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31 Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 3, n. 1, p. 31-53, jan./jun. 2013 Relações intertextuais entre Dom Casmurro, de Machado de Assis, e Capitu – Memórias Póstumas, de Domício Proença Filho 1 Vanessa Vergani Machado 2 Resumo: Neste trabalho, objetivou-se visualizar, baseando-se especialmente nos estudos de Bentes (in MUSSALIM; BENTES, 2005) e Fiorin (2006), as relações intertextuais existentes entre as obras Dom Casmurro, de Machado de Assis, e Capitu – Memórias Póstumas, de Domício Proença Filho. O romance de Proença Filho foi elaborado a partir da história contada em Dom Casmurro, na qual se tem a narração unilateral de Bentinho sobre a grande incerteza de sua vida: a traição de sua esposa, Capitu, e de seu melhor amigo, Escobar, que ele sugere serem verdadeiras. O que há em Capitu – Memórias Póstumas é a versão autodefensiva da esposa acusada, que argumenta, em seu desabafo póstumo, contra os pontos levantados pelo marido no texto original de Machado de Assis. Está nesses pontos a concentração deste estudo, e, com as teorias aqui utilizadas, foi possível confirmar a existência de um diálogo discorde entre eles e, por conseguinte, entre as duas obras. Palavras-chave: Dom Casmurro. Capitu – Memórias Póstumas. Intertextualidade. 1 Orientadora: Maria Cecília de Oliveira Adão: Doutora em História pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Mestre em História pela mesma instituição. Docente do Claretiano – Centro Universitárionos cursos de Licenciatura em História, Filosofia, Educação Física, Gerenciamento de Recursos Humanos e Pedagogia (PARFOR). E-mail: <[email protected]>. 2 Especialista em Ensino de Português, Literatura e Redação pelo Claretiano – Centro Universitário. Graduada em Letras pela mesma instituição. E-mail: <[email protected]>.

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Relações intertextuais entre Dom Casmurro, de Machado de Assis, e Capitu – Memórias Póstumas, de Domício Proença Filho1

Vanessa Vergani Machado2

Resumo: Neste trabalho, objetivou-se visualizar, baseando-se especialmente nos estudos de Bentes (in MUSSALIM; BENTES, 2005) e Fiorin (2006), as relações intertextuais existentes entre as obras Dom Casmurro, de Machado de Assis, e Capitu – Memórias Póstumas, de Domício Proença Filho. O romance de Proença Filho foi elaborado a partir da história contada em Dom Casmurro, na qual se tem a narração unilateral de Bentinho sobre a grande incerteza de sua vida: a traição de sua esposa, Capitu, e de seu melhor amigo, Escobar, que ele sugere serem verdadeiras. O que há em Capitu – Memórias Póstumas é a versão autodefensiva da esposa acusada, que argumenta, em seu desabafo póstumo, contra os pontos levantados pelo marido no texto original de Machado de Assis. Está nesses pontos a concentração deste estudo, e, com as teorias aqui utilizadas, foi possível confirmar a existência de um diálogo discorde entre eles e, por conseguinte, entre as duas obras.

Palavras-chave: Dom Casmurro. Capitu – Memórias Póstumas. Intertextualidade.

1 Orientadora: Maria Cecília de Oliveira Adão: Doutora em História pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Mestre em História pela mesma instituição. Docente do Claretiano – Centro Universitárionos cursos de Licenciatura em História, Filosofia, Educação Física, Gerenciamento de Recursos Humanos e Pedagogia (PARFOR). E-mail: <[email protected]>.2 Especialista em Ensino de Português, Literatura e Redação pelo Claretiano – Centro Universitário. Graduada em Letras pela mesma instituição. E-mail: <[email protected]>.

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1. INTRODUÇÃO

Uma das obras mais ilustres e intrigantes da literatura mundial, o romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, publicado em 1900, é a terceira obra da trilogia realista machadiana, ao lado de Memórias Póstu-mas de Brás Cubas (1881) e Quincas Borba (1891). No conhecido texto, o leitor acompanha a aflição do narrador, o protagonista Bentinho, que, pretendendo induzir o “fino leitor” e a “castíssima leitora” a adentrarem seu universo casmurro e recalcado, deita nas palavras suas memórias, de-sabafando acerca da grande incerteza de sua vida, tema central do livro: a traição de sua esposa, Capitu, e de seu melhor amigo, Escobar, que ele insinua serem verdadeiras.

Entretanto, como bem o sabem leitores de cabeceira, vestibulandos, curiosos e entusiastas da obra, em Dom Casmurro, conta-se, apenas, com a visão de Bentinho sobre a situação, que, em verdade, é parcial. Desse modo, há indagações fundamentais a serem feitas partindo-se desse relato impregnado de obscuridades: teriam sido culpados de adultério Escobar e Capitu? E por que razão Machado de Assis escolheu transferir ao leitor a sentença de inocentá-los ou condená-los? Ora, não há maneira de res-ponder a tais questões, pois, para isso, são necessárias as versões dos perso-nagens em xeque, bem como as de “testemunhas” imparciais no contexto. Além disso, nem o próprio Machado poderia, caso não o quisesse, escla-recer tal impasse, uma vez que, sendo “mero” autor, não necessariamente precisa ter o domínio de seus personagens.

Todavia, como afirma o próprio narrador, em seu capítulo Convi-vas de boa memória, “Nada se emenda bem nos livros confusos, mas tudo se pode meter nos livros omissos” (ASSIS, 2008, p. 105). Nesse sentido, objetivando responder àquelas questões, alguns autores se lançaram ao desafio de emendar trechos, unir partes, supor ideias e, com isso, propor resoluções, valendo-se do aval oferecido por Bentinho, bem como de criar outras perspectivas para tais fatos. Foi isso o que fez, por exemplo, o escri-tor Domício Proença Filho (1998), em seu Capitu – Memórias Póstumas, concedendo voz à dita personagem e apresentando sua versão do drama

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do Dr. Bento Santiago. Questionado, numa entrevista, sobre a respon-sabilidade que sentia em “reescrever” Machado, Proença Filho explica: “Nunca tive nem tenho a pretensão de reescrever Machado. Entusiasta de sua obra, busquei apenas dialogar com o seu texto e com a sua fortu-na crítica” (GRUPO EDITORIAL RECORD, 2011). É a esse diálogo mencionado por Proença Filho que se apega este estudo.

O que se pretende no presente trabalho é visualizar as relações exis-tentes entre esses dois textos, o original e seu fruto, alcançando os níveis de intertextualidade que as obras refletem. Na busca por afirmações e re-futações, aprovações e reprovações, bem como semelhanças e diferenças, é que se pauta o estudo, destinado, especificamente, a estabelecer a ponte entre tais romances, na qual se observará os limites de independência e subordinação que existem nessa conexão, além das singularidades de cada obra.

Para tanto, serão utilizados estudos feitos acerca desse fator de análi-se textual – a intertextualidade –, como também de variadas definições a seu respeito, baseando-se, especialmente, em Bentes (2005), mas também em outros autores, iniciando pela apresentação das concepções de “tex-to” e, depois, de “intertextualidade” nas quais se fundarão este trabalho, para que se possa, em seguida, partir à análise dos romances. Com esse suporte, se confirmará a existência de relação intertextual entre o relato de Bentinho e a resposta de Capitu – da Capitu de Proença Filho, não menos “oblíqua” e “dissimulada”, embora um pouco mais despida, que a de Machado de Assis.

2. TEXTO E INTERTEXTUALIDADE

Como dito, começaremos a explanação deste estudo abordando a concepção de texto que utilizaremos neste trabalho. Desse modo, o que deveríamos fazer é iniciar a sua conceituação apresentando, de saída, a definição mais bem aceita entre os linguistas ou a mais atual surgida na área, porém, como este se trata de um trabalho sobre relações intertextu-

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ais, optamos por utilizar a metodologia do diálogo também nesta seção, considerando que a noção de “texto”, tal como a de tantos outros termos e expressões, sempre terá à sua disposição mais de uma explicação. Portanto, exporemos brevemente a definição de “texto” em sua trajetória, dividin-do-a em três momentos, colocando-a como resultante de um complexo de reflexões obtidas ao custo de muitos estudos.

Antes, o que se concebia como “texto” era qualquer sequência lin-guística possuidora de coerência, o que significa que essa primeira defini-ção estava concentrada no arranjo do material linguístico. Tal concepção pressupõe, portanto, a existência de “não textos”, ou seja, de sequências linguísticas incoerentes entre si. Em suma, o que aqui se tinha era o texto, oral ou escrito, reconhecido como uma estrutura “pronta” e “acabada”; era a ênfase no seu aspecto “físico”, “palpável”. Consequentemente, é tido como uma unidade dotada de um início e um fim, adquirindo, inclusive, a acepção de “elemento linguístico maior que a frase” (BENTES, 2005).

Por exemplo, para Weinrich (1971, apud FÁVERO; KOCH, 1988, p. 22), que pode ser incluído como partícipe desse momento da definição do termo, como menciona Bentes (2005, p. 253) para ilustrar a sua expo-sição, o “texto” é caracterizado por meio de fatores como: “a) a seqüência coerente e consistente de signos lingüísticos; b) a delimitação por inter-rupções significativas na comunicação; c) o status do texto como maior unidade lingüística”.

Essa conceituação contrasta com outra, posterior, a qual toma o tex-to não como mera materialização linguística, mas como participante de um exercício mais amplo de comunicação. Nesse momento, passa-se a le-var em consideração as circunstâncias de planejamento e construção da verbalização do texto, bem como suas condições de recepção (BENTES, 2005). O que temos, então, é a inclusão do interlocutor e sua resposta na produção textual, ainda que essa resposta não seja aquela aguardada pelo locutor. Assim, se antes o centro do conceito de “texto” estava na organização dos constituintes linguísticos e na extensão do arranjo, agora podemos dizer que a palavra-chave dessa segunda definição é “interação”.

As palavras de Bakhtin (1986 apud BENTES, 2005, p. 255), filóso-

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fo russo de destaque na lista dos grandes teóricos do discurso, tido como um dos maiores pensadores do século 20, fornecem um melhor esclareci-mento dessa compreensão:

Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro. [...] A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. Se ela se apóia sobre mim numa extremidade, na outra se apóia sobre meu interlocutor. A palavra é o território co-mum do locutor e do interlocutor.

Além das diferenças entre as variadas concepções de “texto”, há, tam-bém, “fusões” e “confusões” entre diferentes acepções do termo. Ocorre, por exemplo, que alguns autores aceitam a palavra “discurso” como sinô-nima de “texto”, como também existem os que as empregam com signi-ficados distintos. Isso se deve pelo fato de que, em algumas línguas, tais como o alemão e o holandês, não existe essa diferenciação, pois não há, em seu léxico, a palavra “discurso”, não havendo, portanto, uma separação entre esse vocábulo e o “texto”. Além do mais, não podemos nos esquecer de que existe o campo de estudos dedicado exclusivamente à Análise do Discurso, que, em meio às suas propostas, difere os sentidos dessas duas palavras (ALEIXO, 2011). Podemos nos servir de Fávero e Koch (1988, p. 25), também citadas por Aleixo (2011, p. 115-116), para representar essa distinção:

Texto em sentido amplo, designando toda e qualquer manifestação da capacidade textual do ser humano (uma música, um filme, uma escultura, um poema etc.), e, em se tratando de linguagem verbal, temos o discurso, atividade comunicativa de um sujeito, numa situ-ação de comunicação dada, englobando o conjunto de enunciados produzidos pelo locutor (ou pelo locutor e interlocutor, no caso dos diálogos) e o evento de sua enunciação.

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Como é possível observar na citação, além de uma discriminação entre os vocábulos, ocorre, nesse terceiro entendimento, uma ampliação do sentido de “texto”, passando-se a incorporar ao termo os diferentes ti-pos de manifestação comunicativa humana, como a música, a pintura, os gestos etc., restringindo a linguagem verbal ao “discurso”, compreendido, por sua vez, como atividade comunicativa envolta na situação de comuni-cação. Grosso modo, poderíamos afirmar, com base em Fiorin (2006), que Bakhtin partilha dessa conceituação.

Com essa explicação do que é “texto” dividida em três momentos, as-sinala-se o problema de qualquer definição: haverá, sempre, mais de uma acepção para um único conceito, seja concordante, seja discordante de uma anterior. No que concerne à conceituação de “texto”, não é diferente; teóricos contemporâneos ou não divergem em suas definições, e o que im-porta é encontrar aquela compatível com a análise textual que se propõe realizar, porém sem desconsiderar as demais. Nesse sentido, sendo a inten-ção deste estudo dissertar sobre os níveis de intertextualidade evidencia-dos entre dois romances, a definição mais próxima dos pressupostos que aqui serão utilizados pode ser representada pela fala de Koch (1997 apud BENTE, 2005, p. 255), a qual poderíamos encaixar naquela segunda con-cepção de “texto”, que o entende em sua situação de interação:

Poder-se-ia, assim, conceituar o texto, como uma manifestação ver-bal constituída de elementos lingüísticos selecionados e ordenados pelos falantes durante a atividade verbal, de modo a permitir aos parceiros, na interação, não apenas a depreensão de conteúdos se-mânticos, em decorrência da ativação de processos e estratégias de ordem cognitiva, como também a interação (ou atuação) de acordo com práticas socioculturais.

É claro que, embora haja a intenção do diálogo entre os diferentes momentos apresentados, não há o intuito de compará-los nem de colocá--los em debate; ao contrário, o recurso foi usado, como já dito, para se traçar a trajetória da conceituação do termo e, assim, chegar-se à definição

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apropriada para este trabalho, demonstrando, com isso, que ela não foi subitamente produzida nem é estática. Em verdade, a intenção primeira é alcançar o outro conceito em que se postula este estudo, o qual constitui fator de grande importância para a compreensão global de um texto: a intertextualidade.

Interessante fator de coerência textual, a intertextualidade é, em suma, o processo de recorrer-se a textos anteriores a um dado texto para compreendê-lo integralmente. O curioso é que nós, locutores e, também, interlocutores de textos, não notamos o quanto nos servimos, no coti-diano, de nosso prévio conhecimento de outros textos para produzirmos e recebermos textos novos (BENTE, 2005). Daí a atenção que deve ser dada às informações que acumulamos em nosso dia a dia e à influência que elas exercem em nós. É tal como afirmam Fiorin e Savioli (2007, p. 20):

A percepção das relações intertextuais, das referências de um texto a outro, depende do repertório do leitor, do seu acervo de conheci-mentos literários e de outras manifestações culturais. Daí a impor-tância da leitura, principalmente daquelas obras que se constituem as grandes fontes da literatura universal. Quanto mais se lê, mais se amplia a competência para apreender o diálogo que os textos travam entre si por meio de referências, citações e alusões. Por isso cada li-vro que se lê torna maior a capacidade de aprender, de maneira mais completa, o sentido dos textos.

Esse ato recorrente de orientar-se, de influenciar-se por “textos” anteriores para produzir ou para receber “textos” novos, é chamado, por Bakhtin, de “dialogismo”, porém, antes de prosseguirmos com essa afir-mação, é preciso esclarecer a utilização das aspas para destacar a palavra “textos”. Na realidade, o significado que carrega o termo “dialogismo” para o filósofo não traz em seu bojo a ligação ao conceito de “texto”, pois, de acordo com ele, devem-se chamar “dialogismo” as relações entre “enun-ciados”, o que quer dizer que, para compreendermos o raciocínio bakhti-niano, devemos substituir a palavra “textos”, na afirmação do início deste parágrafo, por “enunciados”.

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A confusão entre os conceitos de “dialogismo” e “intertextualidade” é muito comum não só entre leigos no assunto, como também entre teó-ricos do texto, que costumam firmar uma associação, que é errônea, entre os dois termos. Por esse motivo, faz-se necessário, neste estudo, antes de partirmos a um desenvolvimento mais pleno sobre o elemento protago-nista deste estudo – a intertextualidade –, exercitarmos, mais uma vez, o diálogo, tal como fizemos anteriormente, na exposição de “texto”, expli-cando a causa de tal equívoco, bem como a relação que existe entre os dois conceitos.

Segundo Fiorin (2006), o conceito de “dialogismo”, sobretudo per-tencente ao universo bakhtiniano, é confundido com o de “intertextu-alidade”, o que chega a ser ilógico, uma vez que esse termo nem sequer aparece na obra do filósofo. E o engano possui um marco histórico: ele se dá no momento em que a semioticista Júlia Kristeva (1967) apresenta, na França, um estudo no qual ela introduz o termo “intertextualidade” como pertencente à análise de Bakhtin, e Roland Barthes passa a difundir essa ideia. O problema é que eles entenderam como sendo “texto” o que Bakhtin chama “enunciado”, um erro condenável porque há, na obra do filósofo, uma distinção entre essas duas nomenclaturas. Para ele, o “tex-to” é “[...] uma realidade imediata, dotada da materialidade, que advém do fato de ser um conjunto de signos”, enquanto o enunciado é [...] uma posição assumida por um enunciador, é um sentido”. Fiorin (2006, p. 52) resume: “O enunciado é da ordem do sentido; o texto, do domínio da manifestação”.

Nesse sentido, fundamentando-nos no que afirma o próprio Fiorin (2006), linguista estudioso da teoria bakhtiniana, poderíamos dizer, uma vez que existe essa distinção entre “dialogismo” e “intertextualidade” e, para Bakhtin, entre “enunciado” e “texto”, que há dialogismo, ou relações dialógicas, entre enunciados (que são os sentidos) e, também, entre textos (que são as manifestações dos sentidos), devendo, porém, chamar-se “in-tertextualidade” somente as relações dialógicas materializadas em textos.

Em outras palavras, mais simples, ocorre intertextualidade quando um texto, em sua composição, se remete a outro(s), ou seja, “dialoga” com

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outro(s), reafirmando ou rebatendo assuntos em comum, consolidando ou negando ideias, fazendo menções, com o intuito de destacá-las, contes-tá-las, ironizá-las, estilizá-las, denegri-las, incorporá-las etc., adicionando a elas novas impressões, inerentes à própria produção. Por exemplo, neste artigo, caracterizado como de revisão bibliográfica, no qual nos utiliza-mos da manifestação escrita para a produção de seu texto e com ela tra-balhamos nos objetos aqui analisados, recorremos, como se afirmou no início desta seção, à intertextualidade, servindo-nos de citações diretas e indiretas de diversos autores para ratificar as informações que apresenta-mos e defendemos.

O uso de citações de um texto ou mais feito por outro, seja de forma explícita, seja de forma implícita, é o meio mais comum e o modo prima facie de estabelecer-se intertextualidade. Nos textos jornalísticos, científi-cos e, especialmente, literários, isso acontece com frequência; os autores fazem constantes referências a textos anteriores, podendo ser essa alusão ao gênero discursivo, à estrutura textual, ao tema, à história, a personagens etc. Geralmente, nesse último tipo de texto – o literário –, a citação ocorre de maneira implícita, isto é, o escritor costuma não indicar de onde reti-rou as passagens aludidas, pois pressupõe que seu leitor já tenha o mesmo acervo de informações que ele possui a respeito do texto citado (FIORIN; SAVIOLI, 2007). No entanto, devemos ressaltar que essa generalização não deve ser tomada como regra, já que, como se verá na seção a seguir, trabalharemos com um texto literário que se utiliza, em praticamente toda a sua extensão, de citações explícitas e, inclusive, diretas para remeter-se ao texto a partir do qual ele foi produzido, pois, como se notará, deste é de-pendente para que se ocorra uma compreensão global do intertexto.

A melhor maneira para se explicar as ocorrências intertextuais em seus níveis variáveis sempre será por meio de exemplos. É fato: só com-preendemos o funcionamento do texto no próprio texto; só visualizamos as formas de linguagem na comunicação real. Portanto, sem mais, vamos partir à análise dos textos propostos neste trabalho, a qual confirmará a refutação feita ao final do parágrafo anterior e muitos exemplos oferecerá para a elucidação do conceito de intertextualidade.

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3. A INTERTEXTUALIDADE ENTRE OS DOIS ROMANCES

Para Bakhtin, o jogo de enunciados, isto é, das relações dialógicas, pode ou não manifestar-se no fio do discurso, havendo meios para a ocorrência dessa manifestação. Falamos da incorporação assumida da(s) “voz(es)” de outro(s) pelo enunciador em seu enunciado, a qual constitui a maneira mais nítida do diálogo entre os sentidos proposto pelo filósofo – que a denomina, inclusive, de “concepção estreita de dialogismo” – e representa, quando revelada em textos, a prima facie, como afirmamos an-teriormente, de intertextualidade (FIORIN, 2006).

De um modo geral, existem duas possibilidades de inserção do dis-curso alheio no enunciado: na primeira, nomeada “discurso objetivado” por Bakhtin, a “voz” do outro é francamente referenciada e claramente apartada da “voz” do enunciador, ou seja, ela é demarcada; na segunda, a outra voz é “diluída” nas palavras do enunciador, ou seja, está internali-zada na fala deste, não havendo, consequentemente, uma separação mui-to clara entre o texto citante e o texto citado, e havendo, portanto, uma “bivocalidade” (FIORIN, 2006). Como veremos a partir deste momento na análise que iniciaremos, esses modos de inserção do discurso do outro num novo texto possuem exemplos clássicos de sua ocorrência no roman-ce metaficcional a que nos propomos comentar, os quais reafirmam as de-finições até aqui apresentadas e evidenciam a intertextualidade entre ele e a sua obra inspiradora.

No intertexto Capitu – Memórias Póstumas, a primeira possibilidade de introduzir no enunciado o discurso alheio, mencionada no parágrafo anterior, é a grande “anfitriã” do leitor, o “convidado de honra” desse ro-mance, recebendo-o, contextualizando-o, adentrando-o na história que vem contar, história essa contada por Capitu, que, no momento em que resolve tecer seu relato, já se encontra morta (por esse motivo, o título), vindo, portanto, do além-túmulo contar sua versão sobre as acusações a ela feitas por seu ex-marido, Bentinho, em Dom Casmurro. Por isso, há o abuso, especialmente nas primeiras cenas do texto, de citações diretas e in-

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diretas da primeira obra, que são as principais maneiras de demarcação do discurso alheio, para que ocorra a retomada de trechos e se possa construir a outra versão da história. Domício Proença Filho, autor dessas memórias de Capitu, justifica o uso desse recurso como um meio de assegurar leal-dade ao seu texto-origem, destacando, inclusive, que todas as transcrições são acompanhadas de comentários da narradora, havendo, por trás deles, obviamente, a “[...] perspectiva crítica da nova narrativa” (GRUPO EDI-TORIAL RECORD, 2011).

Utilizemo-nos da intertextualidade e deixemos que a própria Capitu justifique seu método. Façamos como Proença Filho (1998) e ofertemos a voz à moça dos olhos de ressaca, para que ela mesma afirme o porquê do uso de transcrições e paráfrases em seu desabafo:

Não há como fugir dos fatos. Vivemos, eu e Bentinho uma realida-de comum, em vários aspectos relatada no seu livro. Ao retomá-la, reproduzirei, com freqüência e por vezes literalmente, passagens de seu texto, para que não me acusem de falsear os fatos, e, sempre que tal ocorrer, situarei, para maior destaque e para garantia de distan-ciamento, suas palavras entre aspas. Prefiro assim, até porque ficarão bem mais evidentes as minhas ponderações. Longo foi o tempo em que fui sendo julgada sem direito de defesa. E apenas na palavra do outro. Por isso, tenho por legítimo valer-me dela para melhor di-lucidá-la. Mesmo com o risco de paráfrase. (PROENÇA FILHO, 1998, p. 16).

Chamamos de “discurso direto”, com base em Fiorin (2006), ou de “citação direta”, aquilo a que Capitu se referiu, podemos assim entender, como reprodução literária. Já ao que ela se refere como “palavra do ou-tro” sob o risco de paráfrase é chamado de “discurso indireto” (FIORIN, 2006), ou “citação indireta”. Sem mais, vejamos um excerto retirado do intertexto que estamos analisando, em que a narradora pratica a intertex-tualidade que anuncia no início de seu texto, utilizando-se de citações di-retas e indiretas para construir seu discurso:

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O pai de Bentinho é eleito deputado e vem para o Rio de Janeiro, com a família. O agregado vem também e ganha quarto próprio no fundo da chácara. As febres voltam a Itaguaí. Seus serviços são reconvocados. Mas diante da convocação, ele se deixa estar calado, assume aquela sua falsa seriedade, suspira, e acaba confessando que nunca fora homeopata! “Tomara esse título para ajudar a propagan-da da nova escola, e não o fez sem estudar muito e muito; mas sua consciência não lhe permitia aceitar mais doentes” “— Mas você curou das outras vezes”, diz o Dr. Santiago; “— Creio que sim; mas o mais acertado é dizer que foram os remédios indicados nos livros. Eles sim, abaixo de Deus. Eu era um charlatão!...” Bentinho me dis-se que, nesse momento, segundo o testemunho de sua mãe, muito emocionado, as lágrimas molhavam-lhe as palavras; mas, logo refei-to, prosseguiu no seu discurso estudado: “— Não negue, os motivos do meu procedimento podiam ser e eram dignos; a homeopatia é a verdade, e, para seguir a verdade, menti; mas é tempo de restabelecer tudo”. (PROENÇA FILHO, 1998, p. 21).

No caso que apresentamos, Capitu serve-se, como dissemos, dessas duas maneiras de representação do discurso alheio. Ela está narrando o modo como José Dias foi “agregado” à família Santiago, e, para iniciar essa explicação, utiliza-se, de início, de falas breves e objetivas, bem demarca-das e ritmadas pelo uso do ponto final ao fim de cada uma. A intenção, aqui, é “encurtar” o assunto e ir direto ao ponto, e Capitu só se utiliza desse recurso porque conta com a prévia leitura do texto original feita por seu leitor. Ela compreende que seu interlocutor já sabe do que ela está falando e, por isso, quer abreviar o assunto para chegar aonde pretende. Então, ao final dessa sequência de cenas estabelecida no início do parágra-fo, ela emenda uma citação indireta da fala de José Dias, para, em seguida, partir a uma transcrição ipsis litteris de sua fala, iniciando o tema central desse capítulo, em que Capitu justifica, com as transcrições literárias do texto de Bentinho, sua opinião acerca do agregado e, também, sua opinião acerca do que ela supõe ser a visão de seu ex-marido, além de apresentar José Dias ao leitor. Após uma sequência de citações diretas, a narradora apresenta, outra vez, uma citação indireta.

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As citações diretas e indiretas constituem-se exemplos de “intertex-tualidade explícita” por haver a indicação da fonte a que elas se remetem (KOCH; TRAVAGLIA, 1990 apud BENTES, 2005). Elas são recursos utilizados como apoio ao enunciado recente, ou seja, para ilustrá-lo, com o intuito de reafirmar ou negar a ideia apresentada, ironizá-la, condená-la etc. As citações diretas são caracterizadas pelo uso de um verbo introdutor e de travessão; já as indiretas, além do verbo introdutor, trazem a con-junção integrante “que”. Entretanto, essas não são as únicas maneiras de demarcar o discurso alheio no texto; Fiorin (2006) ainda nos traz outras duas formas de utilizar-se de citações alheias. Trata-se do uso do recurso “aspas”, que, basicamente, destaca termos ou expressões, com o intuito de remetê-los a um enunciado anterior, e do recurso “negação”, que, como o próprio nome já diz, está relacionado à negação de um enunciado anterior.

Pode aqui ocorrer uma confusão, a qual já nos adiantamos em escla-recer: Capitu afirma, no começo de sua narrativa, como podemos notar na citação que apresentamos no início desta seção, que se servirá de “aspas” para destacar a fala dos outros personagens em seu romance. Ela se propõe a sempre indicar o discurso alheio se utilizando de tal sinal gráfico, como se esse fosse o único ou o melhor meio capaz de assegurar a veracidade das referências diretas à fala do outro. Porém, como se percebe no decorrer do intertexto, não é isso o que ela faz o tempo todo, talvez para que a leitura não fique cansativa ou repetitiva às vistas do leitor. É fato: não há como escapar do travessão em um diálogo, e, além do mais, nesses casos, ele indi-ca melhor a fala do outro do que as próprias aspas, embora estas também sejam usadas como recurso à pontuação de uma citação direta, como já sabemos, especialmente em textos científicos, podendo ser tal ocorrência observada neste mesmo artigo. O que acontece é que as aspas servem, es-pecialmente, para um tipo específico de delimitação do discurso alheio, para o qual demonstraremos um exemplo a seguir, extraído do intertexto que estamos analisando.

Aceitei, enfim, como Bentinho, a teoria. Mas não concordo que mi-nha vida se casa à definição. Se a dele coincide, o problema é dele. Eu,

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Capitu, cantei todo o tempo e com empenho um duo temperado de ternura, e depois um trio, com o nascimento do meu filho. Se retor-nei ao duo, assegurei, porém, a afinação e a harmonia. Mas não nos precipitemos. Voltemos às conseqüências das denúncias do agrega-do. Não foi absolutamente como o Sr. Bento Santiago narrou no seu relato infeliz. (PROENÇA FILHO, 1998, p. 31, grifos do autor).

Anteriormente ao excerto apresentado, Capitu está a recordar o tre-cho de Dom Casmurro em que Bentinho nos conta sobre a história de seu amigo Marcolini acerca da relação entre a vida e a ópera. Na citação que extraímos, ela dá a sua opinião a respeito de tal teoria, encaixando-a na sua vida, assim como o faz o ex-marido no seu relato, e, ainda “imitando” a obra anterior, destaca, por meio de itálico, algumas palavras que perten-cem à fala de Bentinho, as quais ele utiliza, em seu texto, para encasar sua teoria particular ao universo da ópera. Devemos entender que o mesmo efeito que as aspas possuem sobre uma palavra que se pretende destacar tem o recurso da escrita em itálico ou mesmo do sublinhado, usuais para a demarcação de citações. E foi isso o que fez Proença Filho (1998) para remeter-se não só ao texto-origem de sua obra, como também para inserir a fala de Capitu no universo de vocábulos referentes à ópera, uma vez que é para isso que o recurso “aspas” (manifestado pelo itálico, em nosso caso) serve: para circunscrever termos ou expressões que identificam a menção à fala de outra pessoa ou a um universo particular de vocábulos.

Ainda nesse excerto, mais especificamente em seu final, temos um exemplo do outro recurso à demarcação do discurso alheio que menciona-mos: a negação, cujo próprio nome já explicita sua função. Notemos que no trecho “[...] Não foi absolutamente como o Sr. Bento Santiago narrou no seu relato infeliz” (PROENÇA FILHO, 1998, p. 31), duas vozes se confrontam: a que é a favor da versão de Bentinho sobre o momento em que ele percebe estar enamorado de Capitu depois de ouvir a conversa entre sua mãe, D. Glória, e o agregado, José Dias – versão essa que é o “relato infeliz” ao qual a narradora se refere –, e a que concorda com Ca-pitu, que, na sequência do excerto, vai dar a sua explicação do fato. Sem

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mais, a negação é, em suma, isto: a refutação de um enunciado, na qual se estabelece, automaticamente, o diálogo com o seu sentido contrário, ou seja, o da afirmação.

Assim como no discurso direto e no discurso indireto há contornos externos muito bem definidos para a sua demarcação, os recursos “aspas” e “negação” apresentam nítidas provações de sua intertextualidade: nas aspas, notamos o diálogo por meio dos sinais gráficos ou estilísticos, como o itálico; na negação, por meio do advérbio negativo. Todavia, como dis-semos no início desta exposição, há uma segunda maneira de se inserir um discurso anterior em um novo texto, e, nesta, não existe algo que expli-cite essa citação. É o que Koch e Travaglia (1990 apud BENTES, 2005) chamam de “intertextualidade implícita”. Aqui, encaixam-se mais cinco tipos de intertextualização: a polêmica clara, a polêmica velada, a paródia, a estilização e o discurso indireto livre (FIORIN, 2006), os quais também são passíveis de serem evidenciados no romance de Proença Filho (1998).

Não sei se disse que saí do Brasil como se nossa vida fosse um jar-dim de roseiras floridas. Conformadas, foi o que escrevei; agora me lembro. A família levou-nos ao cais, com emoção e carinho. D. Glória cheia de cuidados com o filho, que não se expusesse demais aos ventos do navio, que não fosse pegar uma pneumonia; José Dias amargava, mas sem demonstrá-la, a sua frustração, por mais uma vez, não voltar à Europa, e logo à Suíça, belíssima, vocês vão adorar, e fi-quem tranquilos, eu cuido da casa e dos velhos, Capitu, se em algum momento sentir que eu posso ser de alguma valia, é só escrever, que viajo em seguida... (PROENÇA FILHO, 1998, p. 218, grifo nosso).

Como se pode notar já na primeira leitura, no excerto anterior, não há uma demarcação propriamente dita entre a voz da narradora Capitu e a voz do personagem José Dias; elas misturam-se ao final do trecho, mas, mesmo assim, são claramente percebidas. Por isso, com base em Fiorin (2006), entendemos que o recorte em destaque na citação traz palavras tidas como bivocais, o que nos leva a afirmar a ocorrência de discurso in-direto livre. Capitu está narrando a sua despedida da família de Bentinho,

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quando de sua embarcação para a Suíça, motivada pelas discussões em tor-no da paternidade de Bentinho em relação a Ezequiel, filho do casal. O re-lato com o qual contamos é a versão de Capitu dessa despedida, mesclada com a fala de José Dias ao final, entremeada em seu discurso. Percebe-se, nitidamente, a voz do agregado no trecho destacado, embora não haja de-marcações que a evidenciem, e percebe-se, também claramente, no início do parágrafo, que Capitu está descrevendo a cena com suas próprias pa-lavras. Tal como nos explica Fiorin (2006), “[...] são dois tons diferentes que permitem perceber duas vozes distintas”, pois o tom sereno de Capitu começa, no final do trecho, a contrastar com a euforia e o entusiasmo de José Dias ao imaginar a viagem da narradora. Por conseguinte, há trechos que poderiam ser das duas vozes. O período “[...] por mais uma vez, não voltar à Europa, e logo à Suíça [...]” poderia ser atribuído, na forma em que está, à voz da narradora, mas também a José Dias, se compreendermos que o início da fala deste se encontra nesse ponto, com o lamento por não participar da viagem.

Muitas vezes ocorre, no intertexto Capitu – Memórias Póstumas, de a protagonista dessa versão, Capitu, colocar em xeque os ditos de Bentinho na primeira obra. Não surpreende: a narradora pretende defender-se das acusações de seu ex-marido, e isso o faz questionando seus apontamen-tos, condenando-os e explicando o porquê dos achismos do esposo. É por esse motivo que temos uma polêmica constantemente estabelecida, vezes clara (na maior parte das vezes e, por que não, em quase todo o texto), vezes velada (em alguns momentos), poderíamos assim afirmar. Ora ela transcreve trechos da fala de Bentinho, como vimos, e os contrapõe à sua voz; ora ela direciona o leitor a com ela concordar, sem necessariamente expor fala alguma, intentando, com isso, induzir o leitor a partilhar de seu drama, tal como no trecho: “[...] E você, se um dia amou como eu amei, desejou como eu desejei, vai certamente me entender” (PROENÇA FI-LHO, 1998, p. 14).

Quando ela age como nesse exemplo, conduzindo o leitor a acompa-nhar seu raciocínio e construindo uma “teia” discursiva que o induz a re-negar o relato de Bentinho, mas sem trazer para sua fala a ideia que rebate

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a sua afirmação, deixando subentendido, portanto, que quem dela discor-dar estará, automaticamente, concordando com a versão de Dom Casmur-ro, podemos concluir que está se criando uma “polêmica velada”, isto é, não expressamente aberta. É o que acontece, por exemplo, na construção discursiva daquele excerto no parágrafo anterior. Notemos a existência de duas vozes em oposição: a que compreenderá Capitu por compartilhar de experiência semelhante à dela e a que não a compreenderá pelo motivo contrário, estando, por conseguinte, do lado de Bentinho. Como a inten-ção da narradora é obter a “absolvição” do leitor, ela argumenta de forma que o convença, pois joga com a crença de que este já tenha passado por sensações tais como as dela.

Quando Capitu busca, entretanto, com a exposição da fala de seu ex-marido, questionar ou negar os apontamentos dele, afrontando-o e defendendo a sua posição, o que temos é chamado de “polêmica clara”. Vejamos um exemplo no excerto a seguir:

Bentinho vivia repetindo que sua mãe era boa criatura. Não era bem assim. D. Glória, apesar da aparente mansidão e da emotividade, era uma matriarca autoritária e dominadora. Um mérito lhe reco-nheço: era dona de uma personalidade forte. Provou-o, quando lhe morreu o marido, o Dr. Pedro de Albuquerque Santiago. Ela estava com trinta e um anos. Em pleno fulgor da maturidade. [...] Naquela conversa vespertina de 1857, já chegara aos seus quarenta e dois. Bo-nita ainda e ainda jovem, procurava, entretanto forçar o empenho da natureza e escondia “os saldos da beleza e da juventude” [...]. Fora re-almente muito bonita, verdade se diga. [...] Mas antes devo justificar a restrição do meu juízo: D. Glória era, de fato, autoritária. De um autoritarismo cercado de palavras mansas, mas fundadas em decisão que não admitia contestações. Era a senhora de classe dominante, capaz de tentar, como tentou, conduzir o destino do filho. Seus me-nores gestos sempre traziam segundas intenções [...]. (PROENÇA FILHO, 1998, p. 24-26).

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Nesse recorte, temos a réplica de Capitu à afirmação feita por Benti-nho em sua obra: “Minha mãe era boa criatura [...]” (ASSIS, 2008, p. 23). Ela discorda do ex-marido e ainda justifica sua opinião. Nessa passagem de Capitu – Memórias Póstumas, o que temos é um nítido exemplo de polêmica clara no diálogo entre os dois textos, com Capitu polemizando e discutindo a afirmação de Bentinho e apresentando críticas à sogra, em-bora concorde com o ex-marido em certos trechos, como, por exemplo, ao dizer que a mãe de Bentinho “[...] fora realmente muito bonita, verdade se diga [...]” (PROENÇA FILHO, 1998, p. 25), uma vez que é isso que consta na primeira obra. O interessante é observar que, claramente, o dis-curso de Capitu é moldado a partir do de Bentinho, mas é no de Capitu que os dois enunciados estão formalmente delimitados. O ponto de vista de Bentinho, como se pode notar em todo o decorrer do romance, serviu de “rotunda” às afirmações de Capitu.

Um desses nítidos momentos em que a fala de Bentinho serve de embasamento para o discurso de Capitu, estabelecendo-se, mais uma vez, uma polêmica clara, se encontra no final do romance. No entanto, em vez de transcrever a fala do ex-marido, a narradora diz “glosar” suas palavras, subvertendo, com ironia, o texto original, diluindo-o em seu discurso, criando, com isso, uma paródia. Para compreendermos como essa paródia acontece, vejamos, primeiramente, um trecho do último capítulo de Dom Casmurro, o qual será transformado no relato de Capitu:

[...] O resto é saber se a Capitu da Praia da Glória já estava dentro da de Matacavalos, ou se esta foi mudada naquela por feito de algum caso incidente. Jesus, filho de Sirac, se soubesse dos meus primeiros ciúmes, dir-me-ia, como no seu cap. 9, vers. I: “Não tenhas ciúmes de tua mulher para que ela não se meta a enganar-te com a malícia que aprender de ti”. Mas eu creio que não, e tu concordarás comigo; se te lembras bem da Capitu menina, hás de reconhecer que uma estava dentro da outra, como a fruta dentro da casca.E bem, qualquer que seja a solução, uma coisa fica, e é a suma das sumas, ou o resto dos restos, a saber, que a minha primeira amiga e o meu maior amigo, tão extremosos ambos e tão queridos também,

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quis o destino que acabassem juntando-se e enganando-me... A terra lhes seja leve! [...]. (ASSIS, 2008, p. 213).

Agora, acompanhemos um trecho do último capítulo de Capitu – Memórias Póstumas:

E, ao término deste meu relato, se você se lembra bem do Bentinho menino, há de concluir comigo – e gloso as palavras dele – que o fruto que estava dentro da casca era o Dr. Bento Santiago. Que a cas-murrice e a solidão lhe tenham sido leves. Faço minhas, por fim, as palavras do salmista e deixo-as à sua meditação: E as suas línguas per-deram a força, voltando-se contra eles mesmos. Todos os que os viam fi-caram assombrados. (Davi, salmo 63). (PROENÇA FILHO, 1998, p. 225, grifos do autor).

Analisemos: a intenção de Capitu no final de seu texto é, além de negar as injúrias feitas por Bentinho, ironizar o discurso dele, parodian-do o capítulo em que o esposo termina a sua narrativa. Ela subverte as conclusões de Bentinho e as transforma nas suas, propondo uma leitura diferente e contrária à do texto anterior. E isso não ocorre apenas nesse momento do intertexto, mas, sim, na obra em si, o que nos oferece o aval para podermos afirmar que Capitu – Memórias Póstumas é um exemplo de leitura na qual teríamos o que Sant’Anna (1985 apud BENTES, 2005) chama de “intertextualidade das diferenças” e o que Maingueneau (1976 apud BENTES, 2005) explica como fenômeno da “[...] subversão de um texto por outro”. Nesse sentido, se a intenção de Proença Filho (1998) tivesse sido criar uma confissão de Capitu, na qual toda a sua construção reafirmasse o conteúdo de Dom Casmurro e orientasse o leitor para uma conclusão parecida com a do texto retomado, teríamos o que Mainguene-au (1976) postula como fenômeno de “captação de um texto por outro” e o que Sant’Anna (1985 apud BENTES, 2005, p. 270-271) chama de “intertextualidade das semelhanças”.

A proposta da “intertextualidade das diferenças” está diretamente ligada à concepção de paródia, pois ela traduz, como vimos, a relação dia-

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lógica existente num texto novo que contradiz ou ironiza um texto antigo. Ora, é isso o que faz Proença Filho (1998) em todo o seu romance; portan-to, podemos afirmar que Capitu – Memórias Póstumas é uma paródia de Dom Casmurro. Sua intenção é a do contraste, o que significa que, obvia-mente, o intertexto conta com a prévia leitura do seu romance inspirador para que o leitor alcance uma compreensão completa da história. Sem que isso aconteça, não é possível que o leitor estabeleça a conexão necessária para que haja intertextualidade entre os dois romances, embora, com os recursos utilizados por Proença Filho (1998), de retomadas das passagens de Dom Casmurro, ele consiga alcançar um sentido lógico e cadente para o desenrolar do texto e o compreenda globalmente.

Não poderíamos afirmar, porém, que a ponte que une Capitu – Me-mórias Póstumas a Dom Casmurro seja a da estilização – outra forma de intertextualidade que, tal como a paródia, “imita” um texto anterior –, uma vez que esta não possui a intenção de negar nem de ironizar. Tal como explica Fiorin (2006, p. 43), na estilização, “[...] as vozes são convergentes na direção do sentido, as duas apresentam a mesma posição significante”, ou seja, a intenção, aqui, é a da reafirmação. Por esse motivo, não podemos deixar de mencionar que é notória a “imitação” que Proença Filho (1998) pretende fazer do estilo machadiano, reconhecido por sua ambiguidade e ironia, além do diálogo também estabelecido com outras obras, especial-mente com Memórias Póstumas de Brás Cubas, a qual serviu, também, de inspiração para a criação do título. É como afirma o próprio autor:

Na elaboração do texto das Memórias, tive sempre a preocupação de manter uma “atmosfera” machadiana. Nessa direção é que associei Capitu a outros personagens do Bruxo do Cosme Velho e às nar-rativas em que se inserem. A seleção de palavras e a construção dos diálogos tinham sempre como iluminação este procedimento. A re-ferência a Aurélia é uma homenagem a José de Alencar, o pioneiro criador dos perfis de mulher na nossa literatura. (GRUPO EDITO-RIAL RECORD, 2011).

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Desse modo, o que poderíamos supor, em um caso isolado, é que houve um processo de estilização no título Capitu – Memórias Póstumas, pois a intenção desse nome é apenas dialogar com dois textos de Macha-do de Assis, Dom Casmurro e Memórias Póstumas de Brás Cubas, sem a intenção de ironizá-los ou negá-los. O intuito é apenas informar o leitor, já de início, que, assim como Brás Cubas escreveu seu texto já depois de morto, Capitu o fez, havendo, portanto, uma convergência de sentido no entendimento do título, o que já implica, mais uma vez, o conhecimen-to prévio do leitor – se ele não tiver lido as Memórias Póstumas de Brás Cubas, não conseguirá estabelecer a conexão existente entre os dois textos. Porém, ainda assim, não poderíamos afirmar que há estilização entre Dom Casmurro e Capitu – Memórias Póstumas.

De uma maneira geral, podemos afirmar a ocorrência de intertextu-alidade entre Dom Casmurro e Capitu – Memórias Póstumas pelo simples fato de que essa obra não existiria sem aquela e, menos ainda, sem o pon-tapé inicial ofertado por Machado de Assis em sua construção misteriosa da incerta história de Bentinho, embora haja a crença veemente, por parte desse narrador “casmurro”, na traição de sua esposa e de seu melhor ami-go. A intertextualidade está declarada em todo o texto-fruto, em todos os seus capítulos, desde seu título até seu ponto final, e o mais interessante é conhecer esse outro lado da mesma história para conseguir-se formar um juízo a respeito da cigana oblíqua e dissimulada. Mas Proença Filho faz uma ressalva, a qual não pode ser esquecida por aqueles que se propõem à leitura de sua obra: “Essa é a minha perspectiva. Cabe a cada leitor con-cordar ou não com elas e chegar às suas próprias conclusões. Literatura é linguagem” (GRUPO EDITORIAL RECORD, 2011).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Capitu – Memórias Póstumas é a obra inaugural de uma coleção denominada À Sombra do Texto em Flor, título esse que já pressupõe a compreensão de que as obras nela incluídas foram derivadas de outros

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textos, o que não foi diferente com o romance que aqui analisamos. O que evidencia essa relação de “sombra” da narrativa de Machado de Assis (2008) para com o relato de Capitu criado por Proença Filho (1998) é, justamente, essa relação de subordinação, que, vale ressaltar, só existe de Capitu – Memórias Póstumas para Dom Casmurro, e nunca o contrário. Afinal, essa é a lei primeira para o estabelecimento de relações entre tex-tos, e, além disso, o autor das reminiscências de Capitu não teve a preten-são de equiparar-se a Machado de Assis. Seu propósito único é mostrar uma nova possibilidade de leitura para o drama de Bentinho, ofertando voz, como dissemos, à grande “vítima” da história: Capitu, dos olhos de ressaca (GRUPO EDITORIAL RECORD, 2011).

A análise que foi realizada neste trabalho procurou mostrar exata-mente isto: o grande acerto de Domício Proença Filho em ser justo com a famigerada personagem machadiana, oferecendo-lhe um direito de de-fesa, mesmo que post mortem, baseando-se nas entrelinhas deixadas por Bentinho em sua amarga narração. Para isso, utilizamo-nos de estudos e teorias referentes ao fator de análise textual que se encaixou perfeitamente no trabalho que procuramos fazer: a intertextualidade, que define o tipo de relação existente entre textos produzidos a partir de outro.

Com esse suporte, conseguimos confirmar a existência de intertex-tualidade entre os textos que escolhemos para serem examinados, porém a leitura dessa relação entre eles não deve se esgotar aqui. A discussão sobre o fenômeno que acontece nos diálogos entre os textos vai além do estudo que fizemos, e a nossa intenção foi apenas apontar possíveis explicações para a sua ocorrência em Capitu – Memórias Póstumas, a qual consegui-mos, com sucesso, realizar.

REFERÊNCIAS

ALEIXO, F. A coesão lexical no texto “Circuito Fechado”, de Ricardo Ramos. Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 1, n. 1, p. 113-133, jan./jun. 2011. Disponível em: <http://sm.claretiano.edu.br/upload/4/revistas/sumario/pdf/29.pdf>. Acesso em: 09 out. 2011.

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ASSIS, M. Dom casmurro. 6. ed. São Paulo: Martin Claret, 2008. (Coleção A obra-prima de cada autor).

BENTES, A. C. Lingüística textual. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A. C. (Orgs.). Introdução à lingüística: domínios e fronteiras. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2005. v. 1.

FÁVERO, L. L.; KOCH, I. G. V. Lingüística textual: introdução. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1988.

FIORIN, J. L. Introdução ao pensamento de Bakhtin. São Paulo: Ática, 2006.

FIORIN, J. L.; SAVIOLI, F. P. Para entender o texto: leitura e redação. 17. ed. São Paulo: Ática, 2007.

GRUPO EDITORIAL RECORD. Entrevista: Capitu – memórias póstumas. Disponível em: <http://www.record.com.br/autor_entrevista.asp?id_autor=3996&id_entrevista=188>. Acesso em: 20 set. 2011.

PROENÇA FILHO, D. Capitu – memórias póstumas. Rio de Janeiro: Artium, 1998. (Coleção À sombra do texto em flor).

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Title: Intertextual relations between Dom Casmurro, by Machado de Assis”, and Capitu – Memórias Póstumas, by Domício Proença Filho.Author: Vanessa Vergani Machado.

ABSTRACT: In this article, we aimed to see, basing on especially the studies of Bentes (in MUSSALIM; BENTES, 2008) and Fiorin (2006), the intertextual relations in the works of Dom Casmurro, by Machado de Assis, and Capitu – Memórias Póstumas, by Domício Proença Filho. The novel of Proença Filho was prepared from the story in Dom Casmurro, in which there is a unilateral narration by Bentinho about the great uncertainty of his life: the betrayral of his wife, Capitu, and his best friend, Escobar, which he supposes to be true. What’s in Capitu – Memórias Póstumas is the self-defensive version of the accused wife, who argues in his posthumous outburst against the points raised by the husband in the original text by Machado de Assis. The concentration of this study is in these points, and, through the theories have been used here, it was possible to establish a discordant dialog between them and, therefore, between two novels.Keywords: Dom Casmurro. Capitu – Memórias Póstumas. Intertextuality.

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54 Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 3, n. 1, p. 31-53, jan./jun. 2013