PRISÃO TEMPORÁRIA

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PRISÃO TEMPORÁRIA

HUGO DE BRITO MACHADO Advogado, Professor Titular de Direito Tributário da

Universidade Federal do Ceará e Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da

5.ª Região (Aposentado)

Tentam explicar a prisão de empresários acusados de

cometerem crimes contra a ordem tributária. Um jovem procurador da

república em São Paulo, que comandou a operação policial, foi à televisão

justificar as prisões afirmando que se trata de prisão temporária.

Reportando-se à manifestação de um advogado que classificara como

indevida a prisão disse que o advogado tinha razão do ponto de vista

constitucional, “mas não é assim não”. Em outras palavras, disse que na

prática a teoria é outra. Confessou, portanto, que a Constituição Federal

não vale nada. E isto é estarrecedor, pois mostra que estamos vivendo

um Estado ditatorial, com nítida inspiração nazifacista, onde a

Constituição e as leis só valem na parte em que conferem competências

às autoridades, mas são letras mortas na parte em que asseguram

direitos aos cidadãos. Prisão temporária é uma “prisão cautelar de

natureza processual destinada a possibilitar as investigações a respeito de

crimes graves, durante o inquérito policial”.(Fernando Capez, Curso de

Processo Penal, 12ª edição, Saraiva, São Paulo, 2005, p. 247). Somente

se justifica em situações excepcionais nas quais seja indispensável às

investigações, evitando que o acusado nelas interfira. Jamais para obter

depoimentos, como ocorreu no caso em tela, que se tenta justificar pelo

efeito surpresa, evitando que os acusados recebam instruções de seus

advogados sobre o que dizer. E também nesse ponto o jovem procurador

da república e demais autoridades que realizaram a “operação narciso”

mandaram às favas a Constituição Federal, que ao tratar dos direitos e

garantias fundamentais assegura que “o preso será informado de seus

direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a

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assistência da família e de advogado”.(CF/88, art. 5°, inciso LXIII). Outra

característica do Estado nazifacista transpareceu no modo pelo qual foram

apreendidos computadores e documentos. Mesmo quando necessárias às

apreensões, em um Estado de Direito estas devem ser feitas pela forma

legalmente estabelecida, sempre com lavratura dos termos

correspondentes, nos quais são identificados os objetos apreendidos. Da

forma como as apreensões têm ocorrido, tudo poderá depois ser

apresentado pelas autoridades como tendo sido apreendido na empresa

em questão. Tudo. Qualquer computador, com qualquer conteúdo.

Qualquer documento, falsificado por sabe-se lá quem. E isto torna viáveis

ações inteiramente arbitrárias nas quais autoridades podem fabricar as

provas que quiserem contra os acusados. Admitir como legítimas ações

policiais como as que têm sido exibidas pela televisão, só é possível se

acreditarmos que as autoridades são, todas elas, santos. Mas sabemos

todos que não é assim. Os direitos e garantias fundamentais existem e

devem ser respeitados precisamente porque os que acusam, e os que

julgam, não são santos. São humanos, falíveis como qualquer ser

humano. A posse no cargo de procurador da república, ou de delegado de

polícia, ou de juiz, não transforma o homem em santo. Por isto é que a

ordem jurídica impõe formas, impõe procedimentos, para a ação das

autoridades. E assegura direitos como o de defender-se, o de ficar calado,

não se auto-incriminar, não ter violado seu domicílio, entre outros que

guarnecem o cidadão, contra os abusos de autoridades, às vezes bem

intencionadas, mas, nem sempre maduras o suficiente para o exercício do

poder. Não temos dúvida de que o Estado dispõe dos meios necessários à

arrecadação dos tributos devidos, sem agredir cidadãos aos quais nem ao

menos oferece a segurança pública de que necessitamos para trabalhar e

gerar riquezas. Talvez não disponha, isto sim, é do fundamento ético

necessário para convencer as pessoas a pagar os tributos que impõe. É

realmente muito difícil convencer alguém que trabalha a suportar

pacificamente o peso excessivo dos impostos que não geram recursos

para a prestação dos serviços essenciais, porque são insuficientes para o

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pagamento de juros aos agiotas oficiais e para saciar a sede de políticos

corruptos e de publicitários que se prestam como instrumento de suas

práticas abomináveis.

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