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PROVA ESCRITA DE DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL Via Profissional 35.º CURSO DE FORMAÇÃO PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS AVISO DE ABERTURA: AVISO N.º 19401/2018, PUBLICADO NO DIÁRIO DA REPÚBLICA, 2.ª SÉRIE, N.º 251/2018, DE 31 DE DEZEMBRO DE 2018 DATA: 28 DE FEVEREIRO DE 2019 2.ª CHAMADA HORA: 14H 15M ( DE ACORDO COM O DISPOSTO NO ARTIGO 12.º DO REGULAMENTO INTERNO DO CENTRO DE ESTUDOS JUDICIÁRIOS, O TEMPO DE DURAÇÃO DA PROVA INICIA-SE DECORRIDOS 15 MINUTOS APÓS A HORA DESIGNADA ) DURAÇÃO DA PROVA: 4 HORAS

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PROVA ESCRITA

DE

DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL

Via Profissional

35.º CURSO DE FORMAÇÃO PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

AVISO DE ABERTURA: AVISO N.º 19401/2018, PUBLICADO NO

DIÁRIO DA REPÚBLICA, 2.ª SÉRIE, N.º 251/2018, DE 31 DE

DEZEMBRO DE 2018

DATA: 28 DE FEVEREIRO DE 2019

2.ª CHAMADA

HORA: 14H 15M (DE ACORDO COM O DISPOSTO NO ARTIGO 12.º DO

REGULAMENTO INTERNO DO CENTRO DE ESTUDOS JUDICIÁRIOS, O TEMPO DE

DURAÇÃO DA PROVA INICIA -SE DECORRIDOS 15 MINUTOS APÓS A HORA

DESIGNADA)

DURAÇÃO DA PROVA: 4 HORAS

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PROVA ESCRITA DE

DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL

Via Profissional – 2.ª Chamada – 28 de fevereiro de 2019

1 - A presente prova consiste na elaboração de um Despacho de Encerramento do Inquérito a ser proferido nos Autos de Inquérito com o NUIPC 111/17.0PSLSB, devendo ser apreciadas todas as questões suscitadas até ao final dessa fase processual ou que sejam de conhecimento oficioso.

2 - Apesar de a prova consistir na elaboração de um Despacho de Encerramento de Inquérito, não poderá conter qualquer assinatura, ainda que fictícia, pelo que, no final da peça, as/os candidatas/os só deverão escrever as palavras seguintes:

“Data”

“Assinatura”.

3 - Cotação: 20 valores

I - A Cotação do Despacho a elaborar distribui-se da seguinte forma:

Tomada de posição sobre a nulidade invocada por um dos arguidos - 2,5 valores

Outras questões prévias - 2 valores

Descrição fáctico-jurídica - 6,2 valores

Qualificação jurídica - 5 valores

Prova e comunicações - 1,8 valores

II – Organização do discurso técnico-jurídico e linguagem utilizada – 2,5 valores.

4 - A atribuição da cotação máxima nesta prova pressupõe uma apreciação completa das várias questões que se suscitam até ao final do Inquérito, ou de conhecimento oficioso, de facto e/ou de Direito, que deverá ser coerente e corretamente fundamentado com indicação dos preceitos legais aplicáveis.

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5 - Na apreciação da prova relevarão, nomeadamente, a pertinência do conteúdo, a qualidade da informação transmitida, a organização e qualidade da exposição, a capacidade de argumentação e de síntese e o domínio da língua portuguesa.

6 - Os erros ortográficos serão valorados negativamente: 0,25 por cada um, até um máximo de 3 valores, para o total da prova (Ponto 6.3.1 do Aviso n.º 19401, publicado no Diário da República, 2ª série, n.º 251, de 31 de dezembro).

7 - As/os candidatas/os que na realização da prova não pretendam utilizar a grafia do "Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa" (aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91 e ratificado pelo Decreto do Presidente da República n.º 43/91, ambos de 23 de agosto), deverão declará-lo expressamente no quadro "Observações" da folha de rosto que lhes será entregue, escrevendo "Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91 não está em vigor com carácter de obrigatoriedade", sendo a prova corrigida nesse pressuposto.

9 - As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer elemento identificativo da/o candidata/o (a identificação constará apenas do destacável da folha de rosto), sob pena de anulação da prova.

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Considere os seguintes elementos com relevo no decurso do Inquérito do Processo com o

NUIPC nº 111/17.0PSLSB:

1) A fls. 1-3 encontra-se o Auto de Notícia, datado de 11 de janeiro de 2017, subscrito por ZZZ,

devidamente identificado, do qual consta, para o que releva:

“Hoje, dia 11 de janeiro de 2017, pelas 16h 30m, fui chamado ao local da ocorrência, sito na

Rua da Infelicidade, nº 1, 1º andar, Esq., nesta cidade de Lisboa, e aí fui contactado pelo

médico António Abrantes que me disse que a porteira lhe indicou a entrada na residência e

que, uma vez lá, constatou que a vítima Belinda Bártolo já se encontrava sem vida, conforme a

ficha CODU nº 1-1, que se junta.

Mais informou que a tripulação da ambulância Lisboa 1, ao deparar-se com a situação, ainda

iniciou manobras de suporte básico de vida, mas sem sucesso.

Dirigi-me para junto do cadáver e constatei que o mesmo se encontrava em decúbito dorsal no

hall da residência.

Analisado o local, constatei que havia vestígios de luta, pois verifiquei que os óculos da vítima

estavam partidos ao lado da mesma e que a vítima apresentava uma escoriação no lábio

inferior.

Na fração da porteira do prédio encontrava-se uma outra vítima, Custódia Carmo, a qual

apresentava várias escoriações na face e a receber assistência médica por parte do INEM.

Indagada, a vítima Custódia Carmo, moradora no 1º andar Drt., disse que chegou a casa por

volta das 16h e, alguns minutos depois, dirigiu-se para casa da sua amiga Belinda Bártolo, o

que fez abrindo a porta de entrada com uma chave que tem na sua posse e que a vítima

Belinda lhe tinha entregue para entrar livremente na casa dela, sem necessidade de tocar à

campainha para o efeito, e assim obrigá-la a levantar-se, já que se movia com dificuldade.

Então, logo que abriu a porta viu a amiga Belinda prostrada no chão e de imediato foi

ELEMENTOS RELEVANTES PARA O(S) DESPACHO(S) A ELABORAR

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surpreendida por um indivíduo de cara tapada e com luvas que, ato contínuo, a puxou, lhe deu

na cabeça com uma caixa preta que trazia nas mãos e a agrediu com socos e pontapés,

deixando-a inconsciente.

Quando voltou a si, reparou que a sua amiga ainda se encontrava prostrada no solo,

aparentemente inconsciente, e aterrorizada fugiu para a sua casa para pedir auxílio. Pensa que

quando voltou a ter consciência já estariam sozinhas, pois não viu mais ninguém, nem sentiu

barulho. Mal entrou em sua casa, ligou para a portaria e gritou por socorro, tendo a Deolinda

Dâmaso, a porteira, aparecido alguns momentos depois e chamado o INEM e a Polícia.

Deixo registado que tanto a porta principal como a porta de serviço não apresentavam

quaisquer sinais de arrombamento e a casa quaisquer sinais de desarrumação que levassem a

crer ter o meliante andado à procura de bens de valor.

De toda a situação descrita foi dado conhecimento à Polícia Judiciária e à senhora Procuradora

de turno.”

2) A fls. 10 consta o Relato de diligência externa efetuada em 12 de janeiro de 2017, subscrito

por ZZZ, do qual consta para o que ora releva:

Dando continuidade às diligências tendentes ao apuramento dos factos em investigação,

desloquei-me à Rua da Infelicidade com vista a aí recolher imagens de videovigilância no Hotel

OLHOVIVO, existente no nº 2 dessa mesma rua.

Foram facultadas as imagens respeitantes ao período das 15h 30m às 16h 45m do dia 11 de

janeiro de 2017.

3) A fls. 25-30 consta o Auto de Visionamento das Imagens, datado de 13 de janeiro de 2017,

subscrito por ZZZ, recolhidas na Diligência Externa efetuada em 12 de janeiro de 2017, junto

do Hotel OLHOVIVO, do qual constam:

- Vários fotogramas dos quais se extrai que, na referida Rua da Infelicidade, junto ao nº 1 (local

onde ocorreu o crime), às 15h 56m, caminhavam dois indivíduos de estatura média, trajando

de escuro, com o carapuço do casaco enfiado na cabeça, usando aparentemente calças de

ganga de cor azul e ténis brancos, caucasianos, sendo que um transportava uma mochila às

costas. Entraram ambos no referido prédio com o nº 1, sendo que às 16h 00m, um deles

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voltou a sair e permaneceu junto à porta de entrada, no passeio. O indivíduo permaneceu de

costas para a porta do prédio e a certa altura agarrou no telemóvel, que colocou junto ao

ouvido. Aparentava estar vigilante, olhando quer para a direita, quer para a esquerda. Às 16h

13m, saiu pela referida porta de entrada o segundo indivíduo com uma mochila às costas e

ambos abandonaram o local, caminhando apressadamente pela Rua da Infelicidade até ao

cruzamento com a Rua do Desespero, por onde seguiram.

(NOTA: deverá considerar que a qualidade das imagens é baixa, não sendo possível, através

delas, identificar o rosto dos indivíduos que nelas ficaram registadas; identifica-se

razoavelmente a estatura, que são caucasianos, e as roupas que os intervenientes trazem

vestidas)

4) A fls. 35 encontra-se o Auto de Apreensão do DVD, datado de 13 de janeiro de 2017,

contendo as imagens constantes do Auto de Visionamento de fls. 25-30.

5) A fls. 40-42, o Auto de Inquirição de Ernesto Bártolo Esteves, filho de Belinda Bártolo e

Filomeno Esteves, e morador na Rua dos Descendentes, nº 2, 2º andar Frente, Lisboa, datado

de 20 de janeiro de 2017, do qual consta, para o que releva:

A sua mãe morava sozinha desde o falecimento do pai, há cerca de 15 anos. Naquele dia 11 de

janeiro recebeu uma chamada telefónica da porteira do prédio da mãe, Deolinda Dâmaso,

muito aflita, por volta das 19h, talvez, não sabe ao certo, dizendo-lhe que viesse depressa para

casa da mãe porque tinha acontecido uma desgraça. A Deolinda estava muito perturbada e

apenas dizia que era uma desgraça e que a mãe tinha falecido. Nesse dia estava em Paris,

numa reunião de trabalho, e só pôde regressar na madrugada do dia seguinte porque já não

conseguiu voo para essa noite. Inquirido disse que a mãe era pessoa para abrir a porta quando

tocavam à campainha, bastando dizer que era da água ou da luz, ou qualquer coisa desse

género. Perguntado, disse que, do que se apercebeu até ao momento, falta na casa de sua

mãe um cofre de cor preta que esta guardava na sua cómoda, no interior do qual tinha um fio

grosso em ouro antigo, que estima deveria pelo menos valer cinco mil euros, um anel de

noivado com um diamante cujo valor estima possa ascender a dez mil euros e ainda um relógio

de marca Cartier, modelo balon bleu, que novo custa hoje pelo menos cinco mil euros. Estava

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tudo dentro do cofre que desapareceu. Não deu por falta de mais nada e a mãe não

costumava ter muito dinheiro em casa.

6) A fls. 50-52 encontra-se o Auto de Inquirição da testemunha Deolinda Dâmaso, datado de

25 de janeiro de 2017, residente na Rua da Infelicidade, Rés-do-chão Dt., Lisboa, constando

dele, para o que ora releva:

Disse há mais de 20 anos que é a porteira do prédio da Rua da Infelicidade, nº 1, e que naquele

dia 11 de Janeiro de 2017, por volta das 15h e 30m, foi fazer uma pequena sesta porque estava

com dor de cabeça e a essa hora não costuma ser chamada pelos moradores do prédio. O seu

horário é das 8h às 14h e das 17 h às 19h mas, se a chamarem em outra qualquer hora, está

sempre disponível para ajudar no que for preciso.

No 1º andar Esq. vivia a Srª D. Belinda Bártolo, viúva há uns 15 ou mais anos, não sabe

exatamente, e que tem um filho já casado que mora também em Lisboa, mas viaja muito pelo

estrangeiro em trabalho.

E no 1º andar Dt. vive a Sra. D. Custódia Carmo.

São muito amigas há muitos anos e sabe que até têm a chave da casa uma da outra. Disse

também possuir as chaves dos 1º andares dt. e esq. que lhe foram entregues pelas

proprietárias para o que fosse preciso.

Estava a dormitar quando o seu telemóvel tocou. Era a D. Custódia Carmo que, aflita, lhe pedia

ajuda, gritando “acuda-me, acuda-me”. Saiu da cama assustada e subiu de imediato ao 1º

andar pelas escadas. A porta da casa da D. Custódia estava aberta e ela estava logo no hall de

entrada, sentada no chão, com sangue na cara, toda despenteada e com a cara já inchada,

com o telemóvel na mão, e só dizia acudam-me, acudam-me, acudam a Belinda. Então ela viu

que a porta do 1º andar esq. estava aberta e, desnorteada com tudo aquilo, entrou no hall e

viu que estava a Sra. D. Belinda caída no chão, com os óculos partidos também no chão,

inconsciente. Não sabia se estaria morta, mas não tocou nela. Voltou de imediato para junto

da D. Custódia, pegou no telemóvel que ela tinha na mão e ligou para o 112 e para a Polícia.

Não saiu mais de ao pé da D. Custódia porque ela estava em estado de choque e teve medo

que lhe acontecesse alguma coisa.

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Perguntada, disse que a falecida Belinda era uma senhora muito pacata, não lhe conhecia

inimigos, muito reservada, muito sua amiga, que não faz ideia de quem poderia ter feito uma

coisa daquelas.

Mais disse desconhecer se a D. Belinda tinha dinheiro em casa ou coisas de valor, pois ela

nunca lhe falou disso e pelo menos à vista não lhe conheceu nada que chamasse a atenção,

quer na sua pessoa, quer exposto em casa.

Não sabe se naquele dia ali foi alguém contar a água, luz ou gás durante o tempo em que se

retirou, na hora do seu descanso.

Enquanto esteve ao serviço, ninguém apareceu para esse efeito ou para qualquer outro. Foi

um dia normal, sem visitas aos moradores.

E mais não disse.

7) A fls. 60-62 encontra-se o Relatório de Urgência dos cuidados médicos prestados a Custódia

Carmo, do qual constam os seguintes registos relativos ao dia 11 de janeiro de 2017, para o

que ora releva:

Fluxograma – agressão

Queixa – vítima de agressão da qual resultou traumatismo craniano e torácico, facial, cervical e

TCE com PC

VMER no local

Discriminador – história de perda de consciência

Sinais vitais –

Dor – 7 (0-10) -

(...)

História da doença atual: TC CE e maxilofacial (Urg)

Informação clínica: Trauma AAS

Trazida ao SUC após ter sido vítima de agressão com traumatismo craneo-facial (murros e

pontapés) com perda de conhecimento. Concomitantemente refere traumatismo torácico no

hemicorpo esquerdo, queixando-se de dor localizada à grelha costal esquerda cuja intensidade

agrava com inspiração profunda. Sem disneia nem sinais de dificuldade respiratória

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(...)

Admissão em 11 de janeiro de 2017, pelas 17h 28m, por agressão da qual resultou hematoma

epicraniano temporo-parietal direito, hemorragia subconjuntival à esquerda, vários

hematomas na região cervical anterior, equimoses no cotovelo, mão esquerda e dor referida à

grelha costal esquerda. Sem fraturas em imagiologia.

(...)

Alta para saída com parecer médico favorável.

8) A fls. 70-72 encontra-se o exame médico-legal efetuado a Custódia Carmo, do qual consta,

para o que ora releva:

(...)

Discussão

1- Os elementos disponíveis permitem admitir o nexo de causalidade entre o traumatismo e o

dano.

2 – A cura das lesões é fixável em 18-01-2017 tendo em conta o tipo de lesões resultantes

CONCLUSÕES:

A data da cura das lesões é fixável em 18-01-2017

As lesões atrás referidas terão resultado de traumatismo de natureza contundente o que é

compatível com a informação

Tais lesões determinarão, em condições normais, 7 dias para a cura com afetação da

capacidade de trabalho geral (7 dias) e com afetação da capacidade de trabalho profissional (7

dias)

Do evento não resultarão, em condições normais, quaisquer consequências permanentes.

9) A fls. 80-82 encontra-se o Auto de Inquirição da testemunha Custódia Carmo, residente na

Rua da Infelicidade, nº 1, 1º Dt., datado de 1 de fevereiro de 2017, do qual consta, para o que

ora releva:

Ela e a falecida Belinda Bártolo residiam naquele prédio da Rua da Infelicidade há mais de vinte

anos e foi ali que, por ambas serem vizinhas e morarem no mesmo andar, se fizeram muito

amigas. A falecida ficou viúva há uns 15 anos, com um filho, e ela é solteira, sem filhos. Mais

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disse que de há uns anos a esta parte, desde que o filho da falecida Belinda saiu de casa, já

homem, ela passou a ter a chave da casa dela, porque eram a companhia uma da outra, sendo

como irmãs. Todos os dias da semana, por volta das 16h, ia a casa dela ver a telenovela e

ficava até ao jantar. Naquele dia 11 de janeiro, descansou depois de almoço um pouco e, por

volta das 16h, talvez uns minutos depois porque ainda ouviu em sua casa bater as 16h no

relógio da sala, como de costume, dirigiu-se para casa da falecida, o que fez abrindo a porta de

entrada com a chave que tem na sua posse. Então, viu logo a Belinda prostrada no chão,

inconsciente, e ato contínuo foi surpreendida por um indivíduo de cara tapada e com luvas que

de imediato a puxou e agrediu com uma caixa preta na cabeça e lhe deferiu socos e pontapés,

na cara e no corpo, deixando-a logo inconsciente. Quando voltou a si, reparou que a sua amiga

se encontrava ainda prostrada no solo, aparentemente inconsciente, e aterrorizada fugiu para

a sua casa para pedir auxílio. Pensa que quando voltou a ter consciência já estariam sozinhas

pois a porta da rua estava aberta. De seguida, já no hall de sua casa, aflita, ligou do seu

telemóvel para a Deolinda, a porteira, e gritou por socorro, tendo ela aparecido alguns

momentos depois e chamado o INEM e a Polícia.

Não tem a menor ideia de quem pode ter feito esta desgraça.

A falecida Belinda era uma mulher de bem, sem inimigos, só saía para ir à missa, ao

supermercado, fazer uma ou outra compra, sendo sempre as mesmas perto de casa, ou saía

quando o filho a vinha buscar para almoçar com ele. Tratava da sua vida sozinha, vivia da sua

reforma, de administrativa no Ministério do Mar, e da do marido falecido, que tinha sido

bancário. Não falava com desconhecidos, nem era rica, nem sequer com o seu ouro andava na

rua. Sabe que ela tinha um fio grosso de ouro, que o guardava num cofre, na gaveta da

cómoda do seu quarto, e que ela tinha grande estima nele, pois era herdado da mãe, e um

anel de noivado e um relógio oferecido pelo falecido marido. Chegou a ver esses bens, mas

não sabe dizer ao certo o valor, mas seguramente que tudo seria para uns vinte mil euros, ao

que ela uma vez lhe confidenciara.

Perguntada, disse que não faz ideia de quem pudesse querer mal à Belinda: era uma senhora

educada, reservada, muito amiga dos seus amigos e do filho com quem se dava muito bem,

também muito amigo dela, nunca saía à rua com o ouro e não acredita que revelasse a pessoas

de fora que o tinha.

Perguntada, disse ser normal ela abrir a porta a pessoas de confiança ou que se identificassem

ao que vinham.

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Perguntada disse que recentemente não houve obras lá em casa da falecida Belinda e que ela

nunca teve empregada doméstica. Sempre cuidou de si sozinha apesar de há algum tempo a

esta parte já ter alguma dificuldade em se movimentar.

E mais não disse.

10) A fls. 90-92 encontra-se o Relatório de Autópsia Médico-Legal de Belinda Bártolo, do qual

consta, para o que ora releva:

(...)

Exame do hábito externo

Cabeça – escoriação na metade direita da região mentoniana com 0,8 cm x 1,1 cm de maiores

dimensões

Pescoço – equimoses bilaterais

- Tórax – escoriação no terço médio da face anterior do hemitórax direito, com 0,4 cm x 0,2 cm

de maiores dimensões

Abdómen – sem lesões traumáticas

Exame do hábito interno

Cabeça

Partes moles – petéquias. Área de infiltração sanguínea na região parietal, linea mediana

sagital, com 3,5 cm x 2,5 cm de maiores dimensões. Área de infiltração sanguínea na região

occipital esquerda, arredondada com 1,2 cm de diâmetro.

Pescoço

Músculos – área de infiltração sanguínea no terço médio do músculo esternocleidomastóideo

direito, com 2,0 cm x 0,6 cm de maiores dimensões. Restantes planos musculares sem lesões

traumáticas.

Conclusões

1 - Em face dos dados necrópsicos, da informação circunstancial atrás descrita e do resultado

dos exames complementares de diagnóstico, tudo indica que a morte de Belinda Bártolo tenha

sido devido a cardiopatia isquémia crónica.

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2 – Esta é causa de morte natural.

3 – As lesões traumáticas acima descritas denotam ter sido produzidas por ação de natureza

contundente, não constituindo causa adequada de morte.

4 – Além das lesões atrás referidas foram ainda encontradas outras alterações resultantes de

intervenção terapêutica.

5- O exame toxicológico feito ao sangue para pesquisa de etanol foi negativo.

6 – O exame histológico de fragmentos de órgãos revelou os seguintes diagnósticos anátomo-

patológicos: “enfisema panacinar com formação de “bolhas”. Doença isquémica crónica do

miocárdio com cicatriz de enfarte do V.E. Fígado de estase crónica. Edema da glia”.

11) A fls. 95 encontra-se um Auto de Declarações de Perito, datado de 15 de maio de 2017,

para esclarecimento de exame pericial relativo ao Relatório de Autópsia de fls. 90-92:

Perguntado sobre a produção das lesões, esclareceu:

- A escoriação descrita na região mentoniana denota ter sido produzida por ação de natureza

contundente, sendo compatível com traumatismo provocado por oclusão ou tentativa de

oclusão dos orifícios respiratórios da vítima.

- As áreas de infiltração sanguínea ao nível dos tecidos moles da cabeça denotam ter sido

produzida por ação de natureza contundente, sendo compatíveis com traumatismo provocado

por queda da vítima no chão.

- A área da infiltração sanguínea ao nível dos músculos do pescoço denota ter sido produzida

por ação de natureza contundente, sendo compatível com traumatismo provocado por

compressão extrínseca do pescoço, neste caso, de esganadura.

Perguntado se as lesões traumáticas observadas constituem causa da morte, o senhor perito

esclareceu que:

- constata-se que há pequenas lesões traumáticas externas que não constituem a causa de

morte, tal como não existe em termos anatomopatológicos uma lesão capaz de explicar

objetivamente o evento terminal.

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Perguntado sobre o que significa, do ponto de vista patológico, padecer de um enfisema

pulmonar e de uma isquémia crónica do miocárdio, esclareceu que:

- um pulmão enfisematoso, e portanto com menor reserva, conduz a um estado de hipoxémia,

que é uma baixa de oxigénio no sangue, permanente, suscetível de ser agravado com qualquer

esforço ou obstrução mínima da via aérea

- um coração com coronariopatia crónica, isto é, um entupimento das artérias, é suscetível a

fenómenos de hipoxémia e/ou stress. Não se detetaram evidências de isquémia aguda

(enfarto).

Perguntado sobre o que indica a existência de petéquias, esclareceu que

- a presença de petéquias nos tecidos moles surgem com grande frequência nos casos de

síndrome asfíxico, não sendo no entanto patognomónicas. Ou seja, o facto de encontrarmos

petéquias aponta para um quadro de asfixia, mas não podemos excluir outras causas de

morte.

- as petéquias indicam congestão vascular habitualmente de natureza obstrutiva compatível

com uma origem extrínseca e provocada (esganadura).

Perguntado sobre se o contexto emocional pode dar azo ao desfecho observado, disse que

num contexto de um stress violento, com libertação de adrenalina típica nesses casos,

concomitante a episódios de asfixia, ainda que momentâneas, com hipoxémia, é possível a

afetação de um miocárdio doente, desencadeando uma arritmia fatal compatível com a falta

de dados objetivos da autópsia e a morte súbita (morte imediata sem causa aparente de um

indivíduo aparentemente assintomático).

12) A fls. 96 encontra-se o Assento de Nascimento de Custódia Carmo do qual resulta, para o

que ora releva, ter nascido no dia 25 de dezembro de 1936.

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13) A fls. 97 encontra-se o Assento de Nascimento e Óbito de Belinda Bártolo do qual se extrai,

para o que ora releva, ter nascido no dia 1 de janeiro de 1930 e falecido no dia 11 de janeiro

de 2017.

14) A fls. 110, com data de 14 de setembro de 2017, o Inspetor titular do Processo lavrou uma

cota com o seguinte teor “Nesta data, faço constar que recebi uma chamada telefónica, pelas

13h, do número 911223344, tendo-se a pessoa identificado como sendo Florberta Frias,

advogada com a cédula profissional 11223300, informando que tinha sido contactada por

Gabriel Gomes e que o mesmo lhe disse ter sido interveniente nos factos ocorridos em 11 de

janeiro de 2017, na Rua da Infelicidade, 1º esq., em Lisboa. Manifestou disponibilidade para se

deslocar às instalações da PJ, na companhia de Gabriel Gomes, amanhã, pelas 11h”.

15) A fls. 120 consta o Termo de Constituição de Arguido e o TIR de Gabriel Gomes, datados de

15 de setembro de 2017, às 11h 10m, dos quais se extrai, para o que ora releva, que nasceu no

dia 25 de janeiro de 1993, na freguesia de Bota-no-Bolso, concelho e distrito de Lisboa, é filho

de Gracindo Gomes e Gilberta Gomes, e reside no Bairro da Congeminação, Lote 1, 1º Esq.,

Caneças.

16) A fls. 130-132 encontra-se o Auto de Interrogatório do arguido Gabriel Gomes, efetuado

pelo Inspetor da PJ titular do Processo, datado de 15 de setembro de 2017, com início às 11h

15m e termo às 12h, no qual esteve presente a advogada do arguido Florberta Frias, do qual

consta, para o que ora releva:

Esclarece que é serralheiro de profissão, trabalhando agora numa empresa de abertura e

montagens de portas, e na data dos factos encontrava-se a trabalhar, por conta própria, na

zona da Rua da Infelicidade, um ou dois quarteirões à frente da residência dos autos, no

sentido da Avenida Funesta, mas já não sabe precisar exatamente em que prédio, pois só lá foi

uma vez e conhece mal aquela zona.

Nesse dia 11, após a hora de almoço, por volta das 13h 30m, recebeu uma chamada do

Humberto Henriques, a perguntar onde estava e se se podiam encontrar para tomar um café.

Combinaram então o local do encontro, às 15h, numa cafetaria na esquina da Rua da

Infelicidade com a Avenida Funesta, cujo nome não recorda.

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É amigo do Humberto há um bom par de anos, vivendo ambos no Bairro da Congeminação, em

Caneças. Os pais dele ainda ali residem, mas a ele deixou de o ver por ali.

Quando estavam a tomar o café, o Humberto disse-lhe que precisava dos seus serviços para

abrir uma porta de um apartamento situado naquela zona, porque ali morava um rapaz que

lhe devia muito dinheiro há que tempos e que por isso haveria de trazer o dobro da dívida de

casa dele, estivesse ele ou não em casa, e nem que tivesse que lhe dar nas trombas porque era

um caloteiro.

Ofereceu-lhe 1 000 euros para abrir a porta da entrada da casa, tendo ele que levar as

ferramentas necessárias.

Já uma vez, há uns tempos, lá no Bairro onde moram, ele lhe tinha falado desse rapaz e lhe

tinha dito que se ele não lhe pagasse teria que ir a casa dele buscar o que era seu e não se

ficaria por isso, fosse a bem, fosse a mal, porque caloteiros não brincavam com ele.

Foram então até à Rua da Infelicidade e, quando ali chegaram, a porta do prédio estava

entreaberta.

Então o Humberto disse-lhe para ficar ali a vigiar que se fosse necessário subir para abrir a

porta do apartamento o chamaria.

Ouviu que o Humberto tocou à campainha, e ouviu também abrir e fechar uma porta.

Percebeu, então, que lhe tinham aberto a porta e ele tinha entrado.

Ficou ali para vigiar, se bem que que não poderia impedir que os moradores do prédio

entrassem, porque isso sim, daria nas vistas, e também para ver se, pelo menos, o Humberto

lhe pagaria a hora de trabalho, já que não tinha necessitado da sua intervenção.

Aguardou cerca de 10 a 15 minutos, não sabe bem. Não sabe se atendeu ou efetuou qualquer

chamada durante esse período de tempo, pois não se recorda. Também não sabe dizer qual o

número de telemóvel que usava nessa altura porque muda frequentemente, pois não gosta

que os clientes fiquem com o seu número muito tempo, porque não têm qualquer respeito

pelo seu horário de descanso.

Quando o Humberto saiu, seguiram os dois pelo passeio e ele perguntou-lhe se o rapaz lhe

tinha devolvido o dinheiro e ele disse que sim, que tinha corrido tudo bem. Pediu-lhe então

para lhe dar pelo menos 100 euros para compensar a hora de trabalho perdida e o Humberto

disse-lhe que depois acertariam contas, à noite, lá no Bairro. E pronto, cada um foi à sua vida.

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Mas o Humberto não apareceu no café nem lhe deu nada, pois desde essa data não mais

conseguiu estabelecer contacto com ele. Deixou de lhe atender o telefone. Indicou esse

número de telefone do Humberto Henriques como sendo o 92 333 4440. Confrontado com a

ficha biográfica existente na Polícia Judiciária, identifica a foto do Humberto Henriques como

sendo o amigo que o interpelou a deslocar-se à Rua da Infelicidade.

Confrontado com os fotogramas de fls. 25-30, disse que efetivamente é ele e o Humberto.

Depois de ter estado na Rua da Infelicidade, voltou para o seu trabalho e não sabe para onde

foi o Humberto.

Perguntado por que motivo só agora veio falar com a Polícia Judiciária, disse que não tem

conseguido conviver com o facto de saber quem praticou os factos e nada dizer para

esclarecer a verdade e que pretende desta forma colaborar com a investigação, sublinhando

que desconhecia, quando anuiu em acompanhar o Humberto, quem morava no prédio, nunca

lhe tendo passado pela cabeça que aquela ida ali implicaria uma morte.

E mais não disse.

17) A fls. 140-142 encontra-se um Auto de Diligência Externa, com data do dia 18 de setembro

de 2017, do qual consta, para o que ora releva:

Na sequência das declarações do arguido Gabriel Gomes deslocámo-nos na presente data à

residência do arguido para efetuar uma busca domiciliária, conforme auto de busca e

apreensão que se junta a seguir.

18) A fls. 150-152 encontra-se o Auto de Busca e Apreensão, datado de 18 de setembro de

2017, do qual consta, para o que ora releva:

Identidade do buscado: Gabriel Gomes

Consentimento: consinto na busca ao meu domicílio, incluindo equipamentos informáticos e

de telecomunicações, os anexos e as viaturas que se encontram na minha posse, nos termos

do art. 174º, nº 5, al. b), do CPP

Segue-se uma assinatura da qual se reconhece o nome Gabriel Gomes.

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A diligência deu o seguinte resultado: foram apreendidas umas calças de ganga de cor azul,

que o arguido confirmou neste ato terem sido utilizadas aquando da sua deslocação à Rua da

Infelicidade na companhia de Humberto Henriques; uma camisola com capuz, que de igual

modo o arguido disse ser a que utilizou no dia dos factos; ambas as peças coincidem com as

que usava no aludido dia e que podem ser perfeitamente identificadas nos fotogramas.

19) A fls. 160-162 encontra-se a promoção do Ministério Público, elaborada na sequência das

declarações do arguido Gabriel Gomes, sob proposta da Coordenadora de Investigação

Criminal, datada de 25 de setembro de 2017, na qual promoveu junto do Juiz de Instrução

Criminal, após ter exarado a competente fundamentação de facto e de direito, em síntese e

para o que ora releva, que, relativamente ao telemóvel utilizado pelo suspeito Humberto

Henriques com o nº 92 333 4440, fosse ordenada à operadora móvel competente o envio dos

dados referentes à faturação detalhada, trace-back com localização celular, no período

temporal entre os dias 1 e 30 de janeiro de 2017, e bem assim que mais fosse ordenada a

interceção do referido número, bem como o IMEI onde tal número esteja inserido e bem assim

a faturação detalhada e localização celular relativa a cada um dos contactos efetuados e

recebidos, pelo período de 30 dias.

20) A fls. 170-172 encontra-se o despacho do Juiz de Instrução Criminal, datado do dia 28 de

setembro de 2017, no qual autorizou as solicitadas interceções e ordenou à operadora que

fornecesse os dados referidos na promoção que antecedia.

21) A fls. 200-202 por despacho datado de 16 de novembro, na sequência de promoção do MP

para o efeito, o JIC autorizou a busca à residência do suspeito Humberto Henriques, sita na Rua

do Agoiro, nº 3, na Buraca, Amadora, entretanto apurada pela investigação, com vista à

apreensão de quaisquer objetos e / ou outros elementos que sirvam de prova dos factos em

investigação e que ali fossem encontrados, nos termos conjugados dos art. 174º, nº 2 e nº 3 e

177º, nº 2, do CPP, com os condicionalismos ali previstos.

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22) A fls. 210-212 em 18 de novembro, o MP, descrevendo os factos que considerou apurados,

e fundamentando com o perigo de continuação de atividade criminosa, determinou a emissão

de mandados de detenção fora de flagrante delito contra Humberto Henriques, ao abrigo do

disposto no art. 202º, nº 1, al. a) e b) e 204º, al. c) e 257º, nº 1, do CPP, a fim de que o mesmo

fosse presente ao JIC para primeiro interrogatório judicial com vista a aplicação de medida de

coação.

23) A fls. 220-222 encontra-se a análise ao conteúdo da listagem de contactos telefónicos

mantidos pelo suspeito Humberto Henriques, através do número de telefone 92 333 4440, no

período temporal compreendido entre os dias 1 e 30 de janeiro de 2017, efetuada pelo

Inspetor da Polícia Judiciária e conforme aos documentos oportunamente juntos aos autos

pela Operadora Telefónica, do qual consta, para o que ora releva:

No dia 10 de janeiro de 2017 o suspeito Humberto Henriques usa por várias vezes o seu

telemóvel para estabelecer vários contactos telefónicos ativando antenas BTS afetas à

operadora SEMPR’ ÓTELE, situadas na zona da Rua da Infelicidade, na cidade de Lisboa, ou

seja, na zona geográfica onde, no dia seguinte, no mesmo período temporal, vieram a ocorrer

os factos.

Estas antenas cobrem geograficamente a zona onde está situado o imóvel.

Esta constatação aponta fortemente para que o suspeito Humberto Henriques, no dia anterior

aos factos, tenha estado no local da sua ocorrência, para efetuar o reconhecimento do local

onde os iria perpetrar.

No contexto global da listagem dos contactos telefónicos conclui-se que o suspeito Humberto

Henriques habitualmente não frequenta esta zona.

No dia 11 de janeiro, entre as 15h 45m e as 16h 15m, o telemóvel habitualmente utilizado pelo

suspeito Humberto Henriques acionou a antena BTS na Buraca, Amadora, levando a concluir

que o suspeito deixou o telemóvel na sua residência, que se veio a apurar situar-se nesse local,

enquanto se deslocou à cidade de Lisboa para executar o crime, na companhia do arguido

Gabriel Gomes.

O telemóvel ficou propositadamente em casa para fazer crer que não esteve no local da

ocorrência do crime, no momento da sua execução.

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Constata-se igualmente que, na manhã e tarde do dia 11 de janeiro, o referido telemóvel

apenas recebeu contactos telefónicos acionando sempre a mesma antena BTS acima referida,

sita na Buraca.

Entre as 13h e as 18h foram efetuadas várias chamadas para o telemóvel que não foram

atendidas, tendo sido direcionadas para o voicemail, o que representa o facto de não ter

atendido chamadas telefónicas por não se encontrar no local onde o aparelho estava

depositado.

Nos contactos telefónicos posteriores às 18h, o suspeito Humberto Henriques já se encontra

na zona de Caneças, pois as Antenas acionadas encontram-se nesse núcleo urbano.

Relembre-se que o arguido Gabriel Gomes possui residência em Caneças, onde o suspeito

Humberto Henriques também residiu em casa dos seus progenitores.

Foi possível ainda concluir, com base na recolha que se analisa, que entre os dias 1 e 13 de

janeiro, os contactos efetuados e recebidos são para e de cartões “descartáveis”, cuja

titularidade não se logrou apurar e que permanecem desativados desde o dia 11 de janeiro de

2017, bem como assim permanece o cartão do suspeito Humberto Henriques que ora se

analisa.

24) A fls. 230-232 encontra-se o auto de busca e apreensão relativo à residência sita na Rua da

Ganância, Buraca, Amadora, atual residência do suspeito Humberto Henriques, datado de 25

de novembro de 2017, com início às 8h 30m e termo às 10h, do qual consta, para o que ora

releva:

A diligência deu o seguinte resultado:

- dois passamontanhas pretos, nas respetivas caixas, CRIVIT

- 1 telemóvel SAMSUNG GT-S7500, com o IMEI 123456789012345, e um cartão da SEMPR’

ÓTELE

- 1 telemóvel marca SAMSUNG, GT 19300, com o IMEI 098765432109876, e um cartão de

TELE-À-MÃO;

- 1 telemóvel marca SAMSUNG S7 com o IMEI 123098456709812, sem cartão;

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- 1600 euros em 8 notas de 200 euros

- um blusão com capuz que corresponde ao usado no dia 11 de janeiro e registado nos

fotogramas.

25) A fls. 240-242 encontra-se um designado Auto de Conversa Informal, datado do mesmo dia

25 de novembro de 2017, com início às 11h e termo às 12h, subscrito pelo arguido Humberto

Henriques e o Inspetor YQY, cujo teor, em síntese e para o que releva é o seguinte:

Hoje, após a sua localização e detenção, pelas 10h 30m, foi mantida conversa informal com o

arguido Humberto Henriques, que relatou a sua versão dos factos da forma que segue:

Já trabalhou como rececionista no Hotel OLHOVIVO, três meses, em 2016, ao lado da casa da

vítima Belinda Bártolo e nessa altura via-a sair de casa, ou à janela, apercebendo-se que ela

residia no 1º esquerdo do nº 1.

Uma vez passou junto a ela viu-lhe um relógio que lhe pareceu ser de luxo e um fio em ouro,

grosso.

Em janeiro de 2017 lembrou-se de a assaltar porque precisava de dinheiro para pagar uma

dívida de droga.

Sabia que havia uma porteira que depois de almoço tinha um tempo de pausa.

Então pensou num plano: tocar à campainha do 1º esq. do prédio, onde morava a vítima, por

volta da hora da sesta, hora em que a porteira não estaria ao serviço, para não ser visto, dizer

que era para verificar a ligação do gás porque cheirava a gás nas escadas e tinha sido chamado

para fazer a vistoria, entrar, abafar a voz à velha, que não ofereceria resistência, pois quase

não conseguia andar, e um empurrão seria o bastante para que caísse e não se conseguisse

levantar, ir ao quarto dela, pois o quarto é sempre onde se guarda o ouro, e apoderar-se dele.

Pensou que era melhor levar um serralheiro de confiança para o caso de ela não abrir a porta e

a terem de arrombar.

Lembrou-se do Gabriel Gomes que era serralheiro e de confiança.

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Conhece o Gabriel há muito anos porque moravam ambos em Caneças e frequentavam os

mesmos lugares. Falou com ele. Combinaram que o trabalho seria realizado no dia 11 e na

véspera foram lá os dois ver o sítio.

No dia 11, pelas 3h da tarde, encontrou-se com o Gabriel num café perto do prédio, e depois

deslocaram-se para o nº 1 da Rua da Infelicidade.

Tudo correu como combinado: a velhota abriu a porta quando ele lhe disse que era para fazer

a vistoria do gás, entrou e colocou-lhe um pano vermelho na boca para não gritar, empurrou-a

e ela caiu de imediato e não se moveu mais.

Foi ao quarto, abriu a primeira gaveta e viu logo um cofre preto, agarrou nele e quando já

estava quase a sair deparou-se com outra velhota e teve de lhe fazer um mata-leão, que é uma

espécie de asfixia controlada, para ela desmaiar e poder sair dali sem problemas.

O Gabriel ficou cá em baixo a controlar as entradas e avisar se fosse necessário. Saiu da casa e

dirigiram-se ambos para a Avenida do Desterro, e apanharam um táxi até Caneças.

Depois ele foi para casa no seu carro.

Não teve qualquer lucro com o assalto pois entregou tudo logo nessa noite para pagar a dívida.

Só fez aquilo porque é um viciado e não consegue viver sem cocaína.

Perguntado disse não saber exatamente a identidade do individuo a quem entregou os bens.

26) A fls. 260 encontra-se o Termo de Constituição de Arguido e TIR de Humberto Henriques,

datados de 25 de novembro de 2017, às 12h 30m, dos quais se extrai, para o que ora releva,

que nasceu no dia 31 de janeiro de 1993, na freguesia dos À-dos-Larápios, concelho e distrito

de Lisboa, é filho de Humbertão Henriques e Hermínia Henriques, e reside Rua do Agoiro, nº 3,

na Buraca, Amadora.

27) A fls. 262 encontra-se um Despacho da Coordenadora de Investigação Criminal, datado de

25 de novembro, com o seguinte teor, para o que ora releva:

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Conforme resulta dos autos, no dia de hoje, 25 de novembro de 2017, foi dado cumprimento

aos mandados de detenção de Humberto Henriques, indiciado que está pelos factos em

investigação.

Determino que o mesmo seja de imediato apresentado à Exma. Procuradora do DIAP de Lisboa

para apreciação das diligências efetuadas e respetiva validação, bem como apresentação do

arguido detido a primeiro interrogatório judicial.

28) A fls. 269 consta uma cota lavrada pelo Inspetor WYW, datada de 25 de novembro de

2017, na qual fez exarar o seguinte:

Faço consignar que o arguido Humberto Henriques se encontrava detido nesta Polícia hoje, dia

25 de novembro, pelas 13h, para ser conduzido e sujeito a 1º interrogatório judicial de arguido

detido para aplicação de medida de coação e que, na sequência do pedido para usar da casa

de banho, que lhe foi concedido, se evadiu pela janela que dá acesso à Rua da Esperança,

tendo encetado fuga. Foram de imediato colocados em alerta todos os meios policiais para

captura do fugitivo.

29) A fls. 270 encontra-se despacho do MP a determinar a extração de certidão dos autos para

investigação do crime de evasão.

30) A fls. 275-277 consta o seguinte requerimento apresentado em 27 de novembro de 2017

pelo arguido Humberto Henriques, subscrito pelo mandatário Jacinto Jácome, que juntou a

competente Procuração outorgada em seu nome pelo arguido, dirigido ao Juiz de Instrução

Criminal:

“Exmo. Senhor Juiz de Instrução Criminal

A defesa do arguido Humberto Henriques vem requerer a apreciação da seguinte nulidade:

Ao arguido foram tomadas declarações sem assistência de defensor.

As suas declarações, sem Defensor, são preponderantes para lhe imputar a responsabilidade

pelos factos dos autos. Porém, o arguido não se revê nessas declarações, que não proferiu e

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não correspondem à verdade, tendo sido adulteradas por quem as exarou, sendo certo que as

assinou, sem possibilidade de as ler, a mando do Inspetor YQY, e assinou-as na convicção que

estava a subscrever o teor das suas verdadeiras declarações. O arguido vem, pois, arguir a

nulidade das declarações assim prestadas, mais solicitando que as mesmas sejam

desentranhadas do processo.

Em face do exposto, requer que seja declarada a nulidade de todo o processado que a si

respeita com as legais consequências e desentranhamento dos autos.

1 - Considere que:

- o arguido Humberto Henriques ainda se encontra em paradeiro incerto;

- não existiram quaisquer outras diligências ou outros elementos de prova com relevo para o Inquérito;

- com a eventual exceção da questão expressamente colocada em crise pelo arguido Humberto Henriques (o que se diz sem que se possa ou deva extrair qualquer indício positivo ou negativo de tomada de posição quanto à mesma), todas as demais formalidades, porventura omissas do enunciado, se encontram cumpridas.

2 - Elabore o Despacho de Encerramento de Inquérito, tomando desde logo posição sobre o requerimento apresentado pelo arguido Humberto Henriques no Processo, a fls. 275-277.