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Cachoeira – Bahia – Brasil, 21, 22 e 23 nov/2018 www3.ufrb.edu.br/eventos/4congressoculturas
Práticas de sororidade em redes sociais da atualidade: uma proposição de
etnografia digital
MIGLIANO, Milene1
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Brasil, < [email protected] >
Resumo: Após as investigações do doutorado, sobre a potência narrativa na criação de outros
imaginários políticos entre os movimentos de contestação urbana e as redes sociais digitais, percebi
a conformação e manutenção de diversas outras redes de consumos e práticas imaginárias, nas
plataformas de sociabilidade online. Entre elas, as redes que se articulam em torno das narrativas
das práticas de sororidade atualizadas na contemporaneidade, nas liminaridades da vida urbana e
outros espaços de produção simbólica, como a agricultura urbana, a astrologia, a auto-ginecologia,
entre outras nas quais relações entre mulheres são vivenciadas na virtualidade das redes sociais.
Compreendo como práticas de sororidade, modos de operar que acionam irmandades possíveis
entre mulheres – para além da concepção binária de gênero, superando a contenção do imaginário
político que oprime as mulheres como o patriarcado, o racismo, as relações coronelistas e as
opressões coloniais, bem como as relações trabalhistas do capitalismo avançado.
Palavras-chave: Liminaridades, fragmentos de narrativas; sororidade; etnografia digital; experiência.
Na atualidade contemporânea os modos de narrar vem sendo afetados pelas novas maneiras
de compartilhar fragmentos e sentidos. As redes sociais digitais tem sido um dos dispositivos que
vem mais do que contribuindo para as transformações nos modos de compartilhar experiências as
mais diversas, das que comumente tem lugar de fala privilegiado na esfera pública comunicativa.
Nesse sentido, as práticas de sororidade relacionadas – em diversos grupos secretos no facebook,
mas também em perfis públicos, que agenciam consumos - buscam superar a competitividade entre
mulheres, redescobrir as sabedorias ancestrais das ervas, afetar as mulheres em redes que
potencializam os sentimentos de autonomia, liberdade e ampliação de possibilidades, muitas vezes
apagados desde a inquisição da igreja católica no mundo ocidental, a colonização européia em
diversos continentes do mundo, que arruinaram comunidades inteiras de povos originários. A
proposta deste texto é apresentar brevemente o projeto de pós-doutoramento no qual realizarei uma
etnografia digital que propõem a implicação de meu corpo na investigação possível, considerando
as programações algorítmicas que exercerão controle sobre o que estarei acessando enquanto
pesquisadora. A investigação parte do acompanhamento do perfil danzamedicina no instagram, com
mais de 49 mil seguidoras, perfil no facebook com mais de 30 mil seguidoras e site próprio, no
1 Professora do Centro de Artes, Humanidades e Letras da UFRB, Membro do Grupo de Estudos em Experiência,
Estética, Comunicação e Audiovisual da UFRB, Doutora em Arquitetura e Urbanismo pela UFBA, Mestre em
Comunicação e Sociabilidade Contemporânea pela UFMG, graduada em Comunicação Social pela UFMG.
endereço http://www.danzamedicina.net/. A pesquisa buscará por meio do acompanhamento das
postagens referendar as possibilidades de resistências que imaginam, fabulam e consomem modos
de ser e estar mulher em práticas compartilhadas na atualidade digital.
É sabido que os modos de viver e de se comunicar sofreram transformações em relação aos
lugares de enunciação e aos espaços de posicionamento político, desde a primeira facilitação das
interfaces comunicacionais de computadores conectados em rede. Tal conexão possibilitou a
publicização de diversas narrativas que antes eram invisibilizadas, controladas e/ou estigmatizadas,
tendo sua comunicação dificultada no cotidiano social. As mudanças nos modos de narrar2
(BENJAMIN, [1929] 2013), proporcionadas desde a emergência das então chamadas novas
tecnologias de informação e comunicação vem sendo investigadas3 (ROCHA, ALVES, MAILINI,
RECUERO, LEMOS, SILVA, BRETAS, CANCLINI, AMARAL et alli), atualizando a necessidade
de se construir um pensamento crítico vigoroso em relação a elas. Em estudos recentes
(MIGLIANO, 2017) pude constatar que é possível superar a “contenção do imaginário político”
(RIBEIRO, 2011)4 por meio de alguns usos e apropriações das tecnologias de comunicação e
informação em redes sociais digitais. Isto pode ser observado em situações nas quais a mobilização
política agenciava periodicamente encontros entre os participantes da contestação urbana “Praia da
Estação”, em Belo Horizonte (MG), em um espaço público. Mas e se as condições de interação
2 No texto “Livros que permanecem vivos” ([1929] 2013), Benjamin afirma que “toda descoberta científica implica por
si só, mesmo sem pretende-lo, uma revolução procedimental” (p.125), ou seja, quando há uma transformação
técnica na sociedade os modos de narrar consequentemente também são transformados.
3 Rocha tem investigado as expressividades políticas dos movimentos juvenis da atualidade que “mesclam ação política,
linguagens estéticas e uma forte base comunicacional e tecnológica” (ROCHA, 2016) bem como a (des)possessão
como chave de análise para questões ligadas ao consumo e capitalismo nos fluxos midiáticos contemporâneos
(ROCHA, 2018); Alves (2017) (https://www.marceloalves.org/) tem trabalhado com a mineração de dados por meio
de coleta de informações protocolares, produzindo percepções e reflexões sobre as opiniões brasileiras; Mailini
(2013) tem investigado as disputas políticas entre a internet e a vida pública, produzindo gráficos de alta
complexidade que nos levam a compreensões de outra ordem destas situações comunicativas; Recuero (2009), das
pioneiras nos estudos metodológicos de apreensão das relações na internet, pesquisa atualmente as conversações em
rede; Lemos (2008) busca compreender os novos modos de vida da contemporaneidade, desde o surgimento das
mídias móveis até as articulações com séries de televisão recentes. Silva (2014) tem investigado as relações entre os
tempos e as imagens das diversidades nas novas formas de se fazer presente. Bretas enfrentou dilemas na
formulação do campo de investigação no Brasil, percebendo já o caráter híbrido, diria múltiplo, entre, como pensa
Canclini, um espaço de produção intercultural que se faz entre as desigualdades, desconexões e diferenças sociais,
culturais e sócio-técnicas. Amaral et alli (2015) retomam a perspectiva da re(a)presentação em Polivanov,
compreendendo-a mais adequada do que representação, para abordar a produção de sentidos sobre subculturas no
ciberespaço, considerando as oportunidades de auto-definição das singularidades nas apresentações sendo refeitas.
4 Ribeiro diz que há uma espécie de contenção do imaginário político, que poderia vir a ser superado diante dos modos
de usar o que se tem à mão “O que é a visibilidade hoje, o que é conquistar o espaço público hoje, o que é você
virar notícia hoje, o que é você virar, de alguma maneira, um sujeito reconhecido, ou ator político reconhecido? As
ferramentas desse reconhecimento têm que ser muito amplas e acontecer de maneiras muito mais criativas. Então os
locus da criação são mobilizados e mobilizáveis pela ação política e vice-versa. Você vê que a criação política
também penetra na própria criação das artes. Há uma hibridação que diz respeito, no meu modo de ver, à
instauração de um mundo onde a comunicação é cada vez mais sofisticada, e também um território de disputa. Daí
a aproximação em várias áreas: a arte e a política, a experiência urbana e a técnica, tudo isso caminha junto.” (2011,
s/p)
forem quase restritas aos encontros estabelecidos na mediação tecnológica, como os que temos
observado em grupos de mulheres em busca de trocas pelas plataformas das redes sociais digitais,
como as emergentes pelo perfil danzamedicina?5 No projeto de pós-doutoramento busco
compreender como se dá a re(a)presentação (AMARAL et alli, 2015) de imagens e imaginários a
respeito da sororidade entre mulheres, conectadas em redes sociais, na atualidade. Quais
imaginários são acessados, apresentados e conectados nestas redes de interações urbanas virtuais
compondo a ideia de um outro modo (que não se funde na rivalidade e competição) de relações
entre as mulheres? Será que a transformação das práticas é proporcionada por meio das interações
que daí se originam, para as mulheres que se envolvem nestes6 ambientes de consumo, produção e
transformação de imaginários no ciberespaço?
Quando digo mulheres, amplio a compreensão da categoria para além da binaridade de
gênero (BUTLER, 1990) considerando todas as que assim se designarem, já que entendo “gênero
como uma representação que constitui performativamente a aparência de sua própria fixidez
interior” (BUTLER, 1990, p.107). Também posso considerá-las como as que venham a sofrer
“sexismo, exploração sexista ou opressão” (hooks7, [2000] 2017), causas e combates da luta
feminista. bell hooks afirma ainda a importância da luta feminista levar em consideração o
feminismo negro e as categorias de classe e gênero compondo a problemática interseccional8. Em
“A irmandade ainda é poderosa”, terceiro capítulo do livro Feminismo é para todos (2000), a
autora tematiza a questão da solidariedade entre mulheres contra as opressões capitalistas,
5 Encontrado em www.danzamedicina.net, em inglês e português e nos perfis das redes sociais facebbok e instagram,
em português.
6 Proponho a investigação para o perfil danzamedicina que se define como em busca da cura por meio da dança, do
reconhecimento da ancestralidade e da mulher selvagem, com atividades gratuitas e comercializadas. No instagram
conta com mais de 51mil seguidores e no facebook, mais de 30 mil. a pesquisa também acompanhará alguns grupos
secretos entre o facebook e o whatsapp, como o “Auto-ginecologia e dicas naturais”, (feminista, secreto, no
facebook, conta com uma imagem de capa de sangue menstrual sendo vertido na água corrente na natureza), o
“Juntas geramos renda” (feminista, secreto, no facebook, conta com uma ilustração na imagem de capa de duas
mulheres, mostrando os braços fortes), bem como outros perfis do instagram, como o “curandeirasdesi”, que se
auto-identifica como “serviço de saúde alternativo e holístico” e conta com 39 mil seguidores, de modo a ampliar o
escopo de observação da ideia de sororidade nas redes sociais articuladas online, considerando as bolhas
algorítimicas (PARISER, 2012) promovidas pela minha usabilidade das redes da internet.
7 Por considerar que o que escreve é mais importante do que seu nome, bell hooks solicita que nas citações de seus
textos seu nome seja grafado com letra minúscula. Tal transcriação subversiva de identificação já é considerada
nesta investigação como um fragmento de narrativa de sororidade.
8 “Entendemos que a solidariedade política entre as mulheres expressadas em irmandade vai além do reconhecimento
positivo das experiências das mulheres e até mesmo a simpatia compartilhada pelo sofrimento comum. A irmandade
feminista está enraizada no compromisso compartilhado de lutar contra a injustiça patriarcal, independentemente da
forma que a injustiça toma. A solidariedade política entre as mulheres sempre enfraquece o sexismo e prepara o
cenário para derrubar o patriarcado. Significativamente, a irmandade nunca poderia ter sido possível em todos os
limites da raça e classe, se as mulheres individuais não estivessem dispostas a alienar seu poder de dominar e
explorar grupos subordinados de mulheres.” https://medium.com/qg-feminista/cap%C3%ADtulo-3-de-feminismo-
%C3%A9-para-todos-de-bell-hooks-bd8f90741594 .
considerando as experiências diversas de mulheres negras, de diferentes classes sociais, de
diferentes condições de existência; acrescento, diversas potências comunicativas. Sem tal condição,
primeiramente o reconhecimento da diferença da luta da mulher negra, a traição à fraternidade
patriarcal não seria radical na medida necessária das transformações sociais mais do que urgentes,
como foi a ação revolucionária contra as opressões às mulheres (hooks, [2000] 2017), e que parte de
irmandades femininas. Minha proposta se dispõe a investigar as relações das práticas de sororidade
em redes digitais, entre as narrativas anteriores e os grupos secretos que as acionam; tenho a
hipótese de que enquanto nas redes sociais o termo é muito usado, no espaço de produção de
conhecimento acadêmico, a sororidade ainda é pouco discutida. Um dos espaços onde encontrei o
termo é nas regras que definem as práticas de conduta de diversos grupos (alguns secretos, mas que
serão acessados para compor as redes de sentidos re(a)presentados pelo perfil danzamedicina).
Outro é mesmo o modo como o perfil em questão clama por suas seguidoras chamando-as “manas”,
diminutivo de hermanas (irmãs em espanhol), atualizando dimensões comunicativas e de
sociabilidades, compondo os fragmentos de narrativa no imaginário da sororidade9.
Para Paul Preciado, em seu Manifesto contrassexual, as questões de gênero, sexo e
sexualidade devem ser compreendidas como “tecnologias sócio-políticas complexas; [sendo]
necessário estabelecer conexões políticas e teóricas entre o estudo dos aparatos e dos artefatos
sexuais” (PRECIADO, 2002, p.21) – desmerecidos nos sistemas de legitimação de narrativas –, a
“história das tecnologias modernas e os estudos sócio-políticos do sistema sexo/gênero”.
(PRECIADO, 2002, p.21). O autor defende a “mudança das posições de enunciação” na sociedade
atual, na qual se vive no plano de um discurso produzido por uma heteronormatividade racista que
oprimiria “corpos falantes” diferentes dos que determinam e/ou se submetem a esse modo de vida.
A ação revolucionária “radical” necessária, clamada por hooks, e empreendida por Preciado
em seu manifesto, vida e obra, tem o sentido relembrado por Angela Davis em “significa
simplesmente ‘compreender as coisas desde a raiz” (DAVIS, 2017 [1988] p.24). No livro Mulheres,
cultura e política, Davis afirma a importância da luta feminista negra, considerando os
silenciamentos e opressões que as mulheres negras sofrem como um agravante da sua condição de
subordinação na sociedade capitalista patriarcal atual, elaborando o argumento da luta
interseccional inclusive em títulos de seus textos, como em “Vamos subir todas juntas: perspectivas
9 A sororidade - termo derivado da palavra sóror, do latim irmã - pode ser considerada como a solidariedade feminina
acionada nas práticas cotidianas e políticas, sendo portanto uma força de superação da competitividade entre mulheres,
exacerbada pelo sistema capitalista.
radicais sobre o empoderamento da mulher afro-americana”. Para a autora, é preciso tomar
consciência das relações de poder em agência social e afetação na contemporaneidade e filiar as
lutas, fortalecendo as minorias.
Associo estas Minorias aos processos históricos de quatro epistemicídios (SANTOS, 2010),
isto é, a destruição de conhecimentos ligada à destruição de seres humanos (GROSFOGUEL,
2016): o genocídio dos povos originários, a “conquista de Al-Andalus, a escravização de africanos
nas Américas e o assassinato de milhões de mulheres queimadas vivas na Europa, acusadas de
feitiçaria.” (GROSFOGUEL, 2016, p.26). Em um trabalho que intenta começar a superar tais
heranças sociais, Boaventura e Maria Paula sugerem que se invista no dar a ver as “epistemologias
do sul”, propondo um diálogo com os saberes e práticas para além do pensamento branco,
heterossexual e masculino que domina o mundo, guiando-se por conceitos de objetividade e
universalismo que ignoram as diversidades socioculturais.
A busca por outras racionalidades e a comunicação de tais visões de mundo tem sido cada
vez mais visibilizada no ciberespaço, compondo as culturas urbanas no mundo todo. A ideia do
pensamento e da prática interseccional compreende a complexidade das relações que se estabelecem
entre realidades sociais desiguais, mas que ao mesmo tempo, ao associarem suas atuações,
diversificam as potências criativas em ações de resistências e apropriações das estratégias
(CERTEAU, 1994) em um espaço/tempo liminar entre as lutas, posso dizer. Tais práticas de redes
de relações de sororidade, fazem circular redes de (re)criações dos conhecimentos femininos que se
associam, propõem-se à integração com a natureza, dos astros e das geografias, aos conhecimentos
das músicas, dos gestos, das danças, das ervas e alimentos nos corpos e fortalecem a irmandade
como superação da contenção do imaginário político (RIBEIRO, 2011).
A execução é uma estratégia que nos amedronta há séculos e, seguindo Federici no livro
Calibã e a Bruxa ([2004], 2017), remete à violência do assassinato em série de mulheres
consideradas bruxas, isto é, mulheres que se relacionavam com as tradições de conhecimento das
curas das ervas, bem como de muitas outras relações com seus corpos e a natureza: um dos
epistemicídios já comentados. Silvia Federici ([2004] 2017) faz a análise da inquisição empreendida
pela Igreja Católica atentando para a acumulação primitiva10 do ponto de vista das mulheres e da
10 Ela escreve “(...) das mudanças que introduziu na posição social das mulheres e na produção da força de trabalho.
Daí que a minha descrição da acumulação primitiva inclui uma série de fenômenos que estão ausentes em Marx e que,
no entanto, são extremamente importantes para a acumulação capitalista. Entre esses fenômenos estão: i) o
desenvolvimento de uma nova divisão sexual do trabalho; ii) a construção de uma nova orem patriarcal, baseada na
exclusão das mulheres do trabalho assalariado e em sua subordinação aos homens; iii) a mecanização do corpo
reprodução da força de trabalho. Ela ressalta o capitalismo como uma nova fase do patriarcado, que
trouxe outra divisão sexual nas relações trabalhistas determinando as mulheres como reprodutoras
da força de trabalho.
O modo de estabelecer tal sistema de opressão se deu a partir da caça às mulheres dos
séculos XVI e XVII: “sustento aqui que a perseguição às bruxas, tanto na Europa quanto no Novo
Mundo, foi tão importante para o desenvolvimento do capitalismo quanto a colonização e a
expropriação do campesinato europeu de suas terras.” (FEDERICI, [2004] 2017, p.26). A autora diz
que apenas uma parte da história de tal opressão foi narrada no livro, mas que ainda falta “uma
análise da exploração capitalista da natureza e seu impacto no trabalho reprodutivo” (FEDERICI,
[2004], 2017, p. 13). A autora argumenta também, que a função do trabalho escravo e sua
relevância para a existência do proletariado industrial foram apenas mencionados, bem como, quais
foram as resistências encontradas nessa perseguição, que dura séculos, e precisam vir a ser
desenvolvidos. Assim como afirma que o medo de ser mulher ainda é amparado por dados
relevantes de feminicídios e violências simbólicas cotidianas. É sobre essas resistências, que hoje
continuam acesas entre as redes de sororidades, vivas entre as redes sociais digitais da
contemporaneidade que me debruçarei no pós-doutorado, dedicando a pensar como as narrativas de
sororidade vêm sendo imaginadas, fabuladas e consumidas, dando a ver modos de ser e estar
mulher em práticas compartilhadas de superação das visões de mundo opressoras.
Entre o período de existência da inquisição e o movimento que temos observado de
valorização das práticas de sororidade e de re(a)presentação das mulheres em fragmentos de
narrativas que remetem às tradições e ancestralidades que resistem, há alguns momentos
importantes na história das batalhas empreendidas por mulheres, compondo as redes que hoje se
estabelecem. Anoto, por exemplo, o caso das mulheres russas que lutaram pela emancipação
feminina desde tempos pré-URSS, e que consideravam a influência familiar das mulheres na vida
social e governamental de grande importância. Essas pensadoras e ativistas reconheciam que a
consciência da mulher cresceu depois que as condições econômicas a fizeram sair do círculo
doméstico e possibilitou “se engajar(em) na luta pela sobrevivência” (KALMONOVITCH, [1907]
2017, p.19). Anna Kalmonovitch, ativista do movimento de mulheres, no I Congresso de Mulheres
de Toda a Rússia apresenta um texto “O movimento Feminista e a relação dos partidos com ele” no
qual apresenta publicamente, plena de lucidez diante da opressão que as mulheres viviam desde a
inquisição, bem como a expropriação que sofreram de sua ciência de manipulação de ervas, que
proletário e sua transformação, no caso das mulheres, em uma máquina de produção de novos trabalhadores.”
(FEDERICI, [2004] 2017, p.26)
muito era considerado feitiçaria; assim sendo, eram levadas na sequência para serem queimadas em
fogueiras. (KALMANOVITCH, [1907] 2017, p.22). Ela conclui neste texto que, “enquanto era
possível vencer a mulher fisicamente, escravizando-a por meio do processo de compra e venda
chamado casamento, não era tão fácil reprimir seu espírito” (KALMANOVITCH, [1907] 2017,
p.23).
Em sua luta pelo sufrágio universal e legitimação de um espaço de participação política
institucional para as mulheres, Kalmanovitch constrói um texto colaborativo com as cartas que
recebeu de líderes da luta situadas em outros territórios (França, Inglaterra e Alemanha); a
irmandade feminina já se colocava em ação e prática. Em um texto anterior, Kalmanovitch
rememora a história das amazonas e sua potência enquanto guerreiras imbatíveis a defender seus
territórios e entes queridos (Algumas palavras sobre o feminismo, 2017 [s/d]).
Em 1913, Aleksandra Mikhailovna Kollontai, escritora, jornalista, revolucionária e política, escreve
em “O Dia da Mulher”: “os trabalhadores não perceberam imediatamente que, nesse mundo de
exploração e de falta de direitos, a mulher é oprimida não apenas como vendedora da força de
trabalho”, e aqui afirma, “mas também como mãe e mulher” (KOLLONTAI, [1913], 2017, p.161).
Simone de Beauvoir em “La femme indépendante” ([1949], 2008) apresenta a questão de
que a maior parte das mulheres, em sua realidade, na França, sequer imaginava que precisava
conquistar politicamente seu espaço, ao invés de aguardar a graça que lhes habitava seduzir o que
demandam dos homens, atentando assim para o sexismo presente nas próprias vítimas. Atuante e
praticante de um outro modo de vida para a mulher do mundo ocidental, Beauvoir faz parte de outra
movimentação importante nesses passos da conquista da possibilidade de tematizar as práticas de
sororidade e autonomia feminina, no maio de 68 na França – e que na verdade aconteceu em
diversos outros lugares do mundo, a exemplo do Brasil, inclusive com o gesto de libertação
feminina em relação à ditadura militar. E depois, a liberação sexual hippie norte-americana,
expressada principalmente no festival de música “Woodstock”, em 1969. Na mesma época, as lutas
das mulheres negras estadunidenses se faziam acirradas contra a violência do patriarcalismo e
racismo estrutural, tendo entre as suas grandes vozes políticas a pensadora e militante do partido
comunista, tendo sido candidata à presidência em 1980 e 84, Angela Davis ([1981], 2016), que já
apontava a dimensão opressora do capitalismo que considerava as mulheres como reprodutoras,
haja vista a separação das famílias durante a escravidão norte-americana.
A escritora, poeta e ativista caribenha-estadunidense Audre Lorde, em seu texto “O erótico
como poder”, defende a superação da ideia de que o único uso da eroticidade feminina possível é o
que agencia a sedução dos homens.
Em contato com o erótico, eu me rebelo contra a aceitação do enfraquecimento e de todos
os estados de meu ser que não são próprios de mim, que me foram impostos, como a
resignação, o desespero, o auto-aniquilamento, a auto-negação, a depressão (LORDE,
[1984], 2009, p.15).
Para a escritora, a repressão sofrida pelas mulheres foi programada a partir da dominação
masculina do poder do erótico, entendido como agência sensível entre o poder e o espírito feminino,
aproximando-o de uma relação mais humanizada e atenta às transformações sociais necessárias e
sutis.
Para a sociológa Ana Clara Torres Ribeiro, o apoio da tecnociência na ocidentalização do
mundo, “desconstrói orientações culturais para construir um universo maquínico e artificial,
responsável por exclusões sociais radicais.” (2013a [1989], p.33) como as que as próprias mulheres
são capazes de exercer contra si mesmas. A autora elenca no texto “Sujeito corporificado e bioética:
caminhos da democracia” que a necessidade de
reencantamento da experiência humana (Maffesoli, 1997), a ressubjetivação das
relações sociais e a superação da leitura dominante do corpo como máquina ou vitrine
dependerão da resistência oferecida à sedução exercida através das técnicas de
manipulação da vida social (RIBEIRO, 2013a, p.33).
Para a autora, a demanda de ressubjetivação das relações sociais é evidente assim como a
demanda de um real humanismo praticado (SANTOS, Apud RIBEIRO) um real humanismo em
ação, “um humanismo efetivamente corporificado” (RIBEIRO, 2013a).
Quando as mulheres negras norte-americanas lutam contra o racismo e a violência
institucional, quando Winnie Mandela luta contra leis absurdas de opressão dos povos originários de
um território novo designado país (DAVIS, 2017, p.92), quando as mulheres indígenas insistem na
luta da existência continuando a possibilitar nascer novas crianças, as mulheres outras têm sempre
muito a aprender com tais perspectivas para além do ocidente. Pelas breves observações que venho
realizando das postagens do perfil danzamedicina, parece-me que tais questões são preocupações
que vem sendo enunciadas e praticadas enquanto transformações. Por isso, preocupo-me em dar a
devida
importância de considerar seriamente os dilemas morais e as encruzilhadas éticas que se
apresentam a pesquisadores que intentam desenvolver estudos sobre o consumo e a
comunicação nos contextos industriais, massivos e, posteriormente, nos contextos pós-
industriais e pós-massivos, e o fazem em um esforço de escapar ao reprodutivismo, ao
esquematismo e ao falseamento, não temendo as contaminações e os paradoxos,
dedicando-se a objetos e temáticas “menores”, interessando- se por “raspas e restos”,
por banalidades e pelo “mau gosto”. (ROCHA, 2017, p.3)
A questão da re(a)presentação que buscaremos tratar se relaciona com os usos e apropriação
das redes sociais digitais por mulheres que afirmam práticas da sororidade em (re)existência à
opressão capitalista associadas às violências ambientais, de gênero e de raça (DAVIS, [1984],
hooks, 1989), dando a ver e circular imaginários políticos outros (RIBEIRO, 2011) até então
silenciados desde a inquisição (FEDERICI, 2017) e a escravidão, nos ambientes comunicativos
públicos da sociedade conhecida como ocidental. Enquanto redes sociais digitais, compreendo as
conexões e endereçamentos agenciados pelas plataformas de compartilhamento de registros e
criatividades, o que consideramos fragmentos de narrativas (BENJAMIN, 1994): textos, imagens,
sons, audiovisuais, entre outras possibilidades de produções de apresentação e narração de
experiências estéticas. Fragmentos também organizados por algoritmos (PARISER, 2012) que
afetam a fruição de suas singularidades, gestualidades, subjetividades e experiências, tomadas
ancestrais por meio de perfis que os imaginam entre imagens que lampejam (DIDI-HUBERMAN,
2011) e transpõem o horizonte de expectativas anteriormente possível. Como essa produção e
circulação de fragmentos de narrativas (re)apresenta a mulher enquanto ser independente,
possibilita construir laços de sociabilidade pela resistência, entre os enunciados dos perfis das
diversas plataformas, com músicas, imagens, textos, gestos e corpos que dançam registrados e
disponibilizados na rede. Como é produzida a (re)apresentação do poder erótico (LORDE, 2010) da
mulher entre os formatos comunicacionais midiáticos e as práticas de consumo que estabelecem os
modos de pensamento e de imaginar-se enfrentando, em meio aos ambientes urbanos complexos,
outros modos de viver.11
Por meio da cartografia dos fragmentos de narrativas dos espaços de produção de
enunciados em rede do perfil danzamedicina, identificarei os valores afetivos em circulação pelas
redes digitais, analisarei e buscarei compreender como os modos de produzir o imaginar tem se
desenrolado na busca pela emancipação feminina na contemporaneidade.
A força ambivalente do consumo (possessão/despossessão) garante e subverte a
dinâmica capitalista e afeta as perspectivas de subjetivação. Na mística do consumo,
quando tomamos posse de um objeto ele também nos possui. Como no gênio irônico
presente no autoengano narcíseo-altruísta, no qual o homem de corpo modelado a bordo
de seu carro de luxo diz: “faço isto apenas para mim”; “comprei este carro porque me
encanta seu desempenho, e não pela marca”. Como na afirmação indisciplinada do
jovem ativista que fala: “eu consumo afetos”, “eu gasto meu tempo com meus amigos,
desfrutando do prazer do encontro”. Como na fala do adicto, capaz de “gastar o que for
11 A respeito dessa ideia preciso debruçar-me e, começarei pela ideia de ecofeminismo de Vandana Shiva, apresentada
por Federici (2017, p.51), que por meio da demanda de tomada de conhecimento da quantidade de lixo que
produzimos, como uma cultura do descartável, estamos perdendo a relação fundamental com a terra e com os
conhecimentos e sabedorias do direito até mesmo de morrer naturalmente. Neste vídeo de fala da pensadora no
programa Fronteiras do pensamento, ela apresenta o pensamento acima explicitado, nomeado como a monocultura
da vida, a qual seria também a extinção da diversidade da subsistência e autonomia dos povos.
https://www.youtube.com/watch?v=d9FhGpv_IIk
preciso para ter o celular de última geração”. Escassez no excesso. Excesso na escassez.
Mas, ainda, para além de qualquer função totêmica, o consumo como rito sacrificial,
não só do outro, mas do próprio sujeito. (ROCHA, 2018, p. 99)
No projeto porvir, buscarei apresentar as possibilidades de tradução de uma etnografia
digital (HINE, 2015; MILLER, 2016), isto é, investigação realizada na potência limiar entre as
redes sociais digitais e os corpos femininos em associação, em uma cartografia de sentidos dos
fragmentos das narrativas. Tal tradução diz respeito à produção e consumo de práticas de sororidade
enquanto criação da resistência da mulher nos fluxos políticos contemporâneos.
Político está sendo compreendido como um ato/fato/ideia que irrompe a razão consensual
desestabilizando-a, colocando-a em cheque, ou, como explica Rancière (2012), interrompendo o
modo policial, o status quo. Dar visibilidade e oportunidade à gestos políticos (DIDI-
HUBERMANN, 2016; RIBEIRO, 2010) seria assim, ampliar os regimes de sensibilidade visíveis e
possibilitar afetos, ações, experiências, narrativas à contrapelo, diferentes do modo opressor
dominante vigente, reconhecendo as re(a)presentações que vem sendo feitas nas redes de
comunicação e sentido.
Compreendo, diante das observações iniciais que venho realizando, que parte das mulheres
que usam e se apropriam do perfil danzamedicina, habitam grandes cidades no Brasil e no mundo,
atentando para a dimensão nômade do trabalho desenvolvido pela mulher que coordena o perfil, a
dançarina Morena Cardoso; a cartografia dos fragmentos de narrativas proposto poderá dar conta da
potencia do perfil nas comunicações e agenciamentos políticos enquanto culturas urbanas.
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