PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO Cristina Moron... · instituto de franquias....
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO FACULDADE DE DIREITO
KAREN CRISTINA MORON BETTI MENDES
CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA INSTITUCIONAL NOS CONTRATOS DE FRANQUIA
São Paulo 2014
KAREN CRISTINA MORON BETTI MENDES
CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA INSTITUCIONAL NOS CONTRATOS DE FRANQUIA
Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, para obtenção do Título de Mestre em Direito Civil, sob orientação do Professor Doutor Francisco José Cahali.
São Paulo 2014
KAREN CRISTINA MORON BETTI MENDES
CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA INSTITUCIONAL NOS CONTRATOS DE FRANQUIA
Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, para obtenção do Título de Mestre em Direito Civil, sob orientação do Professor Doutor Francisco José Cahali.
Aprovado em:____/____/____
BANCA EXAMINADORA
São Paulo 2014
Dedico este trabalho principalmente ao meu filho, Luiz
Theodoro, meu companheiro inseparável nesta
jornada;
Ao meu marido com amor, Dr. Luiz Theodoro
Mendes, pelo apoio incondicional em mais uma etapa
da vida;
Aos meus queridos pais, Antonio Jorge e Cristina
Luiza meus eternos professores, pelo apoio, pela
ajuda, pelo exemplo e pelas orações.
Aos meus amados irmãos, Antonio Jorge Junior e
Ana Claudia, companheiros de todas as horas, pela
amizade e infinito amor;
Aos meus amigos, em especial às minhas queridas
amigas Ana Paula e Lisiane, pela paciência, ajuda e
disponibilidade para as inúmeras discussões jurídicas
que muito contribuíram para este trabalho;
In memoriam, dedico este trabalho aos meus avós,
Francisco e Adelina; Jorge e Diva em especial ao
meu avô, Dr. Jorge Moysés Betti Filho, um grande
exemplo de sabedoria, cuja ética, conhecimentos
jurídicos e amor ao Direito me conduziram a seguir
esta profissão e que me inspira na carreira jurídica e
na vida pessoal.
AGRADECIMENTOS
A todos aqueles que acreditaram, que compreenderam e que pacientemente
aguardaram a finalização deste trabalho, contribuindo para que eu pudesse alcançar
este título tão desejado, meu carinho e gratidão.
Ao querido Mestre, Professor Doutor Francisco José Cahali, pelos
ensinamentos transmitidos, pela compreensão, sabedoria, simplicidade e dedicação
que lhe são inerentes, e pelo apoio e estímulo na execução deste trabalho.
RESUMO
O objetivo do presente estudo é apresentar a arbitragem institucional como uma
alternativa dinâmica e harmônica para a solução de controvérsias nas relações
negociais relativas aos contratos de franquias.
Justifica-se este trabalho com lastro em que, dada a dinâmica das relações no
mundo dos negócios, a internacionalização do comércio, a agilidade e a velocidade
com que se dão tais relações, notadamente no segmento de franquias, há pelo
menos três premissas identificáveis de plano que precisam ser preservadas em se
tratando de solucionar lides na franchising: a especialização do julgador na matéria,
a rapidez na solução do conflito e a manutenção da boa relação comercial depois de
solucionado o conflito, o que se obtém em linha de identidade, ao se aplicar a
arbitragem como método eficaz nesse intento.
Para tanto, serão aqui analisados ambos os institutos, tanto da arbitragem quanto da
franquia, primeiro em separado e, após, em seus pontos de confluência, bem como
trazendo à tona os aspectos polêmicos que poderão surgir nessa relação de
mutualismo, os quais são dissolvidos no decorrer do estudo, por meio de chaves de
segurança apresentadas para que se obtenham a eficácia e a validade da aplicação
do método não estatal, devidamente harmonizado à franquia, e, por fim, sugerindo
alteração legislativa à Lei de Franquia para garantia da utilização eficaz e válida da
arbitragem no segmento de franquias.
Palavras-Chave: Arbitragem. Cláusula Compromissória Institucional. Franquia.
ABSTRACT
The object of study of this work is to present the institutional arbitration as a dynamic and
harmonic alternative for the settlement of disputes in dealings relating to contracts of
franchises.
Justifying this work, with ballast in that, given the dynamics of the relationship in the business
world, the internationalization of trade, the agility and speed with which such relations are
given, especially in the segment of franchising, there are at least three identifiable
assumptions plan, that need to be preserved in the case of solving work in franchising: the
expertise of the judge in the matter; the rapid solution of the conflict and the maintenance of
good business relationship after the conflict solved, what you get in line of identity, to apply
the arbitration as an effective method in this intention.
By the way, will be analyzed in this work both institutes, first separately, and after, in their
points of confluence, as well as bringing to the fore the controversial aspects that may arise
in this relationship of mutualism, which in the course of the study are dissolved, through
security keys presented to get the effectiveness and validity of the application of the method
do not state, duly harmonized to the franchise, and, finally, suggesting legislative amendment
to the law of franchises to guarantee the effective use and valid arbitration in the segment of
franchises.
Keywords: ARBITRATION. INSTITUTIONAL ARBITRATION CLAUSE. FRANCHISE.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS ................................................................................ 12
2. FORMAS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS ........................................................... 18
2.1. Autotutela ........................................................................................................ 18
2.2. Autocomposição .............................................................................................. 20
2.3. Heterocomposição .......................................................................................... 20
2.4. Mediação ........................................................................................................ 21
2.5. Conciliação ..................................................................................................... 22
2.6. Arbitragem ...................................................................................................... 25
3. ASPECTOS GERAIS DA ARBITRAGEM NO BRASIL .......................................... 30
3.1. Brevíssimo histórico da arbitragem no cenário brasileiro ................................ 33
3.2. Características e natureza jurídica da arbitragem ........................................... 35
3.3. Princípios norteadores da arbitragem ............................................................. 40
3.4. Arbitrabilidade ................................................................................................. 44
3.5. Espécies de arbitragem – ad hoc e institucional ............................................. 47
4. CONVENÇÃO ARBITRAL ..................................................................................... 53
4.1. Compromisso arbitral ...................................................................................... 56
4.2. Cláusula compromissória ................................................................................ 56
4.3. Tipos de cláusula compromissória .................................................................. 59
4.4. A cláusula compromissória institucional .......................................................... 66
4.5. Cláusula compromissória e contrato de adesão ............................................. 67
5. ASPECTOS GERAIS SOBRE A FRANQUIA E OS CONTRATOS DE FRANQUIA
.................................................................................................................................. 73
5.1. Conceito de franquia ....................................................................................... 75
5.2. Contrato de franquia ....................................................................................... 77
5.3. A circular de oferta e as relações negociais entre franqueador e franqueado 84
5.4. O papel da Associação Brasileira de Franchising – ABF ................................ 88
6. CONTRATOS DE FRANQUIA E ARBITRAGEM .................................................. 92
6.1. Vantagens da arbitragem e da cláusula institucional nos contratos de franquia
............................................................................................................................... 93
6.2 A adesividade do contrato de franquia e a arbitragem ................................... 104
7. A “CHAVE DE SEGURANÇA” PARA INSERÇÃO DA CLÁUSULA
COMPROMISSÓRIA INSTITUCIONAL NOS CONTRATOS DE FRANQUIA:
ASPECTOS POLÊMICOS DA CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA INSTITUCIONAL
EM CONTRATOS DE FRANQUIA .......................................................................... 111
8. SUGESTÃO PARA ALTERAÇÃO LEGISLATIVA DA LEI DE FRANQUIA COMO
“CHAVE DE SEGURANÇA” PARA UTILIZAÇÃO DA ARBITRAGEM
INSTITUCIONAL ..................................................................................................... 131
CONCLUSÃO .......................................................................................................... 136
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 138
ANEXO I – LEI DE ARBITRAGEM BRASILEIRA .................................................... 146
ANEXO II – LEI DE FRANQUIA BRASILEIRA ........................................................ 157
ANEXO III – LEI DA ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA PORTUGUESA ...................... 161
10
INTRODUÇÃO
O perfil das relações contratuais insertas nos contratos de franquia, ao
mesmo tempo em que seja dinâmica e interativa com o universo comercial (inclusive
internacional), poderá apresentar, obviamente, em sua trajetória negocial,
controvérsias inter-relacionais entre as partes envolvidas.
Diante disso, surge a necessidade de que se utilize um método de solução de
conflitos que se harmonize ao perfil dos contratos de franquia, de modo que se
obtenha a necessária agilidade na resolução conflitual, o que permitiria que os
negócios evoluíssem em medida idêntica com que acontecem, e, ainda, com a
possibilidade de as partes interagirem quanto ao procedimento a ser adotado.
Fatores como a especialidade do árbitro, a agilidade na solução, possibilidade
de escolha do julgador, dão à arbitragem credenciais suficientes para que seja o
método eleito no segmento de franquias, já que a jurisdição estatal não agasalha
tais expectativas.
Nesse pensar, em princípio a harmonização dos institutos da franquia e da
arbitragem pode parecer mansa, mas, com o aprofundar do entendimento e
compreensão de ambos, individualmente, aparecem questões que necessitam ser
dirimidas para que se possa utilizar a arbitragem como método de solução de
conflitos para questões que tenham por objeto as relações entre franqueados e
franqueadores.
Assim, nos primeiros capítulos, procuramos expor, de uma forma geral, os
métodos de solução de conflitos existentes, em desuso ou utilizados ao longo dos
tempos nas relações interpessoais, e, a partir daí, com base na premissa de
evolução desses métodos dentro das expectativas sociais e negociais,
desenvolvemos a análise da arbitragem como método eficaz para tanto.
Nesse cenário, aprofundamos o tema, oferecendo subsídios para
entendimento da convenção de arbitragem e direcionamos o estudo especificamente
para a cláusula arbitral institucional, seus requisitos, características e aplicação,
como via de eleição da arbitragem que melhor se insere no contexto da finalidade da
pesquisa.
A seguir, abordamos os aspectos gerais do contrato de franquia e o instituto
em sí, como forma de explanar, em seguida, o tema efetivamente proposto neste
trabalho.
11
Diante dessa plataforma, quando então enfrentamos a questão da inserção
da cláusula compromissória institucional nos contratos de franquia, congregamos
ambos os institutos, no capítulo 7, com o intuito de, uma vez formada a convicção
acerca da melhor adequação da arbitragem nessa seara, passarmos a dissecar as
polêmicas que envolvem a temática em pesquisa, para, a seguir, encontrarmos
dissolvidas as questões controvertidas que ensejam a aplicação conjunta desses
segmentos, apresentarmos chaves de segurança para inserção da cláusula arbitral
institucional em contratos de franquia, de modo que se permita sem embargos a
plena eficácia e validade do método de solução de conflitos apresentado neste
estudo, para obtenção da presteza e agilidade esperadas na solução de lides ao
instituto de franquias.
Registro que não foi objeto deste trabalho aprofundarmos análise relativa a
todos os aspectos da arbitragem, limitando o estudo à aplicação da cláusula de
arbitragem institucional nos contratos de franquias, demonstrando como melhor
indicativo em atenção à finalidade proposta.
12
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O significativo aumento no faturamento do setor, nos últimos dez anos,
favoreceu o aquecimento da economia no Brasil, segundo matéria publicada na
Revista Exame em 2012, intitulada “Setor de franquias supera expectativas e fatura
R$ 88 Bi”1.
A globalização econômica provocou, sem dúvidas, mudanças na economia
mundial e, consequentemente, no Brasil, exigindo, assim, uma postura criativa do
empresariado ante o aumento da competividade nos negócios.
E no mercado competitivo, cuja dinâmica da comunicação moderna se
estabelece com considerável rapidez em um ambiente propício à troca de
informações e ao conhecimento, inaugura-se um cenário de desenvolvimento de
novas técnicas e estratégias, que constituirão o diferencial, necessário ao êxito2.
Dentro desse cenário de negociações, obviamente, surge um maior número
de questões controvertidas, que devem ser resolvidas em tempo hábil e, ainda, com
a possibilidade de, após solucionado o impasse, as partes manterem uma relação
saudável e menos litigante.
Nesse contexto, o tráfego contratual do mundo globalizado e pós-moderno e
suas consequentes transformações sociais repercutem no sistema jurídico, pois não
acompanha a velocidade das inovações, havendo, portanto, a necessidade de
adaptações constantes.
Inegável, portanto, que, nos dias atuais, os conflitos entre partes são
crescentes, afinal a globalização trouxe consigo a multiplicidade de relações
interpessoais e econômicas, a diminuição das distâncias, o avanço tecnológico,
atribuiu valores comerciais a produtos dentro dessa nova cultura, ou seja, ao mesmo
passo que propiciou o crescimento das relações comerciais, aumentaram-se os
conflitos derivados dessas interações.
1 Disponível em: <exame.abril.com.br/pme/noticias/setor-de-franquias-supera-expectativas-e-fatura-r-
88-bi>. Acesso em: 2 fev. 2014. 2 A questão da rapidez das transformações tecnológicas do mundo globalizado foi tratada pelo
sociólogo italiano Domenico De Masi, quando faz um resumo das características e dos valores novos que fundamentam a pós-modernidade: “Antes de mais nada a globalização. É sabido que, quando se atira uma pedra em um lago, se obtém uma série de ondas concêntricas que se propagam, de forma contínua, por toda a superfície aquática. Do mesmo modo, graças ao progresso tecnológico, o nosso planeta tornou-se hoje como um pequeno lago, onde cada onda atinge e envolve rapidamente até os cantos mais remotos” (DE MASI, Domenico. O ócio criativo: entrevista a Maria Serena Parlieri. Tradução de Léa Manzi. Rio de Janeiro: Sextante, 2000, p. 140).
13
No processo de transformação e de novas tecnologias se sucedendo, a
conexão nas relações interpessoais é otimizada no tempo, possibilitando a
transferência desses inventos e conhecimentos adquiridos, de forma célere e eficaz.
Por via de consequência, com o aquecimento dos negócios, a celeridade para
a solução dos conflitos deve seguir velocidade compatível. Assim, a utilização da
arbitragem para solução de conflitos destaca-se nesse cenário atual, por ser mais
compatível com o perfil da sociedade moderna, atendendo com efetividade a
composição de questões controvertidas entre partes de uma forma mais adequada
às suas necessidades temporais.
É que enfrentamos uma crise da jurisdição estatal, tanto proporcionada pelo
volume de questões controvertidas que se instalam nas relações, quanto pelos
próprios sistemas procedimentais e legais dos ordenamentos jurídicos, sendo no
Brasil, incontestavelmente, entoada pela possibilidade de rediscussão de matérias e
as estratégias permitidas pelo ordenamento processual pátrio, que implicam o
desaceleramento do processo judicial3.
E é nesse contexto que o instituto da arbitragem se insere, possibilitando à
sociedade escolher entre o ingresso no Judiciário ou na esfera privada, para solução
de conflitos relativos à direitos patrimoniais disponíveis.
Reformulada no Brasil, com o advento da Lei n. 9.307/96, e seguindo os
padrões do modelo da UNCITRAL, a arbitragem vem favorecer o processo de
desjudicialização, ao lado de outros mecanismos de solução, como a mediação,
negociação e conciliação.
3 Parêntese para mencionar que, se por um lado, a Lei de Arbitragem autoriza a anulação de
sentença arbitral, maculada por eventual vício arrolado em seu art. 32, através de ação de nulidade, no prazo decadencial de 90 dias após a notificação da sentença arbitral, ou de embargos do devedor, consoante o § 3º do citado dispositivo, a qual necessariamente deverá ser proposta perante o Judiciário, o que se deve ter presente é que mesmo assim o procedimento arbitral, ao contrário dos procedimentos judiciais, não prevê a vasta gama recursal prevista no ordenamento processual vigente, tornando-se um procedimento mais dinâmico. Ainda, prevista como um dos meios de impugnação da sentença arbitral, a ação de nulidade da sentença arbitral, prevista no art. 33 da Lei de Arbitragem como um sucedâneo recursal, ocasião em que o juiz determinará ao árbitro profira nova sentença, uma vez que são situações passíveis de nulidade. Trata-se de um meio específico para impugnação da sentença arbitral, que visa à decretação judicial da sua nulidade, ou a devolução da questão controvertida ao árbitro para que profira outra sentença, sanando a nulidade então decretada judicialmente. Dessa análise, pode-se tecer que a própria evolução legislativa no Brasil tem propiciado a cultura da arbitragem, já que os princípios da celeridade e economia processual ficam nítidos na medida em que, limitados que são, os recursos e impugnações no âmbito da arbitragem, uma vez que eventual procedência de ação anulatória determinará a modificação parcial ou total da sentença arbitral, obrigando o juiz togado a devolver o processo ao árbitro ou órgão arbitral, uma vez reconhecido o vício material.
14
Nesse sentido, retrata Silva Santos4:
No Brasil, em virtude da ineficácia das instâncias jurisdicionais oficiais do Estado, se procurou envidar o esforço necessário para implementar um sistema constituído pelos Juizados informais de conciliação e arbitragem. Tal medida apresentou como características essenciais, a flexibilidade, a plasticidade, a informalização, e a agilidade dos seus procedimentos práticos, propiciando condições melhores de garantir a operacionalização de formas extrajudiciais de resolução de conflitos e de acesso à Justiça pelos setores menos privilegiados, enfim, das grandes parcelas da população. Nesse sentido, pode-se dizer que existem outros níveis de instâncias legislativas e jurisdicionais que, embora não estatais, podem ser consideradas autênticas e justas.
A importância de que se inaugure uma cultura que seja compatível com essa
mesma velocidade, quando se trata de solução de conflitos, visto que a jurisdição
estatal não acompanhou essas mudanças e seus reflexos, ao menos na rubrica da
celeridade, é fator verificado já nas culturas mundiais, ante a fomentação do instituto
da arbitragem para solução de conflitos.
Todavia, se, em parte, o fortalecimento da utilização da arbitragem se atribui à
crise jurisdicional estatal, não se pode sublimar que se trata apenas de um dos
fatores que influenciaram a utilização dessa cultura.
Na verdade, a arbitragem não tem por exclusivo escopo desassoberbar o
Poder Judiciário, embora a sobrecarga deste, obviamente, seja ao longo do tempo
minimizada, uma vez que se instale a cultura da sua utilização para a solução de
conflitos.
E nessa premissa, a bem da verdade, é comum que se estabeleça um
paradoxo relativamente ao custo da arbitragem e o custo de um processo judicial,
este bem menor, o que à primeira vista levaria a concluir que a arbitragem, por conta
disso, não conseguiria desafogar o Judiciário, pois estaria voltada apenas para
pessoas ou empresas de determinado padrão financeiro que pudessem arcar com
tais custos.
No entanto, a par do tema, que mais adiante será abordado em capítulo
próprio, desde já se pode delinear que a análise traçada no mencionado paradoxo
considera apenas o fator de valor, em exclusividade, e desconsidera o fator temporal
4 SILVA SANTOS, Valdoir da. O multiculturalismo, o pluralismo jurídico e os novos sujeitos coletivos
no Brasil. Dissertação de Mestrado (Direito). UFSC, Florianópolis, 2006. Disponível em: <https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/88574/230469.pdf?sequence=1>. Acesso em: 10 dez. 2013.
15
à solução do conflito, o que no mais das vezes pode representar vantagem
pecuniária.
Em primeiro lugar, registre-se que a utilização da arbitragem, em maior ou
menor escala, contribui ao desassoberbamento do Judiciário, sem que isso implique
a ela a responsabilidade exclusiva para solução da crise estatal, embora, uma vez
difundida e implementada sua utilização, consequentemente, com o passar dos
anos, em maior escala, estará sim auxiliando na solução desse problema.
Diante disso, constata-se, com segurança, que o binômio custo/beneficio
recomenda a utilização da arbitragem.
Obviamente, há casos em que, embora recomendada a utilização da
arbitragem, a parte interessada esteja desprovida de recursos para tanto, e como
forma de tornar ainda mais eficaz a utilização dessa cultura à solução de conflitos,
mister que se busque uma solução contratual ou mesmo legal, para que se efetive
essa utilização.
Nesse particular, importa tecer que a utilização do instituto tem lastro em
possibilitar um mecanismo opcional eficaz para a solução de questões
controvertidas tanto de natureza nacional quanto internacional, inaugurando um
cenário de formalização de quebra do monopólio jurisdicional pelo Estado.
O sistema processual brasileiro, pautado no princípio do devido processo
legal, do contraditório e da ampla defesa, molas mestras da proteção jurídica na
tutela dos interesses das pessoas, dada a previsão contida no art. 5º, XXXV, da
Constituição Federal, assegura a todos, como forma do exercício dessa tutela, a
garantia fundamental de acesso ao Judiciário.
Não obstante, permite ao titular do direito renunciar ao exercício dessa tutela
jurisdicional para que se dê por intermédio da arbitragem.
Segundo Joel Dias Figueira Junior5:
Essa nova forma de prestar a jurisdição – desta feita privada – significa antes de tudo um avanço legislativo que vem refletir uma nova mentalidade que, por sua vez, procura se adequar às tendências do processo civil contemporâneo na busca de formas alternativas de solução dos conflitos de interesses.
Sobretudo, de se observar que mais do que um avanço legislativo, a
arbitragem vem inaugurar a necessidade de uma nova visão do processo em seu 5 FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias. Arbitragem, jurisdição e execução. 2. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999, p. 109.
16
todo. De assim dizer, e muito além do acesso à tutela estatal, o momento exige que
se visualize a justiça como resultado de solução de conflitos e não apenas como
instrumento de acesso.
O mesmo autor, Joel Dias Figueira Junior6, canaliza a ideia:
O direito processual civil precisa retomar a sua dimensão social, adequando-se historicamente às realidades e necessidades dos novos tempos, a começar pelo rompimento do mito do monopólio estatal da jurisdição, e, como diz Carmona, exorcizando o terror da imposição da cláusula arbitral em todo e qualquer contrato, sem que isso importe em enfraquecimento do Judiciário ou na inafastabilidade do controle jurisdicional.
Nesse mesmo pensar, Sálvio de Figueiredo Teixeira, citando Miguel Reale,
defende que7:
A realidade social pujante em que vivemos não se contenta mais com o modelo individualista das soluções judiciais antanho. Desde o final do século passado, vem-se construindo um novo perfil, alicerçado na prevalência do interesse social sobre o individual. Daí exigir-se um Judiciário mais participativo e ativista, na busca de uma sociedade mais justa, humana e solidária, contando com isso com instrumentos processuais mais eficientes [...] Mecanismos hábeis, eficazes que suplementem a atividade estatal, priorizando o social. Se assim é, não há porque excluir desses mecanismos a arbitragem, em atenção aos interesses de importantes segmentos sociais, aos quais a Justiça oficial não tem dado abrigo satisfatório.
E, se o que motiva eventuais contratantes optarem pelo juízo arbitral
(arbitragem) em detrimento da jurisdição estatal para dirimir questões controversas
que inauguram entre si seriam: a celeridade, a economia, a especialidade dos
árbitros e o sigilo, fica assim, portanto, impressa a ideia de que a arbitragem não tem
por escopo eliminar, combater ou desestabilizar a jurisdição estatal. Pelo contrário,
tem o condão de caminhar lado a lado com ela, possibilitando à jurisdição estatal
conter sua sobrecarga, permitir o acesso à tutela de direitos de forma mais
adequada à dinâmica exigida no mundo globalizado e proporcionar um instrumento
de jurisdição vantajoso aos interesses dos tutelados.
No caso dos contratos de franquia, a aplicação da arbitragem ainda mais se
justifica quando, por meio da eleição da cláusula compromissória, soma-se a eleição
6 FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias. Op. cit., p. 110.
7 TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.
Disponível em: <http://200.198.41.151:8081/tribunal_contas/1997/02/02/2002_11 _11_0001.2xt/-versao_impressao?ed=02&folder=2 –artigo da , - www.tce.mg.gov.br/revista>. Acesso em: 21 nov. 2013.
17
de um expert no assunto para a solução de conflitos que eventualmente possam
surgir da relação contratual ao fato de que, na arbitragem, o ambiente amistoso
permite que a solução do conflito possa ocorrer sem o rompimento da relação de
parceria e cooperação entre o franqueador e o franqueado como forma de manter o
relacionamento entre as partes, preservando-se a contratação.
E, pela complexidade dos contratos que envolvem o sistema de franquias, a
arbitragem tem sido amplamente utilizada à medida que, por ser da sua essência a
celeridade da solução conflitual, aliada ao conhecimento técnico dos julgadores,
acrescentada de princípios da privacidade e sigilo que envolvam as questões
arbitrais, oferece maior segurança aos envolvidos8.
Ocorre que, pelas características específicas dispostas no contrato de
franquia, apesar de já amplamente utilizada essa forma de solução de conflitos,
ainda é matéria que gera discussão e que será tratada a seguir.
8 Como explica Giovanni Ettore Nanni: “[...] uma parcela cada vez maior e importante dos contratos empresariais de hoje apresenta, no mínimo, duas características: a complexidade e a atipicidade” (NANNI, Giovanni Ettore. Interpretação de contratos e arbitragem. Valor Econômico. Disponível em: <http://gearbpucminas.blogspot.com.br/2011_01_01_archive.html>. Acesso em: 29 maio 2014.
18
2. FORMAS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS
O homem precisa viver em sociedade pois depende dela para sobreviver,
quer por uma dependência física, ante sua fragilidade biológica, quer por questões
culturais.
A ocorrência de conflitos na sociedade entre indivíduos, grupos e Estado é
inevitável e na sociedade tais conflitos têm sido mais frequentes e complexos9.
Assim, a interação entre os seres humanos, quer por cooperação, quer por
competição, quer por conflito, sugere que temos uma necessidade em agruparmo-
nos para suprir necessidades, e aqui, parafraseando Carnelutti10, assim não fosse,
significaria que poderíamos viver isoladamente dos demais, atendendo
individualmente essas necessidades. Mas não é o que ocorre, pois o homem é, em
sua excelência, um ser social.
E desde que o homem deparou-se com situações que lhe exigiam a escolha
entre cenários que poderiam ser considerados incompatíveis e lhe exigiam a tomada
de decisões pessoais ou de grupo, desenvolveram-se técnicas para solucionar tais
conflitos.
Portanto, conflitos sempre existiram e sempre existirão, mas a forma de
solução passou por alterações ao longo da história11.
2.1. Autotutela
Inicialmente, o homem, na defesa dos bens necessários à sua sobrevivência,
utilizava-se do exercício da autotutela, onde impera a prevalência do mais forte
sobre o mais frágil.
A tal respeito, Sergio Pinto Martins retrata que a autotutela seria a forma de
solução de conflitos mais antiga, representada pela técnica em que cada um
“defende seus próprios interesses, por seus próprios meios”12.
9 SILVA, Paulo Eduardo Alves da; SALLES, Carlos Alberto de; LORENCINI, Marco Antônio Garcia
Lopes (Coord.). Negociação, mediação e arbitragem: curso básico para programas de graduação em direito. Rio Janeiro: Forense/São Paulo: Método, 2012. 10
CARNELUTTI, Francesco. Sistema de direito processual civil: introdução e função do processo civil. Tradução de Hiltomar Martins de Oliveira. São Paulo: Classic Book, 2000, p. 57. 11
CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 28.
19
Em que pese em primeira vista e, muito provavelmente, nos primórdios da
humanidade, revelar-se a autotutela uma forma a se considerar de pouca diplomacia
ou até mesmo de certa brutalidade, já que se dava pela imposição da vontade do
mais forte, como observa Francisco José Cahali13, em outra feição, encontramos no
evoluir da sociedade civilizada tal forma de solução de conflitos legitimada, como,
por exemplo, na legítima defesa e em lide que envolva a posse, ambas autorizadas
pela lei a fim de evitar, obviamente, a inviabilidade do exercício de um direito caso
sua solução seja postergada e, assim, tardio e ineficaz seu exercício.
Contudo, excepcionalmente e porquanto o Estado nem sempre possui o
imediatismo necessário para resguardar os interesses do tutelado, no exato
momento da ameaça desse direito, a autotutela é excepcionalmente admitida em
nossa legislação pátria, mas apenas para defender direitos que estejam sendo
violados e enumerados na lei – Constituição da República, Código Civil, Código
Penal, Código Penal Militar e jurisprudência do Supremo Tribunal Federal –, caso
contrário, constitui crime e está sujeita a sanção legal14.
Cabe mencionar, aqui, que o exercício da autotutela, em casos não
permitidos em lei, constitui crime previsto no art. 345 do Código Penal, pois se
entende que configurará o exercicio arbitrário das próprias razões15.
De dizer, ainda no que respeita ao crime do exercício arbitrário das próprias
razões, para efeitos de se reconhecer a autotutela legítima, exige-se que o fato
obedeça aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, o que vale dizer, não
pode ser cometido com excessos.
Do que se vê, somente quando a lei permite poderá ser utilizada a autotutela;
ao contrário, estará inserta em tipo penal ou nos parâmetros legais do ilícito.
12
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho. São Paulo: Atlas, 2008, p. 38. 13
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 37. 14
Como formas de exceção, donde se tem a possibilidade de legitimar o exercício da autotutela, podem-se citar alguns exemplos: a) o art. 9º da Constituição Federal; b) o art. 188 do Código Civil; c) o art. 1.210 do Código Civil; d) o art. 1.467 do Código Civil; e) os arts. 1.469 e 1.470 do Código Civil. No Código Penal, incluído o Militar, há exclusão da ilicitude ou exclusão de crime, observadas nos seguintes diplomas: arts. 23 do CP e 42 do CPM; o estado de necessidade (art. 23, I, c/c o art. 24 do CP e art. 42, I, do CPM); a legítima defesa (art. 23, II, c/c o art. 25 do CP, e art. 42, II, do CPM); o estrito cumprimento do dever legal (arts. 23, III, 1ª parte, do CP e 42, III, do CPM) e o exercício regular do direito (arts. 23, III, in fine, do CP e 42, IV, do CPM). 15
Art. 345. Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência. Parágrafo único. Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.
20
2.2. Autocomposição
Outra forma de solução de conflitos é a autocomposição, ou seja, aquela que
ocorre por comum acordo entre as partes, quer pela renúncia integral ou parcial de
uma ou ambas envolvidas no conflito, para que se resolva o litígio16.
Pode-se ousar em dizer que a autocomposição, na verdade, ao refletir
solução em que os próprios conflitantes resolvem a controvérsia de modo negocial,
é considerada o legítimo meio alternativo de pacificação social para se resolver uma
questão controvertida.
Vislumbra-se a autocomposição em duas situações: por transação (quando
houver concessões recíprocas entre as partes) ou por submissão (quando uma parte
renuncia a coisa ou o bem).
Em linhas gerais, em nossa legislação, a autocomposição é admitida sempre
que não se trate de direitos ligados aos direitos de personalidade (honra, liberdade,
intimidade, vida), nos termos do que dispõe o artigo 1.035 do Código Civil17.
Todavia, há casos em que as partes não chegam à solução negociada do
conflito entre si e convocam um terceiro para auxiliá-las nesse intento.
Segundo Fernanda Levy18, nesses casos, que se denominam
autocomposição indireta, um terceiro estruturará um processo de construção de
acordo baseado em seus parâmetros e filosofia.
2.3. Heterocomposição
A heterocomposição é uma forma de solução de conflitos por meio da
intervenção de um terceiro na relação conflituosa, ou seja, as partes submetem a
terceiro seu conflito, em busca de solução a ser por ele firmada ou, pelo menos, por
ele instigada ou favorecida19.
Como modalidades de forma heterocompositiva de solução de conflitos temos
a jurisdição estatal, a arbitragem, a mediação e a conciliação.
16
MARTINS, Sérgio Pinto. Op. cit., p. 39. 17
TARGA, Maria Inês Corrêa de Cerqueira César. Mediação em juízo. São Paulo: LTr, 2004, p. 66. 18
LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Cláusulas escalonadas: a mediação comercial no contexto da arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 54-55. 19
DELGADO, Mauricio Godinho. Arbitragem, mediação e comissão de conciliação prévia no direito do trabalho brasileiro. LTr, São Paulo, v. 66, n. 6, p. 663, jun. 2002.
21
2.4. Mediação
A mediação, heterocompositiva que é, contará com o auxílio de um terceiro
não envolvido no conflito, na verdade, o mediador, que, neutro e imparcial, apenas
auxilia as partes na solução do conflito, decodificando as linguagens, sem sugerir ou
impor a solução do impasse.
Assim, a mediação é uma forma extrajudicial de solução de controvérsias em
que um terceiro, mediador20, tem a função de aproximar as partes para que elas
ajustem diretamente a solução desejada.
Elucida Francisco José Cahali21 que o mediador seria o terceiro que “faz a
terapia do vínculo conflitivo”, entendimento que permite referir como sendo a
mediação um instituto de solução de conflitos, em que um terceiro decodificador da
linguagem entre as partes proporciona uma técnica para que se dê a convergência
de interesses entre as partes em conflito, sem, contudo, sugerir uma solução,
limitando-se a provocar um amadurecimento dos mediados, no panorama do conflito
havido entre elas, contribuindo, dessa forma, para dirimir o impasse.
Sobre o tema, a abordagem de Maria Inês Targa22 merece ser colacionada:
[...] mediador é aquele que facilita o processo de entendimento, controlando a conversa e auxiliando as partes a vislumbrar pontos de intersecção em seus interesses, que podem ser importantes para a elaboração de um acordo e, principalmente, para a efetivação de um futuro relacionamento, mais agradável [...] é aquele que emprega a técnica para fazer com que as partes, cuja comunicação está desgastada pela existência do conflito, consigam superar, ao menos inicialmente, essa barreira [...]
Portanto, na mediação, a autonomia das decisões das partes, como retratam
Taylor e Folberg23, caracteriza esse procedimento, juntamente com a privacidade,
economia de tempo e financeira, informalidade, oralidade e reequilíbrio relacional
entre pares.
A aplicação da mediação ao caso concreto é técnica que pode ser utilizada
tanto no âmbito profissional como no não profissional; extrajudicial ou mesmo
judicial.
20
Ou mediadores, podendo ser mais de um. 21
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 341. 22
TARGA, Maria Inês Corrêa de Cerqueira César. Op. cit., p. 131. 23
FOLBERG, Jay; TAYLOR, Alison. Mediación: resolución de conflitos sin litigio. Tradução de Beatriz E. Bianca Mendoza. Revisão de Chávez Asencio. México: Limusa Noriega, 1996, p. 27-28.
22
Conforme Maria Nazareth Serpa24, na Argentina a aplicação da mediação
prévia, em certas lides, é obrigatória antes do julgamento da ação judicial, e
segundo Barona Vilar25, por sua vez, tem demonstrado eficácia na solução de
conflitos, considerando-se que em 1998, no Fórum Cível de Buenos Aires, das
139.984 ações, 33.663 foram submetidas à mediação, tendo resultado apenas 5.785
casos infrutíferos e, assim, encaminhados à sentença.
Célia Gonzalez26, igualmente, refere que no Canadá as disputas trabalhistas,
bem como de família, devem ser previamente submetidas à mediação, instituto em
corrente ascensão naquele país.
Não demais lembrar que, no âmbito extrajudicial, observa-se e assim pode-se
distinguir a aplicação da mediação não profissional e da mediação profissional.
A mediação não profissional é aquela que se dá quer no seio familiar, quer no
comunitário, quer no social (entre pais e filhos, religiosos), pressupondo
essencialmente que as partes confiem a alguém tal encargo e deste obtenham
auxílio para construírem uma solução consensual à questão controvertida.
Quanto à mediação profissional, ainda Maria Inês Targa27 faz referência
àquela aplicada em consultórios de psicologia, advocacia, câmaras arbitrais, que,
mediante a paga ou não por tais serviços, desenvolve-se através da eleição de um
terceiro neutro no conflito, o qual, em reuniões com as partes em lide, facilita a
conversação e até solver o conflito, não tendo, no entanto, poder de dizer a solução
do impasse, limitando-se a orientar as partes.
2.5. Conciliação
Pode ser que as partes, ainda, necessitem de um terceiro que haja de forma
mais incisiva a que se instale o consenso. Assim, como forma eficaz de solução de
conflitos, a utilização da conciliação pode ser mais recomendada para a solução de
um caso concreto, em que as partes em conflito necessitem que o terceiro, aqui
24
SERPA, Maria de Nazareth. Mediação de família. Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p. 74. 25
BARONA VILAR, Silvia. Solución extrajurisdiccional de conflitos: alternative dispute resolutions y derecho procesal. Valencia: Tirant lo blanch, 1999, p. 151-152. 26
GONZÁLEZ-CAPITEL MARTINEZ, Célia. Manual de mediación. Barcelona: Associacón Catalana de Foemnt a la Mediación Multiportes, 1999. 27
TARGA, Maria Inês Corrêa de Cerqueira César. Op. cit., p. 133.
23
chamado “conciliador”, tenha uma atuação mais pontual na solução da questão
controvertida.
Para Célia Regina Zaparolli28:
A conciliação, genericamente, é uma forma de resolução pacífica de disputas e de lides administrada por um terceiro investido de autoridade decisória na questão posta ou delegado por quem a tenha, judicial ou extrajudicialmente, a quem compete aproximar as partes, gerenciando e controlando as negociações, aparando arestas, sugerindo ou formulando propostas, no sentido de apontar vantagens e desvantagens, sempre visando um acordo. Caso as partes não cheguem a esse acordo, na hipótese de frustração da conciliação, a autoridade proferirá sua decisão.
Pode-se dizer, então, que a conciliação é uma técnica de solução de conflitos,
na qual o papel do conciliador é mais contundente que o do mediador, mas sem a
força de “dizer o direito” que se obtém na utilização da arbitragem e jurisdição
estatal, atuando o conciliador de forma persuasiva e efetiva, tendo como foco a
solução do conflito, independentemente da questão meritória nele presente.
Nesse rumo, o conciliador não só aproxima as partes como ainda realiza
atividades de controle das negociações, formula propostas e aponta as vantagens
ou desvantagens, buscando sempre facilitar o alcance de uma solução satisfatória
para as partes, utilizando técnicas imparciais e equilibradas.
Nesse sentido, Francisco José Cahali29 destaca proveitoso na figura do
conciliador que seja um terceiro no conflito e com talentos de modo a criar um
ambiente propício às confluências, utilizando a criatividade na condução de seu
trabalho, para uma plena eficácia da solução por tal via.
E, na conciliação, o bem imediato alcançado importa na transação, ou, como
se queira denominar, no acordo entre as partes.
De observar nesse contexto, inclusive, que o conciliador, em verdade, não
buscará adentrar em discussão meritória da questão posta e, sim, atentar em
auxiliar as partes a resolver suas questões controvertidas, sob forma de acordo.
Destarte, em que pese então podermos atribuir à mediação e à conciliação,
em primeira vista, característica de solução heterocompositiva, sob o ponto de vista
28
ZAPAROLLI, Célia Regina. In: SILVA, Paulo Eduardo Alves da; SALLES, Carlos Alberto de; LORENCINI, Marco Antônio Garcia Lopes (Coord.). Negociação, mediação e arbitragem: curso básico para programas de graduação em direito. Rio de Janeiro: Forense/São Paulo: Método, 2012. 29
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 340.
24
de que há a atuação ainda que discreta de um terceiro à solução do conflito, por
outro lado, não se pode sublimar que deixe de ser autocompositiva, vistas da
atuação limitativa que se atribui ao terceiro, em verdade, colaborador das partes em
lide.
Francisco José Cahali, nesse particular, refere30 que:
O foco na mediação é o conflito e não a solução. Na conciliação percebe-se o contrário: o foco é a solução, e não o conflito. E com tratamento às partes, pretende-se na mediação o restabelecimento de uma convivência, em equilíbrio de posições, independentemente de se chegar a uma composição, embora esta seja naturalmente desejada.
Em que pese ainda haja alguma confusão conceitual sobre mediação e
conciliação, como assevera Fernanda Levy31, sendo por vezes, inclusive, a
mediação considerada gênero da espécie conciliação, ou então entendidas como
expressões sinônimas, como por exemplo, na Itália, em que a utilização do termo
“conciliazione”, para designar tanto um quanto outro instituto, precisou ser objeto de
legislação conceitual para distingui-los, em verdade, ambos são meios consensuais,
e o que os diferencia é o modo de atuação do mediador e do conciliador e a relação
existente entre os conflitantes.
O conciliador, por seu turno, embora não tenha autoridade para imposição de
decisão às partes, o desempenho de suas atribuições consiste em conduzi-las a
realizarem um acordo, resolvendo-se a questão controvertida.
Tanto as conciliações institucionais quanto as conciliações judiciais têm a
mesma característica, que é a voluntariedade, ou seja, não têm por escopo gerar
qualquer tipo de imposição, podendo o conciliador fazer sugestões ou mesmo propor
soluções para o conflito, mas prevalecerá sempre a liberdade das partes para
aceitar ou não as propostas, pois somente a elas caberá a solução do referido
conflito conciliável.
No sistema jurídico processual brasileiro, o conciliador judicial poderá ser o
juiz em causa ou mesmo um auxiliar, conforme preceitos do CPC, art. 277, parágrafo
único.
Ainda, a forma conciliada está disposta em nosso Código de Processo Civil,
nos arts. 125, IV, 331 e 447, constituindo dever do juiz “tentar, a qualquer tempo,
30
Id., ibid., p. 41. 31
LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Op. cit., p. 56-57.
25
conciliar as partes”, sendo, inclusive, fundamento do juizado especial (Lei n.
9.099/95), já que todas as causas nele postas iniciam pela conciliação.
Conforme Célia Regina Zapparolli32,
[...] o conciliador tem a prerrogativa técnica de intervir e sugerir um possível acordo após uma criteriosa avaliação das vantagens e desvantagens que sua proposição traria às partes – o que se distingue diametralmente da atuação do mediador, que, tecnicamente, não deve sugerir saídas para o acordo [...]
Seja, portanto, judicial, seja extrajudicial, a conciliação é, sem dúvida, a forma
considerada mais justa entre as próprias partes para a solução conflitual, na medida
em que são as próprias partes quem, conciliadas com auxílio de um terceiro
imparcial, encontram a solução da questão até então controvertida.
2.6. Arbitragem
Não obstante todo o exposto, há ainda casos em que as partes, mesmo com
o auxílio de um terceiro imparcial, não conseguem pôr termo ao conflito então
instado entre elas ou, mesmo, não têm interesse em submetê-lo à apreciação
judicial ou a uma prévia tentativa conciliatória, ou, o tendo submetido, não lograram
êxito em seu intento. Daí pretendem que a questão em lide seja analisada e julgada
por um terceiro imparcial, com poder de dizer o direito.
Para casos tais, a utilização da arbitragem, como forma de solução de
conflitos, surge como técnica exitosa, já que é aplicada à solução do conflito por
meio de um terceiro, eleito pelas partes em disputa e a quem compete, por eleição
delas, “dizer-lhes o direito”.
Da mesma forma, e conforme retrata Francisco José Cahali33 relativamente à
arbitragem, “a solução do conflito foi entregue a terceiro, aparecendo daí a figura de
um julgador, que poderá integrar a estrutura estatal (Poder Judiciário) ou ser
independente do Estado – o árbitro”.
32
ZAPPAROLLI, Célia Regina. Op. cit., p. 38. 33
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 28-29.
26
Lauro Gomes Correa34 refere que a arbitragem “[...] é o procedimento de
submeter os assuntos em disputa ou de natureza contenciosa a juízo de
determinada pessoa ou pessoas sem recorrer aos Tribunais de Justiça”.
Vale dizer, portanto, que a arbitragem constitui uma forma ou técnica
extrajudicial de resolução de conflitos, em nível de equivalente jurisdicional, ou seja,
sem a interferência do Judiciário, em que um terceiro imparcial eleito pelas partes
litigantes de comum acordo e vontade e através de instrumento próprio (cláusula ou
compromisso arbitral) decide a questão controvertida (heterocomposição) por meio
de uma sentença arbitral escrita e que possui a mesma eficácia de uma sentença
judicial, podendo, inclusive, ser executada judicialmente, caso a parte vencida não a
cumpra de forma voluntária e, daí, através do Judiciário.
Com a assinatura da cláusula compromissória ou do compromisso arbitral, a
arbitragem assume o caráter obrigatório e a sentença tem força judicial. A decisão
arbitral é dada pelo árbitro, em caráter definitivo, uma vez que não cabe recurso
neste sistema de resolução de controvérsias.
Registre-se, aqui, que, embora a decisão arbitral seja impositiva às partes,
caso não seja espontaneamente cumprida, no sistema processual brasileiro sua
execução forçada se fará perante o Judiciário, em ação própria (Lei n. 9.307/96, arts.
31 e 475-N, IV, do CPC), aqui elevada à categoria de título executivo judicial.
Como vantagem da utilização da arbitragem em detrimento da solução estatal
ao conflito, Francisco José Cahali35 menciona que a liberdade de escolha do
julgador, o lastro de confiabilidade depositada pelas partes no terceiro, aliada à
eleição de conhecimento específico da matéria em lide dentre outros fatores,
somado ao consenso entre as partes a essa eleição, tornam a arbitragem eficaz.
Em síntese, pode-se afirmar que na arbitragem é conferida às partes uma
liberdade maior que a submissão da solução da lide à esfera estatal, afinal, tem
estas a liberalidade de escolha da lei aplicável, a escolha de quem irá decidir a
questão, e até mesmo a formatação do procedimento a ser observado na solução da
lide.
No Brasil, desde que promulgada a Lei de Arbitragem (Lei n. 9.307/96), o
instituto vem sendo aplicado exponencialmente, e, conforme artigo de Arnoldo Wald
34
CORREA, Lauro Gomes. Multiplicadores de um sonho: arbitragem no Mercosul – panorama de um sonho de justiça. Porto Alegre: CRA-RS/Evangraf, 2008, p. 95. 35
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 85.
27
e Ana Gerdau de Borja36, “[...] o avanço da arbitragem colocou o Brasil nos holofotes
internacionais em 2013, colocando-se entre os cinco primeiros no ranking mundial
[...]”.
A utilização do instituto da solução pacífica de conflitos coaduna-se ao nosso
próprio pensar constitucional, afinal, nossos constituintes, ao preambularem nossa
Carta Magna, já norteavam os ideais nacionais a esse respeito, senão vejamos:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e
comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus,
a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO
BRASIL37.
E, como leciona Alexandre de Moraes38, em um preâmbulo constitucional, no
qual se vê definida a proclamação de princípios, justificativas, objetivos e finalidades,
pautando as intenções constituintes de uma nação:
[...] Apesar de não fazer parte do texto constitucional propriamente dito e, consequentemente, não conter normas constitucionais de valor jurídico autônomo, o preâmbulo não é juridicamente irrelevante, uma vez que deve ser observado como elemento de interpretação dos diversos artigos que lhe seguem [...] O preâmbulo, portanto, por não ser norma constitucional, não poderá prevalecer contra texto expresso da Constituição Federal, e tampouco poderá ser paradigma comparativo para declaração de inconstitucionalidade, porém, por traçar as diretrizes políticas, filosóficas e ideológicas da Constituição, será uma de suas linhas mestras interpretativas.
Sem dúvida que, com o advento da Lei de Arbitragem no Brasil, em 1996, o
instituto ganhou força, mas foi sedimentado quando, em julgamento de recurso em
processo de homologação de sentença estrangeira (SE 5.206) por sete votos a
quatro, os ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram em 12-12-2001 que os
mecanismos da Lei de Arbitragem (9.307/96) eram constitucionais.
36
WALD, Arnoldo; BORJA, Ana Gerdau de. Avanço da arbitragem colocou o Brasil sob os holofotes. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-dez-28/retrospectiva-2013-avanco-arbitragem-colocou-brasil-holofotes>. Acesso em: 31 mar. 2014. 37
BRASIL. Constituição da República Federativa. Preâmbulo, promulgada em 05/10/1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 29 maio 2014. 38
MORAES, Alexandre. Direito constitucional. São Paulo: Atlas Jurídica, 2003, p. 48.
28
A saber, o recurso em questão foi julgado em ação movida a partir de 1995,
quando empresa, de origem estrangeira, pretendia homologar um laudo de sentença
arbitral proferida na Espanha, para que tivesse efeitos no Brasil. Em princípio, o
pedido havia sido indeferido, mas em 1996, com a promulgação da Lei n. 9.307/96,
e, assim, no julgamento do recurso, o ministro Moreira Alves levantou a questão da
constitucionalidade da Lei de Arbitragem brasileira.
E assim, embora não tenha sido unânime a decisão, por maioria vencedora, a
par da constitucionalidade da Lei de Arbitragem brasileira, esta lei é constitucional e,
por via de consequência, não afronta o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal.
É que porquanto o objeto da arbitragem deve incidir somente sobre direitos
disponíveis, as partes, ao convencionarem a arbitragem, não estariam renunciando
ao seu direito de ação e ao juiz togado, e sim deslocando a jurisdição por órgão
estatal para um destinatário privado.
Não demais lembrar que a Lei de Arbitragem brasileira não veda o acesso ao
Poder Judiciário, porquanto no Brasil a arbitragem não é obrigatória, e, assim, ao
permitir às partes a escolha entre o juízo estatal e o arbitral para solucionar a lide
existente entre elas, não se pode dizer que esteja ferindo o antes mencionado
dispositivo constitucional.
Do ponto de vista normativo, a confiança, digamos assim, na utilização do
instituto para a solução de conflitos resultou alicerçada e garantida, de certa forma,
através da festejada decisão, ganhando força com as alterações introduzidas no
Código de Processo Civil, notadamente atribuindo força de título executivo judicial às
decisões proferidas por árbitros.
Nesse pensar, se a jurisdição estatal como forma de solução de conflitos se
dá por meio do Estado, que deve dizer o direito impondo a solução do conflito, a
arbitragem, na mesma linha, em paralelos, constitui um meio privado e alternativo à
solução judicial de conflitos, preservadas as normatizações legais advindas ao
instituto.
Como refere Marco Antonio Garcia Lopes Lorencini39, ao discorrer sobre o
“sistema multiportas”, na obra Negociação, mediação e arbitragem, na arbitragem,
em que pese situada no outro extremo da mediação, na prática, no mais das vezes,
39
LORENCINI, Marco Antonio Garcia Lopes. Negociação, mediação e arbitragem. In: SALLES, Carlos Alberto de; LORENCINI, Marco Antonio Garcia Lopes; SILVA, Paulo Eduardo Alves da (Coord.). Curso básico para programas de graduação em direito. Rio de Janeiro: Forense/São Paulo: Método, 2012, p. 62-68.
29
a solução de questão controvertida trazida pelas partes à esfera extrajudicial, em
sua plena eficácia, dar-se-á através da adoção de mais de uma técnica de solução
conflitual ao caso concreto.
30
3. ASPECTOS GERAIS DA ARBITRAGEM NO BRASIL
A arbitragem, em linhas gerais, nada mais é senão a manifestação de
vontade emanada de duas ou mais pessoas, que conferem a terceiro poderes para
que solucione determinada questão controvertida entre partes, em ânimo definitivo,
concordando os outorgantes que se submeterão a tal solução, ficando a esta
obrigados.
A Lei de Arbitragem brasileira (Lei n. 9.307/96) seguiu o exemplo das
legislações de países nos quais o instituto já era utilizado com frequência, e teve
como modelo a Lei sobre Arbitragem Comercial da UNCITRAL – United Nations
Commission on International Trade Law.
De acordo com Francisco José Cahali40:
Comparada com legislações avançadas, como a da Espanha e a de outros países da Europa, para a nossa realidade, a lei não deixa a desejar, principalmente porque naquele continente a cultura da arbitragem já estava incorporada ao direito.
A arbitragem vem ganhando força e reconhecimento também no cenário
nacional na medida em que o Poder Judiciário brasileiro aceita e determina o
cumprimento de decisões proferidas por árbitros particulares, em reconhecimento à
jurisdição arbitral e à força da sentença arbitral, através dos mecanismos
processuais, notadamente previstos no Código de Processo Civil, no art. 475-N,
quando institui a sentença arbitral como sendo um título executivo judicial e, assim,
seu não cumprimento espontâneo pela parte sucumbente enseja ação própria
através do Judiciário, prevista nos arts. 475-J e seguintes do CPC.
Inegavelmente que este evoluir legislativo se deu a partir do reconhecimento,
em sede nacional, da constitucionalidade da Lei de Arbitragem, através de decisão
exarada em análise incidental, pelo STF, em julgamento de caso concreto.
No entanto, cabe aqui mencionar que o STF, ao enfrentar a questão da
constitucionalidade da Lei de Arbitragem, incidentalmente, estabeleceu um paralelo
entre a garantia constitucional do direito de ampla defesa e do juízo arbitral,
entendendo que a eleição pela utilização da arbitragem não se trata de ferir
40
CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 78.
31
dispositivo constitucional, que garante o acesso ao Judiciário nos casos previstos
pela lei.
E esse posicionamento do Judiciário à frente da arbitragem foi fundamental,
pois como bem assevera Adriana Braghetta41, tratando da arbitragem internacional:
Mediante a adoção de leis ou tratados é que se tornou possível a utilização da arbitragem de forma segura. Mas só um bom enquadramento jurídico não é suficiente. O desenvolvimento da arbitragem depende da difusão do instituto e apoio dos tribunais locais que, afinal, irão interpretar e definir os limites do tema. Fechando o círculo, a doutrina servirá de instrumento de apoio e fomento.
Nesse passo, vieram as modificações inseridas no Código de Processo Civil,
quanto às questões relativas à sentença arbitral, no que pertine à execução das
decisões arbitrais terminativas, embora ainda gerem dúvidas na prática processual
em razão da inovação, não só quanto à terminologia, já que anteriormente
denominada no Brasil laudo arbitral, mas quanto à desnecessidade de homologação
e principalmente da agilidade como se dá a sua execução, atualmente denominada
cumprimento por força da Lei n. 11.232/2005, colaboraram ao andar do instituto no
Brasil, afinal, passou a ser retratada expressamente no art. 475-N, IV, do CPC a
conjugação da força executiva desse julgado arbitral por meio do Judiciário.
Assim, o Brasil, contando com uma lei moderna e atual, com juristas
altamente qualificados contribuindo com estudos e doutrinas especializadas nos
mais variados aspectos das arbitragens, dependia apenas do apoio judicial para
contribuir com o avanço e fortalecimento da arbitragem, o que hoje já é realidade.
O sistema arbitral atual e vigente no Brasil tem como característica sua
facultatividade, pois pressupõe uma justiça privada aceita e escolhida pelas partes
nos contratos que assinam, ou quando assim se orientam, e exclui a apreciação e a
participação do Poder Judiciário nas questões relativas ao mérito da demanda, a
exceção da necessidade de executar medidas cautelares interpostas; executar a
sentença arbitral; anular sentença arbitral defeituosa; participar incidentalmente, ao
instalar o procedimento arbitral, quando presente cláusula arbitral vazia e uma das
partes a ela se negar a submissão; ou para intimação de testemunha que se recuse
a comparecer à audiência.
41
BRAGHETTA, Adriana. A importância da sede da arbitragem: visão a partir do Brasil. Rio de Janeiro: Renovar, 2010, p. 4.
32
Não demais lembrar, no entanto, que as partes, pela convenção arbitral,
transferem do poder jurisdicional estatal aos árbitros aqueles mesmos poderes que
eram conferidos ao juiz togado, no que respeita à solução da controvérsia, mas não
o poder coercitivo estatal.
Deve-se, portanto, divisar que, no que se refere às medidas cautelares, à
questão da concessão e da execução delas, o árbitro as concede, mas sua força
executória se dará através do Judiciário.
Todavia, não se pode sublimar que eventual medida coercitiva só poderá
incidir na esfera daqueles que se submeteram à cláusula arbitral, afinal, a utilização
da arbitragem pressupõe relação jurisdicional entre as partes que a
convencionaram.
A par da voluntariedade, as partes possuem a iniciativa de resolver seus
conflitos de interesse pela via arbitral em detrimento do processo judicial, e, a partir
daí, uma vez eleita, o árbitro profere uma decisão, quer com lastro nas regras do
direito positivo, quer, se autorizado e da vontade das partes, baseado na equidade.
Outra característica da Lei de Arbitragem brasileira é de somente se aplicar a
solução de litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis, com anuência das
partes, seja ela por meio de cláusula compromissória, seja por compromisso arbitral,
que, uma vez convencionado pelos litigantes, afasta da apreciação da justiça
comum a competência de decidir a lide.
A Lei de Arbitragem, portanto, veio revolucionar o instituto, dado o caráter
voluntário e opcional da contratação, e alterar substancialmente a questão
relacional, na medida em que as partes manifestam de forma expressa a vontade de
resolver determinado conflito por essa via, prevalecendo a partir de então a
vinculação e obrigatoriedade de sua utilização.
Uma vez eleita a arbitragem por meio de uma convenção, as partes ficarão
vinculadas à decisão do árbitro, que julgará o conflito proferindo uma sentença, a
qual sendo condenatória valerá como título executivo judicial, independentemente de
homologação perante o Poder Judiciário42.
42
Para Eduardo Arruda Alvim e Daniel Willian Granado: “A adoção, entre nós, de maneira ampla, da arbitragem, tal como prevista na Lei 9.307/96, ou seja, com regras que conferem efetividade ao procedimento arbitral, sem necessidade de homologação judicial, representa grande inovação e, em nosso sentir, ostenta diversas vantagens que se sobrepõem a qualquer possível inconveniente desse sistema” (Mecanismos alternativos de solução de conflitos: arbitragem, mediação e conciliação e o Projeto do novo CPC. Disponível em: <http://www.arrudaalvimadvogados.com.br/visualizar-
33
Na verdade, a arbitragem, ao lado de outras formas extrajudiciais de solução
de conflitos, como a mediação, conciliação e negociação, é um novo e amplo campo
de trabalho para os profissionais da área do direito.
Desse contexto se extrai que a justiça privada não veio para competir com o
Poder Judiciário, mas, sim, para caminharem juntos, auxiliando-o, justamente, em
um momento em que, assoberbado, atravessa uma crise.
Em linhas gerais, a arbitragem pode ser entendida como a manifestação de
vontade emanada de duas ou mais pessoas, que conferem a um terceiro poderes
para que este solva determinada questão controvertida entre essas partes, em
ânimo definitivo, concordando os outorgantes, que se submeterão a tal solução e
ficarão a esta obrigada.
Essa forma de solução, por meio de terceiro, isento, escolhido pelas partes, é
um caminho certo para a pacificação de conflitos, pelo fato de este terceiro gozar da
confiança dos que o elegeram.
3.1. Brevíssimo histórico da arbitragem no cenário brasileiro
Ao nos depararmos com o contexto histórico nacional, ainda que em breve
vistas, podemos observar que em face das diferentes formatações que ele assumia,
naturalmente reflexas do contexto evolutivo de nossa sociedade e em nosso
ordenamento, nem sempre o instituto da arbitragem adquiriu a mesma feição.
Cronologicamente mencionando, o Tratado de Tordesilhas, em 1498, como
referência à história do Brasil, é exemplo de resultado de decisão arbitral, bem como
as Ordenações do Reino de 160343.
O Brasil seguiu servindo-se da arbitragem na época da colonização
portuguesa, quando a Constituição do Império de 1824 estabeleceu a possibilidade
às partes de solucionar seus conflitos cíveis através da nomeação de árbitros-juízes,
artigo.php?artigo=15&data=22/06/2011&titulo=mecanismos-alternativos-de-solucao-de-conflitos-arbitragem-mediacao-e-conciliacao-e-o-projeto-do-novo-cpc>. Acesso em: 7 mar. 2014. 43
LEMES, Selma Maria Ferreira. Advogado deve abandonar processo civil na arbitragem. Entrevista concedida ao CONJUR e publicada na revista Consultor Jurídico. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-mai-12/entrevista-selma-lemes-advogada-professora-especialista-arbitragem>. Acesso em: 1º mar. 2014.
34
e, ainda, se as partes assim convencionassem, a decisão dos árbitros seriam
executadas sem recurso.
A partir de então foi continuamente reiterada em todas as constituições que
se seguiram, com maior ou menor amplitude, ganhando inclusive espaço no Código
Comercial de 1850, que previa a utilização da arbitragem particularmente para
atender às controvérsias mercantis44.
E, após diversas previsões legais, muito embora expressamente tratada pela
Constituição Federal de 1988, em seu art. 114, §§ 1º e 2º, no Brasil, a arbitragem
somente ganhou força com o advento da Lei n. 9.307, de 23 de setembro de 199645.
A promulgação dessa lei, também chamada Lei Marco Maciel, alterou
profundamente a história do instituto em nosso país, quanto ao procedimento arbitral
e sua eficácia, não obstante derivando ao Poder Judiciário, o poder coercitivo, pois o
legislador pátrio não o outorgou ao árbitro ou às instituições arbitrais.
Em 2001 a arbitragem ganhou força ainda maior no ordenamento jurídico do
País, com o advento da declaração de sua constitucionalidade pelo Supremo
Tribunal Federal, fortalecendo-se ainda mais em 2002, quando o Brasil aderiu à
Convenção de Nova York de 1958, sobre Reconhecimento e Execução de Laudos
Arbitrais.
Do que se vê, infelizmente, em nível nacional, a arbitragem encontrou, em
princípio, dada a própria cultura paternalista do Estado, certa resistência, muito
provavelmente pela ausência de conhecimento das partes relativamente aos
benefícios da arbitragem e a intervenção estatal nos acordos de vontades, uma vez
que, inicialmente, as decisões arbitrais deveriam submeter-se à homologação do
Judiciário.
E, com a mudança desse tom, dada a acepção do estado moderno, em que
há mais liberdade para as partes, preservando-se a autonomia das vontades, o que
passou a ser um ponto positivo nesse segmento, aliada às alterações introduzidas
pela Lei de Arbitragem, dispensada a homologação da sentença arbitral, um novo
cenário passou a integrar a arbitragem e os investimentos e relações comerciais.
44
DELGADO, José Augusto. Arbitragem no Brasil: evolução histórica e cultural. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 228-229. 45
PINCER, Pedro. Arbitragem traz economia e rapidez à justiça. Disponível em: <http://www12. senado.gov.br/jornal/edicoes/2013/06/11/nova-lei-de-arbitragem-pretende-agilizar-a-justica>. Acesso em: 24 fev. 2014.
35
Como uma das inovações da Lei de Arbitragem merecem destaque a
sentença arbitral e a sua equiparação à sentença proferida pelos órgãos do Poder
Judiciário, bem como a possibilidade de execução dessa decisão quando não
cumprida pelas partes.
Com o advento dessa lei (Lei n. 9.307/96), a decisão arbitral passou então a
produzir entre as partes e seus sucessores os mesmos efeitos da sentença proferida
pelos órgãos do Poder Judiciário, destacando-se em particular sua força executiva,
conforme o seu art. 31.
Adriana Braghetta46 explica que a legislação brasileira, inspirando-se na
legislação portuguesa de 1986 e na espanhola de 1988 quanto ao laudo arbitral
nacional, mostra-se mais moderna que legislações tidas como avançadas, como a
da França, por exemplo, que depende de homologação perante o Judiciário para ser
executada.
E, dentre as inovações trazidas pela Lei de Arbitragem, a equiparação da
sentença arbitral, até então denominada laudo arbitral, à sentença proferida pelos
órgãos do Poder Judiciário é determinante como um dos pontos relevantes para o
crescimento da utilização da arbitragem no Brasil, embora o poder coercitivo ao seu
cumprimento dependa de ser efetivado pelo Judiciário, nos moldes antes vistos.
3.2. Características e natureza jurídica da arbitragem
Assim como a jurisdição estatal, a arbitragem representa uma forma
heterocompositiva de solução de conflitos47, através da qual a decisão é imposta por
um terceiro independente e imparcial, diferindo-se tais jurisdições no que diz
respeito às regras instrumentais.
Segundo Carlos Alberto Carmona48, a arbitragem é um
meio alternativo de solução de controvérsias através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nela, sem intervenção estatal, sendo a decisão destinada a assumir a mesma eficácia da sentença judicial – é colocada à disposição de quem quer que seja,
46
BRAGHETTA, Adriana. Op. cit., p. 253. 47
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 85. 48
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei nº 9.307/96. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 51,
36
para solução de conflitos relativos a direitos patrimoniais acerca dos quais os litigantes possam dispor.
E, para Joel Dias Figueira Júnior49,
este instituto apresenta-se como forma alternativa e facultativa de solução dos conflitos de interesses qualificados por pretensões resistidas. Trata-se de um mecanismo reconhecido internacionalmente pelos povos cultos e internamente sistematizado por norma específica, que viabiliza a transformação de lides sociológicas em lides jurídicas, as quais serão levadas ao conhecimento e decisão de mérito de particulares investidos de autoridade decisória e poder jurisdicional, que lhes é outorgado pelas próprias partes envolvidas em determinados conflitos de interesse.
Pode-se, assim, concluir que a arbitragem é o instituto pelo qual, sem a
intervenção estatal, pessoas capazes de contratar elegem, de comum acordo, uma
terceira pessoa, que por sua vez pode ser uma instituição de arbitragem ou uma
pessoa física, e a quem confiam o papel de resolver-lhes uma questão controvertida.
Decidida a questão, pelo árbitro ou pelos árbitros, quando for o caso, as
partes estarão a ela vinculadas, na medida em que a decisão do árbitro impõe-se às
partes e, portanto, a decisão é adjudicada e não consensual50.
Doutrinariamente, debate-se a par da natureza desse instituto, no que
respeita se teria natureza pública e processual ou natureza privada e contratual.
Em primeiro, de destacar que a arbitragem institui-se a partir da vontade das
partes, que estabelecem pela convenção, a qual poderá ser instituída por
compromisso arbitral ou cláusula compromissória inserta em um contrato; tal meio,
como forma de dirimir conflitos decorrentes de certa relação, baseia-se na premissa
de que a relação triangular que se estabelece entre árbitro e partes não teria força
alguma, além de um acordo de vontades, sem caráter jurisdicional.
Há de se observar, igualmente, a existência do caráter jurisdicional, quando a
lei atribui à decisão arbitral os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos
do Poder Judiciário e caráter de título executivo judicial à condenatória. É o que
parece ter-se baseado a legislação pátria, quando, por meio da Lei n. 9.307/96, em
seu art. 31, estabelece:
49
FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Arbitragem, jurisdição e execução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 38. 50
CAHALI, Francisco José. Op. cit., p. 85.
37
A sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo.
Em se tratando de natureza jurídica51 da arbitragem, observamos,
doutrinariamente, sua divisão em três principais correntes.
A corrente contratual ou privatista defende que a arbitragem tem natureza
contratual privada, uma vez que necessariamente se estabelece a partir da
instituição expressa entre as partes de uma manifestação de vontade nesse sentido
e que tal condição se dá na via não estatal.
E, porquanto exerça o árbitro plena função de sua jurisdição, limitada que fica
ao campo da cognição, visto que não detém o poder de executar suas próprias
decisões, a natureza jurídica da arbitragem teria um caráter privatista no que
respeita à sua origem e à qualidade dos árbitros, que administram sua jurisdição em
decorrência da vontade das partes.
Como adepto dessa corrente doutrinária, podemos citar Marinone52, que,
inclusive, faz expressa referência de que a jurisdição só pode ser exercida por juiz
de direito, dada a forma legal prevista para sua investidura, não podendo ser
delegada de outra forma se não por meio de concurso público, pena de
subvertermos a ordem constitucional espelhada e, assim, não se vislumbraria
caráter jurisdicional investido ao árbitro pela vontade das partes, senão um contrato
em sua efetividade.
Há ainda a corrente doutrinária denominada corrente jurisdicional ou
publicista, que atribui função judicante ao árbitro, identidade àquela exercitada por
juiz togado, e, por isso, o exercício da arbitragem que se revela como autêntica
contribuição privada na administração da justiça teria caráter publicista.
Os defensores dessa corrente visualizam a jurisdição de uma forma mais
atual, ampliando seu conceito, e, daí, entenderem que o árbitro estaria autorizado
51
Nesse sentido, Alexandre Freitas Câmara: "[...] a natureza jurídica deve refletir a verdadeira expressão ontológica da matéria em estudo, levando-se em consideração os seus elementos constitutivos; qualquer esboço classificatório dependerá sempre da prévia e antecedente fixação da natureza jurídica do fenômeno, instituto ou instituição jurídica analisada”
(FREITAS CÂMARA,
Alexandre. Arbitragem: Lei 9.307/96. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 10). 52
MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, v. 1, p. 153.
38
pelo Estado ao exercício de sua jurisdição, teoria de Caivano, segundo José Luiz
Bolzan de Morais53:
[...] não há razão lógica em se considerar que uma mesma função possa variar sua natureza só porque variou a qualidade da pessoa que a desempenha. Os árbitros se revestem da qualidade de verdadeiros juízes, sua missão é essencialmente igual, seu laudo não possui substanciais diferenças da sentença magistral, tendo
inclusive a mesma força executiva. Possuem o mesmo status
jurídico, não havendo motivos inarredáveis para que se designe aos mesmos natureza jurídica diversa [...]
De mencionar, nesse sentido, que árbitros sujeitam-se, quando no exercício
de suas atividades, àqueles mesmos motivadores legais previstos aos juízes de
direito, no que pertine ao impedimento, suspeição ou responsabilidades, devendo
conciliar a prática aos princípios da confidencialidade, competência, imparcialidade,
conforme advertência legal contida na própria Lei de Arbitragem.
Na doutrina de Didier Junior54 há o entendimento de que, se o árbitro é eleito
pelas partes por pacto negocial e normativo, que é a convenção arbitral, o que lhe
confere independência e imparcialidade, delimitada, portanto, e, assim, garantida a
efetividade do princípio do juiz natural.
Em outras palavras, pode-se imprimir, dentro dessa doutrina, que o fato de o
árbitro não ter o poder de execução não significaria que não estivesse no exercício
de uma função jurisdicional, carecedor, apenas, de competência funcional.
E, como uma justaposição dessas duas doutrinas anteriormente abordadas,
surge uma terceira, eclética, chamada de corrente mista ou híbrida, que acredita que
a arbitragem, além de seu aspecto contratual, pois para se consubstanciar necessita
de uma convenção pelas partes, alia uma função judicante, a partir do momento em
que a lei confere ao árbitro o poder de dizer o direito, tal qual confere ao juiz de
direito.
De tudo quanto se expôs, realmente, após o advento da Lei n. 9.307/96, no
Brasil, uma vez instituído o procedimento arbitral, a tese contratualista da natureza
jurídica arbitral deixa de fazer sentido de forma isolada, uma vez que a sentença
53
CAIVANO,1992. Apud BOLZAN DE MORAIS, José Luis; SPENGLER, F. M. Mediação e arbitragem: alternativas à jurisdição. 2. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, p. 186. 54
DIDIER Jr., Fredie. Curso de direito processual civil. 14. ed. Salvador: JusPodivm, 2012, v.1., p. 113.
39
arbitral foi equiparada pela lei brasileira à decisão judicial, dispensada a sua
homologação estatal.
Visto que a Lei de Arbitragem permite que se desloquem à jurisdição privada,
nos limites de sua ingerência, atos até então privativos de órgãos estatais,
adotaremos para este estudo o entendimento de que a natureza jurídica da
arbitragem tem feições híbridas, ou seja, assume contornos da tese contratualista e
da tese jurisdicional.
Contratual na fonte, mas jurisdicional no objeto, conforme entende Selma
Lemes55, a natureza jurídica mista da arbitragem assim se revela porquanto tenha
origem na vontade das partes e, portanto, de nuanças contratuais; e se desenvolve
em bases jurisdicionais, não muito diferente daquilo que se processa nos tribunais.
Nessa linha, seja o juiz, seja o árbitro, incumbem-se de vincular as partes
afeitas a essa decisão e de decidir aquilo que deverá ser ou deixar de ser feito.
Assim, ambos (juiz ou árbitro) atuam de forma similar nesse contexto, analisando e
perquirindo os fatos em pauta e dando solução justa ao caso.
Não que isso implique colocar-se a justiça estatal e a privada no mesmo
patamar; afinal, apresentam características diferentes em sua essência, como, por
exemplo, enquanto a primeira decorre do estatuído no diploma constitucional, a
segunda decorre de uma manifestação válida e eficaz da vontade das partes.
Mas, intrinsecamente, pode-se dizer que ambas têm o poder de resolver um
litígio que lhes seja posto pelas partes.
Inegável, todavia, que a solução arbitral tem caráter de definitividade
condicionado à atuação lícita do árbitro, que será objeto de avaliação, caso seja
arguido pelo Poder Judiciário, em que pese o festejado princípio da competência-
competência do árbitro seja relativizado caso constatada eventual extrapolação dos
poderes conferidos a ele56.
Assim, consequentemente, se o caráter jurisdicional da arbitragem vem
fortalecer o instituto, contribuindo para uma nova percepção da cultura jurídica, não
menos importante seria reconhecer a relação de direito privado advinda de sua
convenção, claramente representada na própria constitucionalidade do juízo arbitral,
55
LEMES, Selma Ferreira. Arbitragem na administração pública: fundamentos jurídicos e eficiência econômica. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 60-61.
56 FICHTNER, Jose Antonio; MONTEIRO, Andre Luis. Temas de arbitragem. Rio de Janeiro: Renovar,
2010, p. 120-121.
40
que em síntese, deriva da renunciabilidade do exercício do direito de ação
relativamente a uma pretensão material dos direitos disponíveis.
3.3. Princípios norteadores da arbitragem
Quando se aborda a expressão “princípios norteadores da arbitragem”, logo
vem a ideia de conjunto de condutas explícitas ou implícitas, norteadoras do
instituto.
Para Celso Antonio Bandeira de Mello57, princípio é, por definição,
mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição
fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e
servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente porque
define a lógica e racionalidade do sistema normativo, conferindo-lhe a tônica que lhe
dá sentido harmônico.
E é na própria Lei de Arbitragem nacional que vemos diversos princípios
jurídicos inseridos e que alicerçam o instituto em nível nacional, devendo ser
seguidos, caso contrário, afastariam o seu propósito.
Na Lei de Arbitragem, bem como em sua doutrina, os expoentes da
arbitragem seriam: a autonomia da vontade das partes, da boa-fé, da imparcialidade
do árbitro, do contraditório e igualdade das partes, da livre convicção do árbitro, da
obrigatoriedade da convenção, do devido processo legal e da Kompetenz-
Kompetenz.
Sobre a autonomia da vontade da parte, pode-se dizer que constitui a própria
essência dela, visto que o instituto baseia-se essencialmente nessa premissa.
A par do princípio, Giovanni Nanni refere que
a autonomia privada está ligada à capacidade negocial, pois é a possibilidade de o autor regrar-se, reconhecida pelo direito, criando normas individuais dentro de sua capacidade [...] não se fala mais na vontade ilimitada do indivíduo para firmar um negócio, mas na relação da vontade privada que encontra espaço ou autonomia no ordenamento jurídico com a vontade de outrem para firmar-se uma relação jurídica obrigacional. Não prevalece mais a vontade interna do sujeito, mas a vontade observada externa e objetivamente, diante
57
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Eficácia das normas constitucionais sobre justiça social, RDP, v. 57/58, p. 247, 1981.
41
do ordenamento jurídico, em consonância à autonomia da vontade
para a autonomia privada58
.
O entendimento, do que se observa, baseia-se na visão moderna e de acordo
com a nova redação do instituto em nosso diploma civil, em detrimento daquele
antes centrado no individualismo que se registrava na redação anterior.
E, assim, o princípio da autonomia da vontade respalda-se na voluntariedade,
calcada na liberdade de escolha adstrita às partes para submeterem a lide à justiça
arbitral, como refere, inclusive, Renan Lotufo59, atribuindo à autonomia privada
caráter potestativo.
Portanto, nesses dizeres, a autonomia da vontade das partes, em sede de
arbitragem, fica limitada a que atendam aos critérios da arbitrabilidade objetiva e
subjetiva determinados pela lei.
A par do princípio do contraditório, de se destacar que, como elemento
constitucional fundamental, não poderia ser relegado em sede de arbitragem, visto
que tem o condão de equilibrar o procedimento e sua dinâmica.
A questão importa na obviedade; afinal, é preciso antes de qualquer coisa
oportunizar a manifestação das razões de cada uma das partes envolvidas para que
se possa decidir a questão controvertida.
Em verdade, o princípio do contraditório equivale ao da igualdade das partes,
uma vez que por meio do contraditório oportuniza-se a outra parte, vale dizer, são
dadas a elas as mesmas oportunidades para se manifestarem no procedimento
arbitral, ficando ambos os princípios associados de certa forma.
A igualdade das partes, por sua via, é princípio que encontra respaldo nas
regras do processo civil, quando trata da paridade de tratamento60.
Consiste, por sua vez, em respaldar as partes equidade de tratamento
perante o direito e os bens em tutela.
No que pertine ao princípio da boa-fé, contemplado expressamente no Código
Civil, pode-se dizer que é a essência da arbitragem e deve estar presente em todos
os momentos do procedimento, e tal qual menciona Maria Helena Diniz61:
58
NANNI, Giovanni Ettore. A evolução do direito civil obrigacional: a concepção do direito constitucional e a transição da autonomia da vontade privada. In: LOTUFO, Renan (Coord.). Cadernos de autonomia privada. Curitiba: Juruá, 2001, Caderno 2, p. 169-172. 59
LOTUFO, Renan. Questões relativas à clausula penal contratual. Revista do Advogado. São Paulo, ano 32, n. 116, p. 161-167, jul. 2012. 60
Art. 125, I do Código de Processo Civil.
42
[...] o sentido literal da linguagem não deverá prevalecer sobre a intenção inferida da declaração de vontade das partes – mas também ao interesse social de segurança das relações jurídicas, honestidade, honradez, denodo e confiança recíprocas, isto é, proceder com boa-fé, esclarecendo fatos e o conteúdo das cláusulas, procurando o equilíbrio nas prestações, evitando o enriquecimento indevido, não divulgando informações sigilosas etc.
Sem dúvida, a boa-fé seria substancial à própria eficácia e validade do
instituto, dele não podendo ser afastada dentro da ideia do que a arbitragem se
propõe.
O princípio da boa-fé, em termos de Lei de Arbitragem, decorre também da
obrigação contratual assumida entre as partes de solver a questão controvertida
apresentada no curso pactual por arbitragem. Não pode uma das partes, após ter
firmado o contrato e eleito a arbitragem, deixar de honrar o compromisso assumido
nesse sentido, caso contrário, não se pode dizer que estivesse agindo de boa-fé.
Quanto ao norteador da imparcialidade do árbitro, de destacar que não difere
das regras do processo em geral e sua imparcialidade constitui uma garantia às
partes, que poderão arguir questões prejudiciais, como suspeição e impedimento,
tendo este apenas interesse na solução da controvérsia.
Ainda sobre o princípio da imparcialidade do árbitro, constitui, em verdade,
um pressuposto à instauração válida do procedimento arbitral, garantindo um
julgamento válido e ético.
Ressalto nesse particular que, seja por ocasião de disposição legal ou por
previsão regulamentar de instituições arbitrais, os árbitros têm o dever de revelar
qualquer fato que implique dúvida quanto à sua independência e imparcialidade,
pena de corromper a eficácia do seu julgado.
Ao árbitro, e por força de disposição legal da própria Lei de Arbitragem,
cuidou o legislador de respaldar suas decisões no princípio do livre convencimento,
que significa a liberdade, limitada as regras jurídicas, do entendimento livre do
terceiro que irá julgar o caso em arbitragem, e desde que tenha suporte em fatos
aos quais se funda o conflito e suas provas.
Com respaldo nesse princípio, portanto, ao árbitro é permitido o poder de
formar sua livre convicção quanto aquilo que lhe é submetido à analise e decisão no
61
DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos. 6. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2006, v. 1, p. 86.
43
procedimento arbitral, apreciando com liberdade de entendimento as provas
produzidas, os argumentos trazidos pelas partes relativos aos fatos, e tudo o que se
some para firmar a sua convicção a respeito da lide.
Nesse sentido, assim como o juiz, o árbitro formará seu convencimento e por
meio da sentença arbitral decidirá a questão posta, fundamentando-a, naturalmente,
inclusive em casos em que autorizado a julgar por equidade.
No que pertine à obrigatoriedade da convenção arbitral, como princípio
norteador da arbitragem, além de constituir, em tese, um apêndice ao princípio antes
abordado, da boa-fé, e que não se pode dissociar, convém mencionar que tal
norteadora consiste na independência, conferida pela própria lei, da cláusula
compromissória em relação às demais estipulações previstas no contrato, de modo
que a nulidade de um contrato não seja alegação para que se sublime ou afaste a
utilização da arbitragem para solver a questão controvertida apresentada e
decorrente dos limites impressos no clausulado.
Ainda, como princípio norteador da arbitragem, podemos mencionar a
garantia do devido processo legal e da Kompetenz-Kompetenz.
Quanto a este último, resulta na premissa de que os árbitros têm competência
para dizer da sua própria competência, apreciando, de oficio ou a requerimento das
partes, o seu âmbito de atuação, inclusive no que diz respeito às exceções relativas
à existência e validade do acordo de arbitragem, conforme preleciona Fernanda
Levy62.
E de Cahali obtém-se ainda que essa regra é fundamento do instituto, ao
passo que, se coubesse ao Judiciário a análise da competência do árbitro, em
primeiro plano, estaríamos possibilitando o intuito protelatório de alguma das partes,
que submeteria a questão ao moroso Judiciário, ou mesmo postergado o
seguimento do procedimento arbitral, o que não é compatível ao instituto63.
Norteada pelo princípio do devido processo legal, que se insere
hierarquicamente em nossa Constituição Federal (art. 5º, LIV e LV), e do qual não se
pode afastar, a arbitragem dá provisão deste, quando na Lei n. 9.307/96, em seu art.
21, determina que:
Art. 21. A arbitragem obedecerá ao procedimento estabelecido pelas partes na convenção de arbitragem, que poderá reportar-se às
62
LEVY, Fernanda. Op. cit., p. 72. 63
CAHALI, Francisco José. Op cit., 2013, p. 114-115.
44
regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada, facultando-se, ainda, às partes delegar ao próprio árbitro, ou ao tribunal arbitral, regular o procedimento.
O dispositivo legal aponta, sem dúvidas, que a observância do princípio
norteador do devido processo legal, em sede de arbitragem, respalda-se no
cumprimento das formalidades e exigências previstas, quer por construção
regulamentar pelas partes, quer por instituídas institucionalmente, o que assegurara
a segurança jurídica, devendo as partes estrita observância desses normativos.
Nelson Nery Junior64, ao abordar o princípio constitucional mencionado,
ensina que o devido processo legal é o princípio fundamental do processo civil,
servindo de base de sustentação a todos os demais princípios. E resume seu
conteúdo na "possibilidade efetiva de a parte ter acesso à justiça, deduzindo
pretensão e defendendo-se do modo mais amplo possível [...]".
O procedimento arbitral, portanto, deverá nortear-se pelos princípios vistos,
tecidos pela própria Lei de Arbitragem, ainda que sua operacionabilidade seja
disposta pelas partes, ou regulamentadas por instituições arbitrais, suporte no
princípio da autonomia da vontade e suas limitações legais. E, sendo tal lei
composta de elementos basilares, vão conferir eficácia e validade aos atos
praticados em seu âmbito, para que se dê a solução de conflitos.
3.4. Arbitrabilidade
A dinâmica do direito enseja uma infinidade de pretensões resistidas, as quais
podem e devem ser objeto de solução não estatal, por via de procedimento arbitral,
como recomendam tratados, convenções, protocolos e legislações mundiais
(nacionais ou internacionais), de modo a bem acompanhar a velocidade das
relações que se estabelecem na contemporaneidade.
Não obstante, nem todas as pessoas e nem todas as matérias são passíveis
de se submeterem a arbitragem e, nesse tom, refere Beat Walter Rechsteiner65:
“uma lide deve ser suscetível à arbitragem, ou seja, capaz de ser objeto de um
64
NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,1996, p. 72. 65
RECHSTEINER, Beat Walter. Arbitragem privada internacional no Brasil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 51.
45
procedimento arbitral. Eis o requisito básico para a validade de uma convenção de
arbitragem”.
Espelha-se, portanto, que não basta se convencione a utilização da
arbitragem – muito mais do que isso, impera que se observe se o objeto do conflito é
arbitrável, como leciona Francisco José Cahali, sendo essa condição essencial na
condição de “filtro dos litígios” que poderão ser submetidos ao instituto66.
Nessa linha, no Brasil, os direitos pessoais ficam excluídos da possibilidade
de solução de controvérsias pelo instituto, bem como da utilização do instituto por
pessoas incapazes.
A análise, portanto, da arbitrabilidade é tema de considerável importância,
pois dimensionará a condição de objeto arbitrável e seu alcance, questões
determinantes da aplicação do instituto ao caso.
Cláudio Finkelstein67 aborda a arbitrabilidade como sendo “uma condição
distinta e mais ampla do que a questão de validade do pacto arbitral”.
Para efeitos de análise, podemos dividir a arbitrabilidade em subjetiva e
objetiva, pois a primeira se refere a questões ligadas à capacidade para se poder
submeter à arbitragem e a segunda ao objeto da matéria a ser submetida à
arbitragem, limitando às questões referentes a direitos patrimoniais disponíveis68.
Para a viabilidade processual, mister o preenchimento de alguns elementos
basilares, para que se dê em sua plenitude a instauração do juízo arbitral.
Assim, para que se utilize a arbitragem, em princípio existem três questões
nucleares para efeitos de sua admissibilidade: a capacidade das partes, a
disponibilidade do direito, além da manifestação de vontade delas.
De acordo com o art. 1º da Lei de Arbitragem nacional: “As pessoas capazes
de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos
patrimoniais disponíveis”.
Em primeiro lugar, observa-se que uma dessas condições de admissibilidade
do juízo arbitral brasileiro segue princípio de direito e diz respeito à capacidade das
partes.
66
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 101.
67 FINKELSTEIN, Cláudio. A questão da arbitrabilidade. Revista Brasileira de Arbitragem, n. 13, p. 24,
jan./fev./mar. 2007. 68
O art. 1º da Lei de Arbitragem brasileira sinaliza a questão da arbitrabilidade subjetiva, ou seja, dimensiona a abrangência da pessoa passível de contratar a cláusula compromissória arbitral, em detrimento ao Judiciário.
46
É que, como antes já visto, se a exigência basilar para a opção, pelas partes,
da jurisdição privada em detrimento da estatal descreve a formalização por meio de
um acordo de vontades, consequentemente, tal vontade deve ser expressa por
pessoas capazes para a prática dos atos da vida civil.
Assim, para que seja válida a convenção arbitral, é preciso que a capacidade
de estar no juízo arbitral se configure dentro dos parâmetros exigidos pelo direito
material.
Se a exigência quanto à formalização dessa expressão da vontade das partes
deve dar-se por pessoas capazes legalmente para tanto, e desde que no universo
dos direitos disponíveis, a convenção de arbitragem é em si o elemento de
admissibilidade do juízo arbitral.
Nesse diapasão, exigência legal inafastável da admissibilidade à instituição
arbitral é a questão relativa à capacidade das partes, o que não se confunde com
legitimidade processual, sendo esta atrelada às condições da ação e não ao
exercício da tutela arbitral em si.
Trazemos, por oportuno, à baila questão que pode ser facilmente confundida
nessa seara: a capacidade ao exercício do direito e a sua titularidade retratada por
Francisco José Cahali69 e aqui colacionada:
[...] Mas a titularidade do direito difere de seu exercício. Para o exercício dos direitos, a lei estabelece restrições, em razão da idade, da falta de discernimento por problemas mentais ou vícios, e ainda da prodigalidade, conforme previsão nos arts. 3º e 4º do CC/2002. Nessa hipótese de incapacidade relativa ou absoluta, o exercício do direito estará condicionado à assistência ou representação, conforme o caso, dos pais, tutores e curadores [...]
Destarte, em casos tais há de se observar que a arbitrabilidade, embora
fosse, em tese, preservada pela capacidade de convencionar, ainda que os
incapazes possam contratar quer assistidos, quer representados, há de se perquirir,
ainda, se os direitos em questão seriam disponíveis, surgindo às vezes o óbice à
utilização da arbitragem, como alerta Francisco José Cahali70, “em razão da
necessária participação do Ministério Público no processo”, a teor do art. 82, I, do
Código de Processo Civil, o que em sede de arbitragem não se coaduna.
69
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 101-102. 70
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 102.
47
Diante disso, e no que se refere à arbitrabilidade objetiva, devemos observar
a possibilidade de essas pessoas capazes disporem de seus direitos, os quais
submetem à arbitragem.
É que a arbitragem tem como âmbito de atuação dissolver questões
controvertidas relativas aos direitos patrimoniais disponíveis e, portanto, excluídas
questões de ordem familiar, de estado de pessoas, de ordem fiscal, tributária, de
falência, de concordata ou de coisas que estão fora do comércio ou determinem a
participação do Ministério Público.
Nessa rubrica, a exigência é da patrimonialidade e da disponibilidade desse
direito – ausente um ou outro elemento, sob o ponto de vista da arbitrabilidade
objetiva, ficaria prejudicada a utilização da arbitragem.
Questão que igualmente merece atenção neste trabalho diz respeito à
arbitrabilidade em relações empresariais.
Em se tratando de direito empresarial, uma vez caracterizada a convenção de
arbitragem em seus moldes legais, não há que inadmitir a utilização do instituto.
Por fim, observados os elementos acima, a eles soma-se a possibilidade das
partes de convencionarem a arbitragem, de forma expressa como exige a lei, e,
assim, estariam reunidos os componentes de admissibilidade do juízo arbitral.
3.5. Espécies de arbitragem – ad hoc e institucional
Em que pesem as regras de arbitragem serem fixadas pelas partes, pelos
órgãos arbitrais e pelos árbitros, soante disposição legal, existem duas formas de
procedimento arbitral que se podem adotar no Brasil, com vistas à lei nacional, à
arbitragem institucional ou ad hoc.
O art. 5º da Lei n. 9.307/96 inserido no Capítulo II – Da Convenção de
Arbitragem e seus efeitos – trata das espécies de arbitragem e estabelece que:
Reportando-se as partes, na cláusula compromissória, às regras de algum órgão arbitral institucional ou entidade especializada, a arbitragem será instituída e processada de acordo com tais regras, podendo, igualmente, as partes estabelecer na própria cláusula, ou em outro documento, a forma convencionada para a instituição da arbitragem.
48
O procedimento arbitral, em si, admite que as regras procedimentais sejam
determinadas pelos participantes desde que se respeitem as normas gerais
previstas na Lei de Arbitragem.
Tanto a origem, quanto os requisitos, princípios, características e atribuições
dos árbitros para julgar o conflito não diferem em uma ou em outra espécie. O que
difere entre as espécies é a forma de condução da arbitragem71.
O art. 21, § 1º, da Lei de Arbitragem brasileira enuncia que: “Não havendo
estipulação acerca do procedimento, caberá ao árbitro ou ao tribunal arbitral
discipliná-lo”.
Observa-se daí que o suprimento de lacunas do procedimento e a definição
deste é competência dos árbitros, nos casos em que não exista qualquer disposição
sobre o procedimento, notadamente em arbitragens, que se denomina ad hoc,
também conhecida como arbitragem “avulsa”, isto é, eleita especificamente para
aquele caso determinado.
Nessa situação específica é feita a nomeação de árbitros particulares, não
pertencentes a uma instituição, e as próprias partes estabelecem regras
procedimentais a serem seguidas ou delegam essa tarefa aos árbitros eleitos. Nesse
caso as partes não optam pela administração do conflito por instituição arbitral.
No que pertine à arbitragem denominada na doutrina ad hoc, em que pese
nossa legislação não fazer expressa referência ao termo, mas sabendo-se que a
expressão latina, uma vez traduzida, significa “para esta finalidade” ou “para isso”72,
fica evidenciado na análise da Lei de Arbitragem o sentido e alcance da leitura do
art. 5º.
Nas arbitragens ad hoc, a estipulação da forma e dos valores de honorários é
livre, igualmente, mesmo porque o ad hoc constitui figura exclusiva que irá
administrar o procedimento, bem como exercer a jurisdição.
Obviamente, poderá o árbitro, na arbitragem ad hoc, estabelecer as regras do
procedimento arbitral, desde que, admitido pelas partes, observe aquilo tudo quanto
estipularam na convenção da arbitral, nos termos do que preconiza a Lei de
Arbitragem em seus arts. 5º, 11 e 21.
71
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p.111. 72
Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ad_hoc>. Acesso em: 12 mar. 2014.
49
A ideia da utilização da arbitragem ad hoc, segundo Cahali73, dentre outras,
condiz com a provável redução de custos, mas, para que se dê com a eficácia
esperada, é conveniente que a eleição do árbitro ou árbitros, já que a arbitragem ad
hoc admite também a figura do colegiado arbitral, que os profissionais eleitos pelas
partes para tal atribuição sejam aqueles de suas respectivas confiança, reunindo
características de aptidão e experiência.
Existem algumas desvantagens na arbitragem ad hoc, em vista da ausência
de eleição de órgão especializado na administração de conflitos, já que as partes
terão de prever na convenção de arbitragem todo o procedimento arbitral ou delegar
essa função aos árbitros, e ainda deverão estipular questões como custas, árbitros
suplentes, entre outras.
Nessa espécie de arbitragem, as regras são determinadas pelas partes ou
pelos árbitros para determinado objeto arbitral, o que exige, obviamente, uma maior
sintonia entre as partes que dela façam uso, tendo em vista que ditarão as regras
aplicáveis e, com mais rigor, a elas se submeterão, pena de eivar de nulidade a
própria decisão arbitral caso não seguidas a contendo74.
Os árbitros eleitos são igualmente independentes, mas desvinculados de
qualquer instituição, sendo responsáveis pela administração do procedimento
arbitral, além das outras funções que lhe são inerentes.
Nesse particular, Beat Walter Rechsteiner75 aduz que:
[...] A liberdade de decisão, aqui, costuma ser ampla, tão só restrita por normas cogentes ou imperativas, relacionadas ao procedimento arbitral, advindos do ordenamento jurídico do país em que tem sede o tribunal arbitral. A fim de facilitar a arbitragem, as partes devem enunciar com precisão o número, a forma de escolha e nomeação, o critério para a eventual substituição dos árbitros [...]
Por outro lado, podem as partes, ao firmarem uma convenção de arbitragem,
optar pela indicação de uma instituição arbitral, que cuidará da administração de
todo o procedimento de acordo com seu regulamento interno, o qual trará regras de
procedimento respeitando os princípios estabelecidos na Lei de Arbitragem.
73
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p.115-116. 74
E não se trata de anulabilidade, visto que a própria Lei de Arbitragem brasileira identifica, em seu art. 32, a nulidade da decisão arbitral, contida em numerus clausus no referido dispositivo, cuja análise gramatical, porquanto emerge da lei citada, não nos permite, em tese, afastar. 75
RECHSTEINER, Beat Walter. Op. cit., p. 20.
50
Já a arbitragem institucional pode ser definida como aquela cuja
administração procedimental é incumbência de uma instituição arbitral, que possui
regulamento próprio, a qual as partes elegem como regras procedimentais.
Como o próprio nome sugere, a arbitragem institucional utiliza uma plataforma
de anuência, pelas partes, às regras preestabelecidas por uma instituição arbitral,
responsável pela administração do procedimento.
Tais regras, por sua vez, já são existentes, visto que integram os normativos e
regulamentos da instituição, e devem ter sido analisadas e escolhidas pelas partes
na época da elaboração da convenção arbitral, embora a lei assim não exija, mas
parte-se da premissa de que, para anuir a determinada forma procedimental, mister
que dela se conheça, ou corre-se o risco derivado da omissão da parte, nesse
sentido, em aceitar aquilo a que, embora não conhecesse mas lhe fosse
oportunizado conhecer, submeteu-se.
A administração do procedimento, que é feita pela instituição nos moldes de
seu regulamento interno, bem como o zelo legal são tarefas da instituição eleita
pelas partes, a fim de garantir que a sentença arbitral tenha todos os requisitos
necessários para ser executada e que o procedimento arbitral em si não tenha vícios
passíveis de serem suscitados eivados de nulidade.
Do que se espelha, na dicção da lei, as expressões “entidade especializada”
ou “órgão arbitral institucional” nada mais são senão organizações privadas, com ou
sem fins lucrativos, cujo objeto social é voltado à atividade de administração
procedimental arbitral.
Na realidade, não importa qual a sua denominação – instituto, câmara ou
centro – , pois a atividade a ser desenvolvida será aquela voltada apenas à
administração e jamais o julgamento do conflito.
Nessa linha, uma vez constituída e registrada na forma da lei de registro
público, a instituição arbitral surge como pessoa jurídica de direito privado, visto que
não há qualquer disposição legislativa específica sobre a atuação dessas
instituições ou mesmo da atividade de árbitro, além daquelas previstas na Lei n.
9.307/96.
Importante trazer à baila, nessa rubrica, uma questão relevante: uma vez que
a Lei de Arbitragem não desceu a minúcias, em relação à formação dos órgãos
institucionais arbitrais questiona-se, nesse âmbito, se entidades autônomas,
constituídas a partir de associações, entidades de classe, órgãos de
51
representatividade profissional ou econômica poderiam, dentre outras atividades,
projetar-se como órgãos arbitrais institucionais, criando câmaras de mediação,
conciliação e arbitragem, ainda que por meio de uma nova pessoa jurídica, mas no
corpo da própria entidade ou em seus domínios administrativos.
Preocupa e de certa forma exige redobrada atenção esse mister.
É que fica muito evidente que a origem da associação ou entidade em cena
representa determinada categoria ou interesses de um grupo específico, ao exercer
atividade de administração procedimental em arbitragens, sem que se verifique um
vício de origem relativo à administração e deliberação do procedimento arbitral, o
que poderia por si só sublimar os princípios da imparcialidade e isenção inerentes ao
instituto da arbitragem.
E, não obstante o fato de que a entidade arbitral não exercerá, por si, o poder
de dizer o direito, senão o árbitro eleito, nomeado e aceito pelas partes, afeto, por
sua via, aos termos do que dispõe o art. 18 da Lei de Arbitragem76, não demais
lembrar que, ainda assim, a própria condução dessa administração arbitral por
instituição com algum tipo de vínculo profissional ou comercial ou econômico entre
as partes ou entre uma das partes poderá parecer em análise superficial que
atingiria frontalmente princípios basilares da arbitragem.
É que, em que pese ser a instituição arbitral mera administradora dos
procedimentos arbitrais que lhe são confiados, e, assim, não exercer poder
jurisdicional, atua diretamente nas questões administrativas procedimentais que lhe
são confiadas.
Nesse particular, não demais lembrar que a uma as regras procedimentais
dela emanam; a duas, de alguma forma se verificaria um vínculo da instituição que
teria, inclusive, o poder regimental de indicar árbitros, caso a possibilidade estivesse
assente em seu regimento interno, o que pesaria desconfortável na relação.
Em se tratando de arbitragens institucionais, existem regras predefinidas
pelas câmaras arbitrais, as quais dispõem sobre as normas e os procedimentos da
arbitragem, as tabelas de custas, as taxas de administração e os valores dos
honorários arbitrais, que podem ser cobrados por hora de trabalho do árbitro ou
como um percentual sobre o montante total envolvido na disputa.
76
Art.18. O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário.
52
Todavia, em pensamento mais alinhado aos princípios adotados pela
arbitragem, não há risco que se possa atribuir ao rompimento à imparcialidade
dessas instituições por estarem vinculadas a determinados setores.
É que, à medida que as partes têm a opção de escolher os árbitros que
atuarão no caso concreto, estes devem respeitar o dever da imparcialidade e da
idoneidade, pena de terem suas decisões questionadas ou invalidadas.
Outro fato importante de se destacar é que as partes, ao elegerem uma
instituição para administrar o procedimento arbitral, fazem-no em comunhão de
vontades.
Portanto, as câmaras arbitrais, mesmo que vinculadas a entidades de classe
ou a determinados setores da sociedade, certamente atuantes no segmento,
possuem independência e regulamento próprio.
Na realidade, inegável que, em se tratando de órgão arbitral vinculado a
entidades de classe ou categorias especializadas, certamente a prestação da
arbitragem será igualmente mais direcionada, podendo servir como ponto referencial
à excelência de tal prestação.
53
4. CONVENÇÃO ARBITRAL
Da leitura da Lei de Arbitragem e de seus dispositivos nota-se que o
legislador tratou de forma conjunta da cláusula compromissória e do compromisso
arbitral, ambos espécies do gênero convenção de arbitragem.
O art. 3º da lei em comento estabelece que:
As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral.
Do que se vê, prevê a lei que as partes podem estipular que a solução de
eventual conflito seja dirimido por meio da arbitragem. Daí, fundamentalmente,
concorrerá a vontade dessas partes, que deverão, através de uma cláusula
compromissória ou compromisso arbitral, optar por esse meio extrajudicial de
composição.
A diferença basilar entre a cláusula e o compromisso arbitral é que, na
primeira, integra um contrato ou adendo a ele, em que as partes preveem a
utilização do instituto antes que ocorra um conflito; e no caso da segunda, ou seja,
de não terem as partes previsto, mediante cláusula compromissória, tal eleição, só
poderão dirimir seus litígios por meio da arbitragem, firmando, uma vez instalado o
conflito, um documento que se denomina compromisso arbitral.
Em qualquer caso, não obstante a forma com que instituam a arbitragem, esta
deverá ser sempre em comum acordo, livre e voluntariamente.
O legislador deu idêntico peso ao compromisso arbitral e à cláusula
compromissória, para fins de afastar-se a jurisdição estatal e trazer à jurisdição
privada a apreciação do conflito.
Nesse esteio, independentemente de em qual forma a convenção de
arbitragem foi firmada pelas partes dentre as que a lei autoriza, a verdade é que,
uma vez instituída entre estas, obriga-as e afasta o juiz, transferindo ao árbitro a
competência para julgamento de um conflito.
O caráter contratual da arbitragem exige a assinatura de convenção de
arbitragem, para que a declaração de manifestação de vontade das partes
envolvidas possa ser verificada.
54
É que, pautada no princípio da autonomia da vontade das partes, a
arbitragem prescinde de manifestação expressa da vontade dos envolvidos.
Para Carlos Alberto Carmona77:
A convenção arbitral, que produz efeitos contundentes, tem como contrapartida que demonstrar cabal, clara e inequívoca vontade dos contratantes de entregar a solução do litígio (atual ou futuro, não importa) à solução dos árbitros. O efeito severo de afastar a jurisdição do estado não pode ser deduzido, imaginado, intuído ou estendido. O consentimento dos interessados é essencial.
O legislador pátrio preocupou-se, obviamente, em proteger a vontade das
partes plasmada em documento que afasta a jurisdição estatal e avoca a jurisdição
privada.
Do que se percebe, o consentimento para arbitrar vai muito além da simples
aposição de assinatura pelas partes em documento que convencione a arbitragem:
em verdade, a vontade das partes, a sua conduta e a manifestação livre e clara
dessa vontade é que determinam a validade da eleição.
E, dentre os efeitos da convenção de arbitragem, pode-se notar que não
caberá ao juízo estatal, em primeiro plano, firmar considerações e decisões sobre a
existência, validade ou eficácia da convenção arbitral, uma vez que a própria
arbitragem tem como princípio legal conhecer de sua própria competência, poder
este que é legalmente conferido ao árbitro.
Observe-se a Lei de Arbitragem nacional:
Art. 8º A cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato em que estiver inserta, de tal sorte que a nulidade deste não implica, necessariamente, a nulidade da cláusula compromissória. Parágrafo único. Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória.
Ainda, na mesma lei:
Art. 20. A parte que pretender arguir questões relativas à competência, suspeição ou impedimento do árbitro ou dos árbitros, bem como nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, deverá fazê-lo na primeira oportunidade que tiver de se manifestar, após a instituição da arbitragem.
77
CARMONA, Carlos Alberto. Op. cit., p. 83.
55
§ 1º Acolhida a arguição de suspeição ou impedimento, será o árbitro substituído nos termos do art. 16 desta Lei, reconhecida a incompetência do árbitro ou do tribunal arbitral, bem como a nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, serão as partes remetidas ao órgão do Poder Judiciário competente para julgar a causa.
Portanto, em segundo plano, caberá ao Judiciário solver eventual impasse
relativo à convenção arbitral.
No Brasil, conforme frisa Carlos Alberto Carmona78, no procedimento arbitral
brasileiro a competência não é exclusivamente do árbitro, para todo e qualquer
impasse relativo à convenção arbitral ou mesmo resultado da arbitragem, destarte a
esteira enunciada pelo art. 7º da Lei de Arbitragem.
Tal solução não é utilizada apenas no Brasil, mas também na França,
Inglaterra e Estados Unidos79.
Desta feita, se uma das partes ajuíza ação no Judiciário cujo objeto em lide
derive daquilo que haviam convencionado submeter à arbitragem e o autor assim o
faça e o réu não alegue em preliminar a existência dessa convenção, a ação
prosseguirá na esfera judiciária porquanto não compete ao juiz estatal conhecer de
oficio da eleição em cena e, nesse particular, fica certo que as partes renunciaram
àquela eleição – pois já vimos previamente que a convenção de arbitragem em
verdade firma-se em sua análise, precipuamente, através do elemento “vontade das
partes” em submeter-se a ela.
Ao se convencionar a arbitragem, deve-se ter presente que ela será
autônoma perante a relação jurídica à qual se vincula, implicando, inclusive, a que a
nulidade desta não conduzirá à nulidade da convenção.
Uma vez constituída entre as partes, fica certo que renunciaram a jurisdição
estatal ao deslinde de questão controvertida, afastando o Judiciário de intervir no
mérito da demanda.
Dada a regra geral, mister análise, ainda que sumária, do compromisso
arbitral e da cláusula compromissória arbitral.
78
CARMONA, Carlos Alberto. Op. cit., p. 176. 79
BORN, Gary. Internacional commercial arbitration. Boston: Kluwer Law International, 2009, v. 1, p. 854.
56
4.1. Compromisso arbitral
O compromisso arbitral é um termo firmado entre as partes quando o conflito
já existe, manifestando sua concordância em submetê-lo à arbitragem, podendo ser
judicial ou extrajudicial.
Poderá ser feito em juízo ou fora dele. O compromisso judicial é válido para
aqueles processos que já tramitam no Poder Judiciário, que ainda não tiveram
sentença e cuja matéria verse sobre direito disponível, sendo celebrado por termo
nos autos perante o juízo em que tramita a demanda.
Por outro lado, o extrajudicial é celebrado por instrumento particular, assinado
por duas testemunhas, ou por instrumento público, fora do Poder Judiciário.
Na Lei de Arbitragem o compromisso arbitral vem definido no art. 9º80. No
entanto, este estudo, ocupando-se da análise das arbitragens eleitas por meio de
cláusulas compromissórias institucionais inseridas nos contratos de franquia, não
ampliará a matéria quanto ao compromisso arbitral, ficando, portanto, assim, apenas
entoadas suas nuanças.
Não nos aprofundaremos no tema do compromisso arbitral, visto que este
trabalho coaduna-se à cláusula compromissória institucional.
4.2. Cláusula compromissória
Ao contrário do compromisso arbitral, a cláusula compromissória é inserida
em contrato ou em termo apartado antes de surgido o conflito, o que faz com que
seja chamada de preventiva, ou seja, será utilizada apenas se daquele contrato
surgir alguma controvérsia, caso contrário não terá utilidade.
A definição de cláusula compromissória está prevista no art. 4º da Lei de
Arbitragem: “A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em
um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a
80
“Art. 9º O compromisso arbitral é a convenção através da qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial.
§ 1º O compromisso arbitral judicial celebrar-se-á por termo nos autos, perante o juízo ou tribunal, onde tem curso a demanda.
§ 2º O compromisso arbitral extrajudicial será celebrado por escrito particular, assinado por duas testemunhas, ou por instrumento público.”
57
surgir, relativamente a tal contrato".
Segundo Selma Lemes81:
A cláusula compromissória, ou cláusula arbitral é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se em submeter à arbitragem os litígios que dele decorrerem. Não existe ainda a controvérsia, mas surgindo, no futuro, será submetida à arbitragem (art. 4º).
Quando surgem os conflitos, os ânimos dos contratantes já estão bastante
alterados, fazendo com que qualquer questão anexa seja motivo para novos
conflitos.
Surte daí a importância da análise da cláusula compromissória para que, na
eminência de um conflito, esteja apta a dar início ao procedimento arbitral da forma
convencionada, evitando-se, assim, qualquer procedimento judicial nesse sentido.
Segundo José Emilio Nunes Pinto:
Não resta a menor dúvida de que será sempre mais fácil para as partes acordarem quanto à forma de instituição da arbitragem e de seu processamento quando da negociação do instrumento contratual que regule as suas relações. Surgida a controvérsia, as circunstâncias em que a mesma venha a surgir podem servir de empecilho para que se chegue ao consenso que, no limite, obrigariam as partes a recorrer ao Judiciário, com flagrante desvantagem para a continuidade de suas relações e celeridade na
solução pretendida82
.
Isso porque, no momento em que é inserida a cláusula compromissória em
um contrato, o conflito é potencial e, portanto, sua aplicabilidade surgirá com os
conflitos instados, o que não acontece com o compromisso arbitral, já que neste as
partes fazem opção pela solução arbitral após o surgimento do conflito, estando
todas as questões então trazidas já resolvidas.
É importante lembrar que o § 1º do art. 4º da Lei de Arbitragem define que
citada cláusula pode estar inserida no bojo do mesmo contrato ou em documento à
parte. Portanto, o compromisso de contratar a arbitragem pode, todavia, ser anterior,
simultâneo ou posterior ao contrato principal.
81
LEMES, Selma Maria Ferreira. Arbitragem em propriedade intelectual. Disponível em: <http://www.selmalemes.com.br/artigos/artigo_juri34.pdf>. Acesso em: 9 dez. 2012. 82
Pinto, José Emilio Nunes. As vantagens da cláusula compromissória clara e precisa para a condução da arbitragem. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link= revista_artigos_leitura&artigo_id=3978>. Acesso em: 10 mar. 2014.
58
É mister fazer referência a uma das principais características da cláusula
compromissória, a sua autonomia, ou seja, ela é autônoma em relação ao contrato
em que estiver inserta, de tal forma que a nulidade deste não implica, fatalmente, a
própria nulidade da cláusula compromissória.
Exigência legal é de que seja estipulada por escrito, com vistas justamente
em afastar qualquer dúvida relativamente à vontade das partes em instituí-la.
O Brasil adotou sistemática que permite a instituição do juízo arbitral com a
contratação de cláusula compromissória arbitral, não havendo a necessidade de
compromisso arbitral. Importante esclarecer que para o procedimento arbitral é
indispensável que a cláusula arbitral tenha sido estabelecida como cláusula cheia,
podendo ser institucional ou ad hoc.
É possível a eleição da arbitragem através de cláusula compromissória vazia,
todavia não é uma condição ideal, uma vez que normalmente tais problemas de
construção clausular são vistos no momento em que as partes utilizam-se (ou
pretendem utilizar-se) dela – e obviamente não seria um momento favorável para
sua reconstrução sob forma de cláusula cheia e perfeita, dadas as condições
desfavoráveis do momento.
Para Francisco José Cahali83:
Firmar compromisso, por certo, não é imprescindível à instituição da arbitragem, porém, este foi o meio pelo qual encontrou a lei para, diante da cláusula vazia, sistematizar as providências tendentes a efetivar submissão do conflito ao juízo arbitral.
Em verdade, ao celebrarem a cláusula compromissória, outro não seria o
intuito das partes senão, em agindo em colaboração, criarem um mecanismo que
possam aplicar para solverem de suas controvérsias futuras e nos limites daquilo
que convencionaram.
Sendo assim, indubitável que se alinham as partes, para a conclusão da
cláusula, na direção da boa-fé, com identidade de propósitos nesse sentido, e em
referencial posto pela Lei de Arbitragem, como no Código Civil brasileiro,
notadamente no art. 422, quando trata da execução dos contratos.
Diante dessas considerações, importante ponderar que as cláusulas
compromissórias podem conter todos os elementos legais que identifiquem, com
segurança, as regras as quais se submetem as partes ao instituírem-na, o que, sem
83
CAHALI. Francisco José. Op. cit., 2011, p. 116.
59
maiores embargos, torna imediata a instauração da arbitragem, por provocação de
uma dessas partes, ou, em caso de existência de cláusula vazia e inexistindo acordo
entre elas quanto à forma de se instituir a arbitragem, será sempre necessário a
propositura da ação prevista no art. 7º da Lei n. 9.307/96.
E, muito embora ainda exista posicionamento contrário, segundo o qual é
necessária a existência de compromisso arbitral mesmo na presença de cláusula
arbitral cheia, a questão já é pacificada no Brasil84.
Nesse sentido Carlos Alberto Carmona85:
[...] a lei de arbitragem deixou absolutamente clara a sua intenção de dar por instituída a arbitragem tão logo o árbitro (ou os árbitros) aceite o encargo (art. 19), e tal aceitação pode ocorrer tanto por força da cláusula como do compromisso. Exigir cláusula e compromisso
parece-me, portanto, um verdadeiro bis in idem.
Assim sendo, com a cláusula cheia, a arbitragem poderá ter seu início sem a
intervenção do Poder Judiciário.
Registre-se que depois da Lei de Arbitragem a cláusula compromissória
deixou de ter caráter de pré-contrato e passou a ter efeitos próprios.
Nos termos do que estabelece o sistema arbitral brasileiro, não se admite
cláusula arbitral tácita, sendo sempre necessária e indispensável a manifestação de
vontade de forma expressa para que a arbitragem seja considerada válida.
É expressa a determinação constante do art. 4º da Lei de Arbitragem quando
estabelece no § 1º: “A cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito,
podendo estar inserta no próprio contrato ou em documento apartado que a ele se
refira”.
4.3. Tipos de cláusula compromissória
Quanto aos tipos de cláusula compromissória pode-se, para efeitos de bem
analisá-las, dividi-las em: cheias, vazias, patológicas ou escalonadas, combinadas
(ou fracionadas).
84
A posição contrária é defendida em sua maioria por processualistas como José Carlos Barbosa Moreira, Humberto Theodoro Júnior, Alexandre Freitas (CARMONA, Carlos Alberto. Op. cit., p. 78). 85
CARMONA, Carlos Alberto. Op. cit., p. 78.
60
Diz-se cláusula cheia aquela que “se constitui no padrão pretendido e que
permite a instauração de plano do procedimento arbitral”86.
A cláusula compromissória será cheia na medida em que for suficiente para
que se instaure o procedimento arbitral. Poderá em seu texto fazer menção à
arbitragem institucional ou ad hoc desde que verse sobre todos os pontos
indispensáveis para abertura do procedimento.
A cláusula cheia, por conter todos os requisitos que a lei determina mínimos
para a instituição da arbitragem eficaz, deve ser acordada contemplando o número
de árbitros (sempre ímpar); a sede da arbitragem; a lei aplicável; o idioma (previsão
normalmente quando houver partes estrangeiras); as regras para a arbitragem (se
reportar às regras de algum órgão arbitral institucional ou uma entidade
especializada ou mesmo delegar ao árbitro ou tribunal que regulem o procedimento);
os limites da arbitragem; a autorização ou não para o julgamento por equidade; a
responsabilidade pelo pagamento de honorários e despesas com a arbitragem.
Ainda assim o são, pois que redigidas com clareza suficiente a que as partes
signatárias evitem que a instituição dela, já de per si, estabeleça controvérsias.
Pode-se, além daquelas que a lei considera mínimas para a eficaz instituição
da arbitragem, descer a minúcias, como, por exemplo, indicar o nome do árbitro que
irá atuar quando ocorrida a questão controvertida.
Segundo José Emilio Nunes Pinto87,
[...] a cláusula compromissória bem redigida, com clareza e precisão do escopo e termos, há de agregar inúmeras vantagens a todo o procedimento arbitral, lembrando-se sempre de seu efeito vinculativo para as partes, seus sucessores e cessionários a qualquer título.
Sem dúvida, a forma segura de convencionar a cláusula arbitral cheia dá-se
mediante as regras de uma instituição arbitral, visto que as partes se vinculam ao
procedimento regimental da entidade eleita, reportando-se às cláusulas do
regulamento interno da instituição.
86
PINTO, José Emilio Nunes. Cláusulas arbitrais patológicas – esse mal tem cura. Disponível em: < .mundojuridico.adv.br cgi-bin upload texto82 .rtf >. Acesso em: 10 mar. 2013. 87
PINTO, José Emilio Nunes. As vantagens da cláusula compromissória clara e precisa para a condução da arbitragem. Disponível em: <http://www.mundojuridico.adv.br>. Acesso em: 10 mar. 2014.
61
Destarte, a cláusula cheia por si só, é suficiente para que o árbitro assuma
sua função e dê início ao processo arbitral, sem que haja necessidade de qualquer
outra providência.
Por outro lado, na cláusula vazia, também denominada cláusula em branco,
não há condições de ser iniciado o procedimento arbitral, pois ausentes as
informações mínimas necessárias a tanto. Estas podem ser definidas como a
“versão em negativo das cláusulas cheias”88.
Assevera, nesse sentido, inclusive, Francisco José Cahali89, que tais
cláusulas, na própria acepção do termo, seriam aquelas em que a previsão de
arbitragem traz uma lacuna quanto à forma de instauração do procedimento arbitral,
que deverá ser suprida.
Nesses tipos de cláusula, por exemplo, não consta forma de nomeação de
árbitros, como se dará o chamamento da parte adversa para o início do
procedimento, forma de remuneração dos árbitros entre outros pontos
indispensáveis a possibilitar o início do procedimento. Em verdade, apenas
discorrem sobre a eleição de dirimir qualquer eventual problema resultante daquele
pacto pela arbitragem.
O cuidado com relação à inserção de cláusula, para que não se constitua
vazia, é de rigor, pois uma vez surgido o conflito a impossibilidade de instauração do
procedimento arbitral trará consequência às partes.
José Emilio Nunes Pinto90 assevera que:
[...] não sendo possível instaurar-se de plano a arbitragem, o desequilíbrio da equação é agravado. Desequilíbrio decorrente da controvérsia que é potencializado pela impossibilidade de se instaurar a arbitragem como pretendido.
Em assim ocorrendo, a questão pode ser dirimida pelas partes com a
confecção de um compromisso arbitral, que estabelecerá as normas a serem
utilizadas no procedimento.
88
PINTO, José Emilio Nunes. Cláusulas arbitrais patológicas – esse mal tem cura. Disponível em: .mundojuridico.adv.br cgi-bin upload texto82 .rtf . Acesso em: 10 mar. 1013. 89
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 126. 90
PINTO, José Emilio Nunes. Cláusulas arbitrais patológicas – esse mal tem cura. Disponível em: .mundojuridico.adv.br . Acesso em: 10 mar. 2013.
62
Mas nem sempre no momento em que se instala um conflito as partes
preservam a mesma conexão inicial que tiveram ao firmarem o negócio a que se
atrela a cláusula arbitral.
Diante disso, surge um problema, que é a resistência de uma das partes em
assinar o termo, admitindo a lei, em casos tais, que, conforme o art. 7º da Lei
Arbitral, a parte proponha a ação perante o Poder Judiciário, para firmar ou não a
competência da arbitragem para julgar e processar aquela demanda ou mesmo por
disposição das partes, através de um termo de compromisso arbitral.
Diferentemente, se a cláusula vazia pode ser corrigida sem intervenção
estatal, a cláusula patológica não dá margem a essa possibilidade. É que a cláusula
patológica, porquanto seja aquela de conteúdo dúbio, incompleto ou impreciso,
sublimando em sua essência a real intenção das partes quando de sua origem
redacional, e, assim denominadas pois “padecem de um mal crônico que as
acometeu quando de sua criação”91.
Como exemplo de cláusula patológica, José Emilio Nunes Pinto92 sugere um
caso em que a cláusula prevê as regras da Câmara de Comércio Internacional de
Paris – CCI para serem aplicadas por uma instituição brasileira, pois tais regras
foram desenvolvidas para a estrutura daquela instituição e, portanto, incompatíveis
com a estrutura das instituições brasileiras.
Consequentemente, a inviabilidade da utilização da cláusula patológica acaba
por derivando na impossibilidade de se instaurar a arbitragem ante a ausência de
consenso entre as partes a tal ponto que a parte somente conseguirá dar início ao
procedimento arbitral se contar com a boa vontade da outra ou socorrer-se do Poder
Judiciário, dados os elementos omissos da cláusula patológica.
Dessarte, uma cláusula pode ser considerada patológica quando não cumpre
ao menos quatro funções: não produz efeito obrigatório entre as partes; não dá aos
árbitros o poder de resolver o litígio, permite a intervenção da jurisdição estatal para
solver o conflito; não permite a organização do procedimento de modo que conduza
a uma sentença arbitral93.
91
PINTO, José Emilio Nunes. Cláusulas arbitrais patológicas – esse mal tem cura. Disponível em: <www.mundojuridico.adv.br . Acesso em: 10 mar. 2013 92
PINTO, José Emilio Nunes. Cláusulas arbitrais patológicas – esse mal tem cura. Disponível em: .mundojuridico.adv.br . Acesso em: 10 mar. 2013 93
DERAINS, Yves. El contrato de arbitraje: cláusulas compromissórias patológicas y conbinadas. Legis: Universidad del Rosario, 2005, p. 191.
63
É que a cláusula arbitral tem o intuito de possibilitar a instauração,
organização e desenvolvimento da arbitragem, agregando valores. Todavia, uma
vez confusa, ambígua, contraditória, dentre outros atributos do gênero que possam
retirar-lhe a eficácia para a utilização vinculativa da arbitragem, torna-se inoperante.
Pela cláusula arbitral patológica, pode-se afirmar, no mais das vezes, que, em
verdade, a intenção das partes foi efetivamente utilizar-se do instituto para
solucionar eventuais questões controvertidas previstas no instrumento firmado entre
elas, sem que se possa dimensionar, efetivamente, elemento substancial dessa via
eleita – e, em algumas situações, pode ser que a própria opção das partes à
utilização da arbitral, pesem dúvidas, como exemplifica Francisco Cahali94:
[...] indicação do regulamento de uma instituição, porém para ser administrada por entidade diversa, com regras contrárias àquelas previstas ou até mesmo para ser desenvolvida por árbitro único, impossibilitando a utilização de algumas previsões; [...] as partes elegem o foro da Comarca de São Paulo para as questões decorrentes de contrato a serem dirimidas por arbitragem judicial, ou, ainda, os conflitos serão resolvidos por arbitragem dos juizados especiais de pequenas causas.
Importa, em análise da validade da instituição arbitral em casos tais, que a
vontade das partes, quando nos deparamos com cláusulas vazias, esteja
suficientemente clara, o que preservaria um mínimo de eficácia na utilização do
instituto.
Caso contrário, recomenda Francisco José Cahali95 sejam invalidadas ou
interpretadas inexistentes sob ótica restritiva e de rigor extremo, sob pena de, uma
vez instado o conflito, ensejarem a exposição sentencial a invalidação final pelo
Judiciário.
Não obstante, caso a vontade das partes em utilizarem-se da arbitragem
esteja suficientemente cristalina, embora a cláusula esteja defeituosa, pode-se
instaurar procedimento arbitral, adaptando-se a vontade das partes e utilizando-se
dos princípios da cláusula arbitral antes vistos, de forma a preservar-se seu efeito.
A par da questão da vinculação da cláusula, quando ainda de inviável acesso,
será dirimida nos termos com que refere a Lei de Arbitragem, através de seu art. 7º,
em que a parte interessada busca, através do Judiciário, o compromisso arbitral da
parte adversa.
94
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 134. 95
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 135.
64
Quanto à cláusula escalonada, pode-se dizer daquelas em que se utiliza a
arbitragem híbrida, ou seja, estipula-se a utilização da mediação ou conciliação
previamente à arbitragem.
Normalmente, tal formato é utilizado em instituições arbitrais para comporem
a solução de questões controvertidas, submetendo às partes em lide, previamente
ou durante o próprio procedimento arbitral, as técnicas compositivas não
contenciosas.
Fernanda Levy96 retrata que
Esse escalonamento pode ocorrer de duas maneiras: pela previsão inicial de mediação e caso ela reste infrutífera no sentido de obtenção do acordo, continua-se a gestão do conflito com a
arbitragem (cláusula arbitral escalonada med-arb) ou no sentido
inverso, iniciado o procedimento arbitral, ele é suspenso para que a mediação se desenvolva, para em seguida ser retomado para a homologação do acordo ou continuidade do procedimento arbitral
(cláusula arb-med).
Sem dúvidas, o resultado positivo na utilização desse formato de solução
conflitual geralmente coaduna-se aos feitios de contratos em que as partes mantêm
relações comerciais, de forma continuada e no advento do conflito, parte dessa
relação interessa a continuidade, possibilitando em fase prévia da arbitragem,
apararem as arestas e obterem um consenso, solvendo o conflito e submetendo o
entendimento delas e acertamento, à homologação por um árbitro.
Não demais lembrar que, uma vez que tenham as partes disposto a instituição
da arbitragem através de cláusula escalonada, outro não poderia ser o entendimento
senão a aplicação de todos os métodos eleitos, uma vez que não se trata de opção
por um ou outro, mas em escala como o próprio nome conceitual remete.
A forma híbrida mais conhecida seria a utilização da med-arb, modalidade
normalmente prevista em cláusula contratual em que, de forma escalonada, as
partes se dispõem a solucionar a questão controvertida apresentada, inicialmente,
através de mediação que, caso inexitosa, passa a ser objeto da arbitragem.
Nessa modalidade, normalmente também o mediador atuará como árbitro,
situação que, se, por um lado, possa dar a entender que haveria certa distorção na
figura do mediador quando ocupasse posição de árbitro, já que ambas as formas
pressupõem ambientes e técnicas diferentes, por outro lado pode-se entender
96
LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Cláusulas escalonadas: a mediação comercial no contexto da arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 200.
65
proveitoso em razão de que o antes exercido papel de mediador tornaria o árbitro
mais a par do cenário do conflito e suas nuanças. De dizer que não se encontra
proibição legal alguma para que o árbitro atue como mediador ou mesmo
conciliador.
No med-arb, assim como em todos os métodos híbridos, ao se utilizar as
vantagens da mediação e da arbitragem para a solução eficaz de um conflito,
inicialmente a audiência inaugural serve para facilitar a mediação, enquanto no
med/arb a mediação vem primeiro e, se mal sucedida, submete-se o caso à
arbitragem.
Destarte, as formas híbridas podem combinar-se entre si, na utilização de
duas ou mais formas alternativas para solução de conflitos e, considerando-se,
inclusive, no caso concreto, variadas etapas para o objetivo de solver a controvérsia
instaurada, é possível justapor-se esses diferentes métodos.
Conforme Richard Hill97, cada método cumpre determinados fins, da mesma
forma como na medicina há diversos medicamentos para curar diversos graus de
uma mesma enfermidade.
O método a ser aplicado dependerá sempre daquilo que as partes
convencionarem, mas deve-se para tanto considerar, sendo o intuito óbvio solver
controvérsias, que aquele eleito à aplicação seja adequado a determinado caso
concreto.
De qualquer forma, a solução conflitual, quer pela mediação, quer pela
conciliação, quer pela arbitragem ou seus meios híbridos, fica cada vez mais
sedimentada em nível nacional.
Por derradeiro, de registrar que há outra forma de cláusula arbitral, pouco
utilizada ainda, mas que vem firmando espaço no terreno da arbitragem, como
indica Selma Ferreira Lemes98:
[...] Cada vez mais se verifica a necessidade de moldar as formas extrajudiciais de solução de controvérsias às especificidades de contratos complexos [...] Por todas essas razões, a indicação da arbitragem e a eleição de foro num mesmo contrato podem ser válidas e eficazes [...]
97
HILL, Richard. The theoretical basis of mediation and other forms of ADR: why they work. Arbitration International, LCIA, v.14, n. 2, 1998. 98
LEMES, Selma Ferreira. Cláusulas combinadas ou fracionadas. Revista do Advogado, AASP, ano 33, n. 19, p. 153-154, abr. 2013.
66
Nesse pensar, vislumbram-se as chamadas cláusulas arbitrais combinadas ou
fracionadas, ou seja, sincronizadas, que permitem às partes, no âmbito de suas
vontades, fracionarem um contrato e elegerem, por exemplo, leis diferentes para
reger cada matéria nele contida ou mesmo, nesse fracionamento, a eleição da
justiça estatal e da arbitral para cada questão delimitada na cláusula.
Tal modalidade permite ainda que questões contratuais versadas em direitos
indisponíveis sejam submetidas à jurisdição estatal e as relativas aos direitos
disponíveis pactuados sejam dirimidas por meio da arbitragem.
Nessa via, a cláusula fracionada permitiria que se preservasse a utilização da
arbitragem em determinados e delimitados contextos do contrato a que ela se
coaduna, e que se remetesse ao Judiciário aqueles que sejam de competência
exclusiva deste ou mesmo que tenham assim estipulado as partes.
Da doutrina de Carlos Alberto Carmona99, acrescenta-se:
[...] enganam-se portanto aqueles que veem alguma patologia por conta da inserção, num mesmo contrato, das duas cláusulas: a convivência de ambas é pacífica, não havendo necessidade de conceber artifícios interpretativos, muito menos de investigar eventuais intenções das partes para excluir uma ou outra avença.
No entanto, especial atenção merece a redação dessas cláusulas, tendo em
vista que devem guardar sintonia entre si, não podendo dar previsão contraditória,
de modo que uma negue a aplicação da outra, sob pena de, consequentemente,
encaminhar a cláusula a sua invalidade ou inoperância.
4.4. A cláusula compromissória institucional
Da redação do art. 5º da Lei n. 9.307/96 nota-se a possibilidade de o
procedimento arbitral seguir as regras contidas e preestabelecidas pelo regulamento
de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada, desde que eleita pelas
partes.
Nesse particular, estariam as partes concordes em aderir às regras do
procedimento regimental institucional, para dirimirem seus conflitos, inserindo na
convenção arbitral, que a estas se submetem.
99
CARMONA, Carlos Alberto. Op. cit., p. 122.
67
As partes, ao elegerem uma câmara arbitral, por meio de uma cláusula
compromissória institucional, certamente contam com um fator primordial: a fluidez
do procedimento.
É que não se pode arredar que tais regulamentos internos, que regerão o
procedimento arbitral institucional, em razão da especialidade na administração do
processo arbitral e sua condução, expressam soluções consistentes para problemas
comuns que surgem rotineiramente em procedimentos arbitrais.
Destaque-se ainda que, uma vez eleita pelas partes a instituição arbitral, a
cláusula compromissória, porquanto tem força coercitiva, terá em caso de eventual
rejeição por uma das partes, uma vez instalado o conflito, seu prosseguimento, de
acordo com as regras da instituição.
Caso contrário, e aí reside a vantagem de as partes firmarem cláusula
compromissória institucional, o conflito relativo à eleição da justiça privada ao
deslinde da controvérsia será levado ao Judiciário, que decidirá sua instituição,
jamais o mérito da causa.
Nesse sentido orientação de Marco Dewiggi100:
É imprescindível se destacar, porém, a importância da correta redação de
uma cláusula arbitral. Cláusulas mal redigidas e incompletas podem impedir a
instauração e desenvolvimento do procedimento arbitral. Nesse sentido, nossa
sugestão é que a cláusula arbitral a ser pactuada seja sempre cheia, reportando-se
às regras de uma câmara arbitral reconhecida e idônea.
Assim, na cláusula compromissória institucional nem sequer torna-se
elemento imprescindível a eleição do árbitro, senão, na maioria das vezes, da
própria instituição, que administrará o procedimento.
4.5. Cláusula compromissória e contrato de adesão
No cenário atual, visualiza-se uma crescente preocupação com o direito sob o
ponto de vista da tutela dos interesses sociais.
Assim, por via de consequência, as limitações à vontade das partes
encontram-se policiadas em decorrência da massificação pactual, resultado da
100
DEWIGGI, Marco. Franquia x arbitragem: vantagens no momento da solução do litígio. Jornal do Comércio, A15, 11 ago. 2010.
68
fomentação do mundo comercial que, para acompanhar as exigências e velocidades
negociais modernas, fez quase que desaparecer as contratações individuais,
aflorando com mais volume e intensidade os instrumentos contratuais de massa, ou
seja, derivados de um mesmo produto posto no mercado, têm suas cláusulas e
condições predispostas em um instrumento.
Esse tipo contratual, obviamente, no mais das vezes, favorece os interesses
do contratante que disponibiliza o produto ou o serviço, não admitindo à outra parte
liberdade de manifestar com uma plenitude sua vontade pactual, senão em
submeter-se às regras impostas em negócios similares.
São os chamados contratos de adesão, que reconhecidamente legais pela
legislação pátria, devem preencher alguns requisitos para que possam ser
considerados válidos e eficazes.
A experiência, no entanto, permite-nos afirmar que o aderente mais
interessado no produto ou serviço adquirido nem sequer lê o que está assinando e
daí a preocupação em proteger aquele que aderiu.
E não se trata de dar agasalho àquele que por ato de sua própria desídia
deixou de observar, antes da contratação adesiva firmada, pleno e prévio
conhecimento daquilo que contratava; mas, pelo contrário, de proteger aquele cuja
vontade própria viu ser subjugada pela vontade do outro, que ditou as próprias
regras, não tendo o aderente mais que duas opções, senão firmar ou não firmar o
instrumento.
No que pertine à arbitragem, os §§ 1º e 2º do art. 4º da Lei de Arbitragem
mencionam os elementos que devem conter na cláusula compromissória.
Nesse caso, importa destacar o mencionado no § 2º:
Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o
aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente,
com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito,
com a assinatura ou visto especialmente para esta cláusula.
Conforme Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery101:
[...] Como medida protetiva ao aderente, a norma dispõe que, nos contratos de adesão, a cláusula compromissória pode ter eficácia, desde que seja de iniciativa do aderente. Sendo de iniciativa do
101
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade; Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 7. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 1432.
69
estipulante, deve vir expressa em caracteres destacados (negrito), em contrato escrito. A cláusula compromissória de iniciativa do estipulante deve ser pactuada em documento anexo e não no próprio formulário do contrato de adesão. Isto para não deixar dúvidas de que o aderente concordou expressamente com a cláusula compromissória [...]
Ainda, da mesma doutrina, tem-se que o regime jurídico da Lei de Arbitragem
aplica-se a todo e qualquer contrato de adesão, seja de relação civil, comercial ou
de consumo102.
Pois bem, do que se depreende relativamente à adesividade pactual, e daí
independe se na seara das relações consumeristas ou não, que o Lei de Arbitragem
brasileira tratou de solver o impasse, quando determinou condições aos contratos de
adesão, e, notadamente, no que se refere à inserção compulsória de cláusula
compromissória cuja legislação, deixa certo que, para que a cláusula
compromissória tenha validade e eficácia, o aderente deverá ter a iniciativa de
instituir a arbitragem, e só terá validade se for instituída de forma "expressa", onde o
aderente concorda com a sua instituição, devendo ser estabelecida em documento
apartado (anexo), ou feito em negrito, com assinatura ou visto do aderente
especialmente para essa cláusula. Caso não sejam respeitados esses requisitos, a
cláusula compromissória não terá validade nem eficácia nos contratos de adesão e
em relações consumeristas.
E aqui, fique suficientemente claro, repisamos que a letra legal não abrange
apenas a relação de consumo, senão de qualquer relação adesiva, primando-se
que, ao anuir a cláusula compromissória em contratos de adesão, o aderente tenha
pleno conhecimento da eleição da jurisdição selecionada, já que consequências
jurídicas importantes são advindas dessa eleição.
É que, com lastro na vontade das partes, em muito se dissociam a ideia da
contratação adesiva e a eleição da jurisdição arbitral nesse tipo de contrato, afinal,
característica da adesividade é justamente a existência de uma sobreposição da
vontade de um em detrimento da do outro, o que impediria, em verdade, que se
pudesse verificar, no caso da eleição da arbitragem nesses contratos, a livre
manifestação de vontade por ambas, caracterizada, então, a possível
compulsoriedade da arbitragem.
102
Regulamentado no Código de Defesa do Consumidor, art. 54.
70
Nessa esteira, constata-se pertinente a inserção de cláusula compromissória
em contratos adesivos. O art. 4º, § 2º, da Lei n. 9.307/96 permite-nos ao menos
duas vias para efetivar a arbitragem, ou seja, a uma, ao estabelecer que a cláusula
só terá eficácia se o aderente permitir e der início ao procedimento ou, ao prever a
arbitragem, esta seja previamente levada a conhecimento e aceite expresso pelo
aderente, ocasião em que firmam as partes o contrato e a eleição da arbitragem no
mesmo documento ou em anexo a ele, desde que a cláusula arbitral esteja em
negrito e com visto exclusivo para a cláusula.
Relativamente ao primeiro modo citado, de certa forma fica a arbitragem sem
efeito vinculante em relação ao aderente, afinal dele é o “poder de manus”; em
relação à segunda opção legal, não há questionamentos do efeito vinculativo da
cláusula compromissória inserta nos contratos de adesão, de tudo quanto se
observa.
Limitado, portanto, de certa forma, o limite de predisposição relativamente à
arbitragem, em contratos adesivos, em detrimento dos contratos livremente
negociados.
Nesse sentido, importante mencionar, a título exemplificativo, notícia
publicada pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem – CBAr a respeito de decisão do
TJSP relativamente à cláusula compromissória inserta em contrato empresarial
adesivo e cuja redação clausular não se coadunava às exigências legais, verbis103:
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) julgou ser nula a cláusula que estabelece o uso de arbitragem em um contrato de adesão firmado por um microempresário com a Ambev. Após analisar o processo a 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do tribunal levou em consideração o fato de a cláusula não estar redigida de acordo com os requisitos previstos na Lei nº 9.307, de 1996, que trata da arbitragem. A ação foi proposta por um empresário que firmou dois contratos com a Ambev para abrir quiosques em supermercados no Estado do Rio de Janeiro que venderiam produtos da cervejaria. De acordo com o advogado do autor do processo, Carlos Alberto da Silva, os estabelecimentos seriam instalados em hipermercados em São Gonçalo e Niterói (RJ). Posteriormente, entretanto, o autor da ação foi informado de que os locais não permitiam sublocação, e o negócio não poderia ser continuado. Silva estima, entretanto, que seu cliente tenha gasto em torno de R$ 15 mil com a abertura das empresas, despesas com contador, uniformes e capas para proteger os quiosques. O contrato previa que eventuais
103
CBAr. Valor econômico – Cláusula de adesão é nula em questões empresariais. Disponível em: <http://cbar.org.br/site/blog/noticias/valor-economico-clausula-de-adesao-e-nula-em-questoes-empresariais>. Acesso em: 22 abr. 2014.
71
problemas deveriam ser resolvidos por meio de arbitragem. Pleiteando a anulação da cláusula e danos morais e materiais o empresário procurou a Justiça. “As custas com o tribunal arbitral seriam cerca de R$ 60 mil a R$ 70 mil, e meu cliente não possui esse dinheiro”, afirma o advogado. O relator do caso no TJ-SP, desembargador Tasso Duarte de Melo, considerou que a redação da cláusula de arbitragem no contrato não estava de acordo com o disposto no parágrafo nº 4 da Lei 9.307. A norma estipula que em contratos de adesão a cláusula é nula se não for escrita em um documento anexo ou em negrito. Melo também considerou que a norma que rege a arbitragem não estipula que cabe apenas ao árbitro decidir sobre a nulidade da cláusula e, portanto, se o tribunal arbitral não estiver formado, o Judiciário pode se pronunciar sobre ela. “Exigir que o apelante leve a sua demanda ao árbitro é incongruente com a própria posição defendida por ele, de não concordar com a arbitragem, por entender que a cláusula compromissória é nula”.
Se, por um lado, como referido na mencionada notícia, tal decisão teria
“enfraquecido a arbitragem no Brasil”, segundo o advogado Marcos Fioravanti, pois
que, para ele, “A Lei determina que o tribunal arbitral deve dizer se tem competência
ou não para analisar um assunto. Se ele disser que a cláusula é nula, abre espaço
para o Judiciário”104, na visão de Thereza Arruda Alvim105, a decisão está coadunada
à lei, já que a cláusula posta teria infringido dispositivo legal e, nesse esteio, não se
haveria de negar vigência ao dispositivo que afasta a cláusula.
Fica premente, dessa forma, que não se deve descuidar de algumas questões
que poderiam ensejar dúvidas, notadamente aquelas relativas à cláusula
compromissória em contratos de aceitação de regras em bloco106.
104
FIORAVANTI, Marcos. <http://cbar.org.br/site/blog/noticias/valor-economico-clausula-de-adesao-e-nula-em-questoes-empresariais>. 105
ALVIM, Thereza Arruda. <http://cbar.org.br/site/blog/noticias/valor-economico-clausula-de-adesao-e-nula-em-questoes-empresariais>. 106
Relativamente à questão de suposta hipossuficiência do empresariado, no validar da cláusula compromissória em cena, cabe retratar decisão do TJSP, de 2012, na Apelação n. 0183377-82.2011.8.26.0100 (número de origem: 583.00.2011.183377-9/000000-000), Comarca de São Paulo / Foro Central Cível / 5ª Vara Cível, tendo como relator Tasso Duarte de Melo, em decisão proferida em 18 de dezembro de 2012, julgou ser nula a cláusula que estabeleceu a arbitragem em um contrato de franquia firmado entre um microempresário e uma fabricante de bebidas, por não terem observado a forma determinada na lei. “VOTO Nº 8368 Trata-se de recurso de apelação (fls. 417/434) interposto por Alex Cesar Rodrigues Alves contra sentença proferida pelo MM. Juiz da 5ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Capital, Dr. Marcos Roberto de Souza Bernicchi (fls. 407), que extinguiu sem resolução do mérito a ação declaratória de rescisão contratual c.c. reparação de danos ajuizada pelo Apelante em face da Apelada. O Apelante relata as razões de fato e de direito que embasam a sua pretensão de rescisão do contrato de franquia firmado entre as partes, por culpa da Apelada. Sustenta a nulidade da cláusula arbitral inserida neste contrato e a impossibilidade de se afastar a jurisdição estatal, na espécie. Subsidiariamente, pugna pela redução dos honorários advocatícios. Contrarrazões às fls. 442/459, em que alega que a competência para dirimir quaisquer dúvidas a respeito da validade da
72
Dessarte, a questão da hipossuficiência, a nosso ver, bem analisada na
decisão em comento e que agrega valor à arbitragem, com vistas a que, a uma, a
questão da adesividade contratual fica, no caso, vulnerável, ante as negociações
prévias havidas entre as partes para o fechamento do negócio, em que pese o
contrato ter característica, em primeira análise, de adesivo, e, a duas, no sentido de
que as mesmas negociações prévias havidas deram conta de que a relação
empresarial estabelecida não era de hipossuficiência, mas sim paritária.
Assim, ao se optar pela inclusão de uma cláusula compromissória em um
contrato, notadamente de adesão, a escolha do método de solução de conflitos
deverá ser decorrente da vontade das partes contratantes, obedecendo-se ao
clausulado dessa eleição, no sentido de estar adequado às exigências legais a
tanto, bem como que fique, sempre, muito clara a intenção das partes nesse sentido,
para evitar questionamentos futuros.
cláusula compromissória seria do árbitro, pela aplicação do princípio da competência-competência e, por isso, o Poder Judiciário só poderia se manifestar após o árbitro. Aduz a validade da cláusula compromissória, pois o contrato de franquia teria sido negociado, não sendo de adesão, e porque o Apelante teria consentido com a arbitragem. No mais, trata do mérito da causa, pugnando pela improcedência do pedido inicial. Cita doutrina e jurisprudência. É o relatório. À revisão. São Paulo, 21 de novembro de 2012. Tasso Duarte de Melo, Relator... DECISÂO:DECLARATÓRIA DE RESCISÃO CONTRATUAL C.C REPARAÇÃO DE DANOS. FRANQUIA. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. Previsão no de franquia cuja rescisão é pleiteada. Princípio da competência-competência. Exegese. Ação ajuizada Apelante perante o Judiciário. Ausência de qualquer ato para dar início à arbitragem. Inexistência de óbice legal ao Judiciário declarar a validade ou invalidade da compromissória antes do árbitro. Artigos 8º e 20 da Lei 9.307/96. Ausência de fixação de impedimento para a análise judicial prévia da validade da cláusula compromissória. Interpretação do princípio da competência- competência à luz das doutrinas alemã, suíça, americana, mexicana. Doutrina francesa que se mostra restritiva. Violação à garantia constitucional da duração razoável do processo e ao princípio da economia processual. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. Nulidade. Contrato de franquia que caracteriza contrato de adesão. Artigo 54 do CDC. Cláusula compromissória em contrato de adesão que deve estar em negrito ou em documento anexo, com a assinatura específica. Artigo 4º, § 2º, da Lei nº 9.307/96. Descumprimento. Retorno dos autos à vara de origem dilação probatória. Recurso provido”
73
5. ASPECTOS GERAIS SOBRE A FRANQUIA E OS CONTRATOS DE FRANQUIA
O termo “franquia” existe desde o tempo da Idade Média, na França, quando,
nas cidades francas, pessoas e bens tinham livre circulação e eram isentos de
pagamento de taxas e impostos ao poder central e/ou à igreja107.
Conforme Milman108, o termo “franquia” foi identificado já na Idade Média, na
França, com a expressão Franc, que significava a transferência de um direito,
concessão de um privilégio ou permissão exclusiva.
Essa outorga de direitos e privilégios, de certa forma, poderia ser considerada
como um sistema rudimentar de franquia.
Ocorre que o sistema de franquia como vemos hoje teve sua origem em
meados do século XIX, nos Estados Unidos, no ano de 1862, quando a companhia I.
M. Singer&Co, dedicada à fabricação de máquinas de costura, começou a utilizar
essa fórmula empresarial para o mercado absorver os seus produtos109.
Segundo José Cretella Neto110, o contrato de franchising começou a ser
utilizado nos Estados Unidos da América, após o término da Guerra Civil (1865),
quando a Singer Sewing Machine Company estabeleceu uma rede nacional de
revendedores, com a sua marca, a fim de escoar a fabricação de seus produtos.
Com a necessidade de as empresas norte-americanas do norte do país
expandirem o seu mercado industrial após a guerra civil, através da colaboração dos
comerciantes locais, iniciou-se, então, o verdadeiro sistema de franquia: a
colaboração entre empresários independentes para a obtenção de um fim comum.
Segundo Roberto Cintra Leite111, o sistema de franchising teve seu auge logo
após a Segunda Guerra Mundial, quando muitas companhias começaram a adotar
esse conceito para negociar os seus produtos em concessionárias e distribuidores
oficiais. Esse foi o caso de vários fabricantes de automóveis, como a Ford ou
General Motors, e de algumas companhias mais importantes de refrigerantes, como
107
DAHAB, S. Entendendo franchising. Salvador: Casa da Qualidade, 1996. 108
MILMAN, Fábio. Franchising. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1996, p. 31. 109
CHERTO, M. R. Franchising: revolução no marketing. São Paulo: McGraw-Hill, 1988. CHERTO, M. R.; RIZZO, M. 100 franquias internacionais inéditas no Brasil. São Paulo, 1994. 110
CRETELLA NETO, José. Curso de arbitragem: arbitragem comercial, arbitragem internacional, lei brasileira de arbitragem, direito privado brasileiro aplicável à arbitragem, instituições internacionais de arbitragem, convenções internacionais sobre arbitragem. 2. ed. Campinas-SP: Millenium, 2009, p. 312. 111
LEITE, Roberto Cintra. Franchising na criação de novos negócios. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1991.
74
a Seven Up ou a Coca-Cola, a qual aceitou expandir-se, em número de países, com
um sistema e formato equivalentes.
No ano 1929, a General Motors recorreu a um contrato que, mediante o
associativismo entre a central e os seus distribuidores, favoreceu a colaboração
entre as partes, ao mesmo tempo em que ambas mantinham níveis razoáveis de
independência112.
Por conta das leis antitrusts, tendentes a evitar a integração vertical de
distribuidores e produtores, ocorreram a facilitação e o desenvolvimento efetivo do
sistema de franquias113.
Enquanto as empresas nos Estados Unidos percebiam as vantagens do
sistema de franquia, na Europa esse sistema de distribuição vinha despontando,
principalmente na França, através do mercado de lãs. A Lainiere de Roubaix
assegurava a comercialização de seus produtos através da criação da empresa
Pingoin, que formalizando parcerias com diversos retalhistas em forma de
exclusividade assegurava à empresa a distribuição dos seus produtos em diversas
zonas geográficas da França114.
Mas esse canal de distribuição teve a sua consagração com a criação de
várias redes de fast-foods como McDonald`s, Burger King, Kentuchy Fried
Chicken115.
No Brasil, as escolas de inglês Yazigy e CCAA foram os grandes
responsáveis pela introdução do sistema de franquia, no início dos anos 60. A partir
daí, o sistema de franchising evoluiu bastante, com a fundação da Associação
Brasileira de Franchising – ABF, em meados dos anos 80, e a entrada em vigor da
lei da franquia n. 8.955, em 15 de dezembro de 1994.116
112
BARROSO, Luiz Felizardo. Franchising & direito: contrato, circular de oferta, manuais operacionais, comentários à Lei nº 8.955/94, comentários aos Projetos de Lei ns. 2.921-A/2000 (do Deputado Alberto Mourão, do PMDB/SP, que modifica a lei vigente) e 273/2001 (do Senador Carlos Bezerra, do PMDB/MT, que veda a sublocação de imóveis pelo franqueador, por valor superior ao da locação), arbitragem e franchising: 2. ed. ver. e atual. em consonância com o novo Código Civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. 113
GONÇALVES, Priscila Brolio. A obrigatoriedade de contratar como sanção no direito concorrencial brasileiro. Tese (Doutorado), Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2008. 114
MARINHO, Ana Cecília Pereira. Marketing de franquia no Brasil. Tese (Pós-Gradução), Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro, 2013. 115
BARROSO, Luiz Felizardo. Op. cit. 116
COELHO, Larissa. Indenização de clientela no regime de franquia: um olhar sob o sistema do Brasil e de Portugal. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br>.
75
Segundo Melitha117, na década de 90 iniciou-se um processo de
amadurecimento do sistema, em razão da promulgação da Lei n. 8.955/94, o que,
com certeza, significou uma chave para a segurança na relação de franquias,
impondo-se a obrigatoriedade da COF – circular de oferta de franquia e sua entrega
ao franqueado, como forma de deixar cristalina a relação nesse sistema.
Impulsionado também pelo crescimento acelerado do mercado comercial,
com o aval do governo federal na implementação de projetos (SEBRAE, acordos de
cooperação), nos últimos 30 anos o Brasil vem aprimorando e aperfeiçoando a
gestão de franquias, cujos números hoje falam por si: somos o 3° país do mundo em
número de empresas e o 6º em número de unidades118.
De acordo com Melitha119, o crescimento médio do sistema de franquias foi de
16% nos últimos anos, e tem sido fomentado por alguns fatores verticalizados do
crescimento do poder aquisitivo brasileiro, da economia. Com a criação de sistemas
de microfranquias, destinadas a pequenos investidores, franquias virtuais, e,
inegavelmente, porque o Brasil foi eleito para sediar a Copa do Mundo de 2014,
houve um aquecimento do mercado brasileiro como um todo, principalmente no
segmento de franquias de hotelaria e turismo.
Observa-se nesse pensar que o franchising é um mercado que está sempre
em evolução e crescimento continuados, adaptando-se e acompanhando os
momentos históricos, políticos, econômicos e culturais por que passa o cenário
mundial.
5.1. Conceito de franquia
Em termos conceituais, o franchising é o sistema no qual alguém
(franqueador) autoriza terceiro (franqueado) a explorar os direitos de uso da marca,
os direitos de distribuição de produtos e/ou serviços em um mercado definido, além
de utilizar um sistema de operação e de gestão de um negócio de sucesso.
117
PRADO, Melitha Novoa. Franchising na real. Agbook, p. 57. 118
Id., Ibid., p. 239 e s. 119
Id., Ibid., p. 234.
76
Boroian e Boroian120 definem o franchising como uma forma de replicar o
sucesso.
É um canal de distribuição, agregado à licença de uso de uma marca
conjuntamente com uma prestação de serviços e oferecimento de know-how, esses
realizados pelo franqueador, para a devida operação do negócio pelo franqueado.
A IFA – International Franchising Association121 define o franchising:
Franchising is a method of distributing products or services. At least two levels of people are involved in a franchise system: (1) the franchisor, who lends his trademark or trade name and a business system; and (2) the franchisee, who pays a royalty and often an initial fee for the right to do business under the franchisor's name and system. Technically, the contract binding the two parties is the “franchise”, but that term is often used to mean the actual business that the franchisee operates.
Tales Andreassi e Pedro Lucas de Resende Melo122 definem franchising
numa relação contratual referente a uma franquia que é desenvolvida entre duas
partes: o franqueado e o franqueador.
S. Shane123 afirma que o franchising é uma alternativa à diversificação que
pode ser considerada uma estratégia cooperativa que as firmas adotam para
dispersar os riscos e compartilhar competências.
Walter Douglas Stuber e Maria Cecília Semionato124 estabelecem o
franchising como sendo um sistema de comercialização de produtos e/ou serviços
e/ou tecnologia, baseado em estreita e contínua colaboração entre empresas
jurídica e financeiramente distintas e independentes, por meio do qual o contratante
(franchisor) concede o direito e impõe a obrigação aos seus contratados
(franchisees) de explorar uma empresa de acordo com o seu conceito.
120
BOROIAN, D. D.; BOROIAN, P. J. The franchise advantage: il prism creative group. Chicago, 1992. Apud: TOLEDO, Geraldo Luciano; PROENÇA, Cristina. Fatores críticos de sucesso da franquia – uma análise sob a óptica de ex-franqueados no Município de São Paulo. Caderno de Pesquisas em Administração, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 43-53, jan./mar. 2005. 121
IFA – INTERNATIONAL FRANCHISE ASSOCIATION. Frequently asked questions about franchising: answers to the 19 most commonly asked questions about franchising. 122
ANDREASSI, Tales. RESENDE, Pedro Lucas de Melo. Publicação científica nacional e internacional sobre franchising: levantamento e análise do período 1998-2007-2010. Disponível em: < http://www.anpad.org.br/rac>. 123
SHANE, S. From ice cream to the internet: using franchising to drive the growth and profits of your company. Upper Saddler River, NJ Prentice Hall, 2005. Apud: ANDREASSI, Tales; RESENDE, Pedro Lucas de Melo. Publicação científica nacional e internacional sobre franchising: levantamento e análise do período 1998-2007-2010. <http://www.anpad.org.br/rac>. 124
STUBER, Walter Douglas; SEMIONATO, Maria Cecília. Franchising e licenciamento. RT, ano 4, n. 16, fls. 292, jul./set. 1996.
77
A relação de franquia pressupõe várias relações jurídicas advindas de um
único sistema padronizado e, dentre elas, o direito de uso da marca, elemento que
identifica comercialmente o negócio125.
O art. 2º da Lei de Franquia (8.955/94) define franquia empresarial como:
[...] o sistema pelo qual um franqueador cede ao franqueado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semiexclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente, também ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício.
Assim, franquia consiste em uma autorização para o uso de nome e de
marca, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semiexclusiva de produtos
e/ou serviços ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração de
negócio ou sistema operacional, desenvolvidos ou detidos pelo Franqueador126.
Sebastião José Roque127 estabelece que, pelo ponto de vista jurídico, a
franquia é geralmente um complexo de contratos, sendo um principal e os outros
acessórios ou dependentes.
Pode-se dizer, então, que a franquia é um sistema pelo qual uma empresa
(franqueador) que detém uma marca e know-how de produção de um produto e/ou
serviço resolve ceder a outro empresário (franqueado) a licença para utilizar desse
seu invento de forma autônoma, com exclusividade em determinada região,
prestando toda a assistência ao franqueado (da abertura ao funcionamento do
negócio), mediante uma remuneração.
5.2. Contrato de franquia
O contrato de franquia compreende vários contratos interligados e, portanto, é
o documento jurídico pelo qual o franqueador transfere ao franqueado, mediante
remuneração, o segredo de seu negócio.
125
PRADO, Melitha Novoa. Op. cit. 126
BARROSO, Luiz Felizardo Op. cit. 127
ROQUE, Sebastião José. Do contrato de franquia empresarial. São Paulo: Ícone, 2012, fls. 15 (Col. Elementos de direito).
78
A importância do contrato de franquia é ressaltada por Melitha128:
Ele versa sobre questões de suma importância, como o território de abrangência da unidade franqueada (que pode ser um shopping, uma rua, uma cidade, um Estado); as taxas que serão pagas, seus percentuais e sobre que base serão cobradas; o prazo para as partes que não cumprirem suas obrigações; formas de suporte pela Franqueadora; cláusula de não concorrência (quando termina a relação de Franquia, o contrato precisa estipular as restrições ao Franqueado para continuar no mesmo segmento de mercado).
Sendo, portanto, um sistema complexo de vários contratos interligados,
destacam-se dentre os contratos a cessão de uso da marca ou patente; a
distribuição exclusiva, ou semiexclusiva, de produtos ou serviços; a transferência de
tecnologia de implementação e administração de negócio, o know-how (segredo de
negócio) e o treinamento do franqueado e seus empregados.
Fran Martins129 define o contrato de franquia como sendo o documento que
liga uma pessoa a uma empresa para que esta, mediante condições especiais,
conceda à primeira o direito de comercializar marcas ou produtos de sua
propriedade, sem que, contudo, a esta esteja ligada por vínculo de subordinação.
Nelson Abrão130 observa que o contrato de franquia é o documento pelo qual
o titular de uma marca de indústria, comércio ou serviço (franqueador) concede seu
uso a outro empresário (franqueado), posicionando-se quanto à distribuição,
prestando-lhe assistência no que concerne aos meios e método para viabilizar a
exploração dessa concessão, mediante o pagamento de uma entrada e um
percentual sobre o volume dos negócios pelo franqueado.
Waldirio Bulgarelli131 define o contrato de franquia como sendo a operação
pela qual um comerciante titular de uma marca comum cede seu uso, num setor
geográfico definido, a outro comerciante. O beneficiário da operação assume
integralmente o financiamento de sua atividade e remunera o seu cocontratante com
uma percentagem calculada sobre o volume dos negócios. Repousa sobre a
cláusula da exclusividade, garantindo ao beneficiário, em relação aos concorrentes,
o monopólio da atividade.
128
PRADO, Melitha Novoa. Op. cit. 129
MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 486. 130
ABRÃO, Nelson. A Lei de Franquia empresarial (n. 8.955, de 15/12/1994). RT, São Paulo. 131
BULGARELLI, Waldirio. Contratos mercantis. 8. ed. São Paulo: Atlas, 1995, p. 520.
79
Fábio Ulhoa132 estabelece que o contrato de franquia se desenvolve na
plenitude de dois outros contratos, o de licenciamento de uso de marca e o de
organização empresarial. De um lado, o franqueador, titular de uma marca já
conhecida dos consumidores e que deseja ampliar a oferta de seus produtos e/ou
serviços, sem, contudo, querer despender valores e sofrer os riscos da implantação
de filiais, e, de outro lado, o franqueado, que dispõe de recursos, interesse em abrir
o seu próprio negócio, mas sem conhecimento técnico e de administração e
economia, fatores geralmente necessários ao sucesso do empreendimento que se
pretende possuir.
Jorge Lobo133 assevera que a natureza jurídica do contrato de franquia se
estabelece em uma nova técnica de cooperação entre empresas independentes,
com vistas a maximizar os resultados operacionais de ambas.
Guilherme Carvalho Monteiro de Andrade134 classifica o contrato de franquia
como sendo consensual, bilateral, oneroso, de execução continuada e típico.
Apesar de muitos autores entenderem o contrato de franquia como típico por
estar estabelecido na Lei n. 8.955/94, compactuamos com o entendimento de que se
trata de um contrato atípico, já que a Lei de Franquia não define a forma como deve
ser formalizado, mas apenas que deve ser formalizado de forma escrita.
Fábio Ulhoa Coelho afirma que o contrato de franquia é atípico porque a Lei
n. 8.955/94, embora discipline determinados aspectos da franquia, não tornou a
modalidade do contrato típico, já que as relações entre franqueador e franqueado
regem-se exclusivamente pelas cláusulas contratuais pactuadas.
Apesar de a Lei n. 8.955/94 (lei de franquia) estabelecer em seu art. 1º que os
contratos de franquia estão disciplinados por ela, fato é que o que o legislador visou
proteger o princípio da transparência entre as partes no que tange à parte pré-
contratual e não só o contrato em si, pois com relação ao contrato de franquia no
que se refere aos direitos e obrigações entre os franqueadores e os franqueados
pouco se fala, existindo apenas uma exigência, a de que o contrato de franquia seja
formalizado na forma escrita.
132
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 426-427. 133
LOBO, Jorge. Contrato de franchising. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 34. 134
ANDRADE, Guilherme Coelho Monteiro de. Algumas considerações sobre o contrato de franquia, sob a ótica da interpretação econômica. Disponível em: <http://www.madadvogados.com.br/ docs/Franquia25.06.07.pdf>.
80
O franchising possui uma lei pátria que o regula, mas é certo que, em razão
de constituir-se em um sistema, incide nesse tipo de negócio, já que abrange
diversos institutos jurídicos em razão da diversidade de modalidades contratuais
dele advindas, além da lei específica, outras legislações, sendo
[...] regido, tanto pelo código civil como pelo código comercial e por um número razoável de leis extravagantes aplicáveis, direta ou indiretamente, à espécie, como a lei antitruste, a lei que trata dos crimes contra a ordem econômica, propriedade industrial [...]135.
De suma importância em sua aplicação, porquanto a franquia encerra uma
relação contratual, é a aplicação da legislação civil.
Assim, os princípios contratuais presentes no Código Civil vigente,
notadamente a boa-fé objetiva, a função social do contrato, a transparência e
lealdade entre os contratantes, note-se, dão a base e estabilidade aos contratos de
franquia.
Isso fica muito nítido quando se observa a preocupação do legislador, dada a
exigência legal contida na Lei de Franquia, a respeito da circular de oferta de
franquia – COF, atribuindo como responsabilidade do franqueador em expor,
previamente ao franqueado, pleno conhecimento daquilo que estará contratando.
A premissa é obtida da legislação ordinária civil pátria, onde se extrai os
princípios que vão alinhados na franquia de modo a reger a relação negocial, bem
como alicerçar o caráter vinculativo do negócio entre as partes, caso o contrato de
franquia se aperfeiçoe.
Nesse particular, observe que o Código Civil de 2002 refere, já de início, em
seu art. 113, que “Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé
e os usos do lugar de sua celebração”.
Mais adiante, alinha: “Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um
direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim
econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
E segue: “Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na
conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”.
O novo Código Civil respeita o princípio da boa-fé objetiva, agregando como
questão basilar a ser observada nos contratos um dever de conduta entre as partes.
135
BARROSO, Luiz Felizardo. Op. cit., p. 92.
81
De tudo quanto se estampa, o princípio da boa-fé pesa inafastável aos
contratos em geral e, consequentemente, ao contrato de franquia e vai além, na
acepção do Código Civil, quando delineia a conduta das partes.
Esse princípio rege os contratos de franquia, por via de consequência é que
elementarmente obtém através da circular de oferta de franquia – COF sua
fundamental expressão.
E em desfecho aos princípios basilares, o princípio estampado no art. 421 do
Código Civil, ao referir que a liberdade de contratar deve ser exercida em razão e
nos limites da função social do contrato, é que consequentemente atingem os
contratos de franquia.
Assim, somado ao princípio da boa-fé objetiva, a função social do contrato
embasa e dá corpo ao direito contratual, considerando-se, portanto, norma de ordem
pública, alheia à sublimação pelas partes.
Todavia, a função social do contrato não deve ser interpretada como objeto
do contrato, e sim na via da limitação da autonomia privada.
Nesses dizeres o entendimento de Teresa Ancona Lopez136:
Hoje, com a consagração do princípio da função social do contrato, vemos não mais ser possível o contrato só ter eficácia em relação às partes, não podendo nem prejudicar nem beneficiar terceiros (res inter alios acta, allis nec podest nec nocet). Sem dúvida, o contrato tem relevância como “fato social”, não existe isolado na sociedade. Em consequência, todo acordo de vontade repercute também nos interesses alheios. É como uma pedra jogada em um lago que vai formando círculos infinitos.
Na mesma linha são os dizeres de Cláudia Lima Marques137:
a nova concepção do contrato é uma concepção social deste instrumento jurídico, para a qual não só o momento da manifestação da vontade (consenso) importa, mas em que também e principalmente os efeitos do contrato na sociedade serão levados em conta e em que a condição social e econômica das pessoas nele envolvidas ganha em importância.
E não poderia ser diferente dado seu próprio conceito, conforme o jurista
português Antônio Pinto Monteiro138:
136
LOPEZ, Teresa Ancona. Princípios contratuais. In: FERNANDES, Wanderley (Coord.). Fundamentos e princípios dos contratos empresariais: série GVLaw. 1. ed., 2. tir. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 20. 137
MARQUES, Cláudia Lima. A chamada nova crise do contrato e o modelo de direito privado brasileiro: crise de confiança ou de crescimento do contrato? In: MARQUES, Cláudia Lima (Coord.). A nova crise do contrato: estudos sobre a nova teoria contratual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 27-28.
82
[...] através do contrato de franquia, se define e executa a política comercial do fabricante e se procede à integração do revendedor na sua rede de distribuição selectiva [...] representa a mais estreita forma de cooperação entre empresas independentes e o mais elevado grau de integração do distribuidor na rede outra parte, em termos de gerar no público a convicção de ser o fabricante ou uma sua filial, a encarregar-se da distribuição.
Assim, o contrato de franquia pode ser definido como um documento atípico,
de natureza bilateral, consensual, oneroso, de trato sucessivo e por adesão.
Paulo Antônio Begalli139 estabelece que os contratos atípicos são aqueles que
se regem pelas normas da teoria geral das obrigações, dos contratos e por analogia
às normas de contratos similares, não possuindo tipificação na lei, como ocorre com
o contrato de franquia.
Bilateral (sinalagmático), porque do contrato de franquia surgem direitos e
obrigações para franqueador e franqueado, por conta da obrigação do repasse de
know-how daquele a este e da obrigação de o franqueado respeitar regras e
padrões do sistema de franquia no qual está inserido.
Paulo Antônio Begalli140 define contratos bilaterais como sendo aqueles que
produzem direitos e obrigações para ambas as partes, que são credoras e
devedoras entre si.
Maria Helena Diniz141 estabelece que os contratos bilaterais em seus efeitos
causam direitos e deveres recíprocos entre os contraentes, que são reciprocamente
credor e devedor do outro, portanto sinalagmáticos.
Sebastião José Roque142 afirma que a bilateralidade desse contrato se
manifesta sob diversas formas, a começar pela definição positiva de duas partes,
franqueador e franqueado, pelas obrigações mútuas existentes entre esses dois
entes em decorrência de seu próprio consenso, e o não cumprimento das
obrigações por uma delas pode ensejar o apelo ao princípio exceptio adimpli
contractus ou ainda à rescisão do próprio contrato.
138
MONTEIRO, António Pinto. Contrato de agência. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2004; e Contratos de distribuição comercial: direito comercial. 2. reimpr. Coimbra: Almedina, 2004, p. 114 e 117. 139
BEGALLI, Paulo Antônio. Direito contratual no novo Código Civil. Leme-SP: Editora de Direito, 2003, p. 100. 140
Id., ibid. 141
DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, v. 1, p. 113. 142
ROQUE, Sebastião José. Op. cit., fls. 15.
83
Consensual, porque se aperfeiçoa constantemente pela aceitação das partes,
sem qualquer forma solene, uma vez que, pela característica do sistema de franquia
no que tange à velocidade e rapidez, sua evolução e suas características, pautados
na constante modificação do mercado globalizado, se os contratos de franquia
tiverem formas solenes para serem pactuados, a forma jurídica emperrará a
engrenagem da evolução mercadológica, o que para o sistema seria um desacerto.
Paulo Antônio Begalli143 define contratos consensuais como sendo aqueles
em que as partes formalizam de comum acordo e se aperfeiçoam pelo mero
consentimento. Para Maria Helena Diniz144, os contratos consensuais, quanto à sua
forma, são aqueles que se perfazem pela simples anuência da parte.
Oneroso, porque a atribuição patrimonial efetuada por cada um dos
contraentes tem por correlação a compensação ou equivalente à atribuição da
mesma natureza proveniente do outro; para alcançar ou manter a atribuição
patrimonial da contraparte, cada contraente tem de realizar uma contraprestação.
Assim, para que o contrato seja oneroso é preciso que cada uma das partes tenha
simultaneamente uma vantagem de natureza patrimonial e um sacrifício do mesmo
tipo, como no caso do sistema de franquia, em que o franqueador tem como
vantagem patrimonial o recebimento dos royalties e o prestígio da marca pela
pulverização dos franqueados em todos os territórios, já o franqueado tem por
vantagem patrimonial a economia de escala na aquisição de produtos e/ou serviços,
além de basear o seu negócio em marca renomada e reconhecida pelo público
consumidor.
Os contratos onerosos trazem vantagens e sacrifícios patrimoniais para os
contratantes145 e, quanto à sua forma, são aqueles que se perfazem pela simples
anuência da parte146.
O contrato de franquia é de trato sucessivo, porque, mesmo após a sua
rescisão, algumas obrigações dele advindas perduram, como, por exemplo, a não
utilização de marca ou de negócios semelhantes pelo ex-franqueado em
determinado tempo e local em que estava instalado quando inserido em
determinado sistema de franquia, entre outras obrigações que surgem e perduram
mesmo após a rescisão do contrato.
143
BEGALLI, Paulo Antônio. Op. cit., p. 104. 144
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p.120. 145
BEGALLI, Paulo Antônio. Op. cit., p. 101. 146
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p.120.
84
Os contratos de trato sucessivo são aqueles em que sua satisfação não
ocorre em um só momento, enquadrando-se no conceito de prestações periódicas,
que não se extingue pelo simples descumprimento de uma conduta, mas que
perpetua pelo princípio da continuidade147.
Maria Helena Diniz148 define que os contratos de execução continuada são os
que se prorrogam no tempo pela prática ou abstenção de atos reiterados.
Por adesão, porque como a principal característica do sistema de franquia é a
padronização, diferente não é a sua característica quanto à sua formação contratual;
a adesividade no contrato de franquia é de suma importância, uma vez que não
pode haver tratamentos diferentes e condições diferenciadas em um mesmo sistema
de franquia entre os entes que dele participam, conforme se verá de forma mais
detalhada adiante.
Maria Helena Diniz149 reitera que os contratos por adesão (Standard
verträgen) são aqueles que impedem a liberdade de convenção, visto que impedem
que as partes transijam sobre qualquer parte, limitando a uma delas aceitar ou não
as cláusulas e condições previamente redigidas e impressas pela outra parte.
5.3. A circular de oferta e as relações negociais entre franqueador e
franqueado
Um dos mais importantes princípios que norteiam o sistema de franquia é o
da transparência, que fica evidenciado no art. 3º da Lei de Franquia, no qual
estabelece:
Sempre que o franqueador tiver interesse na implantação de sistema de franquia empresarial, deverá fornecer ao interessado em tornar-se franqueado uma circular de oferta de franquia, por escrito, e em linguagem clara e acessível.
Eduardo Rodrigues Gomes e Alberto José do Patrocínio150 defendem que:
147
BEGALLI, Paulo Antônio. Op. cit., p. 101. 148
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p.126. 149
Id., ibid. 150
Disponível em: <http://www.excelenciaemgestao.org/Portals/2/documents/cneg9/anais/T13_0574 _3828.pdf>. Acesso em: 24 fev. 2014.
85
A transparência nos negócios permite aos atores envolvidos a adoção de medidas que, mesmo não sendo necessariamente a base do planejamento estratégico, sirvam como ferramental preventivo às limitações ao desenvolvimento do negócio. A necessidade desta atitude significa que existe um longo caminho a ser percorrido para que as relações entre franqueadores e franqueados produzam modelos que levem à conclusão de negócios de longa duração. Consequentemente, para bom desenvolvimento da franquia os contratos devem ser equilibrados e definir claramente os direitos e responsabilidades das partes envolvidas, ou em outras palavras, deve ter transparência entre todos os interessados na relação de franquia. Este é um novo tema da RSE, devendo ser incorporado como diferencial pelas franquias, ainda que resulte numa diversidade de conceitos que, por vezes, têm definições totalmente diferentes.
A lei brasileira nada mais fez do que estabelecer o princípio do disclosure
norte-americano para as relações entre franqueadores e os interessados a
franqueados. A preocupação do legislador foi preservar o patrimônio desses
interessados, uma vez que a maioria dos sistemas de franquia exige um aporte de
grandes vultos financeiros para sua participação, pelos interessados.
Geralmente os interessados a franqueados são pessoas que empenham em
um negócio valores economizados uma vida toda e, com o sonho de montar o seu
próprio negócio com o mínimo de risco possível, veem no sistema de franquia a
possibilidade da realização desse sonho. Então, como forma de proteger esses
investidores de “primeira viagem” o legislador trouxe para a legislação brasileira o
princípio do disclosure.
Disclosure, na tradução livre da palavra, significa a “divulgação pelas
companhias de toda informação, positiva ou negativa, que poderia subsidiar uma
decisão de investimento [...]”151.
Barroso152 afirma que no mercado de capitais brasileiro temos o prospecto
como instrumento do disclosure; já no mercado de franquias, é a circular de oferta
de franquia que serve de meio de divulgação sincera, ampla e total dos dados
empresariais.
E continua:
Chama-se disclosure o princípio da revelação total e sincera dos
dados empresariais no mercado de capitais e no de franquias empresariais, sendo que o princípio da revelação total e sincera dos dados empresariais ao público investidor é conhecido pelas
151
DICTIONARY OF FINANCE AND INVESTMENT TERMS. Barron´s Educational Series. 152
BARROSO, Luiz Felizardo. Op. cit.
86
expressões advindas do direito anglo-saxônico: disclosure, full disclosure, ou full and fair disclosure.
Assim, a circular de oferta de franquia é um documento legal que visa
apresentar todas as informações pertinentes ao sistema de franquia que o
franqueador visa formatar, a qual estabelece desde a história do franqueador, seus
balanços e demonstrações financeiras, até o modelo do contrato a ser formalizado
com os pretensos franqueados.
Conforme define Melitha153:
Circular de Oferta de Franquia (COF) – é um compêndio de informações preparado pelo franqueador e no qual constam as características do negócio. A circular é tão importante no processo de venda e compra de uma franquia que é exigida pelos artigos 3º e
4º da Lei nº 8955/94, que rege o sistema de franchising no Brasil [...]
Nesse contexto, a circular de oferta de franquia é documento jurídico basilar à
realização do negócio de franquia, cuja existência e exibição pelo franqueador ao
franqueado advêm de determinação legal, sob pena de ser passível de discussão e
sujeitando o franqueador às sanções legais previstas na Lei de Franquia.
Outro elemento estrutural do contrato de franquia, também no contexto da
transparência, é o pré-contrato de franquia, o qual implica a capacitação do
franqueado na instalação do negócio.
Por meio dele, embora não decorra de exigência legal, mas da boa prática e
experiência do franqueador, capaz, inclusive, de evitar futuros conflitos, tal
instrumento é o que dará guarida aos direitos e deveres das partes no período em
que inicia a instalação do negócio.
Nesse período, já que pré-operacional, recomenda-se que manifestem
documentalmente, através do pré-contrato, as bases do sistema contratado, de
forma clara e objetiva, quase que como uma minuta do contrato de franquias, que
deverá ser formalizado, atribuindo-se, por cautela, inclusive, uma data de expiração
desse pré-contrato154.
Consequentemente, o ingresso efetivo do franqueado no sistema consolidado
pelo franqueador dar-se-á através do elemento estrutural denominado contrato de
franquia155. É por meio dele que as partes sacramentarão aquilo tanto quanto foi
153
PRADO, Melitha Novoa. Op. cit., 14. 154
Id., ibid., p. 15. 155
Id., ibid., p.16.
87
preestabelecido entre si, no passo do sistema moldado pelo franqueador, e aqui já
experimentado pelo franqueado na fase de ajuste prévio.
É da lei que decorre sua obrigatoriedade de formalização por escrito,
contendo as características exigidas para que se valide.
A Lei de Franquia é clara ao exigir que aqueles empresários interessados em
enveredar no sistema de franquias como franqueadores deverão apresentar aos
pretensos franqueados a circular de oferta de franquia, a qual deverá conter todas
as exigências do art. 3º dessa lei156.
156
“Art. 3º Sempre que o franqueador tiver interesse na implantação de sistema de franquia empresarial, deverá fornecer ao interessado em tornar-se franqueado uma circular de oferta de franquia, por escrito e em linguagem clara e acessível, contendo obrigatoriamente as seguintes informações:
I - histórico resumido, forma societária e nome completo ou razão social do franqueador e de todas as empresas a que esteja diretamente ligado, bem como os respectivos nomes de fantasia e endereços;
II - balanços e demonstrações financeiras da empresa franqueadora relativos aos dois últimos exercícios;
III - indicação precisa de todas as pendências judiciais em que estejam envolvidos o franqueador, as empresas controladoras e titulares de marcas, patentes e direitos autorais relativos à operação, e seus subfranqueadores, questionando especificamente o sistema da franquia ou que possam diretamente vir a impossibilitar o funcionamento da franquia;
IV - descrição detalhada da franquia, descrição geral do negócio e das atividades que serão desempenhadas pelo franqueado;
V - perfil do franqueado ideal no que se refere à experiência anterior, nível de escolaridade e outras características que deve ter, obrigatória ou preferencialmente;
VI - requisitos quanto ao envolvimento direto do franqueado na operação e na administração do negócio;
VII - especificações quanto ao: a) total estimado do investimento inicial necessário à aquisição, implantação e entrada em
operação da franquia; b) valor da taxa inicial de filiação ou taxa de franquia e de caução; e c) valor estimado das instalações, equipamentos e do estoque inicial e suas condições de
pagamento; VIII - informações claras quanto a taxas periódicas e outros valores a serem pagos pelo
franqueado ao franqueador ou a terceiros por este indicados, detalhando as respectivas bases de cálculo e o que as mesmas remuneram ou o fim a que se destinam, indicando, especificamente, o seguinte:
a) remuneração periódica pelo uso do sistema, da marca ou em troca dos serviços efetivamente prestados pelo franqueador ao franqueado (royalties);
b) aluguel de equipamentos ou ponto comercial; c) taxa de publicidade ou semelhante; d) seguro mínimo; e e) outros valores devidos ao franqueador ou a terceiros que a ele sejam ligados; IX - relação completa de todos os franqueados, subfranqueados e subfranqueadores da rede,
bem como dos que se desligaram nos últimos doze meses, com nome, endereço e telefone; X - em relação ao território, deve ser especificado o seguinte: a) se é garantida ao franqueado exclusividade ou preferência sobre determinado território de
atuação e, caso positivo, em que condições o faz; e b) possibilidade de o franqueado realizar vendas ou prestar serviços fora de seu território ou
realizar exportações; XI - informações claras e detalhadas quanto à obrigação do franqueado de adquirir quaisquer
bens, serviços ou insumos necessários à implantação, operação ou administração de sua franquia,
88
Como forma de proteger os valores dados pelos pretensos franqueados por
ocasião do ingresso no sistema de franquia, a lei também estabeleceu que qualquer
valor pago pelo franqueado ao franqueador deverá ser realizado após dez dias da
entrega da Circular de Oferta de Franquia – COF, visto que o franqueador que não
respeitar o estabelecido na lei poderá responder pelas sanções nela contidas, que
podem ser a devolução das quantias pagas ao franqueado, perdas e danos, além da
anulabilidade do próprio contrato.
5.4. O papel da Associação Brasileira de Franchising – ABF
A Associação Brasileira de Franchising é uma entidade sem fins lucrativos,
criada em julho de 1987, que tem como missão divulgar, defender e promover o
desenvolvimento técnico e institucional desse moderno sistema de negócios,
congregando todas as partes envolvidas no franchising – franqueadores,
franqueados, consultores e prestadores de serviços –, com o ideal comum de
fortalecer o sistema de franquia157.
Sebastião José Roque afirma que não se pode compreender o
desenvolvimento e a divulgação da franquia no Brasil sem ligá-la ao organismo que
se dedica à sua implantação, visto que se trata de uma entidade particular formada
apenas de fornecedores indicados e aprovados pelo franqueador, oferecendo ao franqueado relação completa desses fornecedores;
XII - indicação do que é efetivamente oferecido ao franqueado pelo franqueador, no que se refere a:
a) supervisão de rede; b) serviços de orientação e outros prestados ao franqueado; c) treinamento do franqueado, especificando duração, conteúdo e custos; d) treinamento dos funcionários do franqueado; e) manuais de franquia; f) auxílio na análise e escolha do ponto onde será instalada a franquia; e g) layout e padrões arquitetônicos nas instalações do franqueado; XIII - situação perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) das marcas ou
patentes cujo uso estará sendo autorizado pelo franqueador; XIV - situação do franqueado, após a expiração do contrato de franquia, em relação a: a) know how ou segredo de indústria a que venha a ter acesso em função da franquia; e b) implantação de atividade concorrente da atividade do franqueador; XV - modelo do contrato-padrão e, se for o caso, também do pré-contrato-padrão de franquia
adotado pelo franqueador, com texto completo, inclusive dos respectivos anexos e prazo de validade.” 157
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE FRANCHISING – ABF. Disponível em: <http://www.portaldofranchising.com.br/sobre-a-abf/atuacao-da-associacao-brasileira-de-franchising>. Acesso em: 08 mar. 2014.
89
por franqueadores, franqueados, fornecedores, advogados especializados e
pessoas interessadas no tema.
Apesar de não ter poder de fiscalização ou mesmo sanção, certo é que os
franqueadores que pretendem utilizar o sistema de franquia como canal de
distribuição veem na ABF uma oportunidade de transmitir seriedade ao seu sistema,
além de segurança aos interessados em se tornarem franqueados, já que para filiar-
se à ABF os franqueadores devem respeitar, além da Lei de Franquia, o seu Código
de Ética e de Autorregulamentação.
Como já mencionado, a ABF não tem poder de aplicar qualquer tipo de
sanção aos franqueadores, mas trabalha com ações de premiação àqueles que se
destacam e a ela são filiados, entregando, por exemplo, todo ano, o selo de
qualidade da ABF.
Assim, como forma de regulamentar os contratos de franquia, a Associação
Brasileira de Franchising – ABF criou um Código de Autorregulamentação do
franchising, no qual fixou as regras gerais para pautar a relação entre franqueadores
e franqueados de forma salutar, evitando, assim, distorções de natureza jurídica e
comercial.
O Código de Autorregulamentação do franchising estabelece os preceitos
gerais de ética, moral e boa-fé que deverão pautar a conduta de franqueadores,
franqueados e prestadores de serviços do sistema de franquia.
Estabelece, ainda, que franqueadores, franqueados e prestadores de serviços
do sistema de franquia deverão conduzir suas atividades observando as disposições
do Código de Autorregulamentação, bem como as obrigações impostas pela
legislação vigente.
Partindo dessa premissa inicial, o Código estabelece quais seriam as
obrigações gerais entre franqueadores158 e franqueados159 quando adentrados ao
158
“OBRIGAÇÕES DO FRANQUEADOR 4. - O Franqueador deverá adotar as seguintes práticas comerciais
4.1. - Observar e manter com os seus Franqueados, relações honestas, éticas, pautadas pela transparência, boa-fé e respeito mútuo, seguindo as exigências legais estabelecidas para o ‘Franchising’ e cumprindo as obrigações assumidas no contrato. 4.2. - Oferecer aos potenciais Franqueados, de forma completa e correta, todas as informações exigidas por lei, além de outras que sejam relevantes para a avaliação do negócio, as quais vincularão o Franqueador. 4.3. - Responsabilizar-se pelo uso dos direitos de propriedade intelectual concedidos ao Franqueado. 4.4. - Garantir ao Franqueado o uso da marca e do Sistema de Franquia, salvo disposição expressa em contrário das partes.
90
sistema de franquia, como forma de pautar as regras inseridas nos contratos de
franquia formalizados entre as partes.
Além de fixar em linhas gerais quais seriam essas obrigações, o Código
também fixou em linhas gerais as regras para a formalização do contrato de
franquia, dando um norte a seguir aos entes participantes dessa relação.
O Código define o contrato de franquia como o instrumento que rege a
relação jurídica estabelecida entre franqueador e franqueado, estabelece os termos
e condições que deverão ser obedecidos para a exploração do sistema de franquia
pelo franqueado e as situações inerentes ao relacionamento franqueador-
franqueado.
Determina, também, que o contrato de franquia deverá dispor sobre o objeto
da franquia; concessão de direitos de propriedade industrial e intelectual; território de
4.5. - Zelar pelo aperfeiçoamento e desenvolvimento do seu Sistema de Franquia, visando que os franqueados da rede possam atender as necessidades apresentadas pelo mercado consumidor. 4.6. - Fornecer aos Franqueados toda a informação e suporte necessários para o funcionamento e desenvolvimento do negócio objeto da Franquia, a fim de permitir uma gestão uniforme da rede de Franquias. 4.7. - Manter uma comunicação eficiente com os Franqueados, promovendo discussões e intercâmbio de ideias, para melhorar a capacidade produtiva da rede, buscando solucionar as questões ou controvérsias que surgirem no relacionamento entre as partes. 4.8. - Tratar com isonomia seus franqueados.”
159
“OBRIGAÇÕES DO FRANQUEADO 6. - O Franqueado deverá adotar as seguintes condutas e práticas comerciais.
6.1. - Observar e manter com o seu Franqueador, relações honestas, éticas, de boa-fé e respeito mútuo, cumprindo sempre as obrigações assumidas no contrato de franquia e as normas legais. 6.2. - Dedicar seus maiores e melhores esforços para o desenvolvimento de sua Franquia e para a conservação da identidade e reputação do Sistema de Franquia. 6.3. - Fornecer ao Franqueador todos os dados referentes ao negócio franqueado, a fim de possibilitar ao Franqueador um controle eficaz do desenvolvimento da rede. 6.4. - Manter a estrita confidencialidade sobre os métodos, processos, técnicas, segredos de negócio, de fabricação ou comercialização, que lhe forem transmitidos pelo Franqueador. 6.5. - Utilizar a Marca sempre observando a legislação vigente, assim como as normas, padrões e orientações definidas pelo Franqueador, a fim de resguardar a identidade, prestígio e valor da Marca no mercado. 6.6. - Cumprir rigorosamente as normas, especificações, procedimentos e obrigações definidas pelo Franqueador com relação à operação da Franquia e utilização da Marca, estejam elas designadas em contrato, nos manuais ou em quaisquer outras orientações escritas prestadas pelo Franqueador. 6.7. - Assegurar que seus sócios, funcionários, auxiliares ou prepostos sejam capacitados para as atividades que exercerão, tanto durante quanto após o treinamento oferecido pelo Franqueador, a fim de desempenharem as atividades do negócio franqueado de forma eficaz, segundo as técnicas do Sistema de Franquia. 6.8. - Empreender esforços no sentido de manter comunicação eficaz com o Franqueador, promovendo discussões e intercâmbio de idéias, buscando melhorar a capacidade produtiva da rede e a solução das questões surgidas durante a operação do negócio, sobretudo aquelas que possam prejudicar o bom relacionamento entre as partes. 6.9. - Efetuar pontualmente os pagamentos das taxas previstas no contrato de franquia.”
91
atuação do franqueado; obrigações pecuniárias das partes; prazo da concessão da
franquia; direitos e obrigações do franqueador e do franqueado; causas e
consequências da rescisão; sucessão das partes; hipóteses e consequências da
cessão ou transferência da franquia; confidencialidade e não concorrência; cláusula
arbitral, preferencialmente indicando a Câmara de Mediação e Arbitragem da ABF –
Associação Brasileira de Franchising como órgão responsável pela condução da
mediação ou arbitragem.
Quanto à cláusula de mediação e arbitragem, apesar de o Código estabelecer
como uma das regras preferenciais a eleição da Câmara de Mediação e Arbitragem
da ABF nos contratos de franquia, fato é que, apesar de todos os esforços, referida
Câmara não saiu do papel, o que decerto referida nomeação torna inócua a cláusula
no contrato.
Ainda sugere que o contrato de franquia esteja redigido de forma clara e
precisa, usando linguagem acessível, em coerência com os termos e condições
expostos pelo franqueador na circular de oferta de franquia, bem como com as
demais informações divulgadas pelo franqueador ao mercado com respeito ao seu
sistema de franquia; que tal contrato seja sempre formal, escrito, firmado na
presença de duas testemunhas, e que sua eficácia independa de registro em
cartório de registro de títulos e documentos ou em qualquer outro órgão.
Concluindo-se, apesar de o Código de Autorregulamentação do franchising
não ter poder vinculativo aos participantes do sistema de franquia, fato é que
aqueles que desejam participar desse sistema devem ter a chancela da Associação
Brasileira de Franchising, porque a partir daí se estabelece a seriedade daquele
sistema de franquia no qual as partes estão inseridas.
Também é papel da ABF promover regularmente cursos sobre franquia,
seminários, simpósios, encontros e discussões, visando ao aprimoramento técnico e
profissional daqueles interessados no sistema de franquia.
Por fim, a ABF também tem como papel a divulgação do franchising no Brasil
por meio da publicação anual do Guia Oficial de Franquias, com tiragem de 100 mil
exemplares, além da Organização da Maior Feira de Franquia da América Latina,
que ocorre todos os anos na cidade de São Paulo.
92
6. CONTRATOS DE FRANQUIA E ARBITRAGEM
Tanto os contratos de franquia quanto o instituto da arbitragem vêm em
crescente utilização no cenário nacional, e, coincidentemente, ambos resultaram
legislados no Brasil em períodos próximos. Desde então, com a criação de
ferramentas jurídicas ao sistema de franquia, a partir da edição da Lei n. 8.955/94,
bem como à arbitragem, com a Lei n. 9.307/196, a evolução jurídica de tais modelos
vem sedimentando-se nas relações entre empresários, dentro do contexto de
iniciativas privadas.
Segundo reflexão de Melitha Novoa Prado, a morosidade do sistema judiciário
e o custo do processo representam perdas financeiras às partes que poderiam ter
sido evitadas se a franquia continuasse em operação, defendendo, assim, a
utilização de adoção de métodos alternativos para resolução de conflitos, que seria
cada vez mais eficiente160.
Reconhece Melitha, todavia, que antes de tudo é necessário ampliar a ideia
da relação de franquia para além daquela adstrita ao contrato e às partes, tendo em
vista que as razões de foro íntimo, e de “prevalência de interesses e sentimentos”,
afetariam o êxito do processo de gestão de conflitos, visto que eventuais questões
controvertidas entre partes baseiam-se em três dinâmicas: causa, tempo e efeito161.
Em relação ao fator “tempo”, Melitha ressalta que “é um valor precioso, que
não deve ser desperdiçado com bobagens e sofrimentos (inevitáveis) que se
prolongam”162 e que competiria ao franqueador uma atitude pró-ativa nessa gestão,
quando aspectos que circundam a relação possam interferir nesse fator, cabendo a
este a simplificação fundamental, já que o fator tempo, quando se fala em conflito, é
de tal importância.
A inclusão de cláusula compromissória em contrato de franquia já foi objeto
de discussão em passado recente. Nos dias atuais está sedimentado o
entendimento quanto à possibilidade da eleição da via arbitral e referidos contratos.
Ainda que se entenda que o contrato de franquia é contrato de adesão, desde
que sejam respeitados os termos do § 2º do art. 4º da Lei n. 9.307/96, a cláusula
compromissória será perfeitamente válida.
160
PRADO, Melitha Novoa. Op. cit., 129. 161
Id., ibid., p. 130. 162
Id., ibid., p. 132.
93
Importante esclarecer que o contrato de franquia não caracteriza relação de
consumo. Nem a existência de um contrato de adesão e de uma possível
hipossuficiência poderia ensejar o entendimento de submissão do contrato de
franquia ao Código de Defesa do Consumidor.
6.1. Vantagens da arbitragem e da cláusula institucional nos contratos de
franquia
Ao observarmos um sistema de franquias e as mais diversas relações que se
estabelecem nesse tipo negocial, como antes visto, a existência de um conflito pode
ter dimensões gigantescas, afinal, pode envolver, além da relação entre franqueador
e franqueado (forma individual), toda a rede de franquia em si.
Nesses casos, usualmente, as partes utilizam-se da forma adversarial para
solver tais controvérsias, ou seja, através do Poder Judiciário.
Todavia, para os contratos de franquia, a solução de conflitos nesse meio não
é a mais indicada, como adiante se verá, razão por que os meios não adversariais
vêm ganhando espaço como ferramenta de sucesso na gestão de conflito.
É que as vantagens da utilização do instituto da arbitragem ao franqueador e
ao franqueado em caso de um litígio decorrente do contrato de franquia podem
diminuir os custos de transação das partes contratantes, aumentando seus lucros e
minimizando suas perdas, já que ambos os institutos jurídicos têm extrema afinidade
de princípios, como já se abordou.
Assim, a utilização da arbitragem na solução de conflitos decorrentes desse
contrato contribui para a fomentação da utilização do instituto no Brasil.
As vantagens da utilização da arbitragem em tais contratos não diferem
daquelas inerentes ao próprio instituto da arbitragem, e, pelo contrário, encaixam-se
perfeitamente no sistema um do outro.
Para que se tenha a exata dimensão de tudo quanto se aduz, merece
destaque, por ocasião da análise dos temas em conjunto, a observação de algumas
características que se agregam, dentre elas: a celeridade do procedimento arbitral, a
possibilidade de escolha do julgador e sua capacidade técnica, a privacidade e sigilo
do procedimento arbitral, a preservação da relação entre as partes e a possibilidade
de escolha das partes quanto à lei aplicável ao caso.
94
A celeridade é um diferencial positivo introduzido pela Lei de Arbitragem,
considerando-se a morosidade do Judiciário, cujo sistema processual permite
caminhos mais longos para o encerramento de uma questão controvertida.
Pelo fato de a Lei de Arbitragem prever o prazo de seis meses para a
prolação da sentença arbitral, caso as partes não tenham estipulado nada em
contrário, a solução de um conflito contratual é mais rápida do que seria caso
resolvido perante o Poder Judiciário.
A bem de observar, nesse aspecto, que uma decisão terminativa e vinculativa
às partes no Judiciário pode demorar até dez anos para ser solvida, considerando-
se que o procedimento judicial conta com pelo menos três graus de jurisdição e a
possibilidade de uma gama de recursos. Na arbitragem, por sua vez, considerada a
lei que versa sobre a matéria procedimental, levaria em média de seis a dezoito
meses para ser concluída163.
Nesse pensar, se a longa duração de um processo judicial é causa, por si só,
de expandir conflitos, notadamente, no âmbito de contratos de prestação
continuada, como é o caso dos contratos de franquia, cujo principal fator de ajuste é
precipuamente a boa relação das partes, a manutenção de uma lide por tempo
indeterminável, no mais das vezes, sem dúvida, agrava e inviabiliza a manutenção
dessa relação, ao menos até que uma decisão finalize o embate.
E, no mundo negocial, fica óbvio que, nesse interregno, desde a instauração
do conflito até sua solução vinculativa final, ou seja, enquanto as partes em conflito
aguardam uma decisão definitiva, deve-se considerar até mesmo que, em alguns
casos, o ponto nuclear do conflito derive de privação às partes de seus bens e/ou
direitos, fato que gera alto custo dentro do negócio, por via de consequência,
prejuízo, o que pode ser facilmente contornado optando-se por decidir o litígio por
arbitragem, minimizando, assim, que incidam os riscos do tempo no negócio como
um todo, notadamente, na relação afeta.
Dessarte, se, justamente na essência da franchising, uma das ferramentas
eficazes é o atendimento à dinâmica negocial dentro do universo da conectividade e
mobilidade, estruturadas no conceito atual de mercado, em mais se justifica a
celeridade na solução dos conflitos intercorrentes no contrato de franquias e, assim,
a utilização da arbitragem como ferramenta eficaz no segmento.
163
Aqui em referência segundo a lei e a experiência como advogada atuante nesse segmento.
95
A inexistência de recursos ou procedimentos de caráter infringente em sede
de arbitragem também é fator de contribuição para a celeridade do procedimento
arbitral na medida em que o objeto do conflito será decidido em instância única,
cabíveis, no mais das vezes, embargos de declaração da sentença proferida, nos
limites com que autorizado pela lei e pelo regulamento interno da instituição ou
estipulado entre as partes, caso de arbitragem ad-hoc.
E, nessa rubrica, há de se salientar em rápida abordagem, já que não se
insere no tema proposto, que o quanto se aduz nesse sentido deriva do que
usualmente se observa quando da utilização da arbitragem, afinal, permitir que se
agregue ao procedimento arbitral a vasta gama de instâncias que se observa
permissivo no processo civil, por exemplo, corresponderia afastar da própria
sistemática do instituto aquilo quanto ele se baseia, razão por que a tendência de
instância única da arbitragem deve ser preservada.
Outro fator que contribui para a celeridade do procedimento arbitral é o
ambiente amistoso que propicia uma aproximação das partes e como consequência
a possibilidade de acordos no decorrer do procedimento.
A necessidade de agilidade na solução de um conflito mostra-se presente em
todas as relações atuais, especialmente nas empresariais, em que o tempo aparece
como grande vilão.
No contrato de franquia não é diferente, pois o franqueado depende do
conhecimento do franqueador para que o seu negócio tenha o desenvolvimento
almejado, e o tempo que pode demorar uma solução judicial é fator de sucesso ou
fracasso do negócio, visto que a demora na solução do conflito pode resultar na
perda do objeto e interesse das partes no negócio.
Outra vantagem inquestionável para que busque resolver questões ligadas
aos contratos de franquia por meio da arbitragem é a possibilidade de escolha do
árbitro que será responsável pelo julgamento dos conflitos em função de sua
capacidade técnica.
Eleger um julgador ou um colegiado com compreensão técnica para examinar
todos os aspectos da demanda permite que o conflito seja analisado de uma forma
menos generalista, como seria caso fosse resolvido no Judiciário.
96
A figura do julgador especialista, presente na arbitragem, é retratada por
Valéria Maria Sant’Anna164:
Cabe observar que é distinto julgar uma demanda tendo em mãos laudos técnicos e depoimentos sobre um tema que não se domina e decidir sobre um tema sobre o qual se tem o domínio. Essa a grande chave dos contratantes [...] Ao nosso entender, o juízo arbitral, mesmo podendo sair até mais oneroso para as partes, deve ser mais confiável tendo em vista a possibilidade de se ter peritos decidindo a contenda [...] o problema estará sendo solucionado por pessoas de capacidade e entendimento no tema, podendo chegar a uma conclusão inédita, inclusive porque, se as partes assim o permitirem, poderão utilizarem-se tão somente da equidade [...]
A especialização do árbitro eleito para dirimir o conflito diminui o risco de
decisões equivocadas ou dissonantes à área.
Melitha165 encoraja a utilização da mediação e arbitragem em conflitos
relativos ao sistema de franchising, referindo que há anos seus clientes vêm
adotando tais métodos e estariam bastante satisfeitos, tanto em relação à
especialização do julgador, possibilidade vista na arbitragem, como pelo fato de que
vislumbra decisões mais justas e equilibradas nesse segmento que possibilita,
inclusive, a prévia mediação, etapa que constitui um diferencial positivo em relação
àqueles conflitos que têm sido solucionados, através da justiça estatal, por
julgadores não especializados.
Como sustentou Francisco Müssnich166, em debate realizado e reproduzido
na Revista Getúlio, da FGV:
Os grandes conflitos societários, as questões do mercado de capitais
ou as operações financeiras exigem expertise. Seria injusto
pretender que um juiz possa saber tudo sobre processo civil, direito criminal, execução, locação, usufruto e ainda dar conta desses casos.
Nesse particular, fica óbvio que, se na arbitragem os árbitros são indicados
pelas partes e daí poderem ser eleitos essencialmente em razão da afinidade,
conhecimentos e capacitações técnicas relativos à natureza do litígio, sua utilização
na área de franquias é, sem dúvidas, uma vantagem insofismável, afinal a
164
SANT’ANNA, Valeria Maria. Arbitragem. Edipro, 1997, p. 22-23. 165
PRADO, Melitha Novoa. Op. cit., p. 135. 166
MÜSSNICH, Francisco. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/ 10438/7015/Ed.%2013%20-%20Debate%20(site).pdf?sequence=1>.
97
especialização diminui o risco de análise equivocada nas decisões, já que quem vai
arbitrar tem conhecimento da matéria.
E tanto é verdade que, sob o título “Juiz sem especialização atrasa ações,
dizem advogados”, matéria publicada no CONJUR, de autoria de Pedro Canário167,
revela uma preocupação de advogados especialistas em determinada área,
atribuindo também à questão da morosidade do Judiciário a falta de conhecimentos
técnicos dos juízes, o que propiciaria julgamentos equivocados e, daí, a interposição
dos recursos processuais cabíveis.
E tanto é verdade que a criação de câmaras ou varas especializadas, pelo
país, plasma que até mesmo o Judiciário se coadune com a assertiva e tente, dessa
forma, minimizar a questão, dentro da gestão administrativa possível para a melhor
formatação da justiça.
No entanto, os problemas empresariais não podem ficar à mercê de soluções
judiciárias, visto que, a uma, são demoradas ante a própria instrumentalização
processual prevista, e, a duas, quanto ao notório fato de que o Judiciário está por
demais assoberbado, afinal, é necessário que a vida empresarial não fique
estanque, já que prejudicaria seu desenvolvimento e, pior, pode ser que o conflito
enseje o engessamento das próprias atividades administrativas ou empresariais de
produção.
Tem-se, portanto, que a formatação da arbitragem, por sua vez, já se
coaduna, em sua essência procedimental, em atender de forma dinâmica e eficaz
seus usuários, e isso, no âmbito da franquia, vem de ser fundamental.
Essencialmente, no que diz respeito à confidencialidade, em detrimento da
publicidade do processo judicial, a arbitragem permite que as partes envolvidas,
empresas que são e que têm interesse em manter o sigilo tanto relativo aos conflitos
que atravessem, quanto no que diz respeito às relações que mantêm no mundo
negocial, vislumbrem aspecto positivo, principalmente em se tratando de contratos
de franquia, pois que isso evita tornar público, inclusive, segredos de negócios,
valores envolvidos, know-how, clientela, projetos, entre outros.
Nas relações de franquia, a questão da preservação da confidencialidade
exerce papel preponderante, dada a própria sistemática negocial estabelecida e que
167
CANÁRIO, Pedro. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2012-mar-27/falta-especializacao-juizes-atrasa-acoes-propriedade-intelectual>. Acesso em: 7 maio 2014.
98
tem como núcleo aspectos de extremo sigilo, como, por exemplo, a transferência de
know-how, dentre outros.
Nesse sentido, menciona Adir Ribeiro168, na obra Gestão estratégica da
franchising, ao mencionar aspecto preponderante de se considerar nos documentos
de franquia:
Outro aspecto importante é a confidencialidade das informações dos manuais. É importante que esteja claro para a rede que as informações têm um caráter confidencial e que não podem ser passadas para outras pessoas que não pertencem ao sistema de Franquia da rede.
O sigilo da arbitragem permite, ainda, que a decisão arbitral não se torne um
padrão ou possa ser alegada por uma das partes como um precedente para os
demais casos a serem julgados, afinal, dado o sigilo do procedimento arbitral e, aqui
registro, não decorrente da lei, mas da tradição do procedimento arbitral, nenhuma
decisão pretérita, implica servir de base para o julgamento de outra análoga – e
aqui, portanto, não se verifica ocorrência de dissídio jurisprudencial a ponto de que
uma das partes se beneficie do norteador de uma decisão de caso análogo. E, sob
esse aspecto, é positivo, afinal, da arbitragem obtêm-se decisões personalizadas,
podendo-se afirmar que “cada caso é um caso” em se tratando de justiça privada.
E ressalte-se como um ponto positivo, já que, não necessariamente uma
decisão de caso análogo, supondo-se equivocada em algum aspecto, seja lastro
para outro caso em análise.
A arbitragem, portanto, traduziria o ambiente ideal para que os conflitos
derivados de relações negociais que se dão nuclearmente, em caráter confidencial
entre franqueadora e franqueado, sejam solucionados através de procedimento ideal
para refletir em linha de continuidade pactual, preservada a confidencialidade,
princípio que não se pode obter por meio da justiça estatal, já que impera naquele
setor o princípio publicista dos atos processuais.
Além disso, a preservação da relação entre as partes é a tônica da
arbitragem, que se realiza, normalmente, através de um sistema híbrido de
mediação ou conciliação prévia, e, sendo uma opção feita pelas próprias partes,
acaba no mais das vezes em atos de mútua cooperação.
168
RIBEIRO, Adir et al. Gestão estratégica do franchising: como construir redes de franquias de sucesso. São Paulo: DVS, 2011, p. 86.
99
Nessa mesma linha, e agora sob o enfoque das relações de franquia, ressalta
Adir Ribeiro169, a par do “lado humano da franchising”, que a construção de bases
relacionais sólidas entre as pessoas envolvidas nas relações de franquia evitaria
problemas que constantemente surgem nas trajetórias empresariais e daí a
integração entre CPFs em vez de somente CNPJs, como refere em expressão
figurativa para configurar que atrás de um CNPJ (de uma pessoa jurídica) sempre
existe uma pessoa física (CPF) – propiciaria relações mais maduras e responsáveis,
que consequentemente se refletiriam no comportamento e nas relações das pessoas
jurídicas relacionadas, citando o autor, ainda, que a franchising seria justamente
uma relação de forte interdependência entre as pessoas, minada de sentimentos,
expectativas, emoções, motivações, núcleo das relações de franquias.
Base nisso, a arbitragem, quando aplicada para solucionar conflitos instalados
em relação de franquia, seria capaz de aparar arestas de tal modo que resultasse
preservada a relação entre as partes – e isso porque a arbitragem se dá em
ambiente cuja pauta, ao contrário das lides dirimidas pelo Judiciário, não se
estabelece dentro da cultura litigante, senão em ambiente que promove justamente
a pacificação de conflitos.
Diante disso, ocorre, por via de consequência, adesão das partes aos ditames
traçados na sentença arbitral, ou seja, uma menor resistência aos comandos dela,
os quais, caso não cumprida, têm imediata via satisfativa, através de ação de
cumprimento prevista no Código de Processo Civil.
Nos contratos em cena, muitas vezes há o envolvimento de interesses
comerciais entre investidores de países diversificados, cujas normas jurídicas e
costumes têm diferentes contornos.
Nesse aspecto, justamente, reside uma das vantagens da utilização da
arbitragem nos contratos de franquia que possibilita a escolha livre pelas partes da
lei aplicável ao caso, podendo elas, inclusive, optar pelo julgamento do conflito com
fundamento na equidade, usos e costumes e regras de comércio internacional170.
Nesse sentido, Carlos Alberto Carmona171:
169
Id., ibid., p. 24-25. 170
“Art. 2º A arbitragem poderá ser de direito ou de equidade, a critério das partes. § 1º Poderão as partes escolher, livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, desde que não haja violação aos bons costumes e à ordem pública. § 2º Poderão, também, as partes convencionar que a arbitragem se realize com base nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio.” 171
CARMONA, Carlos Alberto. Op. cit., p. 15.
100
Segundo a Lei de Arbitragem, as partes têm liberdade de escolher o direito – material e processual – aplicável à solução da controvérsia, podendo optar pela decisão por equidade ou ainda fazer decidir o litígio com base nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio.
Abre-se um parêntese para tratar da questão da escolha da lei aplicável nas
arbitragens que envolvam os contratos de franquia.
Como paradigma, importa mencionar a decisão da 7ª Câmara do 1º Tribunal
de Alçada Civil de São Paulo – 1º TACSP, no julgamento do Agravo de Instrumento
– AI n. 1.111.630-0, que inaugurou precedente jurisprudencial a par da questão da
escolha, pelas partes em arbitramento, da lei que seria aplicável no julgamento da
lide, tendo em vista que a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB
prevê que a lei aplicável ao contrato seria a do local em que foi firmado e, no
contexto, não poderiam as partes estabelecer, em princípio, uma lei aplicável ao
caso concreto que não fosse da mesma territorialidade do pacto.
A saber, tratava-se de conflito entre partes de nacionalidade diferente que
haviam atribuído, na cláusula arbitral, a aplicação da lei francesa ao deslinde do
conflito, por arbitragem. A questão resultou solvida, merecendo seja colacionado
trecho do voto do juiz relator Waldir de Souza José:
[...] não há invocar-se a Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro [atual Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro – LINDB], que só tem aplicação quando houver omissão ou controvérsia a respeito do direito aplicável à hipótese. Como a lei nº 9.307/96, em seu art. 2º, permite que as partes possam livremente escolher as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, não se verifica o desconforto entre a lei de arbitragem, que preserva em seu art. 9º, tal direito às partes, em detrimento as regras da CCI [...] 172
No mencionado julgamento, resultou declarada a validade da cláusula arbitral
e garantida a escolha da lei aplicável eleita pelas partes, ainda que não guardasse a
mesma territorialidade. A respeito da lei aplicável, o Tribunal entendeu que não era
correto pautar-se no regramento da Lei de Introdução às normas do Direito
Brasileiro, visto que o art. 2º, § 1º, da Lei de Arbitragem permite às partes que optem
livremente pelas regras aplicáveis à solução do litígio, e, por fim, que não havia
172
LEMES, Selma. A ESCOLHA DA LEI APLICÁVEL NA ARBITRAGEM. IMPORTANTE
PRECEDENTE JURISPRUDENCIAL. http://www.selmalemes.com.br/artigos/artigo_juri08.pdf - Acesso em 16.02.2014.
101
invalidade pelo fato de a questão envolver representação comercial, regulada em lei
especial, já que se trata de direitos disponíveis e transigíveis.
Em termos de contrato de franquia, sem dúvida, a eleição pelas partes da lei
aplicável ao julgamento de eventual conflito, principalmente considerando-se a
internacionalização desse tipo de contrato, é característica que interessa nesse meio
negocial, tendo em vista que, tanto a possibilidade da eleição da lei aplicável à
matéria em conflito, no caso de julgamento por arbitragem, quanto à possibilidade da
aplicação da equidade, resulta em ponto de convergência entre ambos os institutos,
de franquias e arbitragem, como forma inquestionavelmente benéfica.
Dessarte, tanto as partes podem escolher a lei a ser aplicada no caso
concreto, como também poderão fazer a opção pelo idioma a ser utilizado, bem
como eleger árbitros de outros países sem interferir na nacionalidade da decisão,
principalmente porquanto, nesse aspecto, o Brasil adotou o critério da territorialidade
da decisão, segundo o qual a decisão será nacional ou estrangeira de acordo com o
local em que foi preferida.
A par dessas reflexões e experiências, pode-se dizer que fica de certa forma
pasmada a ideia de que a utilização da arbitragem no segmento da franquia é
solução ideal, coadunada aos princípios cujos fatores “tempo, causa e efeito”,
primordiais nas relações de franquias, são igualmente fatores intrínsecos da
arbitragem e retratados nos princípios da celeridade, especialidade, sigilo,
previamente solucionável por técnicas de mediação e despida que é da visão
paternalista que ainda se agrega ao Judiciário, no sentido de que este se veste da
cultura de solução de lides através da figura austera do Estado, em detrimento da
firme, porém branda ideia de solução por composição e diálogo advinda da
arbitragem, quase que um processo cooperativo entre partes, traduzido na dinâmica
da arbitragem173.
As vantagens que regem a arbitragem, por si só, formam uma sincronia
perfeita com o objeto do contrato de franquia, e, por essa razão, vem sendo utilizada
cada vez mais nesse segmento.
Quanto ao tema, na leitura de Sebastião Jose Roque174, obtém-se:
Não há um poder judiciário internacional, a justiça pública universal. O foro competente para julgar questões internacionais, com
173
PRADO, Melitha Novoa. Op. cit., p.132. 174
ROQUE, Sebastião José. Op. cit., p. 162-163.
102
predominância na área contratual é estabelecido pelas próprias partes na cláusula de eleição de foro. No plano nacional há certas limitações à eleição de foro pelas partes, pois o Código de Processo Civil impõe normas sobre o foro competente [...] nessas condições, empresas de países diferentes poderão celebrar contrato coma eleição de foro competente para dirimir quaisquer controvérsias entre elas, perante a justiça de um dos países a que pertença alguma delas ou, então, no foro de qualquer dos países [...] Entretanto, não seria apenas a escolha do foro a preocupação das empresas contratantes, mas também o direito a ser aplicado [...] as vias costumeiras de solução têm apresentado sensível inadequação para o exame de divergências entre empresas engajadas num contrato. Por estas razões as normas internacionais penetram no Brasil, transformando-se em direito nacional, como foi o caso da arbitragem [...]
Pode-se, portanto, afirmar que a arbitragem, uma vez utilizada como meio de
solução de conflitos derivados de contratos de franquia, não seria apenas
conveniente, como de inquestionável vantagem, já que os institutos em apreço
acham-se sincronizados tanto quanto em relação ao binômio formatação/princípios
de regência quanto em vista das vantagens de sua aplicação a tais contratos.
Mister se registre, por derradeiro, que a instituição da arbitragem em contratos
de franquia resulta mais bem enquadrada através de eleição por cláusula
institucional, em detrimento das demais formatações possíveis.
E, nesse particular, uma vez que na arbitragem institucionalizada as regras do
formato processual a adotar são as que vigoram na instituição escolhida pelas
partes, nos limites da lei arbitral, desde já se consagra como um facilitador.
Nesse ponto, interessa notar que, se antes do conflito, as partes, ao
instituírem a cláusula compromissória e, assim, elegerem a arbitragem para
solucionar os conflitos decorrentes da contratação em cena, não ditarem as regras
procedimentais uma a uma, a serem adotadas na ocasião do conflito, muito menos
condições terão de fazê-lo quando instalado o conflito, afinal, pressupõe-se que, no
curso do quadro controvertido entre elas, a tendência é que não haja convergência
nesse aspecto, podendo, assim, gerar-se um conflito além daquele conflito de
essência, o que seria um aspecto negativo na relação.
Dessarte, uma vez estabelecida pelas partes a arbitragem institucional, sua
administração ocorrerá pela instituição eleita, que, por sua vez, possui regulamento
próprio e tem disciplinada a forma de eleição de árbitros, o que dá ensejo à
segurança jurídica a tal ponto que nem sequer se instalaria entorno a eventual
103
aplicação do art. 7º da Lei de Arbitragem175, podendo a parte que desejar dar início
à arbitragem dirigir-se à referida instituição.
Ainda, a definição, guarda dos documentos e o local de realização das
reuniões ou audiências já é questão que deixa de ficar ao encargo de as partes
resolverem ou mesmo responsabilizarem-se, já que a própria instituição arbitral é
quem zelará pelo cumprimento de tais questões.
Portanto, a arbitragem tende a ser o melhor método de solução de disputas
para um contrato de franquia, e a cláusula arbitral institucional nesses contratos
tende a fomentar o lucro e reduzir a perda, notadamente.
Relativamente à cláusula institucional aplicada aos contratos de franquia, é de
se perceber que a agilidade e confidencialidade que se vê convergentes na
arbitragem ao instituto negocial em tela estariam mais bem preservadas se ficassem
restritas ao âmbito arbitral institucional.
Nesse particular, cabe tecer que em caso de eventual inadimplência por
resistência do adverso em submeter-se à cláusula arbitral ou em não havendo
acordo prévio entre as partes sobre a forma de instituir a arbitragem, o que jamais
ocorreria fosse instituída através de cláusula compromissória institucional, as partes,
ao utilizarem-se do direito conferido no art. 7º da Lei de Arbitragem, e, assim,
levando à apreciação da justiça estatal o conflito nesse sentido, de alguma forma
estariam afetando princípios básicos a par da confidencialidade, já que em sede de
estatal não se aplica o sigilo em casos tais, bem como, caso procedente a ação,
obtendo da justiça estatal o suprimento dessa vontade, nasceria a partir de uma
sentença judicial o juízo arbitral.
Tal sistemática de certa forma prejudicaria os interesses das partes no
contrato de franquia, uma vez que contraria os princípios que convergem entre a
arbitragem e a franquia, e, segundo a exegese do citado artigo legal, o conflito
instado a par da eleição da arbitragem, sendo solvido em sede de processo judicial,
frustraria, de certa forma, a agilidade esperada do juízo arbitral antes eleito.
Ainda, dar curso ao procedimento arbitral através de uma sentença judicial
que supra a vontade da parte relativamente à eleição da justiça privada é
reconhecer de certa forma que a parte recalcitrante não estaria utilizando-se da mais
estrita boa-fé, já que se esquiva da utilização do instituto por um mecanismo judicial
175
A saber, o art. 7 º da lei outorga eficácia positiva à cláusula compromissória, diante da resistência da parte em instituir a arbitragem que livremente pactuou.
104
que admite, inclusive, recurso em caráter infringente e, nesse pensar, o decurso do
tempo prejudicaria a plena e ágil solução do conflito.
Dessarte, a cláusula compromissória institucional é recomendação nas
relações negociais e especificamente nos contratos de franquia, quando a dinâmica
por si só pressupõe uma preservação da relação e rapidez na solução de conflitos
que poderiam pôr em risco toda a atividade do negócio.
6.2 A adesividade do contrato de franquia e a arbitragem
Normalmente utilizado em relações de consumo de massa, o contrato de
adesão nada mais é senão aquele cujas cláusulas são pré-impressas e estipuladas
por uma das partes, sujeitando a outra parte signatária às regras preestabelecidas
no negócio jurídico.
Na doutrina de Orlando Gomes176 temos que o contrato de adesão é aquele
em que uma das partes tem que aceitar, em bloco, as cláusulas estabelecidas pela
outra, aderindo uma situação contratual que encontra definida em todos os seus
termos.
Relativamente ao contrato de adesão, interessante abordagem observa-se
em Fran Martins177:
[...] cedo se desenvolveram em larga escala e hoje são grandemente usados nos negócios comerciais. Significam uma restrição ao princípio da autonomia da vontade, consagrado pelo Código Civil Francês, já que a vontade de uma das partes não pode manifestar-se livremente na estruturação do contrato [...]
De dizer, portanto, que, em relação à definição do contrato de adesão, este
não difere em muito na doutrina, que pesa uníssona relativamente à construção
desse tipo de contrato, vislumbrando-se a ideia de manifestação de vontade das
partes, expressa pela edição das regras do negócio jurídico por uma delas e pela
adesão dessas regras pela outra parte, quando então surge o vínculo jurídico entre
elas relativamente ao contrato.
176
GOMES, Orlando. Contratos. 18. ed. atual. e anotada por Humberto Theodoro Júnior. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 109 e 119. 177
MARTINS, Fran. Op. cit.,, 8. ed. 1958, p. 99.
105
Em verdade, os contratos de adesão representariam uma espécie de
evolução necessária aos instrumentos contratuais na atual conjuntura do mundo
jurídico dos negócios, já que caracterizado por um novo conceito em pró da
otimização e velocidade com que se realizam os negócios.
Para melhor entendimento, interessa-nos retratar, em linhas gerais, que,
nessa evolução histórica do contrato, os princípios lex inter pars e pacta sunt
servanda, reportando o pensamento jurídico advindo do liberalismo econômico do
século XIX, influenciaram o CCB de 1916, e que de sua via passou por uma
adaptação à nova realidade social inaugurada com a era capitalista, até caminhar às
concepções atuais do Código Civil de 2002.
Nessa trajetória, note-se que, partindo do Código editado sob influência do
liberalismo, havia menos intervenção do Estado na vida negocial, atribuindo-se às
partes essa responsabilidade de estipularem suas regras, as quais se tornariam “lei
entre elas”, competindo-lhes o devido policiamento178.
No entanto, com o advento do capitalismo, o pensamento liberalista teve que
ser, de certa forma, adaptado a essa realidade introduzida pela sociedade, que
passou a caracterizar-se como de consumo.
Em verdade, observa-se que os contratos de adesão são uma técnica
contratual inerente à sociedade industrial, capitalista, globalizada e massificada,
como meio de dar maior velocidade à contratação de produtos e/ou serviços, bem
como visando ao custo e ao lucro empresariais.
O conceito legal do contrato de adesão está na Lei n. 8.078/90, em seu art.
54, que pode ser invocada por analogia às demais áreas do direito civil, não
somente para as relações de consumo:
Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.
Cláudia Lima Marques179, a par do contrato de adesão, retrata que o aderente
“[...] (muitas vezes sem sequer ler completamente) as cláusulas [...]”, aceita em
bloco o clausulado pelo contratante e daí as regras da relação porquanto unilateriais
e pré-elaboradas por uma das partes, outorgaria ao aderente “um papel de simples
178
ZANARDO, Maria Antonieta. Proteção ao consumidor – conceito e extensão. RT, 1993, p. 15. 179
MARQUES, Cláudia Lima. Op. cit., p. 31.
106
aderente à vontade manifestada pela empresa no instrumento contratual
massificado".
No contexto, segundo o conceito de Orlando Gomes180 para os contratos de
caráter adesivo: "No contrato de adesão uma das partes tem que aceitar, em bloco,
as cláusulas estabelecidas pela outra, aderindo uma situação contratual que
encontra definida em todos os seus termos".
Assim, dada a natureza dos contratos adesivos, duas são as possibilidades:
ou o aderente aceita as cláusulas pré-redigidas ou não firma o contrato, ou seja,
dentro da sua manifestação de vontade, anui ou não ao clausulado.
Lastro nesses padrões doutrinários, para Melitha181:
Ao contrário do que se pensa, o contrato de franquia não é um contrato de adesão, mas sim “por adesão”, chamado de contrato padrão. Os contratos de adesão são aqueles nos quais o contratado não possui chance alguma de requerer alguma alteração ou modificar alguma cláusula, como são, por exemplo, aqueles assinados com as concessionárias [...] Diferentemente, o contrato de Franquia, apesar de ser padrão para o sistema formatado pelo franqueador, pode sofrer alguns ajustes de forma a esclarecer alguns pontos nebulosos e até mesmo se adaptar às condições acordadas com o franqueador. Isso não significa que o franqueador terá várias minutas diferentes do seu contrato de franquia. Na realidade, para que o franqueador pratique gestão participativa da sua rede, o padrão contratual deve ser único [...]
E, portanto, relativamente à classificação do negócio como adesivo, como
bem observa Nelson Nery Junior182, existem duas figuras, a saber: o contrato por
adesão e o contrato de adesão.
Nesse sentido, não demais lembrar que a própria Lei de Franquia remete para
a existência de um padrão, uma formatação única do sistema de franquias, de modo
que se possa estabelecer, dentro desse sistema, uma homogeneidade comercial.
E tudo isso porque, ante a própria natureza do contrato de franquia, pode-se
verificar que, uma vez estruturado o sistema de franquias, as contratações dele
derivadas seguirão um mesmo padrão, capazes de atender às condições do próprio
negócio, razão por que, uma vez formado o sistema, não tem espaço ao
franqueador excetuá-las em favor de um ou outro franqueado.
180
GOMES, Orlando. Op. cit., p. 109 e 119. 181
PRADO, Melitha Novoa. Op. cit., p. 141-142. 182
NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil comentado. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 551.
107
A imposição dessa contratação por meio de instrumentos pré-redigidos pelo
franqueador dá ao contrato de franquia, já de princípio, ares de adesividade, visto
que ao candidato a franqueado não é permitido discutir as cláusulas, mas apenas
pequenos ajustes.
Inegável que dentro de um sistema de franquias, estruturado que deve ser, os
contratos dele derivados obedecerão a um padrão de cláusulas e condições
elaboradas pelo franqueador e será celebrado por mera aceitação das condições
impostas, com pouca possibilidade de negociação pelo franqueado, principalmente
porquanto não se pode pensar em inovar cláusulas em um contrato que, em sua
essência, tem a função de ratificar entre as partes tudo quanto se espelha desse
sistema – sistema este construído pelo franqueador.
Nesse sentido, mister ter em mente que a franquia é um microssistema que
exige um olhar diferenciado e mais cuidadoso relativamente aos seus conceitos e
características, devido a suas peculiaridades. Por isso, a importância de estudar a
cláusula compromissória nos contratos de franquia e não nos contratos de adesão
em geral faz-se presente neste trabalho.
Inegável que o contrato de franquia é um contrato bilateral, uma vez que
produz direitos e obrigações entre as partes. Também não há discussão quanto à
sua onerosidade, pois prevê ganhos e perdas entre as partes.
E, por se tratar de contrato de execução continuada, uma vez que indica
sucessivas prestações, tem como premissa o sucesso do negócio, que dependerá
da continuidade saudável dessa contratação.
Assim, como já mencionado, quanto às características acima descritas há
pouca discussão, e no que diz da sua tipicidade ou atipicidade, embora se perceba
alguma divergência doutrinária afinal, a lei delineia seu conteúdo, mas não impõe
uma disciplina singular, não é discussão relevante neste, razão pela qual não nos
ateremos ao tema.
Interessa-nos, para efeito deste estudo, em verdade, outro aspecto que tem
ditado essa seara pactual e que diz respeito à classificação do contrato de franquia
quanto à sua adesividade, interessando observar que a Lei de Franchising brasileira,
dentre outras questões que cercam o cenário, enumera em seu art. 3º a exigência
do franqueador antes de firmar qualquer contrato com o franqueado, para que
exponha, dentro do prazo legal de dez dias que o antecede, através de documento
que o legislador denominou circular de oferta de franquia, os elementos e
108
informações pertinentes ao negócio de forma ampla, com todos os esclarecimentos
necessários ao desenvolvimento deste, ensejando entre as partes análise e
discussão antes da formalização do contrato.
E aí justamente reside a questão: porquanto a franchising se dá dentro de um
sistema que envolve uma gama de negócios jurídicos, e que esses negócios
jurídicos devem ser paritários em relação aos demais franqueados, e, por isso, a
franquia ocorre dentro de um único formato, fica difícil imaginar que se possa
contratar exceções a um ou outro, dentro de um mesmo sistema, até porque os bens
ou serviços são produzidos ou distribuídos de modo uniforme, e igualmente também
são reguladas de maneira uniforme as relações contratuais insertas nesse sistema.
Nesse particular, Eduardo Silva da Silva183, ao discorrer sobre contratos
adesivos, refere que:
A impossibilidade fática de ambas as partes discutirem os termos do negócio ou contrato, conhecendo detalhadamente cada minúcia técnica, é substituída pela cognoscibilidade, ou seja, pelo fato de o formulador das condições gerais do contrato garantir ao contratante hipossuficiente a faculdade de examinar e conhecer as condições do contrato. A escusa de não ter tido ciência expressa das nuanças contratuais não serve para fazer com que o contratante mais fraco se desobrigue em relação a algumas disposições porque o formulador destas deve ter garantido o seu amplo acesso a todas as informações possíveis [...]
Nesse pensar, e porquanto a Lei de Franquia, em sede nacional, exige que o
franqueador, por meio de um pré-contrato denominado COF, exponha ao
franqueado fidedigno conhecimento do negócio antes de efetivamente contratar,
ficaria resolvida tanto a questão da ampla cognição negocial, entre as partes, quanto
a vinculação entre elas, no que pertine à solução de conflitos por arbitragem,
independentemente da classificação doutrinária que se dê ao contrato de franquia:
de adesão ou por adesão.
Da leitura da Lei n. 8.955, de 15 de dezembro de 1994 – Lei de Franchising,
também chamada de Lei de Magalhães, verificamos, em seu art. 4º, in verbis:
Art. 4º A circular de oferta de franquia deverá ser entregue ao candidato a franqueado no mínimo 10 (dez) dias antes da assinatura do contrato ou pré-contrato de franquia ou ainda do pagamento de qualquer tipo de taxa pelo franqueado ao franqueador ou a empresa ou pessoa ligada a este.
183
SILVA, Eduardo Silva. Arbitragem e direto da empresa: da arbitragem e direito da empresa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 87.
109
Relativamente à aplicação da arbitragem nos conflitos que envolvam franquia,
colaciono entendimento do TJSP, a título exemplificativo:
TJ-SP – Apelação APL 9072852592006826 SP 9072852-59.2006.8.26.0000 (TJ-SP) Data de publicação: 14/12/2011 Ementa: JUÍZO ARBITRAL - Cláusula compromissória de arbitragem, inseria em contrato de franquia - A decisão que extingue o feito por reconhecer a existência de prévio pacto de arbitragem (art. 267, VII, CPC) é sentença, não interlocutória (art. 162, § 1º, CPC); logo, o recurso a ser contra ela manejado é a apelação (art. 513, CPC) - Não se vislumbra nulidade de cláusula compromissória arbitral em
contrato de franchising ao só argumento de que a avença é de
adesão - De resto, o direito consumerista não incide à espécie, porque ambos os polos contratantes se amoldam à figura legal de "empresário" (art. 966, CC) - Demanda com vistas à desconstituição dos contratos, por supostos vícios de consentimento (erro e estado de necessidade) - Estão em xeque apenas direitos patrimoniais disponíveis: os autores argumentam que lhes foi exposto, pela ré,
panorama do negócio que se evidenciou, a posteriori, divergente da
realidade, daí sua bancarrota, e reflexa pretensão indenizatória material e moral aqui vertida - Os vícios da vontade não induzem nulidade absoluta, mas anulabilidade, apta a convalescer caso não exercido tempestivamente o direito potestativo à desconstituição (arts. 169 e 172, CC ) - Consequente impossibilidade de apreciação da controvérsia pela Jurisdição Estatal - Admissível, quando muito, o processamento da ação prescrita pelos arts. 7º e seguintes da Lei de Arbitragem (9.307/96) - Sentença de extinção sem resolução de mérito mantida - Apelo não provido.
Do aresto acima, observa-se que o entendimento coaduna-se com a lei, que,
na sua exegese, não nega a validade e eficácia aos contratos de adesão, pelo
contrário, provê sua eficácia e validade desde que respeitadas na relação, como
cuidou o legislador estabelecer, aquelas premissas relativas ao conhecimento
efetivo do aderente.
Não obstante isso, a franquia, por se tratar de um sistema único, e cuja
contratação entre as partes será determinada através de incontestável e prévio
conhecimento do franqueado de todas as peculiaridades do negócio, tem sua
eficácia e validade indiscutíveis, e, consequentemente, vinculativas as normas
estipuladas para o negócio.
Relativamente à cláusula compromissória institucional, inserta em contrato de
adesão ou por adesão, qualquer que seja o entendimento doutrinário que se tenha a
par do contrato de franquias, resultaria de uma obrigação de fazer, ou seja, afastaria
o Poder Judiciário, para solver os conflitos decorrentes do seu objeto, e, aqui, o
110
legislador preservou tal condição, ao prever que, assumindo a redação da cláusula
compromissória, aqueles requisitos que a lei entende indispensáveis a sua validade
e eficácia, uma vez atendidos, não faria prevalecer o discurso de que a cláusula
compromissória não tem validade.
Refere Eduardo Montenegro Dota184 que:
[...] devidamente cumprido o ritual destinado a validação da convenção arbitral para os pactos de adesão, não poderá a parte aderente sustentar o desconhecimento, o descontentamento ou, mesmo, que fora levada a erro ao concordar com a cláusula arbitral, sob pena de atentar contra a boa-fé que deve presidir as relações contratuais legalmente estabelecidas [...]
Nesse andar, reitero: considere-se adesivo ou por adesão o contrato de
franquia. Em verdade, uma vez cumpridas as formalidades legais para sua
validação, não há que questionar a cláusula arbitral, na acepção do disposto no art.
4º, § 2º, da Lei de Arbitragem.
E isso porquanto, em sede de franquia, no sistema que constitui o referido
negócio, obtêm-se contratos-tipo, cujas cláusulas são padronizadas para toda a rede
de franqueados, os quais raramente poderão ser alteradas, em virtude da
necessária padronização que opera de forma positiva ao desenvolvimento da
atividade econômica avençada, e que somente através desse tipo de contratação é
que se possibilita o sucesso das transações afeitas, como inclusive reporta Eduardo
Montenegro Dota185.
184
DOTA, Eduardo Montenegro. Aspectos da arbitragem institucional Op. cit., p. 79 – capítulo aplicabilidade nos contratos de adesão – sistema financeiro – da obra 185
Id., ibid., p. 80.
111
7. A “CHAVE DE SEGURANÇA” PARA INSERÇÃO DA CLÁUSULA
COMPROMISSÓRIA INSTITUCIONAL NOS CONTRATOS DE FRANQUIA:
ASPECTOS POLÊMICOS DA CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA
INSTITUCIONAL EM CONTRATOS DE FRANQUIA
Atentos à classificação doutrinária, pode-se afirmar que o contrato de franquia
preserva características complexas, uma vez que estão insertas em um sistema e
envolvem múltiplas relações negociais, e, assim, por vezes, visto como contrato de
adesão pura e simplesmente, outras como contrato por adesão, conforme
referências antes mencionadas.
Em verdade, no que diz respeito à aplicação da arbitragem como aliada para
solução de conflitos derivados dos contratos de franquia, a matéria é de certo modo
pacífica, não guardando muitos temas em divergência.
No entanto, algumas características merecem um olhar mais atento, conforme
veremos adiante, para que tal relação de mutualismo possa dar-se de forma plena e
eficaz.
A par das características perfeitamente identificáveis na Lei de Franquia pátria
e na Lei de Arbitragem nacional, observamos duas premissas que devem ser
debatidas e dissolvidas, pois que constituem elementos de grande importância para
segurança dessa relação:
a) o caráter adesivo do contrato de franquia e o princípio da autonomia da
vontade para a validade e eficácia da cláusula compromissória institucional;
b) o custo da arbitragem e o exercício do direito diante de eventual
hipossuficiência financeira de uma das partes e notadamente para custear um
procedimento arbitral.
A primeira premissa parte do princípio de que, porquanto o contrato de
franquia tenha caráter de adesividade, a eleição, pelas partes contratantes, da
jurisdição arbitral em detrimento da estatal, para a solução de controvérsias dele
decorrentes, consequentemente deverá observar, em face da Lei de Arbitragem
nacional, o tratamento especial nela contido para esse tipo de contratação.
Tomada essa medida, evitam-se, assim, controvérsias futuras em relação à
utilização da arbitragem, sob pena de que, em ocorrendo conflito proveniente do
contrato de franquias, outro ainda se instaure, inaugurando-se discussão a par da
eleição da via arbitral, antes de dissolver o conflito que originou a demanda.
112
E justamente este é um ponto nodal que devemos cuidadosamente observar,
uma vez que se pretende aliar a utilização da arbitragem institucional como via
jurisdicional aos contratos de franquia, afinal, de tudo quanto aqui se viu, não existe
arbitragem desassociada do princípio da autonomia da vontade, que, no caso,
deverá ficar moldada aos ditames determinados pela lei.
Igualmente, o sistema de franquia, desnecessário dizer, é um e único para
todos os franqueados e, assim, não se pode conceber que haja uma forma híbrida
dentro desse sistema para uns e outros franqueados.
Todavia, uma vez preservado o sistema, pode-se admitir, em poucas
adaptações, seja pactuado entre as partes, por exemplo, que a arbitragem não
tenha escopo nessa relação ou mesmo que tenha. E daí, porque surge
entendimento que o contrato de franquia é “por adesão” e não “de adesão”, afinal,
não ficaria de todo engessado, sem possibilidade de alteração de pactuado, desde
que não interfira ou modifique o sistema de franquia.
Não obstante, se o sistema de franquia estabelece em seu universo que os
conflitos dele decorrentes serão dirimidos através da arbitragem, é certo que, do
ingresso do franqueado nessa cadeia, uma vez tenha sido ciente e consciente a par
dessa eleição sugerida pelo franqueador, e aí reside a importância de que constem
na circular de oferta de franquia de forma pormenorizada, inclusive, questões a par
da arbitragem institucional, essencialmente a estimativa de custos a ela atrelados,
não se pode dizer que se tenha sublimado o aspecto da vontade da parte na eleição
da forma e sistemática de solução de controvérsias entre as partes.
E isso se dá porque a exigência legal é, justamente, no sentido de que se dê
à outra parte, em contratos previamente redigidos, pleno conhecimento da cláusula
arbitral, que deverá estar negritada e vistada especialmente para tal fim, de sorte
que, como já se abordou neste trabalho, trata-se de um contrato apêndice, por vezes
inserto dentro de outro contrato e no qual, embora não dependa da eficácia e
validade deste, tem seu berço.
E aqui registro que este trabalho tem por enfoque a utilização da arbitragem
institucional em pactos tais, de sorte que entendemos esta a mais segura e,
portanto, eficaz sistemática, como já se abordou, para que se dê a plena relação
mutual entre os institutos; não demais lembrar, desde que as partes estipulem a
arbitragem por cláusula cheia, indicando na cláusula a câmara eleita, o que se
repisa.
113
Todavia, importante lembrar que a Lei de Arbitragem vigente foi inaugurada
no País em 1996, sob a égide do Código Civil de 1916.
Com o advento do Código Civil de 2002, donde se observou nítida a evolução
social decorrente da inserção de princípios constitucionais civilistas pautados pela
Constituição Federal de 1988, e, consequentemente, do direito e comportamentos
entre partes, precipuamente reflexos no mundo negocial, observa-se uma
necessidade de readequar a relação arbitral ao panorama contemporâneo, bem
como preencher eventuais lacunas que ao longo de sua existência vêm sendo
supridas por decisões judiciais ou arbitrais nesse âmbito.
Nesse enfoque, inegável que, em razão disso, a Lei de Arbitragem projetada,
nesse particular, contém elemento reflexo e necessário, em alinho ao que dispõe o
Código Civil186.
E isso se vê nítido ao analisarmos os dispositivos legais referentes à cláusula
compromissória nos contratos de adesão187, donde se conclui que a preocupação do
legislador pátrio foi afastar a possibilidade de instituição de uma arbitragem
compulsória, e, por isso, exigiu fosse cumprida a forma determinada para outorgar-
lhe a devida eficácia.
Observe-se que no projeto de Lei de Arbitragem, não obstante persista a
tônica da arbitragem voluntária, de sua via, essa preocupação vem mais abrandada
em sua forma, quando, note-se, desaparece do dispositivo a expressão “vistada”,
exigindo apenas, o legislador, seja cumprido aspecto redacional na cláusula: Art. 4º,
§ 2º: “Nos contratos de adesão a cláusula compromissória só terá eficácia se for
redigida em negrito ou em documento apartado”.
Parece claro que, ao abrandar a exigência prevista para a eficácia da cláusula
compromissória na lei projetada, o legislador tratou de distinguir os tratamentos para
186
CCB 2002: “Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente. Art. 424. Nos contatos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio”. 187
Lei de Arbitragem vigente: “Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato. § 1º A cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, podendo estar inserta no próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira. § 2º Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula”.
114
os “contratos adesivos” e “contratos adesivos em relações de consumo”,
regramentos estes que serão observados dentro dos respectivos sistemas.
Em verdade, foi, sem dúvida, um grande avanço, afinal, em se tratando de
contrato de adesão sem relação de consumo, a eficácia da cláusula fica
condicionada apenas a dois requisitos não cumulativos: redação em negrito ou em
documento apartado.
E em que pese a lei projetada ter feito expressa referência à clausula
compromissória, nesse particular, a mesma sorte seguirá eventual compromisso
arbitral firmado entre partes e que envolva o contrato de adesão sem relação de
consumo, afinal, ao autorizar o seja em documento apartado, também não indica o
tempo em que a eleição da via arbitral deva ocorrer entre as partes, sugerindo
apenas que antes da existência do conflito, mas jamais impedindo sua eleição após
ele instaurado.
O que fica impresso, portanto, como vontade do legislador, é que as partes
que desejarem solver questões controvertidas oriundas de contrato de adesão sem
enfoque consumerista, ao firmarem a cláusula compromissória nele inserta, estariam
naquele momento cientes da utilização da via arbitral ao deslinde de eventuais
questões dele decorrentes, manifestando sua vontade ao assinarem a convenção de
arbitragem.
A arbitragem institucional, portanto, estruturada que é a partir da vontade das
partes, encontra um tratamento peculiar quando instituída através de uma cláusula
compromissória inserta em contratos de adesão e, aqui, porque não dizer, leia-se:
“em contratos de franquia”, para efeitos de análise do tema neste debate.
Isso porque, considerando-se a cláusula de eleição da arbitragem inserta na
relação de franquia (e aqui sob o ponto de vista macro e, portanto, focada a relação
negocial como um contrato de adesão), a prevalência da vontade de uma das partes
no âmbito do negócio contratado vem sim predeterminada, o que poderia conduzir
ao entendimento precipitado de que isso reduziria a outra parte, o franqueado, sua
expressão de vontade, que se resumiria ao mero aceite daquelas cláusulas.
Contudo, tal assertiva, sob uma análise precipitada, induz-nos ao equívoco de
que, consequentemente, tal inserção implica o reconhecimento da limitação da
vontade do franqueado na época da eleição do sistema de solução de controvérsias
daquele contrato, o que não é verdade.
115
Da leitura atenta da lei vigente e da lei projetada de arbitragem e sob o ponto
de vista técnico, ao contrário do que em análise precípua se possa estabelecer em
falsa premissa, em verdade, pelo legislador pátrio resultou diferenciado na lei
projetada o âmbito da relação entre empresários e entre consumidores, e, portanto,
a eficácia clausular fica condicionada a que se obedeça a determinadas regras,
devendo ser redigida e destacada em negrito e na lei em vigor, vistada como prova
de que a parte aderente teve conhecimento daquela eleição jurisdicional, podendo
ser essa forma substituída por pacto redigido em instrumento separado do contrato.
Obviamente, porquanto o franqueador seja o detentor do conhecimento
peculiar do negócio, em princípio, pode-se dizer que estaria em posição diferenciada
em face do franqueado.
Em se tratando de contratos de franquia, e daí notadamente atendendo a
requisito legal inserto na legislação pátria a tais contratos, mais uma vez sente-se
presente e imprescindível o atendimento do conhecimento prévio ao franqueado,
igualmente, no que respeita à inserção de eleição arbitral no pactuado.
Dessa forma, através da circular de oferta de franquia pelo franqueador ao
franqueado (e aqui entendemos), é o momento em que deverá ser incluída a
questão da arbitragem vertida ao contrato de franquia.
E isso, porquanto seja um documento prévio legalmente exigido para que se
estabeleça com segurança o negócio de franquia e que possibilita um equilíbrio
contratual pleno entre as partes contratantes, que comprovará, indefectivelmente,
que ao franqueado foi dado a conhecer com mais acuidade, do negócio que está
contratando em todas as suas faces, notadamente a eleição da arbitragem.
Isso se justifica, afinal, se a Lei de Arbitragem brasileira previu mecanismo
coibitivo de eventual abuso no tocante à inserção de cláusula arbitral nos contratos
de adesão, o que se infere da exegese ao art. 3º, § 2º, supondo-se que, em
determinado caso, o franqueado alegue abusividade da cláusula, caberá ao
franqueador comprovar que a cláusula arbitral não foi firmada compulsoriamente, em
detrimento do aderente ou em razão de uma situação menos vantajosa para este.
O que jamais poderá ocorrer, sob pena de contribuirmos para a insegurança
da utilização da arbitragem na relação de franquia, é que a franqueadora, no curso
da contratação, decida alterar o sistema, incluindo a arbitragem como forma de
solução de conflitos entre as partes, sem que anteceda ciência e aceite dessa
116
eleição pela parte franqueada e vice-versa, e isso por questões óbvias: ninguém se
obriga àquilo que não convencionou.
Nesse passo, uma vez seja assim disposto entre as partes, a concordância
expressa do franqueado na instituição de cláusula compromissória arbitral, bem
como de que tal cláusula constante no contrato em cena apresenta-se em negrito no
corpo do contrato ou firmada em anexo, fica cristalino que as partes tinham entre si
avençado, sem embargos, tal eleição jurisdicional.
Nesse sentido, por via de consequência, ocorrerá a autorização expressa a
que o contratante, interessado na resolução de eventual litígio, tome a iniciativa de
instauração da arbitragem, ficando o adverso, uma vez formalizado o pedido,
obrigado em aceitá-la sem nenhuma possibilidade de optar, unilateralmente, pela
jurisdição estatal.
Diante disso, e se muito se discutiu sobre a validade da arbitragem nas
relações de franquia, hoje resulta suficientemente firme que a eleição da arbitragem
é válida, sim, ainda que se trate de franquia, e mesmo que, na pior das hipóteses,
entenda-se que o contrato de franquia é um contrato de adesão. E tudo isso desde
que sejam respeitados os termos do § 2º do art. 4º da Lei n. 9.307/96.
Nesse cenário, importa frisar que, embora a questão da utilização da
arbitragem em contratos de franquia seja, atualmente, não apenas via de acesso
cada vez mais frequente para solver controvérsias dele advindas, mas cada vez
mais sagrada e consagrada pelos Tribunais de Justiça do País, na questão da
vinculação, como já se observou alhures em decisões colacionadas neste trabalho,
mister que não se perca a “chave de segurança” para que a eficácia e validade
plena da instauração da arbitragem ocorra sem embargo.
E aqui repiso: para que o franqueado não seja visto como a parte mais fraca
da relação e, ainda, sem intelecção suficiente para analisar o foro eleito, afinal, na
maioria das vezes, essa não é a realidade, é importante que o franqueador se
resguarde de provas da inexistência da hipossuficiência e falta de intelecção por
parte do franqueado, o que é facilmente dirimido a partir da redação da circular de
oferta de franquia.
Todavia, entendemos que na circular não deverá apenas reportar a que a
arbitragem será a via utilizada para dirimir os conflitos entre as partes, mas, sim,
oportunidade em que o franqueador exporá as questões relativas à arbitragem e a
cláusula arbitral institucional a ser inserta no contrato de franquias, bem como os
117
custos estimados caso seja acionada, com a possibilidade de anexar a ela o
regulamento interno da instituição eleita, encerrando, assim, a possibilidade de
insegurança ou debate prévio sobre o cumprimento da cláusula arbitral quando
ocorra um conflito.
Em segunda premissa, e não menos importante, outro aspecto polêmico deve
ser dissolvido, conforme proposta deste trabalho, e que diz respeito à questão da
hipossuficiência financeira de uma das partes (franqueador ou franqueado), de modo
que impossibilite a utilização da arbitragem quando instado o conflito.
É que não se pode sublimar nesse segmento empresarial que a relação
pasmada jaz entre empresários, e, portanto, ainda que detentor da marca, do nome,
do know-how, o franqueador nem sempre será – e daí o perigo de se generalizar – a
parte mais forte dessa relação no que pertine à condição financeira do negócio.
Será, entretanto, aquele que detém a técnica e o conhecimento e quem permite que
terceiro a utilize mediante paga.
O risco do negócio, de sua via, ainda que previamente contido na circular de
oferta de franquia, decorrerá, obviamente, de ato administrativo do franqueado
relativamente à condução de seus negócios como empresa, bem como de eventual
instabilidade econômica apresentada no cenário do País.
A utilização, portanto, da arbitragem institucional, tema que nos interessa
dirimir, no cenário da franquia, constitui meio eficaz para a solução de eventuais
questões controvertidas entre as partes inclusive nesse sentido.
Interessa-nos enfocar, contudo, que, uma vez instalado o conflito entre as
partes, tanto por meio da arbitragem quanto mediante procedimentos judiciais, as
partes incorrem em custos de transação, os quais derivam da prestação jurisdicional
(pública e privada).
E, nesse panorama, a arbitragem permite minimização desses custos, em
razão da celeridade que proporciona no procedimento que lhe é confiado, bem como
agilidade, especialização dos árbitros e sua imparcialidade – princípios esses que
tornam recomendável a arbitragem empresarial, afinal, no mundo dos negócios não
existe, no mais das vezes, a possibilidade de que se desacelere ou mesmo se
estanque um negócio para que se solva um conflito, cuja indefinição do tempo que
irá levar para que seja solvido porá em risco todo o negócio.
Todavia, a custa de eventual desequilíbrio do contrato de franquia impõe
análise, justamente aquela em que, derivando em desequilíbrio financeiro, ponha em
118
risco a utilização da arbitragem institucional aqui aplicada, quando esse desequilíbrio
financeiro for a tal ponto que o franqueado ou o franqueador estejam
impossibilitados de arcar com o custo do procedimento arbitral, afinal, na jurisdição
estatal faz-se presente a possibilidade de aplicação do instituto da gratuidade
judiciária, que é inaplicável na justiça privada, ante seus próprios tons.
Portanto, os benefícios da Lei n. 1.060/50 não podem ser invocadas no
âmbito da arbitragem, em que pese a citada lei não ter definido seu alcance, mas
deixa claro que se trata de tema que outorga isenção de taxas, custas e
emolumentos judiciais na esfera estatal (grifei).
As instituições arbitrais, por sua vez, são empresas privadas e, como tal, não
há o que as obrigue efetuar descontos, planos de pagamentos diferenciados ou
mesmo isenções em suas custas e honorários arbitrais, os quais, normalmente, são
cobrados antecipadamente.
Todavia, é certo que a Constituição estabelece em seu art 5º, LXXIV, o dever
do estado em prestar assistência jurídica gratuita aos que comprovadamente não
tiverem recursos a tanto, o que se dará em nível institucional e não afeto à
instituição arbitral, senão em nível de defensoria pública e órgãos de prestação de
assistência judiciária gratuita, ficando ao encargo da parte usuária tal providência.
Um dos fatores que levam as partes a elegerem a instituição arbitral, além da
qualidade do trabalho, é, também, o custo188.
188
Parêntese para colacionar os dizeres de Adriana Braghetta sobre o tema: “... Em termos globais, três instituições se destacam no cenário internacional: a Corte de Arbitragem da CCI – Câmara de Comércio Internacional; o braço internacional da AAA – American Arbitration Association; a ICDR – International Center for Dispute Resolution; e a LCIA – London Court of International Arbitration. As três renomadas instituições têm experiência com arbitragens envolvendo empresas brasileiras e com sede no Brasil. Porém a experiência mostra que a comunidade arbitral brasileira tem preferido escolher a CCI. Outras câmaras começam a ser mais conhecidas perante os profissionais da área no Brasil: Câmara de Estocolmo; Câmara de Milão; SIAC – Singapure International Arbitration Center; HKIAC – Hong Kong International Arbitration Center; e a câmara sob os auspícios da CIETAC – China International Economic and Trade Arbitration Commission...No Brasil, há 5 instituições muito conhecidas e utilizadas: CAM-CCBC, Fiesp/Ciesp, Amcham, Camarb e FGV. Essas 5 instituições se destacam por concentrar o maior volume de casos e os mais complexos. A professora Selma Ferreira Lemes realiza uma pesquisa anual, desde 2005, dos casos levados a essas câmaras arbitrais. De 2005 a 2011, foram contabilizadas 532 arbitragens nas referidas instituições. A média de casos novos dos últimos 3 anos é de 126 casos. As câmaras CAM-CCBC e Fiesp/Ciesp se lançaram no mercado internacional. Ambos os regulamentos foram atualizados e adequados para arbitragens nacionais e internacionais, foram incorporados grandes nomes estrangeiros às listas sugestivas de árbitro e ambas já estão preparando os seus respectivos staffs para lidar com os casos envolvendo partes de outras jurisdições. A experiência mostra que as partes e os advogados escolhem a instituição arbitral, ainda na fase de negociação do contrato, com base na análise da qualidade do seu trabalho e dos custos (tanto da própria instituição, quanto dos árbitros). Nos grandes casos, a discussão do custo fica minimizada e realmente o grande diferencial é a excelência do serviço da instituição” (BRAGUETTA, Adriana. Qualidade norteia escolha de
119
E esse é o entendimento de Francisco José Cahali189, a fim de embasar a
assertiva relacionada ao custo:
O segundo benefício provável deste método é econômico-financeiro. Em um primeiro momento, os valores para se instaurar um procedimento arbitral poderiam desencorajar o uso do instituto, mas o resultado final, medido a partir do custo-benefício (por exemplo, a própria confidencialidade, tecnicidade do árbitro ou a insegurança das decisões judiciais), bem como, e especialmente, a celeridade na obtenção do resultado, podem levar a outra conclusão quando comparado a um processo na justiça estatal [...]
Dessarte, a especialização do árbitro, em sua essência, traduzida em ato de
jurisdição privada, representa benefício ao usuário, mas não conta com subsidio de
aporte legal, e, portanto, nessa via, não contaria com concessão de benefícios de
gratuidade em custas e honorários arbitrais, na forma com que é possibilitado na
justiça estatal.
Assim, a utilização da arbitragem institucional deve ser tida como a melhor
solução para contratos de franquia, mas, antes, precisa ser solvida a questão de
eventual impossibilidade de a parte interessada acionar a arbitragem, em razão de
seu custo.
A par dos custos praticados pelas instituições arbitrais, Olívia Alonso e Marina
Gazzoni190 referem que:
[...] Diferente da Justiça, que é mantida pelo Estado, as câmaras de arbitragem funcionam com recursos pagos pelas empresas que as procuram. Estes custos incluem taxas de administração e o honorário dos árbitros, entre outras despesas. Para um processo no valor de R$ 100 mil julgado por um único árbitro, por exemplo, o custo não seria menor que R$ 17 mil nas principais câmaras de São Paulo, segundo estimativas do escritório Rayes, Fagundes & Oliveira Ramos (RFOR). No Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CCBC), o mais antigo em operação no Brasil, desde 1979, o custo de um caso com três árbitros e duração de seis meses é de, no mínimo, R$ 147 mil, sendo R$ 2 mil uma mensalidade paga ao centro e R$ 45 mil para cada julgador, afirma o presidente da entidade, Frederico Straube. O pagamento é realizado por hora, mas há um mínimo de 100. Para compensar essas despesas, a disputa
instituição arbitral. Revista Consultor Jurídico, 12 abr. 2013. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-abr-12/adriana-braghetta-qualidade-norteia-escolha-instituicao-arbitral>. Acesso em: 13 dez. 2013). 189
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 87. 190
ALONSO, Olívia; GAZZONI, Marina. Velocidade é maior na arbitragem mas custo também. Disponível em: <http://economia.ig.com.br/velocidade-e-maior-na-arbitragem-mas-custo-tambem/n1237598998423.html>. Acesso em: 16 dez. 2013.
120
deve envolver pelo menos R$ 1 milhão, na opinião de advogados. Em média, os processos da CCBC têm valor de R$ 38 milhões [...]
Em primeiro pensamento, poder-se-ia cogitar da inversão do ônus financeiro
da arbitragem à parte que apresente condição para arcar com tal consectário e,
nesse particular, quando as partes acordassem nesse sentido, não restariam
dúvidas, mesmo que determinado regulamento arbitral (institucional) previsse outra
forma, modo e tempo para que se desse o pagamento de tais encargos. Mas, para
tanto, desde que as partes dispusessem explicitamente que, no caso em que
houvesse hipossuficiência financeira de uma delas que impedisse o acesso da
discussão do conflito em via arbitral em razão disso, independentemente do que
previsse a normatizadora da câmara arbitral eleita no que pertine à responsabilidade
do pagamento de tais encargos em relação a essa instituição, a parte adversa
efetuaria o pagamento ou reembolso (conforme dispusessem entre elas).
No entanto, cabe discussão quando não houver acordo preestabelecido entre
as partes para tal fim, e, portanto, ficaria a dúvida de se o árbitro teria poder para
determinar pagamento das custas pela parte contrária, no caso em que uma delas
arguisse insuficiência de recursos para custeio de tais encargos.
Na acepção de Francisco José Cahali191, os custos estimados da arbitragem
variam de acordo com tabela própria das instituições, visto que cada câmara arbitral
tem autonomia nesse sentido, mas que usualmente o custo estará atrelado ao valor
em causa. No regulamento interno de cada instituição arbitral haverá previsão,
inclusive, a par da responsabilidade do pagamento desse custo, forma e tempo de
seus vencimentos, e, ainda, da verba honorária do árbitro, embora sejam
consectários arbitrais que não se confundem.
Tais encargos, todavia, em se tratando de arbitragem institucional, têm seus
valores e peculiaridades próprios, dada a autonomia empresarial dessas instituições,
prevalecendo o que estatuído em seus regulamentos internos ou convencionado
com estas, para “quem se encomendou a arbitragem”192, podendo, inclusive, ser
detectada se permitida pela instituição ou assim convencionada, da mesma forma,
pelo próprio árbitro na sentença proferida.
Nesse pensar, em se tratando de arbitragem institucional, não se pode
estabelecer, dada a autonomia da instituição e do árbitro eleito por ela ou pelas
191
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 114. 192
Expressão utilizada pelo Professor Francisco Cahali (id., ibid., p. 237).
121
partes em lide (conforme seja a estipulação nesse particular) o momento exato e o
quantum que incidirá como custo de arbitragem – e, aqui, parêntese para remeter
que nos referimos a todo o custo do procedimento arbitral e honorários arbitrais –,
uma vez que difere a cada instituição eleita.
Em verdade, as partes, ao nomearem, por cláusula arbitral institucional, a
câmara arbitral eleita, possivelmente terão prévio conhecimento dos valores do
investimento nesse sentido, e, portanto, não se pode dizer que ficariam impedidas
de provisionar uma reserva para tanto.
Na mesma ótica, há de se pensar que a utilização do financiamento da
arbitragem por terceiros também resolveria o problema do custo da arbitragem, tema
esse que não será aprofundado nesta oportunidade, já que remete a uma questão
apaziguadora, sem maiores contextos a este trabalho. E aqui, quando se faz
referência a terceiros, não implica “patrocínio” para a causa, o que deve ficar
suficientemente claro, pena de que se ponha em risco até mesmo a imparcialidade
dos sistemas em voga. Trata-se, em verdade, de associação ou entidade de classe
comercial, que subsidia as custas em causa.
Contudo, interessa-nos apresentar a “chave de segurança” para a validade e
eficácia da arbitragem institucional em sede de contrato de franquia em caso de
hipossuficiência financeira de curso de contrato, em que as partes não tenham
estipulado a quem pertença tais encargos em casos tais.
E isso porque se observa que os regulamentos das instituições arbitrais, por
via de regra, fixam valores a serem recolhidos pela parte que ingressa com o pleito
arbitral, já de início, conforme é, inclusive, a sistemática adotada pela própria
jurisdição estatal.
Nesse pensar, observe-se de tudo quanto aqui exposto que, na esfera da
empresa privada, que é a instituição arbitral, e, em se considerando que as partes
elegeram cláusula arbitral em contrato de franquia e no decorrer da contratação,
ocorrido o evento controverso, incida circunstância que torne impossível, em razão
do custo, que a parte interessada ingresse com procedimento arbitral; melhor
solução tem de ser analisada para que não se agasalhe uma prejudicial ao exercício
de um direito por alguma motivadora financeira entoando um desequilíbrio entre
essas partes. Em outras palavras, a previsão de um benefício não pode vir de se
tornar um pesadelo.
122
Em primeiro lugar, de ter presente que o árbitro e a instituição não são partes
no processo e, nesse andar, exigir-lhes concedam isenção nos custos do
procedimento arbitral ou em procedimento que vise justamente discutir essa questão
(ausência de recursos), pesa inviável, visto que tal incidente demandaria a prestação
de um serviço jurisdicional privado e, como tal, que deverá ser remunerado.
Assim, trabalhando-se na possibilidade de que franqueador e franqueado
estejam financeiramente saudáveis na época da contratação e, assim, sem
embargos, tenham eleito a via arbitral como jurisdição do contrato, mas que, no
momento do surgimento do conflito, haja alteração da situação financeira de uma
das partes, de modo que se inviabilize a utilização da arbitragem em razão dos
custos, há de indagar, nesse caso, a questão a par da renúncia à jurisdição estatal
havida na eleição da cláusula compromissória institucional e a solução objetiva ao
impasse, já que, como se viu, impera a inaplicabilidade da Lei n. 1.060/50 no âmbito
da justiça privada.
Certo é que não se pode pretender que as partes, quaisquer que sejam,
vejam negado seu acesso à justiça, em função da norma constitucional, a qual
ampara o direito de acesso àqueles que não têm meios de suportar os custos e, em
se tratando de arbitragem, não abrange remunerações dela advindas, até porque o
Estado está constitucionalmente obrigado a fornecer, gratuitamente, o aparelho
judiciário, o que não inclui o custo da justiça privada.
Cabe questionar, portanto, no caso em que denunciada a convenção de
arbitragem, afinal, a quem recairia a competência de decidir tal impasse e qual seria
a solução mais adequada.
No direito português, a questão se resolve com a aplicação simplista do
disposto no art. 20, n. 1, da Constituição portuguesa193:
Artigo 20º Acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva 1. A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.
Segundo a Carta Magna portuguesa, o acesso à justiça não será negado ao
hipossuficiente financeiro, o que permite concluir que ficaria afastada a eficácia da
jurisdição privada em caso de impossibilidade de pagamento de seus custos.
193
Disponível em: <http://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/ConstituicaoRepublicaPortuguesa. aspx>. Acesso em: 18 dez. 2013.
123
Nesse sentido, o entendimento do STJ português194:
[...] Se o Autor caiu em situação de insuficiencia econômica após a celebração da convenção de arbitragem, ficando impossibilitado de suportar as despesas com ela, não tinha de reunir com a outra parte para chegar a acordo naqueles pontos necessários para o bom funcionamento do tribunal arbitral. A insuficiencia econômica a verificar-se nos termos referidos, constituindo uma alteração das circunstancias em que contratou a convenção arbitral, possibilita-lhe, só por si, recorrer ao tribunal comum [...]
De tudo quanto se viu até aqui, pretendeu-se demonstrar que a inclusão da
cláusula compromissória institucional em contrato de franquia é possível e vem
sendo utilizada cada vez mais pelas inúmeras vantagens.
No entanto, não se podem negar algumas dificuldades enfrentadas na prática
em situações que dificultam o início e desenvolvimento do procedimento arbitral.
Situações estas que, em realidade, podem estar relacionadas principalmente
com a questão do pagamento das custas, já que no caso de a demanda ser
proposta pelo franqueado, este deverá arcar com o pagamento inicial como pré-
requisito para instauração do procedimento devido à natureza particular da
arbitragem, na mesma medida a que estaria afeito o franqueador, em idêntica
situação.
Indaga-se, nesse caso, pois, como se resolveria a questão caso o franqueado
não pudesse arcar com o pagamento das custas arbitrais?
Esse é um tema que ainda não está solucionado no Brasil e requer
amadurecimento dos contratantes quando optam pela arbitragem institucional, visto
que devem estar atentos à indicação dos órgãos arbitrais para ficarem cientes,
inclusive, dos custos por eles praticados e, assim, poderem, como já se abordou,
tratar o assunto entre si, previamente à contratação da franquia, estipulando as
responsabilidades entre si nesse sentido, independentemente daquelas a que
afeitos em face da instituição eleita.
Na acepção de Melitha195 fica claro que a adoção da arbitragem na área de
franquias é método que requer maturidade:
Da mesma forma, a Arbitragem não é para todos os Franqueadores. É necessário haver uma filosofia interna de gestão de conflitos, que
194
Disponível em: <www..dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/321408c5637f978>. Acesso em: 17 dez. 2013. 195
PRADO, Melitha Novoa. Op. cit., p. 140.
124
contemple os métodos não adversários como ferramentas importantes para a sustentabilidade do sistema de franquia.
Atualmente, a Arbitragem no setor de franchising, apesar de tão
cabível e viável, tendo em vista a notoriedade de conhecimento do árbitro, ainda sofre muita resistência, tanto de corpos jurídicos como pelos seus custos que devem ser suportados num prazo máximo de 6 a 8 meses, enquanto na Justiça comum, isso é diluído entre 6 a 10 anos. Apesar de possuir custos inferiores, a Arbitragem, conforme a Câmara escolhida, possui regras para sua instituição, inclusive no que se refere aos honorários de árbitros, etc. Importante analisar sempre e detalhadamente as regras e particularidades do regulamento da Câmara Arbitral, para que tenhamos um foro de discussão viável para ambas as partes.
Assim visto, e ante essa análise, para os casos em que a parte
hipossuficiente financeiramente na relação de arbitragem prevista no contrato de
franquia possa, em sua plenitude, exercitar seu direito de jurisdição privada com
segurança, necessário solvermos as seguintes indagações:
a) qual meio poderia ser utilizado pela parte a fim de viabilizar a utilização da
arbitragem?
b) qual mecanismo deveria ser manejado com o fim de viabilizar o acesso à
jurisdição arbitral sem impedir o acesso à justiça?
Quanto à primeira rubrica, considere-se que, para o ingresso do procedimento
arbitral, a parte requerente deverá desembolsar, em princípio, as custas iniciais do
procedimento arbitral, tal qual ocorre no Judiciário. Em se tratando de arbitragem
institucional, com certeza, essa verba não poderá ser relegada ao final processo, a
menos que a instituição ou o árbitro assim o consintam.
Assim, feito o requerimento inicial ao árbitro e havendo autorização do
pagamento à parte sucumbente ao final do processo, a questão estaria resolvida e
não se vislumbra maiores questionamentos.
Em meios-termos, de questionar, igualmente, da possibilidade de o árbitro
determinar, em casos tais, que a parte contrária, e desde que não seja
hipossuficiente financeiramente, seja instada a tal pagamento.
Na prática, seria submeter ao árbitro a análise de uma questão controvertida
decorrente da utilização da própria cláusula compromissória, antes que as partes
tragam à discussão a matéria objeto do contrato e sobre a qual estão em conflito.
Obviamente que a discussão implica reconhecimento de uma controvérsia a
ser solvida antes de analisar o conflito que decorre de análise de aplicação e
distribuição excepcional às regras de arbitragem anteriormente previstas, sem que
125
haja o respectivo pagamento pelo serviço no tempo e forma convencionados em
regulamento interno institucional.
Nesse pensar, claro que podemos admitir, como exceção, que a instituição ou
o árbitro entendam de relegar ao final do procedimento o pagamento do custo
arbitral e, assim, também a questão não seria um óbice, afinal, a discussão referente
às custas ocorreria no âmbito arbitral, pois, uma vez decidida pelo árbitro, óbvio que
instaurado procedimento a tanto, seria finalizada por meio de uma sentença arbitral
que, descumprida, ensejaria o ingresso com ação de cumprimento perante o Poder
Judiciário.
Nesse esteio, e uma vez que os citados dispositivos legais, de fato, remetem
a solução do impasse à arbitragem em questões relacionadas ao procedimento
arbitral e seu custo, competiria ao Judiciário a análise da matéria relativa a eventual
hipossuficiência financeira da parte para utilizar a arbitragem como convencionado.
É que, assim se supondo ou, ainda, em casos em que nem a parte
interessada tenha condições financeiras para arcar com os custos arbitrais, nem a
instituição arbitral autorize o pagamento desse custo ao final procedimento, outra
não parece ser a solução, embora, talvez, não a mais célere, que a discussão a par
do custo da arbitragem seja dirimida perante o Poder Judiciário.
Nesse particular, a medida deverá ser proposta entre partes ou entre a parte
hipossuficiente e o Estado como antes se aventou e nunca contra os árbitros e a
instituição, afinal, inegável que estes não participaram da relação clausular arbitral
havida entre as partes que, pelo contrário, ainda que a ela tenham feito expressa
referência, no imprimir da cláusula arbitral cheia, automaticamente submeteram-se
às regras procedimentais e de custos – que em verdade não são o cerne da questão
controvertida e, sim, a impossibilidade financeira de uma das partes em dela valer-
se.
Residindo, portanto, a discordância das partes no que se relaciona ao custo
da via jurisdicional eleita, e porquanto o pano de fundo do conflito, nessa etapa,
converge a cláusula arbitral em si, o que não se pode afastar em sua essência, cabe
ao órgão judicial, a teor da amplitude de aplicação que aqui se deve dar ao art. 7º da
Lei de Arbitragem, remeter a questão às vistas do Judiciário, a fim de que a cláusula
compromissória institucional, ainda que cheia e redigida de forma perfeita a viabilizar
a instauração da arbitragem, fosse adequada de forma a permitir a fluidez do
procedimento arbitral.
126
Ora, aqui a resistência apontada deriva da ausência de recursos – que
embora não seja vertida diretamente à cláusula em si, dela constitui um apêndice,
uma resistência ainda que parcial, mas que não se pode de outra forma denominar,
afinal a indisponibilidade de recursos de uma parte não poderá trazer prejuízos ao
seu exercício pleno de direitos.
Apesar de ter ficado sedimentado pela doutrina que o manejo da ação
prevista no art. 7º da Lei de Arbitragem só seria necessário na hipótese de cláusula
vazia ou em branco, nesse caso seria utilizada tanto como um facilitador, quanto
pelo fato de que o acesso à justiça não pode ser denegado por carência de recursos
econômicos, o que seria notadamente inconstitucional e, por isso, o apoio do
Judiciário, nesse ponto, seria fundamental.
Isso não somente porque a arbitragem e o Judiciário devem caminhar lado a
lado em total apoio um ao outro, mas pela própria questão de fundo: o que se
discute não é em sua essência o regimento interno de custos de arbitragem e, sim, a
impossibilidade da plenitude contratual no quesito arbitragem convencionada por
insuficiência de recursos de uma de as partes implementar o custo desse movimento
procedimental.
Observa-se que o art. 7º da Lei de Arbitragem estabelece um procedimento
específico a tanto:
Lei nº 9.307 de 23 de Setembro de 1996 Art. 7º Existindo cláusula compromissória e havendo resistência quanto à instituição da arbitragem, poderá a parte interessada requerer a citação da outra parte para comparecer em juízo a fim de lavrar-se o compromisso, designando o juiz audiência especial para tal fim. § 1º O autor indicará, com precisão, o objeto da arbitragem, instruindo o pedido com o documento que contiver a cláusula compromissória. § 2º Comparecendo as partes à audiência, o juiz tentará, previamente, a conciliação acerca do litígio. Não obtendo sucesso, tentará o juiz conduzir as partes à celebração, de comum acordo, do compromisso arbitral. § 3º Não concordando as partes sobre os termos do compromisso, decidirá o juiz, após ouvir o réu, sobre seu conteúdo, na própria audiência ou no prazo de dez dias, respeitadas as disposições da cláusula compromissória e atendendo ao disposto nos arts. 10 e 21, § 2º, desta Lei. § 4º Se a cláusula compromissória nada dispuser sobre a nomeação de árbitros, caberá ao juiz, ouvidas as partes, estatuir a respeito, podendo nomear árbitro único para a solução do litígio.
127
§ 5º A ausência do autor, sem justo motivo, à audiência designada para a lavratura do compromisso arbitral, importará a extinção do processo sem julgamento de mérito. § 6º Não comparecendo o réu à audiência, caberá ao juiz, ouvido o autor, estatuir a respeito do conteúdo do compromisso, nomeando árbitro único. § 7º A sentença que julgar procedente o pedido valerá como compromisso arbitral.
No intuito da lei em cena, há de se admitir, mutatis mutandis, que a cláusula
arbitral institucional cheia, quando trouxer à tona, no momento em que dela se
necessite utilizar, situação comprovadamente de desequilíbrio entre as partes que, a
tal ponto, fique prejudicada sua aplicação, no momento da própria instauração do
pedido arbitral, outro não poderá ser o entendimento, senão relegá-la como cláusula
circunstancialmente inoperante (grifei).
Nessa via, uma vez admitida com tal enfoque, não teria por que o Judiciário
não conhecer da questão do rumo estatal, afinal a convenção arbitral nesse dado
momento estaria prejudicada. Em que pese, no entanto, a Lei de Arbitragem prever,
no citado artigo legal, a possibilidade da ação no intuito de submeter a parte
recalcitrante à arbitragem, não se poderia afastar da realidade econômica a
circunstância em pauta.
O entendimento nesse sentido amolda-se ao caso em que, por circunstância
que impossibilite acionamento da cláusula arbitral, esta não se poderia considerar
válida e eficaz em sua amplitude em razão do fator financeiro, e, portanto,
merecedora a tutela judicial para que a questão da arbitragem possível se instaure,
uma vez seja vontade manifesta entre as partes a dissolução do conflito por meio da
via arbitral.
Assim, seja suprindo por declaração, a inversão antecipada ao ônus do
pagamento das custas procedimentais à parte que demonstrar melhores condições
em arcar com tais consectários, reportando ao final da demanda a obrigação de
reembolso se for o caso, ou, na pior das hipóteses e tendo em vista a adesividade
do contrato de franquias, instar ao franqueador a tal ônus, a solução prévia do
conflito entendo, deverá ser dirimida na via estatal.
Dessarte, fica claro nesse particular que seria conveniente às partes
contratantes no sistema de franquias a criação de incentivos no bojo contratual,
mediante os quais incluam cláusulas capazes de maximizar os benefícios da
inserção da cláusula arbitral institucional e prover um fundo para que, na execução
128
do contrato, não seja prescindível submeter ao Judiciário questões de aporte, o que
possibilitaria que, de plano, e através de recursos em reserva prévia prevista pelas
partes, a cláusula arbitral institucional tenha imediata aplicação ao conflito em si.
Portanto, a criação de um fundo entre a franqueadora e os franqueados, para
custeio das despesas arbitrais, seria elemento de extrema valia, desde que, claro,
tais valores não fossem lançados dentre as obrigações de retenção pelas partes
contratantes, aleatoriamente, mas em consonância à realidade dos números
financeiros expressos nos respectivos contratos e os valores praticados pela
instituição de arbitragem eleita.
Não obsta, ainda, que a matéria em apreço seja conhecida pelo Judiciário,
através de medida cautelar autossatisfativa, afinal, inclusive como reporta Francisco
José Cahali196:
Como próprio da arbitragem institucional, tudo depende, ainda, do regulamento da instituição encomendada para administrar a arbitragem. Assim, além da costumeira previsão conformando a possibilidade de se requerer medidas cautelares antecedentes perante o Judiciário sem que tal providência signifique renúncia à arbitragem, pode, ainda, e por certo excepcionalmente, exigir regramento específico para um “procedimento cautelar pré-arbitral”, destinado a resolver questões urgentes, anteriores à instituição do juízo arbitral, como ocorre na Corte Internacional de arbitragem da CCI, inclusive com regulamento próprio para estas medidas sendo que, neste caso, indispensável, também, que as partes tenham convencionado a adoção deste expediente. Nesta situação, então, as tutelas urgentes já serão submetidas à instituição para processamento em modelo criado para esta finalidade.
Sugere-se, portanto, convencionem as partes, na eleição da arbitragem, que
excepcionalmente, para casos de conflitos lastreados em tutelas urgentes, ficaria
admitida a apreciação pelo juízo estatal, em detrimento do juízo privado,
comprometendo-se a parte que dele se utilizar a ingressar com o procedimento
arbitral a posteriori, se for o caso, noticiando, naqueles autos, a decisão prévia
obtida da via estatal.
E, nesse sentido, em acordão do STJ, a Ministra Nancy Andrighi manifesta:
[...] Nessa situação, superadas as circunstâncias temporárias que justificam a intervenção contigencial do Poder Judiciário e, considerando-se que a celebração do compromisso arbitral implica, como regra, a derrogação da jurisdição estatal, é razoável que os autos prontamente encaminhados ao juízo arbitral, para que esse
196
CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 252.
129
assuma o processamento da ação, e, se for o caso, reaprecie a tutela conferida, mantendo, alterando ou revogando a respectiva
decisão (RESP nº 1297.974/RJ, j. 12.06.2012)197
.
Em suma, com relação às cláusulas compromissórias em contratos de
franquia firmados no Brasil, fica assinalado que três questões na construção
clausular sejam observadas:
a) convém espelhar a eleição da justiça arbitral na circular de oferta de
franquia, em todos os seus detalhamentos possíveis, notadamente em relação ao
custo da arbitragem;
b) que a cláusula arbitral seja destacada em negrito, ou inserida em
documento anexo, e que os franqueados aponham suas assinaturas ou rubricas ao
lado, demonstrando concordância de opinião.
É que, ainda que se trate de sistemática legal a ser entoada em contratos de
adesão, conforme dispõe o § 2º do art. 4º da Lei n. 9.307/96, entendemos que o
cumprimento dessas disposições, haja vista que o posicionamento dos juízes não é
pleno nesse sentido, no que diz respeito aos contratos de franquia o cumprimento do
caráter previsto da medida visaria afastar eventual alegação de invalidade ou
ausência de eficácia da cláusula compromissória;
c) que as partes, na medida do possível, prevejam em contrato, antes
submetido à circular de oferta de franquia, questões a par do fundo de reserva com
finalidade específica para utilização de instauração de arbitragem, em caso de
hipossuficiência financeira de curso contratual, instituindo regras dessa utilização,
ou, ainda, que prevejam, independentemente do regulamento da instituição arbitral
eleita, a quem caberia tal responsabilidade de custeio no segmento do contrato
havido entre elas, ou mesmo que estabeleçam, na omissão desse aspecto, que
medidas urgentes poderão ser submetidas à justiça estatal, dentre elas as que
tenham por objeto questões sobre a insuficiência de recursos financeiros que
venham a ser experimentados no curso da contratação por uma das partes e que
dificultem o acesso ao juízo estatal.
Solvidas as questões polêmicas supra-apontadas, através das mencionadas
“chaves de segurança” a que ambos os institutos plenamente possam harmonizar-se
com a segurança pretendida pelas partes, ressentem-se, ainda, diante do que
claramente se observa no andar deste estudo, que tanto a Lei de Arbitragem quanto
197
CAHALI., Francisco José. Op. cit., 2013, p. 251.
130
a Lei de Franquia, em nível nacional, experimentam lacunas que têm sido supridas
pelos doutrinadores, em nível de utilização do direito comparado, bem como pelo
próprio Poder Judiciário, que, a cada dia, reconhece e reafirma a utilização conjunta
desses institutos.
Obviamente, o Poder Judiciário é imprescindível, visto que, através dele, a
arbitragem vem ganhando espaço e sendo desvencilhada a ideia de que a justiça
estatal e a privada andam por caminhos antagônicos; pelo contrário, andam juntas,
passo a passo, contribuindo uma com a outra, para a aplicação do direito e da
justiça, nas relações entre partes.
131
8. SUGESTÃO PARA ALTERAÇÃO LEGISLATIVA DA LEI DE FRANQUIA COMO
“CHAVE DE SEGURANÇA” PARA UTILIZAÇÃO DA ARBITRAGEM
INSTITUCIONAL
A arbitragem, de tudo quanto se viu, sob a ótica do mercado econômico-
contemporâneo, é, sem dúvida, fomentada em razão da concepção de que o
empresário resolva seus conflitos sem morosidade, dando fluência rápida aos seus
negócios.
E, porquanto prestação jurisdicional privada, como já vimos, implica custos,
afinal, pelas atividades exercidas na condução e decisão da controvérsia, os árbitros
e a instituição arbitral exercem seu ofício na mesma medida em que o faz o Poder
Judiciário.
No entanto, se na esfera da solução de conflitos estatal entre partes o
legislador tratou de resolver a questão do custo processual àquele que
demonstrasse hipossuficiência financeira, através dos institutos da assistência
judiciária gratuita e da gratuidade judiciária, permitindo, assim, o exercício do direito
fundamental de acesso à via judicial, na arbitragem essa solução não obtém alcance
e, portanto, merece ser resolvida na esfera empresarial.
É que na mesma velocidade com que os negócios e consequentemente as
empresas se desenvolvem e expandem, reflexivamente podem ser atingidos por
crises, dada a instantaneidade dessas relações, interações e conflitos.
Nesse pensar, é plausível que as empresas financeiramente saudáveis no
momento de firmarem um contrato optem pela arbitragem como sistema para dirimir
eventuais controvérsias.
Não obstante, no momento em que surgem os conflitos a serem objeto dessa
arbitragem, a situação econômico-financeira das empresas pode não ser a mesma,
a tal ponto de não conseguirem arcar com os custos de uma arbitragem.
No caso em tema, tal quadro não seria difícil detectar em relação empresarial
que se desenvolve no âmbito da franquia, cujo crescente mercado, em nível
nacional, divisa perfis peculiares no mundo empresarial.
Diante disso, e considerando-se o aqui exposto, pretende-se com este
modesto estudo sugerir alterações legislativas na Lei de Franquia com o intuito de
obtenção de resposta rápida e eficaz para solução dos conflitos desse segmento,
132
notadamente através da arbitragem institucional, cujos princípios em muito se
coadunam entre si.
Pois bem, em sede de arbitragem, em que pese não existirem regras legais
determinando quem é responsável pelo pagamento desse custo, cabe às partes
decidirem a par do assunto quando da redação da cláusula compromissória ou na
assinatura do compromisso arbitral.
Assim, podem decidir, por exemplo, que as despesas decorrentes da
arbitragem serão divididas entre si ou que a parte sucumbente pagará os honorários
dos árbitros e custas da instituição arbitral.
E, para assegurar o efetivo exercício da arbitragem, garantindo, assim, a
esperada celeridade e todos os demais princípios arbitrais que se coaduam às
práticas no segmento da franquia, torna-se importante que conste expressamente na
circular de oferta de franquia que dentre as despesas previstas estejam as custas e
despesas com eventuais arbitragens.
Mas essa menção deve ser expressa, não bastando a obrigação prevista no
art. 3º, VIII, e), por ser genérica e não deixar claro que em caso de conflitos o
franqueado poderá ter que arcar com os custos de eventual arbitragem.
Assim, sugere-se a inclusão da alínea f ao art. 3º, VIII, para que conste: “f)
despesas com arbitragens, incluindo custas e estimativa de honorários arbitrais, de
acordo com tabela de custas da instituição eleita em contrato”.
Com isso estaria resolvida a questão quanto ao amplo conhecimento do
franqueado por ocasião do recebimento da circular de oferta de franquia no que diz
respeito aos custos com eventual arbitragem que possa ser necessária ante o
surgimento de conflito no decorrer do contrato.
Contudo, para efeito de segurança maior às partes, a questão não estaria
totalmente resolvida, sendo necessário, ante o princípio da transparência que rege
as relações entre franqueados e franqueadores, dar ao franqueado o conhecimento
dos regulamentos da instituição arbitral eleita.
Para solução da questão, sugere-se, ainda, a inclusão de uma alínea ao
inciso XV do art. 3º da Lei de Franquia com a seguinte redação: “a) Ao contrato
padrão deverão ser anexados os regulamentos da instituição arbitral, quando eleita,
inclusive o que tratar de custas, despesas e honorários arbitrais”.
E, para que não haja mais dúvidas relativamente à matéria, por fim, sugere-se
uma última alteração na Lei de Franquia, de modo que seja incluído artigo que
133
estabeleça a possibilidade de a parte contrária, na demanda arbitral, arcar com o
pagamento das custas arbitrais caso uma das partes alegue impossibilidade de
pagamento das custas.
Nesse caso, a parte impossibilitada de arcar com o pagamento das custas
arbitrais iniciais deverá requerer à instituição arbitral eleita que comunique a parte
contrária sobre o interesse no pagamento das custas, a fim de viabilizar o início do
procedimento arbitral.
Caso não haja interesse no pagamento das custas, a instituição arbitral não
iniciaria ou caso já iniciado encerraria o procedimento arbitral, o que possibilitaria à
parte hipossuficiente ingressar com a demanda no Judiciário, sob pena, não fosse
este o entendimento, de se impedir o acesso à justiça.
Sistema semelhante ao sugerido é praticado em Portugal,198 que dita
procedimento específico para pagamento de custas, possibilitando a comunicação
da parte contrária na demanda a fim de que pague as custas e viabilize a abertura
do procedimento arbitral199.
198
Lei n. 63, de 14-11-2011 – Lei de Arbitragem Voluntária 199
“Art. 17º Honorários e despesas dos árbitros 1 - Se as partes não tiverem regulado tal matéria na convenção de arbitragem, os honorários dos árbitros, o modo de reembolso das suas despesas e a forma de pagamento pelas partes de preparos por conta desses honorários e despesas devem ser objecto de acordo escrito entre as partes e os árbitros, concluído antes da aceitação do último dos árbitros a ser designado. 2 - Caso a matéria não haja sido regulada na convenção de arbitragem, nem sobre ela haja sido concluído um acordo entre as partes e os árbitros, cabe aos árbitros, tendo em conta a complexidade das questões decididas, o valor da causa e o tempo despendido ou a despender com o processo arbitral até à conclusão deste, fixar o montante dos seus honorários e despesas, bem como determinar o pagamento pelas partes de preparos por conta daqueles, mediante uma ou várias decisões separadas das que se pronunciem sobre questões processuais ou sobre o fundo da causa. 3 - No caso previsto no número anterior do presente artigo, qualquer das partes pode requerer ao tribunal estadual competente a redução dos montantes dos honorários ou das despesas e respectivos preparos fixados pelos árbitros, podendo esse tribunal, depois de ouvir sobre a matéria os membros do tribunal arbitral, fixar os montantes que considere adequados. 4 - No caso de falta de pagamento de preparos para honorários e despesas que hajam sido previamente acordados ou fixados pelo tribunal arbitral ou estadual, os árbitros podem suspender ou dar por concluído o processo arbitral, após ter decorrido um prazo adicional razoável que concedam para o efeito à parte ou partes faltosas, sem prejuízo do disposto no número seguinte do presente artigo. 5 - Se, dentro do prazo fixado de acordo com o número anterior, alguma das partes não tiver pago o seu preparo, os árbitros, antes de decidirem suspender ou pôr termo ao processo arbitral, comunicam-no às demais partes para que estas possam, se o desejarem, suprir a falta de pagamento daquele preparo no prazo que lhes for fixado para o efeito.”
134
O regulamento do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio
Brasil-Canadá200, no capítulo III – das custas e despesas, art. 12, também prevê a
possibilidade de pagamento das custas pela parte contrária201.
Ainda nesse sentido é a previsão da tabela de despesas dessa instituição no
item VI202.
200
Disponível em: <http://www.ccbc.org.br/default.asp?categoria=2&subcategoria=Regulamento 2012#12>. Acesso em: 6 mar. 2014. 201
12.9. Todas as despesas que incidirem ou forem incorridas durante a arbitragem serão antecipadas pela parte que requereu a providência, ou pelas partes, igualmente, se decorrentes de providências requeridas pelo Tribunal Arbitral. 12.10. Na hipótese do não pagamento das Taxas de Administração, honorários de árbitro e peritos ou quaisquer despesas da arbitragem, será facultado a uma das partes efetuar o pagamento por conta da outra, em prazo a ser fixado pela Secretaria do CAM/CCBC. 12.10.1. Caso o pagamento seja efetuado pela outra parte, a Secretaria do CAM/CCBC dará ciência às partes e ao Tribunal Arbitral, hipótese em que este considerará retirados os pleitos da parte inadimplente, se existentes. 12.10.2. Caso nenhuma das partes se disponha a efetuar o pagamento, o procedimento será suspenso. 12.11. Decorrido o prazo de 30 (trinta) dias de suspensão por falta de pagamento, sem que qualquer das partes efetue a provisão de fundos, o processo poderá ser extinto, sem prejuízo do direito das partes de apresentarem requerimento para instituição de novo procedimento arbitral visando solução da controvérsia, desde que recolhidos os valores pendentes. 12.12. Independente do disposto nos artigos 12.10 e 12.11 do Regulamento, o CAM/CCBC pode exigir judicial ou extrajudicialmente o pagamento das Taxas de Administração, honorários dos árbitros ou despesas, que serão considerados valores líquidos e certos, e poderão vir a ser cobrados através de processo de execução, acrescidos de juros e correção monetária, conforme disposto na Tabela de Despesas. 12.12.1. Os trabalhos periciais não se iniciarão antes do depósito integral de seus honorários, ainda que o pagamento aos peritos seja efetivado de forma diversa. 12.13. O Comitê Especial previsto no artigo 5.4 do Regulamento, somente será constituído mediante o pagamento dos valores estipulados na Tabela de Despesas. Salvo disposição expressa e específica em contrário, os honorários deverão ser recolhidos pela parte que suscitou o incidente. 12.14. O Presidente do CAM/CCBC poderá determinar o ressarcimento de valores que a instituição tiver adiantado ou de despesas que tiver suportado, assim como o pagamento de todas as taxas ou encargos devidos e não recolhidos por qualquer das partes. 202
Disponível em: <http://www.ccbc.org.br/default.asp?categoria=2&subcategoria=tabela de custos>. Acesso em: 6 mar. 2014. “VI) Inadimplemento Como garantia no pagamento tempestivo das despesas descritas acima, o Novo Regulamento do CAM/CCBC possui as seguintes disposições: [...] 12.10. Na hipótese do não pagamento das Taxas de Administração, honorários de árbitro e peritos ou quaisquer despesas da arbitragem, será facultado a uma das partes efetuar o pagamento por conta da outra, em prazo a ser fixado pela Secretaria do CAM/CCBC. 12.10.1. Caso o pagamento seja efetuado pela outra parte, a Secretaria do CAM/CCBC dará ciência às partes e ao Tribunal Arbitral, hipótese em que este considerará retirados os pleitos da parte inadimplente, se existentes. 12.10.2. Caso nenhuma das partes se disponha a efetuar o pagamento, o procedimento será suspenso. 12.11. Decorrido o prazo de 30 (trinta) dias de suspensão por falta de pagamento, sem que qualquer das partes efetue a provisão de fundos, o processo poderá ser extinto, sem prejuízo do direito das partes de apresentarem requerimento para instituição de novo procedimento arbitral visando solução da controvérsia, desde que recolhidos os valores pendentes. 12.12. Independente do disposto nos artigos 12.10 e 12.11 do Regulamento, o CAM/CCBC pode exigir judicial ou extrajudicialmente o pagamento das Taxas de Administração, honorários dos árbitros
135
Nesse espectro, no aventar da questão em enfoque, a parte que pretender
instaurar o procedimento arbitral, mas que no curso da relação contratual, quando
então se instaurar o conflito, não possuir condições financeiras para buscar a
solução de um direito em conflito, não ficaria impedida de seu exercício e, pelo
contrário, o equilíbrio contratual nesse sentido ficaria de pronto restabelecido, sem a
necessidade previa de socorrer-se ao Judiciário para solver questão relativa à
utilização da cláusula arbitral institucional.
E isso, forte no fato de que não se pode olvidar o acesso à justiça, já que
constitui garantia constitucional da suprema relevância.
Nesse pensar, se a eleição da arbitragem, pelas partes, representara uma
vontade e nela ocorrera uma renúncia à jurisdição estatal, não se pode conceber
que alguma das partes seja impedida de ter um direito seu avaliado pelo sistema
procedimental eleito, dentro de um contexto contratual.
Além disso, não se concebe em medida de igualdade, nessa hipótese, que a
parte adversa no contrato resida em situação confortável, em face de que a parte
prejudicada não teria condições de dar início ao mecanismo previsto entre elas para
solucionar a controvérsia.
Diante disso, a sugestão legislativa aposta, certamente, evitaria que dentro de
um cenário contratual que envolvesse um sistema de franquias e sua intrínseca
complexidade, alguma das partes ficasse impedida de obter as benesses da solução
de determinada questão controvertida através da arbitragem institucional, como
previamente manifestaram e expressamente pactuaram.
O tema se justifica ao passo que a ausência de norma legal, aliada à
amplitude que caracteriza a arbitragem e seu procedimento, entendemos que deve
ser objeto de consideração pelo legislador e, enquanto não for, pelas partes que
integram o sistema de franquias, de forma preventiva ao conflito.
ou despesas, que serão considerados valores líquidos e certos, e poderão vir a ser cobrados através de processo de execução, acrescidos de juros e correção monetária, conforme disposto na Tabela de Despesas.”
136
CONCLUSÃO
Todo conhecimento adquirido no âmbito empresarial e comercial pode ser
considerado um bem imaterial e detentor de valores socioeconômicos, sendo objeto
de negócios jurídicos complexos, como acontece no contrato de franquia.
Dessarte, o segredo dos negócios e a transferência de know-how constituem
o fundamento da franquia e daí percebe-se desde já a necessidade de que conflitos
advindos desse tipo de relação comercial não sejam levados a conhecimento
público, afinal, consequentemente, o núcleo do negócio pautado entre as partes
inevitavelmente poderia vir à tona.
Nesse pensar, a utilização da justiça estatal, de per si, não seria a melhor
seara para que as partes que integram a relação comercial de franquia resolvessem
suas lides.
É que a franquia, tendo como fator mestre para sua manutenção e
competitividade os segredos dos negócios do franqueador, tem na arbitragem uma
grande aliada, visto que esta se norteia justamente pelo princípio da
confidencialidade e sigilo.
Nessa medida, as disputas surgidas nos negócios de franquia estão, cada vez
mais, sendo solucionadas por meio da arbitragem, cujas decisões garantem
segurança jurídica às partes, até porque proferidas possivelmente por um árbitro
especializado na matéria em pauta e com a celeridade indispensável a todo o
negócio.
E, de tudo quanto se viu neste trabalho, a arbitragem vem ganhando força e
se estabelecendo como forma eficaz de solução de controvérsia na área de
franquias, harmônicos que são os institutos em cena.
De registrar, todavia, que, mesmo ao se utilizar o instituto da arbitragem nos
contratos de franquia, não se pode estabelecer o afastamento integral do Poder
Judiciário quanto ao procedimento arbitral, tanto porque a decisão arbitral somente
ganhará força executiva na seara judicial, como pelo fato de que há questões que
ainda pedem a análise do referido órgão.
Contudo, há um caminhar lado a lado entre a justiça arbitral e o Judiciário,
possibilitando-se às partes litigantes o equilíbrio de suas relações controvertidas.
Nesse sentido, a cooperação do Poder Judiciário tem sido fundamental e
indispensável para o desenvolvimento das arbitragens domésticas institucionais,
137
pois é mister para que a arbitragem ganhe força no cenário nacional, ainda
culturalmente litigante, inaugurando-se uma política menos invasiva e mais
pacificadora para a solução de questões controvertidas.
Notadamente, a par da efetividade do exercício do direito por meio da
arbitragem, em detrimento da eventual impossibilidade que se instale no curso
contratual, questão que respeite a hipossuficiência financeira de uma das partes,
como solvido tem o Judiciário nesse particular, as “chaves de segurança” estão
explanadas neste trabalho, de modo a perfectibilizar a aplicação do instituto da
arbitragem aos contratos de franquia, em sua excelência.
Ainda, cuidou-se de dirimir problemática eventualmente instalada no
entendimento da adesividade do contrato de franquias, em virtude da divisão
doutrinária que se apresenta nesse particular nessa sede, vindo de ser objeto de
análise e solução neste trabalho.
Nesse pensar, podemos dizer que ao adotarmos a arbitragem institucional no
segmento da franquia, estaríamos buscando a efetividade e celeridade processual e
sempre no intuito da pacificação social.
Para tanto, como se abordou, algumas medidas prévias urgem atenção para
que a arbitragem possa ser efetivamente aplicada aos contratos de franquia e, daí,
de forma menos dependente de análise pelo Poder Judiciário, em questões
anteriores ao conflito em si e que se instalem pela utilização desse instituto,
permitindo-se, pelos meios apresentados, a solução dentro de seu próprio terreno de
competências, que é a própria arbitragem em sua excelência.
138
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146
ANEXO I – LEI DE ARBITRAGEM BRASILEIRA
LEI Nº 9.307, DE 23 DE SETEMBRO DE 1996.
Dispõe sobre a arbitragem.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Capítulo I
Disposições Gerais
Art. 1º As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.
Art. 2º A arbitragem poderá ser de direito ou de eqüidade, a critério das partes.
§ 1º Poderão as partes escolher, livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, desde que não haja violação aos bons costumes e à ordem pública.
§ 2º Poderão, também, as partes convencionar que a arbitragem se realize com base nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio.
Capítulo II
Da Convenção de Arbitragem e seus Efeitos
Art. 3º As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral.
Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato.
§ 1º A cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, podendo estar inserta no próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira.
§ 2º Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula.
Art. 5º Reportando-se as partes, na cláusula compromissória, às regras de algum órgão arbitral institucional ou entidade especializada, a arbitragem será
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instituída e processada de acordo com tais regras, podendo, igualmente, as partes estabelecer na própria cláusula, ou em outro documento, a forma convencionada para a instituição da arbitragem.
Art. 6º Não havendo acordo prévio sobre a forma de instituir a arbitragem, a parte interessada manifestará à outra parte sua intenção de dar início à arbitragem, por via postal ou por outro meio qualquer de comunicação, mediante comprovação de recebimento, convocando-a para, em dia, hora e local certos, firmar o compromisso arbitral.
Parágrafo único. Não comparecendo a parte convocada ou, comparecendo, recusar-se a firmar o compromisso arbitral, poderá a outra parte propor a demanda de que trata o art. 7º desta Lei, perante o órgão do Poder Judiciário a que, originariamente, tocaria o julgamento da causa.
Art. 7º Existindo cláusula compromissória e havendo resistência quanto à instituição da arbitragem, poderá a parte interessada requerer a citação da outra parte para comparecer em juízo a fim de lavrar-se o compromisso, designando o juiz audiência especial para tal fim.
§ 1º O autor indicará, com precisão, o objeto da arbitragem, instruindo o pedido com o documento que contiver a cláusula compromissória.
§ 2º Comparecendo as partes à audiência, o juiz tentará, previamente, a conciliação acerca do litígio. Não obtendo sucesso, tentará o juiz conduzir as partes à celebração, de comum acordo, do compromisso arbitral.
§ 3º Não concordando as partes sobre os termos do compromisso, decidirá o juiz, após ouvir o réu, sobre seu conteúdo, na própria audiência ou no prazo de dez dias, respeitadas as disposições da cláusula compromissória e atendendo ao disposto nos arts. 10 e 21, § 2º, desta Lei.
§ 4º Se a cláusula compromissória nada dispuser sobre a nomeação de árbitros, caberá ao juiz, ouvidas as partes, estatuir a respeito, podendo nomear árbitro único para a solução do litígio.
§ 5º A ausência do autor, sem justo motivo, à audiência designada para a lavratura do compromisso arbitral, importará a extinção do processo sem julgamento de mérito.
§ 6º Não comparecendo o réu à audiência, caberá ao juiz, ouvido o autor, estatuir a respeito do conteúdo do compromisso, nomeando árbitro único.
§ 7º A sentença que julgar procedente o pedido valerá como compromisso arbitral.
Art. 8º A cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato em que estiver inserta, de tal sorte que a nulidade deste não implica, necessariamente, a nulidade da cláusula compromissória.
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Parágrafo único. Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória.
Art. 9º O compromisso arbitral é a convenção através da qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial.
§ 1º O compromisso arbitral judicial celebrar-se-á por termo nos autos, perante o juízo ou tribunal, onde tem curso a demanda.
§ 2º O compromisso arbitral extrajudicial será celebrado por escrito particular, assinado por duas testemunhas, ou por instrumento público.
Art. 10. Constará, obrigatoriamente, do compromisso arbitral:
I - o nome, profissão, estado civil e domicílio das partes;
II - o nome, profissão e domicílio do árbitro, ou dos árbitros, ou, se for o caso, a identificação da entidade à qual as partes delegaram a indicação de árbitros;
III - a matéria que será objeto da arbitragem; e
IV - o lugar em que será proferida a sentença arbitral.
Art. 11. Poderá, ainda, o compromisso arbitral conter:
I - local, ou locais, onde se desenvolverá a arbitragem;
II - a autorização para que o árbitro ou os árbitros julguem por eqüidade, se assim for convencionado pelas partes;
III - o prazo para apresentação da sentença arbitral;
IV - a indicação da lei nacional ou das regras corporativas aplicáveis à arbitragem, quando assim convencionarem as partes;
V - a declaração da responsabilidade pelo pagamento dos honorários e das despesas com a arbitragem; e
VI - a fixação dos honorários do árbitro, ou dos árbitros.
Parágrafo único. Fixando as partes os honorários do árbitro, ou dos árbitros, no compromisso arbitral, este constituirá título executivo extrajudicial; não havendo tal estipulação, o árbitro requererá ao órgão do Poder Judiciário que seria competente para julgar, originariamente, a causa que os fixe por sentença.
Art. 12. Extingue-se o compromisso arbitral:
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I - escusando-se qualquer dos árbitros, antes de aceitar a nomeação, desde que as partes tenham declarado, expressamente, não aceitar substituto;
II - falecendo ou ficando impossibilitado de dar seu voto algum dos árbitros, desde que as partes declarem, expressamente, não aceitar substituto; e
III - tendo expirado o prazo a que se refere o art. 11, inciso III, desde que a parte interessada tenha notificado o árbitro, ou o presidente do tribunal arbitral, concedendo-lhe o prazo de dez dias para a prolação e apresentação da sentença arbitral.
Capítulo III
Dos Árbitros
Art. 13. Pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes.
§ 1º As partes nomearão um ou mais árbitros, sempre em número ímpar, podendo nomear, também, os respectivos suplentes.
§ 2º Quando as partes nomearem árbitros em número par, estes estão autorizados, desde logo, a nomear mais um árbitro. Não havendo acordo, requererão as partes ao órgão do Poder Judiciário a que tocaria, originariamente, o julgamento da causa a nomeação do árbitro, aplicável, no que couber, o procedimento previsto no art. 7º desta Lei.
§ 3º As partes poderão, de comum acordo, estabelecer o processo de escolha dos árbitros, ou adotar as regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada.
§ 4º Sendo nomeados vários árbitros, estes, por maioria, elegerão o presidente do tribunal arbitral. Não havendo consenso, será designado presidente o mais idoso.
§ 5º O árbitro ou o presidente do tribunal designará, se julgar conveniente, um secretário, que poderá ser um dos árbitros.
§ 6º No desempenho de sua função, o árbitro deverá proceder com imparcialidade, independência, competência, diligência e discrição.
§ 7º Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral determinar às partes o adiantamento de verbas para despesas e diligências que julgar necessárias.
Art. 14. Estão impedidos de funcionar como árbitros as pessoas que tenham, com as partes ou com o litígio que lhes for submetido, algumas das relações que caracterizam os casos de impedimento ou suspeição de juízes, aplicando-se-lhes, no que couber, os mesmos deveres e responsabilidades, conforme previsto no Código de Processo Civil.
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§ 1º As pessoas indicadas para funcionar como árbitro têm o dever de revelar, antes da aceitação da função, qualquer fato que denote dúvida justificada quanto à sua imparcialidade e independência.
§ 2º O árbitro somente poderá ser recusado por motivo ocorrido após sua nomeação. Poderá, entretanto, ser recusado por motivo anterior à sua nomeação, quando:
a) não for nomeado, diretamente, pela parte; ou
b) o motivo para a recusa do árbitro for conhecido posteriormente à sua nomeação.
Art. 15. A parte interessada em argüir a recusa do árbitro apresentará, nos termos do art. 20, a respectiva exceção, diretamente ao árbitro ou ao presidente do tribunal arbitral, deduzindo suas razões e apresentando as provas pertinentes.
Parágrafo único. Acolhida a exceção, será afastado o árbitro suspeito ou impedido, que será substituído, na forma do art. 16 desta Lei.
Art. 16. Se o árbitro escusar-se antes da aceitação da nomeação, ou, após a aceitação, vier a falecer, tornar-se impossibilitado para o exercício da função, ou for recusado, assumirá seu lugar o substituto indicado no compromisso, se houver.
§ 1º Não havendo substituto indicado para o árbitro, aplicar-se-ão as regras do órgão arbitral institucional ou entidade especializada, se as partes as tiverem invocado na convenção de arbitragem.
§ 2º Nada dispondo a convenção de arbitragem e não chegando as partes a um acordo sobre a nomeação do árbitro a ser substituído, procederá a parte interessada da forma prevista no art. 7º desta Lei, a menos que as partes tenham declarado, expressamente, na convenção de arbitragem, não aceitar substituto.
Art. 17. Os árbitros, quando no exercício de suas funções ou em razão delas, ficam equiparados aos funcionários públicos, para os efeitos da legislação penal.
Art. 18. O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário.
Capítulo IV
Do Procedimento Arbitral
Art. 19. Considera-se instituída a arbitragem quando aceita a nomeação pelo árbitro, se for único, ou por todos, se forem vários.
Parágrafo único. Instituída a arbitragem e entendendo o árbitro ou o tribunal arbitral que há necessidade de explicitar alguma questão disposta na convenção de arbitragem, será elaborado, juntamente com as partes, um adendo, firmado por todos, que passará a fazer parte integrante da convenção de arbitragem.
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Art. 20. A parte que pretender argüir questões relativas à competência, suspeição ou impedimento do árbitro ou dos árbitros, bem como nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, deverá fazê-lo na primeira oportunidade que tiver de se manifestar, após a instituição da arbitragem.
§ 1º Acolhida a argüição de suspeição ou impedimento, será o árbitro substituído nos termos do art. 16 desta Lei, reconhecida a incompetência do árbitro ou do tribunal arbitral, bem como a nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, serão as partes remetidas ao órgão do Poder Judiciário competente para julgar a causa.
§ 2º Não sendo acolhida a argüição, terá normal prosseguimento a arbitragem, sem prejuízo de vir a ser examinada a decisão pelo órgão do Poder Judiciário competente, quando da eventual propositura da demanda de que trata o art. 33 desta Lei.
Art. 21. A arbitragem obedecerá ao procedimento estabelecido pelas partes na convenção de arbitragem, que poderá reportar-se às regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada, facultando-se, ainda, às partes delegar ao próprio árbitro, ou ao tribunal arbitral, regular o procedimento.
§ 1º Não havendo estipulação acerca do procedimento, caberá ao árbitro ou ao tribunal arbitral discipliná-lo.
§ 2º Serão, sempre, respeitados no procedimento arbitral os princípios do contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento.
§ 3º As partes poderão postular por intermédio de advogado, respeitada, sempre, a faculdade de designar quem as represente ou assista no procedimento arbitral.
§ 4º Competirá ao árbitro ou ao tribunal arbitral, no início do procedimento, tentar a conciliação das partes, aplicando-se, no que couber, o art. 28 desta Lei.
Art. 22. Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral tomar o depoimento das partes, ouvir testemunhas e determinar a realização de perícias ou outras provas que julgar necessárias, mediante requerimento das partes ou de ofício.
§ 1º O depoimento das partes e das testemunhas será tomado em local, dia e hora previamente comunicados, por escrito, e reduzido a termo, assinado pelo depoente, ou a seu rogo, e pelos árbitros.
§ 2º Em caso de desatendimento, sem justa causa, da convocação para prestar depoimento pessoal, o árbitro ou o tribunal arbitral levará em consideração o comportamento da parte faltosa, ao proferir sua sentença; se a ausência for de testemunha, nas mesmas circunstâncias, poderá o árbitro ou o presidente do tribunal arbitral requerer à autoridade judiciária que conduza a testemunha renitente, comprovando a existência da convenção de arbitragem.
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§ 3º A revelia da parte não impedirá que seja proferida a sentença arbitral.
§ 4º Ressalvado o disposto no § 2º, havendo necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão solicitá-las ao órgão do Poder Judiciário que seria, originariamente, competente para julgar a causa.
§ 5º Se, durante o procedimento arbitral, um árbitro vier a ser substituído fica a critério do substituto repetir as provas já produzidas.
Capítulo V
Da Sentença Arbitral
Art. 23. A sentença arbitral será proferida no prazo estipulado pelas partes. Nada tendo sido convencionado, o prazo para a apresentação da sentença é de seis meses, contado da instituição da arbitragem ou da substituição do árbitro.
Parágrafo único. As partes e os árbitros, de comum acordo, poderão prorrogar o prazo estipulado.
Art. 24. A decisão do árbitro ou dos árbitros será expressa em documento escrito.
§ 1º Quando forem vários os árbitros, a decisão será tomada por maioria. Se não houver acordo majoritário, prevalecerá o voto do presidente do tribunal arbitral.
§ 2º O árbitro que divergir da maioria poderá, querendo, declarar seu voto em separado.
Art. 25. Sobrevindo no curso da arbitragem controvérsia acerca de direitos indisponíveis e verificando-se que de sua existência, ou não, dependerá o julgamento, o árbitro ou o tribunal arbitral remeterá as partes à autoridade competente do Poder Judiciário, suspendendo o procedimento arbitral.
Parágrafo único. Resolvida a questão prejudicial e juntada aos autos a sentença ou acórdão transitados em julgado, terá normal seguimento a arbitragem.
Art. 26. São requisitos obrigatórios da sentença arbitral:
I - o relatório, que conterá os nomes das partes e um resumo do litígio;
II - os fundamentos da decisão, onde serão analisadas as questões de fato e de direito, mencionando-se, expressamente, se os árbitros julgaram por eqüidade;
III - o dispositivo, em que os árbitros resolverão as questões que lhes forem submetidas e estabelecerão o prazo para o cumprimento da decisão, se for o caso; e
IV - a data e o lugar em que foi proferida.
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Parágrafo único. A sentença arbitral será assinada pelo árbitro ou por todos os árbitros. Caberá ao presidente do tribunal arbitral, na hipótese de um ou alguns dos árbitros não poder ou não querer assinar a sentença, certificar tal fato.
Art. 27. A sentença arbitral decidirá sobre a responsabilidade das partes acerca das custas e despesas com a arbitragem, bem como sobre verba decorrente de litigância de má-fé, se for o caso, respeitadas as disposições da convenção de arbitragem, se houver.
Art. 28. Se, no decurso da arbitragem, as partes chegarem a acordo quanto ao litígio, o árbitro ou o tribunal arbitral poderá, a pedido das partes, declarar tal fato mediante sentença arbitral, que conterá os requisitos do art. 26 desta Lei.
Art. 29. Proferida a sentença arbitral, dá-se por finda a arbitragem, devendo o árbitro, ou o presidente do tribunal arbitral, enviar cópia da decisão às partes, por via postal ou por outro meio qualquer de comunicação, mediante comprovação de recebimento, ou, ainda, entregando-a diretamente às partes, mediante recibo.
Art. 30. No prazo de cinco dias, a contar do recebimento da notificação ou da ciência pessoal da sentença arbitral, a parte interessada, mediante comunicação à outra parte, poderá solicitar ao árbitro ou ao tribunal arbitral que:
I - corrija qualquer erro material da sentença arbitral;
II - esclareça alguma obscuridade, dúvida ou contradição da sentença arbitral, ou se pronuncie sobre ponto omitido a respeito do qual devia manifestar-se a decisão.
Parágrafo único. O árbitro ou o tribunal arbitral decidirá, no prazo de dez dias, aditando a sentença arbitral e notificando as partes na forma do art. 29.
Art. 31. A sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo.
Art. 32. É nula a sentença arbitral se:
I - for nulo o compromisso;
II - emanou de quem não podia ser árbitro;
III - não contiver os requisitos do art. 26 desta Lei;
IV - for proferida fora dos limites da convenção de arbitragem;
V - não decidir todo o litígio submetido à arbitragem;
VI - comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva;
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VII - proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e
VIII - forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 21, § 2º, desta Lei.
Art. 33. A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a decretação da nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos nesta Lei.
§ 1º A demanda para a decretação de nulidade da sentença arbitral seguirá o procedimento comum, previsto no Código de Processo Civil, e deverá ser proposta no prazo de até noventa dias após o recebimento da notificação da sentença arbitral ou de seu aditamento.
§ 2º A sentença que julgar procedente o pedido:
I - decretará a nulidade da sentença arbitral, nos casos do art. 32, incisos I, II, VI, VII e VIII;
II - determinará que o árbitro ou o tribunal arbitral profira novo laudo, nas demais hipóteses.
§ 3º A decretação da nulidade da sentença arbitral também poderá ser argüida mediante ação de embargos do devedor, conforme o art. 741 e seguintes do Código de Processo Civil, se houver execução judicial.
Capítulo VI
Do Reconhecimento e Execução de Sentenças
Arbitrais Estrangeiras
Art. 34. A sentença arbitral estrangeira será reconhecida ou executada no Brasil de conformidade com os tratados internacionais com eficácia no ordenamento interno e, na sua ausência, estritamente de acordo com os termos desta Lei.
Parágrafo único. Considera-se sentença arbitral estrangeira a que tenha sido proferida fora do território nacional.
Art. 35. Para ser reconhecida ou executada no Brasil, a sentença arbitral estrangeira está sujeita, unicamente, à homologação do Supremo Tribunal Federal.
Art. 36. Aplica-se à homologação para reconhecimento ou execução de sentença arbitral estrangeira, no que couber, o disposto nos arts. 483 e 484 do Código de Processo Civil.
Art. 37. A homologação de sentença arbitral estrangeira será requerida pela parte interessada, devendo a petição inicial conter as indicações da lei processual, conforme o art. 282 do Código de Processo Civil, e ser instruída, necessariamente, com:
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I - o original da sentença arbitral ou uma cópia devidamente certificada, autenticada pelo consulado brasileiro e acompanhada de tradução oficial;
II - o original da convenção de arbitragem ou cópia devidamente certificada, acompanhada de tradução oficial.
Art. 38. Somente poderá ser negada a homologação para o reconhecimento ou execução de sentença arbitral estrangeira, quando o réu demonstrar que:
I - as partes na convenção de arbitragem eram incapazes;
II - a convenção de arbitragem não era válida segundo a lei à qual as partes a submeteram, ou, na falta de indicação, em virtude da lei do país onde a sentença arbitral foi proferida;
III - não foi notificado da designação do árbitro ou do procedimento de arbitragem, ou tenha sido violado o princípio do contraditório, impossibilitando a ampla defesa;
IV - a sentença arbitral foi proferida fora dos limites da convenção de arbitragem, e não foi possível separar a parte excedente daquela submetida à arbitragem;
V - a instituição da arbitragem não está de acordo com o compromisso arbitral ou cláusula compromissória;
VI - a sentença arbitral não se tenha, ainda, tornado obrigatória para as partes, tenha sido anulada, ou, ainda, tenha sido suspensa por órgão judicial do país onde a sentença arbitral for prolatada.
Art. 39. Também será denegada a homologação para o reconhecimento ou execução da sentença arbitral estrangeira, se o Supremo Tribunal Federal constatar que:
I - segundo a lei brasileira, o objeto do litígio não é suscetível de ser resolvido por arbitragem;
II - a decisão ofende a ordem pública nacional.
Parágrafo único. Não será considerada ofensa à ordem pública nacional a efetivação da citação da parte residente ou domiciliada no Brasil, nos moldes da convenção de arbitragem ou da lei processual do país onde se realizou a arbitragem, admitindo-se, inclusive, a citação postal com prova inequívoca de recebimento, desde que assegure à parte brasileira tempo hábil para o exercício do direito de defesa.
Art. 40. A denegação da homologação para reconhecimento ou execução de sentença arbitral estrangeira por vícios formais, não obsta que a parte interessada renove o pedido, uma vez sanados os vícios apresentados.
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Capítulo VII
Disposições Finais
Art. 41. Os arts. 267, inciso VII; 301, inciso IX; e 584, inciso III, do Código de Processo Civil passam a ter a seguinte redação:
"Art. 267.........................................................................
VII - pela convenção de arbitragem;"
"Art. 301.........................................................................
IX - convenção de arbitragem;"
"Art. 584...........................................................................
III - a sentença arbitral e a sentença homologatória de transação ou de conciliação;"
Art. 42. O art. 520 do Código de Processo Civil passa a ter mais um inciso, com a seguinte redação:
"Art. 520...........................................................................
VI - julgar procedente o pedido de instituição de arbitragem."
Art. 43. Esta Lei entrará em vigor sessenta dias após a data de sua publicação.
Art. 44. Ficam revogados os arts. 1.037 a 1.048 da Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916, Código Civil Brasileiro; os arts. 101 e 1.072 a 1.102 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil; e demais disposições em contrário.
Brasília, 23 de setembro de 1996; 175º da Independência e 108º da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO Nelson A. Jobim
Este texto não substitui o publicado no DOU de 24.9.1996
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ANEXO II – LEI DE FRANQUIA BRASILEIRA
LEI No. 8.955, DE 15 DE DEZEMBRO DE 1994.
Dispõe sobre o contrato de franquia empresarial (franchising) e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:
Art. 1º Os contratos de franquia empresarial são disciplinados por esta lei.
Art. 2º Franquia empresarial é o sistema pelo qual um franqueador cede ao franqueado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semi-exclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente, também ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício.
Art. 3º Sempre que o franqueador tiver interesse na implantação de sistema de franquia empresarial, deverá fornecer ao interessado em tornar-se franqueado uma circular de oferta de franquia, por escrito e em linguagem clara e acessível, contendo obrigatoriamente as seguintes informações:
I - histórico resumido, forma societária e nome completo ou razão social do franqueador e de todas as empresas a que esteja diretamente ligado, bem como os respectivos nomes de fantasia e endereços;
II - balanços e demonstrações financeiras da empresa franqueadora relativos aos dois últimos exercícios;
III - indicação precisa de todas as pendências judiciais em que estejam envolvidos o franqueador, as empresas controladoras e titulares de marcas, patentes e direitos autorais relativos à operação, e seus subfranqueadores, questionando especificamente o sistema da franquia ou que possam diretamente vir a impossibilitar o funcionamento da franquia;
IV - descrição detalhada da franquia, descrição geral do negócio e das atividades que serão desempenhadas pelo franqueado;
V - perfil do franqueado ideal no que se refere a experiência anterior, nível de escolaridade e outras características que deve ter, obrigatória ou preferencialmente;
VI - requisitos quanto ao envolvimento direto do franqueado na operação e na administração do negócio;
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VII - especificações quanto ao:
a) total estimado do investimento inicial necessário à aquisição, implantação e entrada em operação da franquia;
b) valor da taxa inicial de filiação ou taxa de franquia e de caução; e
c) valor estimado das instalações, equipamentos e do estoque inicial e suas condições de pagamento;
VIII - informações claras quanto a taxas periódicas e outros valores a serem pagos pelo franqueado ao franqueador ou a terceiros por este indicados, detalhando as respectivas bases de cálculo e o que as mesmas remuneram ou o fim a que se destinam, indicando, especificamente, o seguinte:
a) remuneração periódica pelo uso do sistema, da marca ou em troca dos serviços efetivamente prestados pelo franqueador ao franqueado (royalties);
b) aluguel de equipamentos ou ponto comercial;
c) taxa de publicidade ou semelhante;
d) seguro mínimo; e
e) outros valores devidos ao franqueador ou a terceiros que a ele sejam ligados;
IX - relação completa de todos os franqueados, subfranqueados e subfranqueadores da rede, bem como dos que se desligaram nos últimos doze meses, com nome, endereço e telefone;
X - em relação ao território, deve ser especificado o seguinte:
a) se é garantida ao franqueado exclusividade ou preferência sobre determinado território de atuação e, caso positivo, em que condições o faz; e
b) possibilidade de o franqueado realizar vendas ou prestar serviços fora de seu território ou realizar exportações;
XI - informações claras e detalhadas quanto à obrigação do franqueado de adquirir quaisquer bens, serviços ou insumos necessários à implantação, operação ou administração de sua franquia, apenas de fornecedores indicados e aprovados pelo franqueador, oferecendo ao franqueado relação completa desses fornecedores;
XII - indicação do que é efetivamente oferecido ao franqueado pelo franqueador, no que se refere a:
a) supervisão de rede;
b) serviços de orientação e outros prestados ao franqueado;
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c) treinamento do franqueado, especificando duração, conteúdo e custos;
d) treinamento dos funcionários do franqueado;
e) manuais de franquia;
f) auxílio na análise e escolha do ponto onde será instalada a franquia; e
g) layout e padrões arquitetônicos nas instalações do franqueado;
XIII - situação perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial - (INPI) das marcas ou patentes cujo uso estará sendo autorizado pelo franqueador;
XIV - situação do franqueado, após a expiração do contrato de franquia, em relação a:
a) know how ou segredo de indústria a que venha a ter acesso em função da franquia; e
b) implantação de atividade concorrente da atividade do franqueador;
XV - modelo do contrato-padrão e, se for o caso, também do pré-contrato-padrão de franquia adotado pelo franqueador, com texto completo, inclusive dos respectivos anexos e prazo de validade.
Art. 4º A circular oferta de franquia deverá ser entregue ao candidato a franqueado no mínimo 10 (dez) dias antes da assinatura do contrato ou pré-contrato de franquia ou ainda do pagamento de qualquer tipo de taxa pelo franqueado ao franqueador ou a empresa ou pessoa ligada a este.
Parágrafo único. Na hipótese do não cumprimento do disposto no caput deste artigo, o franqueado poderá argüir a anulabilidade do contrato e exigir devolução de todas as quantias que já houver pago ao franqueador ou a terceiros por ele indicados, a título de taxa de filiação e royalties, devidamente corrigidas, pela variação da remuneração básica dos depósitos de poupança mais perdas e danos.
Art. 5º (VETADO).
Art. 6º O contrato de franquia deve ser sempre escrito e assinado na presença de 2 (duas) testemunhas e terá validade independentemente de ser levado a registro perante cartório ou órgão público.
Art. 7º A sanção prevista no parágrafo único do art. 4º desta lei aplica-se, também, ao franqueador que veicular informações falsas na sua circular de oferta de franquia, sem prejuízo das sanções penais cabíveis.
Art. 8º O disposto nesta lei aplica-se aos sistemas de franquia instalados e operados no território nacional.
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Art. 9º Para os fins desta lei, o termo franqueador, quando utilizado em qualquer de seus dispositivos, serve também para designar o subfranqueador, da mesma forma que as disposições que se refiram ao franqueado aplicam-se ao subfranqueado.
Art. 10. Esta lei entra em vigor 60 (sessenta) dias após sua publicação.
Art. 11. Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 15 de dezembro de 1994; 173º da Independência e 106º da República.
ITAMAR FRANCO Ciro Ferreira Gomes
Este texto não substitui o publicado no DOU de 16.12.1994
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ANEXO III – LEI DA ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA PORTUGUESA
Lei n.º 63/2011 de 14 de Dezembro Aprova a Lei da Arbitragem Voluntária A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, o seguinte: Artigo 1.º Objecto 1 — É aprovada a Lei da Arbitragem Voluntária, que se publica em anexo à presente lei e que dela faz parte integrante. 2 — É alterado o Código de Processo Civil, em conformidade com a nova Lei da Arbitragem Voluntária. Artigo 2.º Alteração ao Código de Processo Civil Os artigos 812.º -D, 815.º, 1094.º e 1527.º do Código de Processo Civil passam a ter a seguinte redacção: «Artigo 812.º -D [...] . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . a) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . b) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . c) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . d) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . e) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . f) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . g) Se, pedida a execução de sentença arbitral, o agente de execução duvidar de que o litígio pudesse ser cometido à decisão por árbitros, quer por estar submetido, por lei especial, exclusivamente a tribunal judicial ou a arbitragem necessária, quer por o direito controvertido não ter carácter patrimonial e não poder ser objecto de transacção. Artigo 815.º [...] São fundamentos de oposição à execução baseada em sentença arbitral não apenas os previstos no artigo anterior mas também aqueles em que pode basear -se a anulação judicial da mesma decisão, sem prejuízo do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 48.º da Lei da Arbitragem Voluntária. Artigo 1094.º
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[...] 1 — Sem prejuízo do que se ache estabelecido em tratados, convenções, regulamentos da União Europeia e leis especiais, nenhuma decisão sobre direitos privados, proferida por tribunal estrangeiro, tem eficácia em Portugal, seja qual for a nacionalidade das partes, sem estar revista e confirmada. 2 — . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Artigo 1527.º [...] 1 — Se em relação a algum dos árbitros se verificarqualquer das circunstâncias previstas nos artigos 13.º a 15.º da Lei da Arbitragem Voluntária, procede -se à nomeação de outro, nos termos do artigo 16.º daquela lei, cabendo a nomeação a quem tiver nomeado o árbitro anterior, quando possível. 2 — . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . » Artigo 3.º Remissões Todas as remissões feitas em diplomas legais ou regulamentares para as disposições da Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto –Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, devem considerar -se como feitas para as disposições correspondentes na nova Lei da Arbitragem Voluntária. Artigo 4.º Disposição transitória 1 — Salvo o disposto nos números seguintes, ficam sujeitos ao novo regime da Lei da Arbitragem Voluntária os processos arbitrais que, nos termos do n.º 1 do artigo 33.º da referida lei, se iniciem após a sua entrada em vigor. 2 — O novo regime é aplicável aos processos arbitrais iniciados antes da sua entrada em vigor, desde que ambas as partes nisso acordem ou se uma delas formular proposta nesse sentido e a outra a tal não se opuser no prazo de 15 dias a contar da respectiva recepção. 3 — As partes que tenham celebrado convenções de arbitragem antes da entrada em vigor do novo regime mantêm o direito aos recursos que caberiam da sentença arbitral, nos termos do artigo 29.º da Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto -Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, caso o processo arbitral houvesse decorrido ao abrigo deste diploma. 4 — A submissão a arbitragem de litígios emergentes de ou relativos a contratos de trabalho é regulada por lei especial, sendo aplicável, até à entrada em vigor desta o novo regime aprovado pela presente lei, e, com as devidas adaptações, o n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto –Lei n.º 38/2003, de 8 de Março. Artigo 5.º Norma revogatória 1 — É revogada a Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto -Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, com excepção do disposto no n.º 1 do artigo 1.º, que se mantém em vigor para a arbitragem de litígios emergentes de ou relativos a contratos de trabalho. 2 — São revogados o n.º 2 do artigo 181.º e o artigo 186.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. 3 — É revogado o artigo 1097.º do Código de Processo Civil. Entrada em vigor A presente lei entra em vigor três meses após a data da sua publicação.
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Aprovada em 4 de Novembro de 2011. A Presidente da Assembleia da República, Maria da Assunção A. Esteves. Promulgada em 29 de Novembro de 2011. Publique -se. O Presidente da República, ANÍBAL CAVACO SILVA. Referendada em 30 de Novembro de 2011. O Primeiro -Ministro, Pedro Passos Coelho. ANEXO Lei da Arbitragem Voluntária CAPÍTULO I Da convenção de arbitragem Artigo 1.º Convenção de arbitragem 1 — Desde que por lei especial não esteja submetido exclusivamente aos tribunais do Estado ou a arbitragem necessária, qualquer litígio respeitante a interesses de natureza patrimonial pode ser cometido pelas partes, mediante convenção de arbitragem, à decisão de árbitros. 2 — É também válida uma convenção de arbitragem relativa a litígios que não envolvam interesses de natureza patrimonial, desde que as partes possam celebrar transacção sobre o direito controvertido. 3 — A convenção de arbitragem pode ter por objeto um litígio actual, ainda que afecto a um tribunal do Estado (compromisso arbitral), ou litígios eventuais emergentes de determinada relação jurídica contratual ou extracontratual (cláusula compromissória). 4 — As partes podem acordar em submeter a arbitragem, para além das questões de natureza contenciosa em sentido estrito, quaisquer outras que requeiram a intervenção de um decisor imparcial, designadamente as relacionadas com a necessidade de precisar, completar e adaptar contratos de prestações duradouras a novas circunstâncias. 5 — O Estado e outras pessoas colectivas de direito público podem celebrar convenções de arbitragem, na medida em que para tanto estejam autorizados por lei ou se tais convenções tiverem por objecto litígios de direito privado. Artigo 2.º Requisitos da convenção de arbitragem; sua revogação 1 — A convenção de arbitragem deve adoptar forma escrita. 2 — A exigência de forma escrita tem -se por satisfeita quando a convenção conste de documento escrito assinado pelas partes, troca de cartas, telegramas, telefaxes ou outros meios de telecomunicação de que fique prova escrita, incluindo meios electrónicos de comunicação. 3 — Considera -se que a exigência de forma escrita da convenção de arbitragem está satisfeita quando esta conste de suporte electrónico, magnético, óptico, ou de outro tipo, que ofereça as mesmas garantias de fidedignidade, inteligibilidade e conservação. 4 — Sem prejuízo do regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, vale como convenção de arbitragem a remissão feita num contrato para documento que contenha uma cláusula compromissória, desde que tal contrato revista a forma
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escrita e a remissão seja feita de modo a fazer dessa cláusula parte integrante do mesmo. 5 — Considera -se também cumprido o requisito da forma escrita da convenção de arbitragem quando exista troca de uma petição e uma contestação em processo arbitral, em que a existência de tal convenção seja alegada por uma parte e não seja negada pela outra. 6 — O compromisso arbitral deve determinar o objeto do litígio; a cláusula compromissória deve especificar a relação jurídica a que os litígios respeitem. Artigo 3.º Nulidade da convenção de arbitragem É nula a convenção de arbitragem celebrada em violação do disposto nos artigos 1.º e 2.º Artigo 4.º Modificação, revogação e caducidade da convenção 1 — A convenção de arbitragem pode ser modificada pelas partes até à aceitação do primeiro árbitro ou, com o acordo de todos os árbitros, até à prolação da sentença arbitral. 2 — A convenção de arbitragem pode ser revogada pelas partes, até à prolação da sentença arbitral. 3 — O acordo das partes previsto nos números anteriores deve revestir a forma escrita, observando -se o disposto no artigo 2.º 4 — Salvo convenção em contrário, a morte ou extinção das partes não faz caducar a convenção de arbitragem nem extingue a instância arbitral. Artigo 5.º Efeito negativo da convenção de arbitragem 1 — O tribunal estadual no qual seja proposta acção relativa a uma questão abrangida por uma convenção de arbitragem deve, a requerimento do réu deduzido até ao momento em que este apresentar o seu primeiro articulado sobre o fundo da causa, absolvê -lo da instância, a menos que verifique que, manifestamente, a convenção de arbitragem é nula, é ou se tornou ineficaz ou é inexequível. 2 — No caso previsto no número anterior, o processo arbitral pode ser iniciado ou prosseguir, e pode ser neleproferida uma sentença, enquanto a questão estiver pendente no tribunal estadual. 3 — O processo arbitral cessa e a sentença nele proferida deixa de produzir efeitos, logo que um tribunal estadual considere, mediante decisão transitada em julgado, que o tribunal arbitral é incompetente para julgar o litígio que lhe foi submetido, quer tal decisão seja proferida na acção referida no n.º 1 do presente artigo, quer seja proferida ao abrigo do disposto no n.º 9 do artigo 18.º, e nas subalíneas i) e iii) da alínea a) do n.º 3 do artigo 46.º 4 — As questões da nulidade, ineficácia e inexequibilidade de uma convenção de arbitragem não podem ser discutidas autonomamente em acção de simples apreciação proposta em tribunal estadual nem em procedimento cautelar instaurado perante o mesmo tribunal, que tenha como finalidade impedir a constituição ou o funcionamento de um tribunal arbitral. Artigo 6.º Remissão para regulamentos de arbitragem
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Todas as referências feitas na presente lei ao estipulado na convenção de arbitragem ou ao acordo entre as partes abrangem não apenas o que as partes aí regulem directamente, mas também o disposto em regulamentos de arbitragem para os quais as partes hajam remetido. Artigo 7.º Convenção de arbitragem e providências cautelares decretadas por tribunal estadual Não é incompatível com uma convenção de arbitragem o requerimento de providências cautelares apresentado a um tribunal estadual, antes ou durante o processo arbitral, nem o decretamento de tais providências por aquele tribunal. CAPÍTULO II Dos árbitros e do tribunal arbitral Artigo 8.º Número de árbitros 1 — O tribunal arbitral pode ser constituído por um único árbitro ou por vários, em número ímpar. 2 — Se as partes não tiverem acordado no número de membros do tribunal arbitral, é este composto por três árbitros. Artigo 9.º Requisitos dos árbitros 1 — Os árbitros devem ser pessoas singulares e plenamente capazes. 2 — Ninguém pode ser preterido, na sua designação como árbitro, em razão da nacionalidade, sem prejuízo do disposto no n.º 6 do artigo 10.º e da liberdade de escolha das partes. 3 — Os árbitros devem ser independentes e imparciais. 4 — Os árbitros não podem ser responsabilizados por danos decorrentes das decisões por eles proferidas, salvo nos casos em que os magistrados judiciais o possam ser. 5 — A responsabilidade dos árbitros prevista no número anterior só tem lugar perante as partes. Artigo 10.º Designação dos árbitros 1 — As partes podem, na convenção de arbitragem ou em escrito posterior por elas assinado, designar o árbitro ou os árbitros que constituem o tribunal arbitral ou fixar o modo pelo qual estes são escolhidos, nomeadamente, cometendo a designação de todos ou de alguns dos árbitros a um terceiro. 2 — Caso o tribunal arbitral deva ser constituído por um único árbitro e não haja acordo entre as partes quanto a essa designação, tal árbitro é escolhido, a pedido de qualquer das partes, pelo tribunal estadual. 3 — No caso de o tribunal arbitral ser composto por três ou mais árbitros, cada parte deve designar igual número de árbitros e os árbitros assim designados devem escolher outro árbitro, que actua como presidente do tribunal arbitral. 4 — Salvo estipulação em contrário, se, no prazo de 30 dias a contar da recepção do pedido que a outra parte lhe faça nesse sentido, uma parte não designar o árbitro
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ou árbitros que lhe cabe escolher ou se os árbitros designados pelas partes não acordarem na escolha do árbitro presidente no prazo de 30 dias a contar da designação do último deles, a designação do árbitro ou árbitros em falta é feita, a pedido de qualquer das partes, pelo tribunal estadual competente. 5 — Salvo estipulação em contrário, aplica -se o disposto no número anterior se as partes tiverem cometido a designação de todos ou de alguns dos árbitros a um terceiro e este não a tiver efectuado no prazo de 30 dias a contar da solicitação que lhe tenha sido dirigida nesse sentido. 6 — Quando nomear um árbitro, o tribunal estadual competente tem em conta as qualificações exigidas pelo acordo das partes para o árbitro ou os árbitros a designar e tudo o que for relevante para garantir a nomeação de um árbitro independente e imparcial; tratando -se de arbitragem internacional, ao nomear um árbitro único ou um terceiro árbitro, o tribunal tem também em consideração a possível conveniência da nomeação de um árbitro de nacionalidade diferente da das partes. 7 — Não cabe recurso das decisões proferidas pelo tribunal estadual competente ao abrigo dos números anteriores do presente artigo. Artigo 11.º Pluralidade de demandantes ou de demandados 1 — Em caso de pluralidade de demandantes ou de demandados, e devendo o tribunal arbitral ser composto por três árbitros, os primeiros designam conjuntamente um árbitro e os segundos designam conjuntamente outro. 2 — Se os demandantes ou os demandados não chegarem a acordo sobre o árbitro que lhes cabe designar, cabe ao tribunal estadual competente, a pedido de qualquer das partes, fazer a designação do árbitro em falta. 3 — No caso previsto no número anterior, pode o tribunal estadual, se se demonstrar que as partes que não conseguiram nomear conjuntamente um árbitro têm interesses conflituantes relativamente ao fundo da causa, nomear a totalidade dos árbitros e designar de entre eles quem é o presidente, ficando nesse caso sem efeito a designação do árbitro que uma das partes tiver entretanto efectuado. 4 — O disposto no presente artigo entende -se sem prejuízo do que haja sido estipulado na convenção de arbitragem para o caso de arbitragem com pluralidade de partes. Artigo 12.º Aceitação do encargo 1 — Ninguém pode ser obrigado a actuar como árbitro; mas se o encargo tiver sido aceite, só é legítima a escusa fundada em causa superveniente que impossibilite o designado de exercer tal função ou na não conclusão do acordo a que se refere o n.º 1 do artigo 17.º 2 — A menos que as partes tenham acordado de outro modo, cada árbitro designado deve, no prazo de 15 dias a contar da comunicação da sua designação, declarar por escrito a aceitação do encargo a quem o designou; se em tal prazo não declarar a sua aceitação nem por outra forma revelar a intenção de agir como árbitro, entende -se que não aceita a designação. 3 — O árbitro que, tendo aceitado o encargo, se escusar injustificadamente ao exercício da sua função responde pelos danos a que der causa. Artigo 13.º Fundamentos de recusa
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1 — Quem for convidado para exercer funções de árbitro deve revelar todas as circunstâncias que possam suscitar fundadas dúvidas sobre a sua imparcialidade e independência. 2 — O árbitro deve, durante todo o processo arbitral, revelar, sem demora, às partes e aos demais árbitros as circunstâncias referidas no número anterior que sejam supervenientes ou de que só tenha tomado conhecimento depois de aceitar o encargo. 3 — Um árbitro só pode ser recusado se existirem circunstâncias que possam suscitar fundadas dúvidas sobre a sua imparcialidade ou independência ou se não possuir as qualificações que as partes convencionaram. Uma parte só pode recusar um árbitro que haja designado ou em cuja designação haja participado com fundamento numa causa de que só tenha tido conhecimento após essa designação. Artigo 14.º Processo de recusa 1 — Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do presente artigo, as partes podem livremente acordar sobre o processo de recusa de árbitro. 2 — Na falta de acordo, a parte que pretenda recusar um árbitro deve expor por escrito os motivos da recusa ao tribunal arbitral, no prazo de 15 dias a contar da data em que teve conhecimento da constituição daquele ou da data em que teve conhecimento das circunstâncias referidas no artigo 13.º Se o árbitro recusado não renunciar à função que lhe foi confiada e a parte que o designou insistir em mantê -lo, o tribunal arbitral, com participação do árbitro visado, decide sobre a recusa. 3 — Se a destituição do árbitro recusado não puder ser obtida segundo o processo convencionado pelas partes ou nos termos do disposto no n.º 2 do presente artigo, a parte que recusa o árbitro pode, no prazo de 15 dias após lhe ter sido comunicada a decisão que rejeita a recusa, pedir ao tribunal estadual competente que tome uma decisão sobre a recusa, sendo aquela insusceptível de recurso. Na pendência desse pedido, o tribunal arbitral, incluindo o árbitro recusado, pode prosseguir o processo arbitral e proferir sentença. Artigo 15.º Incapacitação ou inacção de um árbitro 1 — Cessam as funções do árbitro que fique incapacitado, de direito ou de facto, para exercê -las, se o mesmo a elas renunciar ou as partes de comum acordo lhes puserem termo com esse fundamento. 2 — Se um árbitro, por qualquer outra razão, não se desincumbir, em tempo razoável, das funções que lhe foram cometidas, as partes podem, de comum acordo, fazê-las cessar, sem prejuízo da eventual responsabilidade do árbitro em causa. 3 — No caso de as partes não chegarem a acordo quanto ao afastamento do árbitro afectado por uma das situações referidas nos números anteriores do presente artigo, qualquer das partes pode requerer ao tribunal estadual competente que, com fundamento na situação em causa, o destitua, sendo esta decisão insusceptível de recurso. 4 — Se, nos termos dos números anteriores do presente artigo ou do n.º 2 do artigo 14.º, um árbitro renunciar à sua função ou as partes aceitarem que cesse a função de um árbitro que alegadamente se encontre numa das situações aí previstas, tal não implica o reconhecimento da procedência dos motivos de destituição mencionados nas disposições acima referidas.
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Artigo 16.º Nomeação de um árbitro substituto 1 — Em todos os casos em que, por qualquer razão, cessem as funções de um árbitro, é nomeado um árbitro substituto, de acordo com as regras aplicadas à designação do árbitro substituído, sem prejuízo de as partes poderem acordar em que a substituição do árbitro se faça de outro modo ou prescindirem da sua substituição. 2 — O tribunal arbitral decide, tendo em conta o estado do processo, se algum acto processual deve ser repetido face à nova composição do tribunal. Artigo 17.º Honorários e despesas dos árbitros 1 — Se as partes não tiverem regulado tal matéria na convenção de arbitragem, os honorários dos árbitros, o modo de reembolso das suas despesas e a forma de pagamento pelas partes de preparos por conta desses honorários e despesas devem ser objecto de acordo escrito entre as partes e os árbitros, concluído antes da aceitação do último dos árbitros a ser designado. 2 — Caso a matéria não haja sido regulada na convenção de arbitragem, nem sobre ela haja sido concluído um acordo entre as partes e os árbitros, cabe aos árbitros, tendo em conta a complexidade das questões decididas, o valor da causa e o tempo despendido ou a despender com o processo arbitral até à conclusão deste, fixar o montante dos seus honorários e despesas, bem como determinar o pagamento pelas partes de preparos por conta daqueles, mediante uma ou várias decisões separadas das que se pronunciem sobre questões processuais ou sobre o fundo da causa. 3 — No caso previsto no número anterior do presente artigo, qualquer das partes pode requerer ao tribunal estadual competente a redução dos montantes dos honorários ou das despesas e respectivos preparos fixados pelos árbitros, podendo esse tribunal, depois de ouvir sobre a matéria os membros do tribunal arbitral, fixar os montantes que considere adequados. 4 — No caso de falta de pagamento de preparos para honorários e despesas que hajam sido previamente acordados ou fixados pelo tribunal arbitral ou estadual, os árbitros podem suspender ou dar por concluído o processo arbitral, após ter decorrido um prazo adicional razoável que concedam para o efeito à parte ou partes faltosas, sem prejuízo do disposto no número seguinte do presente artigo. 5 — Se, dentro do prazo fixado de acordo com o número anterior, alguma das partes não tiver pago o seu preparo, os árbitros, antes de decidirem suspender ou pôr termo ao processo arbitral, comunicam -no às demais partes para que estas possam, se o desejarem, suprir a falta de pagamento daquele preparo no prazo que lhes for fixado para o efeito. CAPÍTULO III Da competência do tribunal arbitral Artigo 18.º Competência do tribunal arbitral para se pronunciar sobre a sua competência 1 — O tribunal arbitral pode decidir sobre a sua própria competência, mesmo que para esse fim seja necessário apreciar a existência, a validade ou a eficácia da
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convenção de arbitragem ou do contrato em que ela se insira, ou a aplicabilidade da referida convenção. 2 — Para os efeitos do disposto no número anterior, uma cláusula compromissória que faça parte de um contrato é considerada como um acordo independente das demais cláusulas do mesmo. 3 — A decisão do tribunal arbitral que considere nulo o contrato não implica, só por si, a nulidade da cláusula compromissória. 4 — A incompetência do tribunal arbitral para conhecer da totalidade ou de parte do litígio que lhe foi submetido só pode ser arguida até à apresentação da defesa quanto ao fundo da causa, ou juntamente com esta. 5 — O facto de uma parte ter designado um árbitro ou ter participado na sua designação não a priva do direito de arguir a incompetência do tribunal arbitral para conhecer do litígio que lhe haja sido submetido. 6 — A arguição de que, no decurso do processo arbitral, o tribunal arbitral excedeu ou pode exceder a sua competência deve ser deduzida imediatamente após se suscitar a questão que alegadamente exceda essa competência. 7 — O tribunal arbitral pode, nos casos previstos nos n.os 4 e 6 do presente artigo, admitir as excepções que, com os fundamentos neles referidos, sejam arguidas após os limites temporais aí estabelecidos, se considerar justificado o não cumprimento destes. 8 — O tribunal arbitral pode decidir sobre a sua competência quer mediante uma decisão interlocutória quer na sentença sobre o fundo da causa. 9 — A decisão interlocutória pela qual o tribunal arbitral declare que tem competência pode, no prazo de 30 dias após a sua notificação às partes, ser impugnada por qualquer destas perante o tribunal estadual competente, ao abrigo das subalíneas i) e iii) da alínea a) do n.º 3 do artigo 46.º, e da alínea f) do n.º 1 do artigo 59.º 10 — Enquanto a impugnação referida no número anterior do presente artigo estiver pendente no tribunal estadual competente, o tribunal arbitral pode prosseguir o processo arbitral e proferir sentença sobre o fundo da causa, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 5.º Artigo 19.º Extensão da intervenção dos tribunais estaduais Nas matérias reguladas pela presente lei, os tribunais estaduais só podem intervir nos casos em que esta o prevê. CAPÍTULO IV Das providências cautelares e ordens preliminares SECÇÃO I Providências cautelares Artigo 20.º Providências cautelares decretadas pelo tribunal arbitral 1 — Salvo estipulação em contrário, o tribunal arbitral pode, a pedido de uma parte e ouvida a parte contrária, decretar as providências cautelares que considere necessárias em relação ao objecto do litígio. 2 — Para os efeitos da presente lei, uma providência cautelar é uma medida de carácter temporário, decretada por sentença ou decisão com outra forma, pela qual,
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em qualquer altura antes de proferir a sentença que venha a dirimir o litígio, o tribunal arbitral ordena a uma parte que: a) Mantenha ou restaure a situação anteriormente existente enquanto o litígio não for dirimido; b) Pratique actos que previnam ou se abstenha de praticar actos que provavelmente causem dano ou prejuízo relativamente ao processo arbitral; c) Assegure a preservação de bens sobre os quais uma sentença subsequente possa ser executada; d) Preserve meios de prova que possam ser relevantes e importantes para a resolução do litígio. Artigo 21.º Requisitos para o decretamento de providências cautelares 1 — Uma providência cautelar requerida ao abrigo das alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 20.º é decretada pelo tribunal arbitral, desde que: a) Haja probabilidade séria da existência do direito invocado pelo requerente e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão; e b) O prejuízo resultante para o requerido do decretamento da providência não exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar. 2 — O juízo do tribunal arbitral relativo à probabilidade referida na alínea a) do n.º 1 do presente artigo não afecta a liberdade de decisão do tribunal arbitral quando, posteriormente, tiver de se pronunciar sobre qualquer matéria. 3 — Relativamente ao pedido de uma providência cautelar feito ao abrigo da alínea d) do n.º 2 do artigo 20.º, os requisitos estabelecidos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do presente artigo aplicam -se apenas na medida que o tribunal arbitral considerar adequada. SECÇÃO II Ordens preliminares Artigo 22.º Requerimento de ordens preliminares; requisitos 1 — Salvo havendo acordo em sentido diferente, qualquer das partes pode pedir que seja decretada uma providência cautelar e, simultaneamente, requerer que seja dirigida à outra parte uma ordem preliminar, sem prévia audiência dela, para que não seja frustrada a finalidade da providência cautelar solicitada. 2 — O tribunal arbitral pode emitir a ordem preliminar requerida, desde que considere que a prévia revelação do pedido de providência cautelar à parte contra a qual ela se dirige cria o risco de a finalidade daquela providência ser frustrada. 3 — Os requisitos estabelecidos no artigo 21.º são aplicáveis a qualquer ordem preliminar, considerando -se que o dano a equacionar ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 21.º é, neste caso, o que pode resultar de a ordem preliminar ser ou não emitida. Artigo 23.º Regime específico das ordens preliminares 1 — Imediatamente depois de o tribunal arbitral se ter pronunciado sobre um requerimento de ordem preliminar, deve informar todas as partes sobre o pedido de providência cautelar, o requerimento de ordem preliminar, a ordem preliminar, se
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esta tiver sido emitida, e todas as outras comunicações, incluindo comunicações orais, havidas entre qualquer parte e o tribunal arbitral a tal respeito. 2 — Simultaneamente, o tribunal arbitral deve dar oportunidade à parte contra a qual a ordem preliminar haja sido decretada para apresentar a sua posição sobre aquela, no mais curto prazo que for praticável e que o tribunal fixa. 3 — O tribunal arbitral deve decidir prontamente sobre qualquer objecção deduzida contra a ordem preliminar. 4 — A ordem preliminar caduca 20 dias após a data em que tenha sido emitida pelo tribunal arbitral. O tribunal pode, contudo, após a parte contra a qual se dirija a ordem preliminar ter sido dela notificada e ter tido oportunidade para sobre ela apresentar a sua posição, decretar uma providência cautelar, adoptando ou modificando o conteúdo da ordem preliminar. 5 — A ordem preliminar é obrigatória para as partes, mas não é passível de execução coerciva por um tribunal estadual. SECÇÃO III Regras comuns às providências cautelares e às ordens preliminares Artigo 24.º Modificação, suspensão e revogação; prestação de caução 1 — O tribunal arbitral pode modificar, suspender ou revogar uma providência cautelar ou uma ordem preliminar que haja sido decretada ou emitida, a pedido de qualquer das partes ou, em circunstâncias excepcionais e após ouvi-las, por iniciativa do próprio tribunal. 2 — O tribunal arbitral pode exigir à parte que solicita o decretamento de uma providência cautelar a prestação de caução adequada. 3 — O tribunal arbitral deve exigir à parte que requeira a emissão de uma ordem preliminar a prestação de caução adequada, a menos que considere inadequado ou desnecessário fazê -lo. Artigo 25.º Dever de revelação 1 — As partes devem revelar prontamente qualquer alteração significativa das circunstâncias com fundamento nas quais a providência cautelar foi solicitada ou decretada. 2 — A parte que requeira uma ordem preliminar deve revelar ao tribunal arbitral todas as circunstâncias que possam ser relevantes para a decisão sobre a sua emissão ou manutenção e tal dever continua em vigor até que a parte contra a qual haja sido dirigida tenha tido oportunidade de apresentar a sua posição, após o que se aplica o disposto no n.º 1 do presente artigo. Artigo 26.º Responsabilidade do requerente A parte que solicite o decretamento de uma providência cautelar ou requeira a emissão de uma ordem preliminar é responsável por quaisquer custos ou prejuízos causados à outra parte por tal providência ou ordem, caso o tribunal arbitral venha mais tarde a decidir que, nas circunstâncias anteriormente existentes, a providência ou a ordem preliminar não deveria ter sido decretada ou ordenada. O tribunal arbitral pode, neste último caso, condenar a parte requerente no pagamento da correspondente indemnização em qualquer estado do processo.
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SECÇÃO IV Reconhecimento ou execução coerciva de providências cautelares Artigo 27.º Reconhecimento ou execução coerciva 1 — Uma providência cautelar decretada por um tribunal arbitral é obrigatória para as partes e, a menos que o tribunal arbitral tenha decidido de outro modo, pode ser coercivamente executada mediante pedido dirigido ao tribunal estadual competente, independentemente de a arbitragem em que aquela foi decretada ter lugar no estrangeiro, sem prejuízo do disposto no artigo 28.º 2 — A parte que peça ou já tenha obtido o reconhecimento ou a execução coerciva de uma providência cautelar deve informar prontamente o tribunal estadual da eventual revogação, suspensão ou modificação dessa providência pelo tribunal arbitral que a haja decretado. 3 — O tribunal estadual ao qual for pedido o reconhecimento ou a execução coerciva da providência pode, se o considerar conveniente, ordenar à parte requerente que preste caução adequada, se o tribunal arbitral não tiver já tomado uma decisão sobre essa matéria ou se tal decisão for necessária para proteger os interesses de terceiros. 4 — A sentença do tribunal arbitral que decidir sobre uma ordem preliminar ou providência cautelar e a sentença do tribunal estadual que decidir sobre o reconhecimento ou execução coerciva de uma providência cautelar de um tribunal arbitral não são susceptíveis de recurso. Artigo 28.º Fundamentos de recusa do reconhecimento ou da execução coerciva 1 — O reconhecimento ou a execução coerciva de uma providência cautelar só podem ser recusados por um tribunal estadual: a) A pedido da parte contra a qual a providência seja invocada, se este tribunal considerar que: i) Tal recusa é justificada com fundamento nos motivos previstos nas subalíneas i), ii), iii) ou iv) da alínea a) do n.º 1 do artigo 56.º; ou ii) A decisão do tribunal arbitral respeitante à prestação de caução relacionada com a providência cautelar decretada não foi cumprida; ou iii) A providência cautelar foi revogada ou suspensa pelo tribunal arbitral ou, se para isso for competente, por um tribunal estadual do país estrangeiro em que arbitragem tem lugar ou ao abrigo de cuja lei a providência tiver sido decretada; ou b) Se o tribunal estadual considerar que: i) A providência cautelar é incompatível com os poderes conferidos ao tribunal estadual pela lei que o rege, salvo se este decidir reformular a providência cautelar na medida necessária para a adaptar à sua própria competência e regime processual, em ordem a fazer executar coercivamente a providência cautelar, sem alterar a sua essência; ou ii) Alguns dos fundamentos de recusa de reconhecimento previstos nas subalíneas i) ou ii) da alínea b) do n.º 1 do artigo 56.º se verificam relativamente ao reconhecimento ou à execução coerciva da providência cautelar. 2 — Qualquer decisão tomada pelo tribunal estadual ao abrigo do n.º 1 do presente artigo tem eficácia restrita ao pedido de reconhecimento ou de execução coerciva de
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providência cautelar decretada pelo tribunal arbitral. O tribunal estadual ao qual seja pedido o reconhecimento ou a execução de providência cautelar, ao pronunciar –se sobre esse pedido, não deve fazer uma revisão do mérito da providência cautelar. Artigo 29.º Providências cautelares decretadas por um tribunal estadual 1 — Os tribunais estaduais têm poder para decretar providências cautelares na dependência de processos arbitrais, independentemente do lugar em que estes decorram, nos mesmos termos em que o podem fazer relativamente aos processos que corram perante os tribunais estaduais. 2 — Os tribunais estaduais devem exercer esse poder de acordo com o regime processual que lhes é aplicável, tendo em consideração, se for o caso, as características específicas da arbitragem internacional. CAPÍTULO V Da condução do processo arbitral Artigo 30.º Princípios e regras do processo arbitral 1 — O processo arbitral deve sempre respeitar os seguintes princípios fundamentais: a) O demandado é citado para se defender; b) As partes são tratadas com igualdade e deve ser –lhes dada uma oportunidade razoável de fazerem valer os seus direitos, por escrito ou oralmente, antes de ser proferida a sentença final; c) Em todas as fases do processo é garantida a observância do princípio do contraditório, salvas as excepções previstas na presente lei. 2 — As partes podem, até à aceitação do primeiro árbitro, acordar sobre as regras do processo a observar na arbitragem, com respeito pelos princípios fundamentais consignados no número anterior do presente artigo e pelas demais normas imperativas constantes desta lei. 3 — Não existindo tal acordo das partes e na falta de disposições aplicáveis na presente lei, o tribunal arbitral pode conduzir a arbitragem do modo que considerar apropriado, definindo as regras processuais que entender adequadas, devendo, se for esse o caso, explicitar que considera subsidiariamente aplicável o disposto na lei que rege o processo perante o tribunal estadual competente. 4 — Os poderes conferidos ao tribunal arbitral compreendem o de determinar a admissibilidade, pertinência e valor de qualquer prova produzida ou a produzir. 5 — Os árbitros, as partes e, se for o caso, as entidades que promovam, com carácter institucionalizado, a realização de arbitragens voluntárias, têm o dever de guardar sigilo sobre todas as informações que obtenham e documentos de que tomem conhecimento através do processo arbitral, sem prejuízo do direito de as partes tornarem públicos os actos processuais necessários à defesa dos seus direitos e do dever de comunicação ou revelação de actos do processo às autoridades competentes, que seja imposto por lei. 6 — O disposto no número anterior não impede a publicação de sentenças e outras decisões do tribunal arbitral, expurgadas de elementos de identificação das partes, salvo se qualquer destas a isso se opuser.
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Artigo 31.º Lugar da arbitragem 1 — As partes podem livremente fixar o lugar da arbitragem. Na falta de acordo das partes, este lugar é fixado pelo tribunal arbitral, tendo em conta as circunstâncias do caso, incluindo a conveniência das partes. 2 — Não obstante o disposto no n.º 1 do presente artigo, o tribunal arbitral pode, salvo convenção das partes em contrário, reunir em qualquer local que julgue apropriado para se realizar uma ou mais audiências, permitir a realização de qualquer diligência probatória ou tomar quaisquer deliberações. Artigo 32.º Língua do processo 1 — As partes podem, por acordo, escolher livremente a língua ou línguas a utilizar no processo arbitral. Na falta desse acordo, o tribunal arbitral determina a língua ou línguas a utilizar no processo. 2 — O tribunal arbitral pode ordenar que qualquer documento seja acompanhado de uma tradução na língua ou línguas convencionadas pelas partes ou escolhidas pelo tribunal arbitral. Artigo 33.º Início do processo; petição e contestação 1 — Salvo convenção das partes em contrário, o processo arbitral relativo a determinado litígio tem início na data em que o pedido de submissão desse litígio a arbitragem é recebido pelo demandado. 2 — Nos prazos convencionados pelas partes ou fixados pelo tribunal arbitral, o demandante apresenta a sua petição, em que enuncia o seu pedido e os factos em que este se baseia, e o demandado apresenta a sua contestação, em que explana a sua defesa relativamente àqueles, salvo se tiver sido outra a convenção das partes quanto aos elementos a figurar naquelas peças escritas. As partes podem fazer acompanhar as referidas peças escritas de quaisquer documentos que julguem pertinentes e mencionar nelas documentos ou outros meios de prova que venham a apresentar. 3 — Salvo convenção das partes em contrário, qualquer delas pode, no decurso do processo arbitral, modificar ou completar a sua petição ou a sua contestação, a menos que o tribunal arbitral entenda não dever admitir tal alteração em razão do atraso com que é formulada, sem que para este haja justificação bastante. 4 — O demandado pode deduzir reconvenção, desde que o seu objecto seja abrangido pela convenção de arbitragem. Artigo 34.º Audiências e processo escrito 1 — Salvo convenção das partes em contrário, o tribunal decide se serão realizadas audiências para a produção de prova ou se o processo é apenas conduzido com base em documentos e outros elementos de prova. O tribunal deve, porém, realizar uma ou mais audiências para a produção de prova sempre que uma das partes o requeira, a menos que as partes hajam previamente prescindido delas. 2 — As partes devem ser notificadas, com antecedência suficiente, de quaisquer audiências e de outras reuniões convocadas pelo tribunal arbitral para fins de produção de prova.
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3 — Todas as peças escritas, documentos ou informações que uma das partes forneça ao tribunal arbitral devem ser comunicadas à outra parte. Deve igualmente ser comunicado às partes qualquer relatório pericial ou elemento de prova documental que possa servir de base à decisão do tribunal. Artigo 35.º Omissões e faltas de qualquer das partes 1 — Se o demandante não apresentar a sua petição em conformidade com o n.º 2 do artigo 33.º, o tribunal arbitral põe termo ao processo arbitral. 2 — Se o demandado não apresentar a sua contestação, em conformidade com o n.º 2 do artigo 33.º, o tribunal arbitral prossegue o processo arbitral, sem considerar esta omissão, em si mesma, como uma aceitação das alegações do demandante. 3 — Se uma das partes deixar de comparecer a uma audiência ou de produzir prova documental no prazo fixado, o tribunal arbitral pode prosseguir o processo e proferir sentença com base na prova apresentada. 4 — O tribunal arbitral pode, porém, caso considere a omissão justificada, permitir a uma parte a prática do acto omitido. 5 — O disposto nos números anteriores deste artigo entende -se sem prejuízo do que as partes possam ter acordado sobre as consequências das suas omissões. Artigo 36.º Intervenção de terceiros 1 — Só podem ser admitidos a intervir num processo arbitral em curso terceiros vinculados pela convenção de arbitragem em que aquele se baseia, quer o estejam desde a respectiva conclusão, quer tenham aderido a ela subsequentemente. Esta adesão carece do consentimento de todas as partes na convenção de arbitragem e pode ser feita só para os efeitos da arbitragem em causa. 2 — Encontrando -se o tribunal arbitral constituído, só pode ser admitida ou provocada a intervenção de terceiro que declare aceitar a composição actual do tribunal; em caso de intervenção espontânea, presume -se essa aceitação. 3 — A admissão da intervenção depende sempre de decisão do tribunal arbitral, após ouvir as partes iniciais na arbitragem e o terceiro em causa. O tribunal arbitral só deve admitir a intervenção se esta não perturbar indevidamente o normal andamento do processo arbitral e se houver razões de relevo que a justifiquem, considerando -se como tais, em particular, aquelas situações em que, não havendo manifesta inviabilidade do pedido: a) O terceiro tenha em relação ao objecto da causa um interesse igual ao do demandante ou do demandado, que inicialmente permitisse o litisconsórcio voluntário ou impusesse o litisconsórcio necessário entre uma das partes na arbitragem e o terceiro; ou b) O terceiro queira formular, contra o demandado, um pedido com o mesmo objecto que o do demandante, mas incompatível com o deste; ou c) O demandado, contra quem seja invocado crédito que possa, prima facie, ser caracterizado como solidário, pretenda que os demais possíveis credores solidários fiquem vinculados pela decisão final proferida na arbitragem; ou d) O demandado pretenda que sejam chamados terceiros, contra os quais o demandado possa ter direito de regresso em consequência da procedência, total ou parcial, de pedido do demandante.
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4 — O que ficou estabelecido nos números anteriores para demandante e demandado vale, com as necessárias adaptações, respectivamente para demandado e demandante, se estiver em causa reconvenção. 5 — Admitida a intervenção, aplica -se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 33.º 6 — Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a intervenção de terceiros anteriormente à constituição do tribunal arbitral só pode ter lugar em arbitragem institucionalizada e desde que o regulamento de arbitragem aplicável assegure a observância do princípio da igualdade de participação de todas as partes, incluindo os membros de partes plurais, na escolha dos árbitros. 7 — A convenção de arbitragem pode regular a intervenção de terceiros em arbitragens em curso de modo diferente do estabelecido nos números anteriores, quer directamente, com observância do princípio da igualdade de participação de todas as partes na escolha dos árbitros, quer mediante remissão para um regulamento de arbitragem institucionalizada que admita essa intervenção. Artigo 37.º Perito nomeado pelo tribunal arbitral 1 — Salvo convenção das partes em contrário, o tribunal arbitral, por sua iniciativa ou a pedido das partes, pode nomear um ou mais peritos para elaborarem um relatório, escrito ou oral, sobre pontos específicos a determinar pelo tribunal arbitral. 2 — No caso previsto no número anterior, o tribunal arbitral pode pedir a qualquer das partes que forneça ao perito qualquer informação relevante ou que apresente ou faculte acesso a quaisquer documentos ou outros objectos relevantes para serem inspeccionados. 3 — Salvo convenção das partes em contrário, se uma destas o solicitar ou se o tribunal arbitral o julgar necessário, o perito, após a apresentação do seu relatório, participa numa audiência em que o tribunal arbitral e as partes têm a oportunidade de o interrogar. 4 — O preceituado no artigo 13.º e nos n.os 2 e 3 do artigo 14.º, aplica -se, com as necessárias adaptações, aos peritos designados pelo tribunal arbitral. Artigo 38.º Solicitação aos tribunais estaduais na obtenção de provas 1 — Quando a prova a produzir dependa da vontade de uma das partes ou de terceiros e estes recusem a sua colaboração, uma parte, com a prévia autorização do tribunal arbitral, pode solicitar ao tribunal estadual competente que a prova seja produzida perante ele, sendo os seus resultados remetidos ao tribunal arbitral. 2 — O disposto no número anterior é aplicável às solicitações de produção de prova que sejam dirigidas a um tribunal estadual português, no âmbito de arbitragens localizadas no estrangeiro. CAPÍTULO VI Da sentença arbitral e encerramento do processo Artigo 39.º Direito aplicável, recurso à equidade; irrecorribilidade da decisão 1 — Os árbitros julgam segundo o direito constituído, a menos que as partes determinem, por acordo, que julguem segundo a equidade.
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2 — Se o acordo das partes quanto ao julgamento segundo a equidade for posterior à aceitação do primeiro árbitro, a sua eficácia depende de aceitação por parte do tribunal arbitral. 3 — No caso de as partes lhe terem confiado essa missão, o tribunal pode decidir o litígio por apelo à composição das partes na base do equilíbrio dos interesses em jogo. 4 — A sentença que se pronuncie sobre o fundo da causa ou que, sem conhecer deste, ponha termo ao processo arbitral, só é susceptível de recurso para o tribunal estadual competente no caso de as partes terem expressamente previsto tal possibilidade na convenção de arbitragem e desde que a causa não haja sido decidida segundo a equidade ou mediante composição amigável. Artigo 40.º Decisão tomada por vários árbitros 1 — Num processo arbitral com mais de um árbitro, qualquer decisão do tribunal arbitral é tomada pela maioria dos seus membros. Se não puder formar -se maioria, a sentença é proferida pelo presidente do tribunal. 2 — Se um árbitro se recusar a tomar parte na votação da decisão, os outros árbitros podem proferir sentença sem ele, a menos que as partes tenham convencionado de modo diferente. As partes são subsequentemente informadas da recusa de participação desse árbitro na votação. 3 — As questões respeitantes à ordenação, à tramitação ou ao impulso processual poderão ser decididas apenas pelo árbitro presidente, se as partes ou os outros membros do tribunal arbitral lhe tiverem dado autorização para o efeito. Artigo 41.º Transacção 1 — Se, no decurso do processo arbitral, as partes terminarem o litígio mediante transacção, o tribunal arbitral deve pôr fim ao processo e, se as partes lho solicitarem, dá a tal transacção a forma de sentença proferida nos termos acordados pelas partes, a menos que o conteúdo de tal transacção infrinja algum princípio de ordem pública. 2 — Uma sentença proferida nos termos acordados pelas partes deve ser elaborada em conformidade com o disposto no artigo 42.º e mencionar o facto de ter a natureza de sentença, tendo os mesmos efeitos que qualquer outra sentença proferida sobre o fundo da causa. Artigo 42.º Forma, conteúdo e eficácia da sentença 1 — A sentença deve ser reduzida a escrito e assinada pelo árbitro ou árbitros. Em processo arbitral com mais de um árbitro, são suficientes as assinaturas da maioria dos membros do tribunal arbitral ou só a do presidente, caso por este deva ser proferida a sentença, desde que seja mencionada na sentença a razão da omissão das restantes assinaturas. 2 — Salvo convenção das partes em contrário, os árbitros podem decidir o fundo da causa através de uma única sentença ou de tantas sentenças parciais quantas entendam necessárias. 3 — A sentença deve ser fundamentada, salvo se as partes tiverem dispensado tal exigência ou se trate de sentença proferida com base em acordo das partes, nos termos do artigo 41.º
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4 — A sentença deve mencionar a data em que foi proferida, bem como o lugar da arbitragem, determinado em conformidade com o n.º 1 do artigo 31.º, considerando -se, para todos os efeitos, que a sentença foi proferida nesse lugar. 5 — A menos que as partes hajam convencionado de outro modo, da sentença deve constar a repartição pelas partes dos encargos directamente resultantes do processo arbitral. Os árbitros podem ainda decidir na sentença, se o entenderem justo e adequado, que uma ou algumas das partes compense a outra ou outras pela totalidade ou parte dos custos e despesas razoáveis que demonstrem ter suportado por causa da sua intervenção na arbitragem. 6 — Proferida a sentença, a mesma é imediatamente notificada através do envio a cada uma das partes de um exemplar assinado pelo árbitro ou árbitros, nos termos do disposto n.º 1 do presente artigo, produzindo efeitos na data dessa notificação, sem prejuízo do disposto no n.º 7. 7 — A sentença arbitral de que não caiba recurso e que já não seja susceptível de alteração no termos do artigo 45.º tem o mesmo carácter obrigatório entre as partes que a sentença de um tribunal estadual transitada em julgado e a mesma força executiva que a sentença de um tribunal estadual. Artigo 43.º Prazo para proferir sentença 1 — Salvo se as partes, até à aceitação do primeiro árbitro, tiverem acordado prazo diferente, os árbitros devem notificar às partes a sentença final proferida sobre o litígio que por elas lhes foi submetido dentro do prazo de 12 meses a contar da data de aceitação do último árbitro. 2 — Os prazos definidos de acordo com o n.º 1 podem ser livremente prorrogados por acordo das partes ou, em alternativa, por decisão do tribunal arbitral, por uma ou mais vezes, por sucessivos períodos de 12 meses, devendo tais prorrogações ser devidamente fundamentadas. Fica, porém, ressalvada a possibilidade de as partes, de comum acordo, se oporem à prorrogação. 3 — A falta de notificação da sentença final dentro do prazo máximo determinado de acordo com os números anteriores do presente artigo, põe automaticamente termo ao processo arbitral, fazendo também extinguir a competência dos árbitros para julgarem o litígio que lhes fora submetido, sem prejuízo de a convenção de arbitragem manter a sua eficácia, nomeadamente para efeito de com base nela ser constituído novo tribunal arbitral e ter início nova arbitragem. 4 — Os árbitros que injustificadamente obstarem a que a decisão seja proferida dentro do prazo fixado respondem pelos danos causados. Artigo 44.º Encerramento do processo 1 — O processo arbitral termina quando for proferida a sentença final ou quando for ordenado o encerramento do processo pelo tribunal arbitral, nos termos do n.º 2 do presente artigo. 2 — O tribunal arbitral ordena o encerramento do processo arbitral quando: a) O demandante desista do seu pedido, a menos que o demandado a tal se oponha e o tribunal arbitral reconheça que este tem um interesse legítimo em que o litígio seja definitivamente resolvido; b) As partes concordem em encerrar o processo; c) O tribunal arbitral verifique que a prossecução do processo se tornou, por qualquer outra razão, inútil ou impossível.
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3 — As funções do tribunal arbitral cessam com o encerramento do processo arbitral, sem prejuízo do disposto no artigo 45.º e no n.º 8 do artigo 46.º 4 — Salvo se as partes tiverem acordado de modo diferente, o presidente do tribunal arbitral deve conservar o original do processo arbitral durante um prazo mínimo de dois anos e o original da sentença arbitral durante um prazo mínimo de cinco anos. Artigo 45.º Rectificação e esclarecimento da sentença; sentença adicional 1 — A menos que as partes tenham convencionado outro prazo para este efeito, nos 30 dias seguintes à recepção da notificação da sentença arbitral, qualquer das partes pode, notificando disso a outra, requerer ao tribunal arbitral, que rectifique, no texto daquela, qualquer erro de cálculo, erro material ou tipográfico ou qualquer erro de natureza idêntica. 2 — No prazo referido no número anterior, qualquer das partes pode, notificando disso a outra, requerer ao tribunal arbitral que esclareça alguma obscuridade ou ambiguidade da sentença ou dos seus fundamentos. 3 — Se o tribunal arbitral considerar o requerimento justificado, faz a rectificação ou o esclarecimento nos 30 dias seguintes à recepção daquele. O esclarecimento faz parte integrante da sentença. 4 — O tribunal arbitral pode também, por sua iniciativa,nos 30 dias seguintes à data da notificação da sentença, rectificar qualquer erro do tipo referido no n.º 1 do presente artigo. 5 — Salvo convenção das partes em contrário, qualquer das partes pode, notificando disso a outra, requerer ao tribunal arbitral, nos 30 dias seguintes à data em que recebeu a notificação da sentença, que profira uma sentença adicional sobre partes do pedido ou dos pedidos apresentados no decurso do processo arbitral, que não hajam sido decididas na sentença. Se julgar justificado tal requerimento, o tribunal profere a sentença adicional nos 60 dias seguintes à sua apresentação. 6 — O tribunal arbitral pode prolongar, se necessário, o prazo de que dispõe para rectificar, esclarecer ou completar a sentença, nos termos dos n.os 1, 2 ou 5 do presente artigo, sem prejuízo da observância do prazo máximo fixado de acordo com o artigo 43.º 7 — O disposto no artigo 42.º aplica -se à rectificação e ao esclarecimento da sentença bem como à sentença adicional. CAPÍTULO VII Da impugnação da sentença arbitral Artigo 46.º Pedido de anulação 1 — Salvo se as partes tiverem acordado em sentido diferente, ao abrigo do n.º 4 do artigo 39.º, a impugnação de uma sentença arbitral perante um tribunal estadual só pode revestir a forma de pedido de anulação, nos termos do disposto no presente artigo. 2 — O pedido de anulação da sentença arbitral, que deve ser acompanhado de uma cópia certificada da mesma e, se estiver redigida em língua estrangeira, de uma tradução para português, é apresentado no tribunal estadual competente, observando -se as seguintes regras, sem prejuízo do disposto nos demais números do presente artigo:
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a) A prova é oferecida com o requerimento; b) É citada a parte requerida para se opor ao pedido e oferecer prova; c) É admitido um articulado de resposta do requerente às eventuais excepções; d) É em seguida produzida a prova a que houver lugar; e) Segue -se a tramitação do recurso de apelação, com as necessárias adaptações; f) A acção de anulação entra, para efeitos de distribuição, na 5.ª espécie. 3 — A sentença arbitral só pode ser anulada pelo tribunal estadual competente se: a) A parte que faz o pedido demonstrar que: i) Uma das partes da convenção de arbitragem estava afectada por uma incapacidade; ou que essa convenção não é válida nos termos da lei a que as partes a sujeitaram ou, na falta de qualquer indicação a este respeito, nos termos da presente lei; ou ii) Houve no processo violação de alguns dos princípios fundamentais referidos no n.º 1 do artigo 30.º com influência decisiva na resolução do litígio; ou iii) A sentença se pronunciou sobre um litígio não abrangido pela convenção de arbitragem ou contém decisões que ultrapassam o âmbito desta; ou iv) A composição do tribunal arbitral ou o processo arbitral não foram conformes com a convenção das partes, a menos que esta convenção contrarie uma disposição da presente lei que as partes não possam derrogar ou, na falta de uma tal convenção, que não foram conformes com a presente lei e, em qualquer dos casos, que essa desconformidade teve influência decisiva na resolução do litígio; ou v) O tribunal arbitral condenou em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido, conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento ou deixou de pronunciar -se sobre questões que devia apreciar; ou vi) A sentença foi proferida com violação dos requisitos estabelecidos nos n.os 1 e 3 do artigo 42.º; ou vii) A sentença foi notificada às partes depois de decorrido o prazo máximo para o efeito fixado de acordo com ao artigo 43.º ; ou b) O tribunal verificar que: i) O objecto do litígio não é susceptível de ser decidido por arbitragem nos termos do direito português; ii) O conteúdo da sentença ofende os princípios da ordem pública internacional do Estado português. 4 — Se uma parte, sabendo que não foi respeitada uma das disposições da presente lei que as partes podem derrogar ou uma qualquer condição enunciada na convenção de arbitragem, prosseguir apesar disso a arbitragem sem deduzir oposição de imediato ou, se houver prazo para este efeito, nesse prazo, considera -se que renunciou ao direito de impugnar, com tal fundamento, a sentença arbitral. 5 — Sem prejuízo do disposto no número anterior, o direito de requerer a anulação da sentença arbitral é irrenunciável. 6 — O pedido de anulação só pode ser apresentado no prazo de 60 dias a contar da data em que a parte que pretenda essa anulação recebeu a notificação da sentença ou, se tiver sido feito um requerimento no termos do artigo 45.º, a partir da data em que o tribunal arbitral tomou uma decisão sobre esse requerimento. 7 — Se a parte da sentença relativamente à qual se verifique existir qualquer dos fundamentos de anulação referidos no n.º 3 do presente artigo puder ser dissociada do resto da mesma, é unicamente anulada a parte da sentença atingida por esse fundamento de anulação. 8 — Quando lhe for pedido que anule uma sentença arbitral, o tribunal estadual competente pode, se o considerar adequado e a pedido de uma das partes,
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suspender o processo de anulação durante o período de tempo que determinar, em ordem a dar ao tribunal arbitral a possibilidade de retomar o processo arbitral ou de tomar qualquer outra medida que o tribunal arbitral julgue susceptível de eliminar os fundamentos da anulação. 9 — O tribunal estadual que anule a sentença arbitral não pode conhecer do mérito da questão ou questões por aquela decididas, devendo tais questões, se alguma das partes o pretender, ser submetidas a outro tribunal arbitral para serem por este decididas. 10 — Salvo se as partes tiverem acordado de modo diferente, com a anulação da sentença a convenção de arbitragem volta a produzir efeitos relativamente ao objeto do litígio. CAPÍTULO VIII Da execução da sentença arbitral Artigo 47.º Execução da sentença arbitral 1 — A parte que pedir a execução da sentença ao tribunal estadual competente deve fornecer o original daquela ou uma cópia certificada conforme e, se a mesma não estiver redigida em língua portuguesa, uma tradução certificada nesta língua. 2 — No caso de o tribunal arbitral ter proferido sentença de condenação genérica, a sua liquidação faz -se nos termos do n.º 4 do artigo 805.º do Código de Processo Civil, podendo no entanto ser requerida a liquidação ao tribunal arbitral nos termos do n.º 5 do artigo 45.º, caso em que o tribunal arbitral, ouvida a outra parte, e produzida prova, profere decisão complementar, julgando equitativamente dentro dos limites que tiver por provados. 3 — A sentença arbitral pode servir de base à execução ainda que haja sido impugnada mediante pedido de anulação apresentado de acordo com o artigo 46.º, mas o impugnante pode requerer que tal impugnação tenha efeito suspensivo da execução desde que se ofereça para prestar caução, ficando a atribuição desse efeito condicionada à efectiva prestação de caução no prazo fixado pelo tribunal. Aplica -se neste caso o disposto no n.º 3 do artigo 818.º do Código de Processo Civil. 4 — Para efeito do disposto no número anterior, aplica--se com as necessárias adaptações o disposto nos artigos 692.º -A e 693.º -A do Código de Processo Civil. Artigo 48.º Fundamentos de oposição à execução 1 — À execução de sentença arbitral pode o executado opor -se com qualquer dos fundamentos de anulação da sentença previstos no n.º 3 do artigo 46.º, desde que, na data em que a oposição for deduzida, um pedido de anulação da sentença arbitral apresentado com esse mesmo fundamento não tenha já sido rejeitado por sentença transitada em julgado. 2 — Não pode ser invocado pelo executado na oposição à execução de sentença arbitral nenhum dos fundamentos previstos na alínea a) do n.º 3 do artigo 46.º, se já tiver decorrido o prazo fixado no n.º 6 do mesmo artigo para a apresentação do pedido de anulação da sentença, sem que nenhuma das partes haja pedido tal anulação. 3 — Não obstante ter decorrido o prazo previsto no n.º 6 do artigo 46.º, o juiz pode conhecer oficiosamente, nos termos do disposto do artigo 820.º do Código de
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Processo Civil, da causa de anulação prevista na alínea b) do n.º 3 do artigo 46.º da presente lei, devendo, se verificar que a sentença exequenda é inválida por essa causa, rejeitar a execução com tal fundamento. 4 — O disposto no n.º 2 do presente artigo não prejudica a possibilidade de serem deduzidos, na oposição à execução de sentença arbitral, quaisquer dos demais fundamentos previstos para esse efeito na lei de processo aplicável, nos termos e prazos aí previstos. CAPÍTULO IX Da arbitragem internacional Artigo 49.º Conceito e regime da arbitragem internacional 1 — Entende -se por arbitragem internacional a que põe em jogo interesses do comércio internacional. 2 — Salvo o disposto no presente capítulo, são aplicáveis à arbitragem internacional, com as devidas adaptações, as disposições da presente lei relativas à arbitragem interna. Artigo 50.º Inoponibilidade de excepções baseadas no direito interno de uma parte Quando a arbitragem seja internacional e uma das partes na convenção de arbitragem seja um Estado, uma organização controlada por um Estado ou uma sociedade por este dominada, essa parte não pode invocar o seu direito interno para contestar a arbitrabilidade do litígio ou a sua capacidade para ser parte na arbitragem, nem para de qualquer outro modo se subtrair às suas obrigações decorrentes daquela convenção. Artigo 51.º Validade substancial da convenção de arbitragem 1 — Tratando -se de arbitragem internacional, entende-se que a convenção de arbitragem é válida quanto à substância e que o litígio a que ele respeita é susceptível de ser submetido a arbitragem se se cumprirem os requisitos estabelecidos a tal respeito ou pelo direito escolhido pelas partes para reger a convenção de arbitragem ou pelo direito aplicável ao fundo da causa ou pelo direito português. 2 — O tribunal estadual ao qual haja sido pedida a anulaçãode uma sentença proferida em arbitragem internacional localizada em Portugal, com o fundamento previsto na alínea b) do n.º 3 do artigo 46.º, da presente lei, deve ter em consideração o disposto no número anterior do presente artigo. Artigo 52.º Regras de direito aplicáveis ao fundo da causa 1 — As partes podem designar as regras de direito a aplicar pelos árbitros, se os não tiverem autorizado a julgar segundo a equidade. Qualquer designação da lei ou do sistema jurídico de determinado Estado é considerada, salvo estipulação expressa em contrário, como designando directamente o direito material deste Estado e não as suas normas de conflitos de leis. 2 — Na falta de designação pelas partes, o tribunal arbitral aplica o direito do Estado com o qual o objecto do litígio apresente uma conexão mais estreita.
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3 — Em ambos os casos referidos nos números anteriores, o tribunal arbitral deve tomar em consideração as estipulações contratuais das partes e os usos comerciais relevantes. Artigo 53.º Irrecorribilidade da sentença Tratando -se de arbitragem internacional, a sentença do tribunal arbitral é irrecorrível, a menos que as partes tenham expressamente acordado a possibilidade de recurso para outro tribunal arbitral e regulado os seus termos. Artigo 54.º Ordem pública internacional A sentença proferida em Portugal, numa arbitragem internacional em que haja sido aplicado direito não português ao fundo da causa pode ser anulada com os fundamentos previstos no artigo 46.º e ainda, caso deva ser executada ou produzir outros efeitos em território nacional, se tal conduzir a um resultado manifestamente incompatível com os princípios da ordem pública internacional. CAPÍTULO X Do reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras Artigo 55.º Necessidade do reconhecimento Sem prejuízo do que é imperativamente preceituado pela Convenção de Nova Iorque de 1958, sobre o reconhecimento e a execução de sentenças arbitrais estrangeiras, bem como por outros tratados ou convenções que vinculem o Estado português, as sentenças proferidas em arbitragens localizadas no estrangeiro só têm eficácia em Portugal, seja qual for a nacionalidade das partes, se forem reconhecidas pelo tribunal estadual português competente, nos termos do disposto no presente capítulo desta lei. Artigo 56.º Fundamentos de recusa do reconhecimento e execução 1 — O reconhecimento e a execução de uma sentença arbitral proferida numa arbitragem localizada no estrangeiro só podem ser recusados: a) A pedido da parte contra a qual a sentença for invocada, se essa parte fornecer ao tribunal competente ao qual é pedido o reconhecimento ou a execução a prova de que: i) Uma das partes da convenção de arbitragem estava afectada por uma incapacidade, ou essa convenção não é válida nos termos da lei a que as partes a sujeitaram ou, na falta de indicação a este respeito, nos termos da lei do país em que a sentença foi proferida; ou ii) A parte contra a qual a sentença é invocada não foi devidamente informada da designação de um árbitro ou do processo arbitral, ou que, por outro motivo, não lhe foi dada oportunidade de fazer valer os seus direitos; ou iii) A sentença se pronuncia sobre um litígio não abrangido pela convenção de arbitragem ou contém decisões que ultrapassam os termos desta; contudo, se as disposições da sentença relativas a questões submetidas à arbitragem puderem ser dissociadas das que não tinham sido submetidas à arbitragem, podem reconhecer -se e executar –se unicamente as primeiras; ou
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iv) A constituição do tribunal ou o processo arbitral não foram conformes à convenção das partes ou, na falta de tal convenção, à lei do país onde a arbitragem teve lugar; ou v) A sentença ainda não se tornou obrigatória para as partes ou foi anulada ou suspensa por um tribunal do país no qual, ou ao abrigo da lei do qual, a sentença foi proferida; ou b) Se o tribunal verificar que: i) O objecto do litígio não é susceptível de ser decidido mediante arbitragem, de acordo com o direito português; ou ii) O reconhecimento ou a execução da sentença conduza um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública internacional do Estado português. 2 — Se um pedido de anulação ou de suspensão de uma sentença tiver sido apresentado num tribunal do país referido na subalínea v) da alínea a) do n.º 1 do presente artigo, o tribunal estadual português ao qual foi pedido o seu reconhecimento e execução pode, se o julgar apropriado, suspender a instância, podendo ainda, a requerimento da parte que pediu esse reconhecimento e execução, ordenar à outra parte que preste caução adequada. Artigo 57.º Trâmites do processo de reconhecimento 1 — A parte que pretenda o reconhecimento de sentença arbitral estrangeira, nomeadamente para que esta venha a ser executada em Portugal, deve fornecer o original da sentença devidamente autenticado ou uma cópia devidamente certificada da mesma, bem como o original da convenção de arbitragem ou uma cópia devidamente autenticada da mesma. Se a sentença ou a convenção não estiverem redigidas em português, a parte requerente fornece uma tradução devidamente certificada nesta língua. 2 — Apresentada a petição de reconhecimento, acompanhada dos documentos referidos no número anterior, é a parte contrária citada para, dentro de 15 dias, deduzir a sua oposição. 3 — Findos os articulados e realizadas as diligências que o relator tenha por indispensáveis, é facultado o exame do processo, para alegações, às partes e ao Ministério Público,pelo prazo de 15 dias. 4 — O julgamento faz -se segundo as regras próprias da apelação. Artigo 58.º Sentenças estrangeiras sobre litígios de direito administrativo No reconhecimento da sentença arbitral proferida em arbitragem localizada no estrangeiro e relativa a litígio que, segundo o direito português, esteja compreendido na esfera de jurisdição dos tribunais administrativos, deve observar--se, com as necessárias adaptações ao regime processual específico destes tribunais, o disposto nos artigos 56.º, 57.ºe no n.º 2 do artigo 59.º da presente lei. CAPÍTULO XI Dos tribunais estaduais competentes Artigo 59.º Dos tribunais estaduais competentes
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1 — Relativamente a litígios compreendidos na esfera de jurisdição dos tribunais judiciais, o Tribunal da Relação em cujo distrito se situe o lugar da arbitragem ou, no caso da decisão referida na alínea h) do n.º 1 do presente artigo, o domicílio da pessoa contra quem se pretenda fazer valer a sentença, é competente para decidir sobre: a) A nomeação de árbitros que não tenham sido nomeados pelas partes ou por terceiros a que aquelas hajam cometido esse encargo, de acordo com o previsto nos n.os 3, 4 e 5 do artigo 10.º e no n.º 1 do artigo 11.º;b) A recusa que haja sido deduzida, ao abrigo do n.º 2 do artigo 14.º, contra um árbitro que a não tenha aceitado, no caso de considerar justificada a recusa; c) A destituição de um árbitro, requerida ao abrigo do n.º 1 do artigo 15.º; d) A redução do montante dos honorários ou despesas fixadas pelos árbitros, ao abrigo do n.º 3 do artigo 17.º; e) O recurso da sentença arbitral, quando este tenha sido convencionado ao abrigo do n.º 4 do artigo 39.º; f) A impugnação da decisão interlocutória proferida pelo tribunal arbitral sobre a sua própria competência, de acordo com o n.º 9 do artigo 18.º;g) A impugnação da sentença final proferida pelo tribunal arbitral, de acordo com o artigo 46.º;h) O reconhecimento de sentença arbitral proferida em arbitragem localizada no estrangeiro. 2 — Relativamente a litígios que, segundo o direito português, estejam compreendidos na esfera da jurisdição dos tribunais administrativos, a competência para decidir sobre matérias referidas nalguma das alíneas do n.º 1 do presente artigo, pertence ao Tribunal Central Administrativo em cuja circunscrição se situe o local da arbitragem ou, no caso da decisão referida na alínea h) do n.º 1, o domicílio da pessoa contra quem se pretende fazer valer a sentença. 3 — A nomeação de árbitros referida na alínea a) do n.º 1 do presente artigo cabe, consoante a natureza do litígio, ao presidente do Tribunal da Relação ou ao presidente do tribunal central administrativo que for territorialmente competente. 4 — Para quaisquer questões ou matérias não abrangidas pelos n.os 1, 2 e 3 do presente artigo e relativamenteàs quais a presente lei confira competência a um tribunal estadual, são competentes o tribunal judicial de 1.ª instância ou o tribunal administrativo de círculo em cuja circunscrição se situe o local da arbitragem, consoante se trate, respectivamente, de litígios compreendidos na esfera de jurisdição dos tribunais judiciais ou na dos tribunais administrativos. 5 — Relativamente a litígios compreendidos na esfera da jurisdição dos tribunais judiciais, é competente para prestar assistência a arbitragens localizadas no estrangeiro,ao abrigo do artigo 29.º e do n.º 2 do artigo 38.º da presente lei, o tribunal judicial de 1.ª instância em cuja circunscrição deva ser decretada a providência cautelar, segundo as regras de competência territorial contidas no artigo 83.º do Código de Processo Civil, ou em que deva ter lugar a produção de prova solicitada ao abrigo do n.º 2 do artigo 38.º da presente lei. 6 — Tratando -se de litígios compreendidos na esfera da jurisdição dos tribunais administrativos, a assistência a arbitragens localizadas no estrangeiro é prestada pelo tribunal administrativo de círculo territorialmente competente de acordo com o disposto no n.º 5 do presente artigo, aplicado com as adaptações necessárias ao regime dos tribunais administrativos. 7 — Nos processos conducentes às decisões referidas no n.º 1 do presente artigo, o tribunal competente deve observar o disposto nos artigos 46.º, 56.º, 57.º, 58.º e 60.º da presente lei. 8 — Salvo quando na presente lei se preceitue que a decisão do tribunal estadual competente é insusceptível de recurso, das decisões proferidas pelos tribunais referidos nos números anteriores deste artigo, de acordo com o que neles se dispõe,
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cabe recurso para o tribunal ou tribunais hierarquicamente superiores, sempre que tal recurso seja admissível segundo as normas aplicáveis à recorribilidade das decisões em causa. 9 — A execução da sentença arbitral proferida em Portugal corre no tribunal estadual de 1.ª instância competente, nos termos da lei de processo aplicável. 10 — Para a acção tendente a efectivar a responsabilidade civil de um árbitro, são competentes os tribunais judiciais de 1.ª instância em cuja circunscrição se situe o domicílio do réu ou do lugar da arbitragem, à escolha do autor. 11 — Se num processo arbitral o litígio for reconhecido por um tribunal judicial ou administrativo, ou pelo respectivo presidente, como da respectiva competência material, para efeitos de aplicação do presente artigo, tal decisão não é, nessa parte, recorrível e deve ser acatada pelos demais tribunais que vierem a ser chamados a exercer no mesmo processo qualquer das competências aqui previstas. Artigo 60.º Processo aplicável 1 — Nos casos em que se pretenda que o tribunal estadual competente profira uma decisão ao abrigo de qualquer das alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 59.º, deve o interessado indicar no seu requerimento os factos que justificam o seu pedido, nele incluindo a informação que considere relevante para o efeito. 2 — Recebido o requerimento previsto no número anterior, são notificadas as demais partes na arbitragem e, se for caso disso, o tribunal arbitral para, no prazo de 10 dias, dizerem o que se lhes ofereça sobre o conteúdo do mesmo. 3 — Antes de proferir decisão, o tribunal pode, se entender necessário, colher ou solicitar as informações convenientes para a prolação da sua decisão. 4 — Os processos previstos nos números anteriores do presente artigo revestem sempre carácter urgente, precedendo os respectivos actos qualquer outro serviço judicial não urgente. CAPÍTULO XII Disposições finais Artigo 61.º Âmbito de aplicação no espaço A presente lei é aplicável a todas as arbitragens que tenham lugar em território português, bem como ao reconhecimento e à execução em Portugal de sentenças proferidas em arbitragens localizadas no estrangeiro. Artigo 62.º Centros de arbitragem institucionalizada 1 — A criação em Portugal de centros de arbitragem institucionalizada está sujeita a autorização do Ministro da Justiça, nos termos do disposto em legislação especial. 2 — Considera -se feita para o presente artigo a remissão constante do Decreto -Lei n.º 425/86, de 27 de Dezembro, para o artigo 38.º da Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto.