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ORDEM DOS DVOGADOS CONSELHO GERAL 1 Processo n.º 13/PP/2016-G Requerente: Conselho de Deontologia de [...] Objecto: Averiguação de eventual incompatibilidade com o exercício da advocacia Visada: [...] Relatora: Dra. Ana Rita Duarte de Campos Sumário: (i) Em sede de averiguação de incompatibilidades e impedimentos no exercício da advocacia, compete ao Conselho Geral e aos Conselhos Regionais a sua declaração e aplicação, ao abrigo do disposto no artigo 81.º, n.º 5, do Estatuto da Ordem dos Advogados. (ii) Só após tais declaração e aplicação, concluindo-se pela verificação de incompatibilidade ou impedimento, pode ser despoletado, inclusivamente ex officio , por parte do Bastonário, dos titulares daqueles órgãos e dos titulares dos órgãos com competência disciplinar, procedimento disciplinar em razão do exercício da advocacia em situação de incompatibilidade ou de impedimento. (iii) As regras em matéria de incompatibilidades e impedimentos não podem afectar a validade de direitos conferidos por Lei anterior à respectiva previsão. (iv) Neste sentido, a Advogada que, sem suspensão da respetiva inscrição, exerça funções de assessoria/consultoria em Gabinete da […] desde 15 de Outubro de 1999, tendo, em 1 de Junho de 2010, celebrado contrato de trabalho em funções públicas, não se encontra em situação de incompatibilidade, por força da ressalva constante do artigo 69.º, n.º 2, do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março. INTRÓITO

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ORDEM DOS DVOGADOS

CONSELHO GERAL

1

Processo n.º 13/PP/2016-G

Requerente: Conselho de Deontologia de [...]

Objecto: Averiguação de eventual incompatibilidade com o exercício da

advocacia

Visada: [...]

Relatora: Dra. Ana Rita Duarte de Campos

Sumário:

(i) Em sede de averiguação de incompatibilidades e impedimentos no exercício da advocacia,

compete ao Conselho Geral e aos Conselhos Regionais a sua declaração e aplicação, ao

abrigo do disposto no artigo 81.º, n.º 5, do Estatuto da Ordem dos Advogados.

(ii) Só após tais declaração e aplicação, concluindo -se pela verificação de incompatibilidade

ou impedimento, pode ser despoletado, inclusivamente ex officio , por parte do

Bastonário, dos titulares daqueles órgãos e dos titulares dos ó rgãos com competência

disciplinar, procedimento disciplinar em razão do exercício da advocacia em situação de

incompatibilidade ou de impedimento.

(iii) As regras em matéria de incompatibilidades e impedimentos não podem afectar a

validade de direitos conferidos por Lei anterior à respectiva previsão.

(iv) Neste sentido, a Advogada que, sem suspensão da respetiva inscrição, exerça funções de

assessoria/consultoria em Gabinete da […] desde 15 de Outubro de 1999, tendo, em

1 de Junho de 2010, celebrado contrato de trabalho em funções públicas, não se encontra

em situação de incompatibilidade, por força da ressalva constante do artigo 69.º, n.º 2,

do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 84/84, de 16 de

Março.

INTRÓITO

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Tiveram os presentes autos origem numa participação anónima, datada de 13 de

Janeiro de 20141, dirigida à Exma. Senhora Bastonária da Ordem dos Advogados, Dra.

Elina Fraga, mediante a qual era dada nota de que “(…) há uma advogada a exercer funções

como tal, que é também funcionária pública na […] – [...], e que não exerce funções em

Departamento ou Serviço interno que a isente da proibição de incompatibilidade de funções que vem

exercendo.

Pede-se que se apure a responsabilidade dos dois lados.”

No dia 27 de Março de 2014, a Exma. Senhora Bastonária da Ordem dos Advogados,

Dra. Elina Fraga, remeteu a referida participação anónima ao Conselho de

Deontologia de [...], através de missiva onde, com a epígrafe “Denúncia de

incompatibilidade” , remeteu a participação em questão ao [...], à data, Presidente do

Conselho de Deontologia de [...], referindo tratar-se de “(…) correspondência referente à

competência territorial desse Conselho [de Deontologia de ...], descrevendo alegada

incompatibilidade da Advogada, com inscrição activa, a Senhora Dra. [...], cédula profissional n.º

[...], por eventual exercício de funções junto da (…)”

Em 2 de Maio de 2014, surge nos autos, a propósito do Processo Disciplinar [...], um

despacho da autoria do [...], então presidente do Conselho de Deontologia de [...]2,

onde se afirma que: “[e]ste Conselho de Deontologia recebeu, em 31/03/2014, uma denúncia

anónima, encaminhada pelo Conselho Geral da Ordem dos Advogados, contra a Exma. Senhora

Advogada [...], titular da cédula n.º [...](…)

Conforme estatuído no artigo 117.º do EOA, apenas “Podem intervir no processo as pessoas com

interesse directo, pessoal e legítimo relativamente aos factos participados…”

Por outro lado, os factos vertidos na denúncia anónima, são susceptíveis de constitui r violação do

disposto nos artigos 77.º/1 alínea a) (Incompatibilidade) e 86.º/alínea d) (Deveres para com a

Ordem dos Advogados), existindo elementos na denúncia que podem ser investigados, por isso, é

este Conselho competente para analisar e averiguar, e consequentemente, substituir -se como

participante, assumindo tal posição.

1 A fls. 3, dos autos. 2 Vide fls. 5, dos autos.

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Nestes termos e face ao disposto no n.º 2 do artigo 139.º do EOA, determina -se a instauração de

processo disciplinar contra a ora participada.”

Na sequência do referido despacho do então Presidente do Conselho de Deontologia

de [...], foram os autos distribuídos ao [...]3, que determinou, em 15 de Maio de 2014,

com fundamento no disposto no artigo 146.º, n.ºs 6 e 10, do EOA, que o participante 4

e a advogada visada fossem notificados da instauração do processo disciplinar,

devendo apresentar as suas posições sobre o mesmo e arrolar testemunhas, até ao

limite de 10, que deveriam ser indicadas aos factos acerca dos quais os respectivos

depoimentos incidiriam, com o limite de 3 por cada facto.

A advogada visada exerceu o seu direito de defesa, arrolou testemunhas e juntou 28

documentos em 12 de junho de 2014. 5

Foi deferido um aditamento ao rol de testemunhas, tendo quatro delas visto deferido

o pedido para deporem por escrito, tendo as restantes duas sido inquiridas

pessoalmente.6

Depuseram por escrito os Senhores Drs. [...]7, [...]8 e [...]9, todos advogados, para além

de [...]10, Procurador da República, e, presencialmente a Senhora Dra. [...]11, jurista na

[…] e o Senhor Arquitecto [...]12, cliente da advogada visada.

3 Vide fls. 6, dos autos. 4 Que nunca se identificou, já que a participação era anónima. Daí que, a fls. 8, dos autos, conste a indicação da escrivã, dando conta de que só notificou a participada do despacho do Relator de 15 de Maio de 2014, já que o participante era anónimo. A notificação à participada consta de fls. 9, dos autos. 5 Vide fls. 10 a 37, dos autos, constando os documentos juntos com a defesa da visada de um volume autónomo, apenso por linha. 6 Vide fls. 48, dos autos. 7 Vide fls. 72 e 73, dos autos. 8 Vide fls. 61 a 71, dos autos. 9 Vide fls. 76 a 77, dos autos. 10 Vide fls. 79 a 98, dos autos. 11 Auto de inquirição a fls. 93 e 94, dos autos. 12 Auto de inquirição a fls. 95, dos autos.

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Em 8 de Outubro de 2014 - seis dias após a tomada de declarações à última das

testemunhas arroladas pela advogada visada - o Relator lavrou despacho, remetendo

os autos à advogada instrutora “(…) para elaboração do projecto a que alude o artigo 147.º,

n.º 1, do EOA.”

A fls. 99, dos autos, consta uma impressão da plataforma “SINOA”, de 13 de Outubro

de 2014, referente ao registo disciplinar da advogada visada, do qual nada constava

nessa data.

Em 15 de Outubro de 2015 (mais de um ano após a remessa dos autos à advogada

instrutora), a advogada visada remeteu uma missiva ao Relator do processo disciplinar,

referindo, entre o mais, que “(…) o prolongamento deste processo é uma espada sobre a cabeça

[da advogada visada] que a tem impedido de tomar decisões importantes na sua vida profissional” ,

requerendo que “(…) V.ª Excia. se digne informá -la sobre o estado do processo, nomeadamente

se há alguma previsão para a sua conclusão.”

Em 13 de Novembro de 2015, o Relator do processo disciplinar lavra o seguinte

despacho, a fls. 107-verso, dos autos: “1. Remetam-se os autos à Senhora Advogada

Instrutora, para cumprimento do meu anterior despacho, de fls. 96, datado de 8/10/2014!

2. Notifique-se a Senhora Advogada Visada de que o actual processo se encontra a terminar a

respectiva fase instrutória, estando este Conselho, neste momento, a ponderar sobre o arquivamento

ou a elaboração de Despacho de Acusação, decisão esta que será em breve comunicada à Sra.

Advogada Visada.”13

Em 31 de Março de 2016, foi lavrado despacho conjunto do Relator do processo

disciplinar e da Advogada instrutora do mesmo, que consta de fls. 112, frente e verso,

dos autos, onde, entre o mais, se decidiu: “[u]ma vez que se trata de uma questão relacionada

com “incompatibilidades”, o presente Conselho de Deontologia só poderá exercer o poder disciplinar

(cf. estatui o art. 54.º do EOA, aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 25 de Janeiro), após o

competente órgão da O.A. averiguar e declarar se efectivamente, a situação em que a Senhora

13 Tal despacho foi objecto de notificação à Advogada visada em 16 de Novembro de 2015.

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Advogada participada se encontra , […] , é incompatível ou não com o exercício da advocacia. Sendo

que, s.m.o., nos termos do artigo 75.º, n.º 5 – Princípios gerais – As incompatibilidades ou os

impedimentos são declarados e aplicados pelo Conselho Geral ou pelo conselho distrital que for

competente, o qual aprecia igualmente a validade das estipulações, orientações, instruções a que se

refere o número anterior) e art. 77.º - Incompatibilidades, ambos do EOA, aprovado pela Lei n.º

15/2005, de 25 de Janeiro.

Assim, propõe-se que os presentes autos disciplinares sejam suspensos, até decisão do Conselho

Geral da O.A.

Após, será elaborado o respectivo Parecer nos termos do art. 147.º, n.º 1, do EOA.”

Este despacho foi seguido de um outro, lavrado pelo Relator do processo disciplinar,

no qual de determinou, em 7 de Abril de 2016, “[r] emetam-se os presentes autos à 1.ª secção,

para apreciação conjunta da proposta e respectiva deliberação.” 14

Em 26 de Abril de 2016, foi proferido Acórdão pelo [...] Conselho de Deontologia de

[...], nos termos do qual se decidiu o seguinte: “Por virtude de concordarem, na íntegra, com

a Proposta de Deliberação, que antecede, nos seus precisos e exactos termos, del iberam [...] em

proceder à suspensão, até à decisão do Conselho Geral, dos presentes autos, após o que será

elaborado o respectivo Parecer, nos termos do disposto no artigo 152.º do EOA (anterior artigo

147.º, n.º 1 do anterior EOA).” 15

Em 5 de Maio de 2016, o Relator lavrou, a fls. 115, dos autos, o seguinte despacho:

“[r]emetam-se os presentes autos ao Conselho Geral da Ordem dos Advogados, para que o mesmo

possa apreciar a questão suscitada nos presentes autos, respeitante à situação de compatibilidade

ou incompatibilidade da Senhora Advogada Visada, relativamente ao exercício da advocacia.

Após o que os presentes autos deverão ser devolvidos a este Conselho, para que o mesmo possa,

então, elaborar o Parecer a que alude o Acórdão, proferido a fls. 114 des tes autos.”

14 Vide fls. 112-verso, dos autos. 15 Importa notar que o Relator era membro [...] do Conselho de Deontologia e, como tal, também subscreveu o Acórdão.

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A Advogada foi notificada do “parecer” – rectius, do despacho conjunto do Relator e

da Advogada Instrutora de 31 de Março de 2016 - e do Acórdão [...] do Conselho de

Deontologia de [...] de 26 de Abril de 2016 em 9 de Maio de 2016.

Em 9 de Maio de 2016, os autos foram remetidos ao Conselho Geral da Ordem dos

Advogados16, tendo, nessa sequência, em 11 de Maio de 2016, sido proferido despacho

pela Exma. Senhora Bastonária, Dra. Elina Fraga, decidindo que: “a) o requerimento

supra referenciado deverá ser autuado como Processo de Parecer de Averiguação de

Incompatibilidades; b) Designo como Relator Senhor Vogal do Conselho Geral, [...]; c) No âmbito

da tramitação dos processos do Conselho Geral, ao Departamento Jurídico, para a devida

sequência.”17

No dia 11 de Maio de 2016, foram os autos conclusos – já sob a forma de processo de

Parecer do Conselho Geral – ao Relator nomeado pela Exma. Senhora Bastonária,

Dra. Elina Fraga, constando dos mesmos um despacho desse mesmo Relator, datado

de 10 de Janeiro de 2010, referindo: “Findo o presente mandato e cessado funções como membro

do Conselho Geral, abro mão dos autos.” 18

E, 11 de Janeiro de 2017, os autos regressaram ao Departamento Jurídico do Conselho

Geral da Ordem dos Advogados.19

A fls. 122, dos autos, consta do Despacho do Senhor Bastonário Guilherme Figueiredo,

de 27 de Janeiro de 2017, no qual se dá conta da deliberação do Conselho Geral da

Ordem dos Advogados, de 20 de Janeiro de 2017, mediante a qual nos termos das

disposições conjugadas dos artigos 44.º, n.º 1, do Código do Procedimento

Administrativo e 46.º, n.º 2, do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei

n.º 145/2015 de 9 de Setembro, foram delegadas na ora Relatora e na Dra. [...] as

competências conferidas ao Conselho Geral em matéria de verificação, declaração e

16 Vide fls. 197, dos autos. 17 Vide fls. 119, dos autos. 18 Vide fls. 120, dos autos. 19 Vide fls. 121, dos autos.

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aplicação de incompatibilidades e impedimentos, designadamente, as previstas no n.º

5, do artigo 81.º e no n.º 2, do artigo 84.º, ambos do EOA.

Nessa sequência, os autos foram distribuídos, em 3 de Fevereiro de 2017, à Dra. [...]

e à mesma conclusos.20

Em 9 de Novembro de 2017, os autos foram redistribuídos ao Dr. [...], Vice-Presidente

do Conselho Geral.21

Em 2 de Março de 2018, os autos regressaram ao Departamento Jurídico do Conselho

Geral da Ordem dos Advogados, acompanhados de despacho do Relator nomeado,

[...], no qual era determinada a remessa dos mesmos à secção de inscrições do

Conselho Regional de [...] da Ordem dos Advogados, “(…) para a devida instrução

preparatória e decisões posteriores e conformes dos vogais com competência delegada para o efeito.” 22

Em 7 de Maio de 2018, o Conselho Regional de [...] endereçou à […] uma carta na

qual referia que: “[a]o abrigo do disposto no artigo 7.º e 8.º do Estatuto da Ordem dos

Advogados, aprovado pela Lei 145/2015, de 9 de Setembro, e visando a instrução de processo de

eventual existência de incompatibilidade a correr termos na Ordem dos Advogados, pelo presente

solicito a V.ª Excia., se digne, por escrito e com a maior brevidade possível, mandar informar estes

serviços se a Exma. Senhora Dra. [...], Advogada, Ced. [...] (…) colabora com […], com a

indicação da respectiva data de início, natureza do vínculo e funções exercidas.” 23

A resposta da [… ] foi dada em 21 de Maio de 2018 e da mesma consta, entre o mais,

que: “(…) a Dra. [...] integra o Mapa de Pessoal do Gabinete [...], no regime jurídico de contrato

de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, com a categoria de técnico superio r, desde

1 de Junho de 2010.

20 Vide fls. 123, dos autos. 21 Vide fls. 125, dos autos. 22 Vide fls. 127, dos autos. Os autos foram remetidos à secção de inscrições do CR[...] em 7 de Março de 2018, conforme carta que se encontra a fls. 129, dos autos. 23 Vide fls. 131, dos autos.

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Exerce funções no referido Gabinete [...), prestando, designadamente, informações para magistrados

e juristas (que solicitem a estes serviços), sobre direito estrangeiro, direito internacional e direito

comunitário.

Mais se informa que em 15 de Outubro de 1999 havia sido celebrado, com esta trabalhadora,

contrato de prestação de serviços por avença, para prestação de assessoria técnico -jurídica no domínio

do tratamento de diversa legislação, tendo este contrato sido renovado anualmente, até 31 de Maio

de 2010, data da cessação do mesmo.” 24

Os autos foram remetidos do Conselho Regional de [...] da Ordem dos Advogados

para o Conselho Geral em 8 de Junho de 2018 25 e distribuídos à ora Relatora a 2 de

Julho de 2018, por despacho do Exmo. Senhor Bastonário, Dr. Guilherme Figueiredo

e foram à mesma conclusos no dia imediatamente seguinte.

I. DOS FACTOS

Com relevância para o apuramento de uma eventual situação de incompatibilidade 26

com o exercício da advocacia, entendemos encontrarem-se demonstrados nos autos

os seguintes factos:

(i) A Dra. [...] licenciou-se em Direito, pela Faculdade de Direito da

Universidade de [...] em 26 de Julho de 1984.

(ii) Em 16 de Novembro do mesmo ano, requereu, junto do então Conselho

Distrital de [...] da Ordem dos Advogados, a sua inscrição como Advogada -

Estagiária, tendo como Patrono o Senhor Dr. [...].

24 Vide fls. 136, frente e verso, dos autos. 25 Vide fls. 198 e 199, dos autos. 26 No caso em apreço, não se equaciona a existência de impedimento, uma vez que está em causa a aferição sobre se o exercício de uma determinada função, junto de um organismo público, impede ou não o exercício da advocacia e não quaisquer situações que, no âmbito de um mandato específico, limitem tal exercício.

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(iii) A Dra. [...] inscreveu-se como Advogada, no então Conselho Regional de

[...], em 18 de Setembro de 1986, tendo a sua cédula profissional sido

expedida em 10 de Outubro desse mesmo ano. 27

(iv) Em 15 de Outubro de 1999 foi celebrado com a Dra. [...] contrato de

prestação de serviços por avença, para prestação de assessoria técnico -

jurídica no domínio do tratamento de diversa legislação, no âmbito do

Gabinete [.. .], que funciona junto dos serviços da […], tendo este contrato

sido renovado anualmente28, até 31 de Maio de 2010, data da cessação do

mesmo.

(v) Com efeitos a 1 de Junho de 2010, a mesma Advogada celebrou um contrato

de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, com a categoria

de técnico superior, mantendo-se em funções no Gabinete [...] da […],

passando a integrar o respectivo quadro de pessoal. 29

(vi) O Gabinete [...] da […]“(…) fornece informação jurídica e presta

assessoria especializada em direito nacional, estrangeiro e internacional,

designadamente nas áreas da cooperação judiciária internacional e dos direitos humanos,

ao Ministério Público e outras entidades competentes, judiciárias ou outras, nacionais,

estrangeiras ou internacionais.

O Gabinete [...] realiza também estudos e difunde informação sobre sistemas

comparados de direito, coopera na organização e no tratamento de documentação

emanada de organismos internacionais, participa em reuniões internacionais e apoia os

representantes do país em organizações internacionais. Colabora igualmente na

divulgação, no estrangeiro, do sistema jurídico português, designadamente junto dos

Estados membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Desenvolve ainda

27 Estes três primeiros factos decorrem do processo de inscrição da Advogada Visada, anexo aos presentes autos. 28 Vide os documentos 13 e 13-A, juntos pela Advogada Visada, que constam do Volume apenso por linha, referentes às renovações relativas aos anos de 2007 e 2008. 29 Este facto e o do ponto anterior resultam da comunicação da […] , de 21 de Maio de 2018.

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atividades de divulgação pública, educação e fo rmação especializada nas suas áreas de

competência.

O Gabinete [...] presta apoio à Autoridade Central para a receção e transmissão de

pedidos de cooperação judiciária internacional em matéria penal, competências que são

atribuídas à […] pelo artigo […] da Lei […]. De acordo com o artigo […] da mesma

Lei, o Gabinete presta também informação sobre o direito português aplicável em

determinado processo penal que seja solicitada por uma au toridade judiciária

estrangeira, ou sobre o direito estrangeiro a pedido de autoridade judiciária portuguesa.

Além do mais, o Gabinete [...] é o órgão nacional de recepção e transmissão de

informação sobre o direito estrangeiro ao abrigo da Convenção Europeia no Âmbito da

Informação sobre o Direito Estrangeiro .” [nota suprimida]

(vii) Tal Gabinete foi criado pelo Decreto-Lei n.º [...] contando-se entre as suas

competências as seguintes: a) contribuir para a organização e tratamento da

documentação emanada de organismos internacionais, com relevo para a

actividade desenvolvida pela […] e pelo […]; b) proceder, em colabor ação

com as bibliotecas da […]e do […], ao levantamento de um ficheiro de

legislação estrangeira, comunitária e internacional, de forma a poder apoiar,

em termos comparativos, os serviços de consulta jurídica da […]; c)

fomentar o acesso dos juristas portugueses ao direito estrangeiro,

internacional e comunitário e apoiar, para o efeito, a actividade de

publicações jurídicas do […], designadamente o suplemento do […] sobre

[…]; d) apoiar documentalmente a actividade dos representantes designados

no âmbito do […] para participar em reuniões de organismos internacionais

e cooperar na preparação de relatórios, informações, pareceres, respostas a

questionários ou outros trabalhos que […] caiba apresentar a tais

organismos; e) proceder à difusão de toda a documentação recebida pelos

vários serviços do […] ou de outros departamentos do Estado que nela

manifestem interesse; f) prestar apoio, na área da sua actividade específica,

às acções de cooperação jurídica internacional que caibam ao […] ou a

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outros departamentos governamentais e seus organismos especializados e g)

assegurar a ligação entre […] e o Centro de Informática do […] em matéria

de preparação e concretização de projectos relativos à implementação de

um sistema de tratamento automático da informação jurí dica.

(viii) O trabalho desenvolvido pela Advogada Visada junto do Gabinete [...] da

[…] compreende o apoio diário de informação em matéria de legislação

estrangeira aos Tribunais e presta informações de elevado nível de

complexidade a todas as entidades públicas que as solicitam,

designadamente, à Presidência do Conselho de Ministros, à Comissão

Nacional de Protecção de Dados Pessoais, aos Grupos Parlamentares, a

Direcções-Gerais e a Embaixadas.30

(ix) Trata-se de uma função relacionada com a assessoria ao exercício de uma

função do Estado, independente e estranha à Administração Pública. 31

(x) A Advogada Visada foi qualificada, no Mapa [...], anexo à Proposta de

Renovação do Contrato de Prestação de Serviços, de 29 de Setembro de

2008, como ocupando uma função de assessoria técnico -jurídica.

(xi) No dia 28 de Maio de 2010, a Advogada Visada celebrou, com a […],

contrato de trabalho em funções públicas, por tempo indeterminado,

contrato esse destinado a produzir efeitos a partir de 1 de Junho de 2010. 32

(xii) De acordo com a cláusula segunda, do referido contrato de trabalho em

funções públicas, “1. [a]o Segundo Outorgante é atribuída a categoria de técnico

superior, sendo contratado para, sob a autoridade e direcção do Primeiro Outorgante, e

sem prejuízo da autonomia técnica inerente à actividade contratada, desempenhar as

30 Facto que decorre da proposta de renovação do contrato de avença celebrado com a Advogada Visada, que integra o documento 13, junto pela mesma, que consta do Volume apenso por linha. 31 Vide o ponto 11, a pp. 4/6, da Proposta de Renovação do Contrato de Prestação de Serviços, de 29 de Setembro de 2008, que integra o documento n.º 14, junto pela Advogada Visada, que consta do Volume apenso por linha. 32 O contrato em questão foi junto pela Advogada Visada, como documento 17 e consta, com essa indicação, do Volume apenso por linha.

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respectivas funções, cujo conteúdo funcional se encontra descrito no n.º 2 do artigo 49.º

da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro. 33 O Trabalhador fica também obrigado a

exercer as funções e a executar as tarefas descritas no Mapa de Pessoal do Gabinete

[...], que caracterizam o posto de trabalho que vai ocupar. 3. A actividade contratada

não prejudica o exercício, de forma esporádica, das funções que lhe sejam afins ou

funcionalmente ligadas., para as quais o trabalhador detenha qualificação profissional

adequada e não impliquem desvalorização profissional, nos termos estabelecidos no

artigo 113.º do RGTFP.”

(xiii) No dia [...] de 2010 foi publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º [....],

o extracto do Despacho n.º [....], dando conta da celebração do contrato

referido no ponto anterior.

(xiv) Durante os anos de 2010 a 2013, a parte mais significativa do rendimento

declarado da Advogada Visada correspondia aos vencimentos auferidos pelo

exercício de funções no Gabinete [...], sendo absolutamente residuais os

restantes.

(xv) A Advogada Visada encontra-se, à presente data, a exercer funções no

Gabinete [...] da [...].

(xvi) A Advogada Visada encontra-se com inscrição activa na Ordem dos

Advogados, ininterrupta, desde o dia 3 de Outubro de 1986. 34

33 A Lei em questão encontra-se actualmente revogada, por via da entrada em vigor da Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho. O artigo 49.º, n.º 2, dessa Lei, remetia para um anexo à mesma, no qual a função de técnico superior era caracterizada, no seu conteúdo, da seguinte forma: “Funções consultivas, de estudo, planeamento, programação, avaliação e aplicação de métodos e processos de natureza técnica e ou científica, que fundamentam e preparam a decisão. Elaboração, autonomamente ou em grupo, de pareceres e projectos, com diversos graus de complexidade, e execução de outras actividades de apoio geral ou especializado nas áreas de actuação comuns, instrumentais e operativas dos órgãos e serviços. Funções exercidas com responsabilidade e autonomia técnica, ainda que com enquadramento superior qualificado. Representação do órgão ou serviço em assuntos da sua especialidade, tomando opções de índole técnica, enquadradas por directivas ou orientações superiores.” 34 Conforme informação constante do sítio da Ordem dos Advogados, nesta data consultado, acessível em [...].

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II. QUESTÃO PRÉVIA: DOS PODERES DO CONSELHO GERAL E

DOS CONSELHOS DE DEONTOLOGIA, EM FACE DE

EVENTUAIS VIOLAÇÕES DE REGRAS PROFISSIONAIS QUE

ESTABELECEM INCOMPATIBILIDADES COM O EXERCÍCIO DA

ADVOCACIA OU IMPEDIMENTOS A ESSE MESMO EXERCÍCIO

As regras que estabelecem incompatibilidades com o exercício da advocacia são

regras relativas ao exercício da profissão que a delimitam negativamente, isto é,

são regras que impedem, da óptica do exercício da advocacia, o desempenho de

outras funções e actividades.

A violação de tais regras, sendo causa de ilícito disciplinar, é dife renciada das

restantes regras estatutárias – designadamente, as relativas à deontologia

profissional, que se encontram previstas nos artigos 88.º a 113.º, do Estatuto da

Ordem dos Advogados, compreendendo a regulação das relações com os clientes,

com os tribunais e entre advogados – na medida em que a violação de regras em

matéria de incompatibilidade pressupõe uma declaração, por parte do Conselho

Geral da Ordem dos Advogados ou do Conselho Regional respectivo.

Nesse sentido depõe o disposto no artigo 81. º, n.º 5, do Estatuto da Ordem dos

Advogados, onde pode ler-se que: “[a]s incompatibilidades e os impedimentos são

declarados e aplicados pelo Conselho Geral ou pelo Conselho Regional que for o competente

(…).”

Nesta matéria, o poder do Conselho Geral e dos Conselhos Regionais vai ao ponto

de permitir a declaração, por parte de tais órgãos, da nulidade de quaisquer

estipulações contratuais, por via das quais as regras, em matéria de impedimentos

e incompatibilidades, previstas no Estatuto da Ordem dos Advo gados sejam

violadas, conforme se dispõe na segunda parte do mesmo artigo 81.º, n.º 5, do

Estatuto da Ordem dos Advogados.

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Esta especificidade – que remonta ao Estatuto Judiciário de 1962 35, embora aí se

previsse que tal competência declarativa e aplicativa se encontrava sob a tutela do

Ministério da Justiça36 – encontra justificação no poder de pronúncia atribuído ao

Conselho Geral e aos Conselhos Regionais, no que tange ao exercício da profissão

de advogado, atendendo a que dessa interpretação pode resultar uma redução do

âmbito possível desse mesmo exercício, o que é dizer que a delimitação do âmbito

do exercício legítimo da profissão de advogado cabe ao Conselho Geral e aos

Conselhos Regionais, que têm competência exclusiva para declarar e aplica r as

normas relativas às incompatibilidades e aos impedimentos previstas no Estatuto

da Ordem dos Advogados.

Note-se que a competência em causa não é puramente declarativa, uma vez que

como vimos, os Conselhos Geral e Regionais podem determinar a suspensã o da

inscrição como advogado, sem necessidade de qualquer outra intervenção

decisória, quer porque concluem pela verificação de uma situação de

incompatibilidade ou de impedimento, quer porque o advogado que possa

encontrar-se numa tal situação não presta a colaboração necessária ao

esclarecimento da mesma no prazo de 30 dias contados da recepção do pedido

(artigo 81.º, n.º 2, do Estatuto da Ordem dos Advogados).

Assim, e desde há muito, a questão relativa à declaração e aplicação de normas em

matéria de impedimentos e incompatibilidades com o exercício da advocacia está

reservada ao Conselho Geral e aos Conselhos Regionais da Ordem dos Advogados.

Naturalmente que a violação das regras em matéria de impedimentos e de

incompatibilidades implica a responsabilidade disciplinar do advogado, ao abrigo

35 Decreto-Lei n.º 44278, de 14 de Abril, no seu artigo 591.º. 36 A menos que se demonstrasse que o exercício da profissão de advogado, nessas condições, implicaria que o cargo público fosse usado para o aumento ou em proveito da sua clientela como advogados (artigo 592.º, n.º 1, alínea b), do Estatuto Judiciário de 1962), sem prejuízo de o Conselho Geral da Ordem dos Advogados poder “estabelecer a incompatibilidade do exercício da advocacia com o de outras profissões e actividades consideradas susceptíveis de comprometer a dignidade ou o decoro do advogado”, devendo tais deliberações ser, em todo o caso, homologadas pelo Ministro da Justiça, nos termos do que se dispunha no artigo 594.º, do mesmo diploma legal.

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da regra geral que se encontra prevista no artigo 115.º, n.º 1, do Estatuto da Ordem

dos Advogados, nos termos da qual “[c]omete infracção disciplinar o advogado ou o

advogado estagiário que, por acção ou omissão , violar dolosa ou culposamente algum dos deveres

consagrados no presente Estatuto, nos respectivos regulamentos ou nas demais disposições legais

aplicáveis.”

A iniciativa do procedimento disciplinar cabe, nos termos do disposto no artigo

123.º, n.º 1, do Estatuto da Ordem dos Advogados, aos Presidentes dos Conselhos

com competência em matéria disciplinar, sem prejuízo de poder ser despoletado

em consequência de participação de qualquer cidadão que se identifique (nos

termos do disposto no n.º 2, do mesmo artigo) e da competência do Bastonário,

dos Conselhos Superior, Geral, Regionais e de Deontologia poderem, ex officio,

ordenar a respectiva instauração (conforme decorre do disposto no n.º 3, do

mesmo artigo).

As regras vertidas no artigo 123.º, do Estatuto da Ordem dos Advogados são regras

gerais que regem a iniciativa do procedimento disciplinar, o que significa que,

estando em causa questões que possam prender-se com a violação de regras

estatutárias em matéria de incompatibilidades e de impedimentos ao exercício da

advocacia, as mesmas têm de ser interpretadas em função da especificidade da matéria

em questão.

Neste sentido, e carecendo o exercício válido do poder disciplinar, no caso de

violação de regras em matéria de incompatibilidades e impedimentos, de declaração

e aplicação prévias por parte do Conselho Geral ou dos Conselhos Regionais da

Ordem dos Advogados, nos termos do disposto no artigo 81.º, n.º 5, do Estatuto

da Ordem dos Advogados, não há condições legais para o exercício legítimo do

poder disciplinar antes de tais declaração e aplicação.

No caso vertente, confrontado com esta incontornável questão no momento em

que a Instrutora nomeada do processo disciplinar pendente no Conselho de

Deontologia da Ordem dos Advogados se encontrava a ser instada –

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designadamente pelo Relator dos mesmos – para proferir Parecer, aquele Conselho

decidiu suspender o processo disciplinar, o que fez em 26 de Abril de 2016

(encontrando-se o prazo de suspensão máximo estatutariamente admissível

esgotado há muito esgotado), data foi proferido Acórdão pelo [...] Conselho de

Deontologia de [...].

Ora, tal decisão de suspensão do procedimento disciplinar (que já ultrapassou o

prazo máximo de 18 meses prescrito no artigo 118. º, n.º 2, do Estatuto da Ordem

dos Advogados) não tem cobertura legal, uma vez que os fundamentos de

suspensão enunciados no n.º 2, desse mesmo artigo, não se verificam, já que não

decorre dos autos que esteja pendente processo penal contra a Advogada visa da,

não tendo, igualmente, sido proferida acusação no processo disciplinar.

No caso em apreço, não poderia, pois, à luz do quadro estatutário que temos vindo

a traçar, ser a denúncia anónima na origem destes autos encaminhada para o

Conselho de Deontologia de [...] (a menos que se entendesse – e seria preciso muito

esforço interpretativo para tal – que a carta da Exma. Senhora Bastonária de 27 de

Março de 2014, que acompanhou a remessa da denúncia anónima àquele Conselho,

consubstanciaria uma ordem de instauração de procedimento disciplinar) e dar

início a um procedimento disciplinar. É que, de facto, nessa missiva, não pode ler -

se qualquer comando expresso ou tácito que autorize uma tal interpretação.

Certamente a circunstância a que acabamos de aludir não passou despercebida ao

Conselho de Deontologia de [...] que, em 2 de Maio de 2014, pela mão do Dr. [...],

lavrou um despacho em que se “substituía” ao participante (cuja identidade se

desconhecia) o que, interpretando tal despacho, não pode deixar de con substanciar

uma instauração ex officio do processo disciplinar.

O Conselho de Deontologia de [...] investiu-se em denunciante, fazendo suas as

imputações de um anónimo. Foi a forma encontrada para que – pelo menos na

aparência – se ter respeitado o quadro estatutário em matéria de iniciativa para

fazer despoletar o procedimento disciplinar. Não fosse assim (nada impondo que

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tivesse sido assim) e não teria restado ao Conselho de Deontologia de [...] outro

caminho que não fosse o do arquivamento liminar dos autos.

Feita esta análise, que dá conta da via crucis que este processo conheceu, mas cuja

análise é indispensável à sustentação da correcta interpretação das normas

estatutárias que, conforme referimos, conferem poder declarativo e aplicativo ao

Conselho Geral e aos Conselhos Regionais em matéria de incompatibilidades e

impedimentos ao exercício da profissão de advogado, importa aferir se, em

concreto, a Advogada visada se encontra ou não numa dessas situações.

III. ANÁLISE JURÍDICA DO CASO, NA VERTENTE DA EXISTÊNCIA

DE EVENTUAL INCOMPATIBILIDADE COM O EXERCÍCIO DA

ADVOCACIA

No caso em apreço, estabelecida que está a factualidade que se mostra necessária à

pronúncia deste Conselho Geral da Ordem dos Advogados, nos termos do disposto

no artigo 81.º, n.º 5, do Estatuto da Ordem dos Advogados, em especial, a que se

prende com a materialidade das funções exercidas, importa dizer o seguinte:

A Advogada visada iniciou as suas funções de assessoria jurídica junto do Gabinete

[...] da […] em 15 de Outubro de 1999, ao abrigo de um contrato de prestação de

serviços (em regime de avença) tendo, em 1 de Junho de 2010, passado a exercer as

mesmas funções, mas ao abrigo de um contrato de trabalho em funções públicas, por

tempo indeterminado.

Não há dúvidas que o trabalho desenvolvido pela Advogada visada, de acordo com os

elementos probatórios que constam dos autos, é um trabalho de assessoria jurídica.

Trata-se de identificação, recolha e encaminhamento de pedidos relacionados com

Direito internacional, sendo, em nosso entender, indiferente se tal trabalho se reporta

a análises genéricas ou possa ter impacto em situações concretas, uma vez que a

assessoria jurídica não tem de ser prestada apenas por referência à análise, em

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abstracto, de questões jurídicas, ao contrário do que parece decorrer do entendimento

expresso pela Advogada visada, na defesa que apresentou no âmbito do processo

disciplinar que lhe foi movido.

Por outro lado, os autos não permitem concluir que a actividade levada a cabo pela

Advogada visada haja sofrido qualquer modificação, após a celebração do contrato de

trabalho em funções públicas, que produz efeitos desde o dia 1 de Junho de 2010 e

que ainda se encontra em vigor, permanecendo a Advogada visada em exercício de

funções ao abrigo do mesmo.

Aliás, a resposta da […], dada em 21 de Maio de 2018 (não obstante a questão da

identidade de funções, por referência ao tempo em que as exerceu em regime de avença

e àquele desde que foi celebrado o contrato de trabalho em funções públicas, não ter

sido objecto de qualquer questão na missiva que motivou o esclarecimento prestado

em 21 de Maio de 2018 pela […]) permite descortinar a continuidade de funções, não

obstante o título jurídico ao abrigo da qual as mesmas eram exercidas ter sido alterado

em 1 de Junho de 2010.

Também não constam dos autos quaisquer indícios de que a actividade desenvolvida

pela Advogada visada tenha, em momento algum, extravasado a prestação de assessoria

jurídica, sem prejuízo de, em abstracto, a categoria profissional de técnica sup erior e

os termos genéricos em que o objeto do contrato de trabalho em funções públicas se

encontra configurado no contrato em execução desde 1 de Junho de 2010 poderem

habilitá-la a exercer funções diversas das da assessoria jurídica.

Todavia, sublinhe-se, não há qualquer prova nos autos de que seja esse o caso, daí

termos concluído que a actividade desenvolvida pela Advogada visada é de assessoria

jurídica e é-o desde 15 de Outubro de 1999, sem que a celebração do contrato de

trabalho em funções públicas haja alterado a materialidade de tal prestação.

Aqui chegados, impõe-se analisar o regime jurídico aplicável, em matéria de

incompatibilidades com o exercício da advocacia, por forma a que possa concluir -se

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se o caso que os presentes autos retratam pode ou não implicar a verificação de

qualquer incompatibilidade.

A Advogada visada é, desde 1 de Junho de 2010, funcionária pública, por via do

contrato de trabalho em vigor desde essa data.

De acordo com o artigo 82.º, n.º 1, alínea i), do Estatuto da Ordem dos Advogados

aprovado pela Lei n.º 145/2015, de 15 de Setembro, “[São, designadamente, incompatíveis

com o exercício da advocacia os seguintes cargos, funções e atividades: ] i) Trabalhador com

vínculo de emprego público ou contratado de quaisquer serviços ou entidades que possuam

natureza pública ou prossigam finalidades de interesse público, de natureza central, regional ou

local”.

A incompatibilidade em questão resultou de uma inovação introduzida na actual versão

do Estatuto da Ordem dos Advogados, incompatibilidade essa que assenta,

exclusivamente, na natureza pública do vínculo jurídico -laboral, independentemente

das funções que, em concreto, sejam levadas a cabo.

Todavia, o artigo 86.º, do actual Estatuto da Ordem dos Advogados prevê uma regra

de aplicação no tempo dos regimes das incompatibilidades e impedimentos – que, em

nosso entender, seria despicienda 37, mas que tem a virtualidade de deixar plenamente

esclarecido que os actos legislativos por via dos quais os limites ao âmbito do exercício

da advocacia sejam estabelecidos não prejudicam direitos adquiridos ao abrigo de Lei

anterior - , nele se estatuindo que: “As incompatibilidades e impedimentos criados pelo presente

Estatuto não prejudicam os direitos legalmente adquiridos ao abrigo de legisl ação anterior.”

Importa notar que a Advogada visada iniciou o exercício das suas funções no Gabinete

[...] da […] em 15 de Outubro de 1999, altura em que se encontrava em vigor a versão

37 Basta ter presente, de resto, que, nos termos do disposto no artigo 12.º, n.º 1, do Código Civil, a Lei só dispõe para o futuro, sendo, por maioria de razão, assim, quando esteja em causa a limitação do exercício de direitos (como é o direito ao exercício da profissão, que as normas sobre incompatibilidades e impedimentos limitam), a mesma não pode ser retroactiva, ou seja, não pode invalidar o conteúdo de relações jurídicas nem limitar o exercício de direitos validamente reconhecidos por Lei anterior.

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do Estatuto da Ordem dos Advogados feita aprovar por via do Decreto -Lei n.º 84/84,

de 16 de Março, onde se dispunha, no respectivo artigo 69.º, n.º 1, alínea i), o seguinte:

“[O exercício da advocacia é incompatível com as funções e actividades seguintes: ] i) Funcionário

ou agente de quaisquer serviços públicos de natureza central, regional ou local, ainda que

personalizados, com excepção dos docentes de disciplinas de Direito.”

Para a verificação da assinalada incompatibilidade, era indiferente – salvo,

naturalmente, tratando-se de funcionário – o título de designação, natureza e espécie

de provimento e modo de remuneração e o regime jurídico das respectivas funções ,

nos termos do disposto no 69.º, n.º 2, primeira proposição, do Estatuto da Ordem dos

Advogados, na versão aprovada por via do Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março.

Todavia, essa versão do Estatuto previa também uma ressalva às incompatibilidades

elencadas no artigo 69.º, n.º 1, ao prever, no n.º 2, do mesmo artigo, que as mesmas

não se verificavam quando o conteúdo das funções exercidas se cingisse à consulta

jurídica.

Naturalmente que o conceito de “consulta jurídica” referido no artigo em questão

nada tem que ver com a consulta jurídica que é acto próprio de advogado, mas, antes,

com as funções comummente designadas de “assessoria jurídica”.

Neste sentido, e pese embora a actual redação do artigo 82.º, n.º 1, alínea i), do

Estatuto da Ordem dos Advogados, a circunstância de, ao tempo em que iniciou as

suas funções – relativamente às quais não está demonstrado que fossem distintas das

que passou a exercer após 1 de Junho de 2010, data do início da produção de efeitos

do contrato de trabalho em funções públicas que a Advogada visada celebrou com a

[…]– não haver incompatibilidade entre o exercício da advocacia e o exercício de

funções de acessória/consulta jurídica junto de entidades públicas, inviabiliza, em

definitivo, a existência de qualquer incompatibilidade.

Apenas não seria assim caso a Advogada visada tivesse iniciado as suas funções em 1

de Junho de 2010, data em que se encontrava em vigor a versão do Estatuto da Ordem

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dos Advogados aprovada pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, já que a ressalva

anteriormente existente no artigo 69.º, n.º 2, do Estatuto da Ordem dos Advogados,

na versão resultante do Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março, foi suprimida.

Para além disso, de acordo com a versão do Estatuto da Ordem dos Advogados

resultante da Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, a incompatibilidade aí sedeada no

artigo 77.º, n.º 1, al ínea j) – onde se enquadraria a actividade levada a cabo pela

Advogada visada – apenas não se verificaria caso a mesma fosse levada a cabo ao

abrigo de um contrato de prestação de serviços, nos termos do disposto no n.º 2,

alínea d), do mesmo artigo.

Todavia, também o Legislador de 2005 fez menção expressa, no artigo 81.º, do

Estatuto da Ordem dos Advogados que nesse ano entrou em vigor ao respeito pelos

direitos adquiridos ao abrigo de legislação anterior em matéria de aferição de

impedimentos e incompatibilidades (solução que, como já vimos, retomou em 2015),

pelo que, mesmo em face da versão do Estatuto da Ordem dos Advogados aprovada

pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, nem a partir da respetiva entrada em vigor,

nem após a celebração do contrato de trabalho em funções públicas se verificou, pelas

razões acima analisadas, qualquer incompatibilidade.

IV. CONCLUSÕES

(i) A violação das regras que estabelecem incompatibilidades com o

exercício da advocacia, sendo causa de ilícito disciplinar, é

diferenciada da violação das restantes regras estatutárias, na medida

em que a respectiva violação pressupõe uma declaração por parte do

Conselho Geral ou do Conselho Regional que for competente,

atendendo ao disposto no artigo 81.º, n.º 5, do Estatuto da Ordem dos

Advogados.

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(ii) A competência em questão é declarativa e aplicativa, já que, caso o

advogado visado não preste os esclarecimentos que lhe sejam

solicitados por parte do Conselho Geral ou do Conselho Regional

competente perante uma situação de possível incompatibilidade,

aqueles conselhos podem determinar a suspensão da respectiva

inscrição.

(iii) A violação das regras que estabelecem incompatibilidades com o

exercício da profissão de advogado têm relevância disciplinar nos

termos do disposto no artigo 115.º, n.º 1, do Estatuto da Ordem dos

Advogados.

(iv) A iniciativa do procedimento disciplinar cabe, atendendo ao disposto

no artigo 123.º, n.º 1, do Estatuto da Ordem dos Advogados, aos

Presidentes dos Conselhos com competência em tal matéria, sem

prejuízo de poder ser despoletado em consequência da participação

de qualquer cidadão que se identifique, em função do disposto no n.º

2, do mesmo artigo.

(v) Nos termos do disposto no artigo 123.º, n.º 3, do Estatuto da Ordem

dos Advogados, o Bastonário, o Presidente do Conselho Superior e os

Presidentes dos Conselhos de Deontologia podem, ex officio,

determinar a instauração de procedimento disciplinar.

(vi) Sem que seja declarada a incompatibilidade com o exercício da

advocacia pelo Conselho Geral ou pelo Conselho Regional

competente, inexistem condições válidas para que possa ser iniciado

um procedimento disciplinar com fundamento na violação das regras

estatutárias que a consagram.

(vii) O prazo máximo de suspensão do procedimento disciplinar é de 18

meses, nos termos do disposto no artigo 118.º, n. º 2, do Estatuto da

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Ordem dos Advogados, devendo ter-se por verificadas as condições

materiais estritas de que depende tal suspensão.

(viii) No caso vertente, nem tais condições se verificam (posto que os autos

não demonstram a pendência de qualquer processo crime contra a

Advogada visada por factos idênticos aos que integram o respectivo

objecto nem foi proferida decisão de acusação no procedimento

disciplinar), encontrando-se transcorrido o prazo para que tal

suspensão pudesse, em todo o caso, vigorar.

(ix) A denúncia anónima que esteve na origem destes autos não poderia

ter sido enviada para o Conselho de Deontologia de [...], antes da

declaração da existência de uma situação de incompatibilidade.

(x) O Presidente do Conselho de Deontologia de [...] aderiu à denúncia

anónima referida no ponto anterior, evitando, dessa forma, o

arquivamento liminar do processo.

(xi) O trabalho levado a cabo pela Advogada visada junto do Gabinete [...]

da […] é um trabalho de assessoria jurídica.

(xii) Esse trabalho é desenvolvido desde 15 de Outubro de 1999, data em

que a Advogada visada celebrou um contrato de prestação de serviços

(em regime de avença).

(xiii) Em 1 de Junho de 2010, a Advogada visada celebrou um contrato de

trabalho em funções públicas, por tempo indeterminado.

(xiv) Inexistem nos autos quaisquer dados que permitam concluir no

sentido de a natureza da prestação se tenha alterado após a celebração

do contrato referido na alínea anterior, existindo, aliás, prova de que

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existiu uma continuidade nessa prestação, resultante da carta de 21 de

Maio de 2018, remetida aos autos pela […].

(xv) Inexistem nos autos indícios de que a actividade desenvolvida pela

Advogada visada tenha, em momento algum, extravasado a prestação

de assessoria jurídica.

(xvi) Desde 1 de Junho de 2010, a Advogada visada é funcionária pública,

por via do contrato de trabalho nessa data celebrado.

(xvii) Nos termos do disposto no artigo 82.º, n.º 1, alínea i), do Estatuto da

Ordem dos Advogados, na redacção resultante da Lei n.º 145/2015, de

15 de Setembro, encontra-se em exercício de função incompatível com

a advocacia o “funcionário ou agente de quaisquer serviços públicos

de natureza central, regional ou local, ainda que personalizados, com

excepção dos docentes de disciplinas de Direito.”

(xviii) Todavia, o artigo 86.º, do actual Estatuto da Ordem dos Advogados

prevê uma regra de aplicação no tempo dos regimes das

incompatibilidades e impedimentos segundo a qual: “As

incompatibilidades e impedimentos criados pelo presente Estatuto

não prejudicam os direitos legalmente adquiridos ao abrigo de

legislação anterior.”

(xix) A Advogada visada iniciou o exercício das suas funções no Gabinete

[...] da […] em 15 de Outubro de 1999, altura em que se encontrava em

vigor a versão do Estatuto da Ordem dos Advogados feita aprovar por

via do Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março, onde se dispunha, no

respectivo artigo 69.º, n.º 1, alínea i), o seguinte: “[O exercício da

advocacia é incompatível com as funções e actividades seguintes: ] i)

Funcionário ou agente de quaisquer serviços públicos de natureza

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CONSELHO GERAL

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central, regional ou local, ainda que personalizados, com excepção dos

docentes de disciplinas de Direito.”

(xx) Para a verificação da assinalada incompatibilidade, era indiferente –

salvo, naturalmente, tratando-se de funcionário – o título de

designação, natureza e espécie de provimento e modo de remuneração

e o regime jurídico das respectivas funções, nos termos do disposto no

69.º, n.º 2, primeira proposição, do Estatuto da Ordem dos Advogados,

na versão aprovada por via do Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março.

(xxi) Todavia, essa versão do Estatuto previa também uma ressalva às

incompatibilidades elencadas no artigo 69.º, n.º 1, ao prever, no n.º 2,

do mesmo artigo, que as mesmas não se verificavam quando o

conteúdo das funções exercidas se cingisse à consulta jurídica.

(xxii) Assim, pese embora a actual redação do artigo 82.º, n.º 1, alínea i), do

Estatuto da Ordem dos Advogados, a circunstância de, ao tempo em

que iniciou as suas funções – relativamente às quais não está

demonstrado que fossem distintas das que passou a exercer após 1 de

Junho de 2010, data do início da produção de efeitos do contrato de

trabalho em funções públicas que a Advogada visada celebrou com a

[…] – não haver incompatibilidade entre o exercício da advocacia e o

exercício de funções de acessória/consulta jurídica junto de entidades

públicas, inviabiliza, em definitivo, a existência de qualquer

incompatibilidade.

(xxiii) Apenas não seria assim caso a Advogada visada tivesse iniciado as

suas funções em 1 de Junho de 2010, data em que se encontrava em

vigor a versão do Estatuto da Ordem dos Advogados aprovada pela Lei

n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, já que a ressalva anteriormente existente

no artigo 69.º, n.º 2, do Estatuto da Ordem dos Advogados, na versão

resultante do Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março, foi suprimida.

Page 26: Processo n.º 13/PP/2016-G advocacia Relatora: Dra. Ana ...º-13-pp-2016-g.pdf · (cf. estatui o art. 54.º do EOA, aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 25 de Janeiro), após o competente

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(xxiv) De acordo com a versão do Estatuto da Ordem dos Advogados

resultante da Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, a incompatibilidade aí

sedeada no artigo 77.º, n.º 1, alínea j) – onde se enquadraria a

actividade levada a cabo pela Advogada visada – apenas não se

verificaria caso a mesma fosse levada a cabo ao abrigo de um contrato

de prestação de serviços, nos termos do disposto no n.º 2, alínea d),

do mesmo artigo.

(xxv) Também o Legislador de 2005 fez menção expressa, no artigo 81.º, do

Estatuto da Ordem dos Advogados que nesse ano entrou em vigor ao

respeito pelos direitos adquiridos ao abrigo de legislação anterior em

matéria de aferição de impedimentos e incompatibilidades (solução

que, como já vimos, retomou em 2015), pelo que, mesmo em face da

versão do Estatuto da Ordem dos Advogados aprovada pela Lei n.º

15/2005, de 26 de Janeiro, nem a partir da respetiva entrada em vigor,

nem após a celebração do contrato de trabalho em funções públicas se

verificou, pelas razões acima analisadas, qualquer incompatibilidade.

Aprovado em sessão plenária do Conselho Geral da Ordem dos Advogados de 28

de Setembro de 2018.