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Pró-Reitoria Acadêmica
Escola de Direito
Curso de Direito
Trabalho de Conclusão de Curso
A (IN)APLICABILIDADE DO ENUNCIADO DA SÚMULA 07 DO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO JUÍZO DE
ADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL
Autor: Thiago Rodrigo Pereira de Assis
Orientador: Prof. Ms. Manoel Águimon Pereira Rocha
Brasília - DF
2015
THIAGO RODRIGO PEREIRA DE ASSIS
A (IN)APLICABILIDADE DO ENUNCIADO DA SÚMULA 07 DO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
ESPECIAL CRIMINAL
Monografia apresentada ao curso de graduação
em Direito da Universidade Católica de
Brasília, como requisito parcial para a obtenção
do Título de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Ms. Manoel Águimon Pereira
Rocha
Brasília
2015
Monografia de autoria do aluno Thiago Rodrigo Pereira de Assis, intitulada “A
(IN)APLICABILIDADE DO ENUNCIADO DA SÚMULA 07 DO SUPEIOR TRIBUNAL
DE JUSTIÇA NO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL CRIMINAL”,
apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito da
Universidade Católica de Brasília, em de novembro de 2015, defendida e aprovada pela banca
examinadora abaixo assinada:
________________________________________________________
Prof. Ms. Manoel Águimon Pereira Rocha
Orientador
________________________________________________________
Prof. ________________________________________
Direito – UCB
________________________________________________________
Prof. ________________________________________
Direito – UCB
Brasília
2015
A Deus, pela força e saúde. Aos meus pais pelo
empenho e cautela. À minha irmã por todo o
apoio. À Suellen Gomes de Araújo pelo carinho
e afeto.
RESUMO
Referência: ASSIS, Thiago Rodrigo Pereira de A (in)aplicabilidade do Enunciado Da
Súmula 07 Do Superior Tribunal de Justiça no juízo de admissibilidade do recurso
especial criminal. 2015. 43 f. Monografia (Curso de Direito) – Universidade Católica de
Brasília, Brasília, 2015.
O tema, a (In)aplicabilidade do Enunciado da Súmula 07 do Superior Tribunal de Justiça no
juízo de admissibilidade do recurso especial criminal, surgiu diante das inúmeras controvérsias
acerca da aplicabilidade da Súmula em questão na seara criminal dos Tribunais locais e na Corte
Superior. Analisando principalmente sobre o aspecto do recorrente, busca-se uma decisão
judicial, a qual avaliará sobre as questões de direito, tendo em vista a possibilidade de haver
valorações sobre questões de fato de maneira equivocada e, assim, podendo, eventualmente,
aproximar-se do eixo da injustiça. Assim, a possibilidade de recorrer via recurso especial surge
no momento processual de exaurimento das instâncias ordinárias.
Ademais, faz-se, aqui, um apanhado específico acerca do Enunciado 7 do STJ no juízo de
admissibilidade do recurso especial, por intermédio da realização analítica de jurisprudências,
precedido de um breve histórico e objetivas conceituações, destacando-se, ainda, os princípios
basilares do recurso aplicável ao estudo, bem como o sistema de valoração da prova, de modo
a possibilitar o entendimento das discussões decorrentes dessa temática nos Tribunais locais e
no Superior Tribunal de Justiça.
Palavras-chave: Direito Processual Penal. Recurso Especial. Superior Tribunal de Justiça.
Reexame e Revaloração de Provas. Enunciado 7 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.
ABSTRACT
The topic, the (in)applicability of Utterance of Precedent 07 of the Superior Court of Justice in
the judgment of admissibility of criminal special feature, came before the numerous
controversies about the applicability of Precedent in question in the criminal in local Courts and
criminal field in Superior Court. Analyzing especially on the aspect of the appellant seeks to a
court decision, which will assess on the issues of law, in view of the possibility of valuations
on matters of fact wrongly and thus may possibly approach the injustice axis. Thus, the
possibility of using via special feature arises from the procedural point of exhaustion of the
ordinary instances. Thus, it is, here, a specific overview on the Statement 7 from the Supreme
Court on the special appeal admissibility of judgment, through the analytical performance of
jurisprudence, preceded by a brief history and objective concepts, emphasizing also the
principles applicable to the study of the basic appeal as well as the valuation system of evidence
in order to facilitate the understanding of the discussions arising from this theme in local courts
and the Supreme Court.
Keywords: Criminal Procedural Law. Special feature. Superior Justice Tribunal. Review and
reevaluation of evidence. 7 Statement of Precedent of the High Court of Justice
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 8
2 PRINCÍPIOS NORTEADORES DOS RECURSOS PENAIS .......................................... 9 2.1 FUNGIBILIDADE ............................................................................................................. 11 2.2 VOLUNTARIEDADE ....................................................................................................... 12 2.3 DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO .................................................................................... 13 2.4 DIALETICIDADE ............................................................................................................. 13 2.5 TAXATIVIDADE .............................................................................................................. 15
2.6 UNIRRECORRIBILIDADE .............................................................................................. 15 2.7 NON REFORMATIO IN PEJUS ........................................................................................ 17
2.8 PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA ............................................................ 18
3 SURGIMENTO HISTÓRICO DO RECURSO ESPECIAL ........................................... 19
3.1 PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL ............... 21
3.1.1 Pressupostos Constitucionais ........................................................................................ 21 3.1.2 Pressupostos Específicos ............................................................................................... 24
4 SISTEMA DE APRECIAÇÃO DA PROVA NO PROCESSO PENAL ...................... 26 4.1 LIVRE CONVICÇÃO OU ÍNTIMA CONVICÇÃO ......................................................... 27 4.2 PROVA LEGAL OU PROVA TARIFADA ...................................................................... 28
5 REEXAME E REVALORAÇÃO DE PROVAS ............................................................. 31 5.1 JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE E JUÍZO DE MÉRITO DO RECURSO ESPECIAL .. 33
5.2 ANÁLISE DOS PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ACERCA
DAS DIVERGÊNCIAS JURISPRUDENCIAIS NA (IN)APLICABILIDADE DO
ENUNCIADO DA SÚMULA 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ....................... 34
6 CONCLUSÃO ..................................................................................................................... 39
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 41
8
1 INTRODUÇÃO
Trata o presente trabalho do instituto jurídico-processual do juízo de admissibilidade do
Recurso Especial em face do conjunto probatório disposto nos autos da ação penal acerca da
possibilidade de revaloração de fatos e provas, desprovido de qualquer substrato de reexame
destes, em razão do enunciado da Súmula n. 07, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Assim, teremos como foco de análise os institutos jurídicos denominados revaloração
de provas e reexame de provas, onde naquele é possível se discutir a possibilidade de nova
interpretação dos elementos probatórios com a correta aplicação do direito e, neste, a vedada
incursão no acervo fático-probatório com o fim de reexaminá-las, ambos a serem analisados
diante à admissibilidade Recurso Especial Criminal dirigido ao juízo a quo, bem como ao juízo
ad quem.
Do mesmo modo, em decorrência do trabalho realizado junto ao Ministério Público do
Distrito Federal e Territórios, especificamente na Assessoria de Recursos Constitucionais -
ARC, núcleo especializado predominantemente em matéria recursal de natureza extraordinária
criminal, fez-se necessário à abordagem de um tema tão pouco discutido na academia.
Nesse ínterim, foi constatado um número espantoso de recursos especiais criminais que,
diariamente, são destinados ao Superior Tribunal de Justiça cujo seguimento é negado, ainda
no Tribunal perante o qual são interpostos, inadmissão essa levada a efeito sob o argumento
que esbarram no óbice do Enunciado 7 do Superior Tribunal de Justiça.1
É cediço que a interposição de recursos para as Cortes Superiores é alarmante e por tal
razão seria necessário a implementação de mecanismos que obstasse a desenfreada
admissibilidade de tais irresignações, para não se desnaturar a essência desses Tribunais, motivo
por que de tantos verbetes e jurisprudências dificultando a admissibilidade dos Recursos
Especial e Extraordinário.
Imperioso ressaltar que o recurso especial foi instituído pela Constituição Federal de
1988 e, a partir de então se tornou um instrumento processual de extrema importância para se
alcançar a concretude dos princípios constitucionais, correlacionados com a possibilidade de
serem apreciados os atos dos Tribunais locais, seja quando a decisão recorrida contrarie tratado
ou lei federal, interpretar lei federal de forma divergente da que lhe haja atribuído outro Tribunal
ou, ainda, julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal, conforme
preconiza o art. 105, inciso III, alíneas “a”, “b” e “c” da Constituição Federal.
1 A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial.
9
Utilizando o método dedutivo de abordagem, o trabalho em comento se serve do estudo
da jurisprudência e das legislações pátrias para sua construção teórica, bem como de
conceituações da doutrina voltada ao tema de forma particular.
Dessa forma, o trabalho é dividido em quatro partes, em primeiro momento será tratado
sobre os princípios norteadores do recurso especial e modalidade de conceituação. Já na
segunda parte, o estudo se direciona sobre a evolução histórica do Recurso Especial, bem como
os pressupostos de admissibilidade constitucionais e específicos. No terceiro capítulo será
abordado o fator prova, com as duas devidas considerações acerca do sistema de valoração de
provas. Por fim, no quarto capítulo, será debatido sobre as duas matérias mais divergentes
dentre os julgamentos no tocante à (in) aplicabilidade do Enunciado da Súmula 07 do Superior
Tribunal de Justiça, a dosimetria da pena e a avaliação de laudo pericial, capítulo este que será
o cerne do presente estudo, buscando demonstrar as principais divergências jurisprudenciais.
Em suma, propende cauteloso estudo da forma como vem sendo aplicado o referido
verbete sumular no momento processual de admissibilidade do recurso especial criminal,
realizado pelos Tribunais Locais e o Superior Tribunal de Justiça, busca-se, também,
demonstrar a dicotomia entre reexame e a revaloração de provas, decorrente da qualificação
jurídica dos fatos, utilizando-se de mandamentos doutrinários, dispositivos normativos e, ainda,
análise de interpretações jurisprudenciais.
Conforme exposto, a temática demonstra-se muito rico, motivo pelo qual não há que se
falar em esgotamento sobre os institutos do reexame e revaloração, na qual se optou pelo
enfoque às controvérsias instituídas pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
10
2 PRINCÍPIOS NORTEADORES DOS RECURSOS PENAIS
Os princípios que norteiam os recursais penais são mandamentos nucleares que
alicerçam toda a estrutura da legislação penal recursal, podendo estar explícitos no ordenamento
jurídico ou implícitos conforme dedução lógica.
Assim, destaca-se o entendimento Pacelli2 sobre os princípios recursais do Estado
Democrático de Direito, verbis:
Em relação ao processo penal enquanto sistema jurídico de aplicação do Direito Penal,
estruturado em sólidas bases constitucionais, pode-se adiantar a existência de alguns
princípios absolutamente inafastáveis, e, por isso, fundamentais, destinados a cumprir
a árdua missão de proteção e tutela dos direitos individuais.
Por outro lado, cumpre ressaltar que recursos penais são meios voluntários que possuem
o objetivo de impugnar decisões judiciais, sejam decisões interlocutórias, sentenças ou
acórdãos, os quais buscam obter uma nova análise da matéria posta ao fundo, podendo, assim,
reformar, invalidar, esclarecer ou integrar uma decisão3.
Ademais, observamos que a natureza jurídica dos recursos não pode ser confundida com
a natureza jurídica das ações de impugnação, a ponto que, na primeira não se instaura uma nova
relação processual, ao contrário dos meios autônomos de impugnação. Apesar disso, cumpre
ressalta-se que ainda há divergência doutrinária a respeito de ser estabelecido nova relação
jurídica ou não. Portanto, a corrente que ascende no direito positivo pátrio é a que o recurso não
conduz à instauração de um novo processo, acarreta, apenas, o prosseguimento processual4.
Ademais, o entendimento de Fredie Didier, in verbis:
O recurso prolonga o estado de litispendência, não instaura as ações autônomas de
impugnação, que dão origem a processo novo para impugnar uma decisão judicial
(ação rescisória, mandado de segurança contra ato judicial, reclamação constitucional,
embargos de terceiro etc.) 5
Em face de tais apontamentos, para o exercício recursal no processo penal devemos
observar os princípios basilares penais apresentados seguir.
2 PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 17ª edição. São Paulo-SP. Editora Atlas, 2013, p. 37 3 TÁVORA, Nestor; ALENCAR; Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 9ª edição. Salvador-
Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1057-1058. 4SOUZA,Bernardo Pimentel. Introdução aos Recursos Cíveis e à Ação Rescisória. Revista e Atualizada à
luz da lei 12.322/10. 8ª edição, 2010, p.15. 5 DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Meios de Impugnação às Decisões Judiciais e
Processo nos Tribunais. 10ª edição. Salvador- Bahia: Editora Juspodivm, 2012, p. 19-20.
11
2.1 FUNGIBILIDADE
A fungibilidade é a qualidade de ser algo substituível por outra coisa da mesmo espécie
quando se busca o mesmo fim único.
No âmbito dos recursos penais temos o princípio da fungibilidade recursal aplicável
quando exista a possibilidade de substituição de um recurso por outro, desde que cumprido
alguns requisitos como a ausência de má-fé, ausência de erro grosseiro e a tempestividade do
recurso que deveria ser apresentado, bem como dúvida acerca de qual peça recursal interpor
frente ao ato judicial recorrível.
Sobre o assunto afirma Pacelli6 que “Trata-se da possibilidade do conhecimento dos
recursos pelo órgão de revisão, competente para o julgamento, independentemente do acerto
quanto à modalidade recursal prevista na lei”.
Assim, a análise realizada pelo julgador é preconizada conforme art. 579 do Código de
Processo Penal – CPP, onde estando diante da hipótese de fungibilidade recursal, pode o
magistrado determinar a fungibilidade recursal, porém para sua aplicação devem ser observados
alguns requisitos para a devida atribuição ao período processual. Conforme as lições de Távora7
na ocasião jurídica deve existir uma situação de dúvida objetiva e plausível em relação a qual
recurso interpor, não podendo, ainda, haver erro grosseiro ou má-fé acerca do recurso, bem
como atendido o prazo limite do recurso que seria cabível.
Em via contrária, podemos observar o entendimento lecionado por Denílson Feitoza8
“o recurso impróprio pode ser conhecido, mesmo sendo interposto fora do prazo do recurso
próprio, desde que haja dúvida objetiva quando ao recurso correto; o contrário significaria
negar a própria existência do princípio da fungibilidade”.
Por fim, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF-RTJ nº 92/123) estabeleceu
um critério objetivo para o acolhimento do princípio, a tempestividade recursal, ou seja, deve
ser observado o prazo o recurso legalmente cabível. Podendo, ainda, citar os seguintes julgados
do Supremo Tribunal Federal - STF, verbis:
É perfilhada pela doutrina, que, ao admitir o recurso indiferente, consagra a
fungibilidade recursal como uma das mais expressivas projeções do princípio da
instrumentalidade das formas no âmbito da teoria do processo, desde que não se
registre a hipótese de má-fé ou, como na espécie , de erro grosseiro.
(MS 28857 QO/GO, Tribunal Pleno, Relator Celso de Mello, julgado 14/09/2011)
O princípio da fungibilidade é aplicável nos casos em que a dúvida quanto a
6 PACELI, Eugênio. Curso de Processo Penal. São Paulo-SP. Editora Atlas, 2014, p. 941-942. 7 TÁVORA, Nestor; ALENCAR; Rosmar Rodrigues. Prova. In: TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar
Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 9ª edição. Salvador- Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1064. 8 FEITOZA, Denílson. Direito Processual Penal: teoria, crítica e práxis. Impetus: Niterói, 2009, p 1047-1048.
12
interposição do recurso cabível advém de erro escusável, ou seja, quando há uma
dúvida objetiva referente ao instrumento adequado para impugnar a decisão de que se
recorre, não sendo admissível sua aplicação em caso de erro grosseiro.
(AI 844682/BA, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Fux, julgado 09-08-2011)
2.2 VOLUNTARIEDADE
O princípio da voluntariedade constitui, no âmbito recursal, a demonstração de vontade
da parte, via ato processual, com intuito de ver uma reforma ou anulação de decisão judicial
rechaçada, ou seja, o recurso é interposto voluntariamente, dependendo da livre manifestação
de vontade.
Cumpre ressaltar que existem exceções estabelecidas acerca da voluntariedade dos
recursos que são aqueles interpostos de ofício pelo magistrado, conforme art. 574 do Código de
Processo Penal, nas seguintes situações: a) da sentença que conceder habeas corpus; b) de que
absolver desde logo o réu com fundamento na existência de circunstancia que exclua o crime
ou isente o réu de pena, nos termos do art. 411. Ainda, observa-se que caso não haja interposição
de recurso ex officio, conforme previsto em lei, não transita em julgado a sentença por haver
omitido o recurso, conforme preconiza o enunciado 423 do Supremo Tribunal Federal.
Ressalta-se nas lições de Paulo Rangel9 que o recurso possui duas partes distintas, a
primeira representa o elemento volitivo do recorrente (manifestação expressa), já a segunda
caracteriza-se pelos motivos da irresignação, em face de uma decisão proferida.
Assim, compreende-se que somente pode haver recurso quando há necessariamente
vontade da parte. Dessa forma, a doutrina majoritária compreende que não há o que se falar que
o recurso de ofício seria uma espécie de exceção a este princípio, pois tecnicamente não é um
recurso, em razão do juiz não possuir legitimidade para recorrer, bem como a lei não pode
obrigar alguém a litigar em juízo e, por fim, os motivos devem buscar alcançar a reforma na
decisão, sob pena de não ser conhecido (art. 577, p. único, do CPP).
Ademais, corrobora o entendimento a Ministra Laurita Vaz do Superior Tribunal de
Justiça no HC 168.038/RS, 5ª Turma, verbis:
A luz do princípio da voluntariedade, aplicável a todos os recursos, ressalvadas as
hipóteses legalmente previstas no recurso ex fficio – nas quais a decisão está sujeita
ao duplo grau de jurisdição – não há qualquer obrigação do defensor quanto à
interposição dos recursos extremos.10
9 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 20ª edição. São Paulo-SP. Editora Atlas, 2012, p. 929. 10 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (5ª Turma). HC 168.038/RS. Relator (a): Laurita Vaz. Rio Grande do
Sul, 19 de junho de 2012. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=168038&&
b=ACOR&p=false&l=10&i=8>. Acesso em 24/10/2015.
13
2.3 DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO
O princípio do duplo grau permite a revisão do julgado em instância hierarquicamente
superior, com a finalidade de a parte obter uma nova decisão em substituição a primeira. Sobre
a temática em análise, imperioso que se destaque Nelson Nery11, verbis:
O princípio do duplo grau de jurisdição tem íntima relação com a preocupação dos
ordenamentos jurídicos em evitar a possibilidade de haver abuso de poder por parte
do juiz, o que poderia em tese ocorrer se não estivesse a decisão sujeita à revisão por
outro órgão do Poder Judiciário.
Ademais, assevera Pacelli12 que a exigência do duplo grau não alcança a instância
extraordinária, tendo em vista que a provocação ocorre via recurso extraordinário/especial, pois
o Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça possuem a missão
constitucionalmente prevista de proteger a Carta Magna e a legislação infraconstitucional,
respectivamente.
Sobre a temática em análise, imperioso que se destaque o importante julgado do
Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal (RHC 79.785/RJ, Tribunal Pleno, Relator
Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 29/03/2000), verbis:
Para corresponder à eficácia instrumental que lhe costuma ser atribuída, o duplo grau
de jurisdição há de ser concebido, à moda clássica, com seus dois caracteres
específicos: a possibilidade de um reexame integral da sentença de primeiro grau e
que esse reexame seja confiado a órgão diverso do que a proferiu e de hierarquia
superior na ordem judiciária.13
2.4 DIALETICIDADE
O princípio da dialeticidade, em face da sua aplicação aos recursos, deve ser dialético, ou seja,
discursivo, onde a parte manifestará expondo seus motivos de fato e de direito pelos quais pugna
por novo julgamento, impugnando pontualmente os fundamentos da sentença recorrida, ou seja,
cumpre à parte recorrente o ônus de evidenciar nas razões do recurso o desacerto da decisão
recorrida.
Dessa forma, imperioso ressaltar o entendimento da Sexta Turma do STJ, verbis:
11 NERY JUNIOR, Nelson. Teoria geral dos Recursos. São Paulo-SP. 7ª edição. Editora Revista dos Tribunais,
2014, p.58-59. 12 PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 17ª edição. São Paulo-SP. Editora Atlas, 2013, p. 886-887. 13 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). RHC 79785/RJ. Relator: Sepúlveda Pertence. Rio de
Janeiro, 29 de março de 2000. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.as
p?s1=%2879785%2ENUME%2E+OU+79785%2EACMS%2E%29%28PLENO%2ESESS%2E%29&base=base
Acordaos&url=http://tinyurl.com/poomhst>. Acesso em 24/10/2015.
14
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO.
ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO. REDUÇÃO. RELAÇÃO DE TRATO
SUCESSIVO. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 6° DA LINDB. MATÉRIA
CONSTITUCIONAL. REITERAÇÃO DAS RAZÕES DO ESPECIAL. SÚMULA
182.
1. A redução do valor de vantagens, diferentemente da supressão destas, configura
relação de trato sucessivo, pois não eqüivale à negação do próprio fundo de direito
(AgRg no REsp 907.461/MS. Rei Ministro FÉLIX FISCHER, QUINTA TURMA, DJ
12/11/2007, p. 282) (RMS 26.394/MS. Rel. Ministra ALDERITA RAMOS DE
OLIVEIRA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/PE). SEXTA TURMA,
DJe 12/04/2013).
2. Em obediência ao princípio da dialeticidade, deve o agravante demonstrar o
desacerto da decisão agravada, não sendo suficiente a impugnação genérica ao
decisum combatido. Precedentes. (AgRg no AREsp 488.379/ES, Rel. Ministro
SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, DJe 06/03/2015).
3. Agravo regimental improvido.14
(AgRg no REsp 1155647/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA,
julgado em 17/09/2015, DJe 08/10/2015)
Conforme Nelson Nery 15 “O recorrente deve declinar o porquê do pedido de reexame
da decisão. Só assim a parte contrária poderá contra-arrazoá-lo, formando-se o imprescindível
contraditório em sede recursal”.
Ademais, é possível observar que o entendimento da dialeticidade dos recursos foi
adotado na edição Enunciado 523 do STF “No processo penal, a falta de defesa constitui
nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu.”
Por fim, ressalta-se que esse princípio é essencial para o conhecimento do recurso. Nesse
sentido, já se manifestou o e.TJDFT, verbis:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMD/AGR/AGI. INEXISTÊNCIA DE
IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. AUSÊNCIA DE DECISÃO SOBRE A MATÉRIA
VENTILADA NOS EMBARGOS. RAZÕES RECURSAIS DISSOCIADAS.
IRREGULARIDADE FORMAL. ACÓRDÃO MANTIDO. As razões do recurso
devem guardar sintonia com o que foi decidido pelos Julgadores. Revelando-se
desfocadas as razões recursais dos fundamentos adotados pela Turma, mormente
porque é impugnada matéria não decidida pelo órgão colegiado, incorre-se em
desrespeito ao princípio da dialeticidade, o que conduz ao não conhecimento dos
Embargos de Declaração por irregularidade formal. Embargos de Declaração não
conhecidos.
(Acórdão n.892518, 20150020144348AGI, Relator: ANGELO CANDUCCI
PASSARELI, 5ª Turma Cível, Data de Julgamento: 09/09/2015, Publicado no DJE:
23/09/2015. Pág.: 185)16
14BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (6ª Turma). AgRg no REsp. 1155647/SP. Relator
(a): Nefi Cordeiro. São Paulo, 17 de setembro de 2015. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurispruden
cia/doc.jsp?livre=%28%22principio+da+dialeticidade%22%29+E+%28%22Sexta+Turma%22%29.org.&&b=A
COR&p=false&t=JURIDICO&l=10&i=1>. Acesso em 02/11/2015. 15 NERY JUNIOR, Nelson. Teoria geral dos Recursos. São Paulo-SP 7ª edição. Editora Revista dos Tribunais,
2014, p. 179. 16 BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (5ª Turma Cível). EMD no AgReg no AGI
20150020144348. Relator: Angelo Canducci Passareli., 09 de setembro de 2015. Disponível em :<http://pesquisa
juris.tjdft.jus.br/IndexadorAcordaos-web/sistj> Acesso em 20 de outubro de 2015.
15
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO.
CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. PRETENSÃO. IMPUGNAÇÃO.
FUNDAMENTO DE FATO E DE DIREITO. RAZÕES DISSOCIADAS.
NEGATIVA DE SEGUIMENTO. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE. RECURSO NÃO CONHECIDO.
1. A Lei Processual Civil exige que o recurso contenha os fundamentos de fato e de
direito com os quais a parte recorrente impugna a decisão proferida. Fundamentar
significa expor as razões do inconformismo, que, por questão de ordem lógica, só
podem referir-se ao contido no acórdão atacado.
2. Quando as razões ofertadas são inteiramente divorciadas do que foi decidido pelo
órgão colegiado, contra o qual a parte se insurge, não se conhece do recurso, por
ofensa ao princípio da dialeticidade.
3. Embargos de declaração não conhecidos.
(Acórdão n.892997, 20140910190284APC, Relator: CARLOS RODRIGUES,
Revisor: HECTOR VALVERDE SANTANNA, 6ª Turma Cível, Data de Julgamento:
26/08/2015, Publicado no DJE: 15/09/2015. Pág.: 268) 17
2.5 TAXATIVIDADE
O princípio da taxatividade é intimamente ligado ao princípio da segurança jurídica,
razão pela qual os recursos a serem interpostos devem observar a taxatividade da lei, ou seja,
só é possível interpor recurso devidamente previsto no ordenamento jurídico, a fim de não se
criar recursos novos, sendo considerados apenas aqueles designados, em numerus clausus, pela
lei federal. No mesmo sentido, afirma Edílson Mougenot 18 que “Os recursos devem estar
expressamente previstos em lei, não se admitindo que a parte requeira a reforma de uma decisão
sem que haja previsão legal do meio impugnatórios”
2.6 UNIRRECORRIBILIDADE
De acordo com o princípio da unirrecorribilidade, para cada natureza de decisão judicial
há um recurso específico adequado para se impugnar. Assim, não fala que o ordenamento
jurídico não admite a interposição de dois ou mais recursos, mas, pelo contrário, é vedada
somente a pluralidade de recursos que visa rediscutir o mesmo tema.19
Observa-se que o princípio em questão é tratado no art. 593, § 4°, do CPP, onde o
legislador afastou a probabilidade de interposição de recurso em sentido estrito quando cabível
apelação.
17 BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (6ª Turma Cível). EMD na APC
20140910190284. Relator: Hector Valverde Santanna. 26 de agosto de 2015. Disponível em : <http://pesquisajur
is.tjdft.jus.br/IndexadorAcordaos-web/sistj> Acesso em 20 de outubro de 2015. 18 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de Processo Penal. 9ª edição. São Paulo-SP. Editora Saraiva, 2014, p.
761. 19 MARCÃO, Renato. Curso de Processo Penal. São Paulo-SP. Editora Saraiva, 2014, p. 1006
16
Nas lições de Paulo Rangel 20 “O princípio da unirrecorribilidade, também chamado de
singularidade ou, ainda, de unicidade, significa dizer que de cada decisão judicial caberá apenas
um único recurso, não sendo admissível a interposição de dois recursos da mesma parte de uma
decisão.”
Noutro giro, imperioso ressaltar o teor do Enunciado 418 do Superior Tribunal de Justiça
“É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de
declaração, sem a posterior ratificação.” Observa-se que a inadmissão do recurso especial é
pelo fato de ainda não estar esgotada a jurisdição do tribunal de origem, assim, para que o
recurso não seja considerado extemporâneo, necessário se faz a devida ratificação após a
publicação do julgamento dos embargos. Imperioso destacar o entendimento do Superior
Tribunal de Justiça, verbis:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE
INSTRUMENTO.
RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO ANTERIOR AO JULGAMENTO DOS
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RATIFICAÇÃO. AUSÊNCIA.
INTEMPESTIVIDADE. SÚMULA 418 DO STJ.
1. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça assentou, no julgamento do REsp
776.265/SC, em 18/4/2007, que não se conhece do recurso especial apresentado antes
do julgamento de embargos declaratórios da decisão recorrida, sem posterior
ratificação, porquanto ainda não exaurida a instância ordinária (art. 105, III, CF).
Aplicação da Súmula 418/STJ.
2. Tal entendimento comporta, tão-somente, a exegese de normas vigentes, razão pela
qual não há falar em aplicação retroativa.
Assim: "A circunstância de a interposição do recurso especial haver ocorrido em
momento anterior à publicação do julgamento acima citado [o do REsp 776.265/SC]
não dá ensejo a qualquer alteração, porquanto é inerente o conteúdo declaratório do
julgado já que o posicionamento ali apresentado apenas explicita a interpretação de
uma norma há muito vigente, não o estabelecimento de uma nova regra, fenômeno
que apenas advém da edição de uma lei." (EREsp nº 963.374/SC, Rel. Min. MAURO
CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJ 1º/9/2008).
3. Agravo regimental a que se nega provimento.21
(AgRg no Ag 956.792/RO, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA,
julgado em 14/02/2012, DJe 05/03/2012)
Portanto, a interposição de recursos sobre o prisma do mesmo tema não seria possível
devido à orientação do princípio em questão, porém há exceção sobre a possibilidade de se
recorrer quanto a uma decisão judicial que houver pontos diferentes impugnáveis, como por
exemplo, nos acórdãos que cabem a interposição de recurso especial e extraordinário, ou seja,
quando houver fundamentos legais e constitucionais que autorizem as duas impugnações.
20 Ibid., 2015, p.958 21 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (6ª Turma). AgRg no Ag 956.792/RO. Relator (a): Og Fernandes.Rond
ônia, 14 de fevereiro de 2012. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=%28%
22sumula+418%22%29+E+%28%22Sexta+Turma%22%29.org.&&b=ACOR&p=false&t=JURIDICO&l=10&i
=6>. Acesso em 02/11/2015.
17
Em suma, conforme a Lei 8.038/90, que instituiu normas procedimentais perante o STJ
e STF, os recursos especiais e extraordinários podem ser interpostos ao mesmo tempo sobre
uma mesma decisão que viole, contrarie ou negue vigência à lei federal, sendo combatida via
recurso especial e que trate exclusivamente de violação a matéria constitucional. Assim,
admitidos ambos os recursos, primeiramente será julgado o recurso especial e em seguida será
remetidos ao Supremo Tribunal Federal, para apreciação do recurso extraordinário, caso este
não restar prejudicado. Todavia, caso o ministro relator do recurso especial observar que o
recurso extraordinário é prejudicial daquele em decisão irrecorrível, sobrestará o seu
julgamento remetendo os autos ao STF para julgar o extraordinário. Não acatando a decisão de
envio dos autos, por entender não ser prejudicial, o relator do extraordinário, em despacho
irrecorrível devolverá os autos ao STJ para julgar o especial, verifica-se, portanto, uma exceção
do princípio.
Ademais, podemos citar o exemplo da doutrina de Grinover 22 “[...] ou, ainda, os de
embargos infringentes e mais os de recurso especial e/ou extraordinário, se houver uma parte
unânime que possibilite o recurso aos tribunais superiores e uma não unânime, embargável.”
2.7 NON REFORMATIO IN PEJUS
O princípio da non reformatio in pejus consiste na garantia aos acusados de não lhe
sobrevier uma decisão desfavorável quando somente ele manejar o recurso, máxime por que o
Órgão Julgador não pode substituir a Acusação, sob pena de violação ao sistema acusatório.
Assim, nota-se que este princípio tem por objetivo impedir que o tribunal revisor piore a
situação atual do recorrente.
Todavia, caso haja recurso de ambas as partes, não há o que se falar em observância a
proibição da non reformatio in pejus. Ademais, ressalta-se que o legislador no art. 617 do
Código de Processo Penal, relativamente ao recurso de apelação, expressamente determinou
proibição da reforma em prejuízo, em razão de não poder agravar a pena quando somente o réu
houver apelado da sentença, sendo aplicável, portanto, a todos os recursos.
Conforme as lições de Pacelli23, ipsis litteris:
Com efeito, a garantia do duplo grau, como conteúdo da ampla defesa, deve abranger
também a garantia da vedação da reformatio in pejus. O risco inerente a todas as
22 GRINOVER, Ada Pellegrini; FILHO, Antonio Magalhães Gomes; FERNANDES, Antonio Scarance. Recurso
no Processo Penal. 7ª edição. São Paulo-SP. Editora Revista dos Tribunais Ltda, 2011, p. 35. 23 PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 17ª edição. São Paulo-SP. Editora Atlas, 2013, p. 893.
18
decisões judiciais poderia ter efeitos extremamente graves em relação ao acusado, no
ponto em que atuaria como fator de inibição do exercício do direito ao questionamento
dos julgados.
Para Grinover24, ipsis litteris:
[...] pelo recurso do réu e sem que haja recurso do Ministério Público, não pode ser
agravada a situação do recorrente. Não se admite a reformatio in pejus, entendida
como diferença para pior, entre a decisão recorrida e a decisão no recurso, não
podendo a piora ocorrer nem do ponto de vista quantitativo, nem sob o ângulo
qualitativo. [...] Não há dúvida que no processo penal, quanto à proibição da
reformatio in pejus para agravar a situação do réu, no seu próprio e único recurso.
Imperioso ressaltar que conforme Enunciado 160 do Supremo Tribunal Federal é
definitivamente nula a decisão do Tribunal que acolhe nulidade não trazia aos autos via recurso
da Acusação, razão pela qual não poderia piorar a situação do acusado em face de nulidade não
suscitada, porém com exceção aos casos de recurso de ofício.
Em suma, conforme todos os apontamentos citados eventual agravação da situação do
réu em seu prejuízo só poderá ocorrer caso seja dado provimento ao recurso de acusação.
Por fim, temos o entendimento da Suprema Corte em diversos precedentes, verbis:
“Em recurso exclusivo da defesa, não pode o Tribunal complementar a sentença para
acrescentar fatos que possam repercutir negativamente no âmbito da dosimetria da
pena.” (HC 108.562/MG, 1ª T- HC/MG 105.768, 1°T- HC/RR 99.925)
2.8 PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
O status presunção de inocência da pessoa, conforme a composição plenária do Supremo
Tribunal Federal, prevalecerá até trânsito em julgado da decisão final.25 A situação jurídica de
inocência do ser humano no Estado Democrático de Direito é considerada até que se prove o
contrário e que demonstre elementos fáticos-probatórios sobre a sua culpabilidade com o devido
trânsito em julgado.
O princípio da presunção de inocência ou da não-culpabilidade, no processo penal, exige
que toda condenação seja calcada em elementos probatórios incriminadores legítimos e, caso
haja dúvidas acerca do contexto, deve ser observado o in dubio pro reo.
24 GRINOVER, Ada Pellegrini; FILHO, Antonio Magalhães Gomes; FERNANDES, Antonio Scarance. Recurso
no Processo Penal. 7ª edição. São Paulo-SP. Editora Revista dos Tribunais Ltda, 2011, p.41. 25 TÁVORA, Nestor; ALENCAR; Rosmar Rodrigues. Prova. In: TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar
Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 9ª edição. Salvador- BA: Editora Juspodivm, 2014, p. 61.
19
Outrossim, a presunção de inocência é uma garantia concebida a partir do princípio da
dignidade da pessoa humana, bem como desenvolvida a partir do devido processo legal, sendo
positivada no art. 5°, LVII, da Constituição Federal,
Ademais, afirma Alexandre de Moraes26 que, como princípio basilar do Estado
Democrático de Direito, a presunção de inocência visa à tutela da liberdade pessoal. Assim, há
necessidade do Estado comprovar a devida culpabilidade do indivíduo, sob pena de
retroagirmos ao total arbítrio estatal.
A partir desses apontamentos, pode-se concluir que a presunção de inocência é
condicionada ao exercício probatório lícito produzido pela acusação, com o fim de determinar
mediante sentença transitada em julgado a condição de culpado. Dessarte, conforme todo
Estado Democrático de Direito deve ser observado o devido processo legal (art. 5º, LIV, CF),
a garantia da ampla defesa e do contraditório (art. 5º, LV, CF), bem como a causa deve ser
decidida por autoridade competente (art. 5º, LIII, CF), princípios estes instituídos na Carta
Maior que visam garantir julgamentos justos, adequados e proporcionais.
26 MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. 6ª Edição. São Paulo-SP. Editora Atlas, 2005,
p. 264-265.
20
3 SURGIMENTO HISTÓRICO DO RECURSO ESPECIAL
A promulgação da Constituição Federal em 5 de outubro de 1988 foi fato determinante
para a confirmação do processo de redemocratização da República Federativa do Brasil. Assim,
com um Texto Constitucional rígido e abrangente, destaca-se a separação dos poderes,
Executivo, Legislativo e Judiciário. No particular do Título IV, Capítulo III, evidencia-se os
artigos 92 aos 126, os quais compreendem todo o Poder Judiciário, o qual foi instituído para
regular a sociedade nos conflitos de seus interesses 27.
Salienta-se, portanto, que antes da promulgação do Diploma Federal de 1988 o Supremo
Tribunal Federal concentrava as funções de guardião da Constituição, bem como o responsável
pela interpretação da aplicação da legislação federal. No entanto, havia duas propostas aos
constituintes, a primeira seria de aumentar o número de ministros do Pretório Excelso e, a
segunda, seria a criação de um novo órgão julgador para as causas que envolvessem a legislação
federal, para onde seriam destinados os recursos especiais, sendo então aprovada a segunda
proposta. Isso somente ocorreu diante do aumento vertiginoso dos recursos que eram dirigidos
ao STF. Assim, necessário se fez, com a Carta de 1988, a divisão de competências, cabendo ao
Superior Tribunal de Justiça a jurisdição para julgar os novos recursos especiais que hoje são
responsáveis por movimentar inúmeras análises diárias de violações diretas ou indiretas às
normas infraconstitucionais devidamente estabelecidas no artigo 105, inciso I, II, III, da Carta
Magna.
Com a composição do Poder Judiciário, observa-se o Superior Tribunal de Justiça, órgão
compreendido inicialmente pelos ministros do Tribunal Federal dos Recursos, obedecendo ao
disposto no art. 27, § 2°, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias. Após, com a
Emenda Constitucional n.º 45, de 2004, conhecida como “reforma do judiciário brasileiro”, o
Tribunal da Cidadania passou a ter sua composição de um terço dentre juízes dos Tribunais
Regionais Federais, um terço dentre desembargadores dos Tribunais de Justiça e um terço, em
partes iguais, dentre advogados e membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito
Federal e Territórios, fator determinante para democratizar sua bancada. 28
27 SERAU JÚNIOR, Marco Aurélio; REIS, Silas Mendes dos. Manual dos Recursos Extraordinário e
Especial. São Paulo-SP. Editora Método, 2012, p. 28-29. 28 SERAU JÚNIOR, Marco Aurélio; REIS, Silas Mendes dos. Manual dos Recursos Extraordinário e
Especial. São Paulo-SP. Editora Método, 2012., p.94 28 ROCHA JUNIOR, Francisco de Assis do Rêgo Monteiro. Recurso Especial e Recurso Extraordinário
Criminais. Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris. 2010, p.23.
21
3.1 PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL
O recurso especial é instrumento processual hábil para se contestar perante o Superior
Tribunal de Justiça decisões judiciais de outros tribunais em única ou última instância quando
ocorrer violação à lei federal.
Ademais, o recurso especial é um mecanismo capaz de pacificar a jurisprudência de
diferentes tribunais sobre a mesma matéria. Sabe-se, ainda, que uma decisão judicial pode ser
passível de recurso especial quando: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;
b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; c) der a lei federal
interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal, conforme preconiza o artigo
105, inciso III, alíneas “a”, “b”, “c”, da Constituição Federal.
Por fim, temos ainda a observância sobre os pressupostos de admissibilidade do recurso
especial: as súmulas, a jurisprudência e, ainda, deve ser observado sua forma de interposição
que é disciplinada na Lei 8.038/90.
3.1.1 Pressupostos Constitucionais
Os requisitos de admissibilidade constitucional são aqueles que não deduzem da Teoria
Geral do Processo, ou seja, não são aplicáveis a todo e qualquer recurso, mas somente no
recurso extraordinário e no recurso especial, possuindo, assim, ambas as natureza
constitucional.29
Deste modo, em análise aos pressupostos da matéria do particular, preconiza o art. 105,
inciso III, alíneas “a” “b” e “c”, ambas da Constituição Federal, a respeito das hipóteses de
cabimento do recurso especial:
Art. 105- Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
[...]
III- julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância,
pelos Tribunais Regionais Federais ou tribunais dos Estados, do Distrito Federal e
Territórios, quando a decisão recorrida:
a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;
b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal;
c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal;
Inicialmente imperioso destacar o estabelecido no inciso III do art. 105 da CF que
compete ao Superior Tribunal de Justiça julgar, em recurso especial, as causas decididas em
29 SERAU JÚNIOR, Marco Aurélio; REIS, Silas Mendes dos. Manual dos Recursos Extraordinário e
Especial. São Paulo-SP. Editora Método, 2012, p. 54.
22
única ou última instância. Com efeito, o termo “causa” exclui qualquer outra decisão sem
caráter jurisdicional30. Já em relação ás decisões em única ou última instância, a discussão da
matéria na qual se pretende reformar deve ser obrigatoriamente esgotada na instância ordinária
para, assim, haver viabilidade recursal, ou seja, o acórdão no qual se deseja recorrer, com a
interposição do recurso especial, necessariamente, a matéria deve estar prequestionada para,
assim, interpor via extraordinária o recurso especial, devendo, portanto, ser esgotado todo e
qualquer recurso ordinário na 1ª e 2ª instância do Tribunal, inclusive com o manejo dos
embargos infringentes, caso um acórdão não seja decidido de forma unânime, sob pena de
supressão de instância. 31 Nas lições de Vicente Greco Filho32, verbis:
Só cabe recurso especial se foram esgotados os recursos ordinários, inclusive os
embargos infringentes perante os tribunais, se cabíveis, de modo que a parte não pode
abandonar ou deixar de utilizar os recursos ordinários para querer, desde logo, interpor
o especial.
Outrossim, temos também o entendimento da 5ª e 6ª Turma do Superior Tribunal de
Justiça, respectivamente, verbis:
PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL.NEGATIVA DE SEGUIMENTO DO APELO NOBRE. EMBARGOS
INFRINGENTES CABÍVEIS. SÚMULA 207 DO STJ.
1. A teor da dicção da Súmula 207 do STJ, é "inadmissível recurso especial quando
cabíveis embargos infringentes contra o acórdão proferido no tribunal de origem".
2. Havendo a possibilidade de manejar embargos infringentes, afigura-se descabido o
argumento trazido pela defesa de que o voto divergente restringiu-se à parte do
acórdão recorrido, mormente quando a divergência concluiu pela absolvição do réu.
3. Agravo regimental desprovido. 33
(AgRg no AREsp 699.154/RJ, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA
TURMA, julgado em 04/08/2015, DJe 18/08/2015)
PENAL. PROCESSUAL PENAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO
REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SONEGAÇÃO
FISCAL EM CONTINUIDADE DELITIVA. APELAÇÃO. ACÓRDÃO NÃO
UNÂNIME. EMBARGOS INFRINGENTES. AUSÊNCIA. NÃO EXAURIMENTO
DE INSTÂNCIA. SÚMULA 207 DO STJ.
1. Nas hipóteses de acórdão não unânime na origem e que cause prejuízo à defesa, é
necessário a oposição de embargos infringentes para o exaurimento da instância.
Incidência da Súmula 207 do STJ.
30 Ibid., 2012, p. 54. 31 ROCHA JUNIOR, Francisco de Assis do Rêgo Monteiro. Recurso Especial e Recurso Extraordinário
Criminais. Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris, 2010, p. 38. 32 GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 11ª Edição. São Paulo-SP. Editora Saraiva, 2015, p. 416. 33 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (5ª Turma). AgRg no AREsp 699.154/ RJ. Relator: Gurgel de Faria.
Rio de Janeiro, 04 de agosto de 2015. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=
%22penal%22+%22sumula+207%22&&b=ACOR&p=false&t=JURIDICO&l=10&i=1 Acesso em 24/10/2015.
23
Precedentes.
2. Agravo regimental não provido.34
(AgRg no AREsp 279.480/PE, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA
TURMA, julgado em 08/05/2014, DJe 02/06/2014)
No que diz respeito à alínea “a” do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal,
devemos distinguir os termos “contrariar” e “negar vigência”. Contrariar significa dar sentido
diverso à Lei Federal ou tratado e negar vigência significa o não reconhecimento da existência
da Lei ou Federal ou tratado ou considerá-los como revogados. Assim, o termo contrariar possui
a incidência mais abrangente do que o termo negar vigência, ou seja, compreende toda e
qualquer maneira de ofensa ao texto legal.35
Em relação à alínea “b” do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal, trata-se do
momento processual em que o acórdão recorrido “julgar válido ato de governo local contestado
em face de lei federal”. Dessa forma, ocorre que havendo duas normas, uma federal e outra
estadual/municipal, ambas vigentes e aplicáveis ao caso, em face de uma decisão de última
instância ordinária, o órgão julgador aplica a norma estadual/municipal em detrimento de uma
norma federal. Assim, haverá possibilidade de interposição de recurso especial. Sobre o tema
já se manifestou Vicente Greco Filho, verbis:
Se a decisão recorrida afirmou a validade de lei ou ato local (entenda-se estadual ou
municipal) que está confrontando com norma federal é porque deixou de aplicá-la.
Prevalecendo o ato ou a lei local é porque foi afastada a federal, daí o cabimento do
recurso.
Temos, ainda, a alínea “c” do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal como a
última hipótese de cabimento constitucional do recurso especial, quando o a decisão recorrida
der a lei federal interpretação divergente da que foi dada em outro tribunal. Nesse ínterim,
ressalta-se a importância do Superior Tribunal de Justiça na função uniformizadora da
jurisprudência nacional, proferindo decisões paradigmáticas. Dessarte, adverte-se que é
inaceitável a interposição do recurso especial, com fundamento na divergência entre órgãos do
mesmo tribunal, conforme Enunciado 13 do STJ “A divergência entre julgados do mesmo
Tribunal não enseja recurso especial”, ou seja, trazer ao recurso especial julgados divergentes
34 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (6ª Turma). AgRg no AREsp 279.480/PE. Relator: Rogerio Schietti
Cruz. Pernambuco, 08 de maio de 2014. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?liv
re=%22penal%22+%22sumula+207%22&&b=ACOR&p=false&t=JURIDICO&l=10&i=2>. Acesso em 24/10/
2015. 35 SERAU JÚNIOR, Marco Aurélio; REIS, Silas Mendes dos. Manual dos Recursos Extraordinário e Especial.
São Paulo-SP. Editora Método, 2012, p. 95-96.
24
dentro de um mesmo tribunal não ensejaria a interposição do recurso especial. Em suma,
somente é cabível o recurso se a divergência for entre órgãos de tribunais diferentes. 36
3.1.2 Pressupostos Específicos
Os pressupostos específicos do recurso especial compreendem a última análise de
admissibilidade sobre a matéria posta ao fundo da irresignação. Com efeito, o objeto de recurso
deve ser devidamente prequestionado na decisão recorrida.
Segundo José Miguel Garcia Medina apud Didier e Cunha37 é possível vislumbrar três
entendimentos distintos acerca do prequestionamento, doravante do exame da jurisprudência e
doutrina. Inicialmente temos o prequestionamento como forma de manifestação do tribunal
recorrido sobre uma questão jurídica federal. Ademais, o prequestionamento debatido
anteriormente à decisão a qual se recorre, ônus esse que é cominado a parte. E, por fim, a
posição eclética, soma dos dois entendimentos citados, o qual o prequestionamento deve ser
debatido previamente acerca de questão federal, seguindo a manifestação expressa do Tribunal.
Dessa forma, diante do assunto tão debatido perante a Corte Cidadã foi sumulado a
matéria nos moldes do Enunciado 211 do STJ, “É inadmissível recurso especial quando à
questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal
a quo.” Nestes termos, inviabilizaria a admissibilidade de eventual recurso especial interposto
sobre a matéria não apreciada pelo Tribunal.
Noutro giro, temos o vedado reexame da matéria de provas (Enunciado 7 do STJ) em
sede de recurso especial. Ressalta-se que o Enunciado em questão será o tema foco do presente
estudo. Adiantando tais premissas, pois será tratada em capítulo próprio, temos a orientação do
Superior Tribunal de Justiça no sentido que a pretensão do simples reexame de provas não
enseja a interposição de recurso especial, tendo em vista o caráter de higidez do direito
objetivo.38 Conceitua Luís Guilherme Marinoni39 sobre o reexame de provas, verbis:
O conceito de reexame de prova deve ser atrelado ao de convicção, pois o que não se
deseja permitir, quando se fala em impossibilidade de reexame de prova, é a formação
de nova convicção sobre os fatos. Não se quer, em outras palavras, que os recursos
extraordinário e especial viabilizem um juízo que resulte da análise dos fatos a partir
das provas.
Sobre as lições de Grinover, verbis:
A conseqüência mais elementar dessas observações está no impedimento da utilização
36 JÚNIOR DIDIER, Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Processo Civil 3. Meios de
Impugnação às Decisões Judiciais e Processos nos Tribunais. Salvador-BA. Editoria Juspodivm, 2014, p.296. 37 MEDINA. 1998, p. 159-166. Ibid., p. 245. 38 JÚNIOR DIDIER, Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da, op. cit., p. 242. 39 Luiz Guilherme Marinoni. Reexame da prova diante dos recursos especiais e extraordinário. Recuperado em
03 de outubro de 2015. http://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1242740737174218181901.pdf
25
dessas impugnações para reexame de questões de fato, cujo deslinde esteja limitado à
avaliação de provas. Se isso fosse possível, os recursos em análise se transformariam
em uma segunda apelação, o que evidentemente contraria sua natureza e destinação.
Assim, o que não se admite em sede de recurso especial é o reexame de provas, porém
será demonstrada no capítulo 4 deste estudo a possibilidade de revaloração das provas.
Ademais, temos inadmissibilidade do recurso quando houver ausência de
fundamentação, conforme preconiza o Enunciado 284 do Supremo Tribunal Federal 40 – STF
que, por analogia, também é aplicável nos recursos especiais. Segundo Rego e Rocha Junior 41,
ipsis litteris:
A maioria absoluta dos casos verificados no seio do Superior Tribunal de Justiça em
que a referida Súmula é aplicada tem como objeto recursos especiais interpostos sem
sequer a menção de qual foi o artigo de lei ofendido pela decisão local. Ou seja, trata-
se, em verdade de um recurso dirigido à Corte Superior, no qual não se discute os
elementos fáticos, mas tão somente os jurídicos das decisões.
Portanto, claro e evidente o óbice do Enunciado quando há deficiência na
fundamentação e a não indicação dos dispositivos violados, que ao final não se tenha a correta
compreensão da irresignação. Ainda, em relação às lições dos doutrinadores Rego e Rocha
Junior42 “[...] além de se indicar o texto violado, há necessidade de se demonstrar como se
procedeu a violação [...]”, ou seja, necessário se faz explicar como se processou eventual
desrespeito à lei, para que, assim, possa configurar o pressuposto para o provimento do apelo
raro.
Lado outro, estabelece o Enunciado 83 do Superior Tribunal de Justiça43 - STJ que não
cabe recurso especial por divergência quando a matéria veiculada pelo recurso se mostrar
contrária ao entendimento que já foi consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, ou seja, o
acórdão usado como paradigma já estiver em consonância com a Corte Superior44.
Segundo Didier e Cunha45 feita a comprovação da divergência, ainda deve o recorrente
realizar o devido cotejo analítico entre o julgado recorrido e o julgado paradigma, ou seja, deve
transcrever os trechos em que fique configurado o dissídio jurisprudencial, aludindo as
circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados.
40 “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata
compreensão da controvérsia.” 41 ROCHA JUNIOR, Francisco de Assis do Rêgo Monteiro. Recurso Especial e Recurso Extraordinário
Criminais. Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris. 2010, p.149. 42 Ibid., p.150. 43 “Não se conhece recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo
sentido da decisão recorrida.” 44 ROCHA JUNIOR, op. cit., p.164. 45JÚNIOR DIDIER, Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Processo Civil 3. Meios de Impugnação
às Decisões Judiciais e Processos nos Tribunais. Salvador-BA. Editoria Juspodivm, 2014, p.298.
26
Em suma, não é meramente comprovar o dissídio jurisprudencial e a simples transcrição
de ementas, pois é necessária a reprodução dos trechos do relatório do acórdão paradigma e,
por conseguinte, o traslado do relatório do acórdão recorrido, para, assim, demonstrar a
similitude fática.
Após, deve ser realizado o cotejo analítico dos trechos do voto do acórdão paradigma e
trechos do voto do acórdão recorrido, para, então, confrontá-los e demonstrar que foram
adotadas teses opostas. Desse modo, caso não comprove, não é possível analisar o mérito da
demanda, pois esbarraria o óbice do Enunciado. Vicente Greco Filho46 ressalta ainda “[...] não
se admite é a utilização de jurisprudência ultrapassada, quando o tema já foi interpretado de
maneira diferente no próprio tribunal, no Supremo Tribunal ou no Superior Tribunal de
Justiça”, ou seja, o cotejo analítico a ser demonstrado em sede recursal necessita estar de acordo
com o entendimento mais recente do Tribunal, ainda que a jurisprudência seja antiga, porém
que não tenha sido superado.
46 GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 11ª Edição. São Paulo-SP. Editora Saraiva, 2015, p.
418/419.
27
4 SISTEMA DE APRECIAÇÃO DA PROVA NO PROCESSO PENAL
As provas no processo penal têm por objetivo a aproximação real da situação fática
denunciada. Conforme Pacelli47 “a prova judiciária tem um objetivo claramente definido que é
a reconstrução dos fatos investigados no processo, na qual busca a maior coincidência possível
com a realidade histórica, isto é, com a verdade dos fatos, tal como efetivamente ocorridos no
espaço e no tempo.” Assim, torna-se uma das tarefas mais difíceis, quando não impossível.
Nesse ínterim, conclui que os exames acerca dos meios de prova disponíveis, bem como a
capacidade de produção de certeza que cada um pode oferecer , devem ser precedidos da
identificação dos princípios e regras gerais aplicáveis.
Temos ainda o entendimento de Távora e Alencar48 onde afirmam que a demonstração
da verdade dos fatos é feita por intermédio do manancial probatórios carreado nos autos e a
prova é tudo aquilo que contribui para a formação do convencimento do magistrado. Portanto,
busca-se o melhor possível, a verdade viável dentro daquilo que foi produzido nos autos.
Complementa, ainda, sobre a importância de processos com qualidade, pois só poderá haver
condenação em face da certeza de culpabilidade e, esta não será obtida através de conjecturas
ou suposições, mas, sim, por intermédio de um escorço probatório sólido. Nesse sentido, define
Nucci49 três sistemas a apreciação das provas: a) livre convicção; b) prova legal; c) persuasão
racional. Já para e Távora e Alencar50: a) certeza moral ou intima convicção do juiz; b) certeza
moral do legislador ou prova tarifada; c) convencimento motivado ou persuasão racional.
Portanto, seguem o mesmo alinhamento de ideologias.
A doutrina majoritária, com o passar histórico, chegou-se a três: a) sistema do livre
convencimento motivo ou persuasão racional; b) sistema da tarifação das provas; e c) sistema
da intima convicção.
4.1 LIVRE CONVICÇÃO OU ÍNTIMA CONVICÇÃO
O sistema da livre convicção caracteriza-se pela decisão exclusiva da certeza
47 PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. São Paulo-SP. Editora Atlas, 2014, p.327. 48 TÁVORA, Nestor; ALENCAR; Rosmar Rodrigues. Prova. In: TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar
Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 9ª edição. Salvador- Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p.496. 49 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 12ª edição. Rio de Janeiro.
Editora Forense, 2015, p.345. 50 TÁVORA, Nestor; ALENCAR; Rosmar Rodrigues. Prova. In: TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar
Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 9ª edição. Salvador- Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 532-
534.
28
íntima do magistrado, no qual decide sobre a avaliação e a admissibilidade das provas, bem
como delibera de acordo com suas convicções jurídicas, não precisando emitir explicações
pelas suas escolhas. Conforme leciona Capez 51 esse é o sistema valorativo que a lei concede
ao magistrado a liberdade ilimitada para decidir como quiser, não fixando qualquer regra de
valoração das provas.
Observa-se, ainda, que a livre convicção é a extrema oposição ao sistema da prova legal
ou prova tarifada, a livre convicção ou íntima convicção. Afirma Nucci 52 que “é o método
concernente à valoração livre ou à íntima convicção do magistrado, significando não haver
necessidade de motivação para suas decisões. É o sistema que prevalece no Tribunal do Júri,
visto que os jurados não motivam o voto”.
No mesmo sentido leciona Távora e Alencar53 “O juiz está absolutamente livre para
decidir, despido de quaisquer amarras, estando dispensado de motivar a decisão. Pode utilizar
o que não está nos autos, trazendo ao processo os seus pré-conceitos e crenças pessoais.”
Portanto, ressalta-se que esse sistema de valoração da prova não é, via de regra, adotado
em nosso ordenamento jurídico, tendo em vista a exigência constitucional do art. 93, inciso IX,
da Constituição Federal, sobre todas as decisões judiciais sejam devidamente fundamentadas,
porém há de se notar resquícios dessa modalidade de valoração, que são as decisões dos jurados
do Tribunal do Júri.
4.2 PROVA LEGAL OU PROVA TARIFADA
O sistema da prova legal ou tarifada é a evidente reação de afastamento ao sistema da
livre convicção ou intima convicção, ou seja, afasta-se a possibilidade de liberdade dada do
magistrado, com o intuito de restringi-lo, ao máximo, o âmbito de atuação. Afirma Guilherme
M. Dezem54 que “Desse sistema decorre a ideia de que a confissão é a rainha das provas, nada
podendo se opor a ela. Também provém dele a ideia de que uma testemunha não é suficiente
para a comprovação do que se pretende no processo (testis unus testis nullus).”
51 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 19ª edição. São Paulo. Editora Saraiva, 2012, p. 399. 52 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 12ª edição. Rio de Janeiro.
Editora Forense, 2015, p.345. 53 TÁVORA, Nestor; ALENCAR; Rosmar Rodrigues. Prova. In: TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar
Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 9ª edição. Salvador- BA: Editora Juspodivm, 2014, p. 532. 54 DEZEM, Guilherme Madeira. Da Prova Penal. 1ª edição. Campinas-SP. Editora Millennium, 2008, p. 118.
29
Com efeito, observa-se que a prova tarifada ainda possui resquícios no ordenamento
jurídico brasileiro no seu art. 158 do Código de Processo Penal, porém tornam-se mínimos
quando observamos o art. 167 do Código de Processo Penal.
Para Nucci55 a prova legal é o método ligado à valoração taxada ou tarifada da prova, a
qual significa o preestabelecimento de um valor determinado para cada uma das provas
produzidas nos autos do processo. Dessa forma, faz com que o magistrado fique cingido ao
critério estabelecido pelo legislador e, ainda, restringido na sua atividade de julgar. No mesmo
contexto, afirma Távora e Alencar56 que na prova tarifada a legislação estipula o valor de cada
uma, estabelece a hierarquia entre estas, aniquila praticamente a margem de liberdade
apreciativa do magistrado, restando, assim, vinculado a atender o regramento jurídico. Dessa
forma, complementa, verbis:
É o que ocorre com a previsão do art. 158 do CPP, ao exigir, nos crimes que deixam
vestígios, que a materialidade seja provada com a realização de exame de corpo de
delito, não servindo a confissão para suprir eventual omissão. A lei diz a prova
adequada à demonstração da materialidade, rejeitando a confissão e elegendo a perícia
como o meio a ser utilizado. Caso não seja possível a realização da perícia, as
testemunhas podem ser utilizadas, a confissão jamais (art. 167, CPP). É sem dúvida
um resquício do sistema da prova tarifada.
4.3 PERSUASÃO RACIONAL OU LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO
Tendo em vista o evidente exagero pelos dois sistemas anteriores, o legislador definiu
uma mudança perante a sistemática avaliativa da prova, razão pela qual permitiu ao magistrado
maior liberdade no momento decisório. No entanto, a liberdade imposta sistema requereu maior
responsabilidade ao juiz, devendo julgar conforme todo o contexto fático- probatório dos autos,
segundo seu livre convencimento, porém decisão esta que deve ser amplamente motivada,
conforme preconiza o art. 93, IX, da Constituição Federal, bem como o art. 155 do Código de
Processo Penal.
Nas lições de Nucci 57 a persuasão racional é um método misto adotado
majoritariamente no sistema processual penal brasileiro, na qual encontra fundamento na
Constituição Federal no art. 93, inciso IX. É a permissão concebida ao magistrado para decidir
55 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 12ª edição. Rio de Janeiro.
Editora Forense, 2015, p.345. 56 TÁVORA, Nestor; ALENCAR; Rosmar Rodrigues. Prova. In: TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar
Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 9ª edição. Salvador- Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 532-
533. 57 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 12ª edição. Rio de Janeiro.
Editora Forense, 2015, p.345.
30
a causa de acordo com seu livre convencimento, devendo, assim, fundamentá-la nos autos, na
busca de persuadir as partes e a comunidade em abstrato.
Nas linhas de Távora e Alencar58 é o juiz em estado livre para decidir e apreciar as
provas que lhe são apresentadas, desde que faça motivadamente, conforme preconiza o art. 93,
inciso IX, da Constituição Federal - CF, bem como ao art. 155 do Código de Processo Penal –
CPP, no qual determina literalmente o sistema da formação da sua convicção vigente no
ordenamento jurídico brasileiro, no qual o magistrado apreciará a prova produzida com
observância ao contraditório judicial, porém não pode fundamentar sua decisão somente nos
elementos colhidos em sede de investigação, com exceções às provas cautelares não repetíveis
e antecipadas. Acerca do tema, Távora e Alencar 59 conclui:
A liberdade do julgador lhe permite avaliar o conjunto probatório em sua magnitude
e extrair da prova a sua essência, transcendendo ao formalismo castrador do sistema
da certeza. Não existe hierarquia entre provas, cabendo ao juiz imprimir na decisão o
grau de importância das provas produzidas.
Destarte, cumpre ressaltar que essa liberdade não é sinônimo de livre arbítrio, pois cabe
ao juiz, em consonância com as provas juntadas, decidir a demanda conforme o acervo fático
probatório dos autos, explicando o porquê da sua conclusão. Portanto, este é o sistema adotado
no ordenamento jurídico brasileiro, conforme o pacífico entendimento da doutrina e da
jurisprudência.
58 TÁVORA, Nestor; ALENCAR; Rosmar Rodrigues. Prova. In: TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar
Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 9ª edição. Salvador- Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 533. 59 Id., 2014, p.533.
31
5 REEXAME E REVALORAÇÃO DE PROVAS
Cumpre esclarecer, desde logo, que o tema em comento é extremamente controvertido
nos Tribunais e no Superior Tribunal de Justiça, dividindo opiniões no sentido de ser ou não
aplicável o óbice do Enunciado 7 da Súmula do STJ no juízo de admissibilidade do recurso
especial, em face de questões processuais de fato e de direito.
Dessa forma, antes de analisarmos o cerne do presente estudo, necessário se faz
conceituar os institutos do reexame de provas e da revaloração de provas, demonstrando a linha
tênue que os divergem no direito.
A rigor, o instituto do reexame de provas em sede de recurso especial é defeso, em razão
da impossibilidade do Superior Tribunal de Justiça rever o conjunto fático-probatório contido
nos autos, pois não se presta ser considerada uma terceira instância no ordenamento jurídico
brasileiro, devendo somente velar pela defesa da aplicação correta da legislação federal.
Nesse sentido já se manifestou Ada Grinover 60, ipsis litteris:
A conseqüência mais elementar dessas observações está no impedimento da utilização
dessas impugnações para reexame de questões de fato, cujo deslinde esteja limitado à
avaliação de provas. Se isso fosse possível, os recursos em análise se transformariam
em uma segunda apelação, o que evidentemente contraria sua natureza e destinação.
Assim, questões de fato devem ser exauridas em primeira e segunda instâncias
instância. Portanto, em face de inúmeros recursos dirigidos à Corte Cidadã com pleitos
pugnando o reexame de provas, a matéria foi devidamente sumulada.
Lado outro, o instituto da revaloração de provas consiste na possibilidade de ser rever a
aplicação da legislação federal sobre as questões de direito controvertidas. Ademais,
processualística brasileira, a revaloração vem sendo admitida por versar sobre a má aplicação
do direito sobre os fatos, ou seja, é possível recorrer ao STJ, via recurso especial, com a matéria
de irresignação posta ao fundo, versando sobre erro valorativo dos fatos, o qual incidiu em
aplicação equivocada do direito.
Nesse sentido, imperioso destacar a manifestação do Ministro Marco Buzzi, ipsis
litteris:
A revaloração da prova constitui em atribuir o devido valor jurídico a fato
incontroverso sobejamente reconhecido nas instâncias ordinárias, prática francamente
aceita em sede de recurso especial.61
60 GRINOVER, Ada Pellegrini; FILHO, Antonio Magalhães Gomes; FERNANDES, Antonio Scarance. Recurso
no Processo Penal. 7ª edição. São Paulo-SP. Editora Revista dos Tribunais Ltda, 2011, p.203. 61 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (4ª Turma). AgRg no REsp.1036178/SP. Relator (a): Marco Buzzi. São
Paulo, 13 de dezembro de 2011. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=
1036178&&b=ACOR&p=true&t=JURIDICO&l=10&i=1 >. Acesso em 01/11/2015.
32
(AgRg no REsp 1036178/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA,
julgado em 13/12/2011, DJe 19/12/2011)
Essa linha entre a diferenciação da revaloração e do reexame de prova é tão delicada
que, para se separar a matéria de fato da matéria de direito, é necessário uma análise minuciosa
entre uma e outra que para alcançar o verdadeiro reconhecimento de ambas as matérias. Cumpre
ressaltar que há casos em que para se analisar a matéria de direito é indispensável exame da
matéria fática.62
Todavia, Bernardo Pimentel63 afirma, categoricamente, que o recurso especial não é via
idônea para suscitar injustiças derivadas da apreciação dos fatos e das provas no tribunal de
origem. Em lado oposto, assevera Vicente Greco Filho apud Bernardo Pimentel, a possibilidade
de ser revisto uma decisão que tenha sido valorado erroneamente a prova, autoriza, assim, via
recurso especial, sanar eventuais erros, verbis:
O erro na valoração legal da prova, entretanto, pode ser suscitado em recurso especial.
É que o equívoco na aplicação das regras que cuidam das provas configura erro de
direito federal, pelo que pode ser submetido à apreciação do Superior Tribunal de
Justiça.
Ademais, em consonância com o entendimento de Vicente Greco Filho temos os
entendimentos de Ada Pellegrini Grinover, Antônio Magalhães Gomes Filho e Antônio
Scarance Fernandes que afirmam, “Não se exclui, entretanto a reapreciação de questões
atinentes à disciplina legal da prova e também à qualificação jurídica de fatos assentados no
julgamento de recursos ordinários”.64
Noutro giro, ressalta-se que no tocante a dosimetria da pena, o Superior Tribunal de
Justiça não vem admitindo recurso especial em face de violação ao art. 59 do Código Penal
quando, necessariamente, importar na análise do conjunto fático-probatório. Todavia, por sua
vez, Nucci apud Távora e Rosmar Rodrigues afirma que somente quando houver flagrante
ilegalidade ou abuso de poder na dosimetria é que o recurso especial será cabível. 65
Portanto, observa-se que o reexame e a revaloração das provas do conjunto fático-
probatório, por diversas vezes, em casos bastante específicos, não se distinguem a partir do
62 MOSSIN, Heráclito Antônio. Recursos em Matéria Criminal. 4ª edição. Barueri-SP. Editora Manole, 2006,
p.593. 63 SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos Recursos Cíveis e à Ação Rescisória. Revista e Atualizada à luz da
lei 12.322/10. 8ª edição. 2010, p.494. 64 GRINOVER, Ada Pellegrini; FILHO, Antonio Magalhães Gomes; FERNANDES, Antonio Scarance. Recurso
no Processo Penal. 7ª edição. São Paulo-SP. Editora Revista dos Tribunais Ltda, 2011, p.203. 65 TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 9ª edição. Salvador-
Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1144.
33
momento em que partimos para o cotejo analítico dos julgados da Quinta e Sexta Turmas do
Superior Tribunal de Justiça.
Dessa forma, observa-se a aplicação da conveniência sobre o julgamento dos recursos
especiais e dos agravos interpostos quando aqueles são denegados, conforme art. 28 da Lei
8.038/90, ao sobrepor ou não a incidência da Súmula 7 do STJ no caso, ou seja, os ministros ao
analisarem o juízo de mérito da demanda, superam o óbice da proibição de reexaminar prova
em sede de recurso especial, atribuindo o instituto da revaloração, o que nada impediria
conhecer o mérito do recurso.
Em suma, o recurso especial, via de regra, possui a característica de não se prestar ao
reexame das quaestionis facti, pois visa somente à apreciação das quaestiones iuris. De tal
modo, a questão fática deve ser exaustivamente analisada em instância ordinária, restando às
instâncias extraordinárias, no caso o Superior Tribunal de Justiça, a análise de eventual violação
a questão de direito.
5.1 JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE E JUÍZO DE MÉRITO DO RECURSO ESPECIAL
O juízo de admissibilidade do recurso especial é o momento pelo qual se examina a
possibilidade de conhecê-lo, ou seja, tem por análise os requisitos necessários para que se possa
legitimamente apreciar o mérito da irresignação.
Com efeito, o juízo de admissibilidade do recurso especial passa por dois momentos, o
juízo provisório, realizado perante o Tribunal recorrido e o juízo definitivo, realizado perante o
Superior Tribunal de Justiça.
O juízo de admissibilidade do recurso especial é provisório quando realizado perante o
Tribunal a quo, após o momento da interposição do recurso e a intimação do recorrido para se
manifestar no prazo de 15 (quinze) dias, mais especificamente, perante o Presidente do Tribunal
recorrido (art. 26 da Lei 8.038/90), findo este prazo o recurso especial será concluso para
admissão ou não do recurso, no prazo de 5 (cinco) dias.
Sendo positivo o juízo de admissibilidade provisório do recurso especial, os autos serão
encaminhados ao Órgão ad quem para a realização do juízo definitivo de admissibilidade, ou
seja, o recurso especial após ultrapassar o juízo prévio sobre sua admissão no Tribunal local,
agora, será ou não, definitivamente admitido pelo Superior Tribunal de Justiça.
34
Ressalta-se, ainda, que a natureza jurídica do juízo de admissibilidade, realizada em
ambos os juízos (a quo e ad quem), é essencialmente declaratória66.
Diante dessa dupla análise, observa-se a enorme rigidez sobre o processamento do
recurso especial até a análise do seu mérito. Assim, tamanha é a necessidade da decisão que
admite, ou não, o recurso especial, ser devidamente fundamentada, com o exame dos seus
pressupostos gerais e constitucionais, conforme o teor do Enunciado 123 do STJ.
Ultrapassado o juízo de admissibilidade definitivo, após satisfazer os requisitos,
compete ao Superior Tribunal de Justiça o encargo para analisar o mérito do recurso que é,
exclusivamente, realizada pelo juízo ad quem, o qual julgará sobre o provimento ou não
provimento do recurso, também chamado de juízo de mérito.
5.2 ANÁLISE DOS PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ACERCA
DAS DIVERGÊNCIAS JURISPRUDENCIAIS NA (IN)APLICABILIDADE DO
ENUNCIADO DA SÚMULA 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
É cediço o elevado número de recursos especiais criminais dirigidos ao Superior
Tribunal de Justiça diariamente, tendo em vista a irresignação da parte perante os Tribunais
recorridos. Dessa forma, o Poder Judiciário busca a celeridade processual constitucionalmente
garantida (art. 5°, inciso LXXVIII, da Constituição Federal).
Assim, com a finalidade de alcançar o patamar ideal sobre a razoável duração do
processo, o judiciário se esforça, diuturnamente, com a utilização de diversos mecanismos para
desafogar o órgão que, hoje, devido às grandes demandas, encontra-se sobrecarregado.
Com efeito, podemos destacar as Metas Nacionais67 fixadas pelo Conselho Nacional de
Justiça que desde o ano de 2009 vem realizando encontros para definir a cada ano metas a serem
implementadas.
É evidente que tais metas definidas, em regra geral, visam diminuir as estatísticas sobre
os números de processos em trâmite no Poder Judiciário. Em contrapartida, com o cumprimento
das metas fixadas, um número maior de recursos tende a surgir praticamente na mesma
proporção.
Observa-se, ainda, que a maioria dos recursos especiais criminais dirigidos ao STJ, no
momento em que são submetidos ao juízo de admissibilidade a quo, não são admitidos em face
de esbarrar no óbice do reexame de fatos. Dessa forma, cabe a parte agravar da decisão para
66 GRINOVER, Ada Pellegrini; FILHO, Antonio Magalhães Gomes; FERNANDES, Antonio Scarance. Recurso
no Processo Penal. 7ª edição. São Paulo-SP. Editora Revista dos Tribunais Ltda, 2011, p. 61. 67 Metas Nacionais. Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/gestao-e-
planejamento/metas. Acessado em 01/11/2015.
35
que o juízo ad quem analise o prosseguimento ou não do recurso. Portanto, nota-se que o
processamento de grande parte dos recursos são interrompidos já no tribunal a quo e, mesmo
assim, as demandas são imensas.
A partir destes fatos, observam-se inúmeros julgados controversos sobre a
(in)aplicabilidade do Enunciado 7 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, no momento em
que analisamos o repositório jurisprudencial da Corte Cidadã.
Vejamos a seguir duas das matérias mais controvertidas dentre os julgados da Corte
Superior, a análise de laudos periciais, em razão de revolver ou não o conjunto fático-probatório
e a análise da aplicação da dosimetria da pena, mais especificamente sobre a pena-base (art. 59
do Código Penal), verbis:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE OFENSA
AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. ART. 557, CAPUT E § 1º-A, DO CPC.
PROVIMENTO DO RECURSO ESPECIAL. RESTABELECIMENTO DE
SENTENÇA CONDENATÓRIA. REVALORAÇÃO DO CONTEXTO
PROBATÓRIO. POSSIBILIDADE. REEXAME DE PROVAS. NÃO
OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS. ART. 184, § 2º, DO CP.
ART. 530-D DO CPP. PERÍCIA SOBRE O CONTEÚDO DE TODOS OS BENS
APREENDIDOS. EXIGÊNCIA QUE NÃO SE PRESTA PARA FINS DE
COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE DELITIVA. IDENTIFICAÇÃO DOS
SUJEITOS PASSIVOS DO DELITO. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES.
AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
- Não há ofensa ao princípio da colegialidade quando a decisão monocrática é
proferida em obediência aos arts. 557, caput e § 1º- A, do Código de Processo Civil e
3º do Código de Processo Penal, que permite ao relator dar provimento, negar
seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em
confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal,
do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.
- A solução da controvérsia não exigiu reexame do conjunto fático-probatório
dos autos - providência vedada pela Súmula n. 7/STJ -, mas apenas a sua
revaloração, a fim de concluir se a perícia mostra-se ou não apta ao desiderato
de comprovar a materialidade do delito.
- Não obstante a redação do art. 530-D do Código de Processo Penal disponha que a
perícia deva ser realizada sobre todos os bens apreendidos, essa exigência não se
presta para fins de comprovação da materialidade delitiva, até porque basta a
apreensão de um único objeto para que, realizada a perícia e concluído sobre a sua
falsidade, esteja configurado o delito previsto no art. 184 do Código Penal.
- Na hipótese, a materialidade do crime restou amplamente demonstrada, uma vez que
foram apreendidos 137 mídias falsificadas, tendo sido realizada perícia, por
amostragem, atestando-se a falsificação das mesmas.
- A jurisprudência desta Corte Superior tem se posicionado no sentido de que, sendo
o crime de violação de direito autoral descrito no art. 184, § 2º, do Código Penal
sujeito a ação penal pública incondicionada e tendo sido constatada, por laudo pericial,
a falsidade da mídia, é desnecessária, para a configuração de sua tipicidade,
a identificação e inquirição do sujeito passivo.
Agravo regimental desprovido.68(grifo nosso)
(AgRg no REsp 1456256/MG, Rel. Ministra MARILZA MAYNARD
68 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (6ª Turma). AgRg no REsp. 1456256/MG. Relator (a): Marilza
Maynard (Desembargadora convocada do TJ/SE). Minas Gerais, 17 de agosto de 2014. Disponível em: <http://w
w.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=1456256&&b=ACOR&p=false&l=10&i=4>. Acesso em 02/11/
2015.
36
(DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/SE), SEXTA TURMA, julgado em
07/08/2014, DJe 22/08/2014)
Ao analisar o voto do precedente citado, observa-se que o acusado interpôs agravo
regimental em face da decisão da Ministra que deu provimento ao recurso especial do
Ministério Público Estadual, restabelecendo a condenação do réu, sob a prática do delito do art.
184, § 2°, do Código Penal.
Por sua vez, alegou o recorrente que a perícia não prestava para firmar sua condenação,
pois entre os objetos apreendidos havia produtos originais e produtos falsificados. Assim, a
Ministra afastou a incidência do Enunciado 7 do STJ, sob o argumento de que a solução da
controvérsia não exigiu reexame do conjunto fático-probatório, analisando novamente o laudo
pericial, onde concluiu “No caso em tela a materialidade do crime restou amplamente
demonstrada, uma vez que foram apreendidos 137 mídias falsificadas, tendo sido realizado a
perícia”
No caso, ainda que conhecido a vedação do reexame de provas, é evidente que estamos
diante da análise do contexto fático-probatório (laudo pericial), pois houve a necessidade da
incursão no acervo de provas contido nos autos, para que seja comprovada a falsidade dos
produtos apreendidos, porém foi afastado a incidência de reexame, aplicando ao caso a
revaloração das provas.
Noutro giro, veremos a seguir o caso de reexame de provas em face também de análise
de laudo pericial, verbis:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL.
FURTO QUALIFICADO E USO DE DOCUMENTO FALSO. ALEGAÇÃO DE
FALTA DE PROVAS.INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.º 07 DESTA CORTE.
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. REINCIDÊNCIA ESPECÍFICA.IMPOSSIBI
LIDADE. IDADE DA VÍTIMA. PROVAS APTAS A COMPROVAR QUE A
VÍTIMA ERA CRIANÇA À ÉPOCA DOS FATOS. DOSIMETRIA DA PENA.
ART. 59 DO CÓDIGO PENAL. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO IDÔNEA.
REINCIDÊNCIA E CONFISSÃO ESPONTÂNEA. COMPENSAÇÃO.POSSIBILI
DADE. MATÉRIA PACIFICADA NESTA CORTE POR OCASIÃO DO
JULGAMENTO DO ERESP N.º 1.154.752/RS. DECISÃO MANTIDA POR SEUS
PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Após exaustiva análise do conjunto fático-probatório presente nos autos, no
qual estavam presentes o laudo pericial, o auto de apreensão e os testemunhos
prestados em juízo, o Tribunal de origem concluiu pela condenação do Acusado.
Dessa forma, a modificação do entendimento sedimentado pela instância
ordinária demandaria amplo reexame de provas, o que sabe vedado na via
estreita do recurso especial, a teor do que dispõe a Súmula n.º 07 desta
Corte Superior. 2. A aplicabilidade do princípio da insignificância no delito de furto é cabível quando
se evidencia que o bem jurídico tutelado (no caso, o patrimônio) sofreu mínima lesão
e a conduta do agente expressa pequena reprovabilidade e irrelevante periculosidade
37
social. Na hipótese, não se verifica o desinteresse estatal à repressão do delito
praticado, pois, conforme ressaltado no voto condutor do acórdão impugnado, o
Paciente é reincidente na prática do crime de furto e possui péssimos antecedentes, de
modo que a sua conduta não se mostra compatível com a aplicação
do princípio da insignificância.
3. [...]
5.[...]
6. Agravo regimental desprovido. 69(grifo nosso)
(AgRg no REsp 1374309/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA,
julgado em 13/08/2013, DJe 23/08/2013).
No caso, o recorrente em sede de agravo no recurso especial pugnou pela análise do
conjunto fático-probatório, sob o argumento de que há falta de provas caracterizadoras para
ensejar sua condenação.
Todavia, conforme a Ministra Relatora foi decidido que o pleito do recorrente esbarraria
no óbice do Enunciado 7 do STJ, ou seja, a análise do laudo pericial não pode ser realizada pelo
fato da não possibilidade de se reexaminar as provas contidas nos autos.
Destarte, ambos os casos se assemelham, pois envolvem a análise de laudos periciais
para se concluir decisão, onde no primeiro caso aplicou-se o instituto da revaloração das provas
contidas nos autos, a fim de comprovar a falsificação dos materiais que foram violados os
direitos autorais. Já no segundo caso, aplicou-se o óbice da Súmula 7 do STJ, em razão de não
poder reexaminar o laudo de falsificação de documento.
Estamos aqui diante de decisões controvertidas dentro da mesma Turma do Tribunal,
casos esses em que surgem conflitando com a própria segurança jurídica do processo penal,
percebe-se, ainda, a ausência de parâmetros sólidos relativos à distinção dos dois institutos
citados dentro da Corte em seus julgamentos.
Ademais, podemos observar outra matéria bastante controvertida entre os julgados,
questões relativas à dosimetria da pena, verbis:
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. REDUÇÃO DA PENA-BASE. POSSIBILIDADE.
DESNECESSIDADE DO REEXAME DE PROVAS. AGRAVO DESPROVIDO.
- A Súmula n. 7 do Superior Tribunal de Justiça - STJ não impede o conhecimento do
recurso especial, pois para o redimensionamento da pena não houve incursão no
acervo fático-probatório dos autos, mas apenas a revaloração das circunstâncias
delineadas no julgado prolatado na origem.
69 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (5ª Turma). AgRg no AREsp. 1374309/MG. Relator
(a): Ministro Laurita Vaz . Minas Gerais, 13 de agosto de 2013. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jur
isprudencia/doc.jsp?livre=%28%22laudo+pericial%22+%22reexame%22+%22documento%22%29+E+%28%2
2Sexta+Turma%22+OU+%22Quinta+Turma%22%29.org.&&b=ACOR&p=false&t=JURIDICO&l=10&i=4>.
Acesso em 04/11/2015.
38
Agravo regimental desprovido.70
(AgRg no AREsp 690.290/PA, Rel. Ministro ERICSON MARANHO
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em
23/06/2015, DJe 03/08/2015)
Em análise ao precedente citado, observa-se que foi realizado o redimensionamento da
pena-base aplicada, em razão de ter sido retirado a valoração negativa da circunstância judicial
da culpabilidade, sendo que esta foi considerada normal para o crime. Assim, o Ministro em
seu voto acatou a tese de ser possível revalorar o material fático-probatório dos autos.
Contudo, é evidente a incursão no acervo, tendo em vista no voto o Ministro revolveu o
material probatório dos autos, no momento em que foi analisado circunstâncias judiciais do art.
59 do Código Penal, “No caso temos que a pena-base foi fixada em 3 (três) anos acima do
mínimo legal, considerando-se a existência de três circunstâncias judiciais desfavoráveis-
culpabilidade, motivos do crime e comportamento da vítima”. Dessa forma, observa-se que o
ministro revalorou ponto a ponto sobre a dosimetria da pena-base ora aplicada, definindo novo
patamar de pena.
Noutro giro, temos o entendimento jurisprudencial divergente da 5ª Turma do STJ,
verbis:
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
HOMICÍDIO QUALIFICADO. DOSIMETRIA. ELEVAÇÃO DA PENA-BASE.
FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. PERCENTUAL. PROPORCIONALIDADE.
REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. VEDAÇÃO.
SÚMULAS 7/STJ E 279/STJ.
I - Não há ilegalidade no v. acórdão recorrido que, analisando o art. 59 do Código
Penal, verifica a existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis aptas a
autorizarem a fixação da pena-base acima do mínimo legal.
II - Dessa forma, tendo sido estabelecida a pena-base acima do patamar mínimo, em
virtude da valoração negativa da culpabilidade, motivos e consequências, com
fundamentação concreta e dentro do critério da discricionariedade juridicamente
vinculada, não há como proceder a qualquer reparo em sede de recurso especial.
(Precedentes).
III - O recurso especial não será cabível quando a análise da pretensão recursal exigir
o reexame do quadro fático-probatório, sendo vedada a modificação das premissas
fáticas firmadas nas instâncias ordinárias no âmbito dos recursos extraordinários.
(Súmula 07/STJ e Súmula 279/STF).
Agravo regimental desprovido.71
(AgRg no AREsp 527.419/ES, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA,
julgado em 06/10/2015, DJe 19/10/2015)
70 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (6ª Turma). AgRg no AREsp. 690.290/PA. Relator (a): Ministro
Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ/SP). Pará, 23 de junho de 2015. Disponível em: http://www.
stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=690290&&tipo_visualizacao=RESUMO&b=ACOR&thesaurus=JU
RIDICO. Acesso em 04/11/2015. 71 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (5ª Turma). AgRg no AREsp. 527.419/ES. Relator (a): Ministro Félix
Fischer. Espírito Santo, 06 de outubro de 2015. Disponível em:< http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.
jsp?livre=%22penabase%22+%22reexame%22+%22penal%22&&b=ACOR&p=false&l=10&i=4>. Acesso em
04/11/2015.
39
No precedente citado, o recorrente buscou a diminuição da pena-base, em razão de ter
sido fixada acima do mínimo legal, alegando ausência de motivação idônea para a majoração
das circunstâncias judiciais na primeira fase. Entretanto, o Ministro Relator afirmou que para
rever a desproporcionalidade do quantum de majoração de pena, não assistiria razão, pois para
que fosse analisado exigiria o reexame do quadro fático-probatório.
Analisando tais precedentes, nota-se tamanha divergência de entendimento sobre a
mesma matéria, isso entre os próprios Ministros do Superior Tribunal de Justiça, casos estes
em que estão em análise desde a simples redução de pena à uma possível absolvição do acusado,
caso seja dado o valor legal à uma prova, por exemplo.
Assim, ainda que a matéria esteja devidamente sumulada, assegurando que a simples
pretensão de reexaminar prova não ensejaria recurso especial, temos nestes casos
entendimentos totalmente controversos dentro do Tribunal.
Portanto, a análise exposta entre os diversos precedentes não se esgota em face do
acervo jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, razão pela qual é uma questão bastante
delicada, cuja comprovação sobre a diferença entre os institutos é extremamente difícil, pois
muitas vezes não se sabe em qual momento se encontra, revalorando ou reexaminando. A partir
de então, deve-se atentar à cautela que a referida matéria necessita ao longo do juízo de
admissibilidade realizado tanto pelo tribunal a quo, quanto pelo tribunal ad quem, para atribuir
à prova o seu devido valor jurídico.
40
6 CONCLUSÃO
No ordenamento jurídico brasileiro, o recurso especial criminal tornou-se um dos
instrumentos primordiais para a garantia do cumprimento da legislação federal, cabendo ao
Superior Tribunal de Justiça aferir eventual violação às normas federais, velando, ainda, pelos
princípios estabelecidos no Estado Democrático de Direito.
Ademais, é cediço que na Corte Cidadã há divergências entre os próprios ministros e,
até mesmo, dentro das próprias turmas, principalmente em relação às questões de fato e de
direito, razão pela qual estamos diante de episódios complexos, sem a devida valoração correta
das provas contida nos autos.
Contudo, as análises dos recursos especiais criminais perante o juízo de admissibilidade
no tribunal a quo e no tribunal ad quem devem passar por um crivo cauteloso, com análise
arraigada da matéria, bem como a finalidade de buscar a distinção entre os institutos da
revaloração e do reexame de provas no caso concreto para buscar a melhor aplicação sobre as
quaestiones iuris.
A expectativa, portanto, é que pacifique o entendimento dos Ministros do Superior
Tribunal de Justiça, principalmente perante a Quinta e Sexta Turma, especializadas em matéria
criminal, objeto do presente estudo, nas quais compreendem que o tema já está “pacificado”,
porém não é o que percebemos, em face dos institutos da revaloração e do reexame de provas
aplicados perante aquela Corte, facilmente comprovada quando observamos em seu repositório
oficial questões de direito extremamente controvertidas, dentre elas podemos citar temas
relacionados à dosimetria da pena, desde a primeira fase até a terceira fase, a análise de exames
de laudos periciais, absolvição por insuficiência de provas, prisões preventivas, dentre outros.
Assim, diante da problemática instalada necessário se faz uma revisão jurisprudencial
no que tange aos assuntos mais complexos e divergentes, devendo analisar cautelosamente cada
recurso com o seu devido valor legal sobre as provas, buscando o afastamento da característica
não só da Corte, mas do Poder Judiciário, de órgão cumpridor de metas de julgamentos
estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça, para, por fim, enveredar-se sobre uma análise
processual de qualidade, com acórdãos justos em consonância com entendimentos coerentes.
41
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