Professor da UFES é afastado

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Cidades 10 ATRIBUNA VITÓRIA, ES, QUINTA-FEIRA, 06 DE NOVEMBRO DE 2014 DENÚNCIA DE RACISMO Professor da Ufes é afastado Manoel Malagutti está impedido de dar aulas para turma que o acusa de racismo. Reitor diz que punição pode chegar à exoneração ANTONIO COSME - 04/11/2014 O PROFESSOR MANOEL MALAGUTTI foi afastado das aulas da turma de Ciências Sociais após denúncia Daniel Figueredo Keyla Cezini O professor do Departamen- to de Economia da Univer- sidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Manoel Malagutti foi afastado das aulas de Economia Política do segundo período de Ciências Sociais. Ele é acusado por alunos de dar declarações racistas em sala de aula, o que causou re- volta nas redes sociais. Segundo o reitor da Ufes, Reinal- do Centoducatte, a decisão de afas- tá-lo das aulas para a turma aconte- ceu por falta de clima, depois das declarações que ele teria feito em sala de aula. Segundo alunos, ele te- ria dito que “detestaria ser atendido por um médico negro.” A Ufes também vai instaurar in- quérito administrativo, que pode levar até à exoneração do profes- sor. “Durante a reunião do Cepe (Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão), foi pedido que ele fosse afastado de todas as aulas, mas isso ainda vai ser anali- sado”, disse Centoducatte. Uma sindicância foi instaurada para apurar o caso e tem prazo de 30 dias para ser encerrada. Segun- do o reitor, porém, a conclusão de- ve ser antecipada. “Ele admite que houve os fatos. Então, acredito que a sindicância deve se encerrar rapidamente. Após isso, temos 90 dias para con- cluir o inquérito administrativo. O professor pode ser punido até com exoneração”, explicou o reitor. Ele classificou como constran- gedora a fala do professor. “Cons- trange e traz perplexidade.” Um inquérito criminal foi aberto também pelo Ministério Público Federal. Segundo o órgão, foi soli- citado à Ufes o nome do professor, a lista de presença da turma onde o fato teria ocorrido e quais as provi- dências adotadas até o momento. A Ufes vai ter de responder aos questionamentos em 48 horas. ASSISTÊNCIA Em relação às cotas, Centodu- catte afirmou que a Ufes pratica a política de cotas sociais desde 2007. Ele também relembrou das políticas de assistência estudantil, que atendem 4.132 estudantes, sendo que 555 são negros. “As nossas pesquisas indicam que, na média, cotistas e não-cotis- tas possuem as mesmas notas. Te- mos de melhorar, mas já investimos mais de R$ 20 milhões por ano em assistência estudantil para dar ga- rantias aos alunos que precisam.” “Sou a favor dos negros” O professor Manoel Malagutti, do Departamento de Economia da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), defendeu-se no fim da tarde de ontem das acusações de racismo que motivaram investiga- ções na universidade e no Ministé- rio Público Federal. Segundo ele, todos os trabalhos já realizados durante sua vida co- mo pesquisador foram em defesa dos pobres e pela redução das desi- gualdades sociais. Malagutti afirmou que não foi racista quando disse, em entrevista ao jornal A Tribuna, que as condi- ções sociais apresentadas por alu- nos negros e cotistas fazem com que o nível das aulas na universida- de caia, porque eles não conse- guem entender termos complexos. “Eu entendo que a questão do ra- cismo passa pela cabeça das pes- soas, mas minha postura sempre foi de fortalecer os cotistas. Eu sou contra as cotas, mas já que elas existem, que se fortaleçam os cotis- tas”, disse o professor. Segundo ele, os depoimentos afirmando que os cotistas e negros possuem condições inferiores de aprendizado foram para tentar melhorar a situação deles. “Sou a favor dos negros, das mulheres e dos trabalhadores pobres, e todos os meus trabalhos ressaltam essa desigualdade que existe no País.” Mas ele reafirmou sua posição contra as cotas. “Tenho amigos ne- gros, namorada negra e não acre- dito que sejam inferiores. Mas, se uma pessoa entra pelo sistema de cotas, ela entra com notas inferio- res e condições menores de apren- dizado. É preciso resolver a desi- gualdade.” FERNANDO RIBEIRO - 10/12/2013 O REITOR DA UFES, Reinaldo Centoducatte, disse que a fala do professor foi constrangedora: “Constrange e traz perplexidade”, afirmou Estudantes fazem protesto Um protesto foi realizado na tar- de de ontem, na Universidade Fe- deral do Espírito Santo (Ufes), pa- ra pedir a demissão do professor de Economia Manoel Malagutti. Os manifestantes gritaram pala- vras de ordem, renegaram o racis- mo e cobraram providências na sede da reitoria da universidade. Cerca de 200 manifestantes saí- ram do Centro de Ciências Huma- nas e Naturais (CCHN) da Ufes, por volta das 16 horas. Depois de circularem pelo campus, foram em direção à reitoria. Cantando “vai cair, vai cair, Ma- lagutti vai cair”, pediram a presen- ça de membros da reitoria para co- brar a adoção de medidas. A vice-reitora Ethel Maciel foi ao encontro dos estudantes e expli- cou como seria montado o proce- dimento para apuração do caso em que o professor teria dito, dentre outras coisas, que “detestaria ser atendido por um médico negro.” Depois disso, foram ao Departa- mento de Economia da Ufes, onde foram recebidos pela chefe do de- partamento, Carolina Giuberti, que afirmou que ela e outros pro- fessores repudiam as declarações de Malagutti. No fim da manifestação, os estu- dantes foram à avenida Fernando Ferrari, que ficou fechada por cer- ca de 10 minutos nos dois sentidos. A manifestação terminou por volta das 18 horas, com um abraço cole- tivo e gritos de palavras de ordem em frente ao Teatro Universitário. O estudante de Geografia Josi- mar Nunes, de 22 anos, entrou na universidade por meio das cotas sociais e acha que o professor deve ser punido exemplarmente. “Para ele, é necessário adotar uma punição exemplar. A impuni- dade é o combustível perfeito para qualquer tipo de discriminação. Mas também é necessário repen- sar e rever práticas usadas na so- ciedade”, afirmou. CENAS DO PROTESTO AO FIM DO PROTESTO, manifestantes fizeram um abraço coletivo e gritaram palavras de ordem. MANIFESTANTES OCUPARAM o pátio da reitoria e exigiram a exoneração do professor acusado de racismo. AS DUAS PISTAS da avenida Fernando Ferrari foram fechadas em frente à Ufes por cerca de 10 minutos. FOTOS: ADEMIR RIBEIRO/AT PROTESTO contra declarações de professor terminou em frente ao Teatro Universitário

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Minha declaração ao Jornal A Tribuna de hoje. A fala ficou um pouco descontextualizada, principalmente a parte final, mas ta valendo. O que afirmei ao repórter é que, devemos sim lutar pela punição nos termos da lei e dos regimentos internos da universidade, mas também temos que focalizar o fenômeno, de maneira que, a partir deste fato, possamos repensar nossas práticas em sala de aula. Tanto enquanto professores das series iniciais, fundamental quanto no ensino superior.

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Ci d a d e s

10 ATRIBUNA VITÓRIA, ES, QUINTA-FEIRA, 06 DE NOVEMBRO DE 2014

DENÚNCIA DE RACISMO

Professor da Ufes é afastadoManoel Malagutti estáimpedido de dar aulaspara turma que o acusade racismo. Reitor dizque punição podechegar à exoneração

ANTONIO COSME - 04/11/2014

O PROFESSOR MANOEL MALAGUTTI foi afastado das aulas da turma de Ciências Sociais após denúncia

Daniel FigueredoKeyla Cezini

O professor do Departamen-to de Economia da Univer-sidade Federal do Espírito

Santo (Ufes) Manoel Malagutti foiafastado das aulas de EconomiaPolítica do segundo período deCiências Sociais. Ele é acusado poralunos de dar declarações racistasem sala de aula, o que causou re-volta nas redes sociais.

Segundo o reitor da Ufes, Reinal-do Centoducatte, a decisão de afas-tá-lo das aulas para a turma aconte-ceu por falta de clima, depois dasdeclarações que ele teria feito emsala de aula. Segundo alunos, ele te-ria dito que “detestaria ser atendidopor um médico negro.”

A Ufes também vai instaurar in-quérito administrativo, que podelevar até à exoneração do profes-sor. “Durante a reunião do Cepe(Conselho Superior de Ensino,Pesquisa e Extensão), foi pedidoque ele fosse afastado de todas asaulas, mas isso ainda vai ser anali-sado”, disse Centoducatte.

Uma sindicância foi instauradapara apurar o caso e tem prazo de30 dias para ser encerrada. Segun-do o reitor, porém, a conclusão de-ve ser antecipada.

“Ele admite que houve os fatos.Então, acredito que a sindicânciadeve se encerrar rapidamente.Após isso, temos 90 dias para con-cluir o inquérito administrativo. Oprofessor pode ser punido até comexo n e ra ç ã o ”, explicou o reitor.

Ele classificou como constran-gedora a fala do professor. “Cons -trange e traz perplexidade.”

Um inquérito criminal foi abertotambém pelo Ministério PúblicoFederal. Segundo o órgão, foi soli-citado à Ufes o nome do professor,a lista de presença da turma onde ofato teria ocorrido e quais as provi-dências adotadas até o momento.A Ufes vai ter de responder aosquestionamentos em 48 horas.

ASS I ST Ê N C I AEm relação às cotas, Centodu-

catte afirmou que a Ufes pratica apolítica de cotas sociais desde2007. Ele também relembrou daspolíticas de assistência estudantil,que atendem 4.132 estudantes,sendo que 555 são negros.

“As nossas pesquisas indicamque, na média, cotistas e não-cotis-tas possuem as mesmas notas. Te-mos de melhorar, mas já investimosmais de R$ 20 milhões por ano emassistência estudantil para dar ga-rantias aos alunos que precisam.”

“Sou a favor dos negros”O professor Manoel Malagutti,

do Departamento de Economia daUniversidade Federal do EspíritoSanto (Ufes), defendeu-se no fimda tarde de ontem das acusações deracismo que motivaram investiga-ções na universidade e no Ministé-rio Público Federal.

Segundo ele, todos os trabalhosjá realizados durante sua vida co-mo pesquisador foram em defesados pobres e pela redução das desi-gualdades sociais.

Malagutti afirmou que não foiracista quando disse, em entrevistaao jornal A Tribuna, que as condi-ções sociais apresentadas por alu-nos negros e cotistas fazem comque o nível das aulas na universida-de caia, porque eles não conse-guem entender termos complexos.

“Eu entendo que a questão do ra-cismo passa pela cabeça das pes-

soas, mas minha postura sempre foide fortalecer os cotistas. Eu soucontra as cotas, mas já que elasexistem, que se fortaleçam os cotis-tas”, disse o professor.

Segundo ele, os depoimentosafirmando que os cotistas e negrospossuem condições inferiores deaprendizado foram para tentarmelhorar a situação deles. “Sou afavor dos negros, das mulheres edos trabalhadores pobres, e todosos meus trabalhos ressaltam essadesigualdade que existe no País.”

Mas ele reafirmou sua posiçãocontra as cotas. “Tenho amigos ne-gros, namorada negra e não acre-dito que sejam inferiores. Mas, seuma pessoa entra pelo sistema decotas, ela entra com notas inferio-res e condições menores de apren-dizado. É preciso resolver a desi-g u a l d a d e.”

FERNANDO RIBEIRO - 10/12/2013O REITOR DAUFES, R einaldoCe n t o d u c at t e ,disse que a falado professor foic o n s t ra n g e d o ra :“Co n s t ra n g ee trazp e r p l ex i d a d e ”,afirmou

Estudantes fazem protestoUm protesto foi realizado na tar-

de de ontem, na Universidade Fe-deral do Espírito Santo (Ufes), pa-ra pedir a demissão do professorde Economia Manoel Malagutti.Os manifestantes gritaram pala-vras de ordem, renegaram o racis-mo e cobraram providências nasede da reitoria da universidade.

Cerca de 200 manifestantes saí-ram do Centro de Ciências Huma-nas e Naturais (CCHN) da Ufes,por volta das 16 horas. Depois decircularem pelo campus, foram emdireção à reitoria.

Cantando “vai cair, vai cair, Ma-lagutti vai cair”, pediram a presen-ça de membros da reitoria para co-brar a adoção de medidas.

A vice-reitora Ethel Maciel foi aoencontro dos estudantes e expli-cou como seria montado o proce-dimento para apuração do caso emque o professor teria dito, dentreoutras coisas, que “detestaria seratendido por um médico negro.”

Depois disso, foram ao Departa-mento de Economia da Ufes, ondeforam recebidos pela chefe do de-

partamento, Carolina Giuberti,que afirmou que ela e outros pro-fessores repudiam as declaraçõesde Malagutti.

No fim da manifestação, os estu-dantes foram à avenida FernandoFerrari, que ficou fechada por cer-ca de 10 minutos nos dois sentidos.A manifestação terminou por voltadas 18 horas, com um abraço cole-tivo e gritos de palavras de ordemem frente ao Teatro Universitário.

O estudante de Geografia Josi-mar Nunes, de 22 anos, entrou nauniversidade por meio das cotassociais e acha que o professor deveser punido exemplarmente.

“Para ele, é necessário adotaruma punição exemplar. A impuni-dade é o combustível perfeito paraqualquer tipo de discriminação.Mas também é necessário repen-sar e rever práticas usadas na so-ciedade”, afirmou.

CENAS DO PROTESTO

AO FIM DO PROTESTO, m a n i f e s ta n t e sfizeram um abraço coletivo e gritarampalavras de ordem.

MANIFESTANTES OCUPARAM o pátioda reitoria e exigiram a exoneração doprofessor acusado de racismo.

AS DUAS PISTAS da avenida FernandoFerrari foram fechadas em frente àUfes por cerca de 10 minutos.

FOTOS: ADEMIR RIBEIRO/AT

P R OT ESTOc o n t rad e c l a ra ç õ e sde professorterminou emfrente ao TeatroU n i ve r s i tá r i o