Portugal aproxima-se dos países de baixa incidência de tuberculose

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INFORMAÇÃO e outras doenças infecciosas Número 86 Ano XIV Maio/Junho 2011 • Publicação bimestral www.jasfarma.com Preço 3.00 € HIV Meeting Point’11 3.º Fórum de Virologia Remark’11 Catarina Furtado, Embaixadora da Boa Vontade do Fundo das Nações Unidas para a População: «Enquanto os países enfrentarem graves carências alimentares, o VIH/SIDA será remetido para segundo plano»

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Reportagem publicada na revista Informação SIDA nº 86, de Maio/Junho de 2011.

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I N F O R M A Ç Ã O

e outras doenças infecciosas

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HIV Meeting Point’11

3.º Fórum de Virologia

Remark’11

Catarina Furtado, Embaixadora da Boa Vontade do Fundo das Nações Unidas para a População:

«Enquanto os países enfrentarem graves carências alimentares, o VIH/SIDA será remetido para segundo plano»

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Opinião

14 | Maio / Junho 2011 Informação Sida® e outras doenças infecciosas

Texto Maria João Garcia

Portugal está próximo dos 20 novos ca-

sos de TB/100 mil habitantes, que nos

incluiria nos países com baixa incidência

TB. A conclusão é do «Programa Nacional de

Luta Contra a Tuberculose – Ponto da Situação

Epidemiológica e de Desempenho», apresen-

tado no Dia Mundial da Tuberculose, que se

assinalou a 24 de Março. Estes e outros re-

sultados foram apresentados pela Associação

Contra a Tuberculose do Porto, Unidade Local de

Saúde de Matosinhos, Direcção-Geral da Saúde,

Associação Nacional de Tuberculose e Doenças

Respiratórias (ANDRT) e Fundação Portuguesa

do Pulmão, num encontro onde se falou de TB.

Os vários especialistas que participaram

no evento foram unânimes em afirmar ser

necessário continuar a apostar na actual

estratégia de luta contra a TB. A Dr.ª Raquel

Duarte, coordenadora da Comissão de TB da

Sociedade Portuguesa de Pneumologia, que

abordou a questão dos rastreios no encontro,

deixou um alerta: «A actual crise não deve

afectar o trabalho que está a ser desenvolvido

contra a TB no nosso País.»

O número total de casos de tuberculose a nível mundial continua a aumentar,

segundo o «Programa Nacional de Luta Contra a Tuberculose – Ponto da

Situação Epidemiológica e de Desempenho». Quanto a Portugal, os números

apontam para a existência de cerca de 20/100 mil novos casos de tuberculose

(TB), situação que nos aproxima dos países de baixa incidência.

Portugal aproxima-se dos países de baixa incidência de TB

Dia Mundial da Tuberculose

Destaque

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Opinião

estimando-se que em 2009 tenham ocorrido

9,4 milhões de casos, ou seja, 139 novos casos

por 100 mil, com uma mortalidade de 1,3 mi-

lhões de pessoas (20/100 mil). A maior parte

(cerca de 85%) dos registos da doença provêm

do Sudeste Asiático (35%), África (30%) e

Extremo Oriente (20%).

A situação é tão grave nestas regiões que

nalguns países chega-se a atingir os 1000

casos em 100 mil habitantes. Ainda de acordo

com o relatório apresentado, «estima-se que,

a nível global, 11 a 13% dos casos de TB estejam

infectados por VIH. A coinfecção TB/VIH tem a

sua expressão máxima na África Subsaariana,

onde se encontram mais de 80% de todos os

casos do mundo.»

Globalmente, apenas 26% dos casos de

TB têm acesso ao teste de diagnóstico para

detectar a infecção por VIH, apesar de «haver

uma melhor coordenação entre programas de

controlo, que tem contribuído para a imple-

mentação de rastreios de TB e de programas

de profilaxia com isoniazida em populações

seropositivas».

Um dos maiores problemas continua ser a

multirresistência. No programa da OMS «Stop

TB» é considerada uma «ameaça global e sem

controlo», face aos 440 mil novos casos que

surgiram em 2008, dos quais apenas 30 mil

estão diagnosticados. Para piorar a situação,

há muito poucos que são tratados de forma

adequada, «morrendo 150 mil pessoas por

ano».

No seu entender, é preciso apostar nos

rastreios, principalmente em grupos de risco

(incluindo os profissionais de saúde) e evitar

desvios na adesão à terapêutica, «o que pode

acontecer em contextos de pobreza».

Também presente no evento esteve a

Dr.ª Maria da Conceição Gomes, presidente

da ANDRT, que destacou a manutenção dos

centros de referência para a tuberculose

multirresistente (TBMR) e «da vacina BCG em

todos os recém-nascidos». Deve-se, ainda,

segundo esta responsável, apostar mais no

trabalho em parceria com entidades da so-

ciedade civil, como as ONG, as autarquias, os

estabelecimentos prisionais, em associações

de toxicodependentes, de sem-abrigo ou ou-

tras pessoas que vivam em grupo por qualquer

motivo ou ideologia religiosa».

Para além disso, defende o «investimento

em centros de multirresistência», a fim de

melhorar a saúde dos doentes e de evitar a

disseminação.

A TB no mundo Quanto ao relatório apresentado, há a real-

çar os progressos alcançados, mas também

os problemas a resolver. Apesar do caminho

já percorrido, o número total de casos de TB

a nível mundial está, de facto, a aumentar,

Maio / Junho 2011 | 15Informação Sida® e outras doenças infecciosas

Destaque

A Dr.ª Raquel Duarte, coordenadora da

Comissão de TB da Sociedade Portuguesa

de Pneumologia, que abordou a questão

dos rastreios no encontro, deixou um

alerta: «A actual crise não deve afectar

o trabalho que está a ser desenvolvido

contra a TB no nosso País.»

Dia Mundial da Tuberculose

Dr.ª Raquel Duarte

Page 4: Portugal aproxima-se dos países de baixa incidência de tuberculose

Relativamente à EU, regista-se uma inci-

dência de 15,8/100 mil em 2009 e os novos

casos diminuem ao ritmo médio de menos 3%

ao ano nos últimos cinco anos. No grupo dos

estados com maior incidência encontra-se

Portugal, a Roménia, a Lituânia, a Letónia, a

Bulgária, a Estónia e a Polónia.

Coinfecções na TB: continua ameaça do VIH

Dos 9,4% de casos de TB em 2009, 1

a 1,2 milhões estavam co-infectados pelo

VIH. O relatório revela que, em todos os

continentes, há países com uma prevalên-

cia de VIH entre os doentes com TB que é

superior a 5%, mas a maior concentração

(com prevalência superior a 50%) existe

em sete países da África Subsaariana e na

Moldávia. A situação agrava-se perante o

facto de, na maioria dos casos, não serem

prestados os cuidados de saúde necessários.

Quanto à EU, a prevalência da infecção por

VIH, associada à TB, está a decrescer, sendo

de 2,3% em 2009.

Relativamente à cobertura da profilaxia

com isoniazida aos infectados por VIH, o nível

é ainda «extremamente baixo (1%), se se tiver

em conta que a profilaxia com cotrimoxazol foi

oferecida a 75% das pessoas que vivem com

VIH». Quanto aos casos notificados entre imi-

grantes, no conjunto dos países da EU/EFTA,

têm vindo a diminuir de forma sustentada na

última década.

De acordo com o relatório, a ameaça

actual é a TBMR, estimando-se que, em cada

ano, surjam, no mundo inteiro, 440 mil novos

casos. A proporção do total de casos com

multirresistência na EU, em 2009, foi de 5,3%.

Uma realidade que se deve, sobretudo, aos

países de Leste.

Mais grave do que a MR é a TB extensiva-

mente resistente (TBXDR), que só é registada

em 15 países. Em 2009 foram notificados 66

casos de TBXDR e as maiores percentagens re-

gistadas de TBXDR encontram-se em Portugal,

na Estónia e na Letónia.

A realidade portuguesaEm Portugal, em 2010, foram diagnostica-

dos 2559 casos de TB, incluindo casos novos e

retratamentos, dos quais 2162 são nacionais e

397 estrangeiros. A incidência dos casos novos

foi de 2372, o que representa «uma redução de

11% relativamente à taxa de incidência defini-

tiva em 2009».

As assimetrias na distribuição geográfica

são menos pronunciadas do que há uns anos,

deixando de existir regiões de alta incidência, e

Destaque

16 | Maio / Junho 2011 Informação Sida® e outras doenças infecciosas

Em 2009 foram notificados 66 casos

de TBXDR e as maiores percentagens

registadas de TBXDR encontram-se em

Portugal, na Estónia e na Letónia.

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13 distritos passaram a ser de baixa incidência.

Em categoria intermédia encontra-se, assim,

Viana do Castelo, Vila Real, Bragança, Setúbal,

Faro, Lisboa e Porto. Uma situação que, se-

gundo a Dr.ª Ana Maria Correia, se deve «ao

trabalho em rede em termos de prevenção e

de tratamento, que permitiu, ainda, diminuir

as recidivas».

No relatório apresentado, destaca-se uma

tendência de aproximação face à Europa, pe-

rante o decréscimo médio anual de 6,4% de

casos de TB. Com 22 casos/100 mil, Portugal

aproxima-se, assim, da fasquia dos 20/100

mil, que lhe conferiria a categoria de país de

baixa incidência. Actualmente, situa-se na in-

termédia/baixa, contudo, das 20 unidades dis-

tritais de coordenação do PNT, do continente

e das regiões autónomas, 13 têm já menos de

20/1000 mil.

As pessoas mais afectadas são os homens

dos 35 aos 44 anos, sendo que os imigrantes

têm quase 3,5 vezes mais probabilidade de

contrair TB. Um total de 78 casos foi diag-

nosticado em crianças, menores de 15 anos,

e 17 têm menos de 5 anos. Quase todos são

residentes em Lisboa e Porto e apenas seis

nasceram no estrangeiro.

O número de casos em estrangeiros man-

tém-se estável desde 2004 e, quanto à TBMR,

Portugal apresenta uma incidência inferior à

mediana dos países da Europa Ocidental.

Destaque

Maio / Junho 2011 | 17Informação Sida® e outras doenças infecciosas

Em Portugal, em 2010, foram

diagnosticados 2559 casos de TB,

incluindo casos novos e retratamentos,

dos quais 2162 são nacionais e 397

estrangeiros. A incidência dos casos

novos foi de 2372, o que representa

«uma redução de 11% relativamente à

taxa de incidência definitiva

em 2009».

Dr.ª Ana Maria Correia

Page 6: Portugal aproxima-se dos países de baixa incidência de tuberculose

O principal factor de risco, a infecção por

VIH/SIDA, tem uma prevalência actual de 15%

entre os casos de TB, «o que significa um de-

créscimo do número de doentes para menos

de metade nos últimos dez anos». Em 2009,

o teste ao VIH cobriu 87% dos casos de TB,

confirmando-se a prevalência da infecção por

VIH em 15%, o que representa um decréscimo

de 45% na última década. A maior prevalência

de coinfecção é nos distritos de Faro, Setúbal,

Lisboa e Porto.

Independentemente da actual situação,

não se deve descurar a investigação, já que

há muitos anos que não há avanços, segundo

a Dr.ª Maria da Conceição Gomes. A Dr.ª

Raquel Correia salienta, ainda, o facto de a

má adesão à terapêutica contribuir para o

desenvolvimento de resistências a todos os

fármacos.

Destaque

18 | Maio / Junho 2011 Informação Sida® e outras doenças infecciosas

CDP Gaia, um caso de sucesso

O Norte tem sido a região mais afectada por casos de TB, mas,

nos últimos anos, o cenário melhorou. O Centro de Diagnóstico

Pneumológico (CDP) de Vila Nova de Gaia já é considerado

um caso de sucesso, face aos resultados positivos que tem

alcançado nos últimos dez anos.

«Passámos de uma taxa de notificação de 50/100 mil, em 2002,

para 29/100 mil, em 2009. O Norte tem valores superiores

à média do País, mas a evolução tem sido muito favorável»,

salienta a Dr.ª Ana Maria Correia, responsável pelo programa de

TB na ARS Norte. E acrescenta:

«Diminuímos o número de casos de TB em cerca de 5,7 ao ano

em todas as idades. A excepção é a dos idosos com mais de 74

anos. A descida fez-se sentir, também, entre os 25 e os 34 anos,

entre toxicodependentes e em infectados por VIH, o que revela

uma diminuição da circulação do mycobacterium tuberculosis

na comunidade.»

Verificaram-se, ainda, melhorias na confirmação do diagnóstico,

na cobertura dos testes de susceptibilidade aos antibióticos, nos

rastreios e na adesão à terapêutica. Melhorias que se devem,

no entender da responsável, à organização do CPD de Gaia e

à interligação que existe com o Centro Hospitalar VNG/E e os

cuidados de saúde primários, assim como ao empenho de toda

a equipa. A centralização dos tratamentos também é um factor

essencial para a responsável do CDP de Gaia.

Dr.ª Maria da Conceição Gomes

O principal factor

de risco, a infecção

por VIH/SIDA, tem uma

prevalência actual de

15% entre os casos de

TB, «o que significa um

decréscimo do número de

doentes para menos de

metade nos últimos dez

anos».