Pedido de ingresso como amicus curiae ajd

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ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA Rua Maria Paula, 36 - 11º andar conj. 11-B telefone (11) 3242-8018 - fone/fax: (11) 3105-3611 , CEP 01319-904 - São Paulo-SP - Brasil www.ajd.org.br - [email protected] EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA ROSA WEBER, RELATORA DO MANDADO DE SEGURANÇA Nº 33.078/DF, “o apelo ao argumento "pacto federativo" não é exitoso por nenhum ângulo e por nenhuma interpretação possível do que seja exatamente esse pacto. Além disso, a mistura de elementos - discricionariedade, lacunas, federação, competências - só torna a solidez argumentativa mais questionável”. (Parecer do Prof. Titular Virgílio Afonso da Silva) Manifestação de AMICUS CURIAE Juntada de PARECER do Prof. Titular Virgílio Afonso da Silva A ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA (AJD), entidade não governamental, sem fins lucrativos e corporativistas, cujos objetivos estatutários, dentre outros, são: o respeito absoluto e incondicional aos valores jurídicos próprios do Estado Democrático de Direito e a defesa da independência do Poder Judiciário não só perante os demais poderes como também perante grupos de qualquer natureza, internos ou externos à Magistratura, vem à presença desse E. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL apresentar sua manifestação, na qualidade de AMICUS CURIAE, junto aos autos do Mandado de Segurança de nº 33.078/DF, conforme segue: 31269272896 MS 33078

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ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA

Rua Maria Paula, 36 - 11º andar – conj. 11-B – telefone (11) 3242-8018 - fone/fax:

(11) 3105-3611 , CEP 01319-904 - São Paulo-SP - Brasil www.ajd.org.br -

[email protected]

EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA ROSA WEBER, RELATORA DO

MANDADO DE SEGURANÇA Nº 33.078/DF,

“o apelo ao argumento "pacto federativo" não é exitoso por nenhum

ângulo e por nenhuma interpretação possível do que seja exatamente

esse pacto. Além disso, a mistura de elementos - discricionariedade,

lacunas, federação, competências - só torna a solidez argumentativa

mais questionável”.

(Parecer do Prof. Titular Virgílio Afonso da Silva)

Manifestação de AMICUS CURIAE

Juntada de PARECER do Prof. Titular Virgílio Afonso da Silva

A ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA (AJD),

entidade não governamental, sem fins lucrativos e corporativistas, cujos objetivos

estatutários, dentre outros, são: o respeito absoluto e incondicional aos valores jurídicos

próprios do Estado Democrático de Direito e a defesa da independência do Poder

Judiciário não só perante os demais poderes como também perante grupos de qualquer

natureza, internos ou externos à Magistratura, vem à presença desse E. SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL apresentar sua manifestação, na qualidade de AMICUS CURIAE, junto

aos autos do Mandado de Segurança de nº 33.078/DF, conforme segue:

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1. Da admissibilidade da intervenção da AJD

Conforme se pode depreender dos autos, motivada por um então episódio

concreto envolvendo a troca de designações do magistrado paulista Roberto Luiz

Corcioli Filho, com seu afastamento informal das áreas criminal e infracional, inclusive

respectivos plantões, esta Associação propôs, junto ao CONSELHO NACIONAL DE

JUSTIÇA (CNJ), o pedido de providências nº 0002040-91.2014.2.00.0000, com o

objetivo de se evitar a repetição de novos episódios de desrespeito às garantias

funcionais dos magistrados, especificamente a independência e a inamovibilidade,

rogando que o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO (TJSP) fosse

compelido a respeitar tais garantias constitucionais, editando norma com critérios

impessoais e objetivos para as designações de juízes auxiliares da Capital.

Paralelo ao pedido de providências proposto por esta Associação, o

próprio magistrado referido também postulou junto ao CNJ e, em seu pedido de nº

0001527-26.2014.2.00.0000, obteve êxito em ver o Tribunal paulista obrigado a

regulamentar as designações dos juízes auxiliares da Capital em respeito às normas,

princípios e garantias constitucionais. E em razão do pedido do magistrado ter

englobado o pedido desta Associação e ter recebido resultado favorável (parcial ao

magistrado – já que também postulou em relação a questão específica a ele –, mas total

aos interesses desta Associação – que postulara, evidentemente, em caráter geral) por

parte do CNJ, aquele Conselho estendeu tal resultado ao feito proposto pela AJD.

Ocorre que a Corte bandeirante, inconformada, e por meio da

Procuradoria do Estado de São Paulo, impetrou o presente Mandado de Segurança com

o fim de atacar a referida decisão do CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA.

O magistrado Roberto Luiz Corcioli Filho postulou, então, seu ingresso

no feito na qualidade de litisconsorte passivo necessário, posto que, nas palavras

posteriores do Eminente Procurador-Geral da República em parecer lapidar já juntado

aos autos, “sofrerá diretamente, sem dúvida, os efeitos jurídicos da decisão” (fls. 8 do

parecer).

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E, do mesmo modo, forçoso reconhecer que também esta ASSOCIAÇÃO

JUÍZES PARA A DEMOCRACIA tem patente e legítimo interesse em intervir no

presente Mandado de Segurança. Não apenas porque a questão aqui tratada diz

respeito a garantias da magistratura, garantias ligadas à ideia de república e também ao

conceito material de democracia, sendo que a Associação, conforme constou em sua

qualificação supra, “é uma entidade não governamental, sem fins lucrativos e

corporativistas, cujos objetivos estatutários, dentre outros, são: o respeito absoluto e

incondicional aos valores jurídicos próprios do Estado Democrático de Direito e a

defesa da independência do Poder Judiciário não só perante os demais poderes

como também perante grupos de qualquer natureza, internos ou externos à

Magistratura”, de modo que é evidente que a participação desta Associação no feito

contribuirá para o profícuo debate que levará esse Suprema Corte a uma decisão justa e

assentada na melhor interpretação da Constituição, como também porque esta

Associação postulou junto ao CNJ e igualmente sofrerá com o resultado deste

Mandado de Segurança que visa afastar a decisão daquele Conselho, que fora

totalmente favorável aos interesses da ora postulante.

Assim, é manifesto o legítimo interesse desta Associação em ser admitida

no feito.

2. Breves considerações para a improcedência do mandamus

A presente intervenção se propõe a ser extremamente breve,

especialmente porque a manifestação do magistrado Roberto Luiz Corcioli Filho nestes

autos, por meio de lapidar peça de seus patronos, já trouxe todos os elementos

necessários para a boa compreensão da questão e para o convencimento desse E.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, pensamos. Também em razão da Advocacia-Geral da

União não ter se furtado de defender o ato atacado pelo writ: ingressou no feito e, da

mesma maneira, apresentou cristalina manifestação ressaltando o acerto da decisão do

CNJ. E, ainda, há poucos dias viu-se juntar aos autos um magistral parecer da lavra

do Excelentíssimo Procurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot Monteiro de

Barros, que, ponto por ponto, demonstrou o acerto do entendimento do CNJ e a absoluta

improcedência da irresignação do E. Tribunal bandeirante. Assim, de modo a não

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repetirmos os argumentos definitivos já lançados nos autos, tomamos a liberdade

de remeter exatamente àquelas peças supramencionadas.

Transcrevemos, a seguir, apenas os principais argumentos expostos na

peça desta Associação dirigida ao Conselho Nacional de Justiça quando de seu pedido

de providências para, em seguida, trazer a baila alguns dos argumentos produzidos pelo

PROFESSOR TITULAR DE DIREITO CONSTITUCIONAL DA FACULDADE DE DIREITO DA

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, Dr. Virgílio Afonso da Silva, em parecer gentilmente

concedido a esta Associação a respeito do presente Mandado de Segurança.

“Conforme Lei Complementar Estadual Paulista nº 980 de 21

de dezembro de 2005, a carreira da magistratura de 1º grau do TJSP é regrada

mediante a seguinte divisão administrativa: juízes substitutos, juízes de

entrância inicial, juízes de entrância intermediária e juízes de entrância final.

O cargo de juiz substituto, como ocorre nos demais tribunais do

país, é ocupado por magistrados recém-ingressos na carreira, estando

submetidos à designação por parte da presidência da corte. Os magistrados de

entrância inicial e final são titulares de varas. Por fim, os juízes de entrância

intermediária podem ocupar a titularidade de vara ou a função de juiz auxiliar,

nas comarcas de entrância final, estes últimos submetidos à designação da

presidência do Tribunal de Justiça.

Assim, por exemplo, a Comarca da Capital de São Paulo é

classificada como de entrância final; todavia, nela trabalham magistrados de

entrância intermediária, conhecidos como juízes auxiliares da capital,

submetidos à designação da presidência do tribunal a qualquer vara da capital

paulista. Da mesma forma, sucede em outras comarcas de entrância final -

como Campinas, Santos, São José dos Campos, dentre tantas outras -, ocupadas

não apenas por magistrados titulares, mas também por juízes auxiliares de

entrância intermediária.

(...)

A sujeição de juízes de direito à livre designação da presidência

do tribunal obedece a imperativo de ordem prática. Objetiva-se o regular

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funcionamento de varas nas hipóteses em que os respectivos magistrados

titulares estejam afastados das funções (férias, licença, etc.), tenham sido

promovidos ou removidos ou ainda necessitem do auxílio de outro colega em

razão de sobrecarga de serviço.

Essa circunstância não permite concluir que ao E. Tribunal de

Justiça de São Paulo foi atribuída a função de designar juízes de direito por

critérios pessoais ou políticos. A designação de magistrados deve atender ao

interesse público consistente na prestação de serviços contínuos e eficazes por

varas ocupadas por juízes competentes e independentes.

Trata-se de exigência da Constituição Federal (CF), cujo artigo

5º, inciso LIV garante o devido processo legal; cujo artigo 37, caput impõe à

administração pública a obediência ao princípio da impessoalidade e cujo

artigo 95, inciso II determina a inamovibilidade como meio necessário à

garantia do juiz natural. Trata-se, em suma, de exigência das liberdades

públicas democráticas, que impõem julgamentos justos, proferidos por juízes

independentes.

Importante lembrar que o juiz só é livre para julgar se lhe

for garantido que não poderá ser afastado do local que exerce o seu mister,

especialmente por razões jurisdicionais. Essa garantia é aplicada a todos os

magistrados, indistintamente, inclusive os juízes substitutos e auxiliares.

A violação à independência funcional pode se dar, não apenas

por ações dos poderes Executivo e Legislativo, como ainda por intermédio de

práticas administrativas internas do próprio tribunal a que pertence o juiz de

direito. Daí a advertência de Eugenio Raúl Zaffaroni: ‘A independência do juiz

é a que importa a garantia de que o magistrado não está submetido às pressões

do poderes externos à própria magistratura, mas também implica a segurança de

que o juiz não sofrerá ás pressões dos órgãos colegiados da própria judicatura’

(Poder Judiciário, Crise, Acertos e Desacertos, Editora Revista dos Tribunais,

1995).

O tema guarda tamanha relevância que no Sétimo Congresso

das Nações Unidas, realizado em agosto de 1985, mereceu especial destaque,

oportunidade na qual a ONU adotou os princípios básicos relativos à

independência judicial. Destacou entre outros princípios que a independência da

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judicatura deve ser garantida pelo Estado; que todas as instituições

governamentais e de outra natureza devem respeitar e acatar o princípio de

independência; que é necessário que os julgamentos sejam realizados sem

pressões, ameaças, intromissões, aliciamentos e, por fim, que é dever

garantir a inamovibilidade dos magistrados.

Nessa linha, vale destacar que acerca do tema manifestou-se o

Procurador Geral da República, na ADI 3358, nos seguintes termos: ‘a garantia

da inamovibilidade encontra-se regulada pelo artigo 95, inciso II, da

Constituição Federal. Ao disciplinar a matéria, o texto constitucional conferiu

tal garantia aos magistrados, sem fazer qualquer distinção entre juízes titulares

ou substitutos, tampouco entre os juízes integrantes dos diversos órgãos do

Poder Judiciário’.”

(grifou-se)

3. A questão do pacto federativo e a opinião do Dr. Virgílio Afonso

da Silva, PROFESSOR TITULAR DE DIREITO CONSTITUCIONAL DA FACULDADE DE

DIREITO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Em anexo, trazemos a opinião legal do Prof. Titular Virgílio Afonso da

Silva a respeito de um dos principais pontos trazidos à discussão neste Mandado de

Segurança – e que certamente carrega uma grande importância para o enfrentamento de

outros casos por essa Corte que envolvam decisões do CONSELHO NACIONAL DE

JUSTIÇA.

Dentre outros argumentos – todos insustentáveis, conforme a exposição

retro e as brilhantes manifestações nestes autos, também referidas –, a impetrante

sustentou que a lei paulista não previu a possibilidade de vir a ser regulamentada e que a

decisão do CNJ feriria o pacto federativo.

Conforme o Prof. Virgílio Afonso da Silva, “o Tribunal de Justiça de São

Paulo e a Procuradoria do Estado de São Paulo argumentaram que essa decisão fere o

pacto federativo, porque o CNJ estaria impondo a edição de um ato normativo não

previsto pela legislação estadual. O argumento, como se vê, é composto por duas partes:

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(1) a suposição de que a não previsão expressa de regulamentação na lei estadual

implica uma discricionariedade absoluta da presidência do Tribunal de Justiça de São

Paulo; e (2) que qualquer exigência de regulamentação, por mais genérica que seja, fere

o pacto federativo porque privaria a presidência do TJ-SP da liberdade que a lei estadual

supostamente garante. Essa linha de argumentos, contudo, não é convincente, pelos

motivos que analisarei a seguir”.

De fato, “o que a PGE-SP pretende fazer crer é que só se exige a

regulamentação de uma lei se a própria lei previr expressamente essa regulamentação.

Nada mais sem sentido. Se isso fosse assim, o mesmo valeria na relação entre a

constituição e a legislação ordinária, isto é, somente haveria regulamentação pela lei

quando a própria constituição assim previsse. Uma leitura bastante rápida da

constituição seria suficiente para fornecer centenas de exemplos de dispositivos que não

fazem qualquer menção a atividade legislativa ou regulamentar inferior mas que, sem

essa atividade, não conseguem produzir os efeitos desejados. Esses dispositivos,

portanto, carecem de regulamentação, quer a constituição assim preveja, quer não.

E, para que ninguém argumente que o caso da constituição é sui generis,

é preciso que se diga desde já que o mesmo vale para a relação entre lei e decreto (ou

outro tipo de diploma infralegal). Nesse caso também bastaria a leitura de algumas

poucas leis para perceber que a ausência de referência à atividade regulamentar não

significa a desnecessidade de regulamentação”.

Portanto, é evidente que não há sentido algum em se defender que não se

pode exigir a existência de critérios objetivos para as designações de juízes auxiliares a

serem previstos por norma regulamentar do TJSP.

E continua o professor: “se a presidência do TJ-SP decidir não mais

nomear mulheres como juízas auxiliares em varas criminais ou homens para as

varas de família, isso teria que ser aceito? A resposta, unânime, seria que a

presidência do TJ-SP não pode utilizar esse critério, porque ele é incompatível com a

constituição, que proíbe a distinção entre homens e mulheres. Nada mais simples.

Mas essa mesma constituição também estabelece princípios básicos da

administração pública (art. 37). Aqui basta mencionar a impessoalidade. Quando o

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CNJ estabelece que o Tribunal de Justiça deve estabelecer critérios objetivos e

impessoais, ele está apenas exigindo que o Tribunal de Justiça de São Paulo, como

toda e qualquer instituição pública, tome suas decisões em conformidade com

princípios que, tanto quanto a igualdade entre gêneros, fazem parte da

constituição brasileira” (grifou-se).

Já quanto ao pacto federativo, o PROFESSOR TITULAR DE DIREITO

CONSTITUCIONAL DA FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, Dr.

Virgílio Afonso da Silva, vê-se obrigado a lembrar o óbvio: “O Poder Judiciário, a

despeito de divisões em justiça estadual e federal, é nacional”, de modo que não se

sustenta o argumento de ofensa ao pacto federativo com a decisão do CNJ.

E arremata: “e o apelo casuístico ao pacto federativo pode ser notado na

própria manifestação do Tribunal de Justiça de São Paulo que, de um lado, afirma que a

exigência de critérios objetivos e impessoais não poderia ser feita pelo CNJ, mas, de

outro lado, aceita, por exemplo, cumprir a exigência de publicação da escala de

plantões, feita pela Resolução CNJ 71/2009. Por que o TJ-SP acata uma resolução do

CNJ que interfere em sua organização, mas se recusa a acatar outra de mesma natureza,

é algo que não fica claro nem nas manifestações do Tribunal, nem da PGE-SP”.

4. Pedido

Ante o acima exposto, espera esta Associação a admissão de sua

intervenção nos autos e que o presente Mandado de Segurança seja improvido ao final.

Termos em que,

Pede deferimento.

De Londrina para Brasília, 23 de janeiro de 2015.

Fernando Buono

OAB/PR nº 35.381

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