PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA 2014 RELATÓRIO...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA 2014 RELATÓRIO FINAL DE PESQUISA DIEGO NOGOSSEK DA ROCHA INICIAÇÃO CIENTÍFICA VOLUNTÁRIA/ EDITAL IC 2014 PLANO DE TRABALHO: Habitação de Interesse Social em Containers Relatório final apresentado ao Grupo de Pesquisa em TEORIA E HISTÓRIA DO AMBIENTE CONSTRUÍDO (THAC) da UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ UFPR por ocasião do desenvolvimento das atividades voluntárias de Iniciação Científica Edital 2014. NOME DO ORIENTADOR: Prof. Dr. Antonio Manoel Nunes Castelnou, neto Departamento de Arquitetura e Urbanismo TÍTULO DO PROJETO: Manual de reciclagem arquitetônica de containers BANPESQ/THALES: 2014015430 CURITIBA PR 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA – 2014

RELATÓRIO FINAL DE PESQUISA

DIEGO NOGOSSEK DA ROCHA

INICIAÇÃO CIENTÍFICA – VOLUNTÁRIA/ EDITAL IC 2014

PLANO DE TRABALHO:

Habitação de Interesse Social em Containers

Relatório final apresentado ao Grupo de

Pesquisa em TEORIA E HISTÓRIA DO AMBIENTE

CONSTRUÍDO (THAC) da UNIVERSIDADE FEDERAL

DO PARANÁ – UFPR por ocasião do

desenvolvimento das atividades voluntárias de

Iniciação Científica – Edital 2014.

NOME DO ORIENTADOR:

Prof. Dr. Antonio Manoel Nunes Castelnou, neto

Departamento de Arquitetura e Urbanismo

TÍTULO DO PROJETO:

Manual de reciclagem arquitetônica de containers

BANPESQ/THALES: 2014015430

CURITIBA PR

2014

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1 TÍTULO

Habitação de Interesse Social em Containers

2 RESUMO

A questão da habitação ainda se constitui em um dos grandes problemas nacionais, uma

vez que se estima, já na primeira década deste século, um déficit habitacional de mais de 6,5

milhões de unidades, o que correspondente a aproximadamente 12% dos domicílios do país.

Diante disto, torna-se necessário apresentar soluções eficientes para o quesito da habitação

social, não se limitando apenas em projetar e construir moradias com custo mais baixo, mas

também que possuam outras qualidades, tais como: ergonomia, qualidade, privacidade e, em

especial, maior sustentabilidade. Deste modo, a possibilidade do reaproveitamento de contêineres

ou containers para esse fim torna-se interessante, pois permite a construção de forma mais rápida

e limpa, podendo criar várias combinações com a mesma estrutura e outros tipos de materiais,

além de vir atender as necessidades de cada individuo.

Esta pesquisa em iniciação científica tem como principal objetivo realizar o estudo sobre

a concepção e execução de habitações de cunho social realizadas a partir do reaproveitamento

desses elementos, criados para o armazenamento e transporte de bens, mas que, após sua vida

útil como tal, têm potencial para sua reciclagem. De modo específico, busca-se descrever suas

características de projeto e construção, em especial quanto às suas vantagens e desvantagens

em relação à questão da sustentabilidade socioambiental.

Como metodologia, a pesquisa, de caráter descritivo-exploratório, baseou-se, por meio

de fontes web e bibliográficas, na coleta e seleção de informações e na análise de um caso

ilustrativo, levando em consideração as questões técnicas, funcionais e estéticas. Como resultado,

verificou-se que o emprego de contêineres visando a Habitação de Interesse Social apresenta

várias vantagens: por ser pré-moldada, a construção acaba senda realizada de forma mais rápida,

sem desperdício e com custo reduzido. Além disso, permite grande variedade de combinações

com base na modulação espacial e, ainda, tem seu aspecto sustentável, devido ao fato de

reaproveitar um material que a principio seria descartado, acumulando-se em depósitos

portuários. Como desvantagem, há a questão do conforto termoacústico, o qual pode ser resolvido

por meio da aplicação de materiais isolantes.

3 OBJETIVOS

De modo geral, pretende-se desenvolver uma pesquisa web e bibliográfica sobre a

concepção e execução de habitações de cunho social realizadas a partir do reaproveitamento de

contêineres, descrevendo suas características de projeto e construção, em especial quanto às

vantagens e desvantagens em relação à questão da sustentabilidade socioambiental. De modo

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2 específico, pretende-se: caracterizar esse tipo de arquitetura sustentável; analisar 01 (um) caso

em particular, em termos funcionais, técnicos e estéticos; redigir um relatório final; e fazer uma

apresentação oral em um evento científico-tecnológico da UFPR.

4 INTRODUÇÃO

O Brasil ainda enfrenta um problema sério referente à questão habitacional. No censo

demográfico de 2010, realizado pela Fundação João Pinheiro, é apontado um déficit habitacional1

de cerca de 6,5 milhões de unidades, o que corresponde aproximadamente a 12% dos domicílios

no país, sendo caracterizado principalmente pela coabitação familiar2. Como forma de resolver

esta questão, o Governo Federal criou, em 2009, o Programa Minha Casa Minha Vida – MCMV3,

que tinha como objetivo enfrentar a crise econômica mundial anunciada em 2008, incentivando a

iniciativa privada a ampliar a produção de unidades habitacionais de interesse social; e abrigando

no programa ações voltadas à redução de tributos e de custas cartorárias, além de medidas para

a regularização fundiária (IAB-SP, 2014).

Nas periferias das cidades brasileiras pode se verificar os resultados de algumas

operações realizado pelo MCMV, inspirados em uma louvável iniciativa de superação das

carências habitacionais e de integração urbana e social no país. No entanto, o que se vê são

projetos burocráticos, repetitivos, sem misturas de usos e sem espaços para o convívio social

(GHIONE, 2012). Para Rifrano (2006), a maioria dos empreendimentos habitacionais

desconsideram as necessidades especiais humanas, sobrepondo diversas atividades no mesmo

espaço. As moradias construídas, que tinham como objetivo combater o déficit habitacional,

acabam recriando os mesmos espaços que as pessoas utilizavam antes de ter a sua nova casa.

Além disso, percebe-se um descuido no projeto em relação ao aspecto de desempenho das

atividades cotidianas, além da individualidade dos futuros usuários, impondo a eles a mesma

solução arquitetônica, com a justificativa da redução de custos.

Segundo Lima (2009), tal situação deve-se principalmente a:

Excessivo pragmatismo por parte do governo, o qual supervaloriza a quantidade em detrimento da

qualidade e do planejamento urbano;

Desarticulação entre as Secretarias de Planejamento, da Habitação, do Meio Ambiente e de

Desenvolvimento Social, que tomam providências paliativas após as obras ao invés de prever no

processo de planejamento a relação sistêmica entre urbanismo, habitação social, meio ambiente e

cidade;

1 Entende-se como déficit habitacional a necessidade da construção de novas moradias, seja em função de reposição do estoque de

domicílios existentes, seja em função do incremento desse estoque. Dentro da metodologia aplicada no censo, aplica-se 04 (quatro) categorias de déficit habitacional: domicílios precários, coabitação familiar, ônus excessivo com aluguel e adensamento excessivo de domicílios alugados (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2010).

2 A coabitação familiar – quando mais de uma família vive no mesmo domicílio – corresponde a 43,1% do déficit habitacional brasileiro,

sendo seguido pelo ônus excessivo com aluguel (30,6%), domicílios precários (19,4%) e adensamento excessivo de domicílios alugados (6,9%) (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2010).

3 O MCMV conseguiu entregar até o final do ano de 2013 um total de 1.547.473 unidades, ultrapassando a meta inicial de um milhão

de residências. O programa já iniciou a sua segunda fase em 2011, dentro do PROGRAMA DE ACELERAÇÃO DO CRESCIMENTO – PAC 2, tendo como objetivo alcançar chegar aos dois milhões de domicílios (O GLOBO, 2014; GOVERNO FEDERAL,2014).

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Falta da participação popular durante a concepção e elaboração dos projetos;

Comodismo em adotar as mesmas tipologias em vários bairros e comunidades, independente das

especificidades espaciais, culturais, paisagísticas, topográficas e ambientais; e

Ausência de trabalho em conjunto entre os poderes governamentais com instituições de ensino

superiores nos cursos de arquitetura e urbanismo, engenharia civil, geografia, sociologia, serviço

social, entre outros.

A dificuldade em solucionar a questão da moradia digna, a qual atenda as necessidades

de espaço e conforto; e que, ao mesmo tempo, possa garantir que a manutenção da mesma seja

viável para uma população com renda de até 03 (três) salários mínimos, é um desafio cuja

solução não se resume no projeto, mas também abrange outras questões (IAB-SP, 2014).

Entretanto, focalizando no projeto, é possível encontrar soluções que atendam aspectos já

citados. A habitação social construída a partir de containers, objeto do presente estudo de

iniciação científica, poder ser uma solução, pois a sua construção é rápida e utiliza materiais

baratos, o que reduz o custo da obra, além de ter o seu lado mais sustentável quando comparado

com as formas convencionais de projeto e construção (FOSSOUX et CHEVRIOT, 2013).

5 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

5.1 Habitação Social no Brasil

Até a metade do século XIX, os recursos e interesses econômicos do país concentravam-

se nas propriedades rurais, as quais eram verdadeiras vilas, compostas por residências, senzalas,

terreiros, depósitos, oficinas, açudes, pomares e capelas. Contudo, aos poucos, o Estado de São

Paulo começou a se destacar no cenário econômico nacional devido à cultura cafeeira, a qual fez

transferir o pólo econômico e político do país do Nordeste para o Sudeste; e, com o lucro gerado

pelo café, os grandes proprietários começaram a investir em estabelecimentos industriais (PIRES

et CRUZ, 2000, apud OLIVEIRA, 2009).

Com o surto industrial ocorrido no Brasil, de acordo com Rifrano (2006), a partir de

meados do século XIX, as cidades tiveram um grande adensamento, devido principalmente ao

êxodo rural. Como consequência, começaram a surgir os primeiros cortiços4 (Fig. 1) e favelas,

além de casas de cômodos e vilas operárias (Fig. 2), as quais passaram a abrigar a camada mais

pobre da população com um custo mais baixo, porém sem deixar de atender as necessidades

básicas da mesma.

Segundo Bonduki (1998), devido à expansão da cidade, o Poder Público encontrou

dificuldades - além de desinteresse, no caso dos bairros mais pobres – de atender as novas

demandas, como transporte público, distribuição de água potável e coleta de esgoto. Os

problemas que mais preocupavam as autoridades eram os que agravavam as condições de

4 Segundo Lemos (1989), a solução arquitetônica mais comum foi o cortiço com duas fileiras de cômodos separadas por uma estreita

passagem central e apresentando no fundo duas ou três privadas ao lado da mesma quantidade de tanques de lavar roupas para uso comunitário. De acordo com o autor, era a solução mais barata quanto à construção, além de ser a mais rentável.

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4 higiene da população, visto que surgiram vários surtos epidêmicos nas cidades brasileiras. Essa

acabou sendo a principal ação do governo sobre a habitação popular durante a República Velha

(1889-1930).

Com o crescimento do processo industrial e a atração para viver nos grandes centros,

conforme Rodrigues (1991), citado por Rifrano (2006), houve a necessidade de atrair mão de obra

com empregos e moradia. Entretanto, de acordo com Bonduki (1998), a lógica que orientava o

Estado liberal, durante a República Velha, era de que o governo não deveria produzir casas para

os operários, mas estimular o investimento particular. Assim, constituíram-se as vilas operárias, as

quais resolviam, ao mesmo tempo, dois problemas: o de construir com incentivo público e o de

abrigar seus empregados perto dos locais de trabalho, mantendo-os sob seu controle político e

ideológico5.

Ainda segundo Bonduki (1998), os cortiços e as vilas operárias eram oferecidos pelo

mercado e tinham suas moradias alugadas. Com o aumento da procura por esses imóveis, devido

ao grande crescimento que os centros urbanos estavam sofrendo, passou a haver, por parte dos

locatários de imóveis, abusos em relação ao preço dos aluguéis, fazendo com que o investimento

rendesse cerca de 12% a 18% ao ano. Com o aumento dos aluguéis, houve um incentivo pela

busca da casa própria, o qual foi favorecido pelos seguintes fatores: o desenvolvimento do Capital

financeiro, em paralelo à difusão da ideologia da casa própria, a partir da Era Vargas; a

intervenção do Estado para a afirmação desse tipo de moradia; e a pressão gerada pelo fim do

investimento por parte da construção civil e dos empreendedores imobiliários sobre a moradia

popular. Além disso, tem-se o desenvolvimento dos transportes, o que permitiu aumentar a

fronteira urbana/rural; a expansão dos loteamentos clandestinos, que consequentemente

5 Essas vilas voltadas à classe trabalhadora eram construídas através de duas formas. A primeira pelos próprios industriais com o

objetivo de alugar para os seus operários, visando atrair e controlar a mão de obra. Além disso, estavam associadas ao vínculo de trabalho com a empresa, ou seja, a perda do emprego significava a perda da moradia. Já de outro modo, eram conjuntos realizados por companhias de construção que as alugavam aos trabalhadores (N. autor).

FIGURA 1 – Planta-baixa típica dos cortiços.

FIGURA 2 – Casa da vila operária no

Saco dos Limões, em Florianópolis SC.

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5 aumentou a prática da autoconstrução; e o declínio da construção de moradias de aluguel, devido

à Lei do Inquilinato, no início da década de 1940 (VILLAÇA, 1989, apud OLIVEIRA, 2009).

Com a Revolução de 1930, mudou o modo com que o Estado Brasileiro intervia na

economia e na regulamentação das relações entre capital e trabalho no país. Iniciou-se assim

uma nova fase na história da habitação social, quando o governo de Getúlio Vargas (1882-1954)

assumira uma postura populista, que, como a expressão já diz, preocupava-se com as “condições

de vida da população menos favorecida” (BONDUKI, 1998).

Entretanto, conforme o mesmo autor, não houve uma ação articulada entre os vários

órgãos e ministérios de modo que interferisse na questão da habitação no Brasil; ou ainda, não

existiu a estruturação de um plano para solucionar definitivamente esse problema. Nesse período,

entre as medidas mais importantes implementadas a respeito da habitação popular, destacam-se:

a Lei do Inquilinato (1942); a criação das carteiras prediais dos Institutos de Aposentadoria e

Pensão (IAPs) e da Fundação da Casa Popular (FCP); e o Decreto-Lei n. 58, que regulamentou a

venda de lotes urbanos a prestações. Os IAPs construíam conjuntos e financiavam moradias

isoladas aos seus associados e posteriormente edifícios residenciais. Entre 1937 e 1964, foram

construídos 279 conjuntos, perfazendo um total de 47.789 moradias e financiadas 72.236

habitações. Apesar de ser um número relativamente modesto, evidenciava uma nova forma de

atuação do Estado: a interferência direta na produção da habitação (RIFRANO, 2006).

De acordo com Bonduki (1998), os IAPs passaram a arrecadar verbas destinadas às

aposentadorias. Porém, até poder prover esses custos, decidiu-se utilizar verba pública para

financiar a construção civil, não só na habitação social, mas também na incorporação imobiliária

para os setores médios. Com o passar do tempo, a segunda opção passou a ser a preferência

dos órgãos relacionados aos IAPs, uma vez que as moradias populares geravam o risco de

inadimplência. Em 1946, foi criada a Fundação da Casa Popular (FCP), a qual consistiu no

primeiro órgão federal brasileiro na área de moradia, que visava atender o restante da população,

pois as IAPs atendiam apenas os seus associados. Ao querer atender um grande número de

indivíduos, com renda mínima, o governo encontrou-se em um situação mais delicada

financeiramente do que a que se prestou com as IAPs. Devido a um mal dimensionamento na

concepção, o projeto não conseguiu se sustentar, entrando em falência em 1964. Isto ocorreu

porque a FCP previa recursos através de taxação das transações imobiliárias, entretanto, devido à

falsificação dos valores negociados e o desinteresse dos governos estaduais em recolher as

contribuições, houve um esvaziamento no caixa da fundação.

Apesar do fato da questão da habitação social ter sido imposta na sociedade brasileira

como responsabilidade do Estado, a qualidade dessas moradias deixavam a desejar, salvo

algumas exceções (Fig. 3 e 4). Contudo, em comparação com as moradias que seriam feitas pelo

Banco Nacional da Habitação (BNH), essas habitações eram eficientes e inovadoras, pois tinham

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6 dimensões compatíveis com as necessidades de uma família trabalhadora, além de contribuírem

para uma renovação do ponto de vista arquitetônico e urbanístico.

A Era Vargas (1930/45) foi o momento em que a questão habitacional foi assumida pelo

Estado e sociedade brasileira como uma questão social, dando inicio a uma política habitacional

no Brasil. Inicialmente, teve-se o congelamento dos aluguéis, motivado pelo aumento abusivo no

custo das moradias. Diante disso, os investimentos em casas de aluguel deixaram de ser

rentáveis e seus proprietários tentaram recuperar os seus investimentos através de sua venda,

causando um grande número de despejos, iniciando assim uma crise habitacional (BONDUKI,

1998).

Como consequência, houve o aparecimento e a difusão da autoconstrução de moradias

feitas pela massa popular; solução encontrada por esta de fugir da produção rentista da habitação

popular. Com o passar do tempo, as comunidades das periferias organizaram-se e passaram a

reivindicar melhorias, tais como: instalação de redes de água e esgoto, iluminação pública e

sistemas de transporte coletivo. Entretanto, ainda conforme Bonduki (1998), a alternativa da

autoconstrução acabou transferindo ao trabalhador a responsabilidade da construção da própria

casa, o que teve êxito e representou o principal fator para a superação da crise habitacional que

eclodiu naquele período.

FIGURA 4 – Conjunto Residencial de Pedregulho, Rio de Janeiro RJ.

FIGURA 3 – Conjunto Residencial de Realengo (Esquerda); Interior de um dos apartamentos de Realengo (Direita).

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A década de 1960 no Brasil pode ser caracterizada pela preocupação política e

programática com a habitação de baixa renda, gerada principalmente após o Golpe Militar (1964).

Foi a época em que aconteceu uma reação à existência das favelas por parte do governo, com a

justificativa da marginalidade urbana. Pretendia-se erradicá-las, com o auxilio financeiro do Banco

Nacional da Habitação (BNH), o qual, segundo Rifrano (2006), tinha os objetivos de coordenar a

política habitacional dos órgãos públicos e orientar a iniciativa privada, financiando a aquisição da

casa própria, melhorando o padrão habitacional e do ambiente, eliminando as favelas,

aumentando o investimento da indústria da construção, e estimulando a poupança privada e o

investimento6.

No final dos anos 1970, instalou-se uma nova crise econômica, a qual reduziu os

recursos, o que afetou o recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), do

qual partiam os recursos de financiamento da habitação popular. Como consequência, houve a

crise do BNH, que conduziu ao seu fechamento em 1986 e a transferência de suas atribuições e

recursos para a Caixa Econômica Federal (CEF). Desde então, a tipologia das habitações sociais

no Brasil tem apresentado praticamente a mesma organização do espaço interno, onde o menor

custo da construção prevalece em detrimento do tamanho da habitação, obrigando os moradores

a adaptarem-se ao espaço disponível. Aqui, as questões de conforto e bem-estar são deixadas

em segundo plano.

5.2 Habitação de Interesse Social em container

A construção em container ou contêiner consiste é um novo ramo da arquitetura, que

vem sendo difundido através das mídias. Apesar de sempre usar o mesmo módulo – o container

padrão ISO –, a arquitetura com ele produzida apresenta uma ampla variedade de projetos de

grande qualidade, tanto do ponto vista de sua concepção quanto à sua estética. Seu recente

desenvolvimento deu-se devido ao excedente desses recipientes, destinados prioritariamente para

o armazenamento e transporte de bens industrializados, matérias-primas e combustíveis. Há uma

grande quantidade pelo mundo, principalmente na Europa e América do Norte, devido à troca de

produtos entre Ocidente e Oriente, onde o primeiro importa mais do que exporta. Como custa

cerca de US$ 900 para devolver os containers, acaba sendo mais econômico comprar novos da

China do que fazer o caminho de ida e volta. A quantidade excedente desses recipientes

metálicos ocupa muito espaço e é pouco ecológica devido ao desperdício de aço, o que vem

inspirtando a sua reciclagem arquitetônica (KOTNIK, 2008).

Tendo como foco a Habitação de Interesse Social (HIS), o reuso desse material pode ser

interessante devido às suas principais características: são elementos pré-fabricados, compactos,

robustos e resistentes às mudanças de temperaturas, podendo ser facilmente transportados e

6 Por meio de recursos gerados pelo Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), o BNH investia na habitação popular. Contudo,

somente nos primeiros anos isso aconteceu de forma prioritária, sendo deixado em segundo plano nos anos seguintes. De acordo com Rifrano (2006), apenas 18% do FGTS foi destinado à Habitação de Interesse Social (HIS).

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8 instalados de forma rápida. Ainda de acordo com Kotnik (2008), os contêineres podem ser

considerados materiais baratos7, o que reduz o custo da obra; e, além disso, permitem produzir

edificações de caráter ecológico8, pois reciclam e reutilizam esses recipientes que foram

abandonados nos depósitos portuários.

Conforme Kotnik (2008), uma residência em container pode adquirir as mais diversas

formas, variando seu tamanho, proporção e tipologia. Quanto ao último item, os projetos podem

utilizar apenas os módulos ou ainda como extensão de um edifício já existente. Além disso, o

contêiner também pode ser usado com uma única unidade, ou com a combinação de vários, com

a possibilidade acrescentar outros tipos de materiais. Ainda segundo o mesmo autor, há duas

maneiras que as construções em container podem ser estruturadas, dependendo da posição e

relação entre as unidades: os módulos podem ser empilhados um junto aos outros, sem nenhuma

separação; ou com espaçamento entre eles. A primeira opção é mais adequada em projetos mais

simples, principalmente quando o conjunto precisa ser eventualmente movido. Já a segunda

opção seria usada mais para criar vários pisos e para incluir outros tipos de materiais.

Uma construção com reuso de contêineres pode ser flexível ao decorrer do tempo.

Conforme a necessidade e disponibilidade financeira, é possível adicionar novos módulos. No

primeiro instante, pode-se montar uma casa com os cômodos mínimos para uma família e, com o

passar do tempo, pode-se ir expandindo a moradia (FOSSOUX et CHEVRIOT, 2013).

7 Os containers dry box de 20 e 40 pés custam em média, respectivamente, R$ 4.000 e R$ 6.000. É importante ressaltar que ainda há

o custo do frete, que pode variar de R$ 1.000 a 5.000, conforme a distância de entrega (PREÇOS.INFO, 2014).

8 Além de retira-los dos portos marítimos, onde foram abandonados, ao reciclar e reutilizar essas estruturas, há uma redução

considerável do uso de outros materiais na construção. Essas vantagens aproximam a arquitetura em container ao conceito de projeto 3R's (Reutilizar, Reciclar e Reduzir), o qual foi apresentado no principal documento produzido pela ECO’92, ocorrida no Rio de Janeiro: a Agenda 21 – Plano Estratégico para o Desenvolvimento Sustentável (KOTNIK, 2008).

FIGURA 5 – Possíveis combinações dos módulos em containers.

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Essa variedade de possibilidades (Fig. 5) é um ponto forte para a habitação em container,

propiciando identidade ao projeto. De acordo com o arquiteto e teórico austríaco Christopher

Alexander (1936-), citado por França et Santos (2012), as pessoas precisam de uma unidade

espacial que dê um caráter de pertencimento e de identidade, o qual permite diferenciar o seu

espaço na cidade com o restante, ou seja: "uma casa personalizada nos conta sobre a pessoa

que vive nela".

Em termos construtivos, os contêineres funcionam como grandes monoblocos. Os

painéis laterais, assoalho, terças, portas, moldura e trilhos formam um conjunto estrutural (Fig. 6),

o que permite que o container seja autoportante e, portanto, seja empilhado. Eles são resistentes

e destinados originalmente a transportar cargas que geram mais esforço do que uma residência

típica. No entanto, ao se fazer aberturas, a estrutura perde parte de sua resistência. Se, por

exemplo, retirar toda vedação lateral, a estrutura, mesmo sem esforços, pode se deformar. Por

isso, de modo geral, sempre que for necessário fazer uma abertura, deve ser feita uma moldura

em volta da mesma. Além disso, pode ser preciso a instalação de vigas e suportes no telhado,

dependendo do tamanho das aberturas e das cargas sobre a estrutura (SOCRATES, 2012).

Por sua vez, o piso de um container, segundo Fossoux et Chevriot (2013), é feito de

aglomerados, podendo suportar até 300 kg/m2. Contudo, deve-se distribuir toda carga ao longo da

superfície, colocando as cargas mais pesadas nos quadros, onde há uma maior resistência.

A velocidade da construção de uma casa em container deve-se principalmente à sua

armação estrutural, não sendo preciso, muitas vezes, a adição de um reforço. Também não há

necessidade da montagem de uma cobertura, o que evidentemente economiza o tempo. Além

disso, os materiais praticamente não têm tempo de secagem.

FIGURA 6 – Conjunto estrutural de um container.

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Outra das grandes vantagens da arquitetura em container reside na possibilidade de

levar o módulo ao terreno pronto para ser utilizado, o que garante uma redução de tempo e de

custo gerado durante o período de construção. Isto é possível porque o contêiner já possui

paredes, piso e cobertura formando a estrutura. Além disso, o empilhamento e fixação desses

elementos são relativamente rápidos, sendo necessário apenas um guindaste. Isto sem contar

que não é necessário fazer grandes movimentações de terra para implantar a edificação, o que

reduz assim o impacto sobre o local.

Independentemente do sistema construtivo, também conforme Fossoux et Chevriot

(2013), o isolamento térmico é um elemento importante, em especial quanto à questão do

consumo de energia9. Quando se trata de uma residência feita com containers, deve-se ter uma

maior atenção para este ponto, pois o seu material é bom condutor térmico. Diante deste fato, há

duas formas de isolamento: interna (Fig. 7) e externa (Fig. 8). A primeira é a opção mais

econômica, contudo menos eficiente, por perder facilmente a calor interno. Isto se deve ao fato da

espessura do isolamento ser menor – em média, 10 cm –, para não perder os espaço interno, que

já é estreito. Além disso, é possível manter as folhas metálicas aparentes, as quais já são

resistentes às intempéries, sendo necessário colocar apenas uma vedação no interior. Já com o

isolamento externo, há uma perda de calor menor. Como não há problema de espaço, dá para

instalar um isolamento mais espesso, entre 10 e 30 cm. Contudo, é preciso colocar uma vedação

resistente, por estar mais exposta, o que encarece a obra (FOSSOUX et CHEVRIOT, 2013).

Outro dos inconvenientes do uso do container na construção é a questão de possíveis

contaminações. Muito dos produtos transportados precisam ser tratados com produtos químicos,

os quais podem ser prejudiciais à saúde, se expostos por muito tempo. Para reverter isso, é

9 Considera-se um consumo baixo em uma residência quando há um gasto menor que 50 kWh/m² por ano (FOSSOUX et CHEVRIOT,

2013).

FIGURA 7 – Isolamento térmico interno. FIGURA 8 – Isolamento térmico externo.

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11 necessário jatear com um abrasivo o aço do contêiner e repintá-lo com uma tinta não tóxica antes

de habitá-lo. No entanto, não são apenas os produtos transportados que são tratados com essas

substâncias, mas também o próprio container – mais precisamente o piso. Por ser de madeira,

são aplicados pesticidas sobre ele para poder conservá-lo por mais tempo. Nesse caso,

recomendasse trocá-lo por um outro material livre de contaminações (ARCHDAILY, 2011;

METALICA, 2014).

Outra questão importante refere-se às dimensões do container. O módulo é muito estreito

– 2,33 m de largura no espaço interior –, podendo ser menor quando colocado um isolante

térmico. O pé-direito útil também é baixo, sendo igual a 2,36m. Essas medidas podem não

atender de forma eficiente uma família, sendo necessário a instalação de um outro container na

lateral, o que vai gerar mais custos, devido à retirada das vedações, cuidados com a fixação, etc.

(FOSSOUX et CHEVRIOT, 2013).

6 MATERIAIS E MÉTODOS

De caráter exploratório, esta pesquisa, baseada em revisão bibliográfica e estudo de

caso, realizou-se por meio da investigação, seleção e coleta de fontes impressas, tais como

artigos, periódicos e livros, nacionais e internacionais; ou ainda publicadas on line, que tratavam

direta ou indiretamente sobre arquitetura em container voltada para a habitação social. A partir

disso, formulou-se os textos presentes neste relatório, abordando a evolução histórica da

habitação social no Brasil de forma básica, destacando os reflexos nos dias atuais; e também

sobre o uso arquitetônico de contêineres, demonstrando suas vantagens e desvantagens para

esse tipo de programa. Na sequência, fez-se o estudo de 01 (um) caso internacional, procurando

ilustrá-lo, descrevê-lo e analisá-lo em seus aspectos estruturais, funcionais e estéticos. Concluiu-

se a pesquisa com algumas observações finais relacionadas à Habitação de Interesse Social em

Containers, além da elaboração deste relatório final e a preparação da apresentação dos

resultados no 22º EVINCI (Evento de Iniciação Científica) da UFPR, previsto para ocorrer em

outubro de 2014.

7 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A partir da revisão bibliográfica realizada, foi possível verificar a necessidade de projetos

de habitação social que atendam os moradores de forma mais digna, respeitando questões de

bem-estar, conforto e sustentabilidade. Assim, buscou-se selecionar para o estudo de caso um

projeto que além de seguir esses aspectos, também que, de forma pertinente, utilizasse

containers, considerando as suas necessidades construtivas. A seguir, está descrito e avaliado,

com base em informações pesquisadas na web, um projeto de moradia de cunho social,

localizado no Canadá, voltada para o público feminino.

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12

ESTUDO DE CASO Imouto Container Housing

(2013, Vancouver - Canadá)

McGinn Engineering & Preservation Ltd.

Localização: Vancouver, Columbia Britânica (Canadá)

Uso: Habitação multifamiliar

Ano de construção: 2013

Número de contêineres: 12 (doze)

Área total: 378 m²

Autoria: McGinn Engineering & Preservation Ltd. (Arq. Barry McGinn)

A Imouto Housing (Figs. 9 e 10) é a primeira Habitação de Interesse Social construída com

containers no Canadá. Localiza-se em Downtown Eastside – bairro mais pobre da cidade de Vancouver –,

próximo ao Port Metro Vancouver (Fig. 11), o maior porto marítimo do país10

. Devido a essa proximidade, a

escolha do container como principal material construtivo tornou-se uma ótima opção, pois há o uso de um

material local, o qual está abandonado e que permite uma redução de custos, gastos de energia e poluição

gerada pelo transporte, reforçando, assim, o seu caráter mais sustentável.

z

10

Anualmente, passam, em média, cerca de 1,4 milhões de containers pelo porto de Vancouver, sendo a maioria proveniente de importações (PORT METRO VANCOUVER, 2014).

FIGURA 11 – Localização da edificação (ponto vermelho), próximo ao porto de Vancouver.

FIGURA 9 – Vista frontal. FIGURA 10 – Vista a partir do pátio central.

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13

A construção desse projeto11

foi realizada pela organização Atira Women’s Resource Society12

,

com o objetivo de atender exclusivamente mulheres. Metade dos apartamentos é voltada para mulheres

acima de 50 anos de idade, enquanto que a outra metade é para aquelas que possuem baixa renda13

. O

propósito de unir esses dois públicos, segundo publicação on line da Atira (2013), é de fortalecer a

comunidade, unindo a maior experiência de vida dessas mulheres mais velhas, com os programas de

orientação da própria organização.

Para sua implantação, optou-se em criar dois pequenos edifícios: um em cada extremo do lote –

de 7,62 x 36,27m de dimensão –, gerando, assim, um pátio central (Fig. 12). Segundo o arquiteto Barry

McGinn (2013), esse espaço central funcionaria como um oásis visual para ambos os pisos térreos e

superiores, além de contribuir com as interações sociais entre as moradoras por meio de espaços de

permanência.

No total, a habitação possui 12 (doze) apartamentos-estúdios – moradias menores e mais baratas

voltadas para pessoas solteiras –, divididos nos três pavimentos de cada bloco. Cada apartamento (Figs. 13

a 15) conta com um quarto, uma sala de estar, uma copa e uma cozinha/lavanderia em um mesmo espaço

integrado, além de um banheiro, o que perfaz uma área útil de 28 m². Por se tratar de um apartamento-

estúdio, o dormitório não possui um cômodo destinado exclusivamente para ele, o que é comum nesse tipo

de moradia. Como solução, é utilizado um mobiliário flexível, o qual pode esconder a cama quando

necessário. Apesar de não oferecer muita privacidade, essa questão é amenizada pelo fato do apartamento

ser voltado para uma pessoa apenas.

11

Além da habitação em container, fez parte do projeto a restauração de um prédio histórico próximo, o qual oferece 16 (dezesseis) unidades para jovens mulheres. Ao todo, o projeto custou US$ 3,3 milhões, com a empresa Canadá Mortgage and Housing Corporation contribuindo com US$ 2,6 milhões (ATIRA, 2013). 12

A Atira,Sociedade de Recurso para Mulheres é uma organização sem fins lucrativos comprometida com o trabalho de acabar com a violência contra as mulheres através da prestação de serviço direto – moradia, defesa e apoio – , bem como trabalhar para aumentar a conscientização e educação da sociedade a respeito dessa violência, tanto contra mulheres quanto crianças (N. Autor).

13 Para mulheres com baixa renda, o aluguel do apartamento custa apenas US$ 375, enquanto que para o outro caso, o aluguel vale

cerca de 30% de sua renda. Nesse caso, a mulher poderá ter uma renda anual de no máximo US$ 34.000 (ATIRA, 2013).

FIGURA 12 – Implantação dos blocos habitacionais.

FIGURA 13 – Planta do apartamento. FIGURA 14 – Área social. FIGURA 15 – Cozinha.

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14

As moradias foram implantadas na orientação Norte-Sul, devido à disposição do próprio terreno.

Assim, as aberturas para a iluminação natural foram concentradas nessa mesma direção, propiciando a

entrada de luz direta e difusa, respectivamente, nos apartamentos posteriores e frontais de cada bloco. No

entanto, não foram adotadas soluções diferentes de tratamento para a entrada de luz nas duas fachadas.

Além disso, essas aberturas foram coerentes com a estrutura do container, pois, as janelas foram colocadas

no lado menor da caixa metálica, sendo necessária apenas a retirada das portas. Devido a isso, não foi

preciso fazer mais recortes nas folhas metálicas – o que exigiria maiores reforços, e, consequentemente,

maior tempo e custo de obra.

Ao todo, foram utilizados 12 (doze) containers de 40 pés do tipo Dry box14

. As caixas foram

modificadas em um estaleiro próximo e depois transportadas e empilhadas no canteiro de obras por meio

de um guindaste (Fig. 16 e 17). Segundo o arquiteto, os cortes foram a parte mais complicada do projeto,

pois afetava a estabilidade da estrutura das caixas. Como solução, foram instalados contra-ventamentos

(Fig. 18) no centro dos containers, na parede entre os apartamentos, de modo a impedir possíveis torções

que a estrutura poderia sofrer devido aos recortes feitos nas paredes das unidades (DZINE TRIP, 2013).

Ainda conforme o arquiteto Barry McGinn (2013), "este loteamento proposto é projetado para ser

modular; repetitivo em detalhe; eficiente com materiais e possuir um baixo consumo de energia e custo no

desenvolvimento para fornecer aos habitantes de Downtown Eastside unidades habitacionais acessíveis". O

desenvolvimento atende todas as normas de construção, excedendo os requisitos do código de isolamento

térmico e transferência de som. Todas as paredes foram revestidas com lã-de-vidro e gesso acartonado

(Fig. 19) na parte interna, o que permitiu deixar a maior parte das folhas metálicas aparentes, reduzindo

assim o custo com impermeabilização externa, além de manter a estética desse tipo de arquitetura.

14

Todos os containers utilizados na edificação vieram de doações: 2 da BC Hydro (concessionária elétrica canadense), 2 de cidadãos e 8 da Port Metro Vancouver (N. autor).

FIGURA 16 – Modificações feitas nos containers.

FIGURA 18 – Contra-ventamento da estrutura.

FIGURA 17 – Montagem dos containers.

FIGURA 19 – Instalação do isolamento.

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15

Apesar dos containers serem resistentes às intempéries, foi construído um telhado na edificação.

A estrutura é um plano horizontal, feito com barrotes e painéis de madeira revestidos com material

impermeabilizado (Figs. 20 a 23). Segundo a Atira (2013), o custo total de construção de cada unidade foi

de US$ 82.500, o que é bem mais barato do que um outro projeto habitacional semelhante da própria

empresa, feito em concreto convencional, o qual custaria cerca de US$ 220.000, resultando em uma

economia de aproximadamente 62%.

Devido ao bom resultado que teve esse projeto de habitação em container15

, a organização da

Atira pensa em construir mais esse tipo de edificação. A ideia é criar um projeto mais sofisticado, desta vez

com apartamentos de até dois quartos. Ele também seria feito em dois blocos, com 07 (sete) andares cada

um, o que exigiria 42 containers reciclados. O projeto seria construído na Hastings Street – um dos

corredores de tráfego mais importante de Vancouver –, mas ainda precisa da aprovação da Prefeitura da

cidade.

15

O projeto foi premiado em 2013 com o Georgie Awards – prêmio canadense que reconhece e destaca a excelência de projetos e construções de casas na British Columbia, Canadá – na categoria “Melhor Inovação e Melhoria Ambiental” (BC HOUSING, 2013).

FIGURA 20 – Execução. FIGURAS 21 e 22 – Aspecto final da construção.

FIGURA 23 – Esquema gráfico do Imouto Container Housing.

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16

8 CONCLUSÕES

A Habitação de Interesse Social (HIS) no Brasil ainda carece de projetos que

proporcionam aos seus moradores uma melhor qualidade de vida. O que se vê ainda é a

preocupação com a quantidade e custo das mesmas, em detrimento da qualidade, como questões

de bem-estar, conforto e sustentabilidade. No entanto, essas habitações podem – e devem – ser

dotadas de valores que tragam benefícios e economia de meios não somente para os seus

moradores, mas também para a sociedade como um todo.

O uso do container na moradia popular ainda é pouco empregado, por haver um pouco

de preconceito em relação a este tipo de construção, acreditando que é simplesmente um

conjunto de caixas metálicas empilhadas, sem nenhum tipo de tratamento. Uma vez quebrada

esta visão, percebe-se a versatilidade desse material na arquitetura, o que possibilita, através da

sua reciclagem, diversas vantagens quando comparado à construção convencional. Por ser pré-

fabricado, é possível produzir residências em série, o que é uma das premissas da HIS. Além

disso, pode-se prever e compor diversas disposições dos módulos, assim como é possível

adicionar outros materiais, os quais também podem ser reciclados, contribuindo ainda mais com a

maior viabilidade econômica e sustentabilidade socioambiental. Devido a isso, é possível adaptar

cada projeto às necessidades de cada tipo de família, tornando-o ainda mais eficiente.

No estudo de caso, foi possível ver as qualidades desse tipo de arquitetura: empregando

um arranjo simples de containers, o arquiteto canadense conseguiu com que o projeto

conversasse com o entorno – formado por prédios antigos –, mas mantendo uma linguagem

contemporânea, de cunho essencialmente tardomoderno. Com poucas modificações nas caixas

metálicas e acréscimo de alguns detalhes em madeira, foi possível amenizar o sua aparência

industrial, que é motivo de objeção para algumas pessoas, resultado em um aspecto mais

tradicional. Os materiais metálicos ainda remetem à indústria e, consequentemente, fazem mais

alusão a trabalho do que habitação: isto exige que se atente ao fato de se buscar dar uma

aparência mais doméstica aos contêineres, o que pode ser conseguido com a aplicação de

madeira, tijolos e pedras. Além disso, o projeto estudado conseguiu atender as necessidades das

moradoras, as quais vivem sozinhas.

Apesar de ter algumas desvantagens citadas por alguns autores, como a necessidade de

isolamento térmico e acústico; e possíveis contaminações, a HIS realizada em containers traz

muitos benefícios, tais como: redução de custos; agilidade de prazos de execução da obra;

diminuição da produção de entulhos da construção civil; versatilidade de projeto e; por fim, a sua

preocupação ambiental, que é a reutilização de um material que seria descartado e, em

consequência, desperdiçado. Há vários desdobramentos da presente pesquisa, como, por

exemplo, o levantamento e estudo de casos nacionais, procurando-se analisar as adequações à

realidade brasileira, incluindo aqui adaptações climáticas, programáticas e construtivas.

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17

9 REFERÊNCIAS

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18 PORT METRO VANCOUVER. Container statistics report (2014). Disponível em: <http://www.portmetrovancouver.com/docs/default-source/about-facts-stats/container-stats---monthly---2008-to-2013.pdf?sfvrsn=0>. Acesso em: 28.jul.2014.

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10 FONTES DE ILUSTRAÇÕES

Figura Disponível em: Acesso em:

1 e 2 RIFRANO, l. Avaliação de projetos habitacionais: Determinando a funcionalidade da moradia social. 2.ed. São Paulo: Ensino Profissional, 2006. p. 26 e 31.

-

3 e 4

BONDUKI, N. Origens da habitação social no Brasil: Arquitetura moderna, lei do inquilinato, e difusão da casa própria. 4.ed. São Paulo: Estação Liberdade, 1998. p. 180 e181.

-

5 http://www.fabprefab.com/fabfiles/fablist/Res4home/July06-profile-images/02-typologies.jpg 23.jun.2014

6 http://www.cesarcontainers.com.br/images/compoe_container/1.jpg 23.jun.2014

7 e 8 FOSSOUX, E.; CHEVRIOT, S. Construire sa maison container. 2. ed. Paris: Eyrolles, 2013. p. 117 e 118

-

9 http://www.mcginn-engineering.com/?page_ID=82 2.ago.2014

10 http://inhabitat.com/shipping-container-social-housing-project-is-a-first-for-canada/atira-shipping-container-building-3/?extend=1

2.ago.2014

11 Google Earth 2.ago.2014

12 e 13 http://designhome.pics/shipping-container-homes-floor-plans/29/beyond-its-altruistic-roots-the-development-boasts-some-impressive/

2.ago.2014

14 e 15 http://inhabitat.com/shipping-container-social-housing-project-is-a-first-for-canada/atira-shipping-container-building-3/?extend=1

2.ago.2014

16 http://dzinetrip.com/container-housing-complex-in-canada-by-atira/ 2.ago.2014

17 http://www.vancouversun.com/sports/cms/binary/7636273.jpg 2.ago.2014

18 e 19 http://dzinetrip.com/container-housing-complex-in-canada-by-atira/ 2.ago.2014

20 http://www.mcginn-engineering.com/assets/img/Imouto_PB300049_edited.jpg 20.ago.2014

21 https://www.bchousing.org/https://www.bchousing.org/staging//images/livegreen/Awards/Imouto.jpg?action=scale&width=150&height=222?action=scale&width=150&height=222

20.ago.2014

22 http://www.lohavancouver.org/wp-content/uploads/2013/10/P1012383.jpg 20.ago.2014

23 http://www.straight.com/files/styles/popup/public/files/images/wide/2011-03-30%2520-%2520Imouto%2520Housing%2520Image%25201.jpg

20.ago.2014