Prospecção para definição do modelo geológico-geotécnico

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    CAPÍTULO 3 

    PROSPECÇÃO PARA DEFINIÇÃO DO MODELO GEOLÓGICO-GEOTÉCNICO 

    3.1 DIMENSIONAMENTO DA PROSPECÇÃO PARA INVESTIGAÇÃO

    “Um bom modelo geológico permite aos geólogos e engenheiros envolvidos no Projecto

    compreender as interacções dos diversos componentes que constituem a crusta terrestre e

    tomar decisões técnicas racionais baseadas nessa compreensão. Em empreendimentos em

    que não exista um modelo geológico adequado, apenas podem ser tomadas decisões ”ad hoc”

    e o risco de problemas na construção devidos a condições geológicas não previstas é muito

    elevado.” (Hoek, 1999).

    Tendo em vista a definição dos traçados dos túneis, é recolhida informação fundamental nos

    trabalhos de cartografia geológica já referidos no capítulo anterior. No entanto, no decorrer eaprofundar dos conhecimentos e exigências do projecto, tornam-se necessários novos

    trabalhos que permitam obter indicações sobre o que se passa abaixo da superfície. Esses

    trabalhos, designados por prospecção, tais como métodos geofísicos, sondagens, poços e

    galerias, devem ser encaminhados de forma a, por um lado, permitir completar o modelo

    geológico nos pontos onde existam dúvidas não esclarecidas pelo reconhecimento geológico

    de campo, e por outro lado, facilitar a realização de ensaios in situ e a obtenção de amostras

    para ensaios laboratoriais (Galera Fernández, 2000). As campanhas de prospecção podem

    trazer grandes benefícios para a caracterização do maciço onde se pretende executar a obra,

    desde que não sejam impedidas por restrições ambientais, especificações ou complicadas

    condicionantes de execução. A cartografia geológica de superfície, com a inerente informaçãoprévia do local e condições geológicas regionais, assim como os acessos e o objectivo do

    Projecto são condicionantes para o planeamento da campanha de prospecção (Quiralte López,

    1998). No Quadro 3.1, representa-se a influência do meio geológico e do relevo no

    planeamento da prospecção para túneis.

    Os objectivos principais dos trabalhos de prospecção, tendo em vista o projecto de uma obra

    subterrânea, são a obtenção de:

    - dados para apoio na definição e/ou pormenorização do modelo geológico;

    -

    uma base para avaliação de potenciais problemas de instabilidade e para obtenção dosparâmetros necessários para a análise de estabilidade e dimensionamento dos suportes

    e revestimentos;

    - uma base para avaliação do custo e preparação dos elementos para concurso.

    Como referido por Lombardi (2001), a quantidade de trabalhos de investigação a desenvolver é

    estabelecida fundamentalmente por uma aceitável relação benefício/custo. Este exercício

    pode-se tornar demasiado arriscado, não tanto por o custo dos trabalhos de prospecção estar

    subestimado, mas pelo facto de os benefícios da prospecção serem, por definição, indefinidos.

    Ou seja, com frequência só pode ser decidido se os benefícios dos trabalhos de prospecção

    foram ou não válidos após estar concluída a campanha de prospecção prevista.

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    CAPÍTULO 3 - PROSPECÇÃO PARA DEFINIÇÃO DO MODELO GEOLÓGICO-GEOTÉCNICO

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    Quadro 3.1 - Influência do meio geológico e do relevo, na planificação de campanhas de prospecção para túneis(Quiralte López, 1998).

    MEIOGEOLÓGICO

    CARACTERÍSTICAS INFLUÊNCIA DA PROSPECÇÃO 

    Rochassedimentares emetamórficas deorigem sedimentar.

    Formações relativamenteuniformes sobre áreasgeralmente extensas.Estruturas definidas eestratificadas. Rochas deorigem marinha geralmentemais uniformes e contínuasque as de origem continental.

    Maior fiabilidade na extrapolação e interpretação tanto emplanta como em profundidade. Relativamente menor volume deprospecção. Bastante utilidade das sondagens.

    Rochas ígneasextrusivas

    Maior variação litológica queas rochas sedimentares.Estrutura estratificada.

    Relativa fiabilidade na interpretação entre pontos e emprofundidade dependendo da origem, por ex. rochas basálticaspermitem maior homogeneidade na extrapolação que emrochas riolíticas. Necessidade de sondagens abundantes.Difícil interpretação de técnicas geofísicas.

    Rochas ígneasintrusivas

    Grande variação tantolitológica como na geometria

    dos corpos intrusivos.

    Maior dificuldade de interpretação e extrapolação que no resto.Difícil delimitação geométrica dos limites dos corpos intrusivos.

    Bastante utilidade da Geofísica. Alinhamentosestruturais

     Acidentes tectónicos. Tipo dedobras e orogenia.

    Maior dificuldade na interpretação e extrapolação de estruturasque em formações litológicas. Necessidade de sondagens.

    Relevo baixo Túneis superficiais. Coberturainferior a 100m.

    Baixo custo relativo das sondagens. Bastante utilidade dageofísica.

    Relevo moderado Túneis intermédios. Coberturade 100 a 500m.

     Alto custo das sondagens. A campanha de prospecçãodepende dos acessos.

    Relevo acidentado Túneis profundos. Coberturasuperior a 500m.

    Condições adversas da prospecção, custo muito alto dassondagens. Acessos muito difíceis. Grande parte do trabalhobaseia-se em fotografia aérea e geologia de superfície.

    Está pois implícito no dimensionamento de uma campanha de prospecção uma grande parte

    de bom senso e intuição. O custo do acréscimo do comprimento de uma sondagem poderá nãotrazer benefícios quando se tem em vista, por exemplo, a pormenorização do dimensionamento

    do revestimento de um túnel de pequeno diâmetro (Lombardi, 2001), entretanto, se esse

    mesmo acréscimo de furação detectar uma zona de falha crítica para a estabilidade, então o

    investimento ter-se-á justificado. Salienta-se ainda que, o custo da prospecção profunda para a

    implantação de uma caverna poderá permitir ajustar a sua localização de forma a evitar que

    esta seja intersectada por um alinhamento geológico com características desfavoráveis à sua

    abertura, e, assim, permitir um decréscimo dos volumes de sustimento a aplicar.

    Mas afinal qual o volume de prospecção adequado para uma determinada obra subterrânea?

    Na realidade, apesar das tentativas de optimização e de estabelecimento de relaçõesbenefício/custo, o dimensionamento da prospecção acaba por ser decidido tendo por base o

    senso comum e a intuição adquiridos com a experiência (que posteriormente se vêm a verificar

    errados ou certos), mas também dependendo do suposto grau de incerteza e do objectivo da

    campanha de prospecção, relacionado com aspectos contratuais e procedimentos. Não

    existem regras, básicas ou profundas, para o dimensionamento da prospecção. A verdade é

    que são mais frequentes os casos de obra em que após construção se considera que mais

    prospecção teria permitido uma diminuição dos custos e dos prazos do que o contrário, isto é,

    casos em que se considerou a prospecção excessiva (Lombardi, 2001).

    Contudo, existe um limite razoável para os trabalhos a desenvolver na fase de projecto, que se

    prende com a necessidade que a equipa projectista tem em obter conhecimento sobre as

    formações geológicas, de forma a não estar limitada na caracterização global das formações

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    OBRAS SUBTERRÂNEAS - ASPECTOS DA CONTRIBUIÇÃO DA GEOLOGIA DE ENGENHARIA NA CONCEPÇÃO E PROJECTO

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    onde serão realizadas as escavações, bem como de forma a poder diminuir a quantidade de

    incertezas iniciais. A título de orientação, segundo Galera Fernández (2000), a experiência

    parece indicar que, para um túnel de dificuldade média, se poderá aceitar, como valor

    orientador, que o comprimento total das sondagens seja superior a 50% da dimensão

    longitudinal do túnel. Hoek e Palmieri (1998), tendo por base dados de 84 túneis, coligidos pela

    U.S. National Committee on Tunnel Technology (USNCTT, 1984), concluem que um volume

    inadequado de prospecção por sondagens resulta num aumento significativo do custo da obra

    (Figura 3.1). Esses acréscimos estão claramente associados a dificuldades derivadas de

    imprevistas condições geológicas adversas.

    Figura 3.1 - Variação do custo da obra em função do comprimento acumulado de sondagens (Hoek e Palmieri, 1998).

    No entanto, no âmbito das obras subterrâneas, o recurso a trabalhos de prospecção não se

    verifica apenas na fase de projecto. Muitas vezes é também necessário, já no decurso da

    escavação, o recurso a sondagens ou métodos sísmicos para aprofundar o conhecimento domaciço na frente de escavação e, consequentemente, diminuir o grau de incertezas sobre o

    que se irá encontrar para lá dessa frente. O modelo geológico é uma ferramenta dinâmica que

    vai mudando à medida que aumenta a informação. Num empreendimento subterrâneo o maior

    volume de informação aparece no decurso da escavação. O modelo geológico é

    continuamente refinado à medida que se avança pelas diferentes fases do Projecto (Hoek,

    1999).

    Carvalho (1981), tendo por base diversos estudos e obras, realizados até 1981 em Portugal e

    no Brasil, refere que em relação ao custo total de trabalhos realizados no âmbito da geologia

    de engenharia para obras subterrâneas, até 10% é aplicado em métodos geofísicos, 40 a 80%

    em sondagens com ensaios de permeabilidade, até 25% em ensaios in situ, 1 a 5% em

    ensaios laboratoriais e 10 a 25% nos honorários dos técnicos.

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    CAPÍTULO 3 - PROSPECÇÃO PARA DEFINIÇÃO DO MODELO GEOLÓGICO-GEOTÉCNICO

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    No Quadro 3.2, apresentam-se os tipos de prospecção passíveis de utilizar nas diversas fases

    dos trabalhos a desenvolver para o Projecto de obras subterrâneas.

    Quadro 3.2 - Tipos de prospecção a desenvolver nas diferentes fases de Projecto de obras subterrâneas (baseado em

    Quiralte López, 1998).

    Fase doProjecto

    Tarefa Conteúdo

    Sondagens muito espaçadasProspecção

    GeofísicaI - Preliminar aEstudo Prévio

    Interpretação Mapas e cortes geológicos (1:25000 a 1:10000)

    Sondagens

    Poços ou trincheiras

    GeofísicaProspecção

    Ensaios in situ 

    Mapas e cortes geológicos (1:10000 a 1:1000) (#)Definição do modelo

    geológico-geotécnico Propriedades geomecânicas

    II - Projecto

    Integração nodimensionamento

    Comunicação e colaboração com restantes colaboradores no projecto

    Cartografia geológica eclassificação do maciço

    No interior do túnel

    Galerias de reconhecimentoProspecção

    Sondagens em avanço

    Ensaios in situ Instrumentação

    Monitorização

    Interpretação Comparação com dados de projecto, revisão e adaptação do projecto

    III - Construção

    Integração na construção Seguimento e implementação de medidas construtivas e/ou correctivas

    (#) Dependendo, por vezes, também da extensão do túnel. 

    3.2 PROSPECÇÃO GEOFÍSICA

    Os métodos geofísicos são métodos disponíveis de prospecção indirecta. A prospecção

    geofísica permite obter medidas de fenómenos físicos à superfície ou em furos. Os dados

    obtidos são convertidos para calcular as propriedades geométricas e físicas da subsuperfície. A

    selecção dos métodos apropriados, a proposta de métodos adequados para interpretação dos

    dados, e os procedimentos de interpretação requerem os serviços de especialistas em

    geofísica. Estes métodos de prospecção não destrutiva têm custos relativamente baixos.

     Assim, se existir uma base razoável que permita a definição de um modelo do terreno parainterpretar a resposta obtida, a investigação geofísica pode ser um complemento valioso à

    cartografia geológica e às sondagens. São métodos que têm sempre uma grande margem de

    erro na interpretação, não devendo por isso ser utilizados como único método de prospecção.

     A geofísica permite determinar a espessura de depósitos recentes, contactos entre litologias de

    características muito contrastantes, espessuras de alteração, zonas de esmagamento, e o

    módulo de deformabilidade dinâmico dos maciços, que varia com a fracturação. São muito

    adequados para extrapolação dos resultados obtidos pela observação de testemunhos de

    sondagens e de afloramentos. Podem ser utilizados debaixo de água e em terra. A

    interpretação, sempre que possível, deve basear-se na geologia local.

    São diversos os métodos geofísicos aplicados em prospecção: o radar, os métodos eléctricos,

    a prospecção electromagnética, os métodos magnéticos, os métodos gravimétricos e a

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    prospecção sísmica. Os métodos mais utilizados na prospecção geológico-geotécnica de uma

    obra subterrânea são os eléctricos, os electromagnéticos e os sísmicos. Os métodos eléctricos

    e os electromagnéticos proporcionam um sistema muito adequado na detecção e

    caracterização de zonas de falha, enquanto que os métodos sísmicos têm mais versatilidade

    de aplicação (Galera Fernández, 2000).

    3.2.1 Métodos Sísmicos

    Entre os diversos métodos de prospecção geofísica, os métodos sísmicos têm sido os mais

    utilizados nos domínios da geotecnia e geologia de engenharia, tanto devido à correlação

    existente entre os parâmetros sísmicos e as características mecânicas e físicas dos maciços,

    como devido à sua simplicidade de aplicação (Coelho, 2000). Por essa razão, optou-se por

    aprofundar esta metodologia.

     A prospecção geofísica por métodos sísmicos utiliza a medição do tempo que um determinadosinal sísmico demora a percorrer uma distância conhecida, permitindo estimar o grau de

    ripabilidade das formações, a geometria dos diferentes horizontes de terrenos e a detecção de

    falhas, etc.

     Aplicados a partir da superfície do terreno têm várias limitações e frequentemente

    interpretações ambíguas. Uma das limitações prende-se com a presença de terrenos ou

    materiais de cobertura de maior velocidade, sobrejacentes aos horizontes que se quer

    prospectar. Nesta situação, grande parte da energia sísmica gerada à superfície é atenuada

    nesta camada, impedindo a penetração da energia até aos níveis pretendidos. Esta limitação

    tem sido uma das principais razões por que se obtêm resultados mais credíveis com osmétodos sísmicos em e entre furos de sondagem, tornando-se possível uma maior resolução

    destes métodos na determinação dos parâmetros sísmicos na região mais profunda do maciço,

    acedida pelos furos, dado que as ondas sísmicas percorrem percursos mais curtos e, como tal,

    sofrem menor atenuação, para atingir esses alvos. Uma interpretação mais real deverá ser feita

    relacionando os resultados da prospecção geofísica com os elementos de cartografia geológica

    (Coelho, 2000).

    É, no entanto, a aplicação do método à superfície que muitas vezes irá permitir o

    dimensionamento da campanha de sondagens de uma forma mais refinada, pois o

    investimento será aplicado criteriosamente nas zonas onde os resultados dos perfis sísmicosindicarem as possíveis anomalias geológicas. Pelo contrário, e como é evidente, a aplicação do

    método entre furos necessita que a furação anteceda a geofísica.

    Em meios urbanos, a grande dificuldade de aplicação da prospecção geofísica por métodos

    sísmicos prende-se com a baixa fiabilidade dos resultados obtidos. Para a execução deste tipo

    de prospecção é fundamental que não existam ruídos nem vibrações nas imediações,

    devendo, por isso, estes trabalhos ser realizados de noite e com o tráfego interditado. Também

    para a obtenção de resultados fiáveis, é fundamental que sejam conhecidas todas as infra-

    estruturas recentes e antigas, mas também que seja considerada a espessura dos pavimentos.

    Os métodos sísmicos aplicados entre furos permitem ultrapassar algumas destas dificuldades,

    prospectando apenas em profundidade, onde as infra-estruturas e pavimentos não influenciam

    os resultados. São no entanto mais onerosos que os ensaios sísmicos de superfície.

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    Em meios não urbanos, a dificuldade na aplicação destes métodos à superfície, por meio de

    perfis, prende-se com a morfologia dos terrenos, pois, para que os resultados sejam de fácil

    interpretação, é fundamental encontrar um alinhamento aproximadamente rectilíneo para

    implantação do perfil sísmico. De realçar também que a realização de um perfil de prospecçãogeofísica por métodos sísmicos necessita ser precedido de desmatação quando a densidade

    de vegetação o exige.

    3.2.1.1 Descrição do método

    O método sísmico utiliza a propagação de ondas elásticas ou sísmicas, em três dimensões,

    através do terreno, ou seja, a transmissão através do terreno do movimento ondulatório que

    produz uma fonte de energia aplicada num ponto (Figura 3.2) e que se regista numa série de

    sensores alinhados com essa fonte (Clayton et al., 2000). Num meio homogéneo, isotrópico e

    em equilíbrio estático, de volume infinito, sobre o qual actua uma força de direcção obliqua àsua superfície, esta força pode ser decomposta em duas componentes, uma perpendicular à

    superfície (tensão normal), que tende a aumentar com a distância, e outra tangencial, que

    tende a fazer girar o elemento, recebendo o nome de tensão de corte. As tensões normais

    produzem variações do volume na direcção dos eixos e são designadas por ondas de

    compressão, ou ondas longitudinais (visto fazerem vibrar as partículas do terreno na mesma

    direcção do raio da onda), ou ondas P (primárias - porque são as primeiras a serem registadas

    nos terramotos). As tensões de corte produzem alterações de forma sem modificação do

    volume e designam-se por ondas de corte, ou transversais (por fazerem vibrar as partículas de

    terreno perpendicularmente à direcção da propagação), ou ondas S (secundárias - porque são

    o segundo evento a ser observado no registo de um terramoto). Assim, para as ondas P omovimento das partículas é paralelo ao eixo de propagação, enquanto que, para as ondas S, é

    perpendicular ao eixo de propagação. Próximo da superfície podem ainda ser detectadas as

    ondas Rayleigh, que são ondas de superfície que se propagam a velocidades ligeiramente

    inferiores às ondas S e as ondas Love, que são geradas entre dois materiais de diferentes

    propriedades elásticas (Clayton  et al., 2000). Na Figura 3.3 representa-se de forma

    esquemática o comportamento das partículas constituintes do solo quando este é atravessado

    por cada um dos tipos de ondas sísmicas. 

    3.2.1.2 Determinação de parâmetros do terreno

     A velocidade de propagação das ondas sísmicas nos maciços depende fundamentalmente das

    características mecânicas, da meteorização, da fracturação, da porosidade, da litologia, da

    profundidade, das tensões e dos fluídos intersticiais. Dado que as ondas P são as de maior

    velocidade, e, por isso, as primeiras a ser detectadas pelos geofones, são também as mais

    utilizadas pela prospecção geofísica por métodos sísmicos. No entanto, dado que apresentam

    algumas limitações quando utilizadas a cotas próximas da superfície, tem havido, nos últimos

    anos, uma concentração no desenvolvimento de técnicas que permitam uma melhor utilização

    das ondas S que, apesar da dificuldade da sua detecção visto chegarem após as ondas P,

    sabe-se apresentarem uma maior amplitude, permitindo assim a sua melhor identificação

    (Clayton et al., 2000).

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    Figura 3.2 - Utilização de martelo como fonte geradora de diferentes tipos de ondas como método simples de produzirenergia em prospecção sísmica de pouca profundidade. P - ondas primárias; SHH  - ondas secundárias; SV  - ondassecundárias verticalmente polarizadas; SHV - ondas secundárias horizontalmente polarizadas (Clayton et al., 2000).

    Figura 3.3 - Tipos de ondas sísmicas ou elásticas: a) onda de compressão ou onda P; b) onda de corte ou onda S;c) onda de superfície Rayleigh (Borm, 1990, in Ferreira, 1992). 

     A propagação de uma determinada onda P obedece à Lei de Snell (Figura 3.4). Essa onda,

    gerada por um impulso instantâneo, propaga-se a uma determinada velocidade V1 no

    horizonte de terreno H1 mais superficial. Quando encontra o horizonte de terreno H2, com

    propriedades de terreno distintas (ou seja, uma descontinuidade), produz-se uma reflexão e

    uma refracção. A propagação da onda P refractada passa então a possuir uma velocidade

    V2=V1x(sin r)/(sin i). Um raio, que incide numa descontinuidade com um ângulo i, reflecte com

    um ângulo simétrico e refracta com um ângulo r.

    Raio incidente Raio reflectido

    Raio refractado

    Figura 3.4 - Lei de Snell (Merchán e Higueras, 2000). 

    Enquanto que as ondas P se propagam tanto pelos componentes sólidos do terreno, como pela

    água contida nos poros, as ondas S apenas se propagam pelo solo, visto que a água não

    apresenta resistência ao corte. É portanto fundamental saber se o solo está ou não saturado

    a) b) c)

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    quando da realização de ensaios de determinação da velocidade das ondas P (Vp), ou saber

    se a densidade dos terrenos que se pretende ensaiar é garantidamente superior à da água.

    Visto que, em maciços rochosos pouco alterados e pouco fracturados, a velocidade de

    propagação das ondas P é claramente superior à da velocidade de propagação na água, não énecessária esta preocupação (Clayton et al., 2000).

    Tornou-se prática corrente a caracterização mecânica e dinâmica dos maciços rochosos

    através da utilização de correlações entre a velocidade de propagação das ondas e certos

    parâmetros geotécnicos (Ferreira, 1992).

     A análise do comportamento elástico linear de um terreno é possível a partir da velocidade de

    propagação das ondas S (Vs), que é função do módulo de elasticidade transversal do terreno

    modificado pelo seu estado de fracturação, dado que as deformações produzidas pelas ondas

    sísmicas (não se considerando as produzidas pelos terramotos) são muito reduzidas.

     /  ρGoVs   =   (3.1)

    em que Vs - velocidade das ondas S,

    Go - módulo de elasticidade transversal para deformações muito pequenas,

     ρ  - massa volúmica do terreno.

    Dado que a massa volúmica dos terrenos não é muito variável, (1600kg/m 3  para um solo e

    3000kg/m3  para uma rocha densa), a variação da velocidade das ondas S é um óptimo

    parâmetro, tendo em vista a determinação do módulo de elasticidade transversal (ou módulo

    de rigidez) para muito pequenas deformações dos terrenos (da ordem dos 10 -7), limite para o

    qual ainda se poderá admitir um comportamento perfeitamente elástico para o terreno.

    Também a velocidade das ondas P (Vp) se pode correlacionar com as propriedades elásticas

    do terreno por:

    Ε  /  ρVp )2  ρ(1

     )-Ε (12   ≈=

    −−   ν ν 

    ν 

      (3.2)

    em que Vp - velocidade das ondas P,

    E - módulo de elasticidade dinâmico para pequenas deformações,

    ν  - coeficiente de Poisson, ρ  - massa volúmica do terreno.

    É ainda possível, conhecendo a velocidade de propagação das ondas P, estimar a qualidade

    do maciço a partir da correlação Vp(km/s) ≈  logQ+3.5 (Barton, 2000), em que Q é o índice de

    qualidade do maciço obtido da classificação de Barton (cf. Capítulo 4).

    3.2.1.3 Método de refracção

    Na prospecção geofísica por métodos de refracção sísmica são registadas nos geofones,

    colocados à superfície do terreno, as ondas de refracção total, ou seja, as ondas refractadascujo ângulo de refracção r é igual a 90º. Isso implica que, pela lei de Snell, V2>V1, pelo que, a

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    sísmica de refracção não detecta horizontes de baixa velocidade (menos densos), sob

    horizontes de velocidades mais elevadas (mais densos) o que dificulta o trabalho de

    investigação geofísica de pouca profundidade, onde frequentemente se encontram zonas

    bastante heterogéneas (Ferreira, 1992) (Figura 3.5).

     A prospecção geofísica, por meio da sísmica de refracção, mantém-se insuficiente para atingir

    profundidades de investigação superiores a 35m sem perda de características de resolução,

    não sendo, portanto, adequada à prospecção de maciços para túneis profundos.

    Ondas reflectidas

    Refracção Total

    Sem Refracção Total

    Refracção Total

     Figura 3.5 - Inversão de velocidades em refracção e reflexão. A refracção não se verifica de V2 para V3 (Merchán eHigueras, 2000).

    3.2.1.4 Método de reflexão

     A prospecção geofísica por métodos de reflexão não tem as limitações impostas pela lei de

    Snell para os métodos de refracção, parecendo ser sempre exequível a detecção de horizontes

    de menores densidades sob horizontes de maiores densidades. É uma técnica que tem vindo a

    ser aplicada com bons resultados, tendo em vista a construção de túneis a médias e grandesprofundidades (Attewell, 1995).

    Utilizando uma técnica já há muito conhecida na indústria petrolífera, adaptada à geotecnia

    (desde 1984), é possível, com a sísmica de reflexão, atingir os mesmos objectivos da técnica

    de refracção, com a vantagem de ser possível alcançar profundidades de investigação de 700

    a 1000m, obtendo-se a estrutura geológica do maciço que se pretende atravessar com o túnel,

    detectando-se as falhas presentes na zona, contactos, etc., e, ainda, com a vantagem de se

    poderem detectar os horizontes de velocidades menores que os sobrejacentes. A sísmica de

    reflexão na indústria petrolífera desenvolve as suas investigações a profundidades que oscilam

    entre os 800 e 6000m. Estando limitado o campo de investigação da prospecção geotécnicasubterrânea até cerca dos 1000m de profundidade, foi necessário adaptar a sísmica de

    reflexão, tendo então surgido a Sísmica de Reflexão de alta resolução aplicada à Geotecnia,

    notando-se uma diferença notável na aplicação de campo e tratamento em relação à técnica

    que lhe deu origem (Merchán e Higueras, 2000). Ainda no domínio da engenharia civil, mas

    também no de engenharia de minas, hidrogeologia e geologia estrutural, o método de reflexão

    sísmica também tem vindo, desde os anos 80, a ser aplicado especialmente para prospecção a

    pequenas profundidades, com o principal objectivo de determinar interfaces entre sedimentos e

    substractos rochosos (Oliveira, 1998).

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    CAPÍTULO 3 - PROSPECÇÃO PARA DEFINIÇÃO DO MODELO GEOLÓGICO-GEOTÉCNICO

    34 

    3.2.1.5 Ensaios sísmicos em furos: “cross-hole”, “down-hole”, “up-hole” e tomografia.

    Podem ser realizados ensaios sísmicos entre furos (“cross-hole”) (Figura 3.6), ou entre um furo

    e a superfície. No segundo caso podem ser ensaios “down-hole”, em que são produzidas

    fontes sísmicas à superfície e detectadas em vários pontos do furo, ou “up-hole”, em que a

    geração de energia se dá no interior do furo de sondagem e a detecção se faz na superfície.

    No uso destes métodos é fundamental que a interpretação dos resultados seja realizada em

    conjunto com os diagramas das sondagens efectuadas para o efeito, dado que, por vezes, as

    ondas sísmicas se propagam por zonas de maiores velocidades, podendo conduzir a

    interpretações não adequadas (Clayton et al., 2000).

    receptor Fonte sísmica

    Figura 3.6 - Cross-hole. Ondas sísmicas propagam-se numa zona de maiores velocidades (V2), o que poderá resultarnuma falsa interpretação dos resultados, caso não se faça, simultaneamente, uma correcta interpretação dosresultados das amostras das sondagens BH (Pinches and Thompson, 1990, in Clayton et al., 2000). 

    O método sísmico de prospecção entre furos (Figura 3.7) ou entre um furo e a superfície

    (Figura 3.8) permite, ainda, a elaboração de tomografia de velocidades sísmicas, que, segundo

    Clayton et al. (2000), é um método muito útil por duas razões:

    - pode fornecer informação da variabilidade geral numa determinada área e, por

    inferência, permitir uma abordagem qualitativa sobre a variabilidade das propriedades,

    como a deformabilidade e a resistência; particularidades como vazios, fracturas,

    camadas de rochas e bolsadas, que são difíceis de detectar com técnicas pontuais,

    como sondagens, são passíveis de identificação;

    - pode ser usada para fornecer valores do G0 ou Gmáx.

    3.3 PROSPECÇÃO MECÂNICA

    Os métodos para observação directa do terreno variam com o tipo de terreno, a extensão da

    zona a prospectar e a profundidade da obra. Os meios mais frequentes são valas, trincheiras,

    poços, sondagens, e galerias em zonas escarpadas ou outras situações particulares.

     A prospecção deverá ser dimensionada tendo em conta o objectivo de eliminar incertezas que

    foram levantadas nas fases anteriores dos estudos realizados com base nos dados de

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    OBRAS SUBTERRÂNEAS - ASPECTOS DA CONTRIBUIÇÃO DA GEOLOGIA DE ENGENHARIA NA CONCEPÇÃO E PROJECTO

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    superfície e prospecção indirecta, pois é impraticável que a campanha de prospecção seja

    constituída por uma malha de sondagens apertada.

    Figura 3.7 - Esquema representativo de um estudo de tomografia sísmica entre furos de sondagem (Ferreira, 1992).

    falha

    Superfície

    Furo

     Figura 3.8 - Esquema representativo de um estudo de tomografia sísmica entre um furo e a superfície, em que foidetectada uma falha (Clayton et al., 2000). 

    Os poços costumam ser usados em solos ou para prospecção pouco profunda. As sondagens

    são utilizadas em qualquer tipo de formação e qualquer que seja a profundidade da obra.

    Em zonas de cobertura reduzida, como no caso de túneis urbanos ou zonas de

    emboquilhamento, poderá ser útil a realização de prospecção mecânica ligeira, como poços ou

    trincheiras. Este método de prospecção poderá ainda permitir a realização de alguns ensaios e

    a recolha de amostras superficiais, ou mesmo a detecção de contactos geológicos ocultos

    pelos terrenos de cobertura. Não é, no entanto, um método de prospecção que permita atingir

    grandes profundidades, estando as suas limitações condicionadas pelo braço das

    escavadoras, geralmente utilizadas para o efeito.

    Sondagens à rotação, com recolha contínua de amostras, são o método de prospecção directa

    mais amplamente utilizado na geologia e geotecnia. A sua grande vantagem prende-se com a

    possibilidade de observação directa das características do maciço a estudar. Além disso

    permitem (Quiralte López, 1998):

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    CAPÍTULO 3 - PROSPECÇÃO PARA DEFINIÇÃO DO MODELO GEOLÓGICO-GEOTÉCNICO

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    - atingir maiores profundidades,

    - a realização de ensaios,

    - a recolha de amostras,

    - a identificação de características hidrogeológicas,

    - obter medidas indirectas da dureza e fracturação do maciço.

    Por estas razões serão adiante tecidas algumas considerações sobre este método de

    prospecção e a sua utilização nos projectos em meios urbanos e não urbanos.

     As galerias de reconhecimento geológico, apesar de dispendiosas, permitem (Quiralte López,

    1998):

    - investigação de pormenor em zonas particulares,

    - a realização de ensaios particulares,

    - a instrumentação, controlo, drenagem, ventilação e injecções.

    Serão referidas como meio de prospecção em projectos subterrâneos com particularidades

    específicas.

    3.3.1 Sondagens

    Furar o maciço recolhendo amostras permite registar as características geológico-geotécnicas

    que interessam à obra subterrânea. Outros métodos de furação que não impliquem a obtenção

    de amostras não são geralmente adequados, porque a amostra é essencial como meio decaracterização do maciço, excepto quando é necessária a realização de trabalhos muito

    específicos. Mesmo assim é importante que existam na mesma campanha de prospecção

    sondagens com amostragem. O custo de uma sondagem na prospecção de um túnel é sempre

    gasta quer ela seja feita quer não.

    O testemunho de sondagem, obtido pelo amostrador do equipamento utilizado para a

    realização desta, geralmente não excede os 3 metros de comprimento. Em Geologia de

    Engenharia, a parte mais importante da amostragem é, geralmente, a relacionada com as

    piores características do maciço, ou seja, zonas de fracturação intensa ou zonas de falha com

    preenchimentos argilosos. Estas zonas de piores características geotécnicas, precisamente asque mais interessa caracterizar para o projecto subterrâneo, dificilmente são obtidas se as

    técnicas de amostragem forem imperfeitas. Para garantir uma boa amostragem, o mínimo que

    o amostrador deverá ser é um amostrador duplo. Por vezes, é também usada bentonite para

    permitir obtenção de amostragem em maciços de difícil recuperação. No entanto é necessário

    muito cuidado na utilização destas argilas, que podem mascarar as amostras mais alteradas.

    Cuidados especiais devem ser tidos aquando da retirada dos testemunhos do amostrador, mas

    também na escolha do diâmetro da amostra, pois um testemunho com pequeno diâmetro parte

    com alguma facilidade e as fracturas, originadas pela furação em diaclases potenciais, são

    difíceis de distinguir das diaclases existentes.

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    Uma outra forma de minimizar a perda de amostra, é usar um amostrador relativamente curto,

    para evitar a fracturação da amostra ao penetrar o amostrador e o desgaste proveniente do

    contacto entre testemunho dentro do amostrador.

    Para sondagens com várias centenas de metros, necessárias na prospecção para projectos deobras subterrâneas profundas, a retirada do amostrador torna-se morosa e custosa, parecendo

    ser desejável um amostrador mais comprido. Uma solução para este problema, será usar o

    sistema de furação ”wire-line”, em que o amostrador pode ser içado por um cabo através do

    interior oco das barras de furação, que só necessitam ser retiradas caso seja necessário

    substituir o “bit” dessa furação (Johnson e DeGraff, 1988). Este tipo de prospecção apresenta,

    no geral, custos elevados e está associado a empreitadas de longa duração, sendo portanto

    limitado o seu emprego. Em sondagens que ultrapassem os 200m, parece razoável fazer um

    controlo do posicionamento da sondagem pelo seu desvio (Galera Fernández, 2000) (Figura

    3.9).

    Figura 3.9 - Equipamento de Eastman muitishot® para controlo do desvio de sondagem (Diez López, 2000).

     A realização de sondagens com recolha contínua de amostra, mesmo tratando-se de

    sondagens de pouca profundidade (dezenas de metros), requer equipamento pesado, ou seja

    de grandes dimensões. Em meios urbanos nem sempre é fácil a montagem de tal

    equipamento, não se conseguindo instalar onde se pretende, ou transtornando o tráfego

    normal de uma cidade. Atendendo, no entanto, às coberturas mais vulgares dos túneis

    urbanos, é normalmente possível prospectar até profundidades que ultrapassem as soleiras

    dos túneis (Figura 3.10).

     Atendendo às maiores profundidades a que os túneis são construídos em meio não urbano, assondagens só pontualmente atingem a zona do túnel. O recurso à prospecção mecânica tende

    a concentrar-se em zonas de potenciais falhas e nos emboquilhamentos, local onde

    geralmente é possível atingir a obra (Figura 3.11).

    Nas sondagens, quer carotadas quer destrutivas, há sempre o interesse em executar vários

    tipos de registos, ensaios in situ  (diagrafias, ensaios de permeabilidade), filmagem por

    câmaras, etc., de forma a rentabilizar o investimento. Em solos é frequente realizarem-se

    ensaios de penetração.

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    Figura 3.10 - Perfil geológico de um túnel em meio urbano em que as sondagens (S) ultrapassam a soleira daescavação. Linha Amarela do Metropolitano de Lisboa (Melâneo, 2000).

    Figura 3.11 - Perfil geológico de uma obra subterrânea em meio não urbano, em que a maioria das sondagens nãoatinge o túnel. Aproveitamento de Fins Múltiplos do Caldeirão, túnel de derivação Mondego-Caldeirão (adaptado deNeiva et al., 1994).

     A realização de sondagens requer sempre a elaboração do seu diagrama (“log”). Nesse

    diagrama deverá ficar registado:

    - a identificação da sondagem;

    - pormenores do contrato, local, coordenadas, cota, orientação e inclinação;

    - método de furação, amostragem e dados do equipamento;

    - registo da progressão da furação, com particular ênfase para a localização de ensaios ou

    recolha de amostras intactas;

    - registo da profundidade do nível freático e variações dos caudais de furação;

    - descrição geológica pormenorizada, que deverá incluir, além da descrição litológica, o

    grau de alteração, cor, granularidade ou granulometria;

    ESCALA

    S

    S SS S

    S S SS

    S S SS

    S

    S S SS S S S

    S S

    S

    S

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    - grau de alteração e fracturação;

    - recuperação e RQD.

    3.3.2 Galerias de Reconhecimento

     As galerias de reconhecimento geológico são realizadas para a prospecção de obras

    subterrâneas apenas para situações muito particulares, e após a análise de toda a informação

    obtida pela prospecção realizada anteriormente. Quando a síntese dessa informação conduz a

    uma incerteza que poderá implicar custos elevados para a obra, por exemplo no caso do

    projecto de uma caverna, o custo da execução deste tipo de prospecção será um investimento

    cujo benefício é elevado.

     As galerias são de grande interesse para a avaliação das características geológicas e

    hidrogeológicas, mas também para a obtenção de características in situ, como as da

    fracturação, difíceis de avaliar pelas sondagens e pela prospecção geofísica. Quando se

     justifica a realização de uma galeria de reconhecimento geológico, é imperativo o levantamento

    exaustivo das características das descontinuidades e a cartografia geológica de pormenor das

    superfícies escavadas, assim como das zonas de percolação de água (Attewell e Farmer,

    1975) (Figura 3.12).

    Figura 3.12 - Método para registo das características geológicas em galerias de reconhecimento e túneis (Knill e Jones,1965, in Attewell e Farmer, 1975).

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    Estas galerias, que, de uma forma geral permitem avaliar o comportamento do maciço quando

    o seu estado de tensão é alterado após escavação, são ainda adequadas para a realização de

    ensaios in situ, que possibilitam a determinação de parâmetros essenciais para o

    dimensionamento das escavações, como o módulo de deformabilidade e o estado de tensão insitu. Pode ser muito útil a leitura de convergências em galerias de reconhecimento geológico,

    como meio de avaliação de comportamento aquando da execução da obra propriamente dita

    (Darcy e Péra, 1990).

    É, no entanto, fundamental a noção de que uma galeria de reconhecimento poderá não traduzir

    o comportamento da escavação que posteriormente venha a ser realizada, não deixando de

    ser um tipo de prospecção pontual. Como em qualquer prospecção e/ou ensaio realizado no

    meio geológico, a noção de efeito de escala deverá ser tida em consideração no momento de

    recolha de informação no interior da galeria de reconhecimento (Figura 3.13).

    Figura 3.13 - Representação simbólica do efeito de escala (adaptado de Cunha, 1993). 

    3.4 CARACTERIZAÇÃO HIDROGEOLÓGICA

    Em obras subterrâneas, é fundamental conhecer a permeabilidade dos maciços, a localização

    sazonal dos níveis freáticos, as pressões da água, e a sensibilidade do terreno às variações

    dessas pressões.

    Maciço rochoso

    Rocha diaclasada

    Rocha com uma diaclase

    Rocha intacta

    Tamanho

    Propriedades 

    Galeria 

    Caverna 

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     A previsão dos caudais de água que terão que ser bombeados durante o processo de

    escavação e mesmo durante a vida útil da obra é de importância fundamental.

    Se, regra geral, a permeabilidade dos maciços rochosos decresce com a profundidade, existem

    algumas excepções: maciços competentes fracturados, maciços cársicos, zonas deesmagamentos na proximidade de falhas com argila. Em maciços graníticos, a presença de

    água termal de origem profunda é difícil de prever (Darcy e Péra, 1990). A análise química e

    isotópica da água encontrada durante os trabalhos de reconhecimento geológico poderá ajudar

    na previsão desta situação.

     A água agrava as condições de estabilidade das escavações em terrenos sem coesão ou em

    terrenos argilosos (podendo originar fenómenos de expansibilidade), por exemplo em zonas de

    falha. Noutros tipos de maciços, por exemplo ricos em gesso, a água pode criar vazios por

    dissolução. Mesmo em terrenos de rochas ígneas granulares, como os granitos, ou em rochas

    metamórficas, como gnaisses, micaxistos ou filádios, em locais bastante fracturados, a invasãoda água sob pressão pode conduzir a zonas facilmente colapsáveis e que necessitam cuidada

    estabilização quando da escavação do túnel ou caverna.

    Devem ser portanto considerados importantes os trabalhos de caracterização hidrogeológica,

    devendo também ser feito algum investimento nos trabalhos de prospecção neste campo.

    No decurso da execução das sondagens, deve ser, no início diário dos turnos, registado o nível

    de água nas sondagens. Deverão também ser realizados ensaios de permeabilidade tipo

    “Lugeon” ou “Lefranc”, caso se esteja perante rochas ou solos, como forma expedita de

    caracterizar a permeabilidade dos terrenos.

    Nos estudos de impacte ambiental, deverão ser analisadas as hipóteses de alteração dos

    níveis de água à superfície.

     A avaliação da permeabilidade em zonas urbanas é também essencial, devido à necessidade

    de avaliar potenciais assentamentos causados pelos rebaixamentos dos níveis freáticos. Caso

    se considere necessário, deverão ser realizados ensaios de bombagem que, contrariamente

    aos ensaios de permeabilidade, são caracterizadores da permeabilidade numa zona

    envolvente ao furo, permitindo estudar a percolação num volume de maciço mais abrangente e,

    portanto, mais próximo da realidade.