Poderosa Afrodite de Woody Allen e a Poética de Aristóteles

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Lucas Scalon Teoria do Audiovisual I Lucas Vicensotto Profª Flávia C.Costa Poderosa Afrodite de Woody Allen e a Poética de Aristóteles Escrito e dirigido por Wood Allen! o fil"e Poderosa Afrodite #$ig%t Ap%rodite! &''() conta co" vários ele"entos da trag*dia grega! a descritos na o+ra de Arist,teles! A Poética . As se"el%an-as est o tanto na for"a /uanto no conte0do da narrativa /ue! de certa for"a +aseado Pig"ale o 1 e" /ue esse! n o encontrando a "ul%er ideal! se isola il%a e esculpe a "ul%er perfeita e" "arfi" 2! conta a %ist,ria de Allen) /ue! o+cecado por encontrar a "e verdadeira de desco+re Linda #$ira Sorvino)! u"a prostituta /ue deu a lu3 a $a4 Lenn) e deu2o para ado- o e! fa3endo a"i3ade co" ela! tenta tran vida. Apesar de to"ar grande parte da %ist,ria! a unidade de a- o ei4o central /ue leva a a- o dos personagens! n o * a de Lenn te transfor"ar a vida de Linda e si" a de Lenn tentando +uscar u"a seus pro+le"as fa"iliares. 7 poss6vel en4ergar essa unidade "ais /uando se define o n, da %ist,ria at* o ponto e" /ue Lenn perce+ relaciona"ento co" a esposa! A"anda #8elena 9on%a" Carter)! n o * "es"o 1 sendo o desenlace a partir da6. Tal percep- o acontece at artif6cio de recon%eci"ento: ao voltar co" a esposa de u" 5antar! casal na rua /ue ele 5ulga feli3 e! a partir da6! usando o flashback 1 /ue! de certa for"a! * re5eitado por Arist,teles! 5á /ue para ele o recon ser feito atrav*s do /ue está dentro do te"po da narrativa! n o a 2! * "ostrada co"o era a vida dos dois antes! +e" diferente 1 e " /ue no "o"ento. A pr,pria volta de tá4i está dentro de u" flashback e o te"po real * /uando Lenn está e" u" treino de fute+ol a"ericano! onde! %ist,ria para u" a"igo! resolve procurar a verdadeira " e de seu in6cio ao desenlace. <utro tipo de recon%eci"ento /ue Arist,teles erro * o encontro de Lenn e =evin na acade"ia de +o4e! logo /uan declara estar procurando o >cara certo? e at* ser " e. A for"a pe recon%eci"ento! e" A Poesia ! * a/uele /ue deriva da perip*cia e n o de a /ue * colocado #ou "el%or! >for-ado?) pelo poeta! /ue ainda n o % apresentado co"o poss6vel desencadeador de algu"aa- o! saindo da

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Artigo analisando o filme Poderosa Afrodite (Mighty Aphrodite, 1995, Woody Allen) sob a ótica de A Poética, de Aristóteles.

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Lucas Scalon Teoria do Audiovisual ILucas VicensottoProf Flvia C. CostaPoderosa Afrodite de Woody Allen e a Potica de Aristteles

Escrito e dirigido por Woody Allen, o filme Poderosa Afrodite (Mighty Aphrodite, 1995) conta com vrios elementos da tragdia grega, assim como descritos na obra de Aristteles, A Potica. As semelhanas esto tanto na forma quanto no contedo da narrativa que, de certa forma baseado no mito de Pigmaleo em que esse, no encontrando a mulher ideal, se isola em uma ilha e esculpe a mulher perfeita em marfim -, conta a histria de Lenny (Woody Allen) que, obcecado por encontrar a me verdadeira de seu filho adotivo, descobre Linda (Mira Sorvino), uma prostituta que deu a luz a Max (o filho de Lenny) e deu-o para adoo e, fazendo amizade com ela, tenta transformar sua vida. Apesar de tomar grande parte da histria, a unidade de ao, ou seja, o eixo central que leva a ao dos personagens, no a de Lenny tentando transformar a vida de Linda e sim a de Lenny tentando buscar uma sada para seus problemas familiares. possvel enxergar essa unidade mais claramente quando se define o n da histria at o ponto em que Lenny percebe que seu relacionamento com a esposa, Amanda (Helena Bonham Carter), no mais o mesmo sendo o desenlace a partir da. Tal percepo acontece atravs do artifcio de reconhecimento: ao voltar com a esposa de um jantar, Lenny v um casal na rua que ele julga feliz e, a partir da, usando o flashback que, de certa forma, rejeitado por Aristteles, j que para ele o reconhecimento deve ser feito atravs do que est dentro do tempo da narrativa, no antes ou depois -, mostrada como era a vida dos dois antes, bem diferente e melhor do que no momento. A prpria volta de txi est dentro de um flashback e o tempo real quando Lenny est em um treino de futebol americano, onde, contando a histria para um amigo, resolve procurar a verdadeira me de seu filho, dando incio ao desenlace. Outro tipo de reconhecimento que Aristteles tomaria por erro o encontro de Lenny e Kevin na academia de boxe, logo quando Linda declara estar procurando o cara certo e at ser me. A forma perfeita de reconhecimento, em A Poesia, aquele que deriva da peripcia e no de algo que colocado (ou melhor, forado) pelo poeta, que ainda no havia sido apresentado como possvel desencadeador de alguma ao, saindo da corrente de causalidade verossmil. Em se tratando dos trs princpios de unidade, o filme s cumpre ento com o da unidade de ao, como citado, no seguindo a unidade tempo, pois se estende por um tempo bem mais longo que o comum a uma tragdia grega, assim como no segue a unidade de espao, pois com a edio h a compresso de uma geografia diversa, no contgua.Um elemento que, claramente, est relacionado tragdia grega, o uso do coro, usado no filme, assim como no teatro, para representar as emoes dos personagens e, algumas vezes, seu pensamento, de forma que o prprio personagem no o possa dizer. comum, no entanto, que, bem diferente do que acontecia nas tragdias, como Lenny inclusive declara no episdio do roubo da ficha de adoo, no filme, haja interao entre Lenny e o coro, permitindo conversas e at que a opinio influencie na histria. O coro, ento, deixa de ser o narrador, ou aquele que v a histria de fora, para fazer parte dela, sendo assim um personagem importante. Tambm importante marcar que o prlogo da narrativa vem, arbitrariamente, aps a entrada do coro, sendo esse quem introduz a histria. Outra distino terica da Potica que pode ser facilmente observada no filme a entre cena e sumrio. A maior parte do filme acontece como cena, com a representao dramtica, detalhada e de curto espao de tempo, porm, algumas vezes, utiliza-se o recurso do sumrio para resumir vrios acontecimentos, como quando feita a declarao, por parte de um membro do coro grego, logo aps Lenny ter seu primeiro encontro com Linda, do resumo de diversos acontecimentos que no so representados. Outro elemento ainda de clara referncia o uso, ao final, do deus ex machina. Tal artifcio uma forma de dar resoluo, geralmente a que encerra a histria, a algo que parece impossvel de ser resolvido. No filme, chamada de deux ex machina, a chegada de um piloto de helicptero na vida de Linda, com quem ela se casa. Na verdade, ele usado como artifcio de humor e no exatamente como resoluo de problemas, j que o desenlace da unidade de ao j havia sido resolvido, quando Lenny e Amanda voltam a ser felizes novamente, juntos.Lenny, um personagem que dentro dos moldes aristotlicos no nem de todo bom nem de todo mau, tem suas peripcias, ou seja, as aes que geram a mudana de seu destino, desencadeadas a partir do momento de sua deciso por mudar a vida de Linda, gerando assim seu afastamento de Amanda. Esse momento no deve ser confundido com o do incio do desenlace, j que esse marcado pela busca de Linda. A diferena at, de certa forma, destacada pelo coro: quando a ideia de Lenny procurar Linda, o lder do coro tenta impedi-lo, mas, quando o personagem toma a deciso de mud-la, o coro toma um tom mais srio e o prprio Lenny que interfere em sua fala. Ou seja, at essa deciso ser tomada e executada nada mudaria em sua vida. No possvel dizer, porm, se Lenny atinge ou no a catarse. O fato que tambm no claro onde se aplicaria, em sua vida, o conceito de felicidade e infelicidade. O mais seguro, talvez, seja dizer que a felicidade aparente do incio revelada como infelicidade e, tentando mudar o destino de outra pessoa, Lenny passe pelo seu prprio processo de mudana de destino, fazendo com que se atinja a felicidade concreta. Falando em gneros cinematogrficos, o filme considerado uma comdia e, at isso, Woody Allen usa como com maestria: a comdia, segundo Aristteles, imita os homens piores e, no seria Linda Ash, a maior geradora de humor na histria, uma mulher pior? E tambm no poderia ser considerada uma personagem coerente, j que seria natural de uma mulher pior gerar humor? Poderosa Afrodite um filme. Nenhuma obra desse tipo, provavelmente, conseguir atingir o ideal de Aristteles. E talvez, nenhuma tragdia tenha conseguido. Mas, se h obras contemporneas que consigam chegar perto do que descreve A Potica, Poderosa Afrodite uma delas, tanto pela sua estrutura, quanto pelo seu dilogo com os elementos presentes no drama grego. Tambm por ser um filme, alguns erros ainda podem ser considerados, como o fato de no haver exatamente uma unidade de tempo ou lugar, mas a decupagem, nesse tipo de obra, faz com que o espectador no se perca. Aristteles, para o fim, recomenda que este seja simples, no duplo, que no haja distino entre o encaminhamento dado aos personagens bons e maus, que preferencialmente todos passem da felicidade desgraa, e entre elas, ao menos para o heri, por um processo catrtico. Em Poderosa Afrodite, Allen no seguiu essa recomendao por completo, j que o final simples, mas, para todos os personagens, feliz. O que indiscutvel aqui a validade da obra de Allen enquanto chamariz para os ecos que encontramos ressoando at hoje em diferentes obras de arte, daquilo que, j nA Potica, havia sido escrito a milhares de anos atrs.