Pensar Aveiro (Amigosd'Avenida) 2

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ENTREVISTA 11 22 DE JANEIRO DE 2010 SEXTA-FEIRA WWW.DIARIOAVEIRO.PT “QUANTO MAIS relevante for a intervenção cívica, melhor a cidade será governada” PAULO RAMOS tirar partido de novas valências que adquiriu. A avenida não pode ser um corredor. Atendendo ao nome do movi- mento, olha para a requalificação da avenida como o projecto mais urgente em Aveiro? A autarquia organizou há dois anos um debate sobre a avenida e elegeu-a como uma das priorida- des. Entretanto surgiu uma can- didatura ao Parque da Sustenta- bilidade, o que faz com que os re- cursos não possam ser orienta- dos para a avenida. E acha que as prioridades da Câ- mara estão bem hierarquizadas? Não queria responder a essa questão. Mas a questão que vale a pena discutir é o que é possível fazer para que a avenida entre na agenda política. Não podemos deixar a avenida de fora, porque é uma peça-chave no desenvolvi- mento da cidade e porque as novas acessibilidades vão poder ser o seu reforço ou a sua desvalo- rização. Mas não é só a avenida, mas também a Praça Melo Frei- tas ou o Rossio e a ligação ao Par- que da Sustentabilidade. O projecto do Parque da Susten- tabilidade está bem elaborado? Ainda não o abordámos sufici- entemente. Que outras batalhas se podem esperar dos Amigos d’Avenida? O termo batalha é um pouco forte… Entre aspas… Muito entre aspas. Porque é essa a tendência: de tornarmos estes momentos de intervenção cívica em pequenas guerras. Queremos afastar essa ideia. Até porque a autarquia tem a legitimidade ab- soluta para governar a cidade e não a queremos questionar. Mas existem outros espaços na cidade que figurem na vossa lista de preocupações? Há algumas circunstâncias so- bre as quais valia a pena reflectir em breve. Uma delas são os eixos de ligação - neste momento está a ser ponderado um importantís- simo eixo de ligação que liga o Rossio ao Alboi. É fundamental discutir esta ponte não como um projecto mas como uma propos- ta de planeamento. No ano passado surgiu o concei- to de Quarteirão Cultural da Ave- nida. Que balanço faz desse pro- jecto? É um conceito que procura valo- rizar a actividade económica liga- da à cultura e às artes como ele- mento de atractibilidade das cida- des. Muitas vezes escapa-nos a concentração de actividades liga- das à cultura que algumas cidades têm, e que Aveiro em particular tem. Pretendíamos que fosse um conceito mobilizador, de concer- tação de agentes, que muitas vezes actuam com agendas e pro- gramações que muitas vezes se sobrepõem. Há quem defenda que a cultura é o novo oxigénio das cidades e a nossa proposta era pensar esta função como elemen- to gerador de emprego e de activi- dades e sobretudo como qualifi- cador do espaço público. Como avalia a dinâmica cultural da cidade? A diversidade de ofertas e pro- dutores culturais é muito rele- vante e a criatividade que a cida- de gera é notável. Há um défice de conhecimento desse potencial e há um défice de interacção. A acção do movimento pode alargar-se a outros concelhos? Este movimento cívico é trans- versal a Aveiro e Ílhavo mas a- largado à região. Não temos uma visão umbiguista nem centralis- ta. A cooperação ao nível da regi- ão é sempre bem vinda. l ideias para identificar qual deve ser a intervenção na praça. Já têm algum projecto concreto que gostariam de ver ali aplicado? Dentro dos Amigos d’Avenida há um grupo significativo de pessoas que pensa que esta praça devia voltar a ser reconfi- gurada como praça e que o vazio deve dar origem a um novo edi- fício. O edifício pode ser uma oportunidade para mostrar o que de mais relevante Aveiro tem para oferecer nos domínios da criatividade, do design, das artes ou da tecnologia, onde na cidade existem elevadas compe- tências. Temos uma universida- de, empresas e projectos rele- vantes no design, teatro, pintu- ra, música, fotografia, cerâmica artística e tecnologias. Aveiro é onde se localiza o “cluster” das tecnologias da informação e comunicação, mas não tem sabido tirar partido desses recursos que são únicos a nível nacional. É um absurdo haver uma crise e não tirarmos parti- do do que nos distingue no con- texto nacional. A praça podia ser um interessante cruzamen- to entre a história e a contempo- raneidade, as artes e a tecnolo- gia, e podia ser uma mostra da energia criativa do que a cidade e a região têm para oferecer e que é muitas vezes desconheci- da do comum dos cidadãos e dos visitantes. E Aveiro está a com- petir a nível nacional com out- ras cidades do ponto de vista turístico, económico, das insti- tuições de ensino superior… Essa competição exige que sai- bamos tirar partido do que nos afirma. Mas este não pode ser um projecto pontual. Tem de ser uma rede de projectos e aquela praça não pode ser desligada do conjunto da cidade. Não pode- mos ter uma visão fragmentada da cidade. E é isso que tem acontecido? A Câmara tem olhado para estes projectos como peças fragmen- tados? Falta uma visão mais glo- bal e coerente? Partindo do exemplo da praça, não há um pensamento global sobre a cidade. E nós queremos a- lertar para a necessidade de incu- tir um pensamento global mesmo quando estamos a trabalhar num espaço relativamente reduzido. Quais são as expectativas do mo- vimento relativamente ao futuro da Avenida Lourenço Peixinho? Nós não temos as soluções na manga. Mas acreditamos que este tipo de abordagens exige método. Em primeiro temos de discutir o que queremos da ave- nida, que papel queremos que desempenhe. E depois temos de discutir as funções que respon- dem a esse desígnio. Do nosso ponto de vista, o desígnio deve passar por afirmar a avenida como um espaço de fruição, um certo recuar à sua função origi- nal de centro cívico e cultural. O que significa que deveríamos procurar atenuar o carácter de via rodoviária que tem hoje e “MAS A QUESTÃO QUE VALE A PENA DISCUTIR É O QUE É POSSÍVEL FAZER PARA QUE A AVENIDA ENTRE NA AGENDA POLÍTICA. NÃO PODEMOS DEIXAR A AVENIDA DE FORA”

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ENTREVISTA

1122 DE JANEIRO DE 2010 SEXTA-FEIRAWWW.DIARIOAVEIRO.PT

“QUANTO MAIS relevante for a intervençãocívica, melhor a cidade será governada”

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tirar partido de novas valênciasque adquiriu. A avenida nãopode ser um corredor.

Atendendo ao nome do movi-mento, olha para a requalificaçãoda avenida como o projecto maisurgente em Aveiro?A autarquia organizou há doisanos um debate sobre a avenida eelegeu-a como uma das priorida-des. Entretanto surgiu uma can-didatura ao Parque da Sustenta-bilidade, o que faz com que os re-cursos não possam ser orienta-dos para a avenida.

E acha que as prioridades da Câ-mara estão bem hierarquizadas?Não queria responder a essaquestão. Mas a questão que vale apena discutir é o que é possívelfazer para que a avenida entre naagenda política. Não podemosdeixar a avenida de fora, porque éuma peça-chave no desenvolvi-mento da cidade e porque asnovas acessibilidades vão poderser o seu reforço ou a sua desvalo-rização. Mas não é só a avenida,mas também a Praça Melo Frei-tas ou o Rossio e a ligação ao Par-que da Sustentabilidade.

O projecto do Parque da Susten-tabilidade está bem elaborado?Ainda não o abordámos sufici-entemente.

Que outras batalhas se podemesperar dos Amigos d’Avenida?O termo batalha é um poucoforte…

Entre aspas…Muito entre aspas. Porque é essaa tendência: de tornarmos estesmomentos de intervenção cívicaem pequenas guerras. Queremosafastar essa ideia. Até porque aautarquia tem a legitimidade ab-soluta para governar a cidade enão a queremos questionar.

Mas existem outros espaços na

cidade que figurem na vossa listade preocupações?Há algumas circunstâncias so-bre as quais valia a pena reflectirem breve. Uma delas são os eixosde ligação - neste momento está aser ponderado um importantís-simo eixo de ligação que liga oRossio ao Alboi. É fundamentaldiscutir esta ponte não como umprojecto mas como uma propos-ta de planeamento.

No ano passado surgiu o concei-to de Quarteirão Cultural da Ave-nida. Que balanço faz desse pro-jecto?É um conceito que procura valo-rizar a actividade económica liga-da à cultura e às artes como ele-mento de atractibilidade das cida-des. Muitas vezes escapa-nos aconcentração de actividades liga-das à cultura que algumas cidadestêm, e que Aveiro em particulartem. Pretendíamos que fosse umconceito mobilizador, de concer-tação de agentes, que muitasvezes actuam com agendas e pro-gramações que muitas vezes sesobrepõem. Há quem defendaque a cultura é o novo oxigéniodas cidades e a nossa proposta erapensar esta função como elemen-to gerador de emprego e de activi-dades e sobretudo como qualifi-cador do espaço público.

Como avalia a dinâmica culturalda cidade?A diversidade de ofertas e pro-dutores culturais é muito rele-vante e a criatividade que a cida-de gera é notável. Há um déficede conhecimento desse potenciale há um défice de interacção.

A acção do movimento podealargar-se a outros concelhos?Este movimento cívico é trans-versal a Aveiro e Ílhavo mas a-largado à região. Não temos umavisão umbiguista nem centralis-ta. A cooperação ao nível da regi-ão é sempre bem vinda.l

ideias para identificar qual deveser a intervenção na praça.

Já têm algum projecto concretoque gostariam de ver ali aplicado?Dentro dos Amigos d’Avenidahá um grupo significativo depessoas que pensa que estapraça devia voltar a ser reconfi-gurada como praça e que o vaziodeve dar origem a um novo edi-fício. O edifício pode ser umaoportunidade para mostrar oque de mais relevante Aveirotem para oferecer nos domíniosda criatividade, do design, dasartes ou da tecnologia, onde nacidade existem elevadas compe-tências. Temos uma universida-de, empresas e projectos rele-vantes no design, teatro, pintu-ra, música, fotografia, cerâmicaartística e tecnologias. Aveiro éonde se localiza o “cluster” dastecnologias da informação e

comunicação, mas não temsabido tirar partido dessesrecursos que são únicos a nívelnacional. É um absurdo haveruma crise e não tirarmos parti-do do que nos distingue no con-texto nacional. A praça podiaser um interessante cruzamen-to entre a história e a contempo-raneidade, as artes e a tecnolo-gia, e podia ser uma mostra daenergia criativa do que a cidadee a região têm para oferecer eque é muitas vezes desconheci-da do comum dos cidadãos e dosvisitantes. E Aveiro está a com-petir a nível nacional com out-ras cidades do ponto de vistaturístico, económico, das insti-tuições de ensino superior…Essa competição exige que sai-bamos tirar partido do que nosafirma. Mas este não pode serum projecto pontual. Tem de seruma rede de projectos e aquela

praça não pode ser desligada doconjunto da cidade. Não pode-mos ter uma visão fragmentadada cidade.

E é isso que tem acontecido? ACâmara tem olhado para estesprojectos como peças fragmen-tados? Falta uma visão mais glo-bal e coerente?Partindo do exemplo da praça,não há um pensamento globalsobre a cidade. E nós queremos a-lertar para a necessidade de incu-tir um pensamento global mesmoquando estamos a trabalhar numespaço relativamente reduzido.

Quais são as expectativas do mo-

vimento relativamente ao futuroda Avenida Lourenço Peixinho?Nós não temos as soluções namanga. Mas acreditamos queeste tipo de abordagens exigemétodo. Em primeiro temos dediscutir o que queremos da ave-nida, que papel queremos quedesempenhe. E depois temos dediscutir as funções que respon-dem a esse desígnio. Do nossoponto de vista, o desígnio devepassar por afirmar a avenidacomo um espaço de fruição, umcerto recuar à sua função origi-nal de centro cívico e cultural. Oque significa que deveríamosprocurar atenuar o carácter devia rodoviária que tem hoje e

“MAS A QUESTÃO QUE VALE A PENADISCUTIR É O QUE É POSSÍVEL FAZERPARA QUE A AVENIDA ENTRE NAAGENDA POLÍTICA. NÃO PODEMOSDEIXAR A AVENIDA DE FORA”