnico, do sistema”, o que provavelmente tem repercussões negativas no desempenho municipal.

Poção de Pedras, Presidente Vargas, e Santa Quitéria são os municípios com os melhores IGD’s em outubro de 2010 e na média do período de janeiro a outubro do mesmo ano, situados em torno de 0,90 e mais.

Os municípios em geral obtêm as melhores taxas na variável relacionada à cobertura qualificada de cadastro, com média para o Maranhão em outubro de 2010 de 0,95, o mesmo resultado não sendo obtido no que diz respeito à atualização do cadastro (com média para o Maranhão, em outubro de 2010, de 0,77). Por isso, não se pode desconsiderar as dificuldades locais em manter atualizadas as informações sobre as famílias em relação à estimativa de famílias com renda familiar mensal per capita de até meio salário mínimo, mesmo quando são conseguidos bons índices de cobertura. Essa informação pode indicar que os municípios conseguem localizar e mapear os pobres de sua região, sem, contudo conseguir captar as mudanças ocorridas nas suas condições de vida, inclusive em função das ações do BF.

Essa é uma situação reconhecida pelo próprio coordenador do BF de Santa Quitéria. Ele afirma que, apesar de a taxa de atualização cadastral de seu município ser de 0,91 no mês de outubro de 2010, o que é uma taxa relativamente alta em si, além de superior às taxas relacionadas à educação e saúde, (respectivamente de 0,89 e 0,81), há dificuldade na

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atualização cadastral, conforme atesta no seu depoimento: “A gente tem um problema de queda na atualização cadastral. Não tem problema com a educação e nem com a saúde”.

Os piores índices obtidos têm relação com o deficiente acompanhamento da agenda de saúde das famílias, o que tem continuamente rebaixado o IGD dos municípios pesquisados. Sendo a essa taxa de 0,70, verifica-se que ela se encontra muito abaixo da de cobertura, que é de 0,95. Por outro lado, mesmo que tenham sido apontadas várias falhas no processo de monitoramento da frequência escolar, sua taxa de 0,84 está acima da de saúde e até da taxa de atualização do cadastro. Isso leva à reflexão de que o processo de registro e repasse de informações na área da saúde se reveste de maior complexidade do que na de educação.

De toda sorte, os resultados negativos encontrados se devem a deficiências no processo de gestão, as quais foram detalhadas no item 3 deste relatório. Pode-se apenas recolocar que, no caso da educação, a maior dificuldade de obtenção de resultados mais expressivos aloja-se na falta de compreensão dos operadores do sistema quanto à compatibilidade dos objetivos de focalização preconizados pelo BF no contexto de uma política universal. Deduz-se que é essa incompreensão que tolhe iniciativas direcionadas para os segmentos mais vulnerabilizados dentro do sistema educacional, já que esses mesmos operadores já realizam procedimentos de controle de frequência de alunos e pesquisa dos motivos das suas faltas por força de suas próprias diretrizes. Visto de outro prisma, esse fato pode ser simplesmente o reflexo da baixa qualidade das ações pedagógicas e não acompanhamento dos alunos pelo sistema educacional como um todo.

No caso da saúde, que apresenta os piores escores, pode-se retomar a análise de LIndert e colaboradores (apud ZOUAN e BARONE, 2008). Eles consideram que o maior problema no monitoramento dessa área, como se pontuou no parágrafo anterior, é a exigência de coleta, transmissão e consolidação de dados em âmbito municipal e envio de dados e sua nova consolidação no Ministério da Saúde no contexto de um sistema muito mais fragmentado e inseguro do que o sistema de educação. Os requisitos para processamento das informações locais em uma base de dados nacional seriam, para os autores citados, mais complexos na saúde do que na educação até por falta de consensos em relação a algumas variáveis, como por exemplo, o número ideal de consultas médicas de pré-natal.

Vale recolocar que, em sendo a contribuição para o acesso dos cidadãos a direitos sociais básicos, especialmente nas áreas vinculadas ao Programa, o objetivo das condicionalidades, a falta de acompanhamento torna impraticável a identificação de famílias que estão com problemas de acesso a esses serviços, inviabilizando ainda o registro de informações sobre os motivos da não utilização.

Mas faz-se ainda necessário alertar para o fato de que falhas no monitoramento das condicionalidades podem significar a não integração das ações do gestor do BF municipal com as áreas de educação e saúde, inviabilizando ou pelo menos dificultando o acesso às informações sobre a frequência escolar e o cumprimento da agenda de saúde pela família e não apenas que o município não está garantindo a oferta regular e com qualidade dos serviços de saúde e educação. 4.2 O Significado do IGD para os municípios: determinantes, configurações, distribuição e aplicação dos recursos recebidos

Vários são os fatores apontados pelos entrevistados como determinantes do não

alcance de índices mais positivos no IGD. Como fica claro, esse resultado insatisfatório decorre predominantemente das menores taxas de acompanhamento das condicionalidades, com destaque para os piores resultados do monitoramento da saúde.

Com efeito, como mostra a gestora do PBF na Assistência Social de Presidente Vargas, para que o município atingisse o índice máximo no IGD precisaria que a saúde e a educação melhorassem seus indicadores, conforme destaca:

“Embora muita gente diga que não conseguimos atingir a meta, acho que é a saúde que não alcança porque na assistência a gente tem

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cumprido essa meta, tem atualizado cadastro, a gente atualiza todos os cadastros. Daí a Educação não fecha, chega perto do 1 (hum), mas não fecha. E como são os três indicadores né, para fechar o IGD, isso dificulta”.

Em sentido semelhante se coloca o operador da Assistência Social de Caxias para quem o “o índice específico da saúde está prejudicando o município”. Isto porque o índice “da Assistência e o da Educação fica em torno de 0,90, mas o índice da Saúde fica abaixo. Já melhorou, consideravelmente porque há alguns anos atrás era de 0,16 e agora já passou de 0,40”.

Além das falhas evidentes no coleta das informações exigida pelo acompanhamento da agenda de saúde das famílias beneficiárias, a maioria dos municípios, se não a totalidade, atribui os resultados negativos prioritariamente à alimentação dos dados por causa tanto do próprio sistema utilizado pelo Ministério como da internet disponível cujo acesso é precário e de má qualidade, ou seja, instável e lento. Diz a operadora de Caxias: “quando o sistema fica fora do ar é o dia todo; aí já é um dia perdido. É o próprio sistema que fica fora do ar, cai e não entra, mas às vezes é a internet, às vezes está lenta, tem determinados horários que ela é muito lenta”.

O atraso no repasse dos recursos pelo MDS é outro problema apontado por vários municípios para explicar os resultados encontrados, dentre os quais estão Cedral, Presidente Vargas e Alto Alegre, cuja gestora do BF assim se expressa: “todo mês vem, só que com atraso né? A única dificuldade é esse atraso, que tá demorando até três meses”. A gestora de Assistência Social de Presidente Vargas destacou a falta de regularidade do repasse do recurso o qual atrasaria até seis meses.

A única observação negativa em relação ao IGD feita pelos gestores do BF de Caxias se refere exatamente ao atraso no repasse dos recursos, o que, na opinião deles, prejudica o município, pois “a gente nunca pode contar com esse recurso naquela data pra poder se organizar”. Mas “a gente até compreende a questão do atraso do IGD, porque tem o tempo de chegar os dados da saúde e da educação. Mas o principal problema é esse. Então se houvesse uma agilidade na questão desses dados e o recurso chegasse a tempo, acho que a gente poderia fazer melhor”.

Participantes do Conselho do BF de Caxias criticam também a forma agregada como é repassado o recurso do IGD aos municípios, como se vê nesse depoimento: “é ruim, ele poderia vir mais livre, não muito chapado. O que torna horrível o trabalho”.

Mesmo que os municípios busquem soluções provisórias para não paralisar as atividades do Programa (adiantamento de recursos e depois ressarcimento das despesas pelas prefeituras), para eles as circunstâncias citadas impediriam a fluência do trabalho de acompanhamento das condicionalidades e mesmo a manutenção de um trabalho sistemático com as famílias mais vulneráveis, além de desmotivar as equipes de trabalho, o que pode indicar que os repasses do MDS se constituem não apenas em subsídios de recursos para fazer face aos custos administrativos dos municípios, mas numa fonte essencial de renda sem a qual a continuidade das ações ficaria comprometida.

Em que pese esse problema, os recursos do IGD são utilizados corretamente na melhoria da gestão do BF, em um leque variado de opções. Para melhoria do ambiente de trabalho são adquiridos principalmente mobílias (mesas, cadeiras e estantes) e aparelhos de ar condicionado; para a melhoria das condições de trabalho propriamente ditas, os mais citados foram: compra e aluguel de carros e motos, compra de combustível, aquisição de materiais didáticos e outros materiais permanentes e de consumo para realização das atividades com as famílias, além de conserto e compra de computadores, impressoras e outros equipamentos e materiais necessários ao registro e repasse das informações nos sistemas, bem como pagamento de internet e também compra de modem para melhorar o acesso.

Os recursos ainda são usados para treinamento e capacitação de pessoal técnico e administrativo do Programa, para pagamento de diárias e de gratificações para os técnicos do Programa e operadores dos diferentes sistemas de informação, estas últimas como

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forma de complementação salarial, contratação e pagamento de técnicos e de palestrantes e professores para os cursos.

A realização de cursos e outras ações para geração de renda é a ação direta com as famílias mais citada, sendo apontada por todos os municípios participantes da pesquisa, os quais apontam ainda mutirões para atualização dos cadastros, ações itinerantes, incluindo-se recadastramento nos povoados.

Em âmbito estadual, a coordenação da condicionalidade da assistência social declara que aplica os recursos em atividades que visam melhoria dos indicadores do IGD dos municípios e do atendimento às famílias. A coordenadora citou capacitações dos gestores e de técnicos responsáveis pelo BF e Cadastro Único, Seminário Intersetorial que agregou as Políticas de Educação, Saúde, Assistência, Segurança Alimentar e o Controle Social, Encontro Estadual da Frequência Escolar, monitoramento e assessoramento às 18 Unidades Regionais de Educação no que diz respeito à frequência escolar – atividade esta solicitada pela Secretaria Estadual de Educação, tendo sido liberados recursos financeiros para pagamento de diárias aos técnicos da Secretaria de Educação na ordem de aproximadamente 56.000,00 (cinquenta e seis mil), bem como monitoramento e assessoramento especifico para atualização cadastral para 70 municípios com mais baixos índices de cadastros atualizados. Além disso, a coordenadora se referiu à aquisição de equipamento de informática para a Supervisão de Transferência de Renda/Proteção Básica da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (SEDES), no espaço físico da SEDES. “Eu penso que é dessa forma também que a o IGD tem contribuído pra melhorar a gestão”.

A coordenadora estadual do BF na saúde não reconhece nenhuma utilização do recurso do IGD no custeio de ações específicas na área de saúde que são necessárias no contexto da gestão do Programa nesta área. Relaciona esse fato à inoperância do Comitê Gestor Intersetorial do Programa, o qual não promove discussões conjuntas entre as áreas para planejar as ações.

A responsável estadual pela saúde no Maranhão entende que, ao contrário do que acontece com sua área, “O IGD para a área da educação tem servido para o aprimoramento do Programa, porque tem forçado mais e isso repercute nos índices melhores da educação”. De fato, ainda que com problemas, a educação recebe diárias, oriundas desse recurso, para fazer o monitoramento da gestão do BF pelo setor de educação dos municípios, inclusive para acompanhar a execução do Projeto Presença por estes, além de participar de evento anual para discussão a respeito do desenvolvimento das condicionalidades, de abrangência estadual.

Algumas situações devem ser destacadas nesse contexto. A primeira é a de Cajapió. A pesquisadora que esteve no município constatou que embora os gestores locais afirmem que o recurso do IGD vem sendo aplicado regularmente na compra de equipamentos e de materiais, nenhuma melhoria de gestão foi constatada, considerando que no próprio órgão gestor há insuficiência de equipamentos, a internet é deficiente, o material de expediente é compartilhado entre as secretarias de educação e de assistência social, constatando-se ainda ausência de ações complementares para as famílias por um período de quase doze meses.

Em Santa Quitéria o presidente do CMAS deixou antever que o recurso do IGD tem sido utilizado mais na fiscalização das famílias do BF do que em ações assistenciais. Nesse sentido, informou que foi feita uma parceria com as casas lotéricas para que só pudessem sacar o dinheiro os beneficiários que tivessem feito o recadastramento, e quem fosse o titular do cartão.

Em São João Batista, no momento da pesquisa, o IGD estava sendo administrado diretamente pela prefeita e estava sendo utilizado para (re)estruturar a Secretaria de Assistência Social, uma vez que, com a mudança de gestão em função da cassação do antigo prefeito, foi identificado que esta se encontrava sem condições de funcionamento como se percebe na fala da gestora: “[...] Quando a gente chegou tava tudo queimado, não tinha nenhum computador funcionando. Aí tivemos que comprar computador, impressora, material didático, capacitação com o pessoal do Bolsa Família porque eles não entendiam nada sobre o Bolsa Família. Agora graças a Deus eles já tão sabendo.”

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A fala da gestora do BF na Assistência Social de Viana sintetiza, porém, a percepção dos gestores do BF dos municípios em relação a essa questão:

“[...] O IGD, eu sempre digo: é a asa de libertação da assistência, nós deixamos de ser a prima pobre, onde uma folha de papel a gente tinha que pedir. Hoje a gente já pode comprar papel, caneta, carimbo, pode comprar computador que antigamente a gente tinha que ficar pedindo. Hoje a gente tem a liberdade de ir e comprar. Tem esse recurso pra dar subsídio não só ao Bolsa Família, mas pra toda a gestão da assistência social [...]” (Gestora de Assistência Social)

Um importante aspecto sobre a questão dos recursos financeiros pode ser captado da fala da gestora do BF de Alto Alegre:

“O único fator que dificulta o Bolsa Família é que ele[...] teria que atender todas as famílias pobres do município mas não atende, não porque o município não esteja com esse cadastro atualizado e pronto, mas por uma questão de orçamento, do próprio Ministério. Mas se tivesse orçamento hoje nós estaríamos com 100% de cobertura! Todas as famílias pobres e extremamente pobres estão cadastradas como beneficiárias ou em perfil para serem contempladas com o Bolsa Família”

É relevante colocar que a Constituição Federal não prevê o direito à renda como direito constitucional. O BF, nesse sentido, não decorre de uma determinação constitucional, mas foi criado por medida provisória, depois transformada em lei ordinária. Em função desse status legal do BF, o ingresso, como beneficiários do Programa, daqueles que satisfazem os critérios de seleção não é automático porque depende da alocação orçamentária e de convênios entre o governo federal e as instâncias municipais. Nesse caso, para Medeiros, Brito e Soares (2007), ele “é, portanto, um quasi-direito cuja exigibilidade judicial por uma família pobre ainda não é assegurada”.

Baixos valores repassados aos municípios são vistos como outro fator importante no esclarecimento dos índices insatisfatórios apresentados. A insatisfação dos municípios com os montantes recebidos pode ser deduzida da fala do representante da coordenação do BF de Barreirinhas. Ao ressaltar a importância do IGD para melhorar a estrutura física a fim de criar um bom espaço de trabalho, acrescenta:

“[...] Até o momento já ajudou muito, mas precisa ajudar ainda mais. Por exemplo, a nossa sala, onde nós trabalhamos atualmente não oferece condições de trabalho. A nossa sala não é climatizada, a fiação elétrica não é legal. Então pra isso nós já estamos pedindo que aplique o IGD para que o nosso ambiente de trabalho melhore também. [...]”

O gestor da Assistência Social de Cedral aponta em que seria gasto o recurso recebido a mais: “para cobrir as despesas decorrentes do trabalho realizado, em especial pela equipe do CRAS (despesas com moto taxi, lanches), para pagamento de técnico, para conserto de equipamentos danificados pela energia elétrica que não é de boa qualidade”.

Colocando o valor atual que é repassado pelo MDS como insuficiente para atender à demanda, a técnica do CRAS de Maracaçumé mostra que “o IGD realmente trouxe um avanço, mas se fosse maior poderíamos fazer muito mais. Acho que a gente poderia avançar muito mais com um recurso maior”.

Portanto, os entrevistados ressaltam o que seria para eles uma necessidade: ampliar o recurso do IGD para aperfeiçoar o Programa. A Gestora de Assistência Social de Presidente Vargas afirma que, com mais dinheiro, poderia envolver um número maior de famílias nos projetos de inclusão produtiva.

Quanto a isso, é bom colocar que a Portaria GM/MDS nº 319 de 29/11/2011fez alterações na forma como é calculado o repasse de recursos do IGD, sobretudo aumento do valor de referência de R$ 2,50 para R$ 3,25 e sua multiplicação pela quantidade de cadastros válidos e atualizados não mais pelo número de famílias em situação de pobreza,

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com repercussões positivas sobre os tetos dos municípios e os valores efetivamente repassados aos mesmos.

Outro aspecto importante a ser apontado diz respeito a quem administra os valores repassados e como se dá a distribuição e o gasto dos recursos do IGD pelas três áreas envolvidas no Programa. O que se observa, na verdade, é que não existem regras claras quanto à repartição do montante de recursos, ainda que ele seja definido pelo desempenho conjunto das áreas envolvidas – assistência social, saúde e educação. Assim sendo, “funciona nessa linha: eu solicito, aí eu recebo”, como diz o responsável pela condicionalidade da educação de São Luís.

Na verdade, nessa situação, cada município procura encontrar, por si próprio, as estratégias e as regras para gerir o recurso. Mas no caso dos municípios maranhenses participantes da pesquisa, essa gestão, em geral, encontra-se ou centralizada nãos mãos dos prefeitos ou dos secretários de Assistência Social, passando muitas vezes ao largo da possibilidade de interferência dos gestores das demais condicionalidades e até do coordenador do BF no município, além do próprio Conselho que deve participar da elaboração do planejamento e do orçamento e aprovar a prestação de contas referentes a esses recursos.

Ainda que seja correta a administração dos recursos pela área que coordena o Programa, o excesso de centralização, segundo a assistente social do CRAS de Cajapió é um grave obstáculo ao trabalho visto que nessa situação, na maior parte dos casos, somente os projetos que o prefeito aprova ou considera relevantes são realizados, o que pode levar a um uso político desse recurso e gerar procedimentos burocráticos que resultem em demora na realização das ações, ou até inviabilizar parte destas. A assistente social dá como exemplo o fato de que último curso realizado com recurso do IGD numa comunidade quilombola do município havia ocorrido cerca de um ano antes.

É informação relevante a que mostra que poucos são os municípios que se referiram explicitamente ao Conselho como instância de planejamento, acompanhamento e fiscalização, sobretudo no seu papel de aprovar a prestação de contas dos recursos do IGD. Entre esses poucos está Alto Alegre, cuja gestora do PBF na Assistência Social declara:

“O recurso do IGD é planejado dentro da instância né, de controle, nós nos reunimos para ver no quê que ele é gasto, e aí é encaminhado aqui para a secretária né, que é a ordenadora de despesas e daí é encaminhado para o setor da tesouraria da prefeitura”.

Em Caxias, como em muitos municípios, a Secretaria de Assistência Social administra os recursos do IGD, mas apenas os custos com o CadÚnico têm seu plano aprovado pelo Conselho.

Os representantes do Conselho de São Luís presentes no grupo focal realizado no CRAS Bacanga reconhecem que até agora as decisões sobre o uso do IGD, mesmo atendendo a demandas reais, estavam centralizadas na Secretaria Municipal de Assistência Social, sem discussão com o Conselho e com as Secretarias de Saúde e Educação e com os CRAS, onde boa parte do trabalho de acompanhamento das condicionalidades acontece, contrariando a ideia da intersetorialidade como estratégia de gestão por meio da qual se partilha poder entre instâncias governamentais e destas com a sociedade civil. Há perspectiva de mudança dessa situação, com a previsão de participação do Conselho no planejamento das ações de 2012.

Da mesma forma, a administração dos recursos do IGD se dá, nesses municípios de forma bem pouco compartilhada com as demais áreas, o que vem representando, inclusive, um dos principais desafios no plano intersetorial enfrentado pelos governos locais e grande fonte de reclamação dos operadores da saúde e da educação, como se vê na observação da gestora de Saúde de Alto Alegre: “eu acho que devia ter uma parte tanto para a Educação quanto para a Saúde, porque nós também estamos focados nisso, trabalhando as condicionalidades que envolvem o Bolsa Família, no caso o SISVAN e lá na Educação, aqui tem o CRAS também”.

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Portanto, quanto ao IGD, sua administração, segundo os depoimentos, “é responsabilidade da secretária de assistência”, mas a informação sobre sua distribuição não é repassada para os demais setores. Dentro desse quadro, os gestores do Bolsa Família na Saúde e na Educação são levados a fazer solicitações junto à Assistência Social, sem deter o menor controle do processo e sem garantia de prazo ou mesmo de atendimento quantitativo e qualitativo das demandas postas no cotidiano.

Ramos (2010) mostra que é fato reconhecido que a Assistência Social (a qual gerencia o Fundo Municipal de Assistência Social, por meio do qual são repassados os recursos do IGD) tem maior poder decisório sobre como os recursos são gastos e que fração do valor total caberá a cada área. A consequência disso, segundo o coordenador do BF na Educação de São Luís é que “a gente se planeja, encaminha e isso demora muito, é muito burocrático. Vai fazer dois anos que a gente solicitou material e nada até agora”. Os técnicos afirmam que depois que “a gente formaliza, a secretária assina, [mas] nunca volta para a gente”.

Obviamente que esse fato repercute diretamente nas condições dentro das quais o acompanhamento das condicionalidades é realizado, pois segundo o coordenador do BF na Educação de São Luís “a gente já fica preocupado com a próxima vigência, será que vai ter? O material esse ano chegou, mas chegou porque já tinha um ano que tinha sido pedido e chegou muito menos do que a gente solicitou”.

Portanto, nos municípios maranhenses, a situação mais generalizada é a concentração do gasto desses recursos nas ações específicas da Assistência Social, sobretudo, em cursos e capacitações visando geração de trabalho e renda. Isso porque, como se viu, não existem mecanismos ou instâncias de deliberação conjunta, evidenciando dificuldades dos gestores se pensarem num trabalho de fato conjunto ou até mesmo articulado. Na verdade, os recursos são vistos unicamente como da Assistência Social, que poderá ou não repassá-los para as demais áreas, considerando critérios próprios.

Sobre a utilização desses recursos, diz a gestora da Saúde de Caxias: “a gente tem muito o apoio daqui da Assistência Social: o material que a gente está precisando, a impressão dos mapas, dos relatórios”. Já o gestor da Educação desse município afirma:

“no meu caso já não é assim tão presente a utilização desse recurso. Eu li no site do MDS como ele pode ser utilizado, [mas] o computador que eu utilizo na minha sala foi dado pelo MEC. Esse ano teve uma conversa com a Assistência social pedindo a lista de equipamentos que eu uso, e eu repassei e até agora nada. Já tive problemas com a impressão dos formulários que é feita bimestralmente. Já aconteceu comigo de eu precisar de um material e a secretaria não dispor, o que acabou até atrasando os meus trabalhos”.

Percebem-se nessas falas duas posições comuns entre os responsáveis pelo acompanhamento da saúde e da educação: uma, que vê os recursos repassados para as ações de acompanhamento pela Secretaria de Assistência Social como simples “apoio” e outra, que percebe como prejuízo o não recebimento ou o repasse de parcos recursos, mas de certa forma isentando os próprios órgãos em relação de montarem uma estrutura mínima para funcionamento do setor.

As próprias Secretarias de Assistência Social reforçam essas posições. Os técnicos da Assistência Social de Caxias, por exemplo, afirmam que a Secretaria “passa [os recursos] quando precisa. Na questão de capacitação, na questão de bens. Para a educação a gente faz isso, até porque a gente depende do cadastrador máster da educação”. Mas a maior parte dos recursos do IGD é aplicada “na questão dos CRAS, o apoio aos CRAS. A gente trabalha com a oferta de cursos para as famílias do programa e que estão cadastradas nos CRAS”.

O que acontece em âmbito municipal se repete na instância estadual: os recursos do IGD recebidos são administrados de forma centralizada na secretaria estadual de assistência social que repassa determinados valores para as demais secretarias, a seu próprio critério. Diz a coordenadora estadual de educação:

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“a gente ainda consegue, mas com muita dificuldade. Um evento por ano, eles pagam o treinamento para a gente porque isso é competência do governo do estado”. Além de serem considerados sempre insuficientes, os recursos também atrasam, como se pode constatar: “nós estamos dentro de um governo com um processo desde fevereiro e o ano já está quase acabando! A gente consegue um ou dois processos de financiamento de diária pra gente fazer essa cobertura, que já era para estar financiando desde o início, então esse ano nós ainda não tivemos um processo pago pela SEDES! É uma dificuldade muito grande!”

Enfim, a gestora estadual do BF na educação não participa do planejamento das ações que seria condição para decidir sobre a distribuição dos recursos para atendimento das necessidades concretas, nem tem nenhum controle sobre o processo de liberação dos mesmos. Ela é categórica: “o estado não discute, mas eu acho que a gente já deveria ter avançado mais porque não é uma política do governo do estado, é uma política do governo federal! É como se fosse uma mala pronta, entendeu?”. A gestora acrescenta: “até o que nós já conquistamos é mais pela relação doméstica do que institucional! Porque sempre a gente conhece quem assume, quem não assume e aí vai lá e mostra: olha, tá aqui a portaria, tá dizendo aqui, olha aqui!

Como consequência do distanciamento entre as coordenações das condicionalidades em âmbito estadual e destas com a secretaria de assistência social, a gestora do BF na saúde, assim como a de educação não sabe qual o valor repassado mensalmente pelo MDS a partir do IGD, “só sei que o valor é alto”, desconhecendo ainda o teto desse índice para o Estado do Maranhão. Quanto à sua aplicação menciona que a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social – SEDES é o órgão responsável pela sua aplicação, através da gestora do Bolsa Família na Assistência Social.

A esse respeito a gestora estadual do BF na educação ressalta a inexistência de um planejamento intersetorial entre saúde, educação e assistência social para o desenvolvimento de ações necessárias à gestão integrada do referido Programa.

Nesse quadro, identifica-se desconhecimento, conhecimento equivocado, incompleto ou parcial do IGD, por parte dos gestores do BF na Saúde e na Educação. Como exemplo emblemático tem-se o gestor do BF na Saúde de Capinzal o qual afirmou ter apenas “ouvido falar” do IGD, acrescentando: “eu não sei explicar nada disso, não”. Outro exemplo característico é o do gestor do PBF na Educação de Poção de Pedras: “o pessoal já falou desse IGD, mas eu não sei direito”.

Situação idêntica pode ser constada em relação aos conselheiros dos conselhos de assistência social. Mesmo em Alto Alegre onde o gestor insiste no papel ativo do Conselho no que refere ao IGD, verificou-se que membros dessa instância afirmaram não “lembrar” o que foi discutido: “assinei, mas não me lembro!”. Outros membros reconhecem que não sabem nada a respeito e outros que só tiveram conhecimento desse mecanismo de estímulo financeiro à boa gestão municipal por causa da pesquisa.

Segundo a presidente do CMAS de Cajapió discussões referentes a esse recurso não haviam constituído ainda pauta das reuniões do CMAS, o que é considerado preocupante pela entrevistadora que esteve no município já que se trata de recurso a ser aplicado em ações sócio-assistenciais que devem ser submetidas ao controle de instâncias competentes, como os Conselhos.

Como consequência de não ter informações básicas sobre o IGD, alguns gestores do BF na Saúde e na Educação desconhecem também a possibilidade de utilização desse recurso para melhoria da gestão de suas respectivas áreas.

Entrevistado da área da Saúde de Barreirinhas, para citar um acaso, além de ter pouca informação sobre o IGD, não sabia que a Saúde também tinha o direito de receber uma parte do recurso como apoio à gestão da condicionalidade da saúde até o momento da reunião entre as três áreas, a qual se deu apenas após o bloqueio dos recursos do IGD, por parte do MDS, em razão do péssimo desempenho da sua área. Até então o conhecimento sobre o Índice era incipiente da parte de alguns e quase inexistente da parte de outros. O

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problema estava na falta de equipamentos e na falta de funcionários, o que seria solucionado com a compra de equipamentos com o próximo repasse do IGD, além de a Assistência Social ter disponibilizado mais um digitador para a Saúde.

Acalorada polêmica existe hoje em torno da ideia das Secretarias de Assistência Social dividirem ou não os recursos com a saúde e educação. Dentro da área de Assistência nos municípios entrevistados, existem aqueles, tais como os entrevistados em Alto Alegre, que advogam que

“deveria ter o IGD para a Saúde e o IGD para a Educação porque o da Assistência é insuficiente. Para compartilhar esse recurso e reinvestir na Educação e na Saúde, teria que distribuir e redistribuir esse recurso. A “prima pobre” ainda tem que distribuir! Na Educação e na Saúde tem tanto dinheiro e esse IGD que vem específico para essa ação do Bolsa Família ainda temos que redistribuir para a Educação e para a Saúde nessa questão de material, de impressão ou de pagamento de pessoal, ou até naqueles mutirões”.

Na mesma linha se coloca a gestora de Assistência Social de Viana, onde nem a saúde nem a educação e nem mesmo o CRAS recebe parte do IGD, estando este completamente centralizado na Secretaria de Assistência Social. A gestora ressaltou a inviabilidade da divisão do recurso, considerando que os critérios do IGD exigem mais da Assistência Social que das demais Políticas. “A gente já recebe pouco, imagina se tiver que dividir”. Assim, argumenta-se, para justificar a não divisão do recurso ou a criação de IGD’s específicos por áreas, que a assistência social é o campo que mais trabalha e acaba sendo prejudicada por conta do baixo índice das outras áreas. Segundo uma gestora municipal:

“Eu acho o seguinte: o critério que o IGD utiliza exige muito da assistência social. Se você for vê a assistência social fica com a maior parte, 70% é nosso, 30% é dividido entre a saúde e a educação. Que é obrigação já deles fazer tudo aquilo que está ali. A educação já recebe um montante muito bom pra garantir escola, vaga pros alunos e garantir aquele aluno lá. Se você for vê quem tem mais usuário é a assistência. A educação só tem o aluno, a assistência tem o idoso, a mulher, a crianças, a família toda [...]”(Gestora de Assistência Social)

Há, portanto, uma convicção equivocada, certamente, de que os recursos devem ser utilizados apenas na assistência social. Ao ser indagado sobre a necessidade de partilha do recurso entre as três áreas segundo as normativas do Programa, um coordenador do BF municipal na área da Saúde retrucou: “Acho que não, esse recurso é mais necessário na assistência social” (Coordenador do PBF)

Ramos (2010) não separa a questão dos recursos da problemática da intersetorialidade. A autora considera que um fator que tende a dificultar essa estratégia de gestão são as diferenças entre as políticas públicas: a política de saúde é a mais bem articulada em termos de coordenação federativa por dispor de um sistema único estruturado, baseado no princípio da universalidade, possuindo regulamentos claros relativos à prestação de serviços e ao repasse de recursos garantidos. A educação ainda não conta com um sistema único semelhante ao de saúde, mas tem parâmetros curriculares nacionais e uma Lei de Diretrizes e Bases que estabelece princípios da educação escolar e as atribuições dos entes federativos, além de possuir recursos constitucionalmente estabelecidos, vinculados ao setor. Já a assistência social, considerada a “prima pobre” entre as três, só recentemente estruturou um sistema único, historicamente mais frágil que os demais, além de ser permeado de conflitos, mais do que de convergências.

Nesse contexto, o gestor da área de Saúde de Barreirinhas considera que receber o IGD serviria como incentivo para trabalhar melhor, para ter um compromisso maior. Para ele, talvez se a própria Saúde recebesse o recurso ela teria um compromisso maior com o repasse das informações como pode se vê nessa fala: “[...] Se eles tivessem recebendo parte desse recurso, eles teriam o interesse de fazer o repasse das informações deles”.

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Mesmo que se considere que os serviços de saúde e de educação têm mecanismos tributários e recursos setoriais próprios para seu financiamento, parece importante a garantia de recursos de forma regular através do IGD como forma de estimular a integração efetiva e o aperfeiçoamento na gestão do Programa.

Os gestores do BF na Assistência Social dos municípios pesquisados foram unânimes em reconhecer melhorias possibilitadas pela utilização dos recursos do IGD, o mesmo não se dando necessariamente entre os gestores das áreas de saúde e de educação, até pelo fato anteriormente citado do pouco ou do nenhum repasse de verbas para esses setores.

Veja-se a situação de Barreirinhas: neste município o coordenador das ações na saúde não pôde identificar nenhuma mudança na gestão da condicionalidade sob sua responsabilidade com a contribuição do IGD, ainda que considere que quando contar com parte desses recursos as condições de execução desse acompanhamento sofrerão melhoras consideráveis, principalmente no que se refere aos equipamentos, que se constituem em condições importantes no armazenamento e repasse das informações.

O cadastrador máster da condicionalidade da Educação, por seu lado, também não pôde identificar nenhuma situação que representasse melhoria na gestão a partir da aplicação do IGD até porque até o momento esta área ainda não havia partilhado com a Secretaria da Assistência Social os recursos repassados pelo Ministério. Assim, todo o recurso usado pela Educação para acompanhar o cumprimento da frequência escolar pelos beneficiários, registrar e repassar os dados aos setores competentes vinha da própria Secretaria de Educação.

A coordenadora estadual do BF na educação, alinhada com o que pensam os gestores municipais, “a contribuição do IGD para a condicionalidade da educação é pouca. É com muito sofrimento e com muita briga!”. O mesmo pode ser dito do coordenador estadual do PBF na saúde.

Já os gestores e técnicos da área da Assistência Social que é a que, de fato, recebe recursos, sentem e apontam melhorias significativas na gestão a partir do IGD. A gestora do PBF de Alto Alegre, por exemplo, considera o IGD fator crucial na montagem de uma estrutura física, administrativa e funcional necessária ao desenvolvimento do Programa, denotando a importância desse recurso para a gestão municipal do BF.

“Se hoje a gente não tivesse esse índice acho que muita prefeitura estaria um pouco amarrada. O IGD tem um impacto significativo nessa gestão, toda estrutura hoje da nossa secretaria, tudo foi com o IGD: os computadores, o mobiliário, os próprios profissionais que trabalham hoje lá que talvez a prefeitura ainda estivesse engatinhando ainda nesse processo. Nós avançamos muito com esse IGD. Eu acredito que contribuiu significativamente. Poderíamos trabalhar muito mais, mas como eu digo o recurso realmente ele é 7 mil, mas para um município como o nosso, quando você vai detalhar realmente as ações não sobra nada”.

Para a gestora de Assistência Social de Maracaçumé, o IGD possibilitou a aquisição de equipamentos que eram inexistentes ou insuficientes anteriormente, o que para ela trouxe melhorias nas condições de trabalho.

A gestora de Assistência Social de Presidente Vargas, além de destacar avanços na questão da internet, na aquisição de equipamentos, aponta a garantia de deslocamento da equipe para acompanhamento das famílias possibilitado por esse recurso: “a gente viu que mudou significativamente. Então esse recurso ajudou para chegar à comunidade, para ir melhorando, estruturando mesmo o programa como um todo”.

A coordenadora estadual do BF na Assistência Social entende que os avanços na gestão foram possibilitados, principalmente pela aquisição de equipamentos (notebook, computadores, impressoras, mobiliários etc.); pela compra de combustível para deslocamento de pessoal às visitas nas áreas rurais e pela contratação temporária de pessoal, pois “esses investimentos qualificam os atendimentos que a gente tem feito”.

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De um modo geral, as variadas formas através das quais o dinheiro repassado é utilizado, tal como se mostrou anteriormente, representam melhorias significativas no processo de gestão dos municípios investigados.

A assistente social de Cajapió, afirmou que o IGD tem contribuído para melhorar a gestão na medida em que lhe propicia maior autonomia já o PBF que passa a ter um recurso próprio: “[...] melhorou bastante, porque agora a própria gestão do programa não tem mais que se preocupar de onde vai tirar recurso pra fazer uma atividade, pra comprar algum suplemento de informática. Hoje já tem de onde tirar sem mexer no orçamento do município.”.

Por outro lado, uma crítica colocada pelos participantes do grupo focal de Barreirinhas consiste em não haver contrapartida do gestor municipal aos recursos disponibilizados por meio do IGD como estratégia capaz de contribuir para a melhoria da gestão do BF. Isto porque só o IGD não teria como resolver todos os problemas de gestão do Programa.

Essas colocações alertam para o perigo de acomodação dos prefeitos, em relação à investimentos e construção de condições adequadas para o pleno desenvolvimento do PBF também com recursos próprios, o que pode se constituir num efeito perverso não esperado da criação desse mecanismo de estímulo financeiro à boa gestão municipal, além da centralização e manipulação desse recurso para fins dissociados daqueles preconizados pelo Programa.. Pode ainda incentivar, naqueles municípios com problemas de acompanhamento, a prática de registro “viciado” pelo objetivo de alcançar índices satisfatórios do IGD e, consequentemente, ter acesso a recursos para a execução das ações. Com efeito, como se viu no monitoramento das condicionalidades, essas estratégias ainda não conseguiram induzir os gestores locais a investir seriamente na provisão de serviços de qualidade, incluindo-se a área de Assistência Social.

A possibilidade de as famílias adquirirem autonomia por meio das iniciativas favorecedoras de geração de renda implementadas nos CRAS (cursos, montagem de empreendimentos, comercialização de produtos, etc) é um benefício indireto citado generalizadamente pelos entrevistados, implicando em mudanças nas condições de vida dos beneficiários, propiciadas pelo uso dos recursos do IGD para efetivação dessas iniciativas. Diz um entrevistado de Caxias: “a gente tem registros de famílias que já melhoraram porque já montaram seu próprio negócio de maneira tímida, mas melhorou de maneira significativa a renda daquelas famílias”.

Para a gestora de educação de Presidente Vargas, o IGD, ao contribuir para melhoria da gestão do BF, influencia na melhoria do índice de evasão no município:

“Nosso número de evasão e alunos fora da escola agora é mínimo, até pela preocupação dos diretores e supervisores das escolas do porque o aluno sai, como sai e sempre vamos atrás dos pais e dos professores. Para isso temos uma ficha de acompanhamento da frequência do aluno, daí quando o aluno falta sem justificativa podemos levar ao Conselho Tutelar e tomar as providências para resolver”.

Conforme o gestor da saúde de Presidente Vargas a aplicação do IGD, ao possibilitar a compra de cadeiras e outros materiais para trabalho etc. tem contribuído para melhoria do Programa, em sua estrutura, com destaque para a criação do Centro de Referência de Acompanhamento do Bolsa Família na Saúde.

Comprova-se, por conseguinte, o grau de importância dos recursos alocados, a abertura e amplitude de seu uso nos seguintes depoimentos:

“Ah, com certeza o IGD é de grande importância. Porque a gente precisou, por exemplo, contratar gente para capacitar operador para o sistema, né? Daí, sem o IGD ficava praticamente impossível. A gente usa o dinheiro é pra isso e para conserto dos computadores, né, porque não dá para ficar sem computador, também compramos outros. E também para os cursos né, que o

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CRAS faz, de bolos, de doces” (coordenadora do PBF e gestora da Assistência Social de Alto Alegre). “É para fazer as visitas, o atendimento assistencial das famílias, do BPC dos idosos, para os deficientes também. Tanto eu faço as visitas, como a secretaria também leva o deficiente até o INSS para fazer o acompanhamento, ela leva e trás” (assistente social de Poção de Pedras). “Contribui principalmente nesse aspecto da melhoria do atendimento, do ambiente de trabalho, no aprimoramento dos colaboradores através de cursos, de capacitações, tudo isso é através do IGD. No Bolsa Família houve capacitação da nova versão do Sistema (versão 7.0) para o pessoal entender como funciona o novo cadastro, como vão ser as novas entrevistas” (operadora da Assistência Social de Caxias).

4.3 Críticas e Sugestões

A principal crítica apontada pelos entrevistados relaciona-se aos recursos do IGD:

atraso no seu repasse e seus valores, considerados baixos ou insuficientes. A complexidade da prestação de contas do recurso, gerando incertezas nas formas

legais de sua utilização, também é criticada por um município. Em relação à utilização dos recursos, a coordenadora estadual da assistência social percebe que existe pouca autonomia dos gestores municipais do PBF no planejamento e no acompanhamento dos gastos dos recursos do IGD. “Eles colocam muito isso... essa dificuldade de ter autonomia pra planejar e gastar com o que é prioridade para o município e que não pode ser incluído no planejamento”.

A inexistência de contrapartida do gestor municipal que possa potencializar os recursos do IGD é outra crítica levantada, mesmo que apenas por um município.

Outro município apontou como obstáculo à gestão do Programa a baixa remuneração da equipe, além da falta de capacitações sistemáticas direcionadas às três políticas na perspectiva de aprimoramento da gestão.

Críticas foram apontadas pelos entrevistados de Cajapió em relação ao atendimento da Caixa Econômica Federal, considerado péssimo e às dificuldades de comunicação com o MDS: “Aqui a gente tem que ligar milhões de vezes para o MDS e pra Caixa” (Coordenador do PBF). O maior problema com o programa Bolsa Família aqui é a Caixa Econômica Federal. O atendimento é péssimo. Tu liga e uma pessoa te atende, meia hora depois tu liga e outra pessoa te atende e é como se tu não tivesse feito nada anteriormente.” (Assistente Social).

Uma primeira e consensual sugestão é a que objetiva maior destinação de recursos para a Assistência Social e para a realização do acompanhamento do cumprimento das condicionalidades, por parte dos beneficiários do BF, para favorecer o desenvolvimento de potencialidades e aquisições, além do fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários que possibilitam a inclusão social das populações vulneráveis, tal como preconizado pela Política de Assistência Social.

Nesse sentido, os recursos do IGD deveriam, em primeiro lugar, ser ampliados para permitir o aperfeiçoamento e a ampliação do Programa, com o envolvimento de um número maior de famílias nos projetos de inclusão produtiva. Em segundo lugar, os repasses deveriam ter maior regularidade e pontualidade para permitir a continuidade das ações e manter a motivação das equipes.

Para os entrevistados, os valores do IGD repassados aos municípios deveriam ser alvo de discussão. Os envios do MDS deveriam ser diferenciados de acordo com alguns critérios: o porte dos municípios e a situação de pobreza, pois municípios com pobreza mais intensa precisariam de um aporte maior de recurso: “acho que também o governo devia trabalhar por essa linha da pobreza e ver quais municípios mais precisam do recurso né? Pois alguns realmente têm mais miserabilidade e estão mais necessitados”.

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A ampliação dos recursos tem como foco também a possibilidade de melhor distribuição para as áreas da Educação e da Saúde, além da própria Assistência Social. Alguns consideram que o IGD deveria ser quase que unicamente aplicado em ações da Assistência Social junto às famílias. Outro município sugere ainda maior alocação de recursos para a assistência social, esta assumindo o SISVAN e o Projeto Presença.

Na perspectiva da intersetorialidade, a coordenadora estadual da assistência social sugere “realização de um planejamento articulado às demais áreas e instância de controle social e/ou CMAS”. Ainda no campo da intersetorialidade, a coordenadora estadual do PBF na educação diz que

“minha crítica e minha sugestão é a mesma: que o governo federal deveria, de fato, determinar e estabelecer valores específicos a cada condicionalidade. Vamos supor que o Maranhão recebe 18 milhões por ano. A assistência receberia 600, a educação receberia 200, ou então 500 para a SEDES, que é onde estão as ações mais gerais, 250 para a educação e 250 para a saúde, entendeu? A minha sugestão é a questão do destino do recurso! Fica muito solto, entendeu?!”.

Além desta, foi colocada como sugestão a utilização do IGD como complementação salarial das equipes e capacitação destas. Uma última sugestão foi de uma conselheira segundo a qual haveria exigência de maior clareza na orientação para aplicação do IGD, opinião compartilhada por gestor do PBF na Assistência Social, referindo-se à necessidade de portarias claras para a gestão do recurso em nível municipal. Nessa mesma linha de raciocínio se coloca a coordenadora estadual da assistência social “Eu acho que deveria haver mesmo maior autonomia para os gestores municipais do PBF no planejamento e acompanhamento dos gastos dos recursos do IGD”. 5 CONCLUSÃO

O processo de gestão do IGD e das condicionalides do BF expressa um movimento contraditório: esforços coletivos para aperfeiçoamento da gestão do BF X dificuldades estruturais - persistência das práticas assistencialistas junto às famílias, disputas políticas, mandonismos locais e dos municípios - estrutura deficiente da maioria dos municípios, equipe de trabalho insuficiente, instável e com problemas de capacitação, improvisação e desarticulação na estruturação das ações. Partindo dessa referência, a pesquisa de campo realizada em treze municípios no Estado do Maranhão permitiu a indicação de alguns aspectos importantes que são, a seguir, destacados nesta conclusão.

a) Referente ao acompanhamento da Condicionalidade da Saúde A pesquisa de campo evidenciou que a Saúde é a área menos estruturada dentre as

que realizam o acompanhamento dos beneficiários do BF nos municípios que compuseram a amostra, sendo destacadas precárias condições de infraestrutura para a realização do controle das contrapartidas exigidas das famílias (precariedade de espaço físico e inexistência ou insuficiência de equipamentos, recursos materiais, humanos e financeiros). Ademais, foi indicado o não reconhecimento e não incorporação dessa atividade como parte da dinâmica de prestação rotineira dos serviços de saúde. Nesse aspecto, as situações mais críticas são aquelas de municípios nos quais nem sequer existem responsáveis da área da saúde para coordenar o processo ou, quando existem, têm pouco ou nenhum domínio sobre a dinâmica de acompanhamento das condicionalidades ou têm uma visão desse acompanhamento centralizada unicamente na gestão de sua área específica ou tão somente no manuseio do sistema informacional. Isso tem contribuído para improvisação das ações de acompanhamento dessa condicionalidade e, consequentemente, para o rebaixamento do IGD em todos os municípios da pesquisa. Os beneficiários revelaram que, muitas vezes, não conseguem ter acesso aos serviços por falta de médicos e outros profissionais, carência de material e de equipamentos nas unidades de saúde: “a gente vai para o hospital, mas não tem médico ou tem muita fila”. Nesse aspecto, como estratégia para não perder o benefício, alguns beneficiários recorrem

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aos serviços de outros bairros, mas que também têm problemas, o que para eles representa a existência de mecanismos que “obrigam” as famílias a cumprirem sua parte no “acordo” entre elas e o poder público, sem que existam formas de assegurar o compromisso do poder público nesse mesmo “acordo”, ou seja, cobra-se dos beneficiários o cumprimento das condicionalidades sem que o próprio município consiga efetivar o direito à saúde.

Nos municípios maranhenses que fizeram parte da pesquisa, incluindo São Luís, que é a capital do estado, o acompanhamento da agenda de Saúde é desenvolvido sem integração com as demais áreas. Os municípios atuam com pessoal restrito, funcionando em salas improvisadas e inadequadas, muitas vezes sem dispor de materiais e equipamentos suficientes para o desenvolvimento do trabalho. Ademais o acompanhamento do cumprimento das condicionalidades por parte das famílias não tem servido como instrumento capaz de (re)orientar as Políticas Públicas, pois os dados coletados não são utilizados como subsídios em outras iniciativas, como por exemplo, naquelas relacionadas à Atenção Básica ou no trabalho desenvolvido pelos agentes de saúde. Nesse aspecto, o acompanhamento das condicionalidades parece se constituir muito mais numa estratégia de controle dos beneficiários (que sofrem diversas punições) do que de garantia de direitos sociais, por meio do acesso aos serviços básicos.

Acrescentam-se aos aspectos acima, as dificuldades em localizar os beneficiários, em razão de constantes mudanças de endereço das famílias sem a devida comunicação à Secretaria de Assistência Social ou à coordenação do BF; por erros no Mapa de Acompanhamento enviado pelo MDS e por dificuldades relacionadas a problemas na base de dados.

No que se refere aos impactos da condicionalidade de Saúde, os entrevistados destacaram pouca contribuição para o desenvolvimento dos beneficiários, sem o registro de modificações significativas, que possam ser consideradas efetivas e duradouras nas suas vidas, representando, quando muito, um cumprimento forçado pelas instâncias envolvidas no acompanhamento, motivado pelo medo das famílias de perder o benefício. Todavia, foi registrado na pesquisa o relato de “que as mães já procuram os agentes de saúde, às vezes, para anotar o peso ou a vacina”, sem atribuir essa mudança ao medo de as famílias perderem o benefício, sendo considerado também possível ver mudanças na forma de as famílias lidarem com sua saúde, destacando maior conscientização acerca do aleitamento materno e da vacinação, expressando-se também na realização, cada vez mais frequente, do pré-natal, o que é creditado ao trabalho educativo realizado com as comunidades nos polos de Saúde da Família.

Foi ainda registrado por alguns sujeitos que participaram da pesquisa que as condicionalidades têm conseguido, ainda não a contento, forçar um certo atendimento do poder público, sobretudo da Política de Saúde, e especialmente no que diz respeito à vacinação e ao acompanhamento da gestante, mas isso se dá, sobretudo, em razão de articulação, mesmo que incipiente, entre os CRAS e os postos de saúde dos bairros, o que vem contribuindo para divulgação dos prazos de vigência dessa condicionalidade. Nesse aspecto, as condicionalidades são importantes para o desenvolvimento das famílias, posto que elas passaram a buscar, com mais assiduidade, os serviços para manter a agenda de saúde atualizada.

b) Referente ao Acompanhamento da Condicionalidade da Educação

Nos municípios visitados, a área da Educação pareceu mais estruturada do que a da Saúde para realizar o processo de acompanhamento do cumprimento das condicinalidades do BF. O espaço físico e condições materiais parecem mais favoráveis, pois não foram reclamadas pelos coordenadores da área. Desse modo, o controle da frequência escolar apresenta bons indicadores de acompanhamento. Essa situação é favorecida com o Projeto Presença e porque o controle da frequência escolar é feito mediante impressão de formulários, que são enviados e recebidos preenchidos das escolas, ficando a resolução dos problemas de infrequência mais sob a responsabilidade da diretoria das escolas. Todavia, alguns gestores municipais do BF na Educação parecem ter uma concepção mais ampla de acompanhamento, não ficando restrito ao controle da frequência escolar, não se reduzindo a

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alimentar o sistema, nem mesmo a fornecer informações com qualidade, pois “não basta gerar dados, a gente precisa fazer alguma coisa por essas crianças que estão em situação de infrequência, que estão em situação de evasão, que estão geralmente com problemas, como alcoolismo dos pais, que são situações que levam as crianças a faltar à escola”. Há ainda a atribuição da responsabilidade do cumprimento da condicionalidade apenas aos beneficiários, na medida em que alguns gestores entendem que o não alcance do percentual mínimo de frequência escolar se deve à falta de clareza das famílias quanto aos benefícios de manter os filhos na escola e que, consequentemente, basta esclarecê-las sobre a importância de mantê-los nesse espaço para que o Programa obtenha o sucesso esperado.

Os entrevistados apontaram como principais impactos gerados em razão da exigência da condicionalidade no campo educacional o aumento significativo na frequência e a diminuição da evasão escolar. A diminuição da evasão e aumento da frequência escolar entre os alunos beneficiários do Programa é vista como resultado da preocupação de algumas famílias com o futuro dos seus filhos, mas, ao mesmo tempo, consideram que o estímulo dado pelos pais para os alunos irem de forma assídua à escola e estudar de forma séria, teria como pano de fundo o desejo de obter ou não perder o recurso: “é o medo de perder o benefício que tem acabado por manter os alunos na escola”.

Assim sendo, a questão da qualidade do ensino e das condições de funcionamento da rede escolar também não aparecem no debate como componente do direito à educação, ficando a reflexão restrita à ideia de que basta incluir o aluno no sistema e de que se a criança ou jovem não estuda é por responsabilidade dele ou dos seus pais.

c) Referente ao acompanhamento da Condicinalidade da Assistência Social

A condicionalidade da Assistência Social é restrita ao cadastramento, validação e atualização dos cadastros, não sendo considerada como condicionalidade a participação das famílias nas ações educativas realizadas nos CRAS, nem a frequência nas atividades do PETI, o que, segundo entrevistados “desvaloriza o trabalho educativo realizado pelos CRAS”. Nesse aspecto, foi muito destacado o caráter de quase não condicionalidade atribuído ao acompanhamento desenvolvido pela Assistência Social por não implicar em penalidades, sendo a gestão da própria Assistência colocada como dependente do desempenho das demais condicionalidades.

Cabe aos técnicos dos CRAS realizar trabalho de acompanhamento familiar no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) que deve ser articulado a outras políticas setoriais com o objetivo de contribuir para a superação das vulnerabilidades sociais que impedem ou dificultam o cumprimento dos compromissos previstos pelo Programa, por parte das famílias. Reuniões e palestras de esclarecimento se constituem nas estratégias de acompanhamento mais utilizadas pelos municípios. Torna-se importante dar destaque ao fato de que, independentemente de o município reunir ou mão boas condições de funcionamento, os técnicos, em geral, apontam dificuldades para realizar satisfatoriamente o acompanhamento da Assistência, sobretudo em razão do número limitado de profissionais para realizar esse trabalho. Em relação aos possíveis impactos do acompanhamento das famílias, foi indicado o ingresso de número expressivo de participantes do Pró Jovem na Universidade via PROUNI e no mercado de trabalho, além de significativa redução do número de crianças e adolescente na rua ou no trabalho infantil.

As ações de qualificação oferecidas aos beneficiários do BF foram muito problematizadas. Nesse aspecto foi registrado que o esforço de realização dos cursos não é precedido de estudo das tendências do mercado de trabalho nem seguido de um acompanhamento pós-curso, de modo que os CRAS não detêm informações sobre as perspectivas das pessoas treinadas. Os cursos ofertados representam uma estratégia para dar condições aos treinados de gerar renda, mas estes cursos ficam restritos a conteúdos voltados para áreas de atuação com poucas possibilidades de real alteração nas condições de inserção no mercado de trabalho. Todavia, além dos cursos, outras iniciativas são

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desenvolvidas na intenção de autonomizar as famílias, como organização de hortas e organizações de cooperativas.

Entre as dificuldades para realizar os cursos e as demais atividades que objetivam a autonomização das famílias foram destacadas aquelas referentes às condições estruturais de funcionamento da Política de Assistência Social, inclusive limitações financeiras e de recursos materiais e humanos, e a pouca capacidade de os municípios maranhenses integrar um conjunto de Políticas Públicas em torno de uma política de desenvolvimento com ênfase numa Política de Trabalho que tenha condições de ampliar o mercado de trabalho e garantir o emprego para a maioria dos trabalhadores de forma a favorecer a superação da pobreza de modo sustentável. Ademais, as iniciativas oferecidas têm pouca amplitude, atingindo somente um número reduzido de famílias. Acrescente-se o fato de que os CRAS passam a ser vistos como uma espécie de locus de qualificação profissional, em detrimento de uma política mais ampla de desenvolvimento.

Apesar das críticas, tanto beneficiários quanto técnicos consideram positiva a relação entre benefício e condicionalidade, ou seja, concordam com as contrapartidas exigidas pelo Programa, pois impedem que “as famílias se acomodem e não façam o que deve ser feito”, embora se constituam muito mais num preço a pagar pelo recebimento do benefício, do que o acesso a serviços que contribuam para melhoria na sua condição de vida, pois os serviços não são prestados com a regularidade e a qualidade necessárias. Nessa mesma direção, os gestores e técnicos consideram que se o Programa deixasse de “punir” os beneficiários, não cumpririam mais as exigências porque não as percebem como um bem em si. Portanto, não haveria mudança na sua forma tradicional de pensar e agir, mesmo que possa ter aumentado o nível de procura pelos serviços de saúde. Essa visão reforça a concepção conservadora das condicionalidades apontada no texto de fundamentação da presente pesquisa.

Foi ainda destacado que as repercussões observadas sobre o poder público são decorrentes, algumas vezes, da pressão das famílias que têm que responder às exigências feitas pelo próprio estado, de modo que o município cobra o cumprimento de condicionalidades pelas famílias, e estas passam a cobrar dele que coloque os serviços à sua disposição para poder cumprir as condicionalidades que lhe são exigidas.

Apesar das limitações apontadas, verificou-se, no geral, que os beneficiários, em sua maioria, parecem estar cumprindo as condicionalidades postas pelo BF, mesmo que por medo de perder o benefício, embora percebam que há distância entre o que é posto pelas condicionalidades e as reais condições de acesso aos serviços de saúde, educação e assistência social nos municípios, por falta de investimento local em expansões e melhorias dos serviços.

d) Referente à Intersetorialidade O acompanhamento das condicionalidades do BF nos municípios pesquisados é

marcado por frágeis esforços na direção de uma gestão compartilhada. Os esboços de articulação parecem ocorrer mais por necessidade dos gestores das áreas, quando buscam os responsáveis dos CRAS, da Secretaria de Assistência Social ou do próprio BF no município visando sua contribuição na potencialização do acompanhamento da sua condicionalidade, o que se configura mais como uma estratégia de resolução de alguns gargalos na localização e abordagem dos beneficiários, embora tenham sido registrados em alguns municípios esforços de articulação entre Assistência Social e Educação e, com menos incidência, com a Saúde, mais para resolver problemas do que por uma prática planejada e sistemática. Nesse aspecto foi ressaltado que o fato de o BF estar vinculado a 03 (três) sistemas (Sistema Presença, SISVAN e Cadastro) distintos constitui-se numa dificuldade, o que conduz a pensar na necessidade de integração desses sistemas para elevar a qualidade de gestão e reduzir os problemas existentes, favorecendo, inclusive, a intersetorialidade. Tal como se identificou na área de Saúde, não há um trabalho devidamente articulado do setor de Educação com os gestores do Programa nos municípios e nem com as demais

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áreas envolvidas no acompanhamento das famílias. Como consequência da falta de aproximação entre os setores envolvidos no Programa, os dados coletados não têm servido como subsídios importantes num processo de planejamento conjunto entre as três Secretarias envolvidas (Saúde, Educação e Assistência Social).

O caráter pouco formalizado das iniciativas de integração pode ser evidenciado até nas instâncias estaduais de coordenação: “a gente troca informações, quando tem algum problema a gente tenta obter informação pra saber como encaminhar”.

Os sujeitos participantes da pesquisa ressaltaram que a inexistência de instâncias para realização de um trabalho menos isolado, implicando no reconhecimento da urgência de melhorar esse aspecto, muitas dificuldades enfrentadas pelos e nos municípios poderiam ser melhor equacionadas se um importante mecanismo institucional introduzido pelo BF – criação de instâncias intersetoriais de negociação – tivesse de fato sido instituído.

Somente em São Luís existe um Comitê Gestor (do qual participam os Secretários da Assistência Social, da Saúde e da Educação) e um Comitê Executivo (congregando coordenadores e superintendentes das respectivas áreas que compõem o BF), tendo este último sido pensado em razão do não funcionamento efetivo do Comitê Gestor. Entretanto, essas instâncias, segundo os depoimentos, funcionam de forma limitada e intermitente. Isso denota a pouca experiência dos sujeitos sociais em estabelecer processos decisórios compartilhados como parte de uma prática de gestão intersetorial. A disposição para um trabalho nessa direção parece depender de variáveis que não estão no campo técnico, quer dizer, só ocorre quando o governante consegue ver nele um elemento de motivação política da sua administração. Os técnicos reconhecem que não há intersetorialidade na gestão das condicionalidades quando dizem: “eu vejo que essas condicionalidades são acompanhadas pelas exigências do sistema e cada um por si e Deus por todos”.

Chama atenção o fato de o Conselho Municipal, enquanto instância de controle social e cuja participação é fundamental para a democratização das decisões, não ser lembrado como parte da estratégia de gestão intersetorial, na maioria dos casos, o que pode indicar dificuldade dos municípios em dividir o poder com setores da sociedade civil.

Dessa forma, os conselhos parecem ter um papel apenas homologador das decisões tomadas pelo executivo e os conselheiros parecem tomar conhecimento de como estão sendo executadas as ações e de que forma estão sendo usados os recursos, sem questionar sua forma de distribuição, nem mesmo participar das deliberações quanto ao seu uso.

Em relação a críticas e sugestões sobre às condicionalidades, destacamos: Insuficiência de recursos – a despeito da ampliação do investimento federal - como obstáculo à operacionalização da Política de Assistência Social como um todo, do BF, inclusive recursos do IGD, em particular para acompanhamento das condicionalidades. Nesse aspecto é sugerida a ampliação dos recursos para os municípios no campo da Assistência Social pelo MDS e do co-financiamento por parte da esfera estadual e alocação de recursos por parte das gestões municipais. Foi sugerido que os recursos do IGD sejam repassados de forma contínua e regular, sem os atrasos que, costumeiramente, vem ocorrendo. Além dos recursos, também são sugeridas melhorias efetivas nas condições de trabalho para o acompanhamento das condicionalidades, com destaque à ampliação do quadro de pessoal e melhoria de salários e capacitação.

Considerando a percepção dos técnicos de que a condicionalidade da Assistência Social é frágil, ou melhor, que não tem propriamente o caráter de condicionalidade, foi destacado, especialmente entre os assistentes sociais, que o não cumprimento da exigência da frequência mínima da carga horária relativa aos serviços de convivência oferecidos pelo PETI deveria ser passível de punição (advertência, suspensão e cancelamento), como as demais condicionalidades. Para além, é sugerido que a própria participação das famílias em ações voltadas para a geração de trabalho e renda que, nas diretrizes do Programa, se constituiriam numa das estratégias de autonomização dos beneficiários, deveria configurar, por si só, como condicionalidade. Essa proposta, que privilegia a dimensão punitiva em detrimento da dimensão educativa das condicionalidades, decorre, provavelmente, do

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desânimo dos técnicos ao atribuir os parcos resultados positivos decorrentes dessas ações ao desinteresse e desmotivação dos beneficiários.

As falhas no processo de acompanhamento propriamente dito detalhadas ao longo deste relatório motivaram sugestões para seu aperfeiçoamento através, principalmente, da realização de um trabalho sistemático e permanente com os trabalhadores diretamente responsáveis pelo acompanhamento nos territórios: operadores do sistema de ensino – professores, diretores, etc – agentes e outros profissionais da saúde, sobretudo os de PSF. Nesse contexto, alguns sugerem maior dedicação a famílias com situações específicas de vulnerabilidade. Além disso, foi sugerida a implementação de um projeto de estímulo da presença dos alunos nas escolas visando sua aprendizagem. A ideia subjacente a essas sugestões prioriza o trabalho de acompanhamento propriamente dito, conferindo menor realce às tarefas afetas aos sistemas de informação – registro e repasse dos dados coletados nas instâncias de execução.

Foram também destacadas como merecedoras de correção as falhas constantes dos sistemas de informação ligados ao monitoramento do cumprimento das condicionalidades – do Sistema Presença, do SISVAN, e do Cadastro, sendo sugerida ao MDS a melhoria dos sistemas e para os municípios, melhorar o acesso da internet.

No que se refere à questão da intersetorialidade, cuja fragilidade foi enfatizada tanto nos municípios quanto nas coordenações estaduais do BF, os entrevistados apontaram a necessidade de fazer avançar o trabalho conjunto entre as diferentes secretarias envolvidas na gestão das condicionalidades exigidas pelo BF por meio de: um processo de planejamento integrado que possibilite a identificação de problemas relacionados à oferta e/ou ao acesso aos serviços e sua resolução através de ações definidas e operacionalizadas em parceria; utilização de uma estratégia voltada para a prática de encontros locais, regionais e estaduais envolvendo as três áreas, devendo se estender àquelas que possam contribuir para o desenvolvimento e a autonomização dos beneficiários.

No processo de construção de uma dinâmica intersetorial foi lembrada a necessidade de maior aproximação entre as equipes responsáveis pelas condicionalidades e os conselhos, o que não apenas favoreceria que estas equipes pudessem captar “o olhar” dos beneficiários através de seus representantes presentes nessas instâncias, como daria a estas condicionalidades um caráter de “reforço positivo e não coercitivo”. Além disso, ações no sentido de possibilitar maior clareza e conhecimento do conselho quanto às suas funções também são sugeridas, até mesmo como estratégia que permitiria o controle social mais efetiva dos Conselho Municipais, resultando no uso correto e mais apropriado dos recursos.

Levando em conta o grau de centralização das decisões e de recursos nas mãos dos prefeitos, foi sugerido um processo mais aberto e mais democrático de tomada de decisão nos municípios pesquisados, com administração compartilhada dos recursos oriundos do IGD.

e) Referente ao Índice de Gestão Descentralizada (IGD) Na pesquisa de campo foi verificado que nenhum município tem conseguido atingir um

índice sintético integral de 100% para permitir o recebimento integral dos recursos que lhes são atribuídos pelo MDS. Vários são os fatores apontados pelos entrevistados como determinantes do não alcance de índice integral no IGD pelos municípios. Como ficou claro, o resultado insatisfatório decorre predominantemente das menores taxas de acompanhamento das condicionalidades, com destaque para os piores resultados do monitoramento da Saúde.

Além das falhas na coleta das informações exigida pelo acompanhamento da agenda de Saúde das famílias beneficiárias, a maioria dos municípios, senão a totalidade atribui os resultados negativos prioritariamente à alimentação dos dados por causa tanto do próprio sistema utilizado pelo MDS como da internet disponível cujo acesso é precário e de má qualidade, ou seja, instável e lento.

O atraso no repasse dos recursos do IGD pelo MDS é outro problema apontado por vários municípios para explicar os resultados encontrados. Mesmo que os municípios

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busquem soluções provisórias para não paralisar as atividades do Programa (adiantamento de recursos e depois ressarcimento das despesas pelas prefeituras), para eles o atraso reclamado compromete a fluência do trabalho de acompanhamento das condicionalidades e mesmo a manutenção de um trabalho sistemático com as famílias mais vulneráveis, além de desmotivar as equipes de trabalho, o que pode indicar que os repasses do MDS se constituem não apenas em subsídios de recursos para fazer face aos custos administrativos dos municípios, mas numa fonte essencial de renda sem a qual a continuidade das ações ficaria comprometida.

Em que pese esse problema, os recursos do IGD são utilizados corretamente na melhoria da gestão do BF, ajudando na melhoria do ambiente de trabalho, com aquisição de mobílias (mesas, cadeiras e estantes) e aparelhos de ar condicionado; para a melhoria das condições de trabalho propriamente ditas, os mais citados foram: compra e aluguel de carros e motos, compra de combustível, aquisição de materiais didáticos e outros materiais permanentes e de consumo para realização das atividades com as famílias, além de conserto e compra de computadores, impressoras e outros equipamentos e materiais necessários ao registro e repasse das informações nos sistemas, bem como pagamento de internet e também compra de modem para melhorar o acesso.

Os recursos ainda são usados para treinamento e capacitação de pessoal técnico e administrativo do Programa, para pagamento de diárias e de gratificações para os técnicos do Programa e operadores dos diferentes sistemas de informação, estas últimas como forma de complementação salarial, contratação e pagamento de técnicos e de palestrantes e professores para os cursos. Em âmbito estadual, a coordenação da condicionalidade da Assistência Social declarou que aplica os recursos em atividades que visam melhoria dos indicadores do IGD dos municípios e do atendimento às famílias, como capacitações dos gestores e de técnicos responsáveis pelo BF e Cadastro Único, Seminário Intersetorial que agregou as Políticas de Educação, Saúde, Assistência, Segurança Alimentar e o Controle Social, Encontro Estadual da Frequência Escolar, monitoramento e assessoramento às 18 Unidades Regionais de Educação existentes no Maranhão no que diz respeito à frequência escolar bem como monitoramento e assessoramento especifico para atualização cadastral para 70 municípios com mais baixos índices de cadastros atualizados, além da aquisição de equipamento de informática para a Supervisão de Transferência de Renda/Proteção Básica.

Na verdade, nessa situação, cada município procura encontrar, por si próprio, as estratégias e as regras para gerir o recurso. Mas no caso dos municípios maranhenses participantes da pesquisa, essa gestão, em geral, encontra-se ou centralizada nãos mãos dos prefeitos ou dos secretários de Assistência Social, passando muitas vezes ao largo da possibilidade de interferência dos gestores das condicionalidades e até do coordenador do BF no município, além do próprio Conselho que deve participar da elaboração do planejamento e do orçamento e aprovar a prestação de contas referentes a esses recursos. Essa centralização na aplicação dos recursos do IGD cria obstáculo ao trabalho, visto que, na maior parte dos casos, somente os projetos que o prefeito aprova ou considera relevantes são realizados, o que pode levar a um uso político desse recurso e gerar procedimentos burocráticos que resultem em demora na realização das ações, ou até inviabilizar parte destas.

É informação relevante a que mostra que poucos são os municípios que se referiram explicitamente ao Conselho como instância de planejamento, acompanhamento e fiscalização, sobretudo no seu papel de aprovar a prestação de contas dos recursos do IGD.

Ademais, verificou-se em alguns municípios disputa dos recursos do IGD: sua aplicação fica sob a responsabilidade do gestor da Política de Assistência Social, em geral o Secretário, mas existem esforços, em alguns municípios para democratizar as decisões sobre a destinação desses recursos, e sua partilha entre as três Políticas. Todavia, nos municípios maranhenses, a situação mais generalizada é a concentração do gasto desses recursos nas ações específicas da Assistência Social, sobretudo, em cursos e capacitações visando geração de trabalho e renda. Isso porque, como se viu, não existem mecanismos ou instâncias de deliberação conjunta, evidenciando dificuldades dos gestores se pensarem

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num trabalho de fato conjunto ou até mesmo articulado. Na verdade, os recursos são vistos unicamente como da Assistência Social, que poderá ou não repassá-los para as demais áreas, considerando critérios próprios.

O que acontece em âmbito municipal se repete na instância estadual: os recursos do IGD recebidos são administrados de forma centralizada na Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social que repassa determinados valores para as demais secretarias, a seu próprio critério. Apesar de nenhum município da amostra receber o teto dos recursos do IGD transferidos pelo MDS, todos ressaltaram sua importância para o aperfeiçoamento da gestão e do desenvolvimento de atividades educativas e complementares, melhorando a infraestrutura com equipamentos, a realização de ações itinerantes, visitas domiciliares, cursos de geração de renda, treinamentos de técnicos, além de garantir um melhor atendimento aos beneficiários do BF. Convém, todavia, ressaltar que a quase totalidade dos sujeitos que participaram da pesquisa demonstrou desconhecer a existência do IGD, limitando-se esse conhecimento praticamente aos gestores (principalmente da Assistência Social).

Em relação a críticas e sugestões ao IGD, o principal destaque foi atribuído ao atraso no repasse dos recursos pelo MDS aos municípios, já apontado acima, além de considerados baixos e insuficientes para a gestão do Programa nos municípios. A complexidade da prestação de contas do recurso, gerando incertezas nas formas legais de sua utilização, também é criticada por um município. Em relação à utilização dos recursos, a coordenadora estadual da Assistência Social percebe que existe pouca autonomia dos gestores municipais do BF no planejamento e no acompanhamento dos gastos dos recursos do IGD.

A inexistência de contrapartida do gestor municipal que possa potencializar os recursos do IGD é outra crítica levantada, mesmo que apenas por um município. Outro município apontou como obstáculo à gestão do Programa a baixa remuneração da equipe, além da falta de capacitações sistemáticas direcionadas às três políticas na perspectiva de aprimoramento da gestão.

Uma sugestão consensual foi a necessidade de maior destinação de recursos para a Assistência Social e para a realização do acompanhamento do cumprimento das condicionalidades, por parte dos beneficiários do BF, para favorecer o desenvolvimento de potencialidades e aquisições, além do fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários que possibilitem a inclusão social das populações vulneráveis, tal como preconizado pela Política de Assistência Social.

Nesse sentido, os recursos do IGD deveriam, em primeiro lugar, ser ampliados para permitir o aperfeiçoamento e a ampliação do Programa, com o envolvimento de um número maior de famílias nos projetos de inclusão produtiva. Em segundo lugar, os repasses deveriam ter regularidade e pontualidade para permitir a continuidade das ações e manter a motivação das equipes.

Foi ainda colocada como sugestão a utilização do IGD como complementação salarial das equipes e capacitação destas.

f) Destaque a questões gerais A maioria dos beneficiários demonstrou timidez para se pronunciar, expor ideias,

prestar informações. Só conseguiam visualizar, sobretudo, o caráter punitivo das condicionalidades e desconheciam o que seja o IGD. Sobressai-se, também, a quase total ausência de informações dos conselheiros sobre a implementação do Programa, acompanhamento de condicionalidades e IGD (a maioria desconhece sua existência).

A deficiência da estrutura dos prédios dos CRAS merece destaque: a maioria carece de adequação, enquanto órgão público, para prestar serviços de qualidade à população usuária. A maioria dos CRAS funciona em prédios alugados, limitando a continuidade e adensamento do trabalho realizado junto às famílias.

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Acresce-se a esse aspecto os limites impostos em decorrência da baixa qualificação e da rotatividade dos trabalhadores do SUAS pela insuficiência/ausência de concurso público, entrave para a realização e continuidade do trabalho com as famílias: acompanhamento das condicionalidades e realização de ações educativas e complementares.

São limitadas as estratégias desenvolvidas pelos municípios visando proporcionar a autonomia das famílias, restritas a cursos tradicionais de “prendas domésticas” que, no limite, podem assegurar um patamar mínimo de renda, na maioria, sem acompanhamento das ações de qualificação/capacitação dos egressos para verificação de melhorias ou não das condições de vida dos beneficiários após participação nessas atividades;

A desarticulação entre as instituições gestoras das condicionalidades (Assistência Social, Saúde e Educação) e o pouco conhecimento por parte de sujeitos que operacionalizam o IGD e as condicionalidades, especificamente na Saúde, produz “ativismo” dissociado de uma compreensão acerca dos significados desses elementos da gestão do Programa. O desconhecimento acerca do IGD se estende aos conselheiros, e, sobretudo, aos beneficiários. Finalmente, merece destaque à Inexistência de contrapartida financeira dos municípios e do estado para desenvolvimento da gestão do BF.

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