QUALIFICAÇÃO DA COMUNICAÇÃO NO DESENHO À MÃO LIVRE
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QUALIFICAÇÃO DA COMUNICAÇÃO NO DESENHO À
MÃO LIVRE
Glauco Assumpção Pachalski UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Orientador: Airton Cattani UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Departamento de Expressão Gráfica [email protected]
RESUMO
Este trabalho apresenta alguns resultados obtidos em curso de desenho à mão
livre voltado para representação arquitetônica. É feita uma comparação entre os
resultados iniciais e finais. A carência de bases teóricas, que poderiam auxiliar no
aprendizado daqueles que apresentam maior dificuldade, reforça a crença do
desenho como uma habilidade muito difícil de ser adquirida. Os centros de ensino,
em sua maioria, não oferecem de maneira sistemática e ampla, os fundamentos
que permitem conhecer a linguagem do desenho (GOMES, 1996). Este artigo
apresenta alguns tópicos referentes à metodologia de ensino desenvolvida para
um curso de desenho. Resultado de pesquisas, estudos teóricos e exercícios
práticos desenvolvidos e testados em dezessete edições realizadas, a proposta do
curso é apresentar uma base de informações práticas que permita avanços
significativos no processo de realização do desenho além de permitir ao aluno ou
profissional de arquitetura desenvolver e apresentar projetos. São abordados dois
procedimentos práticos sobre o processo de abstração e a transmissão da
mensagem no desenho à mão livre, um dos objetivos do desenho de arquitetura.
Palavras-chave: desenho à mão livre, metodologia, abstração.
ABSTRACT
This article presents the results of seventeen free-hand drawing courses for
architectural purposes delivered between 2003 and 2007, and observations of
changes in drawing and presentation skills pre and post course. The majority of
teaching faculties no longer offer the foundation of architectural drawing in a
systematic, broad and unrestricted manner that allows student ‘’to get to know the
language of drawing’’ (GOMES, 1996). The lack of theoretical grounding, to help
those students who have the greatest difficulties, tends to reinforce the common
assumption that drawing is a skill that is very difficult to acquire. This article
presents a number of topics related to methodologies developed for the
architectural drawing course. It is the result of theoretical research and practical
exercises developed and tested in the seventeen courses administered. The
course aims to present a palpable base of information that allows students to make
significant advances in drawing, and helps students and professional architects to
develop and present architectural projects. We will present two practical
procedures, based on theoretical study of the process of abstraction and
transmission of messages through free drawing, which is one of the objectives of
architectural drawing.
Key words : free-hand drawing, methodology, abstraction.
1 Introdução
Atualmente na 17° edição, o curso de desenho Olho Mágico vem sendo realizado regularmente
para estudantes e profissionais de arquitetura e design. Desde sua primeira edição em 2003,
foi realizado em diversas Universidades como curso de extensão e em entidades de classe.
Normalmente com carga horária de dezoito horas, também foi ministrado em versões mais
curtas, como nas Semanas Acadêmicas das faculdades de arquitetura da UFRGS, UFSM e
PUC-RS. Oficinas de três horas também foram realizadas nos encontros nacionais e regionais
de estudantes, nas cidades de São Paulo, Ouro Preto e Brasília. A última edição, em 2007, foi
realizada na UNIFRA, em Santa Maria. Também conta com o apoio do IAB-RS, local onde foi
realizado com mais freqüência. Cerca de 400 pessoas participaram das diversas edições do
curso. Este artigo apresenta as principais referências e procedimentos práticos adotados no
curso, além de resultados obtidos por alguns participantes que validam a metodologia adotada.
2 Referências
Ainda que alguns autores defendam que a “aptidão para a representação gráfica através da
linguagem do desenho parece mesmo ser intrínseca, ou seja, todos nós a possuímos ao
nascer” (GOMES, 1996), o processo de realização do croqui arquitetônico é visto erroneamente
como uma tarefa que necessita talento inato.
EDWARDS afirma que “a capacidade para o desenho sempre foi considerada difícil de
adquirir e quase sempre recebia o fardo adicional de ser uma habilidade incomum e não
comum” (2004).
A contradição acima deve ser esclarecida aos alunos para reduzir a barreira inicial e
conseguir bons resultados nos desenhos. O aluno que apresenta uma série de dificuldades e
seus resultados são considerados insatisfatórios se sente inibido ao escutar que todos
nascemos com a habilidade para desenhar. A redução da autoconfiança é mais um reforço a
favor da incapacidade de se desenvolver habilidade para o desenho.
Conceitos importantes para o desenho muitas vezes não são discutidos. A carência de
bases teóricas, que poderiam auxiliar no aprendizado, reforçam uma visão predominantemente
intuitiva. Sobre os centros de ensino, GOMES comenta: “em sua maioria, não se encontram
organizados e estruturados em termos de recursos humanos, ambientais e materiais para
oferecer, de maneira sistemática ampla e irrestrita, os fundamentos que permitem conhecer o
poder de transformação que tem a linguagem do desenho” (1996).
DONDIS escreve ainda que “o exame dos sistemas de educação revela que o
desenvolvimento de métodos construtivos de aprendizagem visual são ignorados, a não ser no
caso de alunos especialmente interessados e talentosos” (1997).
Valoriza-se os alunos que apresentam maior facilidade, reforçando a idéia da incapacidade
de se desenvolver a habilidade para aqueles que têm menor facilidade. Bases teóricas
consolidadas associadas a exercícios ampliam o horizonte dos alunos.
Avaliações realizadas pelos alunos ao final de cada curso indicam que eles se sentiam
inicialmente com poucos conhecimentos sobre desenho. Este dado também se verificou nas
avaliações feitas por alunos que estão no final da graduação ou que já eram formados. Quanto
questionados sobre o que mais gostaram no curso uma das respostas mais freqüentes foi à
carga teórica apresentada. Segundo eles, as discussões realizadas ampliaram os
conhecimentos, contribuíram para a realização dos exercícios propostos e ajudaram a superar
algumas dificuldades.
Este trabalho irá abordar como a capacidade de abstração, a seleção das informações e a
reflexão sobre os artifícios gráficos criados para representá-las podem contribuir para superar
algumas dificuldades apontadas por grande parte dos alunos que realizaram o curso. Na
comunicação visual o conteúdo nunca está dissociado da forma (DONDIS, 1997).
A percepção visual, igualmente fundamental dentro da teoria do desenho, também deve ser
qualificada. No entanto, em função do foco deste artigo, não será abordado de forma
abrangente. Apesar da abstração e percepção serem processos mentais associados, eles
podem ser analisados separadamente em dois fundamentos. A divisão didática busca facilitar o
aprendizado.
Embora o desenho de arquitetura normalmente esteja mais próximo das artes aplicadas
que da belas artes (DONDIS, 1997), foram utilizados neste trabalho algumas idéias referentes
mais diretamente ao campo da teoria da arte, principalmente devido às escassas publicações
sobre ensino e aprendizagem no campo do desenho de arquitetura. Uma breve análise das
publicações nas principais universidades federal do país indica uma ampla abordagem sobre
temas como perspectiva e desenho técnico. Este trabalho defende que embora esses sejam
assuntos de grande importância, não são suficientes para permitir ao aluno avançar de forma
significativa no processo de desenvolvimento de suas habilidades de desenho à mão livre.
3 Níveis de abstração
No desenho de arquitetura onde a transmissão da informação arquitetônica é um dos
elementos primordiais, a capacidade de comunicação é um elemento fundamental. Este
trabalho considera o manejo das informações como um fundamento. Além da escolha de quais
informações serão representadas dentro dos objetivos desejados, os artifícios para representá-
las graficamente e a relação que se estabelece entre emissor e receptor na transmissão da
mensagem são pontos que merecem ser estudados.
O desenhista utiliza sua capacidade de abstração em diversas etapas do trabalho. Este
artigo aborda algumas delas. A primeira ocorre no processo de reconhecimento das
características do objeto. Captar “a semelhança estrutural entre uma coisa e qualquer
representação dela é, contudo uma enorme proeza de abstração” (ARNHEIM, 2005). Abstração
segundo o Dicionário Aurélio séc. XXI significa: “ato de separar mentalmente um ou mais
elementos de uma totalidade complexa”. Após esse processo de separação das partes o
desenhista passa por uma segunda dificuldade: a escolha, igualmente complexa, de quais
dessas características serão utilizadas na representação do objeto.
Considerando a visão como uma captação ativa, ou seja, o observador participa da
captação das informações do ambiente e a representação desse ambiente não como uma
representação mecânica da realidade (ARNHEIM, 2005), o desenho passa necessariamente
por escolhas. Essas escolhas influenciam a informação que será transmitida por meio do
desenho. O aluno após “decodificar” o objeto em partes deve saber codificá-lo novamente para
representá-lo, utilizando as partes que julgue mais importante dentro dos objetivos pretendidos.
Este raciocínio ainda que simplificado, tem se mostrado útil para aqueles em que a intuição não
permite, por si só, avanços significativos no aprendizado da representação.
Além das características essenciais, outras informações do objeto são passiveis de serem
selecionadas. A escolha depende de uma série de condicionantes: os objetivos do desenhista,
sua capacidade perceptiva, o contexto que está inserido e a sua capacidade de representação.
Depende também do uso que será dado ao desenho e das características do receptor da
mensagem. A escala do desenho também influencia as escolhas. A representação de um
objeto visto de longe terá uma série de características abstraídas em comparação ao mesmo
objeto visto de perto. O fundamento da abstração está intimamente relacionado com a
percepção, pois a observação atenta e qualificada das características do objeto indica uma
série de respostas a essas escolhas.
Considerando o croqui como um esboço, a capacidade abstração é ainda mais marcante.
Esse tipo de desenho, esquemático, sintético e rápido, objetivo de muitos alunos e profissionais
de arquitetura, exige bom domínio sobre o manejo das informações e boa capacidade de
síntese. Caso contrário, se torna ineficiente na transmissão das informações. Os exercícios
propostos nas disciplinas de desenho muitas vezes propõem apenas reduzir o tempo para
realizá-los ao invés de usar informações teóricas como parâmetro de auxílio. O resultado é
arbitrário com relação aos elementos ou partes desenhadas e a eficiência na transmissão da
mensagem é insatisfatória.
O desenho de arquitetura, embora possa e deva ter um apelo sensorial, possui
características de uma ilustração técnica. ARNHEIM escreve: uma “Ilustração técnica deve dar
proporções e ângulos exatos, estabelecer a concavidade ou convexidade uma parte, e
distinguir entre unidades (...) Isso significa não apenas que a melhor ilustração é aquela que
omite detalhes desnecessários e escolhe características reveladoras, mas também que os
fatos relevantes devem ser comunicados aos olhos sem ambigüidade” (2005). O autor ainda
coloca: “e uma vez que produzir a semelhança significa nada mais do que evidenciar os traços
relevantes, não é de se estranhar que o desenhista deva entender quais são estes traços” e
concluí: “pode-se com freqüência conseguir melhor a finalidade afastando-se marcadamente da
aparência ‘fotográfica’” (2005). DONDIS, sobre esse mesmo assunto, escreve: “o resultado
pode ser um maior envolvimento do receptor na captação da informação, facilitando a
transmissão da informação quando o processo de abstração deixe de lado os detalhes
irrelevantes e enfatize os traços distintivos (1997).
Insinuar e fazer o desenho “vir” à mente do receptor são ferramentas poderosas que podem
também auxiliar e facilitar a construção do desenho. Na arquitetura e design constantemente a
representação dos calungas, veículos e outros elementos da ambientação são realizados com
um grau elevado de abstração, utilizando apenas as linhas essenciais para reconhecer o
objeto. A “estratégia” pode ser utilizada também para as partes mais complicadas do ambiente
ou objeto a ser desenhado, caso o estágio de desenvolvimento das habilidades do desenhista
ainda não permitam ou não seja de primeira importância representá-las. O desenhista pode
complementar o desenho e incluir a informação não representada com outros desenhos. Evitar
um desenho infantil e insuficientemente semelhante ao objeto real é um objetivo que o aluno
deve buscar.
O desenhista também usará sua capacidade de abstração quando for representar as
informações selecionadas. O desenho, de maneira simplificada, é um conjunto de artifícios
gráficos que são criados para convencer o observador que a representação do objeto se
assemelha à realidade. Segundo ARNHEIM, “parece seguro afirmar que todas as grandes
obras de arte, não importa o qual estilizadas ou remotas da exatidão mecânica, comunicam o
sabor pleno do objetivo que representam” (2005). O autor reforça sua idéia citando uma frase
dita por Picasso em 1966: “meu objetivo é a semelhança”. Picasso declarou ainda que um
artista deve observar a natureza mais nunca confundi-la com a pintura. “Ela só pode ser
traduzida em pintura através de signos”. Seguindo esse caminho, o desenhista aprendiz deve
saber como usar esses artifícios para atingir seus objetivos. Saber insinuar os elementos por
meio desse artifício permite fazer vir à mente do observador a informação desejada. Citando
Picasso mais uma vez: a “arte é uma mentira que nos faz compreender a verdade”. A verdade
no desenho não existe, uma vez que o desenho é apenas uma representação. No entanto, na
percepção de quem olha esses artifícios gráficos se estabelece uma correspondência entre de
realidade e sua representação. A verdade pode ser entendida como a semelhança entre objeto
e sua representação. A semelhança baseia-se “não numa identidade meticulosa, mas na
correspondência das características estruturais essenciais” (ARNHEIM, 2005). Baseia-se
também na mente e no contexto do observador.
4 Desenvolvimento do Curso
O desenho abaixo (Fig. 1), feito a partir da observação de foto do teatro do Sesc Pompéia, da
arquiteta Lina Bo Bardi (Fig. 2) tenta ilustrar isso. A perspectiva não foi a principal dificuldade
indicada pelos alunos que realizaram o curso. Aqueles que minimamente entendem a técnica
construtiva do desenho com um ponto de fuga, normalmente são capazes de construir as
linhas que configuram tal espaço. A dificuldade indicada por eles se encontra na capacidade de
se representar de forma qualificada e eficiente as treliças que sustentam a cobertura, o telhado
composto por diversos elementos e a textura dos materiais das paredes.
Figura 1: desenho inicial de Roberto A. Figura 2: Sesc Pompéia, Arq. Lina Bo Bardi.
Foram analisados alguns desenhos feitos no início do curso, comparados com os feitos
ao final Os desenhos de um dos alunos são apresentados a seguir (Fig. 3 e 4):
Figura 3: desenho inicial de Gabriel A. Figura 4: desenho final de Gabriel A.
4.1 Infantilidade
As histórias de quadrinhos e as caricaturas apresentam deformações propositadas das formas,
causando ao observador efeito de irreverência, jogo e humor. As deformações não intencionais
podem prejudicar a qualidade. No âmbito da arquitetura existe uma tendência a desvalorizar os
desenhos infantilizados. A semelhança entre o objeto e sua representação é uma característica
que se manifesta na maioria dos desenhos vinculados aos trabalhos profissionais.
O leque de possibilidades e de características do desenho é infinita e não se pretende
neste trabalho “apresentar fórmulas ocas ou simplificações”, como alerta OSTROWER (2003).
Muito menos limitar o ato criador ou restringir a expressão individual (preocupação dos
profissionais do ensino da arte). O propósito deste trabalho é qualificar o repertório do aluno,
através de discussões, análises e exercícios.
4.2 Uso de símbolos desqualificados
Os símbolos infantis ou que não se assemelham ao objeto representado aparecem nos
desenhos e prejudicam a qualidade. GOMES (1996) coloca: aqueles “que não tiveram a
oportunidade de cultivar a habilidade inerente do desenho tendem a sentir-se inibidas diante
daquela forma de expressão que ficou atrofiada em relação à linguagem verbal”. Os símbolos
infantis aparecem quando os fundamentos perceptivos ainda não estão sendo utilizados de
maneira eficiente. Dentro da metodologia deste trabalho, a dificuldade com o fundamento
capacidade de abstração que será discutido a seguir também contribuí negativamente.
4.3 Primeiro procedimento prático: exercício ”análise da forma e mensagem”
O desenhista deve identificar, como primeiro passo, as suas intenções, capacidades, objetivos
e necessidades envolvidas na representação desejada das informações. Igualmente importante
é a escala do desenho, a percepção visual dos objetos envolvidos e a hierarquia das
características desejadas. O objetivo é contribuir na escolha dos traços relevantes e treinar os
efeitos gerados por essas escolhas na percepção do receptor da mensagem.
Analisar as características de um objeto, neste exemplo o edifício do Masp, da arquiteta
Lina Bo Bardi, tem se mostrado bastante útil. Mesmo que se conheça o edifício, a análise da
forma, configuração, materiais, texturas, elementos construtivos entre outros, familiariza o
desenhista com as informações importantes para o desenho do objeto. Conhecimentos
técnicos ajudam na busca pela captação das características que estruturam a forma.
Os alunos sobrepõem um papel manteiga sobre uma foto do edifício (figura 5) e copiam
aquelas partes que escolheram. È interessante restringir o número de linhas para “forçar” o
aluno a não “gastar linhas” que não sejam realmente essenciais. Riscando sobre o papel
manteiga as partes escolhidas os alunos testam as escolhas e verificam se ao retirar a foto de
baixo, o desenho permite que o observador ainda reconheça as informações desejadas. Caso
contrário, o que normalmente ocorre, uma nova tentativa é feita. Normalmente as linhas
escolhidas são destinadas a elementos secundários quanto aos objetivos estabelecidos. Nesse
caso é iniciada uma segunda discussão sobre como se apresentam as características
desejadas, como as percebemos na foto e formas de induzir o receptor a compreender essas
informações sem necessariamente desenhar todos os elementos ou detalhes fazendo uso dos
conceitos da Gestalt.
È interessante também agrupar as informações em uma escala de importância. A
hierarquia estabelece assim grupos de elementos. Essa tarefa mostrou-se bastante difícil para
os alunos que apresentam dificuldade de síntese. Propor para os alunos responder a pergunta
“o que você é em cinco palavras” talvez ajude o aluno a entender que independente do número
de itens, alguns podem ser identificados como mais essenciais.
O segundo passo é discutir qual ou quais grupos, dentro de um leque de possibilidades
possíveis, são essenciais ao entendimento do objeto. O tipo de receptor que vai perceber a
imagem também influencia no processo e deve ser levado em conta nas escolhas. Volta-se a
discussão a frase dita por Picasso. Assim como acontece em todos os desenhos, sejam eles
bem detalhados ou esquemáticos, o desenho é um artifício, ou “mentira” que faz o receptor
compreender a mensagem, ou “verdade” como escreveu Picasso. O aluno deve buscar
desenvolver maneiras de criar esses artifícios gráficos que permitam identificar as informações
desejadas.
O resultado obtido permite aprimorar a capacidade de síntese dentro da linguagem das
formas. O objetivo do exercício é a transmissão das características prioritárias do edifício (Fig 6
e 7). Em uma discussão com o grupo, foi decidido que tais características seriam: volumetria,
estrutura construtiva, entorno, escala e inserção no solo.
Figura 5: Masp, São Paulo. Arq. Lina Bo Bardi
Figura 6: desenho inicial de Lucas B. Figura 7: desenho final de Lucas B.
O procedimento mostrou-se útil também para resolver a dificuldade de como começar o
desenho. Ainda que o desenho não tenha um início determinado, via de regra, parece ser
interessante ao menos dominar quais elementos ou informações visuais são mais importantes
dentro do objetivo estabelecido.
4.4 Segundo procedimento prático: “esqueleto estrutural da forma”
O objetivo é captar e incorporar ao desenho o “esqueleto” compositivo que ordena a forma
observada na busca das características essenciais do objeto. Esses conhecimentos contribuem
na busca pela semelhança estrutural que permite identificar o objeto com sua forma
representada. O primeiro passo é identificar previamente a estrutura que organiza a forma e
desenhar os eixos de construção que se estabelecem, seguindo uma lógica formal que se
aproxima mais da forma real e permite que o receptor reconheça e perceba melhor a imagem,
contribuindo assim para um melhor resultado na transmissão da mensagem. O segundo passo
é escolher um segmento do eixo como uma unidade básica de referência. Esta unidade servirá
de parâmetro de proporção e para a composição das demais partes que compõem o desenho.
Uma vez estabelecido esse eixo de parâmetro, as linhas paralelas, perpendiculares e obliquas
podem ser desenhadas mais facilmente.
A terceira etapa consiste em construir uma caixa ao redor do eixo de referência que possua
proporções semelhantes ao objeto observado (Fig. 8). Como o procedimento que facilita
aprimorar a percepção visual ainda não foi apresentado, por uma divisão didática neste
trabalho, o exercício ainda pode gerar dificuldades para o aluno encontrar essas proporções
(fig. 9 e 10). Mas o objetivo aqui é organizar o desenho de acordo com a ordem compositiva
que determinou a forma. Esse procedimento pode ser utilizado para formas não simétricas,
uma vez que é possível fazer uma equivalência construtiva.
Figura 8: Edifício da Rádio da UFRGS, Porto Alegre.
Figura 9: Desenho inicial de Larissa G. Figura 10: Desenho final de Larissa G.
5 Considerações Finais
Os resultados apresentados neste artigo mostram avanços significativos nas habilidades para o
desenho dos alunos após a participação no curso, cujo objetivo é contribuir para que o mais
antigo modo de expressão gráfica humana (GOMES, 1996) seja mais utilizado pelo aluno ou
profissional de arquitetura e design para desenvolver e apresentar projetos. A discussão teórica
contribuiu para dissipar as incertezas acerca das possibilidades de avanço na qualificação das
habilidades de desenho. “O delicado equilíbrio de todas as potencialidades de uma pessoa –
que lhe permite viver plenamente e trabalhar bem – é perturbado não apenas quando o
intelecto se choca com a intuição, mas igualmente quando a sensação expulsa a razão. O
tatear na incerteza é tão improdutivo quanto a cega obediência às regras” (ARNHEIM, 2005).
Agradecimentos
Agradeço o professor Airton Cattani, que além dos conhecimentos sobre ensino e pesquisa de
desenho, auxiliou na transformação do texto original em um artigo acadêmico. Fico igualmente
grato aos alunos que cederam seus desenhos para este artigo.
Agradeço também a Flávio Pachalski pela edição e correção ortográfica e a Alison Sutton pela
tradução para língua Inglesa.
Referências
[1] ARNHEIM, Rudolf. Arte e percepção Visual: uma psicologia da visão criadora: nova versão.
São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.
[2] DICIONÁRIO Aurélio Século XXI (Eletrônico), Versão 3, 1999.
[3] DONDIS, Donis A. Sintaxe da linguagem visual. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
[4] EDWARDS, Betty. Desenhando com o lado direito do cérebro. Edição revisada e ampliada.
Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.
[5] GOMES, Luiz Vidal Negreiros. Desenhismo. 2ª ed. Santa Maria: Ed. da Universidade
Federal de Santa Maria, 1996.
[6] GOMES, Luiz Vidal Negreiros & STEINER, Ana Amélia. Debuxo. Santa Maria: Ed. da
Universidade Federal de Santa Maria, 1997.
[7] OSTROWER, Fayga. Universos da arte. São Paulo: Ed. Campus, 2003.