Poder Local

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Caderno de Estudo e Trabalho N o 3 Poder Local: O Desafio da Democracia Seminário de Atualização Política 2008

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Prezado(a). Este e-book é a reprodução do livro impresso Poder Local: O Desafio da Democracia, elaborado para ser o material básico dos Seminários de Atualização Política, que a Secretaria de Formação Política do PPS juntamente com a Fundação Astrojildo Pereira vêm promovendo desde maio de 2008, por todo o país. Mesmo havendo um ou outro texto fora do tempo (é que já se passaram quatro anos de sua redação), este material é ainda de maior utilidade para o(a) leitor(a), sobretudo se for candidato/a em outubro próximo. Boa leitura e bom proveito!

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Caderno de Estudo e TrabalhoNo 3

Poder Local:O Desafio da Democracia

Seminário deAtualização Política

2008

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Prezado(a). Este e-book é a reprodução do livro impresso Poder Local: O Desafio da Democracia, elaborado para ser o material básico dos Seminários de Atualização Política, que a Secretaria de Formação Política do PPS juntamente com a Fundação Astrojildo Pereira vêm promovendo desde maio de 2008, por todo o país. Mesmo havendo um ou outro texto fora do tempo (é que já se passaram quatro anos de sua redação), este material é ainda de maior utilidade para o(a) leitor(a), sobretudo se for candidato/a em outubro próximo. Boa leitura e bom proveito!
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Secretário Nacional de Formação Política Francisco Inácio de Almeida

Colaboraram em pesquisa e redação de textoAmauri Pessoa Veras, Antonio Barbosa, Arlindo Fernandes Oliveira, Arildo Dórea,

Caetano Araújo, Claudio Vitorino de Aguiar, Demétrio Carneiro, Elaine Marinho de Faria,Irina Storni, Ivan Alves Filho, Jorge Modesto, Raimundo Lobão, Renato A. Martins, Tereza Vitale

IlustraçõesJacyara Santini

Ficha Catalográfica

SCS Quadra 7, Bloco A, Edifício Executive Tower, Salas 826/828 Asa Sul - Brasília - DF - CEP: 70307-901

Fone: (61) 3218-4123 Fax: (61) 3218-4112 [email protected] www.pps.org.br

SDS · Edifício Miguel Badya · Sala 322CEP: 70394-901 · Brasília-DF

Fone: (61) 3224-2269 · Fax.: (61) [email protected]

www.fundacaoastrojildo.org.br

Almeida, Francisco Inácio de (Org.), 2008 – Poder Local: desafio da democracia, Seminário de Atualização Política, / Francisco Inácio de Almeida. Brasília : Fundação Astrojildo Pereira. Co-edição : Partido Popular Socialista, 2008

100p. Ilustrações: Jacyara Santini

1. Ciência Política. 2. Teorias políticas. Ideologias. 3. Processo Político. Partidos Políticos (Os). I. Almeida, Francisco Inácio de. II Título.

CDU 320 320.5 324

PresidenteRoberto Freire

Presidente Stepan Nercessian

Produção Editorial

Produção e edição finalTereza Vitale

CLSW 302 – Bloco B – Sala 123 – Ed. Park CenterCEP 70673-612 – Setor Sudoeste – Cruzeiro, DF

Telefax: (61) 3033-3704 / 9986-3632e-mail: [email protected] / [email protected]

Sumário

Apresentação ............................................................................................................................................5

1. Uma missão nobre do cidadão .............................................................................................................7

2. Que país é o nosso? ............................................................................................................................. 10

3. Do que é para o que precisa ser .......................................................................................................... 12

4. Acabar com a velha política de um Estado em crise .......................................................................... 14

5. Em torno de princípios e valores ........................................................................................................ 17

6. Construindo a esperança via radicalidade democrática ................................................................... 19

7. Orientado para o socialismo .............................................................................................................. 22

8. Um partido moderno aberto à ampla participação ........................................................................... 24

9. Objetivos claros em torno de um projeto político e social ................................................................ 26

10. O fim de um ciclo .............................................................................................................................. 27

11. A nova realidade global ................................................................................................................... 29

12. Poder Local e cidadania, cidadania e Poder Local .......................................................................... 31

13. O Poder Local democrático .............................................................................................................. 34

14. Governança Social Local e Cidadão-Gestor .................................................................................... 35

15. Diretrizes práticas para melhorar a qualidade de vida ................................................................... 39

16. Uma referência para a sociedade ...................................................................................................... 42

17. A origem dos recursos e os desvios da sua destinação .................................................................... 44

18. A questão do meio ambiente e uma gestão popular ........................................................................ 46

19. Os partidos e o processo eleitoral .................................................................................................... 49

20. As questões específicas das mulheres ............................................................................................... 51

21. Breve história do PCB/PPS .............................................................................................................. 53

22. Planejamento e gestão da campanha eleitoral ................................................................................. 65

23. Manual de convenções e calendário eleitoral ................................................................................... 79

5Poder Local O Desafio da Democracia•

Dando continuidade aos nossos trabalhos de atualização política, apresentamos o Caderno de Estudo e Trabalho nº 3, que

aborda resumidamente as questões gerais do país e do mundo, mas tem seu foco dedicado ao Poder Local e direcionado a pré-candidatos/as a prefeito/a e a vice, e a vereador/a, assim como a dirigentes, mi-litantes e simpatizantes do Partido.

Trata-se de uma caminhada pelas questões mais importantes da pauta nacional e mesmo interna-cional, além de apresentar uma sé-rie de conceitos e de sugestões que vêm sendo construídos entre nós, buscando nos conscientizar para a batalha em torno de novos rumos para as nossas comunidades, graças a uma correta relação entre gover-nantes e governados, a partir do município, de forma a romper com velhos paradigmas políticos, entre eles a partidarização ou domínio da prefeitura em proveito de um pequeno grupo de interesse, com a conseqüente manipulação de recursos, que são de todos, em proveito de minorias.

Além de nos atualizarmos sobre o Brasil e seus problemas, vamos conhecer os valores e princípios que norteiam as atividades do PPS e um resumo da sua história, para entender me-lhor a visão sobre o país e as propostas de enca-minhamento de solução para os impasses que os brasileiros são obrigados ainda a enfrentar como nação. Pretendemos assim que cada um dos par-ticipantes – com essas informações básicas – pos-

sa, em contato com a realidade em que vive, atuar no sentido de modificá-la, tornando-se referência junto a sua comunidade, nas organizações sociais e nas instituições locais.

Somos conscientes da importância de se respeitar o pluralismo de idéias e de nos compro-metermos com o estímulo à verdadeira participa-

ção popular. Colocamos os interes-ses da maioria da população como centro do processo político-admi-nistrativo, daí a necessidade de um diagnóstico correto da situação do município, que permita e fixe obje-tivos, metas e meios inovadores e exeqüíveis.

Um plano capaz de enfren-tar e alterar a realidade social, eco-nômica, administrativa e política do município não pode ser for-mulado com base em generalida-

des. Por isso, um dos aspectos determinantes da mudança será despertar a cidade e o município da apatia em que se encontram, fazendo-os falar, pensar e agir. Centrada no combate à exclusão e à desigualdade, no estímulo ao desenvolvimento social, na recomposição das instituições públicas e na reorganização da administração municipal, dentre outros pontos, uma proposta assim exige dos representantes do povo e de cada cidadão um esforço sistemático, articulado e orgânico.

Por isso é que o PPS luta para que se cons-trua um Poder Local democrático, capaz de in-corporar, em todas as fases do processo de pla-

Apresentação

Somos conscientes da importância de se respeitar o pluralismo

de idéias e de nos comprometermos com

o estímulo à verdadeira participação popular

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nejamento, programação e produção do espaço e de serviços urbanos, a iniciativa das entidades representativas da sociedade (trabalhadores e empresários) e dos cidadãos. Tudo fará para que a ação governamental se complete com a divulga-ção de indicadores econômicos, sociais, ambien-tais e urbanísticos, consubstanciado em um siste-ma que reflita, de um lado, a realidade existente e, de outro, os padrões a atingir, estabelecendo a necessária transparência nas ações públicas.

Antecipando este Seminário, durante o ano de 2007, vários dos dirigentes do PPS, à frente o presidente Roberto Freire e o coordenador elei-toral Paulo Elisiário Nunes, percorreram capitais e cidades com mais de 100 mil eleitores, para discutir com lideranças e possíveis candidatos a estratégia a ser desenvolvida neste ano eleitoral. Da mesma forma, foi apresentado novamente o Projeto Fala Brasil, importante instrumento me-todológico criado para auscultar as idéias e pro-postas da população no período pré-eleitoral. Os cidadãos são consultados através de um questio-nário específico para cada cidade, que é disponi-

bilizado em bancas levadas às ruas e praças mais movimentadas. O questionário aborda os prin-cipais temas que afetam a qualidade de vida do eleitorado, tais como emprego, saúde, educação e segurança, dados que são depois tabulados e dis-cutidos nas reuniões com a comunidade tornan-do-se parte integrante dos programas de governo das candidaturas majoritárias e proporcionais do PPS. A metodologia e os materiais estão disponí-veis no portal do PPS (www.pps.org.br) na área de Eleições 2008.

As eleições deste ano além de ser uma oportunidade para, mais uma vez, se apresentar as idéias do PPS, e se provocar o debate em torno de propostas de solução para os problemas muni-cipais, têm ainda um valor estratégico, orientado pelo princípio de que a consolidação e o apro-fundamento da democracia e a implantação dos valores republicanos requerem partidos fortes e representativos do eleitorado. Somos convictos que os grandes desafios do país só terão solução se enfrentarmos os pequenos e grandes proble-mas locais.

7Poder Local O Desafio da Democracia•

1. Uma missão nobre do cidadão

A política deve ser entendida como a arte ou a ciência de governar ou organizar as questões públicas objetivando regular e

melhorar as condições existenciais dos cidadãos. Ela é importante porque modela a vida em socie-dade e tenta garantir que os interesses da comuni-dade sejam preservados e os direitos individuais ampliados. O conceito está estreitamente ligado ao de poder e deriva do adjetivo em língua grega originado de pólis (politikós), que significa tudo o que se refere à cidade e, consequentemente, o que é urbano, civil, público, social.

No Brasil, como resultado de uma cultura política elitista e autoritária, o atual sistema polí-tico partidário fomenta o aparecimento de grande número de pessoas totalmente descompromissa-das com os sonhos e os interesses do conjunto da sociedade e com as grandes questões republica-nas, agindo como se o Estado e suas instituições fossem meros espaços de seus interesses. Cria-se, então, um campo propício para a demagogia e para constantes atos de corrupção, envolvendo políticos, empresários e funcionários públicos, e a conseqüente impunidade dos seus autores.

Daí a política ser considerada, pela maioria dos brasileiros, como algo nocivo e pernicioso, como ação corrupta e corruptora, indigna para ser praticada por uma pessoa séria e responsável. Em todas as pesquisas que medem o grau de con-fiança da população em diferentes instituições, as organizações políticas – partidos, parlamento e governo – ocupam as posições mais baixas. Re-pulsa, desprezo e indignação são sentimentos co-muns quando se pensa ou se comenta a política.

É que, de um lado, vê-se a política como uma ativida-de específi-ca de elites e figurões, de gente graúda ou de seus apadrinha-dos, e, de outro, é vista como um trampolim para certas pessoas “vencerem na vida”. Nada mais seria que um vale-tudo, em que não há princípios nem escrúpulos, os fins justificando todo e qualquer meio, por mais desonesto e ab-surdo que seja.

As distorções do regime político e do siste-ma partidário têm levado milhões de brasileiros à apatia política frente aos governos, aos processos eleitorais, à atividade partidária e à própria dete-rioração da situação social. Muitas pessoas hon-radas e qualificadas evitam a política, enquanto indivíduos menos qualificados moral e profis-sionalmente são atraídos por ela. Desta forma, o envolvimento com a política transformou-se em uma decisão difícil para homens e mulheres de bem. Num ambiente assim passam a dominar a descrença e o desencanto na política, além do descrédito nos políticos, o que conduz à perni-ciosa idéia de que a democracia é o terreno pro-pício a alimentar os demagogos e suas promessas nunca cumpridas.

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Contribuem para este comportamento a pouca vivência democrática (após o regime mi-litar, o país tem um pouco mais de 20 anos de democracia, o maior período contínuo de sua história) e ainda o fato de que historicamente a criação do Estado precedeu à formação da na-ção brasileira. Parece-nos essencial repisar esse ponto, pois qualquer exame sério da realida-de política brasileira deve levar em conta essa circunstância essencial: em mais de cinco sécu-los, o Brasil foi colônia de um país absolutista (1500-1822), situação a que se seguiu um regi-me político e socioeconômico que tinha como pilar central a escravidão (1822-1889), e viveu três períodos republicanos de restrição maior ou menor à democracia política, a República Velha (1889-1930), o Estado Novo de Vargas (1937-1945) e a ditadura militar (1964-1985).

Somente após o fim da Segunda Guerra Mundial é que vivemos nossa pri-meira experiência democrático-liberal (1945-1964), ainda assim sob algumas restrições, como a proibição do funcionamento legal do Partido Comunista Brasileiro em quase todo esse período, expe-riência que criou condições para o crescimento das reivindicações populares e democráticas, e viu go-vernos democráticos e tolerantes, como o de Juscelino Kubitscheck. As promessas de associar mudan-ça social às liberdades civis foram sufocadas pelo golpe de 1º de abril de 1964, que instaurou um regime militar que perdurou mais de duas décadas. A plena democracia política somente foi restaurada com a promulgação da Constitui-ção de 1988, marcada pela definição do Estado democrático de Direito, aberto às transforma-ções sociais.

Como fruto desse avanço fundamen-tal resultaram duas importantes conquistas: a democracia política e uma certa estabilidade econômico-financeira, além da abertura para políticas sociais distributivistas. Logo em segui-

da, entretanto, o imenso peso de nosso passado patrimonialista harmonizou-se sem maiores di-ficuldades, nos governos FHC e Lula, a uma po-lítica econômica de viés neoliberal, marcada pela predominância dos interesses do setor financeiro, e a ausência de projetos realmente estruturadores de novos rumos para a sociedade brasileira.

Este cenário de profundo distanciamento entre a política que desejamos e a existente nos faz refletir sobre os caminhos que devemos to-mar. Diante dessa realidade e frente a tamanho desafio, cresce nossa responsabilidade. Cresce porque não temos o direito de nos negar à par-ticipação efetiva em relação aos assuntos que dizem respeito a nossa gente e a nossas vidas. Cresce porque não podemos nos conformar com o quadro de desigualdade e miséria, de injustiça e de corrupção que se abate sobre milhões de brasileiros e o país.

Porém, precisa-se dar um primeiro passo: cada brasileiro se convencer da necessidade de fazer política, arregaçar as mangas e se lançar na luta. Ao lado disso, que se desenvolvam esforços para de-volver à política seu caráter ético e de serviço para o bem da socieda-de. Querer fazer política é, antes de tudo, abdicar de projetos somente pessoais em prol de servir ao pú-blico. De desejar, a partir da nossa efetiva participação, influenciar na construção dos destinos de todos. Homens e mulheres de bem, que não se apequenam diante de suas responsabilidades, devem abraçar

a política como um forte instrumento para a concretização das aspirações que não são apenas de uma pessoa ou de um grupo ou de um par-tido, mas de todos, na busca de construção de um país mais democrático, republicano e com oportunidades para todos.

Para melhor entender o papel da política numa determinada sociedade, tem-se que consi-derar, por exemplo, que: a) a atividade do sindi-cato ou da associação se vincula à busca de solu-

Este cenário de profundo

distanciamento entre a política que desejamos

e a existente nos faz refletir sobre os

caminhos que devemos tomar. Diante dessa realidade e frente a

tamanho desafio, cresce nossa responsabilidade

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ções para os problemas profi ssionais, de melhores condições de trabalho e de vida para os trabalha-dores; b) a da associação de mo-radores se preocupa com as ques-tões ligadas ao local de moradia, e de um determinado bairro; c) a da paróquia ou do templo se rela-ciona com os aspectos espirituais, numa área de abrangência especí-fi ca. E assim por diante. Como se pode perceber facilmente, a ativi-dade política é a única que solda todas as demais ações humanas em prol do encaminhamento das questões maiores e essenciais da sociedade, desde as do município, passando pelas do estado e as da União. É a mediadora das esferas fundamentais da vida coletiva.

Nada fazer não é uma op-ção. Sendo omisso ou alheio às questões polí-ticas, o cidadão está também fazendo política,

pois está permitindo que pessoas descompro-metidas com a sociedade continuem usando a

política em seu benefício, único e exclusivo, ou do seu grupo. A apatia e o desprezo com que muitos brasi-leiros encaram o funcionamento do nosso sistema político é o principal combustível que alimenta a cor-rupção, o desmando, o desrespeito às autoridades. Daí a importância e a necessidade de todos fazerem política. É como num jogo de fu-tebol. Ficar na arquibancada – tor-cendo pelo seu time – ajuda, mas quem decide o resultado da partida é quem está no campo jogando. É também como num incêndio. Tem importância gritar e pedir socorro, mas para apagar as chamas precisa-se agir. Para resolver o jogo da vida

e apagar o incêndio dos problemas é preciso agir. É preciso fazer política.

Sendo omisso ou alheio às questões

políticas, o cidadão está também fazendo

política, pois está permitindo que pessoas descomprometidas com a sociedade continuem

usando a política em seu benefício,

único e exclusivo, ou do seu grupo

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2. Que país é o nosso?

O Brasil é um país-continente, uma nação múltipla e unitária, complexa e dinâmi-ca. É a quinta maior população mundial

(com mais de 186 milhões de habitantes), o se-gundo país mais populoso do continente ameri-cano e de todo o hemisfério ocidental, superado apenas pelos Estados Unidos, e também a quinta maior superfície em extensão do planeta (8,514 milhões de km2).

É uma das dez maiores economias do mun-do (seu PIB já ultrapassa R$ 2,5 trilhões) e é dono de um parque produtivo integrado, globalizado e bastante diversificado, de um sistema financeiro e bancário dos mais modernos (embora concentra-do), de vastos recursos naturais (maior produtor mundial de minério-de-ferro, cana-de-açúcar, suco de laranja, café, mandioca, etanol e frutas tropicais e o segundo maior de feijão, soja, car-ne de frango), de potencialidades imensas e com um grau elevado de interligação com a economia mundial. Neste particular, nossas exportações atingiram a marca dos US$ 160 bilhões, sendo que apenas 23.113 das mais de 5 milhões de em-presas existentes no país são responsáveis pelas vendas externas.

Ao mesmo tempo, o Brasil situa-se na ri-dícula 58ª posição mundial em termos de renda per capita, e faz 25 anos que é campeão mundial absoluto em concentração de renda e de rique-za (ativos financeiros, fábricas, terras, imóveis em geral etc.), mesmo quando comparado com nações pobres da África. Para se ter uma idéia, apenas 1% dos brasileiros detém cerca de 53% do estoque de bens do país, e a renda dos 10% mais ricos é 28 vezes a obtida pelos 40% mais pobres (na Argentina é de dez vezes, em Portugal de

oito, nos EUA de 5,5 e no Japão de quatro vezes). Destaque-se que os brasileiros pobres, cuja renda mensal é insuficiente para o atendimento do con-junto de suas necessidades básicas, continuam a constituir um terço da população. Somam 53 mi-lhões, sendo que 20 milhões deles são indigentes, não dispõem de renda monetária suficiente para atender à primeira necessidade fundamental: a alimentação. Enquanto isso, em 2007, apenas 190 mil milionários no país detinham US$ 675 bilhões, o que equivale a praticamente metade do PIB brasileiro.

É também muito concentrada a geração in-terna da renda e a difusão geográfica ao se produ-zir a riqueza, em termos de municípios. Dos 5.564 existentes, só 51 são responsáveis por 50% do PIB com 30,5% da população (vale lembrar que deste universo, apenas cinco cidades – São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Curitiba e Belo Horizonte – respondem por 25% do PIB brasileiro), enquanto 1.371 municípios respondem por apenas 1% do PIB e concentram 3,5% da população.

Segundo o Índice de Gini, apenas Namíbia, África do Sul, Bolívia e Haiti apresentam padrão de concentração de renda pior do que o brasilei-ro. Mas, se forem comparadas apenas as nações de alto desenvolvimento humano, o país apresen-ta a maior desigualdade medida por esse índice. Por sua vez, é campeão mundial em taxa de juros praticada (para depósitos e empréstimos).

Há muitos déficits sociais no Brasil. Cerca de 25% da população não são atendidos em sane-amento básico, 10% não desfrutam do consumo de água tratada, 11,56% dos municípios brasi-leiros não têm uma biblioteca pública sequer, o déficit habitacional chega à casa de 8 milhões de

11Poder Local O Desafio da Democracia•

unidades. Deste déficit, 91,6% situam-se na faixa de renda de até cinco salários mínimos. O ensi-no médio no Brasil possui um déficit de 250 mil professores, especialmente das disciplinas de quí-mica, física, matemática e biologia, áreas cruciais para transitar para a chamada “sociedade do co-nhecimento”.

O analfabetismo ainda é uma chaga. Chega a 11,1% a taxa de analfabetismo das pessoas de 15 anos ou mais de idade e quando se olha o elei-torado vê-se que, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), os dados relativos ao ano de 2007 revelam a nossa baixa escolaridade. Um pouco mais da metade, 51,5%, dos 127,4 milhões de eleitores brasileiros aptos a votar não consegui-ram completar o primeiro grau ou apenas lêem e escrevem. A média de escolaridade no país é sim-plesmente vergonhosa – o brasileiro não vai além de 6,7 anos de freqü-ência à escola, índice três vezes in-ferior ao da Argentina. A situação da qualidade da educação básica é caótica. O Brasil ocupa o 50º lugar, entre 57 nações, no Programa In-ternacional de Avaliação de Aluno (Pisa), que avalia o desempenho de estudantes em matemática, ciências e leitura. É ainda um país que mal-trata suas crianças. Chega a 2,2 mi-lhões o número delas de 5 a 14 anos que trabalham.

São estarrecedores os dados de uma pes-quisa do IBGE, divulgada em setembro de 2007, os quais revelam a imensa dificuldade do acesso à cultura por parte da população do país: o brasi-leiro lê, em média, 1,8 livro por ano, 92% nunca foram a um museu, 93,4% não conhecem exposi-ções de arte e 78% nunca assistiram a um espetá-culo de dança.

A mortalidade infantil alcança em média 20 por mil nascidos vivos (há 16 anos atrás, eram 57), mas continuam muito grandes as disparida-des entre as diversas regiões do país e entre dife-rentes grupos étnicos e sociais. No Nordeste, por exemplo, este número é de 36,9 por mil e para a população negra é de 27,9 por mil (37% maior do que para a população branca). A taxa para a

população branca é de 20,3 por mil nascidos vi-vos. Das 11,5 milhões de crianças com menos de seis anos no Brasil, 56% vivem na pobreza, em famílias com renda per capita de menos de meio salário mínimo.

A informalidade toma conta do mercado de trabalho e dilapida direitos duramente con-quistados ao longo do século XX e seus números assustam. Em 2006, a PEA (População Econo-micamente Ativa) era de 97,528 milhões de tra-balhadores, sendo a População Desocupada de 8,210 milhões e a População Ocupada de 89,318 milhões, e destes apenas 30,1 milhões tinham carteira assinada, ou seja, apenas 33,7% tinham emprego formal.

Outro exemplo concreto de abandono e exclusão são os trabalhadores ru-rais, cujos direitos continuam a ser desrespeitados e a informalidade no campo é gravíssima. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2005, há 17,8 milhões de traba-lhadores rurais no Brasil, o que re-presenta 20,5% de todas as pessoas ocupadas no país. Excluindo-se os que trabalham por conta própria – empregadores, agricultores que produzem para o próprio consumo e trabalhadores não-remunerados

– há 4,9 milhões de pessoas empregadas no cam-po, sendo que apenas 32% têm carteira assinada.

A inserção das mulheres no mercado de trabalho no Brasil vem crescendo de maneira acelerada desde a década de 1970. Atualmente, elas representam mais de 43% da População Eco-nomicamente Ativa (PEA) do país. No entanto, persistem as diferenças entre homens e mulheres, tanto do ponto de vista da empregabilidade quan-to da remuneração. Enquanto a taxa de desem-prego aberto é de 12,4% para as mulheres, a dos homens chega a 9,2%. Quanto à remuneração, quando se desagrega o rendimento dos ocupados por sexo, nota-se que a renda média do trabalho das mulheres correspondia, em 2006, a 65,6% da renda dos homens.

Segundo o Índice de Gini, apenas Namíbia, África do Sul, Bolívia

e Haiti apresentam padrão de concentração de renda pior do que o

brasileiro

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A ninguém é estranho o fato de que o Brasil, no último século, vivenciou importantes transformações em todos os planos. De

uma sociedade agrária passamos a ser uma so-ciedade predominantemente industrial, com um nível de industrialização superior ao da maio-ria dos países europeus, um país razoavelmente moderno social, cultural e economicamente, que constitui um sistema econômico nacionalmente integrado. Além do mais, ultrapassou o limite de ser um mero apêndice do sistema interna-cional e ganhou a capacidade de criar ciclos próprios de crescimento. Res-salte-se também que, em cerca de dez anos, venceu a inflação (de quase 30% mensais para em tor-no de 5% anuais), estabilidade sempre defendida pelo PPS e conquista a ser preservada.

Foram também imen-sos, nesse período, os avan-ços no social. O índice de ur-banização saltou de menos de 50% para 82,82%. A melho-ria da qualidade de vida nos centros urbanos, com o avan- ço da industrialização aliada à expansão da produção agrícola de caráter intensivo, com bai-xo uso de mão-de-obra, acabou por atrair gran-des contingentes populacionais, anteriormente fixados no campo, num processo vertiginoso que ao mesmo tempo em que nos dá um ar de mo-dernidade cria problemas críticos nos grandes e médios municípios.

O Brasil construiu também um processo democrático que se amplia e se consolida, com eleições regulares, livres, no essencial honestas e competitivas, baseadas no sufrágio universal. Mais que isso, entre um período eleitoral e outro, as instituições democráticas vêm funcionando relativamente bem. O eleitorado que, em 1950, somava 11 milhões que correspondiam a 21% da população, hoje se aproxima de 128 milhões correspondendo a 2/3 da população. Houve im-portante crescimento de associações de todo tipo

através das quais a sociedade se organiza e procura influenciar e obter maior

controle sobre a ação do Poder Executivo, do Legislativo e mes-

mo do Judiciário.

Assinale-se que o país adentrou o século XXI em uma situação nova, alme-

jando por pro-fundas reformas, amplamente e

há muito tempo reclama-das. E uma delas diz respeito

à própria política e à cidadania, no sentido da ampliação das liber-

dades e de novos rumos para o país. Porém, para seguir nessa trilha é necessário ter clareza quais os obstáculos a enfrentar.

Nos últimos quinze anos, se a estabilidade da moeda foi direcionada para preparar as bases de um novo ciclo de progresso, o governo FHC assim como o de Lula não se preocuparam em moldar um projeto transformador para o país.

3. Do que é para o que precisa ser

13Poder Local O Desafio da Democracia•

Nem fizeram nada para romper com os compo-nentes históricos estruturais que impedem o de-senvolvimento social com a generalização da ci-dadania, incorporação e organização de milhões de excluídos, reforma democrática do Estado, combinar crescimento econômico com emprego e distribuição de renda, modernização produti-va com eqüidade e respeito ao meio ambiente, e integração competitiva da economia brasileira à economia mundial.

No pleito de 2002, o povo votou nas alterna-tivas que buscavam integrar a maioria dos brasi-leiros na vida econômica e os incluir socialmente. Acreditou que para alcançar uma forma realista de superação das desigualdades, em condições como as nossas, impunham-se agressivas políticas sociais e a re-visão do modelo econômico – as instituições econômicas e as re-lações entre Estado e produtores – convicto de que a garantia de pa-tamares mínimos de qualidade de vida a todo cidadão e o combate à concentração de propriedade e renda, bem como a toda forma de desigualdade social, constituem, por si sós, importantes, porém não suficientes, fatores de estímulo ao desenvolvimento econômico.

Como é de todos sabido, o governo Lula, além de se apoiar em uma política social de fundo assistencialista e eleitoreiro, man-tém o mesmo modelo macroe-conômico do governo anterior, o qual vem impedindo a retomada do crescimento nacional a taxas capazes de absorver o contingente de novos demandantes por traba-lho e ir reduzindo, sistematicamente, o estoque de desempregados. Modelo que, ao privilegiar o equilíbrio financeiro em detrimento dos equilí-brios social e econômico, tem levado o país a um impasse ao exigir taxas elevadas de juros para ga-rantir o equilíbrio cambial, nossas reservas, e, por conseguinte, a estabilidade da moeda. Por conta disso, a poupança privada dirige-se ao mercado financeiro e não à produção, enquanto a poupan-

ça pública esgota-se no pagamento do serviço da dívida: cerca de R$ 150 bilhões só em 2007 de ju-ros pagos da dívida pública, que já ultrapassa R$ 1,3 trilhão, isto é, cerca de 50% do PIB brasileiro. A grande tarefa que se impõe é o restabelecimen-to do primado da economia real sobre a especula-tiva e da prioridade das demandas sociais sobre a lógica do mercado financeiro.

Para nós, a política social, entendida como política de desenvolvimento social, é tão estra-tégica quanto a política econômica. Combater a pobreza e a exclusão social não é transformar pessoas e comunidades em beneficiários passivos e permanentes de programas assistenciais, mas fortalecer as capacidades de pessoas e comunida-

des de satisfazer suas necessidades, resolver seus problemas e melhorar sua qualidade de vida.

Daí porque entendemos que compartilhar com a sociedade as tarefas de formulação e implemen-tação de uma estratégia de desen-volvimento social não é apenas uma possibilidade, mas uma necessida-de na sociedade contemporânea. É preciso contar com a participa-ção de todos na tarefa de promover o desenvolvimento social e, sobre-tudo, é preciso contar com o prota-gonismo da sociedade.

As reformas estruturais, de caráter democrático, devem ir ao encontro do estabelecimento de políticas inovadoras sobretudo em áreas como as de educação (for-mação, qualificação e treinamento dos brasileiros é o investimento de mais alta taxa social de retorno a médio e longo prazos que um país

pode fazer) e de ciência e tecnologia, bases prin-cipais dos novos padrões de desenvolvimento. Repousam particularmente nestes dois campos as maiores esperanças nacionais na formatação de um novo espírito empreendedor que possa romper com velhos paradigmas do passado e assim trazer uma nova energia às principais de-mandas da sociedade.

Combater a pobreza e a exclusão social não é transformar pessoas

e comunidades em beneficiários passivos

e permanentes de programas assistenciais,

mas fortalecer as capacidades de

pessoas e comunidades de satisfazer suas

necessidades, resolver seus problemas e

melhorar sua qualidade de vida

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No Brasil, boa parte dos estados e muni-cípios, além da União, convive com um flagrante atraso das instituições clássi-

cas da democracia, de suas instâncias decisórias quando confrontadas com as necessidades e exi-gências da população, com a velocidade exigida para o seu atendimento e mesmo com a efetivi-dade dos resultados obtidos pelas ações públicas. No Poder Executivo, em níveis federal, estadual e municipal, tal tendência se evidencia, por meio da comprovada ineficiência e ineficácia de proje-tos, programas e ações setorizados.

O velho Estado está assentado na hierar-quia, na verticalidade e seus agentes públicos fazem do segredo e do obstáculo à comunica-ção, assim como da burocracia – a condição do exercício do poder. Ao analisar a questão local, constatamos que o prefeito, na maioria dos casos, teme que a cooperação de lideranças da comuni-dade esvazie seu papel de articulador e provedor, enquanto os habitantes permanecem apáticos, sempre à espera da ação da sua liderança maior. Da mesma forma, existe uma falta de integração entre as esferas públicas federal, estaduais e mu-nicipais, geradora de desperdício de recursos hu-manos e materiais, visto que, no mais das vezes, muitos projetos, programas e ações são sobrepos-tos, atendendo o mesmo público-alvo.

Acontece também que, por desconheci-mento legal e principalmente por injunções po-líticas patrocinadas pelas elites locais, a política municipal, em grande parte, ainda não passa de um arremedo da política nacional, organizada sob

velhos métodos (paternalismo, assistencialismo e clientelismo), e comprometida com os interesses cristalizados que perduram nas regiões e estados há várias décadas. Ao invés de proclamar auto-nomia e exigir direitos que lhe são consagrados constitucionalmente, o município ainda se man-tém em uma dependência exagerada em relação à União e aos estados, abdicando de construir ca-minhos novos no exercício da administração pú-blica e na relação com o conjunto da sociedade.

Lamentavelmente, a velha política do “pi-res na mão” ainda é a dominante em todo o país, acabando por submeter o futuro municipal aos ditames de lideranças regionais e nacionais, cujo principal compromisso é sua própria reprodução política, bem como a de grupos de interesses que as cercam. Tal prática necessita ser rompida. O que não implica declarar-se em rebelião contra o conjunto da Federação. Autonomia implica saber exercitar-se dentro do espaço constitucional e de-

4. Acabar com a velha política de um Estado em crise

15Poder Local O Desafio da Democracia•

mocrático estabelecido, negociar a ampliação de direitos, contribuir para a construção no municí-pio e, por conseqüência, em todo o país, de uma nova cidadania e de uma nova cultura política.

Afinal, a União e os estados, a rigor, cons-tituem uma ficção para o cidadão. É no limite de cada município, de cada distrito e localidade, que as pessoas crescem, se relacionam, criam suas fa-mílias; é nele que ficam suas casas, as ruas e as praças por onde transitam, as escolas em que estudam seus filhos, as igrejas, as sedes dos par-tidos, dos clubes desportivos, da associação co-munitária. E contraditoriamente, é onde se dá o espaço de generosidade e inclusão ou de acumu-lação e exclusão. É no município onde a cidada-nia se dá ou não de forma plena e onde também podem ser construí-das as novas alternativas e o perfil da sociedade democrática e justa com que tanto sonhamos. Obvia-mente, quase todas essas instâncias guardam relações diretas com po-líticas e instâncias administrativas e estatais mais amplas – federais e estaduais –, mas isso não autoriza ninguém a esperar por dádivas vin-das do alto.

Esgotado o Estado em sua configuração atual, reclama-se um novo, mais ágil, mais democrático, mais transparente e com capacida-de de contribuir na superação de desequilíbrios estruturais históricos, até porque o Estado não pode mais ser concebido como instância autôno-ma em relação à sociedade e a esta tutelar. Pelo contrário, deve a ela se subordinar, dentro de uma parceria em que se afirme o espaço público.

Para reafirmar as suas responsabilidades e de fato contribuir para que a população se benefi-cie com as mudanças colocadas pelos novos tem-pos, regidos pela globalização do conhecimento e da informação, é preciso que o município se repense enquanto elo primeiro do fortalecimen-to democrático e a administração municipal se pense também enquanto instância estimuladora e mobilizadora das potencialidades humanas, ma-

teriais e ambientais locais, liderando um processo de conexão entre o poder público, as entidades sociais, a iniciativa privada e o Terceiro Setor. Deve-se relembrar que é no município onde há as melhores condições para se implantar o em-preendedorismo, criar cooperativas e o chamado Banco Popular, experiência que há muitos anos vem dando certo em várias cidades e que existe para criar a prática de financiamento de peque-nos negócios aos cidadãos da comunidade.

Não poderia ser diferente já que a concen-tração de renda e o desemprego, tal como acon-tecem no Brasil, obrigam a ação do município na busca da estruturação de políticas para a inclu-são social. Embora muitos municípios tenham

avançado em relação à sua respon-sabilidade na implementação das políticas de educação e de atenção básica à saúde, ainda engatinham, por falta de maior alcance na defi-nição, aplicação e execução de re-cursos, com relação a políticas de construção da cidadania.

Outro ponto de dificuldade está em um conceito “clássico” de que a gestão pública é o local de acomodação de interesses das par-cerias e alianças, quando, na reali-dade, deve ser o local onde apenas importa a maior eficiência. Neste contexto, cabe uma melhor com-

preensão do papel que pode ser exercido pelas Ri-des (Região Integrada de Desenvolvimento Urba-no) e pelos APLs (Arranjos Produtivos Locais): a) na articulação propositiva entre os setores estatal, público não-estatal e privado; b) pela possibilida-de de articulação em rede de diversos municípios de uma mesma região ou até mesmo de regiões diferentes, formando uma diferente proposta de gestão republicana de formato inverso ao centra-lismo executivo, a de ações comuns de diversos municípios coordenadas por eles próprios.

Ulysses Guimarães, o combativo resisten-te contra a ditadura, o líder municipalista e o Senhor-Diretas, dizia que nenhum cidadão ou cidadã brasileira mora na Esplanada dos Minis-

É no município onde a cidadania se dá ou não de forma plena e onde também podem

ser construídas as novas alternativas e o perfil da sociedade democrática e justa

com que tanto sonhamos

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térios, sede do poder em Brasília. Todos moram num município. Daí se chega a uma conclusão simples, mas de signifi cado pro-fundo. É que todas as riquezas pro-duzidas no país, sejam mercado-rias, serviços, atividades culturais, ocorrem nos limites já defi nidos de um município, de um dos 5.564 municípios brasileiros.

Claro que não será a iniciativa de um prefeito e alguns vereadores, em um ou dois mandatos, que po-derá – num passe de mágica – mo-difi car deformações que, de tão an-tigas, já se sedimentaram em nossa vida política. Isso, no entanto, nos ajudará a entender a importância do Poder Lo-cal na reconstrução da República. Para muitas de

nossas gerações, o poder vinha dos “coronéis”, de seus jagunços e cangaceiros, expressão de uma

civilização predatória e parasitá-ria, impeditiva de fazer a cidade, o estado, a nação seguirem adian-te. Isso criou para muitos de nós a fi gura do político protetor e salva-dor, uma espécie de super-homem que faz tudo por nós, tomando as iniciativas que ele próprio acha me-lhor, sem sequer nos ouvir.

O Poder Local, sua im-plantação defi nitiva, vai fazer com que possamos dizer – na li-nha do Doutor Ulysses – que, como todos moram numa lo-

calidade, o desafi o da democracia começa aí. E esta é uma baita diferença.

Deve-se relembrar que é no município onde há as melhores condições para se implantar o empreendedorismo, criar cooperativas

e o chamado Banco Popular

17Poder Local O Desafio da Democracia•

Vivemos um momento de profundas mudanças. A aplicação das novas des-cobertas da ciência deslanchou mais

uma revolução tecnológica, cujas conseqüên-cias para os povos e nações já são visíveis e cujos desdobramentos são difíceis de vislumbrar. O campo da política muda de qualidade, se-gundo tendências que apenas começamos a perceber. Os grandes sistemas de valores, idéias e propostas que guia-ram a ação coletiva dos ho-mens nos séculos XIX e XX, mostram, cada vez mais, suas limitações face aos novos tempos.

A dificuldade de com-preensão da realidade atinge a todas as correntes de pensa-mento e ação política, particu-larmente a esquerda, em razão da exaustão de suas grandes vertentes: o comunismo e a so-cialdemocracia. Nesse quadro de incertezas, mas também de possibilidades políticas novas, o PPS afirma os princípios e valores que orientam seu diagnóstico do mundo contemporâneo e dão o rumo das mudanças que propõe.

Enfatiza que a eqüidade, ponderada pelo reconhecimento da diversidade, que gera a exis-tência de diferentes oportunidades para diferentes necessidades, é um valor central. Contudo, não está disposto a sacrificar em nome da eqüidade a liberdade e a ética, também valores constitutivos

basilares da verdadeira cidadania que proclama. Reconhece, no entanto, que esses outros valores, para se afirmar, necessitam da eqüidade, direito de igual acesso aos bens, serviços e à própria má-quina pública.

Como exemplo de universalização e eqüi-dade temos o SUS (Sistema Único de Saúde), importantíssima con-quista dos brasileiros, liderada, dentre outros, pelo cientista Sér-gio Arouca, sistema público que atende toda e qualquer pessoa, seja brasileira ou estrangeira. Te-mos como exemplo de eqüidade mediada pela diversidade, o aces-so ao concurso público: é direito de todos os brasileiros maiores de idade etc., sendo a participa-ção nele, por lei, ponderada em favor de pessoas com deficiência.

A ética deve regular a ação entre os cidadãos (homens e mu-lheres), entre eles e a natureza e

também entre eles e o Estado e as mais diversas instituições da sociedade. Ética pressupõe o res-peito às liberdades e aos direitos humanos ple-nos; o respeito à criança, ao idoso, aos portadores de necessidades especiais e às questões de gênero, etnia, opção sexual; a defesa do meio ambiente e dos recursos naturais; a defesa da vida; o enten-dimento de que recursos públicos, em seus vários aspectos, não podem ser apropriados privativa-mente nem desperdiçados; o compromisso com a eqüidade.

5. Em torno de princípios e valores

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Liberdade e eqüidade, e respeito à diversi-dade, são conceitos em permanente construção e fazem parte da trajetória da mobilização e da luta dos povos. Embora se projetando cada vez com mais força para o futuro, esses con-ceitos devem ser materializados e juntos têm um nome: democracia.

O PPS afirma ainda o va-lor da solidariedade, derivada de uma profunda identidade da espécie humana, que transcende toda e qualquer diferença de ca-ráter étnico e cultural. Ela deve continuar sendo a principal base do sentimento de brasilidade – e permear as relações que o Brasil venha a estabelecer com outras nações. Afinal, queremos um mundo cada vez mais íntegro, harmonioso, em paz e, por isso, nos guia a utopia de um dia podermos declarar

o fim do estatuto de estrangeiro, que hoje serve mais para acentuar ódios, e menos para estabe-lecer a diversidade de culturas e a pluralidade dos povos.

Estende o PPS a exigência de solidariedade às gerações futuras. Por isso, para nós é fundamental o compromisso em torno da de-fesa do meio ambiente e da busca do desenvolvimento sustentável. A elevação do nível de vida dos povos, espiritual e materialmen-te, não pode estar baseada em um tipo de consumismo supostamente moderno, que não leva em conta terem fim os recursos naturais. Por princípio, a natureza é de todos e

ela, trabalhada com prudência e inventividade, deve prover os povos igualmente e a todos os cidadãos sem distinção.

Liberdade e eqüidade, e respeito à diversidade,

são conceitos em permanente

construção e fazem parte da trajetória da mobilização e da luta

dos povos

19Poder Local O Desafio da Democracia•

Nessa procura de caminhos é que o PPS se apresenta como um espaço privilegiado da mudança contra o conservadorismo.

De uma alternativa ampla contra as alternativas estreitas do neolibera-lismo e do estatal-cor-porativismo. Da pro-posta moderna de uma integração competitiva e soberana do Brasil ao mercado global em lugar da integração subalterna e contra a visão atrasada de um isolacionismo autár-quico. Dos controles da sociedade civil sobre o Estado contra o estatis-mo ineficaz ou a ação anti-social dos oligopó-lios e do latifúndio. Em síntese, do progresso contra o atraso.

Trata-se da pos-sibilidade de ultrapas-sar os velhos modelos e concretizar uma agenda democrática e humanis-ta, politicamente progressista, socialmente justa e ambientalmente sustentável. E, frente à nova realidade que o Brasil vive e aos desafios atuais, construir-se um instrumento de luta, capaz de colaborar no encaminhamento da solução dos principais problemas do país.

Um Partido que, ao longo de sua história, sempre se afirmou pela defesa de amplas reformas no país, movido pela consciência de que o Estado, construído fundamentalmente a partir dos interes-

ses das elites dominan-tes, além de consolidar privilégios, não atende às demandas por uma sociedade bem informa-da, democrática, plural e aberta à cidadania.

A busca de auto-nomia e auto-suficiên-cia das comunidades e coletividades brasileiras não se constitui em um afastamento e separa-ção entre o Estado e a sociedade, que devem estabelecer novas rela-ções de parceria. Nem aparelhismo nem con-trole ou cooptação nem fenômenos de corpo-rativismo, de defesa de privilégios e posições,

de ineficiência e descasos, podem mais ser aceitos, mas, ao contrário, devem ser combatidos e elimi-nados. Defende-se esta nova parceria por ser um passo importante para melhorar o desempenho do próprio Estado.

Haverá combate sem tréguas ao exercício do poder estatal para benefício privado, tanto de par-

6. Construindo a esperança via radicalidade democrática

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ticulares quanto de corporações ou partidos, cujas conseqüências graves são, de um lado, o crescimen-to das desigualdades sociais, locais, regionais e entre estados e, de outro, o sufocamento e a distorção da ação política que, ao invés de ser dirigida para a so-ciedade em geral, torna-se cada vez mais atividade voltada essencialmente para objetivos e interesses minoritários. Precisamos, sem mais delongas, criar condições reais para a eliminação de valores e práti-cas que deformam a vida política brasileira.

Na nova realidade do país, o PPS reafirma a necessidade de se estabelecer uma nova agen-da, cuja definição e aprimoramento resultem de acordo entre diversas forças políticas e sociais, e apresenta, para esse programa comum, as seguin-tes diretrizes.

Em primeiro lugar, ampliação e aprofunda-mento da democracia. Isso envolve, certamente, o aperfeiçoamento dos mecanismos de representação polí-tica, onde há muito por fazer. Nesse terreno, precisamos discutir uma reforma política, que privilegie a liberdade, não a regulação. Preci-samos debater, dentre outros itens, a relação entre os eleitos e os elei-tores, os compromissos políticos e éticos, o financiamento público de campanhas, e muita coisa mais.

É necessário avançar no marco constitucional que rege o funcionamento dos partidos e organizações, ampliando o espa-ço das liberdades, dos direitos e deveres destas instituições, criando condições favoráveis para a plena expressão das potencialidades políticas, econômicas, sociais e culturais. Cada povo, no seu processo histórico, faz nascer e desaparecer partidos. Há países com poucos (como a Grã Bretanha), há outros que têm dezenas (como a Itália). Critica-se a existência de muitas legendas no Brasil, pois as pequenas funcionariam como siglas de aluguel. A realidade, porém, revela que são, sobretudo, as chamadas grandes legendas que mais funcionam como de aluguel. Em tese, cada partido representa parte da sociedade, e se existem muitos partidos significa que há interes-ses diversos a se fazerem representar. Evidente-mente, há legendas criadas para atender a mania de grandeza de certas pessoas, desejosas de apa-

recer a qualquer preço. Porém, deve-se deixar a sociedade livre para criar e eliminar democrati-camente partidos e candidatos que não dizem a que vêm, ao contrário de estabelecer regras dita-toriais para dificultar ou excluir o surgimento de novas agremiações partidárias.

Impõe-se também discutir o regime presi-dencialista, cuja vigência vem revelando contradi-ções com certos princípios democráticos em que se funda a República. O presidente do Brasil não so-mente se constitui na autoridade por cima de todos, mas influi no conjunto das políticas a ser aplicadas em níveis federal, estadual, municipal e favorece em tudo as ações dos que constituem sua base de sus-tentação. A concentração de poder imperial sobre uma única pessoa leva a uma situação de permanen-te instabilidade, a um potencial de crises e ameaças

de ruptura da ordem constitucional, bastante negativas para a consolida-ção do processo democrático.

Por isso é que o PPS, apesar do plebiscito relativamente recen-te (início de 1993) confirmar este sistema de governo, vai colocar oportunamente em discussão, de forma democrática, ampla e trans-parente, e com tempo necessário de reflexão por parte dos cidadãos, a transformação de nossa República presidencialista em uma Repúbli-ca parlamentarista. Desnecessário

explicitar as evidentes vantagens do parlamenta-rismo, como maior estabilidade política, fim do duelo Legislativo versus Executivo, o real fortale-cimento dos partidos políticos, para ficar apenas nos mais importantes.

Tomando por base a necessidade de ampliar e aprofundar a democracia, sustentamos que a de-mocracia representativa já não é suficiente para dar vazão a novas demandas por mais liberdade e repre-sentação. O incremento da democracia ultrapassa em muito o problema da representação. É preciso discu-tir a composição entre mecanismos de representação e a manifestação direta da vontade do eleitor. Nesse sentido, o PPS ratifica a sua concepção de radicalida-de democrática, na verdade o abrir-se da democracia representativa à convivência com práticas de demo-cracia direta. O Estado deve ser um incentivador des-ta ampliação libertária e nunca o seu obstáculo.

Precisamos debater, dentre outros itens, a relação entre os

eleitos e os eleitores, os compromissos políticos e éticos, o financiamento público de campanhas,

e muita coisa mais

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Por sua vez, intensifi cam-se o associativis-mo e o nascimento de um mundo de interesses que dispensam, ainda que parcialmente, a me-diação do Estado; há um extraordinário desen-volvimento da auto-organização, luta por direi-tos etc. por parte de indivíduos, grupos sociais, sindicatos, ONGs, enfi m instituições da sociedade. Destaquem-se, nesse sentido, os movimentos de mulheres, os de afi rmação das identidades étni-cas, dos negros, dos índios, os de opção sexual, e particularmente os grupos ambientalistas.

É preciso analisar a garan-tia dos direitos individuais, para o que é indispensável o bom funcionamento do Judiciário, cuja crise tem como um dos centros a impunidade, fruto de uma Justiça restrita quanto à cidadania e presa à mera formalidade das leis, daí descambando com freqüência para decisões

no mínimo contestáveis. O primado de qualquer iniciativa para a reforma do Judiciário é o aces-so amplo, rápido e barato à Justiça e a ampliação da legalidade democrática, ao contrário da atual tendência de centralização e das concessões ao

corporativismo dos juízes, advoga-dos e donos de cartórios, que não admitem o controle social e demo-crático do Poder Judiciário.

É preciso discutir a transpa-rência das informações e o controle sobre os atos do governo, o que im-plica falar em divulgação de dados pelos meios mais modernos, em im-prensa livre e Ministério Público atu-ante. É preciso, fi nalmente, debater o

novo desenho da Federação, de maneira a transfe-rir poder para a instância local, na qual vivem os cidadãos de carne e osso, em condições de ampliar sua participação.

É preciso discutir a composição entre

mecanismos de representação e a

manifestação direta da vontade do eleitor

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A ninguém é estranha a evidência de que a sociedade, tal como está organizada, precisa ser transformada radicalmente.

Mesmo com os avanços obtidos, o capitalismo permanece criando fossos imensos entre pessoas, regiões e países. Há muitas desigualdades e in-justiças que ferem a consciência de cidadãos em todo o mundo. Como conseqüência natural dessa inaceitável realidade, a utopia e o sonho por eqüi-dade continuam a embalar partidos, movimentos sociais e o pensamento de milhões de pessoas.

Nós, do PPS, continuamos com o nosso or-gulho de dizer: somos socialistas e, reconhecendo que outros modelos podem concorrer para o de-senvolvimento dos povos, acreditamos e apostamos nas possibilidades democráticas de um sistema de governo baseado em tais princípios e na natural al-ternância do poder. O socialismo implica a diversi-dade de caminhos, mas nenhum deles pode pres-cindir da democracia e da sua ampliação por meio de instituições de autogoverno da sociedade, conva-lidando a idéia da esfera pública não-estatal.

Mesmo assim, enormes desafios, como a exclusão social, a degradação ambiental, a difi-culdade de acesso à cultura para milhões de pes-soas e a crise geral de civilização que permeia todas essas questões, terão que ser enfrentados e resolvidos. Novas formas de ação política preci-sam ser inventadas, principalmente nas duas di-mensões que ganham relevância hoje: o local e o global. Na ordem do dia, por exemplo, já está na agenda mundial a proposta de criação de um espaço político planetário para a afirmação dos valores humanos e democráticos, abrindo novas perspectivas para a história da civilização.

Nesse contexto é que o PPS se apresenta como um Partido que objetiva construir, com a po-pulação brasileira, um modelo de convivência hu-mana fundado numa economia eficiente, ambien-talmente equilibrada e auto-sustentável, dirigida por um arcabouço de instituições democráticas, um aparelho de Estado racionalizado e submetido ao controle social em clima da mais ampla liberdade e pluralismo.

Luta também o PPS para que haja a partici-pação e acesso de todos à renda e ao usufruto das riquezas produzidas. Considera assim necessária a construção de uma nova relação Estado-merca-do-sociedade, tendo como meta principal a inte-gração de milhões à vida produtiva, a melhoria das condições de vida do povo, particularmente o mais carente, e a preservação e ampliação dos padrões e espaços de vida já atingidos.

Nosso horizonte é a construção, no Brasil, de uma sociedade profundamente democrática

7. Orientado para o socialismo

23Poder Local O Desafio da Democracia•

orientada para o socialismo, onde o espaço pú-blico se afi rme sobre todas as demais instâncias derivadas do Estado, do mercado, de grupos econômicos ou mesmo de organizações sociais formais. Estado, mercado e sociedade, mes-mo tendo relações de contradição entre si, não são adversários em seus papéis institucionais e histó-ricos, devendo-se construir entre eles uma interação, o que ocorrerá quando Estado e mercado passa-rem a ser controlados e orienta-

dos pela sociedade, considerando-se o interesse público social. Essas instâncias devem se voltar

para a promoção do bem-estar da população e orientar-se pela maior busca da liberdade, que tem em sua base mínima o cidadão. Daí o PPS realçar a importância política de se promover um deslocamento cada vez maior do Poder Central em direção ao Poder Local, no rumo de um amplo e profundo processo histórico de descentralização.

Nosso horizonte é a construção, no Brasil,

de uma sociedade profundamente

democrática orientada para o socialismo

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Desde sua formação, o PPS apresenta-se plural, aberto à participação de todos os que acreditam ser possível aos seres

humanos viverem livres e iguais. E deseja contri-buir para a construção de uma nova ética, em que o ser humano, sem nenhuma discriminação, seja protagonista e beneficiário das transformações sociais.

Inspira-se na herança humanista, libertá-ria e solidária dos movimentos sociais e das lutas dos trabalhadores no Brasil e em todo o mundo, prolongando hoje a luta que trava desde 1922. Um Partido que não usa o povo, mas se apresenta como um instrumento para que cada cidadão seja sujeito de sua própria história. Tudo faz para que cada ser humano exerça sua plena cidadania, nas áreas em que reside, trabalha, estuda e atua, e luta pela incorporação do direito à cultura, como par-te das garantias individuais e coletivas, assumin-do o caráter pluriétnico e pluricultural do país.

Considera princípios invioláveis as liber-dades estabelecidas na Constituição. Defende a livre circulação de idéias e de pessoas, a elevação em extensão e qualidade da educação pública, a liberdade de crença e a separação entre Igreja e Estado. Nesse sentido, é um exemplo dentre os partidos brasileiros, por ter em suas fileiras, den-tre centenas de lideranças expressivas, padres, fra-des e leigos católicos, pastores de diferentes seitas protestantes, pais e mães de santos e seus discí-pulos e seguidores, kardecistas, taoistas, além de militantes das mais diferentes religiões e convic-ções filosóficas, assim como ateus e agnósticos,

que mantêm entre si um relacionamento fraterno e exemplar, já que livre e sem preconceito.

Sua política de organização expressa sua concepção democrática e pluralista, seja no fun-cionamento de suas estruturas internas seja no seu relacionamento com as demais forças socio-políticas, superando a cultura de desqualificação dos adversários e até dos aliados. Da mesma for-ma, o fortalecimento de sua organização implica que se cultive e se aperfeiçoe a cultura da direção coletiva, em todas as instâncias partidárias, im-pedindo assim o exercício do espontaneísmo, do mandonismo, do patrimonialismo, do paterna-lismo, do individualismo e do grupismo – defor-mações estas que causam mal a todo e qualquer partido. Reclama, pois, a afirmação do processo democrático de decisões, assegurando o debate permanente das questões, a livre expressão das diversidades, o convívio com a diferença, a trans-parência e a agilidade no fluxo de informações.

8. Um partido moderno aberto à ampla participação

25Poder Local O Desafio da Democracia•

O PPS, na sua atividade junto aos movi-mentos sociais, concentra-se no sentido de, res-peitados em sua autonomia, levá-los a articula-rem dinamicamente seus interesses específi cos e imediatos com a polí-tica democrática geral, rompendo assim o corporativismo e direcio-nando sua ação a soluções globais para a sociedade brasileira. Exige também que se mantenha a cultura de combate a toda manifestação de partidarização e instrumentaliza-ção dessas organizações de base.

O PPS compreende que o papel do partido político é ainda fundamental, mas incompleto se

não for acompanhado pelas organizações sociais e civis, em um marco de respeito, tolerância e co-laboração mútua entre si. Partidos e movimentos

organizados têm na sociedade o terreno privilegiado da ação políti-ca, o lugar onde se formam conhe-cimentos, consciências, represen-tações, assim como as diretrizes, as vontades e os meios político-ad-ministrativos para a condução do município, do estado e do país. Mas onde também se podem formar e se concretizar condições de trabalho, de produção de riquezas, de bens e

serviços de uso e benefício social que não depen-dam do Estado em qualquer dos seus níveis.

Partidos e movimentos organizados têm na sociedade o terreno privilegiado da ação

política

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Comprometido com os interesses da maio-ria da população e com a recriação de práticas políticas modernas (sem conces-

sões ao autoritarismo, fisiologismo, paternalis-mo, corporativismo, cartorialismo, à demagogia e à corrupção), o PPS foi o primeiro a propor a constituição de um bloco de centro-esquerda, es-truturado e sustentado por um projeto político e social comum.

Defende que esse arco de forças precisa manter a maior amplitude possível, reunindo em torno de si interesses de classes, diversos e heterogêneos. Deve também reconhecer e po-tencializar as singularidades e identidades de cada força política; e tentar anular desconfian-ças mútuas e pretensões hegemonistas de seus integrantes. Uma aliança que signifique a con-fluência de raízes, tradições, histórias, culturas, sensibilidades e valores diversos, que realize um governo de ampla coalizão democrática decidi-do a mudar o Brasil.

Para o PPS, as linhas centrais de um pro-grama comum localizam-se (1) na defesa e am-pliação da democracia, com a incorporação cres-cente da sociedade nos destinos do país, (2) na reforma democrática do Estado, (3) numa revo-lução educacional, (4) numa nova política eco-nômica que não só mantenha a estabilidade da moeda, mas adote uma nova postura em relação à dívida pública interna, mudando e alongando o seu perfil, de forma negociada e sem ruptura de contratos, na perspectiva do estabelecimen-

to de metas de desenvolvimento e taxas de juros que não estrangulem o crescimento da economia, (5) numa política externa independente e (6) na inserção competitiva da economia brasileira ao mercado mundial.

Esses eixos programáticos interessam a amplos setores e classes sociais, pois incorpo-ram suas reivindicações políticas, econômicas e sociais, assim como as de todos os excluídos do país. Eles combinam organicamente a grandeza dos objetivos com o realismo das possibilidades, depositando sua confiança na ação de mulheres e homens, de jovens e idosos, de amplas forças da democracia e do progresso, para a construção de um Brasil inserido na contemporaneidade, num mundo que se deseja mais pacífico e fraterno.

Por isso, o PPS não se furtará, em hipótese alguma, a confrontos, discussões e engajamentos com qualquer força política que, de forma res-ponsável e com sensibilidade social, queira con-tribuir para o progresso do país, a melhoria das condições de vida material dos cidadãos brasilei-ros e dos valores de solidariedade, democracia e justiça social.

Dentro dessa sua visão estratégica de radicais mudanças, propõe superar o divórcio crescente entre a sociedade e suas instituições, eliminar sua atuação discriminatória em favor dos interesses limitados, especialmente os dos grandes grupos econômicos nacionais e internacionais e grupos políticos e parti-dários dominantes.

9. Objetivos claros em torno de um projeto político e social

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Acreditamos que do ponto de vista das suas experiências políticas, o Brasil vive o fim de um ciclo – um rico período his-

tórico iniciado em 1985 com a vitória de Tan-credo Neves-José Sarney, expressão fiel da ampla coalizão que se gestara nos anos de resistência e não se esgotaria na transição à democracia. De fato, a reunião da maior parte das forças políti-cas engajadas na resistência com a dissidência liberal do regime, na verdade, sustentaria tanto o governo da Nova República quanto os governos posteriores.

Começam a chegar ao fim, mesmo que possam se prolongar um pouco mais no tempo, projetos diversos nascidos da luta contra o regi-me militar (1964-1985) e de paradigmas mun-diais agendados a partir dos anos 1990, como o chamado modelo neoliberal, que acreditou no enxugamento do Estado e que teve nas privati-zações o seu ápice, assim como a tardia opção de conteúdo socialdemocrata tupiniquim, que re-solveu se transformar em síndico de uma verda-de única financista, com retórica avançada – os governos FHC e Lula se enquadram, de alguma forma, nesta classificação.

No governo José Sarney, prevaleceu a tese da redemocratização, o seu marco mais expressi-vo e iluminado. No contexto da política econô-mica pouco deixou, uma vez que as experiências da heterodoxia econômica se esvaziaram ante um momento institucional de baixo nível estru-turante. Radicalizando em direção ao mercado, com todo o seu discurso contra o Estado, Fer-nando Collor também fracassou.

Desse período, talvez o mais criativo e que tenha assentado algumas pedras para um novo país foi o governo FHC, particularmente quando deu passos importantes na moderniza-ção do Estado, incluindo na agenda as chama-das esferas de regulação. Equivocou-se quando alienou um extenso patrimônio público e não deixou em seu lugar nenhuma estrutura produ-tiva rejuvenescida.

Buscando conciliar o projeto socialdemo-crata tardio com os rescaldos de um mercado mundial do qual pretensamente não se podia escapar, acabou por não conseguir jogar, defi-nitivamente, o país no rumo do desenvolvimen-to. Em seu governo, como sempre, ganharam os banqueiros, perderam o Estado e os setores produtivos, e o país experimentou um índice de desnacionalização de suas empresas sem prece-dentes na história.

Lula veio com o discurso e não trouxe modelo, mas apenas a Carta aos Brasileiros, um amontoado de hipóteses a realizar. Acreditava conceber um novo projeto de país governando, mas a quimera logo se transformou em fumaça. Converte-se, cada vez mais, em herdeiro sem

10. O fim de um ciclo

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criatividade do governo anterior, jogando no lixo, ou quase isso, um enorme estoque de espe-ranças, ao não implantar nenhum projeto estruturante capaz de dar novos rumos ao país.

Poderíamos afi rmar que o governo Lula – que tinha tudo para dar a partida a um novo e promissor momento histórico – encerra o ciclo pós-superação do regime militar, quando fervilhava nos corações e mentes todo tipo de alternativa, todas elas com al-guma legitimidade histórica. Uma constatação, porém: todas naufra-garam, se estamos falando de um projeto duradouro e sustentado de desenvolvi-mento social, político e econômico.

Acontece que o Brasil por ter ganho no-vos e importantes atores sociais, nesse processo

de democratização, e o seu povo ter ampliado o seu nível de consciên-cia e de combatividade, exige que se desencadeie um processo ini-ciador de uma nova era, portadora de novas idéias, da materialização de paradigmas alternativos, en-fi m, de um projeto que encaminhe propostas de superação de suas imensas desigualdades sociais e re-gionais, sempre na perspectiva da ampliação contínua das liberdades, e garanta ampla integração do país ao mundo. Nós, do PPS, queremos construir este caminho a partir da

esquerda, uma referência que ainda muito pode dar aos brasileiros.

Um projeto que encaminhe propostas de superação de suas

imensas desigualdades sociais e regionais,

sempre na perspectiva da ampliação contínua

das liberdades

29Poder Local O Desafio da Democracia•

11. A nova realidade global

O século XXI cria condições favoráveis para se pensar o futuro da humanidade com perspectiva otimista. Nos últimos

vinte anos, a globalização transformou profunda-mente o planeta, em um processo de crescente e rápida aproximação econômica, cultural e polí-tica entre povos, nações e sociedades diferentes, acelerando as mudanças e a geração de novos paradigmas. De forma que é impossível pensar a situação de qualquer país hoje fora da configu-ração atual do mundo. Vivemos uma revolução científica e tecnológica, que ultrapassa as frontei-ras do tempo e do espaço, de forma que a questão nacional – de forma crescente – se relativiza e ga-nha novos contornos.

O PPS encara a globalização como um de-safio cheio de perspectivas, mas também como algo complexo e delicado que se não for bem encaminhado pode ser nocivo ao país e à nossa gente e ampliar o fosso entre países e povos. Por isso, se empenha na superação de quaisquer ti-pos de desequilíbrios e preconceitos, sejam eles continentais (Norte e Sul), de classe, étnicos, de gênero e cultural e luta por uma globaliza-ção que se traduza em solidariedade e vantagens mútuas para os povos e nações do planeta.

O PPS prega uma inserção soberana e com-petitiva do Brasil neste processo de globalização. O país não pode furtar-se às possibilidades que a globalização abre em termos de comércio, inter-câmbio cultural, investimentos etc. Mas, ao mes-mo tempo, deve tudo fazer para evitar os efeitos perversos desse processo.

Dando continuidade à sua tradição inter-nacionalista, o PPS se integra ao esforço mundial de construção e aplicação de novos paradigmas democráticos. Solidariza-se com todos os movi-mentos a favor da paz e da fraternidade entre os homens e os povos, além de compartilhar e lutar pela busca de um mundo cada vez mais íntegro, marcado pela relação harmoniosa entre as nações e pelo livre fluxo de homens e idéias. Para tanto, dentre seus objetivos, se encontram o estabeleci-mento de mecanismos políticos de representação mais amplos e avançados, a eliminação das distor-ções nos intercâmbios econômicos entre países, a regulação do capital financeiro internacional, a erradicação da indústria da droga e do crime or-ganizado, a preservação ambiental, o intercâmbio científico, cultural e social entre todos os povos.

Reconhece que, concebidos e tornados rea-lidades concretas no século passado, os grandes blocos econômicos já determinam, com força, as relações internacionais. Tendo o modelo europeu como o paradigma principal deste movimento – o projeto da União Européia vem sendo implantado com rigor e realismo há meio século –, os blocos estão delineados em todos os continentes e sua tendência é de consolidação nos próximos anos. Eles constituem uma das estratégias de maximizar a autonomia no processo de integração. Dentro deste cenário, o Brasil joga papel importante.

Nesse sentido, trabalhar pela consolidação e fortalecimento do Mercosul é um caminho a ser perseguido com pertinácia, como prioridade em nossas relações internacionais. O avanço do pro-

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cesso de integração econômica, política e cultu-ral no subcontinente americano deve prosseguir, ampliar as relações com outros países do conti-nente, desenvolver a integração do Mercosul com a União Européia e com países do porte da China, Índia, Rússia, visando a se negociar em condições menos vulneráveis.

Deve-se considerar também que os ele-mentos da cultura nacional precisam se fortale-cer. Não há porque se temer o novo que surge. Porém, é preciso preparar-se para que o novo seja direcionado para tornar as sociedades mais humanas e fraternas. A afirmação das especifi-cidades culturais deve contribuir para celebrar a diversidade, não para fortalecer preconceitos de nação, de etnia e de qualquer outro tipo.

O PPS também luta para que todo o poder de manipulação das grandes corporações financei-ras, dos monopólios e oligopólios, apoiados pelos governos dos países centrais, hoje aparentemente incontrolável, possa ser regulado e minimizado no contexto de novas relações internacionais que demandam uma ONU mais representativa e efi-ciente e o redimensionamento dos organismos multilaterais. Defende uma ampla reformulação do papel da ONU, combinada com a reestrutura-ção do seu Conselho de Segurança Permanente, que deve contar com participação de outros paí-ses – inclusive do Brasil – em igualdade de con-dições com seus atuais membros, atendendo ao clamor por uma nova ordem internacional.

No mundo de hoje, continua-se a viver uma crise de civilização, que se aprofunda, fun-damentada sobretudo no paradoxo de que a hu-manidade, embora dispondo de conhecimento e instrumentos tecnológicos, políticos e financeiros para resolver os grandes dramas que ela própria gerou ao longo de sua caminhada, ainda alimenta o ódio, a intolerância, a fome, a destruição da na-tureza, a apartação social, a cizânia entre nações, a beligerância desnecessária e estúpida.

Daí porque o quadro que vivemos é con-traditório. A democracia, embora persistam ações golpistas e práticas totalitárias, espalhou-se com força por todos os continentes; a sombra do terror da Guerra Fria não existe mais e ampliou-se a interdependência entre os países. Por sua vez, as graves desigualdades sociais não cedem;

o continente africano prossegue numa situação de extrema miséria; os conflitos de fundo étnico e religioso intensificam-se; expande-se, de forma preocupante, o racismo; a fome assola partes do planeta; os desequilíbrios ecológicos ameaçam o futuro.

O mundo que emergiu na virada do mi-lênio é cada vez mais integrado. Esse processo, contudo, é conduzido quase exclusivamente pe-los mercados, por definição cegos e surdos às de-mandas provenientes dos valores e aos efeitos que produzem em outros campos. Ele demanda uma globalização democrática, não excludente, que eleve os padrões de desenvolvimento humano, do direito internacional e da justiça social e controle os fluxos de capitais financeiros. Da mesma forma, este novo mundo tende a não aceitar mais tutela. Governo de nenhum país tem o direito de impor a sua vontade exclusiva na ordem internacional. A nova época não comporta governos com qual-quer pretensão a arvorar-se em legislador, juiz e policial exclusivo dos destinos do planeta.

Preocupam ao PPS as manifestações aber-tas de intolerância e racismo, e nacionalismo mili-tante, como ocorrem, ostensivamente, em alguns países, particularmente na Europa. Deploramos a presença belicista e desagregadora de tropas dos Estados Unidos na Síria e no Afeganistão, assim como as crises que se aprofundam em algumas regiões do mundo, envolvendo o fundamentalis-mo religioso e velhas questões étnicas, sobretu-do em países africanos e asiáticos, e o infindável conflito no Oriente Médio, onde permanece a perigosa escalada de ódio entre palestinos e isra-elenses, os quais têm ambos direito a seu Estado independente e a viver em paz, entre si e com o resto do mundo.

O PPS é favorável ao combate firme ao ter-rorismo, em todas as suas vertentes, o qual não pode ser definido pelo governo de uma única na-ção – deve ser coordenado, sobretudo, pela ONU ou por outros organismos que dela possam deri-var. Temos de entender que o terrorismo nasce sobretudo dos desequilíbrios entre as nações, da intolerância entre as etnias e religiões, de uma es-trutura de crime que se organiza em todo o mun-do, tendo os paraísos fiscais e o sigilo bancário como seus principais abrigos.

31Poder Local O Desafio da Democracia•

Tornou-se claro que, sob condições de glo-balização crescente, a mudança social no sentido de maior liberdade e eqüidade

não mais poderia ter no Poder Central seu úni-co e decisivo protagonista. Esse o motivo de a questão do Poder Local vir ganhando espaço nas teorizações recentes a respeito de uma nova es-querda. Ampliar a democracia, portanto, implica redimensionar a participação do cidadão no coti-diano da política.

Daí porque compartilhar com a socieda-de as tarefas de formulação e implementação de uma estratégia de desenvolvimento social não é apenas uma possibilidade, mas uma exigência na sociedade contemporânea. Uma estratégia para o Brasil, entendida como estratégia de desenvol-vimento social, deve incorporar, com muito des-taque, uma estratégia de indução ao desenvolvi-mento local integrado e sustentável.

A redemocratização do país, como é de to-dos sabido, colocou na ordem do dia a questão do Poder Local. Durante muitos anos e, particu-larmente, na vigência do período ditatorial, a luta contra o arbítrio sufocou o espaço político nos municípios. O quadro agora se inverte: cada vez mais se reclama a consolidação do princípio fede-rativo, cuja principal base repousa em sua menor unidade, o município.

Dessa forma, o PPS não abdica da luta pela conquista democrática dos poderes centrais na União e nos estados, mas também não privilegia a estratégia torta de irradiar novas formas políti-

cas para as unidades federativas menores somen-te a partir do poder central. A consolidação das propostas nos municípios é fundamental para quaisquer projetos que se pretendam regional ou nacional.

Encarar a questão do Poder Local implica posturas muito definidas. Em primeiro lugar, o município tem por objetivo integrar-se de forma parceira e soberana na construção de uma fede-ração democrática, autônoma, não perdulária, equilibrada pelos dispositivos constitucionais. Não se pode, por exemplo, ficar a exigir recursos da União sem limites quando nos municípios não são adotados mecanismos democráticos e racio-nais de gerenciamento das contas públicas e nem esgotadas todas as possibilidades da esperteza, do favoritismo que, quase sempre, tem políticos corruptos e intermediários inescrupulosos como patrocinadores. Otimizar o emprego de poucos recursos buscando com o menor custo o maior

12. Poder Local e cidadania, cidadania e Poder Local

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benefício para a comunidade é um desafio, diante das mazelas existentes.

Os municípios, apesar das muitas respon-sabilidades sobre o desenvolvimento das políticas básicas, devem exercê-las por meio de regime político e administrativo em colaboração com o estado e a União. A dificuldade gerada pela não observância deste princípio constitucional preju-dica a população, impede o acesso a outros re-cursos concentrados na União, dificulta a prática do controle social e desconhece a importância do exercício da cidadania, afastando cada vez mais a população dos benefícios gerados pela garantia dos serviços oferecidos por meio de políticas pú-blicas estruturadoras.

O PPS e seus representantes devem ter sempre em mente a necessidade de se manter, no município, a rigorosa separação dos poderes. Atualmente, assim como no estado e no plano federal, em quase todos os municípios brasileiros, o Legis-lativo não passa de uma extensão do Executivo. As entidades e os movimentos populares, por sua vez, também não podem se deixar cooptar e se transformar em exten-são dos poderes constituídos e/ou dos partidos políticos.

É preciso levar em conta o papel dos governos locais no en-frentamento das raízes estruturais da questão da pobreza e da desi-gualdade social do país. Nesse sentido, há neces-sidade de optar por programas de gestão por meio dos quais se tente mudar não apenas a cultura de subserviência das camadas populares, mas tam-bém a cultura da arrogância e da impunidade das elites governantes. Esta é uma dimensão política da construção de uma postura cidadã, a partir do incentivo à participação dos distintos segmentos sociais e, particularmente das camadas popula-res, na definição dos destinos do município.

O Poder Local, na concepção do PPS, exige o aumento da consciência da cidadania e uma maior participação popular na decisão de seus próprios destinos. Da mesma forma, impõe a ampliação de espaços de poder, combinando o aspecto de democracia representativa com a de-mocracia direta e incorporando as organizações

sociais e os cidadãos no processo decisório, de modo a tornar o município um ator social que se expresse por meio da articulação da administra-ção pública com a sociedade.

O Brasil vem acompanhando, de várias for-mas, o processo de mudanças ocorrido no mundo, sobretudo, instituindo mecanismos legais que pos-sibilitam a implantação de políticas públicas básicas descentralizadas. Isto é fruto das lutas democráticas que se expressam nos pactos firmados por meio da Constituição de 1988 e de suas leis complementa-res, a exemplo da Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Brasileira (LDB), o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a Lei da Organização da Assistência Social (LOAS), as Normativas do SUS, a Lei de Defesa do Consumidor, o Estatuto da Cidade e o Estatuto do Idoso, entre outras.

Este conjunto de instrumentos legais afir-ma a necessidade de se praticar, além da democracia representati-va, a democracia participativa, por meio de mecanismos institucionais como os Conselhos Setoriais de educação, saúde, assistência social, Fundef, alimentação escolar, cul-tura, esportes, agricultura, meio ambiente, emprego, previdência, tutelar e Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente, nas instâncias municipais, estaduais e nacional. Nessa perspectiva, des-tacam-se o planejamento, ao lado

do orçamento e gestão participativos, como ins-trumentos de extrema relevância de definição de políticas, controle e gestão social dos recursos públicos.

São, assim, inúmeros os canais que podem ser usados para o exercício do Poder Local: pre-feitura, câmara de vereadores, associações profis-sionais e civis, clubes de serviço, e esses diversos tipos de conselhos existentes atualmente, destina-dos a acompanhar praticamente todas as áreas de atividade pública. Esses conselhos têm, ou podem ter, um papel fundamental no resultado da ativi-dade pública, tornando-se instrumentos de avan-ço democrático, ao trazer para as comunidades o poder de definir os rumos da ação municipal.

Por isso é que o PPS dinamizará a atua-ção dos conselhos (lutará para criá-los, onde não

O Poder Local, na concepção do PPS, exige o aumento

da consciência da cidadania e uma maior participação popular na

decisão de seus próprios destinos

33Poder Local O Desafio da Democracia•

existirem), dando-lhes a necessária legitimidade e representatividade, evitando-se a manipulação de cada um deles por parte do prefeito, do vice e de seus auxiliares, e também impedindo que as ações isoladas se convertam em práticas corpora-tivas ou segmentadas.

No município, o Partido deve orientar-se pela busca de concretização de um Plano Comu-nitário de Desenvolvimento, que fuja ao lugar comum e à tradição de todos os governantes de todas as instancias: um plano estratégico que vá além do limite de um mandato de quatro anos. O Orçamento Participativo é um dos elementos-chave para se chegar a esse objetivo, desde que se evitem mecanismos de manipulação dos delega-dos eleitos. E, nesse contexto, cabe uma política muito clara para o funcionalismo, de forma a evi-tar o inchaço político das máquinas administrati-vas e garantir a estabilidade de funções. A busca da profissionalização e da meritocracia na admi-nistração pública municipal é imprescindível.

Diante deste cenário, ainda em formação, o PPS deve mobilizar sua militância, a partir de cada cidade e município, ciente de que cada lo-calidade possui sua própria identidade e que só a cooperação, a solidariedade e a integração dos que nela vivem serão capazes de construir um Brasil mais justo e solidário e, sobretudo, conec-tado às transformações recentes da humanidade.

Mais e melhor democracia implica, neces-sariamente, em uma radical reforma do Estado, o que implica desprivatizá-lo, melhor dizendo, torná-lo efetivamente público. Ou seja, sua ação tem que ser eficiente e voltada prioritariamente para o interesse geral e não estar a serviço, como hoje ocorre em sua grande maioria, dos que con-trolam a máquina estatal, em qualquer das suas instâncias, para atender fundamentalmente os interesses das elites. Todo desperdício de recur-so público – que é escasso – representa sangria dos instrumentos de superação da exclusão so-cial e trabalha para sua permanência. Além de eficiente, o Estado deve deslocar o alvo de suas políticas para os cidadãos mais carentes, a fim de integrá-los à sociedade, à economia e ao poder. Benefícios públicos que não podem ser gozados por todos transformam-se em privilégios.

Para serem mais eficientes, as políticas pú-blicas voltadas para as populações mais carentes devem buscar melhoria em sua qualidade e efeti-vidade. Da mesma forma, o Estado deve assumir um papel mais claro com relação a políticas vol-tadas para a desconcentração de renda.

De outro lado, a atenção aos segmentos menos favorecidos não pode se dar ao custo de sacrifícios aos setores de classe média num processo de socialização dos problemas e não das soluções.

Defendemos assim o papel do Estado nas atividades e áreas em que for necessário, mas a sociedade deve ampliar o seu novo tipo de atuação, não restrito apenas a opinar, criticar, pressionar e eleger representantes. Ela precisa continuar se organizando no campo econômico, produzir bens e serviços, especialmente nas ati-vidades de cunho social como saúde, educação, segurança pública, proteção ao meio ambiente, cuidados com a infância, os deficientes físicos e o idoso, executadas em parceria entre o Estado e a coletividade, na forma de complementação de um para o outro, sobretudo enfrentando os problemas do desemprego e da exclusão social. A universalização dessa nova relação constitui-se no verdadeiro diferencial. A recuperação ou recriação do papel constitucional de “contro-le social” do Poder Legislativo, retomando este poder como casa do povo, pode ter um grande peso estratégico neste processo.

A democracia não pode parar onde come-ça a economia. A economia brasileira deve ser progressivamente democratizada. Isso implica a intervenção pública para combater o monopólio e garantir espaço ao pequeno empresário, a de-mocratização da gestão das empresas, e políticas ativas de distribuição da renda e da propriedade, particularmente a fundiária.

Antes de tudo, deve-se ter clareza de que a responsabilidade do cidadão é complementar ao dever do Estado, e que as políticas de indução ao desenvolvimento devem ser a principal referência numa estratégia social e não as políticas assisten-ciais, por mais necessárias que sejam ou possam parecer estas últimas.

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Uma nova política pressupõe a organiza-ção e o fortalecimento da comunidade que, na maioria das vezes, é mal tratada

ou simplesmente negligenciada, manipulada ou excluída pelas lideranças locais (sobretudo pelo prefeito e vereadores) e pelos partidos políticos. A governança planejada pelo PPS tem um caráter local e uma perspectiva solidária, significando a construção de um novo papel para a a cidade e o município, lugares privilegiados no exercício da democracia e da cidadania.

Todos os homens e mulheres são e devem ser iguais em direitos políticos e sociais. Não há cidadania se não há igualdade jurídica (isto é, to-dos iguais perante a lei), seja qual for a origem da pessoa. Se a cidade como conjunto de serviços básicos não chega a todos os seus habitantes, e se não se oferece esperança de trabalho, de progres-so e de participação, também não há cidadania. Portanto, é legítimo o direito dos habitantes e de suas famílias de participar da vida política local.

O governo local deve liderar a gestão cole-tiva da cidade e do município, sem, no entanto, monopolizá-la – isto pressupõe a instauração de novas modalidades do exercício do poder, para além das formas tradicionais da administração e do comportamento das lideranças locais. Em to-dos os âmbitos da vida cidadã, podem ser criadas novas oportunidades de cooperação público-pri-vado e de legítima participação social.

Os municípios brasileiros não precisam somente de um programa de governo, mas de no-vos projetos de futuro que incorporem, de forma

mais estruturante, o olhar e a percepção de no-vos sujeitos cujas demandas são manifestadas na cena local. É o caso, por exemplo, de pessoas iso-ladas ou militantes de associações de moradores, clubes de mães, times ou grupos que praticam esporte, associações profissionais (de patrões ou empregados). Tais programas devem se propor a enfrentar e alterar a realidade social, política, econômica e administrativa, e não podem ser for-mulados com base em generalidades, descoladas da realidade cotidiana da sua comunidade. As ações populares, as iniciativas de lei, os plebisci-tos, as audiências públicas e a criação de espaços públicos para o exercício da crítica, do debate e da atividade dos cidadãos e de suas entidades são elementos imprescindíveis na construção do Po-der Local democrático.

13. O Poder Local democrático

35Poder Local O Desafio da Democracia•

A primeira condição para fortalecer o PPS nos municípios e ajudar a construir o conceito de Poder Local, enquanto base

sólida para o fortalecimento da democracia no país, é atuar decisivamente nas várias instâncias da sociedade civil, de forma permanente e criati-va – associações, clubes, conselhos, ONGs etc. E onde elas não existam, deve-se agir para que elas surjam.

Deve-se ter sempre em mente que o man-dato de um vereador ou prefeito no quadro de uma sociedade civil desorganizada e manipu-lada, em que pese sua importância conjuntural, não tem muito valor para o projeto desejável de construção de uma nova sociedade, se não estiver acompanhado de um projeto político de cidada-nia mais amplo e permanente. Para tanto, os es-paços institucionais do Legislativo e do Executivo são necessários e estratégicos, mas insuficientes.

Para alcançar esses objetivos e promover o renascimento do espaço público o ponto chave será a formulação de um novo contrato de cida-dania, no qual o poder público municipal deve ter um caráter de articulador entre as exigências da comunidade e a oferta pública de serviços, ao invés de se colocar como o único responsável pela oferta de serviços públicos. Ele deve auxiliar os cidadãos a terem acesso aos recursos humanos, materiais e de conhecimento que atenderão às suas necessida-des e estes, por sua vez, têm que reconhecer suas obrigações para com a comunidade.

Trabalhar com o conceito do governo faci-litador não significa a renúncia do poder público

em liderar a sociedade no processo de partici-pação, definição, acompanhamento, execução e avaliação, pelos cidadãos, das indispensáveis po-líticas públicas. Por isso é importante, também, introduzir o conceito de proteção que reconhece a obrigação dos governos em cuidar e proteger os cidadãos.

Este papel é completamente incompatível com a arquitetura tradicional de governo, marca-da pela centralização administrativa e especiali-zação funcional e pelo controle de processo, pois ele passa a interagir com uma ampla variedade de agentes locais – ONGs, associações voluntárias e de representação, entidades sem fins lucrativos, empresas socialmente responsáveis, entre muitas outras. Suas atividades passam a ser pautadas por metas e indicadores e periodicamente avaliadas pelos seus parceiros, que também se investem da condição de cidadãos gestores, num pacto de co-responsabilidade.

14. Governança Social Local e Cidadão-Gestor

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Um dos pilares do Poder Local e de efetivo controle social, além da participação popular, re-side em se ter uma visão a mais ampla e comple-ta dos aspectos vinculados às áreas de finanças, tributação e, principalmente, orçamento. Aqui, além de se buscar o domínio técnico de acordo com os parâmetros legais vigentes e éticos do PPS, deve-se proceder à total transparência das contas públicas, informando-as permanentemen-te à sociedade.

Devem-se incentivar, no caso do orçamen-to, a definição, o controle e a gestão dos investi-mentos, e lançar mão do aumento da arrecadação principalmente por intermédio da racionalidade na cobrança dos impostos legais e no alargamento da base de contri-buintes. Não podemos coonestar com posturas de prefeitos que evi-tam cobrar certos impostos para beneficiar grupos de interesse e nem com incentivos fiscais que di-laceram o erário. Sempre colocar em pauta a progressividade dos im-postos, em especial do IPTU para os imóveis não edificados que, em muitas cidades, representam mais de 50% deles e que só servem para fins de especulação. Recorrer ao Direito de Permissão, constitucio-nal, pelo qual se pode utilizar um imóvel, pagando-se ao seu dono por prazo certo algum tipo de ren-dimento.

O PPS no município deve orientar-se pela busca de concretização do planejamento admi-nistrativo, que possa ultrapassar estrategicamente o limite de um mandato de quatro anos. A gestão democrática e transparente da administração pú-blica e do orçamento é um elemento chave para chegar a este objetivo. E, nesse contexto, cabe uma política muito clara para o funcionalismo, de forma a evitar o inchaço político das máqui-nas administrativas e garantir a estabilidade de funções. A busca da profissionalização, graças à seleção democrática e à ascensão funcional por mérito, é imprescindível na administração públi-ca municipal.

A educação básica e os serviços básicos de saúde são dois campos prioritários de atuação e

devem ser gratuitos para toda a população. Não há cidadania sem acesso à educação e à cultura na cidade, sem formação continuada, sem serviços de saúde acessíveis e sem serviços coletivos de água, saneamento e o tratamento ecológico dos resíduos. Isso porque o exercício desses direitos condiciona a qualidade da habitação, o acesso ao emprego e a dignidade da vida familiar. A vincu-lação da educação com a perspectiva de empre-go é hoje uma realidade, e experiências como os Centros de Artes e Ofícios, já adotadas em alguns municípios, devem ser levadas em consideração.

A questão do saneamento básico deve ser transformada na política urbana prioritária por

excelência, uma vez que unifica va-rias ações de sustentabilidade no contexto do desenvolvimento urba-no. Levando-se em conta que 60% das internações hospitalares no país decorrem de doenças de veiculação hídrica, é elementar perceber que o saneamento básico e ambiental das cidades brasileiras reduzirá de for-ma significativa os gastos com saú-de, melhorará sensivelmente a con-dição ambiental dos aglomerados urbanos, além de criar, no processo de sua execução, um considerável número de empregos em todo o território nacional.

No campo da saúde, além do acompanhamento rigoroso dos

recursos do SUS, deve-se defender e implemen-tar os pressupostos do Movimento pela Refor-ma Sanitária, garantir a integralidade das ações, priorizar o trabalho de prevenção e dos agentes de saúde, eficientes no combate à desnutrição e à mortalidade infantil. Os recursos não podem ser consumidos preferencialmente na construção de hospitais ou estruturas de alto investimento, sob pena de inviabilizar, em médio prazo, um eficien-te projeto de saúde na cidade. Os prefeitos devem buscar soluções regionais, sempre pelo caminho da cooperação.

O medo gera a intolerância, e a inseguran-ça nega o exercício da cidadania. A economia criminal e a pobreza são fatores de insegurança. A marginalidade e a exclusão de uns gera a in-tolerância de outros. Uma cidade segura é a que

Além de se buscar o domínio técnico de acordo com os parâmetros legais

vigentes e éticos do PPS, deve-se proceder à total transparência das contas públicas,

informando-as permanentemente à

sociedade

37Poder Local O Desafio da Democracia•

combate a pobreza e a intolerância, que multipli-ca os projetos solidários e favorece a comunica-ção entre todos os seus habitantes. Nesse sentido, uma gestão democrática deve combater também a desigualdade na representação da sociedade, dando oportunidades iguais no que diz respeito a gênero, raça, etnia, idade etc.

Contra a insegurança, são necessários uma política de integração social e cultural e reconhecer o direito à diferença assim como programas integrais de prevenção. Mas também uma Justiça eficaz e próxima, uma polícia cívi-ca, uma administração honesta e acessível e uma participação possível para todos. A prevenção é a melhor política de segurança, porém sua efici-ência depende não somente da gestão pública, mas também da responsabilidade individual e coletiva de todos os cidadãos.

Para ser protagonista da construção do Poder Local demo-crático, o PPS deve estruturar-se com eficiência. Deve constituir comissões ou secretarias de acom-panhamento das contas públicas municipais e criar assessorias em várias áreas como nas de meio am-biente, direitos da mulher, jovens e de informações técnico-legisla-tivas. Troca de experiências com o partido em outros municípios é recomendável e necessária.

Por fim, o Partido não pode estruturar-se apenas com vistas às eleições. Caso contrário se igualará aos partidos tradicionais que sempre de-pendem de “caciques” e de lideranças cujo maior compromisso é consigo mesmo. O PPS deve fa-zer parte da vida do município, incentivando a criação de organizações nos diversos segmentos sociais e participando das instâncias da socieda-de civil, lutando por sua autonomia e eficácia na proposição e fiscalização da gestão pública. Isso é o que se chama Poder Local.

Em que pese o perfil progressista que defen-demos para a gestão democrática do Poder Local, devemos estar atentos para não reproduzirmos desigualdades já existentes, embora priorizando os setores mais carentes. Essa contradição é ine-rente ao próprio processo de democratização do Estado e da gestão pública, uma vez que são no

geral os mais carentes aqueles que apresentam menor capacidade de organização e mobilização, e que para conquistarem a legitimidade de suas bases sociais para participação na gestão depen-dem da própria capacidade de resposta do gover-no local às suas demandas.

Assim, o desafio maior está em como for-mular e implementar políticas e programas so-ciais que atendam as necessidades desses setores mais carentes da sociedade local sem cair na ma-nipulação, no populismo e no clientelismo, tão próprios da nossa cultura política.

É no pilar da radicalidade democrática que o PPS deve fazer evoluir a condição do cidadão que participa para o imperativo do cidadão-gestor.

O Poder Local que procuramos construir a partir dos municípios deve estar sustentado na cooperação entre o poder público, as entidades sociais, a iniciativa privada, o terceiro se-tor, outras formas de organização e individualidades, no sentido de so-mar recursos humanos e materiais desses setores e fazê-los presentes em orçamentos-programa que não só representem esta parceria, mas que indiquem a responsabilidade de cada um no esforço por saldar a dívida social.

Por outro lado, devemos ter o cuidado de evitar que a consolidação de instâncias de parti-cipação popular para a definição de prioridades públicas não contribua para o desaparecimento ou submissão de instituições intermediárias lo-cais – associações de moradores, clubes, ONGs etc. – já que as primeiras acabam depositárias da legitimidade outorgada pelos executivos munici-pais. Neste sentido, o PPS atua e defende o forta-lecimento de todas as organizações autônomas da comunidade; estimula a constituição de instân-cias transversais e intermunicipais e trabalha na perspectiva de atender e incluir os desorganiza-dos, com o objetivo de que eles possam construir suas estratégias de intervenção local e no conjun-to do município.

O cidadão-gestor que o PPS busca capa-citar em cada município do país deverá estar orientado pelo princípio do pagamento da dívida social. Ou seja, mesmo reconhecendo a impor-

Uma cidade segura é a que combate a pobreza

e a intolerância, que multiplica os projetos solidários e favorece a comunicação entre to-dos os seus habitantes

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tância e os avanços obtidos pela aplicação da Lei de Responsabilidade Fiscal no zelo com os recur-sos públicos, o cidadão-gestor estabelece como contraponto a construção de indicadores sociais mínimos, que sustentarão as prioridades sociais de cada território, de micro e macro-regiões dos municípios em que atua.

Para que esta política seja consolidada torna-se fundamental o acesso à informação, elemento imprescindível para a capacitação do cidadão-gestor e construção do Poder Local. Não haverá cidadãos ativos e responsáveis se não es-tiverem informados e não tiverem possibilidade real de receber e de responder aos questionamentos e anseios das lideranças públicas e privadas da comunidade.

Convém estimular a multipli-cação de todas as formas de comu-nicação, desde as mais tradicionais, como os centros cívico-culturais de bairro, até as mais modernas, como as rádios e televisões locais e a cabo, e a internet. Por esta razão, o PPS defende, também, a transparên-cia do Poder Público, por meio do acesso direto das populações sobre os dados, resultados e avaliação das metas atingidas.

A combinação destes elementos defi ne a natureza de uma Governança Social Local e são a moldura do empoderamento social, em que as populações benefi ciadas participam de cada etapa de implementação e execução de projetos, progra-mas e ações. Enfi m, o empoderamento signifi ca a

emergência de um cidadão-gestor que se diferen-cia do cidadão que participa das instâncias de de-mocracia participativa existentes porque contro-la as diretrizes governamentais, gere e monitora políticas, combina demandas com planejamento e desenvolvimento de médio e longo prazos e pro-move a articulação de vários territórios.

O imperativo do diálogo determina o su-cesso da construção do Poder Local e da Gover-nança Social Local que o PPS defende. Para que esse elo seja gerado, acumulado e reproduzido, é fundamental que:

• os indivíduosdeum terri-tório ou de uma comunidade sejam incorporados e articulados;

•queasinformaçõeseosco-nhecimentos que eles produzam se-jam acessíveis;

•queelestenhamumprojetocomum, se relacionem de uma ma-neira estável, compartilhem valores e crenças.

Tudo leva, portanto, ao forta-lecimento da cooperação a partir da qual eles participam do espaço pú-blico para planejar, executar, acom-panhar e avaliar programas, proje-tos e ações de interesse coletivo.

Ressalte-se que estamos tratando de um novo jeito de governar – uma nova governança – em que o público passa a ser expressão real e concreta da sociedade organizada e não apenas do Estado. Uma Governança Social Local e um cidadão-gestor fazem a diferença.

Não haverá cidadãos ativos e responsáveis

se não estiverem informados e não

tiverem possibilidade real de receber e de responder

aos questionamentos e anseios das lideranças públicas e privadas da

comunidade

39Poder Local O Desafio da Democracia•

O conceito de Poder Local não se deve con-fundir com o de governo local nem de po-der municipal, pois abarca as várias formas

do exercício do poder pelo cidadão. É necessário que as administrações e os parlamentares do PPS em cada município se apóiem em um rigoroso conhecimento dos problemas locais e das relações destes com suas causas locais, regionais, nacionais e globais.

Impõe-se que a ação das administrações e dos parlamentares do PPS no município seja efi-caz, apresentando respostas concretas e efetivas às expectativas do cidadão. Não basta, por exemplo, listar reivindicações. É preciso dividir responsabili-dades, estabelecer metas no tempo, promover mu-danças concretas e prestar contas ao povo.

Assim sendo, não podemos ter uma proposta apenas para o Executivo, nem ter em mente apenas o município, porque crescem hoje, no mundo e no Brasil, várias formas de desenvolvimento regional, de inter-relacionamento entre vários municípios, de que é exemplo o que tem como referência a água, com o conceito de Bacia Hidrográfica como espaço privile-giado para o planejamento integrado do desenvolvi-mento. Nesse espaço, articulam-se usuários da água, a sociedade civil e o poder público, particularmente os municípios consorciados, na ocupação e na gestão do espaço, com acento na criação e desenvolvimento dos Comitês de Bacias Hidrográficas.

O PPS e seus membros, sejam eles diri-gentes, militantes, candidatos a cargos eletivos, dirigentes sindicais ou associativos, vereadores ou prefeitos, não podem conceber o Poder Local

desconhecendo a realidade ao seu redor ou diplo-mas legais, sejam constitucionais, regimentais ou infraconstitucionais. A informação é elemento decisivo para se operar a política no quadro da modernidade e para diferenciar este projeto de-mocrático de outros existentes.

Desta forma, em cada município, o PPS deve realizar seminários sobre o Poder Local, com uma pauta que conste discussão sobre aspectos da realidade do município e regional, questões constitucionais e políticas públicas democráti-cas. Vereadores do PPS devem ter como objetivo alicerçar-se em documentos legais (Constituição, leis estaduais, leis municipais e regimento) para que possam exercer competentemente o manda-to, seja legislando ou fiscalizando os gastos do Executivo. A mediocridade de um mandato co-meça na falta de informação acerca dos aspectos legais e da realidade local.

15. Diretrizes práticas para melhorar a qualidade de vida

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O PPS reconhece que universalizar as po-líticas sociais e dinamizar sua economia não são tarefas de um partido, de uma administração pú-blica ou de uma classe social, mas de toda a co-munidade. A partir do princípio de que os indi-víduos são os melhores juízes de seus interesses e necessidades, a prestação de serviços públicos no município será tão mais eficiente quanto maior for a autonomia do Poder Local. Os usuários sabem melhor do que qualquer burocrata de quantas e de que escolas precisam. Os usuários decidem melhor sobre quanto deve ser gasto em sua construção e manutenção, já que têm todo o interesse em fisca-lizar o bom emprego de seus impostos, fazendo isso com eficiência maior que a de qualquer fiscal externo.

Imprescindível se faz que o prefeito, o vice, e os vereadores do PPS adotem práticas partici-pativas que superem a atitude me-ramente reivindicatória, indo além da apresentação de demandas du-rante a formulação do orçamento municipal. Não basta abrir espaços para que o cidadão reivindique um posto de saúde no seu bairro; tam-bém não basta que ele possa opinar na destinação de recursos para ins-talação de tal posto. É preciso que o munícipe possa acompanhar e fis-calizar o padrão de atendimento e os resultados e, ainda mais, propor mudanças no seu funcionamento.

Necessário ter em vista que o Poder Local de cunho democrático defendido pelo PPS prescinde de qualquer tipo de manipulação e controle das instâncias populares e de organização da sociedade civil. Essas devem ser rigorosamente autônomas e com elas o poder público deve sempre manter diálogos francos e transparentes, e aceitar como naturais e legítimas suas formas de pressão.

Nesta linha de raciocínio tem fundamental importância o papel do PPS, enquanto instância de luta política e de seus militantes e dirigentes envolvidos na gestão pública. O papel dos diver-sos conselhos paritários (gestão pública x socie-dade organizada) como conselhos de saúde, da infância e adolescência, idosos, pessoas com defi-ciência, comunitários, de orçamento participativo e tantos outros quanto existam, não só deve ser

estimulado, mas como também nos cabe suprir a população em geral e a sociedade organizada em particular, com formação e informação para que possam exercer de forma suficiente e eficiente seu papel de reais parceiros na construção de projetos de gestão democráticos e progressistas.

Subentende-se, do mesmo modo, que o Poder Local, na visão do PPS, não é sinônimo de controle de prefeitura ou de maiorias na Câma-ra de Vereadores. Também na esfera das relações entre os poderes é fundamental que se perceba a necessidade do equilíbrio e da ação positiva em favor da gestão de Estado e não em favor da ges-tão de governo.

É importante que Executivo, Legislativo e Judiciário em ação no município, para além das tensões naturais de poderes diferentes, caminhem todos na direção de construir a governança de lon-

go prazo, a meta constitucional, e não apenas a governança dos inte-resses imediatos dos gestores.

Ao tempo em que entende e tudo faz para incorporar o cidadão à gestão pública, o PPS reafirma sua convicção de que o parlamento mu-nicipal é uma instituição fundamen-tal para a afirmação da democracia e a construção de uma Governança Social. Com essa compreensão, de-fende que a Câmara Municipal faça parte da liderança do processo de aperfeiçoamento da participação

popular, com o objetivo de prepará-la para a co-gestão.

É imperioso que o prefeito e os vereadores do PPS adotem, conforme a realidade local, escalas de gestão menores que o município, como as subprefei-turas e as administrações regionais. Nesse sentido, é preciso verificar se os objetivos da participação, da ética, do desenvolvimento e da qualificação dos ser-viços não serão mais facilmente realizados se forem instituídas instâncias intermediárias de gestão. Isto exigirá, em curto prazo, um salto de qualidade das estruturas organizativas públicas e sociais de gestão e participação e, no longo prazo, um alargamento das instâncias de decisão, planejamento, execução, acom-panhamento e avaliação das políticas públicas.

Impõe-se que o prefeito e vereadores do PPS no município participem ativamente de ar-

É preciso que o munícipe possa acompanhar e

fiscalizar o padrão de atendimento e os resultados e, ainda

mais, propor mudanças no seu funcionamento

41Poder Local O Desafio da Democracia•

ticulações regionais, sejam as associações de mu-nicípios, as redes, os consórcios, os comitês e ou-tras formas. Não basta administrar bem as coisas da cidade. É preciso exercer um papel atuante e cooperativo nas lutas e iniciativas que interessem às diversas instâncias regionais, fazendo aliados e promovendo parcerias para a atração de investi-mentos, obras de infra-estrutura, iniciativas rela-tivas ao turismo e à cultura.

O PPS compartilha do entendimento de que a responsabilidade fiscal no setor público é

inegociável. O zelo com os recursos arrecadados da população é um princípio fundador da de-mocracia. Contudo, a mesma atenção dispensa-da ao âmbito fiscal deve ser estendida à dívida social. Para isso, urge que o poder público mu-nicipal se adeque a uma Lei de Responsabilidade Social, baseada em indicadores e metas sociais, capazes de apresentar um real diagnóstico da situação social, avaliar a eficácia das políticas públicas e promover uma efetiva redução da ex-clusão social.

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16. Uma referência para a sociedade

O Índice de Desenvolvimento Humano, criado na década de 1990, sob inspiração do economista indiano Amartya Senn,

Prêmio Nobel de Economia, tenta medir o desen-volvimento dos países a partir de três dimensões do progresso social: saúde, educação e renda. A cada ano, o Programa das Nações Unidas para o Desen-volvimento (PNUD) apresenta o Relatório de De-senvolvimento Humano de 177 países e de cada um deles em particular.

No relatório de 2007, o IDH do Brasil evoluiu de 0,798 para 0,800, no período de 2004 para 2005, embora com a nota mínima (quanto mais próximo de 1 o IDH, maior o desenvolvimento humano). Na classificação mundial, a Islândia destaca-se em 1° lu-gar; os EUA estão no 12° lugar e o Brasil no 70° lugar (com os seguintes dados: expectativa de vida, 71,7 anos; taxa de alfabetização dos adultos, 88,6%; taxa de matrícula combinada, 87,5%; e renda per capita de US$ 8.402,00). O IDH médio dos países em de-senvolvimento é de 0,691.

Segundo a Constituição brasileira de 1988, os municípios são responsáveis pela implantação de po-líticas como: prover em caráter obrigatório o ensino fundamental para crianças e adolescentes de 7 a 14 anos; prover o atendimento de crianças em creches e programas de educação infantil ainda que seja direito da criança, porém sem a garantia da obrigatoriedade por parte do poder público; prover o atendimento da atenção básica à saúde para a população; promo-ver ações integradas para proteção integral à criança e ao adolescente; promover ações para melhorar a qualidade de vida da pessoa idosa; promover ações integradas para preservação ambiental e criação das

condições necessárias ao desenvolvimento susten-tável; promover ações para garantir a distribuição e utilização do uso do solo e de geração de renda.

Toda a linha de raciocínio aqui desenvolvi-da acaba por nos levar a buscar definir, do ponto de vista do PPS, inicialmente os focos de interesse comuns a toda e qualquer gestão municipal, para, em seguida, buscar meios de como poder avaliar a nossa eficiência, a eficiência de nossos gestores, na aplicação destas políticas. Assim, a atividade do PPS visa criar, para as políticas públicas, um padrão mínimo que se insira em nossa específica forma de perceber o Brasil, sua cidadania, tanto na complexidade das situações e contextos, como na solução dos problemas que se apresentam.

Derivando da própria Constituição federal não fica difícil definir que os focos principais vão

43Poder Local O Desafio da Democracia•

estar na questão da educação e da saúde. Tam-bém por conta da Constituição podemos defi nir que grupos como populações em faixa de risco social, mulheres, índios, negros, crianças, pessoas com defi ciência, são grupos de atenção especial na montagem destas políticas públicas. Agregan-do políticas de empregabilidade e qualifi cação ou requalifi cação profi ssional, vistas como políticas que viabilizem melhoria de renda e qualidade de vida, teremos formado um poderoso tripé de ações públicas que acabam impactando a quali-dade de vida de toda a população e não apenas dos segmentos menos favorecidos.

Este tripé educação/saúde/renda deveria estar expresso nos programas de nossos candidatos, tanto ao Executivo como ao Legis-lativo (claro que dentro da especi-fi cidade de cada poder), como um programa propositivo mínimo a ser agregado a todas as especifi ci-dades locais de cada município e região. Seria conveniente que cada candidato tivesse meios de estabe-lecer metas físicas muito claras e objetivas para cada item e que estas metas, uma vez ganhas as eleições, pudessem ser aplicadas no Planejamento Plurianual (PPA) e no Orçamento Anual, assim como executadas de fato.

O PPS, através de sua direção, estará volta-do para a criação de uma estrutura especializada que possa, cooperativamente e não impositiva-mente, não só apoiar as nossas prefeituras e de aliados, mas também nossos vereadores (banco de projetos, assessoria de elaboração de projetos, assessoria nas funções de controle social etc.) nas tarefas de gestão pública. A execução das metas do tripé será avaliada por indicadores que gera-

rão um índice que possa servir de comparativo nas gestões, entre as gestões do PPS e entre as ges-tões do PPS e as outras.

Dentro dessa perspectiva, o PPS vai propor aos seus candidatos, sobretudo aos prefeitos, que se preocupem com a melhoria do IDH e procu-rem utilizá-lo como a nossa “marca registrada”, quer dizer, oferecer como plataforma eleitoral a concentração em ações que permitam melhorar as condições da educação pública, universal e de qua-lidade, assim como dotar o município de sanea-mento básico, de água sadia e de uma boa assistên-

cia médica ambulatorial, hospitalar e de atendimento doméstico, e, da mesma forma, criar formas de am-pliar os rendimentos dos habitantes da cidade e do campo.

Nesse plano, importante também considerar que se impõe estabelecer formas de capacitar a cidadania para uma efi ciente e pro-dutiva participação nos conselhos paritários e em outros mecanismos de controle social, assim como se

adotar políticas de empregabilidade efetiva e as-sociação alternativa para o trabalho, sem falar na aplicação dos APLs (Arranjos Produtivos Locais) e das RIDEs (Região Integrada de Desenvolvimento Urbano).

Desta forma, estaremos efetivamente con-tribuindo não apenas para melhorar as condições de vida e as oportunidades iguais para homens e mulheres da comunidade, mas também para redu-zir os desequilíbrios e a exclusão sociais de que o nosso Brasil é um dos campeões em todo o mun-do. Ao invés de dar o peixe frito, vamos ensinar a que cada um saiba pescar.

Assim, a atividade do PPS visa criar, para as políticas públicas, um padrão mínimo que se

insira em nossa específi ca forma de

perceber o Brasil

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17. A origem dos recursos e osdesvios da sua destinação

A experiência revela que concorrer a qual-quer cargo eletivo pressupõe fazer pro-messas. Até aqui, nada demais. Em que,

no entanto, devemos ser diferentes? Em prometer o que é necessário à comunidade, mas sabendo que é possível concretizar a promessa feita. Para isso, precisamos, de um lado, conhecer as neces-sidades essenciais e de interesse da maioria e, de outro, saber de que recursos dispõem a Prefeitura e a comunidade para materializar os projetos apre-sentados durante a campanha.

É aí que vamos nos deparar com uma das maiores deformações da Federação, organismo de que fazem parte a União, os estados e os mu-nicípios. Temos, para dirigi-la, a Constituição federal. Os estados, com a autonomia de que dis-põem – e que não é tão pequena como muitos imaginam – têm sua Constituição estadual e os municípios, sua Lei Orgânica. Todos esses docu-mentos, dentro de estados e municípios, não po-dem agredir o texto federal.

É o instante em que a federação mais se enfraquece já que a legislação federal – aprova-da com os votos de representantes de todo o país – acaba por desfigurar o processo de arrecadação e distribuição de impostos e taxas, fazendo com que a União acabe ficando com a parte do leão, e cada dia mais faminto.

Isto significa que conhecer a Lei Orgânica de seu município – para não falar da Constituição – é outra obrigação para o candidato, mais do que para qualquer outro cidadão.

Para muitos, algumas comunidades somen-te existem porque a União lhes repassa recursos.

Esta é uma meia verdade, pois dentro dessa car-ga tributária que cada um de nós se vê obrigado a enfrentar, ano após ano, existem uns tribu-tos (muitos) que são arrecadados somente pela União, outros pelos estados e pouquíssimos pe-los municípios.

Aqui começam nossos grandes problemas, o maior deles sendo a fome voraz da União. Vamos a uns exemplos. A Constituição define a distribui-ção de recursos entre estados e municípios. Mas o Congresso e, por mais incrível que pareça, com o apoio da maioria de deputados e senadores, per-mite ao Planalto ficar com 20% disso tudo, poden-do usar essa fabulosa quantia da maneira que bem quiser e entender, graças à DRU (Desvinculação de Receitas da União). Além disso, a União cobra de nós todos a CIDE, contribuição já incluída no preço da gasolina, do diesel, de qualquer combus-tível, criada para que os recursos assim arrecada-dos sejam aplicados nas rodovias públicas, o que não acontece.

Mas não é só. Se o Congresso, como aconte-ceu recentemente, impedir que se continue cobran-do a CPMF, o governo federal, com uma medida

45Poder Local O Desafio da Democracia•

provisória, aumenta o IOF (Imposto sobre Opera-ções Financeiras) e a CLLS (Contribuição sobre Lu-cro Líquido para Fins Sociais), que são arrecadados unicamente pela própria Receita Federal, algo im-possível no âmbito de estados e municípios.

Os estados têm liberdade, embora não mui-to ampla, para cobrar o ICMS, repassando uma parte desse imposto para os municípios. Mas o pau sempre quebra quando esse ICMS é aumentado – ou diminuído –, sen-do os estados, no mais das vezes, acusados de fazer guerra fiscal e ou-tros descaminhos.

E no seu município? A arreca-dação fica limitada ao ISS (Imposto sobre Serviços) e o IPTU dos imó-veis urbanos. Em cidades pequenas, isto é, na esmagadora maioria dos municípios, esse ISS é quase fictício, ou seja, existe, mas não acontece, não se sabendo como cobrá-lo de dentistas e médicos – se ali existir algum –, de oficinas mecânicas e ou-tros tipos de serviços. O IPTU deveria representar maior volume de verbas, não fossem as dificuldades que vocês mesmos terão que enfrentar para definir o imposto a pagar pela casa em que mora a profes-sora de seus filhos, o médico da cidade e o mais.

É possível mudar essa situação? Bem, a partir da Câmara de Vereadores fica impossível modificar a Constituição, tanto a federal como a estadual. Mas não deve ser difícil garantir, pela Lei Orgânica, que a definição de eventual aumento do IPTU não possa ir além do índice da correção de salários ou do ín-dice oficial de inflação. Atender aos reclamos dife-rentes do prefeito, ainda que correligionário, é dei-xar de ouvir seus eleitores, ou melhor, todos os que vivem a seu redor, insistindo em aumento razoável, isto é, justificável por índices oficialmente aceitos. Mas não se esqueçam de observar, sempre, qual foi o aumento de arrecadação da Prefeitura, exercício a exercício.

Na cidade de Padre Bernardo, na região do entorno de Brasília, havia uma placa da Prefeitura, que dava conta do asfaltamento de trecho de uma rua e, no final, com todo destaque, informava: Ori-gem dos recursos – Povo de Padre Bernardo.

De fato, o dinheiro não sai dos cofres do Go-verno Federal, nem dos cofres do estado nem muito menos do bolso do prefeito. Mas daquilo que arre-cadam de nós, de modo que, reunidos esses recur-

sos em cada orçamento, possam atender às necessi-dades e às urgências da população.

É fato que a Constituição de 1988 abriu no-vas possibilidades a que se criassem mais municí-pios no país. Tem gente que torce o nariz pra isso. E reclama até mesmo quando se propõe a criação de novos estados. Não têm razão. E não têm razão porque a questão não deve ser entendida em nú-

meros, em quantidades, mas, sim, na necessidade de uma cada vez maior representação popular. Mas se querem números, podemos ver que nosso Brasil ainda precisa de muitos estados, muitas prefeituras, muitos vereadores.

Vejam que numa área contí-nua (sem o Alasca) e, por isso, me-nor que a do Brasil, os Estados Uni-dos estão divididos em 48 estados. O Brasil tem apenas 26. E lá são mais de

20 mil municípios. Aqui, o Estado mais dividido em municípios é Minas Gerais, com cerca de 800 deles. Pois a Alemanha, com área territorial equivalente à de Minas, tem 11 mil.

Lemos em jornais e ouvimos no Rádio e na TV que muitos municípios somente sobrevivem com os repasses feitos pela União. E isto é dito de forma tão solene e depreciativa que poucos se ani-mam a discordar. Como nós. Onde se produz para pagar o Imposto de Renda e o imposto sobre com-bustíveis da Cide? E o Fundo de Garantia e tanta coisa mais? Tudo é gerado no município. A União apenas cuida de arrecadar e, como manda a Cons-tituição, fazer a necessária distribuição, ou, melhor dizendo, sua devolução. E isto ainda de modo in-completo, porque a tal DRU permite que 20% do total arrecadado permaneça nos cofres federais.

Daí a pensar que apenas uma Câmara de Ve-readores possa modificar esse quadro daninho aos interesses dos moradores do município vai uma grande distância. Mas já serve para desmascarar aqueles políticos demagógicos que saem anuncian-do que conseguiram isto e aquilo, dando a entender que foram eles, junto ao governador ou ao ministro, que conseguiram a liberação de recursos. Devemos desmascará-los, pois para nós deve estar sempre presente a lição da Prefeitura de Padre Bernardo, em Goiás, aquela que nos disse que a origem de to-dos os recursos é o povo do município.

Conhecer a Lei Orgânica de seu município – para não falar da

Constituição – é outra obrigação para o

candidato

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18. A questão do meio ambiente euma gestão popular*

As cidades vêm sofrendo com a deterioração de sua qualida-de de vida, fenômeno de lon-

ga data, que tem uma de suas raízes mais profundas ligadas à deterioração do meio ambiente, problemática que deixou de ser um assunto setorizado, ligado a um grupo restrito de interes-sados na temática, e de atuação voltada apenas para a preservação dessa ou da-quela espécie vegetal ou animal. Com a emergência de uma série de dados e informações que dão conta de como problemas ambientais podem influen-ciar diretamente a vida do homem so-bre a Terra, a vertente ambiental passou a integrar a agenda política de todas as nações, como uma verdadeira questão de Estado.

Durante a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, reali-zada, em 1992, no Rio de Janeiro, onde se reuni-ram os principais mandatários mundiais, uma sé-rie de acordos foi firmada, com o estabelecimento de princípios que devem ser seguidos por todas as nações do mundo, inclusive o Brasil, signatário de todos os acordos então celebrados.

Esses princípios exigem, em suma, a tomada de uma postura política aberta à implementação do desenvolvimento sustentável, o que exige, por sua

vez, a revisão e a adequação das políticas econômicas, educacionais, de investimentos públicos etc. Portanto a questão ambiental tornou-se, nesta última década, uma questão política de primeira importância e uma das mais desafiadoras para os gestores públicos.

Para essa mudança de paradigma, houve uma participação essencial da sociedade. Foi a par-tir dos movimentos levados a cabo por ela que a questão ambiental passou a fazer parte da agenda política global, infiltrando-se nas diversas esferas de poder para chegar ao nível local. A máxima “pensar globalmente, agir localmente” foi cunhada a partir das experiências vivenciadas em diversas partes do

* Nossos agradecimentos ao Núcleo de Ambientalistas – NUMA do PPS, em Belo Horizonte, à frente o companheiro Jorge Es-peschit, pelas idéias básicas desta parte do Cadernos.

47Poder Local O Desafio da Democracia•

mundo e que, com o fenômeno da globalização da informação, passaram a fazer parte de um todo co-erente e orgânico. Não há como se pensar em am-bientalismo sem pensar nas lutas da sociedade civil em prol da implementação de políticas voltadas ao desenvolvimento sustentável.

Falar de problemas ambientais em uma ci-dade significa falar de poluição sonora, atmosfé-rica, visual, de trânsito, de falta de água, da falta de parques, jardins e espaços de lazer etc. E falar de qualidade ambiental significa falar das condi-ções necessárias ao pleno desenvolvimento es-piritual do cidadão, da garantia de sua saúde e bem-estar, dos requisitos essenciais à construção de sua cidadania e de seu sentimento de integran-te da cidade. Precisamos resgatar esse sentimento de “pertencimento” a uma comunidade.

Há uma série de objetivos a serem perseguidos pela munici-palidade, que demandarão tanto ações por parte do Executivo (fis-calização, ação integradora, obras etc.) e do Legislativo (aprovação e revisão de leis) como de igual for-ma da sociedade, que deve reivin-dicar a adoção, pelo Poder Público, de uma postura firme no trato das questões relacionadas à salubrida-de do meio ambiente e também es-timular os cidadãos a participarem de todo este processo.

Em oposição ao modelo de desenvolvi-mento concentrador, predador e esgotado, que atualmente vigora na ampla maioria de nossos municípios, o PPS deve assumir a Agenda 21, como mecanismo de política e planejamento pú-blico, levando em conta os interesses não apenas das atuais gerações, mas também das futuras. Deve também promover atividades destinadas a esclarecer e a aprofundar o conhecimento sobre ela nas escolas do município e, a partir dela, criar e implantar as Agendas 21 Escolares, assim como envolver toda a comunidade na elaboração da Agenda 21 Local.

No tocante às áreas verdes, dentre outras ações, criar e implantar Unidades de Conserva-ção no âmbito do município, podendo ser parques municipais, praças, bosques, reservas particulares etc., desenvolver projetos de arborização urbana,

assim como conservar e recuperar áreas verdes, com estímulo, inclusive, a parcerias com a iniciati-va privada, associações de bairros, entre outros.

Sobre a conservação da água, estimular o uso racional da água, preservar e recuperar nas-centes, incentivar a adoção de mecanismos volta-dos para a captação e utilização de águas pluviais, promover, juntamente com o governo estadual, o tratamento dos esgotos domiciliares antes de lançá-los aos corpos d’água receptores, e exigir, na forma da lei, o tratamento das águas residuais provenientes das atividades industriais.

Um aspecto importante e negligenciado pelas administrações municipais se refere a implantar e ge-renciar a coleta seletiva de lixo por meio de incenti-vos para a aquisição de matérias-primas recicláveis, apoio a cooperativas de catadores de lixo e de pro-

cessamento de resíduos, desenvolver programas de educação ambiental voltados para a redução, a reutiliza-ção e a reciclagem dos resíduos sóli-dos, simultaneamente à colocação de um maior número de cestos de lixo pela cidade e desenvolver campanhas educativas, orientando as pessoas a jogarem o lixo nos cestos de lixo dis-tribuídos pelo espaço público (asso-ciando, por exemplo, o lixo das ruas ao entupimento de bocas de lobo e às enchentes), e instalar caçambas para depósito e posterior coleta (se pos-

sível, instalar estações de recolhimento de entulho). Outra coisa a fazer é proibir e fiscalizar depósitos de lixo a céu aberto – lixões – no território municipal.

Mesmo em cidades e municípios pequenos, deve-se criar e/ou fortalecer o Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, instrumento para estimular a participação da socie-dade na política ambiental municipal, garantindo-lhe um número de representantes da sociedade civil idêntico ao número de representantes do Poder Pú-blico. Outra iniciativa interessante é instituir e pro-mover audiências públicas, plebiscitos e referendos para a participação da população no trato de temas ambientais polêmicos.

Dependendo do tamanho territorial e po-pulacional do município, precisam ser examinados programas e ações a respeito da poluição sonora (fiscalizar o uso do escapamento original em todos

Não há como se pensar em ambientalismo

sem pensar nas lutas da sociedade civil em

prol da implementação de políticas voltadas ao desenvolvimento

sustentável

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os veículos automotores e motocicletas, regulamen-tar, fi scalizar e divulgar o horário e o nível de ruídos emitidos pelos alto-falantes de veículos de fi nalidade comercial, política ou publicitária, e na execução de obras em vias públicas ou em prédios particulares, assim como fi scalizar ca-sas noturnas que disponham de som amplifi cado ou ao vivo, da poluição do ar (fi scalizar e controlar a emis-são de poluentes pelos veículos e da instalação de fi ltros e demais instru-mentos de mitigação da poluição em empresas poluentes, proibir a queima de resíduos sólidos a céu aberto e a queima em ambientes fechados sem o devido tratamento dos efl uentes gasosos resultan-tes da combustão etc.), da poluição visual (fi scalizar propagandas externas – outdoors, luminosos, letrei-ros etc. – que ultrapassem a quantidade, o local e o tamanho estabelecidos, combater pichações e criar condições para restaurar e revitalizar áreas, monu-mentos e edifícios histórico-culturais).

Quanto ao delicado tema do uso e conser-vação do solo, elaborar um Plano Diretor, revisar a legislação vigente sobre o parcelamento e o zonea-mento do solo urbano, implantar alternativas para as ocupações ilegais existentes etc.

Nada disso terá êxito se não se promover ações de educação ambiental em planos, programas e projetos governamentais e não governamentais, por meio da criação de um Núcleo de Capacitação

que realize ofi cinas, cursos de exten-são, palestras, visitas orientadas etc., via atividades lúdicas, explorando a música, a literatura e o teatro.

Por fi m, é decisivo se fazer um Planejamento ambiental, em que se exija a recuperação de áreas degra-dadas e se garanta a indenização de-corrente de danos causados ao meio ambiente, em que se estimulem e se adotem, quando possível, tecnologias

alternativas ambientalmente corretas nas ações de-senvolvidas pelo setor público e privado, entre ou-tras iniciativas. Nesse sentido, deve-se dar atenção especial ao licenciamento ambiental e ao sistema de concessão de outorgas para direitos de uso múltiplo das águas, à criação de exigências de relatórios de impacto ambiental criteriosos quando da implanta-ção de projetos específi cos, celebração de convênios e cooperação com ONGs locais, estaduais, nacionais e internacionais. Importante também construir nos municípios as ramifi cações institucionais dos siste-mas nacionais de meio ambiente e recursos hídricos.

Nada disso terá êxito se não se promover ações de educação ambiental em planos, programas e projetos governamentais e não governamentais

49Poder Local O Desafio da Democracia•

19. Os partidos e o processo eleitoral

Gostaríamos de cuidar, em separado, da questão dos partidos políticos e, em es-pecial, da fidelidade partidária. É que

a decisão do Supremo Tribunal Federal reco-nhecendo que o mandato pertence ao partido e não ao eleito teve o efeito de uma bomba junto à grande maioria dos políticos com mandatos e boa parte dos partidos. Mas isto somente para os que não estão afeitos ao que de fato ocorre em nosso processo eleitoral.

A Constituição brasileira impõe a qual-quer pessoa, como condição de elegibilidade, a filiação partidária. Por exigência legal, o partido endossa a ascensão do candidato à vida públi-ca, acolhendo-o em suas fileiras, escolhendo-o em convenção, registrando-o na Justiça Eleitoral com numeração identificadora de um partido de-cente, orientando-o e apoiando-o no processo da campanha eleitoral e criando as condições eleito-rais para a sua vitória. Isto basta para dizer que a filiação a um partido é condição indispensável para concorrer a qualquer eleição. E, aí, ser eleito.

Porém, até bem pouco, esse detentor de manda-to, que o exerce em nome do partido pelo qual é eleito, virava as costas a quem lhe abrigara assim como aos eleitores que acreditaram em suas pala-vras e propostas. Destaque-se também que além da infidelidade, essa atitude, como é natural, mo-difica o equilíbrio político oriundo da vontade dos eleitores.

Nas eleições proporcionais – de vereadores e deputados – a quantidade de cadeiras na Casa legislativa é definida pelos votos conseguidos não pelo candidato, mas pelo partido, originando o chamado quociente eleitoral. Como se sabe, o que decide a eleição são os votos obtidos pelo partido, e não os atribuídos ao eleito.

Outro fato importante e pouco conhecido dos brasileiros em geral é que entre os 513 depu-tados federais eleitos, não chegam a duas dezenas aqueles que, sozinhos, conseguiram mais votos que o coeficiente eleitoral exigido. Isto significa que a quase totalidade da Câmara depende dos

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votos da legenda partidária para garantir os seus mandatos, não tendo condições de se eleger por conta própria, apenas com os votos obtidos por cada um deles, individualmente.

Fidelidade é uma via de mão dupla. Não é só o fi liado que tem que ser fi el ao partido por cuja legenda concorreu, porque o partido tam-bém quer ser fi el a seus fi liados. E como pode-remos comprovar essa fi delidade? Não é muito complicado. O Partido tem um programa. Tem instâncias decisórias na sua cidade – o Diretório Municipal -; no seu Estado – o Diretório Estadu-al –; e, fi nalmente, o Diretório Nacional. A cada uma e a todas essas instâncias cabe a obrigação de verifi car se o programa vem sendo cumprido, se estão sendo respeitadas as decisões coletivas ado-tadas, respeitado o direito de cada fi liada ou fi lia-do manifestar sua opinião pessoal publicamente e propor a mudança que quiser.

Tudo indica que o processo de escolha do partido por cuja legenda você vai concorrer se deu pelo conhecimento que teve do PPS e de suas lideranças, dos valores e idéias que defende, do seu programa, dos seus estatutos. E este Seminá-

rio de Atualização Política cumpre em parte este papel, para quantos hoje compartilham conosco o espaço deste operador político.

Integrar-se à atividade partidária signifi ca não apenas participar das reuniões da sua organi-zação, cumprir as tarefas que lhe são designadas ou tomar iniciativas de conquistar novos fi liados, mas é imprescindível procurar atuar no seu local de trabalho, de estudo, de moradia ou onde pra-tica o seu lazer. É importante também participar dos congressos e convenções e das reuniões da direção, sempre que possível, para garantir a lisu-ra das decisões partidárias, impedindo que caci-ques eleitorais, ainda por seu discutível poder de voto, acabem por levar a esses pleitos a impressão digital de uma vontade que quer ser maior que a vontade coletiva.

Veja você que, a partir daí, sua responsa-bilidade aumenta. Você não vai impor sua idéia. Nem sua vontade. Você vai discutir essa idéia com quem, de dentro do partido, quer, também, insistir nas modifi cações que o poder coletivo en-tender necessárias.

51Poder Local O Desafio da Democracia•

20. As questões específicas das mulheresApresentamos aos companheiros e as companheiras, pré-candidatos(as) a prefeito(a) e vereador(a)

algumas sugestões para colaborar com o programa eleitoral a ser apresentado na campanha.

Estas propostas estão baseadas na Plataforma Política das Mulheres do PPS (acesse www.pps.org.br/mulheres para obter o documento), construída exatamente para subsidiar as candidaturas das companheiras e dos companheiros para que abracem o projeto de construção de uma sociedade democrática e igualitária, em que mulheres e homens possam dividir poderes, responsabilidades, sonhos e se juntar na luta pela inclusão social e na afirmação cotidiana da cidadania.

Todas estas reivindicações e conquistas estão sintonizadas com a luta dos movimentos feministas e de mulheres. Desde 1979, estamos construindo nossas políticas para atuação partidária e, em 2001, construímos a Plataforma, que vem sendo reavaliada a cada Congresso de Mulheres do PPS.

Algumas ações para planejamento de campanha das candidatas a prefeita e vereadora do PPS

Para prefeita:

• Transparência no orçamento, contas e gastos públicos; • Ética na política; • Guerra contra a impunidade; • Combater o nepotismo; • Estimular a criação de pequenas empresas/cooperativas de acordo com a vocação da cidade; • Provocar parceria com as associações, entidades etc. para tornar a cidade mais florida e arborizada; • Distribuir gratuitamente preservativos para a comunidade nos postos de saúde; • Distribuir gratuitamente preservativos e possibilitar exames médicos para profissionais do sexo nos postos de saúde; • Treinar policiais para lidar com mulheres infratoras; • Fiscalizar cadeias públicas; • Fiscalizar presídios femininos; • Estimular programas direcionados aos jovens; • Apoiar projetos que promovam a cidadania e o empoderamento da mulher

Para vereadora:

•Fiscalizarconselhosecomitêsdegestãopública;•Fiscalizar o orçamento e os gastos públicos do mu-nicípio;•Combateronepotismo;•Proporaparti-cipação de pelo menos 30% de mulheres nos con-

selhosecomitêsdegestãopúblicadomunicípio;•Propor a participação de pelo menos 30% de mu-lheres em cargos/funções do Executivo municipal; •Protegerasmulheresecriançasvítimasdevio-lênciadomésticaounão;•Proporpuniçãoexem-plar a pessoas que cometam atos de violência física e psicológica com características de preconceito de qualquerforma;•Criaratendimentonoturnonascrechesdacidade;•Criarperíodonoturnodeau-las nas escolas para alfabetização de adultos, com apoio diferenciado às mães, proporcionando salas derecreaçãoparasuascrianças;•Criarcentrosdeatividades esportivas e culturais em cada bairro ou regiãodacidade;•Criarprogramapermanentedeprevençãodedrogasnasescolas;•Criarsalasdeleitura em escolas, associações, sindicatos, igrejas etc.;•Proporaintroduçãodefaixasparatravessiadepedestresnasruasdemaiormovimento;•CriarDisque-Denúncia para abuso sexual de qualquer natureza;•CriarDisque-Denúnciaparamulheresvítimasdeviolência; •Apoiar todasaspropostasde interesse local que estejam em consonância com o programa partidário.

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Propostas de parcerias com a comunidade, oportunizando:

▶ envolver os militantes do partido com o mandato▶ despertar novos talentos e novas lideranças comunitárias▶ promover campanhas de saúde, conscientização e cidadania▶ dirigir o mandato para a comunidade com sua participação efetiva no processo

Campanhas

Criar um Centro de Atividades, Campanhas e Palestras

Temas para palestras: • Violência familiar; •Acompanhamento dos filhos na escola; • Sexona adolescência; •Gravidez precoce; •Adoles-cênciacriativa;•Saúdementalefísicadosido-sos;•Educaçãoparaapolítica;•Geraçãodeem-pregoerenda–Cooperativismo;•Prevençãodeacidentes domésticos.

Oferecimento de cursos regulares profissionali-zantes: • Inclusãodigital; •Auxiliardeescritó-

rio; •Auxiliar de enfermagem; •Atendente deconsultório;•Cabeleireira;•Manicure;•Cortee costura; • Pintura de parede; • Hidráulica; •Mecânica;•Restauraçãodemóveis;•Reformadepinturasdemóveis;•Caixaseembalagensparapresentes;•Maquiagem;•Bijuterias;•Brinque-dos de sucata; •Bonecas artesanais; •Oficinaspedagógicas; • Jogos educativos; • Oficinas deteatro;•Alfabetizaçãodejovenseadultos.

Semana da Cidadania:

•Cidadelimpa,Cidadelinda;•Usoeeconomiadaágua;•Jogosegincanasparacrianças,adoles-centes,adultoseidosos;•Documentaçãoesitua-ção civil em dia, com atendimento da OAB e MP; • Beleza se põe namesa – higiene dos cabelos,unhas, barba, boca etc.

Semana da Educação para o Trânsito:

• Orientação sobre prevenção de acidentes notrânsito;•Guardasdetrânsitomirim

Semana do Meio Ambiente:

•Orientaçãosobreocombateaodesperdíciodeáguaeenergiaelétrica;•Palestraseducativasso-breomeioambiente;•Agriculturafamiliar

Semana da Saúde:

• Mamógrafos – campanha para aquisição demamógrafo; • Pré-natal – campanha de cons-cientização e projeto para atendimento de mães; •Papa-nicolaueauto-exame–umavezaoano,promover o exame em todas as mulheres do mu-nicípio; • Diabetes – exame, conscientização eprevenção; •Colesterol – exame, conscientiza-ção e prevenção; • Obesidade – campanha dealerta e lanche adequado nas escolas e cantinas escolares. Alimentação saudável; • Oftalmolo-

gistas – Cataratas (cirurgia de graça) e outros males comomiopia, astigmatismo; • Dentistas–Cárie,escovaçãoeflúor;•Dermatologistas;•Cartão SUS

Semana da Diversidade – sexual, de opção sexual, de idade, cor, raça, religião etc. através de teatro, artes plásticas, palestras, música e dança:

•Ênfaseàeducaçãodosmeninosparaorespeitoàsmeninas;•Ênfaseàinclusãodosportadoresdedeficiência física

Semana da Criança e do Jovem:

•DigaNãoaoTrabalhoInfantil;•Lugardecrian-çaeadolescenteénumaboaescola;•ECA(Esta-tutodaCriançaedoAdolescente);•DigaNãoàsDrogas

Semana do reconhecimento e valorização do trabalho doméstico:

•Reaproveitamentodealimentos;•Babá;•Co-zinha; • Arrumação de casa; • Organização deespaçosno lar:gavetas,móveisetc.;•Direitosedeveres da empregada doméstica

Semana da Educação para a Paz:

•Comparticipaçãodasescolas, igrejas,sindica-tos, associações, empresas etc.

21. Breve História do Partido

Formação

O Partido Popular Socialista (PPS), cons-tituído formalmente em 1992, é o her-deiro legítimo das melhores tradições

do antigo Partido Comunista Brasileiro, o “Partidão” de tantas batalhas. Funda-do em 25 de março de 1922, o PCB é conseqüência natural da formação dos trabalhadores e do desenvolvimento de suas lutas no Brasil, iniciadas na segun-da metade do século XIX, e busca suprir a carência de um partido político revo-lucionário de classe. Na sua origem e es-tímulo estão a Revolução Russa de 1917 e as idéias socialistas de Marx e Engels.

Em 1922, pelo menos três grandes aconte-cimentos varreram o Brasil de ponta a ponta, com sua influência e reflexos de cunho cultural e po-lítico: a Semana de Arte Moderna, a eclosão da Revolta dos 18 do Forte de Copacabana, que descortinou o influente movimen-to tenentista posterior, e a fundação do PCB. Conforme acentuam historiado-res, os três fatos não tiveram necessaria-mente nenhuma ligação entre si, mas no processo histórico brasileiro acabariam, de alguma forma, por se encontrar. Re-presentavam uma grande “sacudida” do país em direção à modernidade.

O dirigente pioneiro do PCB foi o jorna-lista Astrojildo Pereira, intelectual e então líder

anarquista, e considerado até hoje como um dos mais originais pensadores brasileiros da primei-ra metade do século XX. Na linha dos dirigentes históricos, o mais destacado deles é Luis Carlos Prestes (1943-1981), seguido por Giocondo Dias (1981-1987), Salomão Malina (1987-1991) e Ro-berto Freire (a partir de 1991) e que, desde que se

iniciou o PPS (1992), encontra-se na lide-rança do partido.

Em seu período inicial, o PCB teve uma vida difícil e irregular (em julho, o partido é jogado na ilegalidade), indo aos poucos adaptando-se às duras condições da clandestinidade. E, ao mesmo tempo, travou renhida luta político-ideológica com o anarquismo, que tentava intrigar os comunistas com os trabalhadores ao cha-mar-lhes de políticos, como se fosse uma

pecha de fundo negativista, e condenava o esfor-ço do partido em unificar as ações dos sindicatos qualquer que fosse a orientação ideológica da li-derança destes.

Revelou também seu pioneirismo na proposta de uma política aliancista, ao con-clamar as entidades e personalidades polí-ticas a formarem um Bloco Operário para disputar as eleições de fevereiro de 1928, ocasião em que, pela primeira vez, os tra-balhadores teriam a possibilidade de uma “intervenção direta e independente”. Surgia, assim, a primeira frente única eleitoral, pro-

curando dar unidade à classe operária e baseada também num programa unitário. Em fins de 1927, ainda dentro de uma política frentista, o secretário-

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Com a ascensão do nazismo ao poder na Alemanha (em 1933) e com o avanço do fascismo no mundo, a Internacional Co-

munista, no seu VII Congresso (em 1935), adota a política da Frente Popular contra o fascismo, in-cluindo comunistas, socialistas, liberais e outros. Essa tática, aplicada pelo PCB no Brasil, deu ori-gem à Aliança Nacional Libertadora (ANL), ten-do Luís Carlos Prestes como presidente de honra. O crescimento da ANL chega a assumir propor-ções grandiosas não só pelo entusiasmo das mas-sas, mas também pelo apoio e adesão de líderes políticos e militares progressistas e de expressão na época. Em julho, ela é ilegalizada por Getúlio Vargas, utilizando o pretexto de um manifesto e um discurso de Prestes, que acreditava haver no Brasil uma situação pré-revolucionária e revela-va uma tentativa de instrumentalizar a ANL, por parte dos comunistas.

Quanto mais se isolava, mais a Aliança or-ganizava a rebelião, por meio dos quartéis. No dia 23 de novembro, a insurreição é desencadea-da em Natal, via 21º Batalhão de Caçadores, que assumiu o governo estadual por uns poucos dias; no dia 24, o movimento estoura no Recife, no 29º BC, com os amotinados mantendo a cidade em estado de guerra por três dias, sendo depois des-baratados ou se dispersando pelo interior; e, no dia 27, irrompe no Rio de Janeiro, sublevando o 3º Regimento de Infantaria, na Praia Vermelha, e a Escola de Aviação Militar, sem ao menos conse-guir sair às ruas. A insurreição termina em com-pleto fracasso e derrota. Daí em diante, e sobretu-do a partir de 1937, quando se implanta o Estado Novo de Vargas, o PCB, em particular, e o movi-

mento operário e outros setores progressistas, em geral, sofrem violenta repressão, que durará até a queda do ditador.

A partir de 1943, a evolução política que se foi processando no país, fora e mesmo dentro do governo, facilitava e fortalecia a posição e a ação do PCB. Nesse processo de acumulação de forças, o movimento democrático chega ao auge. Em abril de 1945, são conquistadas a anistia que, embora limitada, liberta todos os presos políti-cos, e a plena liberdade de organização partidá-ria, inclusive para os comunistas. Após 23 anos de luta, quase sempre clandestino, o PCB, em pouco tempo, passa de uns poucos milhares de membros para quase 200 mil.

Graças ao extraordinário desempenho nas eleições de dezembro de 1945, nas quais o seu candidato a presidente da República, Yeddo Fiú-za, obtém cerca de 10% do total de votos, ficando em terceiro lugar, o PCB tem papel de destaque na Assembléia Nacional Constituinte, durante o ano de 1946, com uma bancada composta do senador Luís Carlos Prestes e 14 deputados federais (Jorge Amado era um deles). Suas posi-ções eram principal-mente na defesa dos interesses dos traba-lhadores, advogando o direito de greve, li-berdade e autonomia sindicais etc.

geral Astrojildo Pereira segue para a Bolívia a fim de estabelecer contacto com Luís Carlos Prestes, líder da Coluna e uma figura de grande expressão popular, visando coordenar as “forças em vista de objetivos comuns”. Em 1928, o Bloco Operário é

transformado no Bloco Ope-rário e Camponês – BOC para ser utilizado como alter-nativa legal, depois da volta à clandestinidade.

Dos anos insurrecionais à redemocratização do após-guerra

55Poder Local O Desafio da Democracia•

No início dos anos 50, apesar da política geral do PCB ser muito estreita, os co-munistas retornam à atividade sindical

em aliança com os getulistas e organizam os as-salariados rurais em sindicatos. Essas atitude e forma de atuação são reafirmadas na Resolução Sindical de 1952, que introduziu novas e impor-tantes correções na atividade das entidades de classe, cuja orientação anterior era abandonar e combater os sindicatos legais tidos como pelegos e que estariam a serviço dos patrões, e criar sin-dicatos paralelos, combativos e revolucionários. Essa nova postura começa a dar frutos, como a greve de 300 mil operários de várias categorias, que durou 26 dias, em 1953, e a realização da I Conferência Nacional de Lavradores e Trabalha-dores Agrícolas, ambas em São Paulo.

As greves e outras ações operárias e sindi-cais lançam as bases para a constituição do Pac-to de Unidade Intersindical – PUI, que chegou a contar com 100 sindicatos e que, em 1954, diri-giu uma greve geral contra a carestia, na qual se envolveram cerca de 1 milhão de trabalhadores. Nisso tudo os comunistas têm participação fun-damental, tanto na iniciativa como na direção.

A perplexidade que envolve o Partido com a morte trágica de Getúlio, em 1954, e os fracas-sos nas eleições parlamentares e de governadores evidenciam que as coisas não podem continuar do jeito que estão. E as repercussões começam a apa-recer, em 1955, quando o PCB apóia a candidatura de Juscelino Kubitschek à Presidência da Repú-blica. No ano seguinte, vem uma nova sacudida no Partido, graças aos fatos que envolvem o histórico XX Congresso do PCUS, no qual o secretário-ge-ral do Partido e primeiro-ministro da União Sovi-ética, Nikita Khruschev, lê o seu relatório secreto denunciando o “culto à personalidade” e fazendo sérias acusações a Stalin, o todo-poderoso dirigen-te soviético que falecera em 1953.

Em março de 1947, a situação internacio-nal começa a sofrer alterações com o iní-cio da Guerra Fria, entre EUA e URSS,

iniciando-se um longo período de perseguição aos comunistas. No dia 7 de maio, manifestan-do-se sobre denúncia, o Tribunal Superior Elei-toral cassa o registro do PCB, acusado de ter dois estatutos, de se denominar Partido Comunista do Brasil e não Brasileiro, de utilizar símbolos internacionais (foice e martelo) etc. A partir desse momento, amplia-se a perseguição, sus-pendendo o funcionamento da União da Juven-tude Comunista, fechando as sedes partidárias, apreendendo seus arquivos e fichários, demitin-do todos os funcionários públicos suspeitos e decretando o fechamento da CGTB.

Os parlamentares do PCB, em todo o país, têm seus mandatos cassados, no dia 7 de janeiro de 1948, e a polícia invade e depreda as redações de mais de uma dezena de jornais comunistas, nas principais capitais brasileiras. O Partido é jo-gado na clandestinidade. Em seguida, a direção do PCB começa a esboçar nova linha política, influenciada pela difícil realidade interna do país e pela estreiteza das concepções da Cominform (criada em Moscou), em que se condenam “as grandes ilusões reformistas em conquistas (...) dentro dos estreitos limites da democracia bur-guesa” e propõe-se uma “revolução agrária e an-tiimperialista”. Essa nova tática política seria re-elaborada, de forma mais radical, no Manifesto de Agosto de 1950, enrijecendo-se, tornando-se cada vez mais sectária e voluntarista.

Nova perseguição e uma política sectária

Os anos de inspiração democrática

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Fruto de um processo de análise e audacio-so debate das realidades brasileira e internacional, dos seus próprios problemas internos acumulados durante vários anos, e do impacto e dos desdobra-mentos do XX Congresso, o PCB começa a viver um rico período de amadurecimento cujos elementos centrais são a busca de uma linha política que cor-responda à nova realidade do país e do mundo e de considerar a importância da questão democrá-tica, no seio do partido e numa sociedade autoritá-

ria como a nossa. Dentro dessa visão autocrítica, foi criada uma comissão para estudar e redigir um pro-jeto de Declaração Política para a direção nacional do Partido, sob a coordena-ção de Giocondo Dias. Produto desse esforço, o Comitê Central, reunido em 1958, aprova a Decla-

ração de Março, na qual salienta que o processo histórico de desenvolvimento do capitalismo no Brasil favorece a luta pela democracia e que se im-punha formar uma frente única ao mesmo tempo nacionalista e democrática. O documento defende o caminho pacífico para a democracia, e rejeita o desvio da insurreição armada. Trata-se de um pri-meiro ajuste de contas do PCB com o stalinismo, com seus dogmas, seu taticismo, suas concepções instrumentalistas, seu sistema mandonista.

Pouco mais de dois anos após a elaboração de sua nova política, e depois de quatro meses de intensos e livres debates, o Partido realiza, em se-tembro de 1960, em pleno centro do Rio de Janei-ro, o seu V Congresso, de forma aberta embora não-legal, no qual são reafirmadas e desenvolvidas as concepções da Declaração de Março. É inegável que, a partir daí, os comunistas passam a se inserir de forma mais ativa na sociedade brasileira.

O Partido realiza, no ano seguinte, uma Conferência Nacional, em que aprova novo estatuto alterando o nome de Partido Comunista do Brasil para Partido Comunista Brasileiro, além de não fa-zer mais referências à ditadura do proletariado.

Desde então, intensifica-se no país o proces-so de avanço das forças democráticas e populares, numa evidente tomada de consciência que se ex-pressa na ação direta por interesses específicos e por reformas econômicas, políticas e sociais e no aumento de sua organização. A dinâmica imprimi-

da à sociedade civil por essa luta, principalmente depois da renúncia do presidente Jânio e da batalha popular pela garantia da posse do vice-presidente João Goulart, em 1961, tem uma projeção direta no programa e na ação do governo. Nesse processo visando transformar e renovar em profundidade a estrutura do país, o PCB tem papel fundamental, conquistando por vezes a direção política do mes-mo, graças ao seu desempenho em todos os seto-res da vida política nacional, principalmente nos movimentos operário e camponês, mas atingindo também a intelectualidade, o movimento estudan-til e até setores das Forças Armadas.

Nesse sentido, os trabalhadores são incenti-vados a tomarem terras, a fazerem greves seguidas e a realizarem grandes atos de repercussão, pro-curando dar demonstrações de força. Nessa onda de radicalização, o PCB acaba, muitas vezes, indo a reboque e conciliando com forças radicais e de tendência golpista, representadas então por Leonel Brizola, Francisco Julião, Ação Popular (AP), Polí-tica Operária (Polop) etc., embora tenha também, em alguns momentos, combatido o esquerdismo, o baluartismo e o golpismo dessas forças.

No início de 1964, verifica-se um acirra-mento da luta política, com o enfraquecimento rápido das bases do governo. Por sua vez, há tam-bém a posição equivocada de setores importantes que acham ser sua principal tarefa a criação de di-ficuldades a Jango, na vã ilusão de que é possível se avançar muito mais, ao invés de denunciar e com-bater o inimigo que febrilmente prepara o golpe de Estado. Finalmente, na madrugada de 1º de abril, consuma-se a derrubada pelas armas do governo constitucional de João Goulart, estando o povo desarmado politicamente para enfrentar os gol-pistas. Implanta-se uma ditadura apoiada na força militar e na repressão policial, no autoritarismo e na coação. A partir daí, dirigentes e militantes do PCB, assim como de outras forças políticas e so-ciais, passam a ser ferozmente perseguidos, presos, torturados ou assassinados, e suas organizações sofrem intervenção.

57Poder Local O Desafio da Democracia•

A ditadura militar e a estratégia vitoriosa de isolá-la e derrotá-la

Na sua primeira reunião plenária, após o golpe, em maio de 1965, no estado de São Paulo, o Comitê Central, em profunda

clandestinidade, aprova uma Resolução Política pela maioria dos 32 dirigentes presentes, adotan-do a tática de, por meio do movimento de massas, “isolar e derrotar a ditadura e conquistar um go-verno amplamente representativo das forças anti-ditatoriais”. Foi uma das principais forças a criar o MDB, que se transformou no principal instrumen-to político para isolar e derrotar a ditadura.

Em dezembro de 1967, na clandestinida-de, realiza-se o VI Congresso, que reafirma e de-senvolve a linha política do congresso anterior, ressalta que a tarefa mais imediata é a luta contra a ditadura, a fim de isolá-la e derrotá-la, e assim conquistar as liberdades democráticas. Para tanto, é necessária a constituição de uma frente única de todos aqueles que lutam pela democracia no país. O Partido propõe a luta pela anistia política, pe-las liberdades de organização e de expressão, pelas eleições diretas em todos os níveis e pela convoca-ção de uma Assembléia Nacional Constituinte.

A ação política do PCB, de 1968 a 1972, é dedicada a pôr em prática essas resoluções do seu VI Congresso. Praticamente recomposto dos gol-pes sofridos, o Partido intensifica sua ação políti-ca, e se joga por inteiro na campanha eleitoral de 1974, nas fileiras do MDB, tendo papel destacado na grande vitória política e eleitoral obtida em ou-tubro. Porém, sofre a partir daí novos e rudes gol-pes por parte da repressão, tendo grande número de dirigentes e militantes presos, torturados e al-guns assassinados. Vários membros do CC foram seqüestrados e mortos, o que obriga a direção (pe-quena parte dela apenas fica no país) a exilar-se.

Justamente no mo-mento em que o PCB re-compõe suas forças e co-meça a reaparecer na vida política, por meio do Centro Brasil Democrático, orga-nismo político amplo pre-sidido pelo arquiteto Oscar Niemeyer, e coordenado por Renato Guimarães, sur-

ge inesperadamente o desencadeamento de uma acirrada luta interna no seio da direção no exte-rior. Em 1979, beneficiada pela anistia, a direção volta do exílio trazendo consigo uma série de divergências, partidas de seu secretário-geral e mais alguns dirigentes e militantes, que passam a um conflito aberto com o Comitê Central. A luta chega ao auge, quando Luís Carlos Prestes lança, em março de 1980, a sua Carta aos Comunistas, na qual faz violentos ataques e uma série de acu-sações ao CC, além de propor de forma genérica e não explícita uma mudança na linha política. Nesse mesmo mês, a direção lança o semanário A Voz da Unidade, que cumpriu importante pa-pel de divulgação das idéias e propostas dos co-munistas, durante vários anos, e se constituiu em instrumento de debate e de estímulo a ações polí-ticas, sociais e culturais da sociedade brasileira.

Em maio de 1981, o Partido lança as Te-ses para um Debate Nacional de Comunistas pela Legalidade do PCB. Dos debates, deriva uma proposta de orientação política, que o Encontro Nacional de Comunistas, iniciado em dezembro de 1982 e interrompido pela Polícia Federal, que prende todos os seus participantes, tem prosse-guimento clandestinamente ao longo de 1983 e concluído em janeiro de 1984, aprova quase que por unanimidade. Este VII Congresso elege um novo Comitê Central e na sua Resolução Política mantém as linhas mestras da política desenvolvi-da a partir de 1958, reelaborando e avançando em algumas questões.

Com a derrota no Congresso Nacional da emenda que se apoiava na campanha de rua pelas “diretas já”, exigindo eleições pelo voto popular para a Presidência da República, que reune as maiores multidões da história brasileira, duran-te todo o ano de 1984, nas principais cidades, o pleito indireto ocorre em janeiro de 1985. O PCB é o único partido de esquerda a apoiar a disputa mesmo no terreno espúrio imposto pelo inimi-go, o Colégio Eleitoral, composto por senadores e deputados. Tancredo Neves, do PMDB, tendo como vice José Sarney, que rompera com o PDS, do qual fora presidente, liderou a Aliança De-mocrática, que vence Paulo Maluf. Com a morte inesperada de Tancredo antes mesmo de ser em-

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possado, Sarney assume a pre-sidência em abril.

Graças à luta dos comu-nistas e dos democratas, o PCB ganha a sua legalidade no dia 8 de maio daquele ano. E dois anos depois, pela primeira vez, faz um seu congresso, o VIII, à plena luz do dia. Ele é extraor-

dinário e realizado em Brasília, em julho de 1987, contando com a presença de delegados de todos os estados. Trata-se de um momento rico para a política e a história do país, pois a Constituinte desenvolvia seus trabalhos, a crise econômica já ganhava contornos de gravidade e as lutas sociais ganhavam as ruas. Nesse Congresso, são discuti-das as tarefas e exigências do período de transição democrática, tendo o partido apontado caminhos para o aprofundamento das conquistas. Salomão Malina é eleito para a Presidência do PCB em substituição a Giocondo Dias, que se encontra enfermo. É um encontro dos mais democráticos e que permite uma grande renovação de direções, em todos os níveis.

A bancada do PCB no Congresso Cons-tituinte, apesar de contar com apenas três par-lamentares (deputados Augusto Carvalho, Fer-nando Sant’Anna e Roberto Freire), é tão ativa e articulada, e oferece tal nível de colaboração, que “valia como se tivesse trinta membros”, como disse o deputado Ulisses Guimarães, pre-sidente do CNC. O Partido foi um dos pou-quíssimos a apresentar proposta completa (em forma de livro) sobre as principais questões que seriam analisadas e discutidas pelos constituin-tes, e este é um diferencial. Por sua vez, o líder Roberto Freire, como membro da Comissão de

Sistematização, contribuiu, de forma decisiva, para o encaminhamento e aprovação de vários de seus capítulos. Destaque-se também que, na esquerda, o PCB é o único que se manifesta po-sitivamente pela aprovação da nova Carta, mes-mo reconhecendo nela algumas deficiências. Alguns dos partidos, como o PT, chegam a ser veementes na condenação do novo texto consti-tucional, a ponto de ameaçarem não assiná-lo e até rasgá-lo em praça pública.

Na primeira eleição presidencial no Brasil, pelo voto direto, após a ditadura militar (28 anos depois, portanto), em 1989, o PCB audaciosa-mente lança candidato próprio. É a oportunidade de apresentar-se aos brasileiros, mostrando suas idéias e propostas, e a sua diferença dos demais partidos de esquerda. Dessa forma, ganha maior visibilidade, ao tempo em que revela uma nova e moderna liderança nacional – o deputado Ro-berto Freire. No segundo turno, o Partido apóia a candidatura de Luís Inácio Lula da Silva. Por uma série de fatores, dentre os quais a dificuldade do PT em costurar alianças mais amplas, por força de uma visão hegemonista ou mesmo exclusivis-ta, Fernando Collor ganha a eleição.

O PCB, que desde a primeira hora do go-verno Collor, demonstra sua postura oposicionista diferenciada do restante da esquerda, é duro ad-versário de certo tipo de política. Daí fazer severas críticas ao PT e aos demais partidos oposicionistas por terem criado uma espécie de Governo Parale-lo, como se estivéssemos num regime parlamen-tarista. Na verdade, tratava-se de uma iniciativa bastante equivocada, pois tentava desconsiderar a existência de um governo legal e legítimo, produto da maioria dos votos dos brasileiros.

59Poder Local O Desafio da Democracia•

A renovação interna que o Partido vinha discutindo ganha uma dinâmica maior com a queda do muro de Berlim e a der-

rocada do “socialismo real” no Leste europeu. As divergências da corrente renovadora com a conservadora, no seio do partido, manifestam-se na Tribuna de Debates da Voz da Unidade, pas-sando pelos encontros preparatórios nas cidades e estados, até desembocarem no IX Congresso, em junho de 1991, no campus da UFRJ, no Rio de Janeiro. Sua Resolução Política, aprovada por expressiva maioria, traz a marca da renovação, rompendo com concepções dogmáticas e supera-das pela realidade. A viragem aí iniciada lembra em muito o ocorrido em 1958. Indicado pelo ve-terano Salomão Malina, o então deputado Ro-berto Freire é eleito o novo presidente nacional do PCB, tendo a chapa por ele liderada disputado com duas outras, uma encabeçada pelo arquite-to Oscar Niemeyer e outra pelo vereador gaúcho

Lauro Hageman, que ob-têm respectivamente 54%, 36% e 10% dos votos. As-sim, pela primeira vez, a votação para o novo Dire-tório Nacional é propor-cional aos votos obtidos por cada chapa e secreta, e não mais uninominal, com voto aberto.

Além do avanço crescente das idéias e pro-postas renovadoras que os principais dirigentes do Partido assumem publicamente e que se cho-cam com a estrutura orgânica defasada, há nos meios de comunicação uma sistemática campa-nha de desmoralização dos comunistas, sem falar que a convivência interna entre os setores renova-dores e os que resistem a enfrentar as mudanças dificulta o encaminhamento da rica e audaciosa Resolução Política do IX Congresso. Ressalte-se ainda que lideranças de outros partidos e mesmo sem partido aproximam-se do PCB, identifican-do-se com sua política. É assim que a nova direção pecebista, com amplo respaldo das direções esta-duais, decide convocar o X Congresso, extraordi-nário, para janeiro de 1992, em São Paulo, o qual,

dando seqüência às profundas mudanças inicia-das, altera o nome e a sigla de Partido Comunista Brasileiro (PCB) para Partido Popular Socialista (PPS). Setenta e dois por cento dos delegados es-colhidos em todo o país chancelam no Congresso o que já haviam feito nos encontros preparatórios a decisão aprovada por 71% dos membros do Di-retório Nacional. E o PCB se torna o primeiro PC no continente a mudar radicalmente sua política, sua estrutura orgânica e sua simbologia.

Inicia-se o ano de 1993 com o vice-pre-sidente Itamar Franco assumindo definitiva-mente a Presidência da República, após o impe-achment de Fernando Collor, processo con-cluído no Congresso Nacional, no dia 30 de dezembro de 1992. O

PPS, que apóia de imediato o novo governo, com-preendendo que ele não possuía nada com o ante-rior, é convidado, na pessoa do deputado Roberto Freire, seu dirigente máximo nacional, a dele fazer parte, no papel de líder da bancada do governo na Câmara Federal. Exceção do PT e do PDT, a esquer-da e o centro passam a ter papel destacado na nova conformação do poder. Em abril desse ano, realiza-se o plebiscito sobre forma e sistema de governo, por meio do qual os brasileiros puderam, mesmo que sem a mobilização e o nível de discussão desejá-veis, conhecer as opiniões e manifestar-se em favor da república ou da monarquia, do presidencialismo ou do parlamentarismo. As forças de esquerda e de centro, uma vez mais, se dividem: PT, PDT, PSB e PMDB são favoráveis ao presidencialismo vitorio-so; o PSDB, PPS e PCdoB lutam pelo parlamenta-rismo. Outra batalha política curiosa e estranha é a da revisão constitucional, colocada no texto da Car-ta de 1988 por exigência dos partidos de esquerda, particularmente o PT. Quando veio o tempo para revisão, apenas o PPS se mantém favorável, todos os demais partidos de esquerda se colocam frontal-mente contra alterar o texto constitucional.

Processo de renovação no PCB, crise do “socialismo real” e período de transição

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No ano da eleição presidencial de 1994, o PPS continua insistindo na construção de um bloco de centro-esquerda, o único capaz de ga-nhar a eleição no processo sucessório de Itamar e realizar as reformas que o país reclama. As articu-lações com o PT, de um lado, e o PSDB, do outro, por razões as mais diversas, não redundam na ne-cessária unidade dessas decisivas forças. O Parti-

do, em sua convenção nacional, decide apoiar a candidatura da Frente Brasil Popular, encabeçada por Lula, embora tendo divergências claras e ex-plícitas quanto à estreiteza da frente política e no tocante à condução da campanha eleitoral, prin-cipalmente no grosseiro erro de subestimar e até mesmo ridicularizar o Plano Real e seus alcances para a economia e para o povo brasileiro.

C om a vitória de Fernando Henrique e a sua posse, em janeiro de 1995, o Partido se coloca em sua postura de oposição,

sem abrir mão de “sua responsabilidade de lutar por avanços e conquistas democráticas, agora e já”. No seu XI Congresso, no Rio de Janeiro, em abril de 1996, o PPS realiza um balanço bastante

positivo após a mudança de nome, tendo incorpo-rado milhares de novos filiados e se organizado em todo o país, além do reconhecimento como um ativo participante da cena política brasileira. Em sua Resolução Polí-tica, após denunciar “a crescente submissão do governo democrático de

FHC a uma base de sustentação política, majo-ritariamente fisiológica e conservadora, insensí-vel às reivindicações da maioria da população e também às conquistas da modernidade” e propor que o governo “precisa fazer uma inflexão nes-ta sua perigosa caminhada”, o PPS declara que “a esquerda não pode omitir-se deste debate e desta responsabilidade” e “reforçar uma lógica oposi-cionista destituída de potencial transformador”. O Partido procura convencer a oposição de que, heterogêneo como era o governo, se ela agisse corretamente poderia reforçar os seus setores de-mocráticos e progressistas e fazê-los avançar para uma política de interesse do país. Porém, uma vez mais, o PPS não foi ouvido nem considerado.

Um fato novo na vida política brasileira é o processo de aproximação, em 1997, entre o PPS e o ex-ministro Ciro Gomes. O senador Roberto

Freire convida-o para um encontro formal com a direção nacional, para que se conhecessem nas idéias que professavam e nos projetos que ali-mentavam. Com a crescente identidade revelada em outros encontros com dirigentes e militantes, define-se a saída de Ciro do PSDB, partido do qual foi fundador, para o PPS, o que ocorre no dia 27 de setembro. Em 1998, o PPS apresenta à na-ção sua candidatura à Presidência da República, tendo Ciro Gomes obtido cerca de 10% de votos e dado maior visibilidade ao Partido.

Em março de 1999, o Partido lança docu-mento no qual, após condenar palavras de ordem e ações partidárias e sociais, de natureza golpista (tipo “fora FHC”, “antecipação de eleições”), en-volvendo todos os partidos de esquerda, concla-ma, mais uma vez, estas forças e as de centro a celebrarem um Diálogo Nacional, “movimento de convergência que possa gerar um projeto de desenvolvimento nacional e um novo bloco po-lítico democrático, capaz de obter sucesso nas eleições municipais de 2000 e de abrir espaços para uma vitória consagradora em 2002”. No fi-nal do ano, o Partido promove Encontro Nacional e lança o Manifesto pela democracia, pelo diálogo e pela esperança, acentuando que “a Nação bra-sileira apresenta grandes avanços democráticos

e um despertar cres-cente da importância da cidadania, e não corre o risco do caos e da sua desconsti-tuição. Apesar dos gravíssimos desequi-líbrios sociais e re-gionais, a economia do país oferece muita

Anos de oposição propositiva e de candidatura própria

61Poder Local O Desafio da Democracia•

vitalidade, o que assegura a esperança e a pos-sibilidade da retomada do desenvolvimento sob novos paradigmas”.

No mês de outubro de 2000, mesmo sem conseguir seu intento de congregar amplas forças no mesmo projeto, mas tendo se preparado para o pleito municipal, o Partido obtém bons resulta-dos, ao eleger 410 entre prefeitos e vices e 2.642 vereadores. Em dezembro, promove Encontro Na-

cional, em Brasília, para um balanço das eleições. Mais de 400 prefeitos, vi-ces e vereadores eleitos discutiram o Poder Local e as suas responsabilida-des para integrarem as comunidades na gestão compartilhada munici-pal. A Fundação Astro-jildo Pereira lançou, na ocasião, o número expe-rimental da revista teóri-

ca Política Democrática, cujo objetivo principal “é o debate das alternativas teóricas e práticas que se põem à esquerda, hoje, nos planos global, na-cional e local”. A publicação quadrimestral surgiu tendo como referência revistas abertas como Te-mas de Ciências Humanas, Presença, Estudos So-ciais e Civilização Brasileira.

Em março de 2001, instala-se, oficialmen-te, a Fundação Astrojildo Pereira, instituída pelo Diretório Nacional do PPS, em meados do ano anterior. O ato solene reuniu, em Brasília, pesso-as ligadas à política, à cultura e às artes de vários estados brasileiros. Presidida pelo cineasta Vla-dimir Carvalho, a FAP conta em seu Conselho Curador com nomes da qualidade da atriz Bete Mendes, do poeta Ferreira Gullar, do ex-minis-

tro da Cultura Nascimento e Silva, dos cineastas João Batista de Andrade e Silvio Tendler, da física Dina Lida Kinoshita, do sociólogo Luiz Werneck Vianna, do constitucionalista Paulo Bonavides, da educadora Linda Monteiro, dentre outros.

Em manifesto lançado no dia 1º de abril, Unir para mudar o Brasil, o Diretório Nacional do PPS concluiu “pela necessidade de se articular novamente uma outra aliança, igualmente ampla (como a que isolou e derrotou a ditadura militar), só que para atingir um outro objetivo: o de uma sociedade ainda mais democrática, justa do ponto de vista social, ambientalmente equilibrada e que tenha capacidade para levar a todos os brasileiros os benefícios do progresso, da ciência e da cultu-ra”. A partir daí, por articulações das principais lideranças do PPS, começa a se construir nova aliança para a próxima disputa presidencial.

Ao completar 80 anos, em março de 2002, o PPS realiza o seu XIII Congresso, em Niterói (berço do partido), no qual lança novamente a candidatura Ciro Gomes pela Frente Trabalhis-ta (PDT-PTB-PPS), com a proposta de mudar o Brasil, ampliar a democracia e reduzir a exclusão social. Nas eleições de 6 de outubro, nossa can-didatura presidencial obteve o apoio de mais de 10 milhões de votos (12% do eleitorado) e serviu de suporte para elegermos 15 deputados federais. Apenas 48 horas após o 1º turno, a Executiva Na-cional reune-se, em Fortaleza, para declarar que “continua apostando nas mudanças e que, mesmo mantendo com o PT divergências programáticas, o nome que melhor representa os anseios do povo brasileiro, nesse momento, é o de Lula”.

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O governo Lula e o fim de um ciclo político

Na sua primeira reunião anual, em 2003, no mês de maio, em Brasília, o Diretó-rio Nacional do PPS, após ouvir seus

integrantes, sua bancada de deputados e gover-nadores, lança o documento Rumo às Reformas, em apoio ao governo Lula, e já alertando que “as contradições na base de apoio ao governo e os conflitos internos do PT, cada vez mais visíveis, são reais limitações para a elaboração de uma estratégia de desenvolvimento sustentado, com geração de emprego e renda e mais justiça so-cial, alicerçada na construção de um bloco de forças democráticas e progressistas”.

Já no inicio do ano seguinte, ao avaliar a conjuntura nacional, analisando o primeiro ano do governo Lula, o Diretório Nacional do PPS divulga documento no qual compartilha das “expectativas populares de mudanças sociais efetivas e, nesse sentido, trabalhará no âmbito da aliança governamental”, e conclama o governo a “refletir mais sobre o processo de condução das reformas, corrigindo erros e ampliando o seu debate na base partidária aliada, no parlamento e na sociedade, para dar mais solidez e garantir maior legitimidade às suas propostas”.

Em março de 2004, realiza-se o XIV Con-gresso Nacional do PPS, tendo por tema Poder Local: O desafio da democracia. No documen-to Mudar o Brasil é possível, o Partido começa a pontuar suas diferenças com a política geral levada a cabo pelo governo Lula. Em 2 de agos-to, o Diretório Nacional lança o documento Sem mudança não há esperança, no qual afirma que “depois de mais de um ano e meio de governo, pouco foi feito, a rigor, para superar as condições sociais e as dificuldades econômicas do passado, remoto ou recente”.

O Diretório Nacional do PPS reúne-se, no dia 11 de dezembro, para debater e definir a postura do Partido frente ao governo Lula e o projeto político comum entre o PPS e o PDT. Lança, então, o documento Ousadia para corri-gir os rumos do Brasil, no qual o PPS formaliza seu afastamento do governo e entrega os cargos, na esfera federal, argumentando que “durante mais de dois anos de mandato, o governo igno-rou solenemente o PPS como Partido, sempre virou as costas às sugestões e críticas emanadas

da Direção Nacional e, pior, articulou-se aber-tamente para intervir em nossos assuntos inter-nos, incentivando dissidências e buscando blo-quear, a qualquer custo, o nosso crescimento em escala nacional”. Finalizando, afirma querer que “o Brasil dê certo e o governo, com a orientação que sugerimos, poderia sempre contar com o nosso apoio no caso de afirmar propostas real-mente transformadoras”.

Nova onda de denúncias de corrupção do-mina o ano de 2005, ocasião em que a Comis-são Executiva do PPS, em nota pública, no mês de março, aborda o caso do “mensalão”, sistema que envolve figuras exponenciais do governo e do PT sobre partidos aliados e seus dirigentes, assim como sobre membros do Congresso Na-cional. Defende que, “para superação da crise, é indispensável a apuração completa de todas as denúncias”, sendo igualmente importante “a abertura imediata do diálogo institucional do governo com todos os partidos, a partir de uma Agenda Mínima de Reformas, capaz de garantir as mudanças que o povo requer e a governabili-dade”. Além de propor o afastamento imediato, para apuração, de todos os integrantes do gover-no alvos de denúncias de corrupção, a instalação imediata da CPI Mista dos Correios, a criação e instalação da CPI Mista do Mensalão, o PPS rei-vindica o regime de urgência para a tramitação da reforma política, com destaque para o finan-ciamento público de campanha, a fim de possi-bilitar uma responsável e completa investigação de todos os fatos, e que seus autores, se realmen-te comprovadas suas culpas, sejam punidos.

Um mês depois, a Executiva Nacional constata, em declaração pública, que se inten-sificaram as denúncias e as evidências de atos ilícitos, ressalta a necessidade de “dar todo o po-der às CPIs, fóruns fundamentais para reforçar o papel do Congresso Nacional como instância legítima para a saída democrática dos impasses hoje vivenciados pelo país” e adverte que “sob nenhuma hipótese pode o Congresso Nacional ser desmoralizado por acordos, manobras ou arranjos de ocasião que impeçam a total e com-pleta apuração dos fatos e punição de todos os responsáveis”. Por fim, ressalta a certeza de que “sairemos da crise com o fortalecimento das ins-tituições democráticas”, e conclama a sociedade

63Poder Local O Desafio da Democracia•

para que se mobilize “na construção de um Bra-sil decente”.

Além de fazer um balanço da trajetória partidária do PPS, desde o seu advento, em 1992, período em que teve reforçada sua convicção da validade dos princípios e valores que defende e da pertinência de suas propostas reformistas, as-sim como experimentou um significativo forta-lecimento em organização e expressão eleitoral, o XV Congresso, em 2006, examina a conjuntu-ra internacional e nacional e sobre ela se mani-festa. Para lutar por essas propostas e realizá-las, no governo, o PPS lança a pré-candidatura de Roberto Freire à Presidência da República, “po-lítico experiente, decente, com uma vida pública provada por quase quatro décadas, preparado para dialogar com a sociedade e enfrentar os de-safios agendados por ela” e assinala que, como partido, continua aberto ao diálogo na busca da construção de um outro país, de um Brasil justo e decente.

Quando de sua Convenção Nacional, rea-lizada no Rio de Janeiro, em junho, o PPS, por ex-pressiva e larga maioria, tendo em vista as imen-sas dificuldades de construir um bloco político com o PDT, PV e PHS e sobretudo face ao desafio de ter que ultrapassar a cláusula de barreira de 5% de votos para as eleições de deputado federal, achou conveniente retirar a candidatura de Ro-berto Freire e apresentar o indicativo de apoio a Geraldo Alkimin, do PSDB.

Reeleito Lula, num segundo turno muito disputado, e ao assumir seu segundo mandato, a partir de 2007, permanece no mesmo caminho, revelando a ausência de um projeto transforma-dor para o país. Em nota pública, o PPS desve-la a insistência de Lula e do PT em tão-somente manterem-se no poder a qualquer custo, a pon-to de terem montado uma estrutura que envolve grupos de interesses antagônicos (corporações empresariais e de sindicalistas, de elites e de ex-cluídos, atendidos em seus pleitos essenciais), um verdadeiro “Estado Novo” do PT que, em tudo,

lembra o Estado Novo varguista, até na veleidade de trabalhar, veladamente, pela continuidade de Lula no Planalto.

Colocando-se contra esta tentativa traba-lhada subliminarmente pelo presidente e seu esta-do-maior de vislumbrarem um terceiro mandato, o PPS defende o respeito às instituições e à von-tade popular, ao tempo em que não participa de qualquer movimento golpista do tipo “Fora Lula”, aliás irresponsável bandeira associada à história do PT. Entretanto, alerta o PPS sobre como é po-liticamente chocado o ovo da serpente e “qual-quer atitude do governo que aponte nesta direção terá a decidida oposição do partido. A democra-cia, tão cara ao povo brasileiro, é um bem maior, deve ser estável, tolerante e duradoura”.

Promover uma ampla reforma no Es-tado brasileiro para lhe tornar mais ágil e livre de interesses privados restritos e coorporativos; construir uma nova formação política no país, compromissada com os ideais da esquerda de-mocrática e mais próxima das necessidades reais do cidadão; trabalhar por uma nova cultura eco-nômica, que não se baseie apenas nos interesses “frios” do mercado, mas que leve em conta o de-senvolvimento com respeito ao meio ambiente e a garantia de formas concretas de redução das desigualdades sociais. Esses foram alguns dos pontos centrais da declaração aprovada no dia 21 de agosto, no auditório Nereu Ramos, da Camara dos Deputados, no encerramento da Conferên-cia Caio Prado Jr. Durante três dias, mais de 300 pessoas, entre políticos de diversos partidos, inte-lectuais, sindicalistas, lideranças sociais e repre-sentantes dos mais variados setores da sociedade, debateram os rumos da esquerda e seu projeto para o Brasil. O evento – promovido pelo PPS e pela Fundação Astrojil-do Pereira – discutiu também meios de intro-duzir valores e compor-tamentos, particular-mente de sentido ético, capazes de provocar uma revolução na cul-tura política do país, na forma de exercer man-datos, de ser governo e de se relacionar com a sociedade civil, tendo sempre a premissa do Brasília – Agosto – 2007

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trato correto da coisa pública. A conferência se constituiu num primeiro e essencial passo para estimular a criação de um movimento amplo e sem hegemonismo capaz de construir e viabili-zar soluções para os graves problemas do país, em busca da construção de uma esquerda democrá-tica capaz de estimular uma nova forma de fazer política e de criar uma nova perspectiva para os brasileiros.

•••

Como se constata por essa brevíssima his-tória, o PCB/PPS é, em seus 86 anos de existência, um dos poucos partidos oriundos da esquerda democrática que busca uma proposta viável para responder aos desafios da sociedade brasileira, e se constitui um operador incansável na batalha comum para se concretizar de forma coerente os ideais democráticos e republicanos, e os de cida-dania plena e de justiça social.

Durante toda a sua trajetória, deixou sua marca na história. Lançou o movimento pela uni-dade e autonomia sindicais (ainda nos anos 20), iniciou a discussão da reforma agrária (anos 50) quando o assunto ainda era tabu, assim como he-gemonizou ou integrou como um dos seus líde-res todos os movimentos de luta pelas liberdades,

pela cidadania e pela eqüi-dade no país. Foi o primeiro a defender e deixar na Cons-tituição (em 1946) a liber-dade religiosa para milhões de adeptos dos cultos de origem africana. Foi pionei-ro também em apresentar (em 1979) um documento de luta pela igualdade de di-reitos da mulher, concebido por Zuleika Alambert, hoje

com 85 anos, com propostas para os campos do trabalho, da família, e da vida política.

Tendo atraído para suas fileiras alguns dos mais expressivos nomes da cultura brasileira, o PCB deu contribuição histórica decisiva para a afirmação e desenvolvimento dela, graças à ação de personalidades do quilate de: na literatura (prosa – Oswald de Andrade, Patrícia Galvão-Pagu, Jorge Amado, Graciliano Ramos, Rachel de Queirós etc.; poesia – Carlos Drummond de

Andrade, Moacyr Félix, Solano Trindade, Ferreira Gullar, José Carlos Capinam etc.), nas artes plás-ticas (Cândido Portinari, Djanira, Di Cavalcanti, Rubens Gerchmann etc.), no teatro (Gianfrances-co Guarnieri, Oduvaldo Viana pai, Álvaro Mo-reyra, Paulo Pontes etc.), na MPB (Ataulfo Alves, Silas de Oliveira, Mário Lago, Noca da Portela, Nora Ney etc.), na bossa nova (Carlos Lyra, Nara Leão etc.), nos Centros Populares de Cultura (Au-gusto Boal, Oduvaldo Viana Filho, Arnaldo Jabor, Carlos Estevam Martins etc.), na música clássica (Cláudio Santoro, José Siqueira etc.), no cinema (Alex Vianny, Nelson Pereira dos Santos, Leon Hirzmann, João Batista de Andrade, Vladimir de Carvalho, Silvio Tendler etc.), nas ciências exatas (Mário Schemberg, Luiz Hildebrando Pereira da Silva, Dina Lida Kinoshita, Catulo Branco etc.), na arquitetura (Oscar Niemeyer, Vilanova Artigas, Cydno da Silveira etc.), nas ciências sociais (Caio Prado Júnior, Edson Carneiro, Nelson Werneck Sodré, Alberto Passos Guimarães, Edgard Carone, Luiz Werneck Vianna etc.), na educação (Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro, Moacir Góes etc.), na psi-canálise (Helena Besserman, Nise da Silveira etc.), no humor (Aparicio Torelly – Barão de Itararé, Ja-raraca e Ratinho, Francisco Milani etc.), no espor-te (Leônidas da Silva, João Saldanha, Didi etc.), na televisão (Dias Gomes, Bete Mendes, Stepan Ner-cessian etc.), feministas (Zuleika Alambert, Abi-gail Páscoa, Almira Rodrigues, Iaris Cortês etc.).

Hoje, o PPS é um partido contemporâneo, democrático, socialista, inspirado na herança hu-manista, libertária e solidária dos movimentos sociais e das lutas dos trabalhadores no Brasil e no mundo. Isso se reflete na defesa de um pro-jeto político reformador e capaz de transformar para melhor a realidade socioeconômica e po-lítica: uma ação centrada na democracia, o que requer um comprometimento firme e ético com os princípios da liberdade e do pleno exercício da cidadania; a prevalência dos interesses públi-cos sobre os privados; uma visão de mundo pro-gressista, amparada na justiça e na solidariedade; ampliação da luta em defesa do meio ambiente, pela qualidade de vida e pela igualdade dos di-reitos de todos os cidadãos e cidadãs brasileiros, sem qualquer distinção nem preconceito de raça, etnia, cor, religião, idade, origem, gênero, opção sexual etc.

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22. Planejamento e gestão da campanha*

As eleições estão para os partidos e polí-ticos assim como a final do campeonato está para os times de futebol. É o mo-

mento maior da atividade, aguardado por todos com ansiedade e, muitas vezes, com apreensão. Assim como no esporte, a política tem sua lógi-ca, apesar das crenças em contrário. E essa lógica, no futebol, é comprovada em todo o campeonato, seja estadual, nacional ou mundial. Eles são, em sua maioria, decididos por um número reduzido de times. E por que são sempre os mesmos clubes chegando às finais?

As respostas básicas são duas:

a) Capacidade de organização, criada por uma série de fatores, entre eles o dinheiro e;

b) Capacidade de motivação dos jogadores e das torcidas.

Na política também a capacidade de se or-ganizar e de motivar a torcida, no caso a militân-cia e o eleitorado, é fator decisivo quando chega a hora da decisão.

Objetiva-se contribuir com os candidatos do PPS nessa árdua, porém gratificante, jornada em busca de espaço nos poderes municipais nas eleições de 2008. Porém, longe de nós a pretensão de ensinar candidatos a serem candidatos. Nada mais desejamos que colaborar para iluminar ca-minhos, contribuindo para racionalizar campa-nhas, economizar recursos escassos e, desta forma, ajudar a conquistar a simpatia dessa pessoa arisca

chamada eleitor e, conseqüentemente, lugares ao sol para nossos candidatos e nosso partido.

A vitória começa em casa e cedo

Você se colocou como pré-candidato e está disposto a se apresentar à convenção do partido pleiteando uma vaga nas chapas que vão se formar.

Campanhas eleitorais são muito envolven-tes. Nelas, o candidato vai, aos poucos, perdendo o controle sobre o seu tempo. As rotinas conhe-cidas desaparecem e são substituídas por outras muitas vezes inesperadas. Portanto, é no iniciozi-nho da campanha que algumas iniciativas funda-mentais devem ser tomadas.

1) Uma delas, importantíssima, é o envol-vimento de toda a família. No caso das candida-tas, esses esclarecimentos são fundamentais. Os filhos devem estar convencidos do caminho to-mado pelo pai ou pela mãe. O apoio da família é essencial. A campanha tem de começar com essa questão bem resolvida.

2) A questão financeira: Eu tenho dinheiro para bancar a campanha ou tenho onde buscá-lo? A resposta a essa pergunta é crucial. Campanha sempre exige algum dinheiro. Esses recursos têm de estar garantidos até uns 60 dias antes da eleição. Mas ninguém deve ficar enxergando o diabo mais feio do que ele é na realidade. As campanhas nem sempre são o sorvedouro de dinheiro que muitos imaginam. Tudo depende do candidato, suas rela-ções, o tipo de trabalho que desenvolve na comuni-

* Nossos agradecimentos aos companheiros e publicitários mineiros Carlos Pereira e Sergio Esser, assim como a Adão Candido pela colaboração na elaboração deste material.

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dade. E, à medida que o trabalho eleitoral começa e o candidato vai crescendo, os apoios vão aparecen-do. É impossível definir custos em termos de mate-rial, publicidade etc. Isso depende do tamanho do eleitorado, sua distribuição pela base eleitoral etc. Mas, por mais barata que seja a campanha, algum dinheiro terá de ficar à mão.

Minha saúde aguentará o ritmo de campa-nha, com os dias cada vez mais longos e noites cada vez mais curtas, e comidas muitas vezes in-digestas? A essa pergunta a resposta até pode ser o mais-ou-menos, pois, dependendo da situação, dá para se conciliar algumas escapadas para des-canso, mesmo no auge da campanha.

3) Eu sou um candidato pragmático, bus-cando na política possibilidades de enriquecimen-to material ou atendimento a vaidades pessoais ou sou do tipo idealista, que pretende contribuir para o bem do país e da comunidade onde vivo? A resposta a essa pergunta pode ser fundamen-tal em um Partido como o PPS, comprometido com um programa de mudanças para a nação. O entrosamento entre o candidato e o conjunto par-tidário é muito importante Uma postura pragmá-tica pode inviabilizar o nome do candidato nas convenções partidárias.

4) Eu tenho condições de reunir em torno de meu nome um número suficiente de pessoas que ajudem na campanha?

Público-alvoSão aqueles para os quais a campanha será feita, homens e mulheres, acima de 16 anos, com título de eleitor em dia, de uma determinada área geográfica, bairro ou distrito ou segmento social ou profissional. No iní-cio da campanha, essa é um das primeiras escolhas, pois ela determina todas as outras.

Preparando o timeFeito o exame de consciência, agora é entrar em campanha, dividida em três fases em termos de en-volvimento do candidato – fria, morna e quente. Estamos em plena fase fria. Os contatos em busca de apoios estão sendo feitos – lideranças comunitárias e religiosas, amigos, familiares, vizinhos e moradores dispostos a ceder muros e lugares para futuras faixas, espaço para comitês, a enviar cartas aos círculos de relações pedindo votos etc. E, importantíssimo, começam os contatos financeiros em busca de apoio,

Agora também começa a estruturação das equipes de campanha, pagas ou voluntárias (essas cada vez mais difíceis).

Divisão da equipeMesmo sem o saber, um candidato, independente da dimensão de sua campanha, desempenha, ou tem alguém desempenhando para ele, algumas funções cujos nomes podem até assustar à primeira vista e que passamos a enumerar.

Assessor de marketing: Esta é peça-chave. Deve ser uma pessoa de idéias claras, com visão do con-junto e de cabeça fria. Dará as linhas gerais da campanha. Definirá o comportamento do candidato (deve ser radical ou suave? Bater ou afagar os adversários?), coordenará debates, se houverem e opinará até no tipo de roupa do assessorado. Em resumo, ele embrulha o postulante para presente, de forma a agradar o eleitor.

Assessor político: Tem de ser uma pessoa gozando de ampla confiança do candidato e sua família e, obviamente, com experiência e aptidões para a função. Vai articular alianças políticas, atender rei-vindicações, definir a agenda do candidato e administrar o trabalho de cabos eleitorais, militantes e simpatizantes.

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Assessor de administração e finanças: é até inútil ressaltar a importância desse cargo. Nele, além das fundamentais questões de dinheiro, concentram-se responsabilidades como organizar comícios, panfletagens, transportes, recebimento e despacho de materiais e toda a infinidade de tarefas que mantêm a campanha em andamento.

Assessor jurídico: Em razão das constantes mudanças na legislação, pesadas multas que as infrações acarretam e da importância do chamado “direito de resposta” a eventuais ataques dos adversários pela imprensa, esse setor deve receber muita atenção. Tem que ser eficiente e, principalmente, ágil, para não perder prazos e oportunidades de conquistar espaços na mídia.

Assessor de comunicação: Nas campanhas menores essa assessoria compreende a redação de textos para faixas, muros, folhetos, definição de pontos para panfletagens e internet. Nas maiores, cuida também das relações com a imprensa de um modo geral. Deve ser ocupada por jornalista de prestí-gio. Mas, atenção, a mídia (rádio, jornal, TV etc.) precisa de notícias. Se o candidato não for capaz de produzi-las, não há assessor que consiga conquistar espaços, por mais prestígio que tenha.

Gerente de comitê: Tem de ser pessoa organizada, de trato ameno, mas firme, pois lidará com pessoas de todos os tipos, muitas delas voluntárias, e com o máximo de conhecimento possível das novas tecnologias possíveis de serem usadas na campanha.

Coordenador de campanha: O trabalho da equipe deve ser articulado, com todos trabalhando em sintonia fina. É aí que entra a figura do coordenador de campanha. Pessoa com visão geral do con-junto e que tomará todas as decisões relativas à burocracia em nome do candidato.

Importante: A equipe deve ficar, desde o início, com sua estrutura hierarquizada claramente, mostran-do a função e a responsabilidade de cada um, para se evitar superposição de comando e conflitos.

Organizando o comitêDefinida a equipe, é hora de se começar a pensar no comitê de campanha, Ou nos comitês, se for o caso. O comitê é o lugar onde acontecerão muitas das coisas mais importantes que poderão contribuir para o sucesso ou não da candidatura. Deve ser localizado em local de passagem de muita gente, em praças e ruas de grande movimento. No auge do processo eleitoral, deve ficar o mais agitado e alegre possível, mostran-do que a campanha decolou. Deve oferecer o máximo de conforto ao candidato, convidados, voluntários e equipes pagas, E dispor de lugar para guarda e conferência de material. Não vá o candidato pagar, por exemplo, por 100 mil folhetos e receber da gráfica apenas 50 mil. A conferência desse material é fácil. Basta contar um pacote com 100 peças, pesá-la e usar o resultado como referência para os demais. Portanto, uma balança, dessas de armazém, será muito útil no caso das campanhas que movimentarão grandes quantida-des de material. Outro jeito de conferir os pacotes é pela altura. Conta-se um a ser usado como referência em relação aos demais.

Além de ser o centro burocrático e financeiro, o comitê é um bom meio para se motivar e envolver visi-tantes e simpatizantes na campanha. Muitas vezes a pessoa passa para uma visitinha rápida a alguém, se empolga com o ambiente e passa a integrar a equipe voluntariamente.

A divisão física de um comitê depende das dimensões da campanha, mas no mínimo tem de ter uma recepção para cercar os chatos e desocupados que infestam sempre esses lugares, uma telefonista para atender, anotar e triar recados, espaço para armazenar e conferir material, um lugar reservado para o candidato descansar e receber convidados, uma copa/cozinha, banheiros, mesa telefônica e uma área para atendimento a panfleteiros.

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No caso dos candidatos a prefeito mais abonados, seria o caso de manter uma pequena gráfica e um laboratório fotográfico para fotos e revelações de emergência. Vai que ele consegue foto inesperada com uma personalidade qualquer e precisa mandar o material com urgência para os jornais... E, conforme a dimensão da campanha, há necessidade de uma sala de imprensa.

Um comitê de um modo geral, quando a campanha pega, vive cheio de gente, a maioria só sapeando, além dos doidos que, geralmente, dão as caras, com as soluções mais estapafúrdias para garantir a vitória. Mas todos têm que ser ouvidos, pois, de repente, no meio de muita asneira, pode surgir uma boa idéia.

A participação das pessoas no comitê também é uma boa referência para o andamento da campa-nha. Vamos supor que, numa campanha modesta, existam no início umas cinco pessoas agindo. Esse número deve pelo menos dobrar até o final. Caso isso não ocorra, é porque as coisas vão mal.

Propaganda, a alma do negócioEscolhida a equipe, montado o comitê, começa a fase de começar a embrulhar o candidato para presente, preparando-se o tal de marketing político. A primeira coisa a fazer nessa fase é definir qual será a abrangência da campanha, no caso dos candidatos proporcionais. Ele buscará votos pingados em toda a comunidade ou terá um eleitorado específico, o chamado nicho?

Estabelecido seu público principal (o que os publicitários chamam pela palavra inglesa de target = alvo), é hora de elaborar a plataforma eleitoral, Aquilo que será apresentado aos eleitores como meta do candidato, se eleito. Se seu público, por exemplo, forem os ambientalistas, poderá se comprome-ter, sinceramente, a defender os cursos de água da região.

Depois de estabelecida a plataforma, elaboram-se o slogan e a logomarca da campanha – aquele desenhozinho que passará a enfeitar todas as publicações do candidato, visando marcar bem, visu-almente, sua candidatura.

No caso dos candidatos majoritários, essa história de nicho eleitoral fica meio esvaziada, pois quem quer ser eleito prefeito tem de contar com voto em todo o colégio eleitoral.

A definição da plataforma deve ser precedida de uma pesquisa, que pode ser por meio do “Fala, Brasil!” ou se constituir em bate-papos com as fontes habituais de informação em comunidades pequenas – barbeiro, farmacêutico, padre etc. ou reuniões com grupos de pessoas em seus bairros ou ser um trabalho mais amplo, feito por empresas especializadas.

Nessa pesquisa devem ser apuradas as aspirações principais da comunidade-alvo e, também, a imagem que essa comunidade tem do candidato, em termos pessoais – se é simpático, boa praça, ou se é con-siderado agressivo, arrogante etc.

É a partir desse trabalho preliminar que será desenvolvido todo o esquema de propaganda: folhetos, faixas, pinturas de muros, cartazes, jingles.

O uso da internet em campanhas eleitoraisCom a rápida ampliação do número de usuários no Brasil, a internet passa a ser considerada a cada ano um meio de comunicação e de organização mais significativo para auxiliar nas campa-nhas eleitorais do PPS.

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Atualmente, há no Brasil em torno de 40 milhões de usuários que acessam a rede mundial de com-putadores tanto no ambiente de trabalho como em casa regularmente. Isto sem contar os que usam celulares. Estes usuários são em sua maioria jovens que se utilizam da rede para se comunicar com seus colegas de trabalho, amigos, parentes e procurar novas amizades, além de obter informações noticiosas e acadêmicas.

Estima-se que 75% dos usuários brasileiros estejam em idade eleitoral.

A campanha presidencial de 2006 foi um marco decisivo no uso dessa nova ferramenta no Brasil. Os principais candidatos constituíram equipes especializadas para atuar no ciberespaço, espalhando e res-pondendo boatos, mobilizando a militância em momentos decisivos e principalmente mantendo as ba-ses partidárias informadas dos acontecimentos em tempo real.

A eleição de 2008 deve aprofundar o impacto da utilização dessa tecnologia no dia-a-dia das cam-panhas, especialmente nos grandes centros urbanos, onde o número de usuários é mais significativo e onde já começa a existir um uso mais freqüente para fins políticos.

Utilização da internet na pré-campanhaNo período pré-eleitoral é necessário que os pré-candidatos estejam presentes na Rede, com seus “sites”, “blogs”, participando das redes sociais virtuais (como o Orkut), ou mesmo produzindo con-teúdo audiovisual para os portais de disponibilização (como o YouTube). No entanto, devem tomar o cuidado de não ferir a legislação eleitoral declarando-se candidato ou pedindo voto antes do perí-odo legal permitido para a campanha.

A seguir, algumas das principais ferramentas que podem ser usadas em pré-campanha:

a) “Site” ou “Portal temático colaborativo”:

Durante o período pré-eleitoral é permitido manter um site pessoal, ou seja, um espaço virtual do pré-candidato que o permite divulgar informações sobre sua atividade política, idéias, notícias, currículo e conteúdos audiovisuais, criar enquetes, recolher e-mails de seus amigos e visitantes (futuros eleitores), sem que seja caracterizado como site de campanha. Não se pode pedir voto nem dizer explicitamente que seja candidato.

Os portais temáticos, por sua vez, são usados geralmente para a discussão de temas específicos como, por exemplo, “Soluções para um município”. Neste modelo, geralmente adotado por partidos, abre-se uma fer-ramenta colaborativa com a comunidade para a sugestão de soluções para problemas do dia-a-dia. As pes-soas informam o problema seu ou da comunidade e podem sugerir a solução de outros. Há possibilidade dos outros usuários avaliarem se aquela proposta é boa ou ruim. Tudo isso, aliado a outros recursos, faz com que os maiores responsáveis pelo conteúdo do portal sejam os usuários. O objetivo é auxiliar na criação de um programa de governo identificado com a população, baseado nas sugestões de melhoria sugeridas pelos próprios internautas.

b) “Blog” ou “Diário-virtual”

Os blogs são como jornais diários virtuais, em que a informação fica disposta linearmente, e organi-zada automaticamente em arquivos de fácil recuperação. Pela facilidade no uso e de manutenção, tem se tornado muito popular. Com ele o candidato pode escrever vários artigos (textos, sons e vídeos) diários, que ficam disponíveis para os comentários dos visitantes.

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c) “Redes sociais”

As redes sociais são uma nova forma de relacionamento interpessoal que a internet possibilita. Por meio de sites especializados (como o Orkut) os usuários se organizam por afinidades e assuntos de interesse comum para discutirem e se mobilizarem a respeito de temas que lhes pareçam importan-tes. Neste caso, o pré-candidato deve participar das “comunidades virtuais” ligadas a sua cidade ou área de atuação e criar a sua própria rede de apoiadores.

d) Os sites de disponibilização de conteúdo audiovisual (como YouTube) se popularizaram devido ao barateamento e popularização das câmeras digitais para filmagem, que agora estão presentes até nos telefones celulares. Os pré-candidatos devem ocupar também esse espaço, gerando conteúdo em vídeo sobre a sua cidade ou seu bairro e conclamar mais pessoas para fazerem o mesmo.

e) Outro uso já consagrado para a internet é o recebimento e envio de mensagens eletrônicas com in-formativos periódicos das atividades e temáticas mais importantes do pré-candidato. Alguns sistemas de disparo desses boletins periódicos permitem que o candidato monte sua base de e-mails (confiável) e segmente o envio, obtendo relatórios que mostram a quantidade de pessoas que abriram o e-mail, quantos clicaram no conteúdo e quantos o descartaram.

O uso concertado de todos esses recursos dará ao pré-candidato uma maior visibilidade pública e também servirá de canal para auscultar as demandas e sugestões dos eleitores para uma melhor formatação dos materiais programáticos e de propaganda.

Utilização da internet na campanhaPara a campanha de 2008, o PPS disponibilizará para seus candidatos uma série de ferramentas para auxiliar no melhor aproveitamento dos recursos disponíveis na internet.

a) O e-candidato é um sistema concebido para que o candidato tenha à sua disposição todas as ferramentas necessárias para construir sua campanha na internet. Possui ferramentas que agregam todas as funcionalidades antes descritas num ambiente de fácil administração e de rápida configuração.

Trata-se de um site completo, no qual, além de publicar notícias, o candidato poderá ter seu blog de candidatura, expor suas propostas, informar os endere-ços do seu comitê de campanha, disponibilizar fotos de eventos, coligações, ví-deos e arquivos de áudio como jingles e também material de campanha. Poderá também compor uma rede de voluntários, enquetes e publicar todo o conteúdo que julgar necessário.

b) O portal do PPS (www.pps.org.br) terá uma área exclusiva de apoio ao can-didato, que reunirá informações sobre a legislação eleitoral, formação políti-ca, logotipia, orientações partidárias e material para download, e-candidato, projeto Fala, Brasil!, entre outros.

Quem levanta cedo bebe água limpaTradicionalmente, quando as campanhas começam a pegar fogo, a partir de julho, os preços dos ma-teriais sobem às nuvens. Por isso, quem acha que tem legenda garantida, pode começar a se prevenir, comprando uns pacotes de papel daqui, uns envelopes dali, panos e vinil para as faixas e cartazes, tinta, cola, camisetas, bonés, bandeirinhas, programas de computadores e toda a parafernália que ajuda o can-didato a vencer,

71Poder Local O Desafio da Democracia•

Importante: acertar antecipadamente os serviços gráficos, com empresas idôneas. No auge das campanhas, esse setor fica com serviço saindo pelo ladrão. O ideal seria o comitê ter uma pe-quena gráfica.

Ferramentas para o sucessoHoje em dia, campanha política virou um negócio altamente profissional. Conseqüentemente, foi incorporada uma parafernália muito grande ao processo de se fazer um candidato vitorioso. Lista-mos aqui algumas – a maioria delas.

Informática: o computador hoje é essencial em um comitê eleitoral. É usado desde a fase prelimi-nar da campanha no cadastramento de apoios, cabos eleitorais, eleitores, até a fase de apuração dos votos, para um acompanhamento paralelo da contagem. A Justiça Eleitoral fornece programas para isso aos candidatos. E até depois das eleições ele será útil, quando da prestação de contas financeiras ao TRE.

Pesquisas: Existem dois tipos – qualitativa e quantitativa. A primeira mede, em números, o tamanho provável do eleitorado do candidato, quantas pessoas o conhecem e o tamanho de sua base e a outra define as suas qualidades e defeitos junto ao eleitorado. Essas duas pesquisas são muito importantes no início da campanha, quando será definido o programa do candidato.

Propaganda: Aí está o grande nó das campanhas eleitorais modernas. É por onde sai quase todo o dinheiro, embora por si só não eleja o candidato, é a grande arma para isso. O primeiro requisito é a criatividade. Milhares de candidatos estarão inundando a cidade com suas mensagens. Funcionará melhor aquela que fugir ao lugar comum e não desapareça em meio a uma enxurrada de coisas iguais. Além disso, criatividade significa economia. Pense nisso ao elaborar suas faixas, botões, cartazes, fo-lhetos, jornais etc.

É praticamente infinito o universo de coisas que podem ser usadas como peças publicitárias. Um candidato em Belo Horizonte, Leopoldo Bessone, se elegeu durante anos usando um expediente ba-rato e simples: colocava carroças, puxadas por burros, circulando pelas ruas da cidade, com cartazes seus. O interessante é que ele é pessoa ligada à elite da cidade. Mas atenção, esse tipo de propaganda foi proibida.

Mas, apesar dessa diversidade, existem aqueles recursos tradicionais – faixas, cartazes, botões de lapelas, adesivos, pinturas de muro (muito eficiente), carros com jingles, brindes diversos, internet, out-doors etc. Mas, atenção, a propaganda só pode começar depois de realizadas as con-venções para escolha dos candidatos, o que no PPS, como em todos os partidos, se dará entre os dias 1° e 30 de junho.

Boca-a-boca: é importantíssimo numa campanha para vereador e pode perfeitamente ser feito já mesmo na fase pré-convenção, quando o possível candidato reúne-se com amigos, familiares, co-nhecidos, amigos dos amigos, vizinhos dos vizinhos, informando que pretende apresentar seu nome ao partido e espera contar com apoios, caso venha a ser o escolhido. Isso é feito em visitas, almoços, jantares, batizados, casamentos e em todas as oportunidades de encontros sociais. Nesses encontros são feitos ainda contatos financeiros, em busca de dinheiro para a campanha. Essa ajuda, porém, é regulada por lei.

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O candidato só pode arrecadar dinheiro depois de registrar seu comitê financeiro na Justiça Eleitoral no máximo 10 dias depois da escolha de seu nome na convenção e o devido registro. Terá ainda de declarar quanto pretende gastar na campanha. As empresas podem doar até 2% de seu faturamento bruto do ano anterior à campanha. Uma pessoa física pode doar até mil UFIRs aos candidatos.

Órgãos públicos e entidades de classe são proibidos de fazer qualquer tipo de doação, mesmo na forma de publicidade. As doações podem ser feitas também em materiais ou serviços, mas têm de ser cotadas em dinheiro e fornecidos recibos.

Mesmo depois de iniciado o período da propaganda, ela é cheia de restrições: é proibido o uso de bens públicos para afixação de propaganda; a polícia tem de ser avisada com 24 horas de antecedência da rea-lização de atos de propaganda, em recintos abertos ou fechados, comícios só entre 8h e 24h, alto-falantes só podem ser usados entre 8h e 22h exceto em comícios e, em qualquer caso, nunca a menos de 200 metros de sedes de governos, tribunais, quartéis, hospitais, escolas, bibliotecas, igrejas e teatros quando em funcionamento.

Para evitar aborrecimentos legais o melhor mesmo é o candidato contar com uma boa assessoria de um advogado.

Telemarketing: É um recurso caro, mas eficiente. Pode ser usado para muitas coisas: pesquisa, mo-bilizar militância, pedir voto, formar banco de dados, acompanhar desempenho do candidato em tempo real. Pode ser montado pelo próprio comitê ou ser contratado a terceiros.

Produtores de rádio e tv: É a turma que produz programas gratuitos para o rádio e TV e, também jingles. No caso dos candidatos a vereador, perde bastante de importância já que o programa gratuito cede tempo muito curto a esses candidatos.

Clipagem: Os candidatos, principalmente a prefeito, devem contar com um serviço de clipagem, com o fornecimento diário de notícias sobre o desenrolar da campanha. Sua e dos adversários. Nem que seja para poder responder, em tempo, a eventuais ataques. E os que concorrem a eleições majo-ritárias devem, eventualmente, comprar serviços de clipagem eletrônica, quando derem entrevistas a TVs, ou rádios, ou participarem de debates.

Treinamento: Candidatos e equipes devem passar por treinamentos. Eles para aprenderem a encarar microfones, jornalistas, falar horas sem arrebentar a garganta e os colaboradores da equipe para apren-derem a lidar com o público. A saber, por exemplo, que todo mundo que entra em um comitê merece tratamento atencioso, pois pode significar um bom punhado de votos. Não importa como a pessoa esteja vestida ou fale.

Muros: Recurso importantíssimo em qualquer tipo de eleição, mas fundamental nas eleições propor-cionais, principalmente para vereador, Seu uso, entretanto, precisa ser autorizado pelo proprietário, por escrito. Portanto, desde já é bom o pré-candidato ir se garantindo quanto a isso.

Faixas: São importantes não só pelo retorno em termos de visibilidade, como pelo fato de, quando colo-cada em residências, deixarem claro que a família daquela casa apóia claramente o candidato.

Visitas, almoços, reuniões domésticas: Excelentes oportunidades para o candidato expor suas idéias junto a formadores de opinião, possíveis financiadores, militantes e colaboradores de um modo geral, e, ao mesmo tempo, conquistar votos.

Importante – o recurso mais eficiente mesmo numa campanha é a velha sola-de-sapato, que leva o candidato até onde o voto está: o eleitor.

73Poder Local O Desafio da Democracia•

As convençõesTodo esse aparato só será usado se o nome do pré-candidato for sacramentado na convenção, que define se uma pessoa será ou não candidata pela legenda. As convenções se realizarão entre os dias 1° e 30 de junho. Os Diretórios ou Comissões Provisórias Municipais têm ampla liberdade para organizá-las dentro dos li-mites da lei e dos estatutos partidários. A direção estadual atuará apenas como órgão de assessoramento e aconselhamento.

O time entra em campoEscolhido o candidato, registrada a chapa na Justiça Eleitoral, o que deve ser feito no máximo 10 dias após a convenção, é hora de colocar a campanha nas ruas.

Além do núcleo coordenador da campanha, que deve ser pequeno, coeso e de absoluta afinidade com o candidato, os elementos básicos de campanha na rua são:

Equipe precursora: Esse pessoal vai se antecipar às visitas do candidato ou candidata para apurar nomes das lideranças locais, principais problemas (a ponte que está caindo, a rua que precisa calçamento etc.) para que o candidato ou candidata tenha condições de conversar com os eleitores tendo conhecimento de causa.

Cabos eleitorais: Depois dos financiadores da campanha, são os elementos mais importantes. De um modo geral são pessoas com lideranças em suas comunidades, com aspirações políticas, mas que não dispõem de votos suficientes para se elegerem. Trabalham por idealismo (raramente) ou por razões pragmáticas (futuro emprego para si ou para familiares no gabinete, dinheiro, troca de favores etc.).

Militantes: Em termos de importância, equiparam-se aos cabos eleitorais. São apaixonados e dis-postos ao trabalho. Seu fervor pode compensar a falta de cabos eleitorais. É o pessoal que vai balan-çar bandeiras, atender no comitê, distribuir panfletos, fazer boca de urna e fiscalizar apurações. Eles e elas podem ser encontrados no partido, na família, no grupo profissional.

Simpatizantes: São pessoas que gostam do candidato, concordam com suas idéias e acreditam no seu trabalho, mas indispostas para o trabalho de rua. Podem dar uma força de vez em quando no comitê, colaboram com algum dinheiro e chegam até a pedir algum voto na família e no círculo de amigos. Podem também servir de ligação entre o candidato e esse círculo, oferecendo almoços, churrascos, ou criando outras oportunidades de encontros. Além disso, podem ser bons formadores de opinião favorável ao candidato.

Pessoal de rua: Vai para as esquinas distribuir panfletos, santinhos, balançar bandeiras e usar a ca-misa do candidato. De um modo geral é pago, mas há ainda os militantes que atuam por idealismo. Mas cuidado: esse pessoal tem de ser muito bem treinado e fiscalizado para evitar que a turma fique o tempo todo onde há sombra e não onde passam os eleitores, além de evitar abordagens agressivas que importunem as pessoas. E devem ainda evitar conflitos com grupos adversários. Andar de rou-pa limpa e evitar comportamentos constrangedores quando em serviço.

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Boca de urnaBem, a campanha terminou. Chegou a hora da onça beber água. É o dia da eleição. E da boca-de-urna. Recurso proibido por lei, mas tolerado em maior ou menor grau em todo o país, desde que feito a uma razoável distância do local de votação. Nas últimas eleições proporcionais, cerca de 40% dos eleitores chegavam às urnas sem saberem em quem votar. Boqueiro corre lá seus riscos. Pode pegar até 15 dias de prisão, pagar multa ou ser condenado prestar serviços à comunidade, caso a polícia leve sua missão mais a sério que o necessário, o mesmo acontecendo com o juiz da zona.

Contagem de votosCom a implantação das urnas eletrônicas, ficou mais difícil a trampolinagem com os votos que ocorriam com a contagem manual, quando voto para candidato de partido pequeno, em cidades distantes, onde não havia fiscalização partidária, ia direto engordar a conta dos candidatos dos gran-des partidos.

Atualmente, a fiscalização é mais simples. O TRE fornece o programa de computador necessário a uma contagem paralela de votos.

Mas, de qualquer forma, candidatos e partidos devem se preparar com pessoal entendido no assunto para o dia da votação.

Cuidado com os fornecedoresO candidato e seu comitê devem ficar de olho vivo nos fornecedores. Verificar se têm bom nome na praça, se cumprem com prazos e se seus equipamentos dão conta do recado.

Peças de campanhaA tabela a seguir apresenta uma análise do perfil das principais peças utilizadas numa campanha elei-toral, o importante é sempre escolher adequadamente as peças levando em conta o custo benefício e a realidade financeira da campanha.

Peças Custo/mil Pontos Fortes Pontos Fracos

Mala direta MédioComunicação direcionada evita

desperdícioAusência de banco de

dados confiáveis

Muro pintado BaixoMantém a imagem do candidato presente

na mente do eleitorTende a aumentar a poluição visu-al que ocorre durante a campanha

Adesivo Baixo Fixa a identidade visual do candidatoTem pouca durabilidade física e de

conteúdo de informação

75Poder Local O Desafio da Democracia•

Peças Custo/mil Pontos Fortes Pontos Fracos

Sítio de internet BaixoPermite ao eleitor aprofundar seu conhecimento e interagir com a

candidatura

Baixa penetração nas camadas pobres da população

Santinho Muito baixoMantém a imagem do candidato presente

na mente do eleitor

Não permite aprofundamento de informação. Tende a cair na vala

comum com os outros candidatos

Volante Baixo

Permite um razoável volume de informações sobre a plataforma eleitoral e tem distribuição flexível de acordo com

a necessidade da campanha

É peça de comunicação que apresenta grande perda e

dispersão

Cartaz MédioComplementa o santinho e tem mais impacto. Pode veicular informações

sintéticas sobre a plataforma eleitoral

Tende à indiferenciação com os car-tazes dos concorrentes

Faixa Muito baixoPermite alta adequação ao momento da

campanha. Tem impactoTem pouca durabilidade física e de

conteúdo de informação

Comício AltoPermite o contato pessoal. Permite o

aprofundamento dainformação sobre a plataforma eleitoral

É um canal com algum desgaste em termos de credibilidade

Exige competência verbal do candi-dato e o expõe a pressões

Som volante Muito baixoMantém a imagem do candidato presente

na mente do eleitor

Altamente dispersivo, com nenhum aprofundamento de

informação

Programa de rádio AltoPermite o aprofundamento da

informação sobre a plataforma eleitoral e a interatividade com o eleitor

Apresenta dispersão e exige muita competência do candidato e de

produção para se diferenciar dos concorrentes

Programa de TV Muito altoPermite o aprofundamento da

informação sobre a plataforma eleitoral e a interatividade com o eleitor

Apresenta dispersão e exige muita competência do candidato e de

produção para se diferenciar dos concorrentes

Out-door móvel Muito alto

Mantém a imagem do candidato presente na mente do eleitor, permite exposição

em locais considerados estratégicos. Deve obedecer ao limite de tamanho

estabelecido na Lei Eleitoral.

O alto custo e a pequena quantidade de informação sobre

a plataforma eleitoral

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Peças Custo/mil Pontos Fortes Pontos Fracos

Jornal impresso AltoPermite o aprofundamento da

informação sobre a plataforma eleitoral e a interatividade com o eleitor

É um canal desgastado, com alta perda e dispersão por

exemplar e que exige qualidade da plataforma eleitoral e competência

na produção

Coordenação de campanhaDepois de tomada a decisão de concorrer o candidato deve começar a recrutar os componentes da

sua coordenação de campanha. Apresentamos aqui uma proposta mínima de uma equipe necessária para uma campanha bem organizada.

Função Característica

Família do candidato Acompanha ou representa o candidato nas atividades

Coordenador(a) geral de campanhaTem a visão ampla de tudo o que ocorre na campanha,

é o elo entre a equipe e o candidato. Dirige os trabalhos da equipe

Tesoureiro(a) Ordena despesas e mantém em dia a prestação de contas

Coordenador(a) de captação Elabora e executa a captação financeira da candidatura

Coordenador(a) de marketingÉ responsável pela imagem do candidato, pelas peças

publicitárias e análise das pesquisas

Coordenador a) de agendaRecebe e faz a triagem dos convites e pedidos para o candidato.

Monta e acompanha a agenda

Coordenador(a) de voluntários e mobilização

Recruta e orienta o trabalho da militância envolvida na campanha

Coordenador(a) de eventosPlaneja e prepara os eventos e as aparições públicas do candidato

Coordenador(a) de imprensaMantém relações entre o candidato e a imprensa,

repercutindo as ações e posições do candidato

Coordenador(a) de transporte Gerencia a utilização dos veículos da campanha,

seu abastecimento e sua manutenção

Assessor(a) jurídico Presta consultoria e prepara as ações jurídicas da campanha

Conselho políticoFormado pelos principais apoiadores da campanha, ajuda na formulação

programática e tomada de decisões estratégicas

Coordenadora de logística e material Gerencia o estoque e distribuição do material de campanha

77Poder Local O Desafio da Democracia•

Cronograma de campanha

Os candidatos e suas equipes têm que ter sempre em mente as várias etapas da campanha. Um bom planejamento feito com antecedência poupa dinheiro e dor de cabeça, pois iniciada a campanha a priori-dade é pedir voto e dar visibilidade à candidatura.

Mês Fases/Características

Março/AbrilPré-campanha:

Pesquisas, levantamento de dados, montagem da equipe. Negociações de alianças

Maio/JunhoLançamento/Convenção:

Apresentação do posicionamento do candidato, seus aliados, suas principais propostas. Exploração midiática do evento

Julho/AgostoCrescimento:

Levar a campanha para a rua, agenda de campanha, reiteração das principais propostas, com os devidos ajustes, início dos programas de rádio e TV

SetembroConsolidação/Maturidade

Responder aos ataques, consolidar base de apoio, conquistar o voto útil, ajustes nos programas de RTV baseados em pesquisas, grandes concentrações e carreatas

Outubro

Reta Final – VotaçãoPreparar boca de urna, ato de encerramento da campanha, organizar fiscalização e apuração, focar nos indecisos, atentar para o volume da campanha. Preparar a participação nos últimos

debates da campanha

Outubro 2°Segundo turno

Em 28 dias, é necessário montar uma outra campanha, com novos apoiadores, com mais tempo de RTV, e com o posicionamento ajustado ao novo cenário

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Para encerrar, alguns erros comuns que devem ser evitados:

•DesconhecerapolíticadoPartidoeaopiniãodesuasprincipaislideranças.

•Desconhecerosproblemaseasliderançasdacomunidade.

•Serarrogante,achandoquesabetudo.

•Nãoprometerouprometermuitoalémdopossíveledocrível.

•Nãoterpropostasclaraseviáveis.

•Tentarenganaroseleitorescomopiniõesinsinceras.Mentirsobreopassado.

•Subestimarainteligênciadoeleitor.

•Hostilizaraimprensa.

•Mudaroudescuidardaaparênciapessoalduranteacampanha.

•Fazerdeclaraçõesinfelizes.

•Darimportânciaaboatoseprovocaçõestornando-ospautapolítica.

•Exibirpreconceitosdequalquerordem.

•Terimagemruimnacomunidade.

•Esquecerdeagradecerosapoiosrecebidos.

•Admitirbrigasnaequipeequeestasejasubservienteedesmotivada.

•Passaracampanhatodareunindocomaequipe.

•Deixarfaltardinheirobásicodecampanha.

•Nãoterapreocupaçãonecessáriacomacaptaçãodedinheiro.

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Alguns conceitos importantes 1. Assistencialismo – Tipo de administração do

poder característica do ‘paternalismo’, no qual os problemas estruturais da sociedade não são enfrentados, nem resolvidos, em função de políticas paliativas, assistenciais, buscando manter permanentemente vínculos de depen-dências da comunidade frente às instâncias do Estado.

2. Burocracia – Sistema que organiza o funcio-namento do Estado, por meio de funcionários públicos – concursados ou não – que tende a se tornar um poder específico, usando proce-dimentos administrativos hierarquizados, e cada vez mais especializados, em sua relação com a sociedade

3. Cidadania – Conceito relacionado ao exercício dos deveres e gozo dos direitos por parte dos cidadãos, nas sociedades democráticas, e ao mesmo tempo, fundamento de sua existência.

4. Clientelismo – Uma das conseqüências da prá-tica de administração do poder político de tipo “assistencialista” é a criação de uma “clientela” – conjunto de pessoas dependentes dos favores do ‘chefe’ – fruto da constituição de vínculos de dependência frente ao mandatário. Cons-tituido, por meio de favores, este conjunto de eleitores cativos fica subordinado a seu desejo ou ordem.

5. Cultura política – O termo “cultura” nas ciências sociais está relacionado ao sistema de valores, costumes, atitudes, instituições que to-das as sociedades compartilham entre seus ci-dadãos, caracterizado por um idioma comum e um conjunto de símbolos que o identifica e singulariza. O termo “cultura política” se refere ao conjunto de procedimentos, hábitos, e for-mas de atuar que os cidadãos consideram nor-mais na luta pelo poder político e na ação do Estado.

6. Democracia – Termo oriundo da Grécia an-terior a Cristo, significando governo do povo

(demos = povo de um lugar + cracia = gover-no), em que o poder de tomar importantes de-cisões políticas está com os cidadãos (povo), direta ou indiretamente, por meio de represen-tantes eleitos.

7. Desigualdade – Uma das mais nefastas carac-terísticas de nossa formação social, caracteri-zada, em primeiro lugar, pela enorme diferen-ça de renda, que divide a sociedade em poucos ricos e muitos pobres, e que marca as diferen-tes condições de acesso aos bens públicos e à ação do Estado.

8. Ditadura militar – Quebra violenta do Estado de Direito, pelas forças armadas, direta ou in-diretamente, na maioria das vezes por meio de um golpe, com supressão dos direitos demo-cráticos da cidadania. Caracterizam-se tais go-vernos pela violência, pela censura sistemática e busca da subordinação da sociedade civil. Os melhores exemplos de tais sistemas de governo são as ditaduras de Franco (Espanha); Médici (Brasil), Pinochet (Chile), entre outros.

9. Eqüidade – Toda postura (e prática) política que visa superar as desigualdades sociais, bus-cando garantir o acesso igualitário aos bens so-cialmente produzidos a todos os integrantes da sociedade, e realizar o preceito constitucional de que “todos são iguais perante a lei”.

10. Estado – Conjunto de instituições criadas pelos homens em sociedade, regido por leis próprias, gozando dos direitos de soberania e que funda as diversas nações. O Estado mo-derno é definido como um sistema político representativo (e por isso separado das ati-vidades socioeconômicas que constituem a sociedade civil) surgido num território com dimensão nacional, no curso de um proces-so histórico. Se todo poder emana do povo é o Estado quem o corporifica por meio das leis e de suas instituições, criadas com o fim de garantir sua soberania.

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11. Estado Democrático de Direito – Forma do Estado normatizado por uma Constituição aprovada por um parlamento convocado para instituir e promulgar o conjunto de leis que orientam sua ação e suas instituições, estabe-lecendo os elementos de suas relações, e ga-rantindo sua interdependência.

12. Estatal-corporativismo – Políticas de Esta-do que atendem as demandas e interesses das corporações (associação de pessoas que tem regras, obrigações, direitos, deveres, e privi-légios que lhes são comuns) formadas no seio da sociedade, como os servidores públicos e/ou demais trabalhadores dos setores mais desenvolvidos, materializada na criação de determinados privilégios para elas, em detri-mento dos interesses gerais da sociedade.

13. Estatismo – Toda política que visa aumentar o poder do Estado em detrimento da socieda-de, buscando, em última instância, tutelá-la.

14. índice de Gini – É uma medida de desigual-dade desenvolvida pelo estatístico italiano Corrado Gini, tornada pública em 1912. É utilizada por organismos internacionais, como a Organização Mundial de Saúde (OMS) para calcular a desigualdade de dis-tribuição de renda, mas pode ser usada para qualquer distribuição, de serviços públicos, por exemplo. Ele consiste em um número entre 0 e 1, onde 0 corresponde à comple-ta igualdade de renda (onde todos têm a mesma renda) e 1 corresponde à completa desigualdade (onde uma pessoa tem toda a renda, e as demais nada têm).

15. Latifúndio – Extensa propriedade rural onde existe uma grande proporção de terras não cultivadas e exploradas com tecnologia ob-soleta e de baixa produtividade, em torno da qual se forma uma população dependente dos favores do latifundiário.

16. Mandonismo – Forma de administração do poder de modo discricionário, na qual não são respeitados os preceitos legais nem o di-reito das pessoas, mas tão somente a vontade de mando de quem detém o poder.

17. Mercado de trabalho – Historicamente, o trabalho é a fonte da transformação das con-dições de existência do homem e elemento fun-damental da produção de riqueza, em socieda-de. O termo “mercado de trabalho” designa a forma como se organiza o sistema de produção social, no mundo moderno, que condiciona a oferta e as oportunidades de trabalho para os cidadãos em geral, buscando-se – em tese – os mais competentes e/ou mais aptos.

18. Modelo macroeconômico – É um conceito da Ciência Econômica que trata do estudo do comportamento agregado de uma economia, ou seja, das principais tendências (a partir de processos microeconômicos) da economia no que concerne principalmente à produ-ção, à geração de renda, ao uso de recursos, ao comportamento dos preços, e ao comércio exterior. Os objetivos da macroeconomia são principalmente: o crescimento da produção e consumo, o pleno emprego, a estabilidade de preços, o controle inflacionário e uma balança comercial favorável.Um conceito fundamen-tal à macroeconomia é o de sistema econô-mico, ou seja, uma organização que envolva recursos produtivos, unidades de produção e instituições (regras que definem as relações econômicas).

19. Movimentos sociais – Organizações estru-turadas com a finalidade de criar formas de associação entre pessoas e entidades que te-nham interesses em comum, para a defesa ou promoção de certos objetivos. Eles se ca-racterizam por atuarem de forma explícita e evidente no ambiente político. Suas ações se desenvolvem seja pacificamente (por meio de passeatas, atos públicos, pressões junto a representantes eleitos, promoção de ações ju-diciais etc.), seja mediante manifestações vio-lentas, arbitrárias e/ou polêmicas (ocupações de bens públicos, de propriedades particula-res etc.), como faz, por exemplo, o MST.

20. Mudança social – Todo processo vivido pela sociedade que altera suas formas tradicio-nais de funcionamento. Alguns elementos são comumente considerados como fator de mudança social: desenvolvimento da organi-zação econômica, desenvolvimento científi-

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co-tecnológico, e guerras. O mais importante a destacar nesse processo é o papel ativo da cidadania e a luta de interesses antagônicos no seio da sociedade civil.

21. Neoliberalismo – Concepção de política eco-nômica fundada na lógica de que são os inte-resses dos proprietários que devem dirigir a ação do Estado, o qual deve ser minimizado em detrimento do mercado, privilegiando-se, particularmente, seu sistema financeiro.

22. Oligopólios – Corresponde a uma situação em que há um grupo bastante restrito de pro-dutores e/ou compradores de um determina-do produto. Com isso, eles têm condições de afetar os preços dos serviços que oferecem, já que a concorrência é reduzida. Por exemplo, o setor bancário no Brasil é tido como um oli-gopólio, pois há poucos e grandes bancos que dominam expressiva parcela do mercado.

23. Parlamentarismo – É um sistema de governo no qual o Poder Executivo depende do apoio direto ou indireto do parlamento para ser constituído e para governar. Este apoio costu-ma ser expresso por meio de um voto de con-fiança. Não há, neste sistema de governo, uma separação nítida entre os poderes Executivo e Legislativo, ao contrário do que ocorre no presidencialismo.

24. Partido político – É um grupo organizado formal e legalmente, com base em formas vo-luntárias de participação, em uma associação orientada para influenciar ou ocupar o poder político. Modernamente, é uma pessoa jurí-dica de direito privado que pode ser definido como uma união voluntária de cidadãos com afinidades ideológicas e políticas, organiza-do nos princípios de hierarquia e disciplina, movidos por um programa e capacidade de organização.

25. Paternalismo – É a dominação de todo tipo de exercício de poder, no qual se ressalta a personalidade do mandatário, acima das ins-tâncias legais – Legislativo e Judiciário – em que este se porta como um “pai”, como se a comunidade fosse uma grande família da qual

ele seria o chefe, e todos estariam subordina-dos a sua tutela.

26. Patrimonialismo – Concepção de gestão de qualquer instância do Estado em benefício particular ou de grupos, em detrimento da sociedade em geral. Este é um dos mais arrai-gados elementos de nossa cultura política que devemos combater sem descanso.

27. Processo democrático – Forma como se ope-ram as escolhas da cidadania, quer nos parla-mentos, quer nas instâncias da sociedade, ba-seada – sempre – no voto da maioria. E tam-bém como se dá a escolha dos mandatários e o aperfeiçoamento do sistema democrático com o fortalecimento da participação – autô-noma e consciente – dos cidadãos, em geral.

28. Reforma democrática do Estado – Denomi-nam-se assim os processos de mudanças no âmbito do Estado que visam ampliar a par-ticipação da cidadania, na forma da lei, bus-cando, ao mesmo tempo, maior eficácia em suas ações específicas.

29. Regime político – Modo de governar um Estado, por meio de preceito constitucional que estabelece uma determinada relação com o conjunto da sociedade. Do ponto de vista histórico existem basicamente três regimes políticos: o monárquico, o republicano e o despótico.

30. Sistema de governo – É a maneira pela qual o poder político é dividido e exercido no âmbito de um Estado. O sistema de governo varia de acordo com o grau de separação dos poderes, indo desde a separação estrita entre os pode-res legislativo e executivo (presidencialismo), de que é exemplo o Brasil, até a dependên-cia completa do governo junto ao legislativo (parlamentarismo), caso do sistema de gover-no da maioria dos países da Europa.

31. Sistema político partidário – É o conjunto de partidos que atuam, na luta pelo poder po-lítico, ou domínio do Estado, sob um sistema de leis que regulamenta as formas de disputa e os procedimentos da repartição do poder.

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32. Socialismo – O termo designa um sistema sociopolítico caracterizado pela apropriação dos meios de produção pela coletividade. Abolida a propriedade privada destes meios, todos se tornariam trabalhadores, tomando parte na produção, e as desigualdades sociais tenderiam a ser drasticamente reduzidas uma vez que a produção, sendo social, poderia ser eqüitativamente distribuída. Para Karl Marx, que desenvolveu este tema, o socialismo seria um sistema de transição para o comunismo, que eliminaria de forma integral o Estado e as desigualdades sociais.

33. Sociedade do conhecimento – Denominação com que os especialistas em Ciências Sociais tratam as sociedades contemporâneas em que

prevalecem a incessante inovação científica-tecnológica, baseada no domínio e massifi-cação da informática, desenvolvimento de novos materiais, e seu uso crescente na pro-dução e no cotidiano das pessoas.

34. Terceiro Setor – É constituído por organiza-ções privadas sem fins lucrativos que geram bens, serviços públicos e privados. Todas elas têm como objetivo o desenvolvimento políti-co, econômico, social e cultural no meio em que atuam. Exemplos desse tipo de organiza-ção são as ONGs, as associações e fundações. O Estado é o primeiro setor, o Mercado é o segundo setor e as entidades da sociedade ci-vil formam o Terceiro Setor

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Algumas leituras básicas1. Cidadania no Brasil – O longo caminho, de José Murilo de Carvalho. Civilização Brasileira2. Práticas de Cidadania, de Jaime Pinsky (organizador). Contexto3. Os brasileiros e a democracia, de José Álvaro Moisés. Ática4. As possibilidades da política, de Marco Aurélio Nogueira. Paz e Terra5. A construção social da subcidadania, de Jessé Souza. Ed. UFMG6. Para compreender a pobreza no Brasil, de Victor Valla, Eduardo Storz e Eveline Bertino (organizado-

res). Contraponto7. Classes, regimes, ideologias, de Robert Henry Srour. Ática8. Cabeça de brasileiro, de Alberto Carlos Almeida. Record10. Os donos do poder, de Raymundo Faoro. Globo11. Coronelismo, enxada e voto, de Victor Nunes Leal. Alfa Omega12. Manual Completo de Campanha Eleitoral (2003), de Francisco Ferraz. L&Pm Editores 13. Marketing Politico (2003), de Francisco Javier Barranco Saiz. Pirâmide14. Como são feitas as pesquisas eleitorais e de opinião, de Alberto Carlos Almeida. Editora FGV 15. Tratado da Argumentação – A nova retórica, de Lucie Olbrechts-Tyteca e Chaim Perelman. Martins

Fontes16. Discurso Político, de Patrick Charaudeau. Contexto17. Marketing político e persuasão eleitoral, de Rubens Figueiredo. Konrad Adenauer18. Breve história do PCB, de José Antonio Segatto. Ciências Humanas19. Coerência e mudança, de Roberto Freire. Edições FAP20. A mulher na história. A história da mulher, de Zuleika Alambert. Edições FAP21. A esquerda e uma nova formação política, de Francisco Almeida e Raimundo Santos. Edições FAP22. A revolução do local, de Augusto de Franco. Editora de Cultura23. XV Congresso Nacional do PPS. Edições FAP.