Pressupostos de Admissibilidade

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RESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL 22.2.1. Cabimento O preenchimento do requisito do cabimento exige que o pronunciamento seja recorrível e que o recurso interposto seja o adequado, ou seja, o recurso indicado pela lei para impugnar aquele determinado pronunciamento judicial 7 . A recorribilidade do pronunciamento deve ser analisada em primeiro lugar, porque, concluindo-se por sua irrecorribilidade, é natural que nenhum recurso seja cabível para impugná-lo. Segundo o art. 504 do CPC, os despachos são irrecorríveis, o que poderia levar à conclusão de que todos os pronunciamentos com carga decisória são recorríveis. Apesar de ser essa a regra, é importante lembrar que existe irrecorribilidade de decisões judiciais previstas pelo Código de Processo Civil (v.g. arts. 527, parágrafo único, e 519, parágrafo único), bem como por construções jurisprudenciais (decisão que reconhece suspeição por motivo de foro íntimo). Triste constatação derivada de análise jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça demonstra uma forte e equivocada tendência de entender como despachos e,

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Pressupostos de Admissibilidade Recursais

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RESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL

22.2.1. Cabimento

O preenchimento do requisito do cabimento exige que o pronunciamento seja recorrível e que o recurso interposto seja o adequado, ou seja, o recurso indicado pela lei para impugnar aquele determinado pronunciamento judicial7. A recorribilidade do pronunciamento deve ser analisada em primeiro lugar, porque, concluindo-se por sua irrecorribilidade, é natural que nenhum recurso seja cabível para impugná-lo. Segundo o art. 504 do CPC, os despachos são irrecorríveis, o que poderia levar à conclusão de que todos os pronunciamentos com carga decisória são recorríveis. Apesar de ser essa a regra, é importante lembrar que existe irrecorribilidade de decisões judiciais previstas pelo Código de Processo Civil (v.g. arts. 527, parágrafo único, e 519, parágrafo único), bem como por construções jurisprudenciais (decisão que reconhece suspeição por motivo de foro íntimo).

Triste constatação derivada de análise jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça demonstra uma forte e equivocada tendência de entender como despachos e, portanto irrecorríveis, alguns pronunciamentos nitidamente de natureza decisória. O pronunciamento que restitui o prazo para uma das partes naturalmente analisa a presença da causa que justifique essa restituição e decide pela sua ocorrência8; o pronunciamento que determina a remessa de um processo a outro julgador em razão da prevenção decide a respeito da presença desse fenômeno jurídico de modificação de competência9.

O pronunciamento que deixa de analisar o pedido de tutela antecipada tem carga decisória. A pueril justificativa de que, postergada a decisão a respeito da concessão ou não da tutela

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para momento posterior – após a juntada de determinados documentos nos autos – se estaria diante de pronunciamento que nada decidiu (despacho) não se sustenta10. É evidente que se a parte pediu a tutela antecipada é porque precisa com urgência de sua concessão, de forma que, ao deixar de analisar o pedido, há negativa da prestação jurisdicional requerida pela parte, o que já é suficiente para atribuir a esse pronunciamento conteúdo decisório.

O Superior Tribunal de Justiça diz com todas as letras que o pronunciamento que determina a emenda da petição inicial é mero despacho, mas reconhece que excepcionalmente caberá recurso a depender da subversão da legislação processual em vigor de maneira a causar um gravame à parte11. Percebe-se que o próprio tribunal reconhece o absurdo de seu entendimento ao afirmar ser irrecorrível tal pronunciamento, confundindo admissibilidade com mérito, uma vez que a análise do conteúdo do pronunciamento para se aferir se ele subverte ou não a legislação refere-se à correção ou não da decisão.

Determinada a recorribilidade da decisão, deve-se examinar a correspondência do recurso, o que demandará a análise da natureza e do conteúdo da decisão no caso concreto e, ainda, o respectivo recurso previsto em lei como o adequado à sua impugnação. Essa correspondência é encontrada na lei, tal como ocorre no art. 513 do CPC, que determina caber apelação contra sentença, ou no art. 522 do CPC, que determina ser cabível o recurso de agravo – retido ou de instrumento – contra decisão interlocutória. A mesma correspondência entre espécie/conteúdo de decisão é encontrada, entre outros dispositivos legais, no art. 530 do CPC (embargos infringentes), no art. 535 do CPC (embargos de declaração), no art. 539 do CPC (recurso ordinário constitucional), no art. 546 do CPC (embargos de divergência), no art. 102, III, da CF

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(recurso extraordinário), no art. 105, III, da CF (recurso especial), no art. 34 da LEF (embargos infringentes) e no art. 41 da Lei 9.099/1995 (recurso inominado).

Essa correspondência genérica prevista pelo sistema processual, entretanto, será sempre afastada quando houver a previsão de recurso cabível contra determina decisão em situação específica. A adequação necessária ao preenchimento do requisito do cabimento nesse caso será analisada pela previsão legal específica e não pela previsão legal genérica. Assim, ainda que seja discutível a natureza da decisão que julga a liquidação, é indiscutível o cabimento do agravo de instrumento (art. 475-H do CPC), o mesmo ocorrendo com a decisão que julga a impugnação e não põe fim ao cumprimento de sentença (art. 475-M, § 3.º, do CPC) e a decisão que decreta a falência (art. 100 da LF – Lei 11.101/2005). Mesmo quando for evidente o equívoco do legislador, como ocorre no art. 17 da Lei 1.060/1950, o recurso cabível será aquele previsto expressamente na lei para a situação específica12.

Como já analisado no Capítulo 21, item 21.6, o requisito do cabimento poderá ser afastado no caso concreto em razão da aplicação do princípio dafungibilidade, o que permitirá o julgamento do mérito recursal – desde que os outros requisitos também sejam preenchidos –, ainda que o órgão julgador entenda que o recurso interposto não é o cabível. A fungibilidade flexibiliza o requisito do cabimento.