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PECADOS SAGRADOS

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A Pousada do Fim do Rio

O Testamento

Traições Legítimas

Três Destinos

Lua de Sangue

Doce Vingança

Segredos

O Amuleto

Santuário

Resgatado pelo Amor

A Villa

Tesouro Secreto

Pecados Sagrados

Virtude Indecente

Trilogia do Sonho

Um Sonho de AmorUm Sonho de Vida

Um Sonho de Esperança

Trilogia do Coração

Diamantes do SolLágrimas da LuaCoração do Mar

Trilogia da Magia

Dançando no ArEntre o Céu e a TerraEnfrentando o Fogo

Trilogia da Gratidão

Arrebatado pelo MarMovido pela Maré

Protegido pelo Porto

Trilogia da Fraternidade

Laços de FogoLaços de Gelo

Laços de Pecado

Nora Roberts

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N o r a

R o b e r t s

PECADOS

SAGRADOS

TraduçãoAlda Porto

A. B. Pinheiro de Lemos

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Copyright © 1987 by Nora Roberts

Título original: Sacred Sins

Capa: Leonardo Carvalho

Editoração: DFL

2009Impresso no BrasilPrinted in Brazil

Roberts, Nora, 1950-Pecados sagrados/Nora Roberts; tradução de Alda Porto. — Rio de

Janeiro: Bertrand Brasil, 2009.350p.

Tradução de: Sacred sinsISBN 978-85-286-1378-0

1. Romance americano. I. Porto, Alda. II. Título.

CDD – 813CDU – 821.111(73)-309-0861

R549p

CIP-Brasil. Catalogação na fonteSindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ

Todos os direitos reservados pela:EDITORA BERTRAND BRASIL LTDA.Rua Argentina, 171 – 1º. andar – São Cristóvão20921-380 – Rio de Janeiro – RJTel.: (0XX21) 2585-2070 – Fax: (0XX21) 2585-2087

Não é permitida a reprodução total ou parcial desta obra, por quaisquer meios,sem a prévia autorização por escrito da Editora.

Atendemos pelo Reembolso Postal.

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Para minha mãe,

com agradecimentos pelo incentivo a contar esta história.

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Quinze de agosto. Um dia após outro de suor e céus nebulo-sos. Sem nuvens brancas fofas nem brisas aprazíveis, apenasuma parede de umidade quase espessa o suficiente para

alguém nadar.Reportagens dos noticiários das seis e das onze prometiam

melancolicamente mais. Nos últimos dias longos, morosos, deverão, a onda de calor avançando pela segunda e impiedosa semanafoi a maior matéria publicada em Washington, capital.

O Senado entrara em recesso até setembro, por isso a colina doCapitólio movia-se indolente. Relaxando antes de uma viagem àEuropa havia muito acalentada, o presidente refrescava-se em CampDavid. Sem o vaivém diário de políticos, Washington era uma cida-de de turistas e vendedores ambulantes. Do outro lado doSmithsonian, um mímico apresentava-se a um público que pararamais para recuperar o fôlego coletivo do que em apreciação da arte.Bonitos vestidos de verão murchavam, e crianças choramingavampor sorvete.

Os jovens e os velhos afluíam ao parque público de Rock Creek,usando a sombra e a água como uma defesa contra o calor. Con-

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sumiam-se refrigerantes e limonada aos litros, emborcavam-se cer-veja e vinho na mesma quantidade, mas de forma menos conspícua.As garrafas tinham um jeito de desaparecer quando a polícia do par-que o percorria. Nos piqueniques e churrascos ao ar livre, as pessoasenxugavam o suor, preparavam cachorros-quentes e vigiavam osbebês que caminhavam com passinhos incertos no gramado. Mãesgritavam aos filhos para que ficassem longe da água, não corressemperto da rua, largassem paus ou pedras. A música de rádios portáteisera, como sempre, alta e desafiante; trilhas quentes, como as chama-vam os discotecários, que informavam temperaturas no alto dostrinta graus.

Pequenos grupos de estudantes reuniam-se, alguns sentados naspedras acima do riacho, para discutir o destino do mundo, outros serefestelavam no gramado, mais interessados no destino dos bronzea-dos. Os que tinham tempo e gasolina de sobra haviam fugido para apraia ou as montanhas. Alguns universitários encontravam energiapara lançar discos de plástico, os homens ficavam só de calção paraexibir o torso com um bronzeado uniforme.

Uma jovem artista plástica estava sentada sob uma árvore e faziaesboços na maior indolência. Após várias tentativas de atrair a aten-ção dela para os seus bíceps, que vinha trabalhando durante seismeses, um dos jogadores tomou um caminho mais óbvio. O discopousou no bloco da moça com um estalo. Quando ela ergueu osolhos aborrecida, ele aproximou-se correndo. Exibia um sorriso dedesculpas, e calculado, pois esperara fasciná-la.

— Desculpe. Escapuliu.Após empurrar uma cascata de cabelos escuros sobre o ombro, a

pintora devolveu-lhe o disco.— Não foi nada.Retornou ao esboço sem sequer dar-lhe uma olhada.Juventude é sinônimo de tenacidade. Agachando-se ao lado

dela, ele examinou o desenho. O que sabia sobre arte não enchiauma xicrinha, mas não custava nada dar uma inocente opinião.

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— Escute, isso é bom mesmo. Onde você estuda?Reconhecendo o estratagema, ela ia ignorá-lo, mas ergueu o

rosto apenas para retribuir o sorriso. Talvez ele fosse óbvio, mas erabonitinho.

— Georgetown.— Está brincando? Eu também. Bacharelado de direito.Impaciente, o companheiro do rapaz gritou do outro lado do

gramado:— Rod! Vamos tomar uma loura ou não?— Você vem com freqüência aqui? — perguntou Rod, ignoran-

do o amigo.A pintora tinha os maiores olhos castanhos que ele já vira.— De vez em quando.— Como a gente...— Rod, anda. Vamos tomar aquela cerveja.Ele olhou para o amigo suado, meio acima do peso, e depois de

volta aos frios olhos castanhos da artista. Não havia comparação.— Eu alcanço você depois, Pete — gritou, e lançou o disco num

arco alto e negligente.— Terminou de jogar? — perguntou a jovem, vendo o vôo do

disco.Rod riu e tocou as pontas dos cabelos dela.— Depende.Praguejando, Pete partiu em perseguição ao disco. Acabara de

pagar seis dólares por ele. Após quase tropeçar num cachorro, desli-zou por um barranco abaixo, torcendo para que o disco não caísseno riacho.

Sentiu o coração parar, e depois o sangue disparar e martelar nacabeça. Antes que pudesse inspirar para gritar, vomitou com violên-cia o lanche de batata frita e dois cachorros-quentes.

O disco pousara a cinqüenta centímetros da margem da ensea-da. Novo, vermelho e alegre numa mão branca que parecia atirá-lode volta.

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Era Carla Johnson, aluna de teatro de vinte e três anos e garço-nete em meio período. De doze a quinze horas antes, fora estrangu-lada com um amicto de padre. Branco, debruado com fio de ouro.

O DETETIVE BEN PARIS DESABOU DIANTE DA MESA DE TRA-

balho após terminar o relatório escrito sobre o homicídio Johnson.Datilografara os fatos, usando dois dedos no estilo metralhadora.Mas agora eles retaliavam. Nenhum ataque sexual, nenhum roubovisível. A bolsa continuava embaixo do corpo, com vinte e três dóla-res e setenta e cinco centavos e um MasterCard. Um anel de opalaque teria sido empenhado por cerca de cinqüenta ainda se encontra-va no dedo da morta. Sem motivo, nem suspeitos. Nada.

Ben e o parceiro haviam passado a tarde entrevistando a famíliada vítima. Uma coisa terrível, pensou. Necessária, mas terrível.Haviam desencavado as mesmas respostas a cada vez. Carla queriaser atriz. A vida dela eram os estudos. Namorava, mas não a sério —dedicava-se demais à ambição que jamais viria a realizar.

Ben passou mais uma vez os olhos pelo relatório e demorou-sesobre a arma do crime: o pano branco que cobre o pescoço e osombros do padre sob a batina. Havia um bilhete alfinetado ao lado.Ele próprio se ajoelhara ao lado da morta antes de lê-lo:

Seus pecados lhe são perdoados.

— Amém — murmurou Ben, e soltou um longo suspiro.

PASSAVA DA UMA DA MANHÃ DA SEGUNDA SEMANA DE SETEM-

bro quando Barbara Clayton cortou caminho pelo gramado daCatedral de Washington. Embora o ar fosse quente e as estrelas bri-lhassem, ela não tinha ânimo para apreciá-los. Enquanto caminhavaresmungava mal-humorada. Dera uma bronca no mecânico com

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cara de furão pela manhã. Ele disse que fixou a transmissão de formatão boa quanto nova. Que traste! O bom era que só faltavam maisduas quadras para percorrer. Agora teria de tomar o ônibus para otrabalho. O filho-da-mãe abominável e sujo de graxa ia pagar. Umaestrela cadente explodiu e deslizou pelo céu num arco brilhante.Barbara sequer notou.

Nem o homem que a espreitava. Sabia que ela viria. Não o haviammandado vigiá-la? Não sentia a cabeça, mesmo agora, quase explodin-do da pressão da Voz? Fora escolhido, recebera o fardo e a glória.

— Dominus vobiscum — murmurou e segurou com força nasmãos o macio amicto branco do padre.

Quando concluiu sua missão, sentiu a intensa euforia do poder.Os hormônios ferviam. O sangue uivava. Ele estava limpo. E assim,agora, ela. Lenta, delicadamente, levou o polegar à testa, aos lábiose ao coração da morta, no sinal-da-cruz. Deu-lhe a absolvição, masrápido. A Voz advertira-o de que muitos não entenderiam a purezado trabalho que ele fazia.

Deixando o cadáver nas sombras, saiu andando, olhos brilhan-tes de lágrimas de alegria e loucura.

— A MÍDIA NÃO LARGA NOSSO PÉ COM ISSO. — O CAPITÃO

Harris bateu com força o punho no jornal aberto sobre a mesa. —Toda a maldita cidade está em pânico. Quando eu descobrir quemvazou esse negócio de padre para a imprensa...

Interrompeu-se, recompondo-se. Não era com freqüência quechegava tão próximo de perder o controle. Podia sentar-se atrás deuma mesa, mas era um policial, um policial danado de bom. Umbom tira não perde o controle. Para dar tempo a si mesmo, dobrouo jornal e deixou o olhar deslizar pelos outros policiais na sala.Excelentes, admitiu Harris. Não toleraria menos.

Ben Paris, sentado a um canto da mesa, brincava com um pesode papel de acrílico. Harris conhecia-o bem demais para entenderque ele gostava de ter uma coisa nas mãos quando pensava. Jovem,

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refletiu, mas tarimbado com dez anos na tropa. Policial incorruptível,embora meio informal no procedimento. Quando as coisas estavammenos tensas, até divertia o capitão o fato de Ben parecer a versãoadaptada por um roteirista de Hollywood de um agente secreto —rosto fino, ossos fortes, moreno, magro e musculoso. Cabelos cheiose compridos demais para serem convencionais, porém cortadosnum daqueles elegantes salões pequenos de Georgetown. Tinhaolhos verde-claros aos quais não escapava o que era importante.

Numa cadeira, a um metro de pernas estendidas diante dele,sentava-se Ed Jackson, seu parceiro. Com um metro e noventa ecinco de altura e pouco menos de cento e quinze quilos, podia emgeral intimidar de imediato um suspeito. Por capricho ou intenção,usava uma barba cheia tão ruiva quanto a juba encaracolada nacabeça. Tinha olhos azuis e afetuosos. A cinqüenta metros, con-seguia abrir um buraco na águia de uma moeda americana de vintee cinco centavos com a arma especial da polícia.

Harris largou o jornal, mas não se sentou.— Que você conseguiu?Ben jogou o peso de papel de uma mão para outra e largou-o.— Além da constituição física e da cor, não há ligação alguma

entre as vítimas, nada de amigos comuns, nem saídas mútuas. Vocêrecebeu o resumo sobre Carla Johnson. Barbara Clayton trabalhavanuma loja de roupas em Maryland, divorciada, sem filhos. Vinhasaindo com alguém com muita assiduidade até três meses atrás. Ascoisas malograram, ele se mudou para Los Angeles. Estamos inves-tigando o cara, mas parece limpo.

Enfiou a mão no bolso para pegar um cigarro e percebeu o olhardo parceiro.

— É o sexto — disse Ed, como quem não quer nada. — Benestá tentando limitar a menos de um maço por dia — explicou, econtinuou ele próprio o relatório:

— Barbara passou a noite num bar em Wisconsin. Tipo saídanoturna só de meninas, com uma amiga que trabalha com ela.

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A amiga disse que Barbara foi embora por volta de uma da manhã.Seu carro foi encontrado enguiçado a duas quadras do ataque.Parece que teve problemas na transmissão e decidiu ir a pé. O apar-tamento dela fica a menos de um quilômetro dali.

— As únicas coisas que as vítimas tinham em comum eram serlouras, brancas e mulheres. — Ben tragou fundo a fumaça, deixou-aencher os pulmões e soltou-a. — Agora estão mortas.

Em sua jurisdição, pensou Harris, e tomou a coisa pessoalmente.— A arma do crime, a estola do padre.— Amicto — informou Ben. — Não pareceu difícil demais

investigar. Nosso cara usa o melhor... seda.— Não comprou na cidade — continuou Ed. — Não no ano

passado, pelo menos. Checamos cada loja de artigos religiosos, cadaigreja. Liguei para três revendedores em New England que têm essetipo.

— As notas eram escritas em papel existente em qualquer lojacomum — acrescentou Ben. — Não temos como reconstituir a ori-gem delas ao dono.

— Em outras palavras, vocês não conseguiram nada.— Em outras palavras — Ben sorveu outra tragada —, não

temos nada.Harris examinou cada homem em silêncio. Talvez desejasse que

Ben usasse uma gravata e Ed aparasse a barba, mas tratava-se de umaquestão pessoal. Eram os melhores. Paris, com o encanto indolente ea despreocupação superficial, tinha o instinto de uma raposa e amente afiada como um estilete. Jackson era meticuloso e eficientecomo uma tia solteirona. Um caso para ele não passava de um quebra-cabeça, do qual nunca se cansava de mexer nas peças.

Harris inalou a fumaça do cigarro de Ben, depois se lembrouque deixara de fumar para seu próprio bem.

— Voltem e falem com todos de novo. Obtenham o relatório doex-namorado de Barbara e as listas dos representantes de artigos religio-sos. — Olhou mais uma vez o jornal. — Quero acabar com esse cara.

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— O Padre — murmurou Ben, passando os olhos pela manche-te. — A imprensa sempre gosta de dar um título a esses psicóticos.

— E grande cobertura — acrescentou Harris. — Vamos tirá-lodas manchetes e enfiá-lo atrás das grades.

CONFUSA APÓS UMA LONGA NOITE DE TRABALHO ADMINIS-

trativo, a Dra. Teresa Court tomava café e passava os olhos pelo Post.Uma semana inteira após o segundo assassinato e o Padre, como obatizara a imprensa, continuava foragido. Não considerava a leiturasobre ele a melhor maneira de começar o dia, mas profissionalmen-te o homem a interessava. Não era indiferente à morte de duasjovens, mas fora formada para examinar fatos e diagnosticar.Dedicara a vida a isso.

Em termos profissionais, sua vida era atormentada por proble-mas, dor e frustrações. Para compensar, ela mantinha o mundo pri-vado organizado e simples. Como crescera protegida pela riqueza ecom boa educação, considerava a gravura de Matisse na parede e ocristal Baccarat na mesa algo natural. Preferia linhas simples e tonspastéis, mas, de vez em quando, se via atraída por alguma coisa gri-tante, como o óleo abstrato em vívidas pinceladas e cores arrogantesacima da mesa. Entendia a necessidade do berrante além do suave esentia-se contente. Tinha como uma de suas principais prioridadespermanecer alegre.

Como o café já esfriara, ela afastou-o. Após um instante, afastoutambém o jornal. Gostaria de saber mais sobre o assassino e as víti-mas, conhecer todos os detalhes. Então se lembrou do velho ditadosobre tomar cuidado com o que se desejava porque se poderia obter.Com uma rápida conferida no relógio, levantou-se da mesa. Nãotinha tempo para remoer uma matéria de jornal. Precisava ver osseus pacientes.

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AS CIDADES ADQUIREM O MÁXIMO DE ESPLENDOR NO OUTO-no. O verão as assa, o inverno deixa-as paralisadas e sombrias, mas ooutono dá-lhes uma explosão de cor e dignidade.

Às duas da manhã, numa fria madrugada de outubro, Ben Parisviu-se de repente bem acordado. De nada adiantava perguntar-se oque lhe perturbara o sono e o interessante sonho com três louras.Levantando-se nu, dirigiu-se à cômoda e tateou à procura dos cigar-ros. Vinte e dois, contou em silêncio.

Acendeu um e deixou o conhecido gosto amargo encher-lhe aboca antes de ir à cozinha fazer café. Ligou a luz fluorescente nofogão e manteve o olhar atento ao surgimento de baratas. Nadaescorregou nas fendas. Ben acendeu a chama sob a chaleira e achouque a última dedetização continuava eficaz. Ao estender a mão parauma xícara, afastou o volume de dois dias de correspondência queainda tinha de abrir.

Na intensa luz da cozinha, seu rosto parecia duro, até perigoso.Mas também… pensava em assassinato. O corpo nu era flexível,alto, magro e de pernas longas, com uma estreiteza que seria esque-lética sem as sutis saliências dos músculos.

O café não o manteria acordado. Quando tivesse a mente lúci-da, o corpo logo faria o mesmo. Treinara-se por meio de infindáveisvigilâncias policiais.

Uma gata mirrada cor-de-pó saltou na mesa e encarou-o,enquanto ele tomava o café e fumava. Notando-o distraído, a gatapreparou-se mais uma vez para a idéia do pires de leite tarde da noitee sentou-se para observar.

Não se achavam mais próximos de encontrar o assassino do quena tarde em que se descobrira o primeiro cadáver. Se houvessemencontrado algo mesmo de longe semelhante a uma pista, haviadesaparecido após os primeiros quilômetros de trabalho de campo.Beco sem saída, refletiu Ben. Zero. Nada.

Claro, houve cinco confissões em apenas um mês. Todas dementes perturbadas que ansiavam por atenção. Vinte e seis dias após

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o segundo assassinato e não haviam chegado a conclusão alguma. E,a cada dia que passava, ele sabia, a pista se tornava mais fria. Com adiminuição gradual da pressão da imprensa, as pessoas começavama relaxar. Ele não gostava disso. Acendendo um cigarro na guimbade outro, Ben pensava na calmaria após as tempestades. Olhou a frianoite iluminada por uma meia-lua e ficou pensando.

O DOUG’S FICAVA A CERCA DE OITO QUILÔMETROS DO APAR-tamento de Ben. A pequena boate estava às escuras agora. Os músi-cos tinham ido embora e a bebida fora derramada, esfregada e lava-da. Francie Bowers saiu pela entrada dos fundos e vestiu o suéter.Doíam-lhe os pés. Após seis horas em saltos de dez centímetros, osdedos dos pés latejavam dentro dos tênis. Mesmo assim, as gorjetashaviam valido a pena. O trabalho como garçonete que servia coque-téis talvez a mantivesse em pé, mas, quando se tinha boas pernas —como ela —, as gorjetas entravam aos borbotões.

Mais algumas noites como aquela, pensou, e teria condições dedar a entrada naquele pequeno fusca. Não mais a luta incômodacom ônibus. Essa era a sua idéia de paraíso.

O arco do seu pé emitiu uma cortante pontada de dor.Estremecendo, Francie olhou o beco, que lhe pouparia quase qui-nhentos metros. Mas estava escuro. Ela avançou mais dois passos emdireção ao poste de luz e desistiu. Escuro ou não, não iria andar umpasso a mais do que precisava.

Ele a vinha esperando fazia longo tempo. Mas soubera. A Vozdissera que uma das perdidas estava sendo enviada. Ela se aproxima-va rápido, como se estivesse ansiosa por alcançar a salvação. Durantedias, ele rezara por ela, pela purificação de sua alma. Agora a hora doperdão achava-se bem perto. Ele era apenas um instrumento.

O tumulto, iniciado na sua cabeça, desceu em espiral. O poderinundou-o. Nas sombras, ele orou até ela falecer.

Agia rápido, pois era misericordioso. Assim que passou o amic-to no pescoço, ela teve apenas um instante para arquejar antes de ele

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apertá-lo. Emitiu um leve som líquido tão logo o ar foi cortado.Quando o terror a tomou, ela deixou a bolsa de lona cair e agarrouo laço com as mãos.

Às vezes, quando sentia grande poder, ele as libertava rápido.Mas o mal naquela era forte e desafiava-o. Puxou a seda com osdedos e depois os enterrou com força nas luvas que usava. Assim queo corpo cedeu, ele levantou-a, mas ela continuava a espernear. Umdos pés bateu numa lata e derrubou-a. O barulho ecoou na cabeçadele até quase fazê-lo gritar junto.

Então ela ficou mole, e as lágrimas no rosto dele secaram-se noar outonal. Deitou-a com delicadeza no concreto e absolveu-a nalíngua antiga. Após prender o bilhete no suéter, abençoou-a.

Ela descansava em paz. E, por enquanto, ele também.

— NÃO HÁ MOTIVO ALGUM PRA VOCÊ NOS MATAR DESSE JEITO,

correndo pra lá. — O tom da voz de Ed era sereno quando Ben con-tornou uma curva com o Mustang a cem quilômetros. — Ela já estámorta.

Ben reduziu a marcha e tomou a direita seguinte.— Foi você quem fez o último carro sofrer perda total. Meu últi-

mo carro — acrescentou sem muita maldade. — Só tinha cento ecinqüenta quilômetros rodados.

— Perseguição em alta velocidade — resmungou Ed. OMustang trepidou sobre um calombo e lembrou a Ben que ele pre-tendia verificar os pára-choques. — E eu não o matei.

— Contusões e fissuras. — Ben engrenou a terceira e atravessouuma luz amarela. — Contusões e fissuras múltiplas.

Com uma expressão de quem se lembrava, Ed sorriu.— Nós os pegamos, não foi?— Estavam inconscientes. — Ben parou cantando os pneus

junto ao meio-fio e enfiou as chaves no bolso. — E eu precisei decinco pontos no braço.

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— Ranzinza, ranzinza, ranzinza.Com um bocejo, Ed dobrou-se para sair do carro e endireitou-

se na calçada.Embora mal amanhecesse, e fizesse frio o bastante para se ver a

respiração no ar, uma multidão já se formava. Curvado dentro dajaqueta e desejando um café, Ben abriu caminho por entre os espec-tadores curiosos até o beco isolado por corda.

— Astucioso.Com um aceno da cabeça ao fotógrafo da polícia, baixou os

olhos para a vítima número três.Calculou-lhe a idade entre vinte e seis e vinte e oito anos. Suéter

de poliéster barato, as solas dos tênis quase lisas de gastas. Ela usavabrincos pendentes folheados a ouro. O rosto, uma máscara de pesa-da maquiagem que não caía bem com o suéter e a calça de veludocotelê de lojas de departamentos.

Protegendo com as mãos em concha o segundo cigarro do dia,ele ouviu o relatório do policial uniformizado ao lado.

— Um vagabundo a encontrou. Nós o pegamos num carro doesquadrão curando a bebedeira. Parece que remexia no lixo quandotopou com ela, o que desencadeou o medo enorme no cara, e por issoele saiu correndo do beco e quase bateu na minha radiopatrulha.

Ben assentiu com a cabeça e baixou os olhos para o bilhete presono suéter da vítima. Frustração e fúria despertaram tão rápido den-tro dele que, quando se instalou a aceitação, mal foram notadas.Curvando-se, Ed pegou a enorme bolsa de lona que a vítima deixa-ra cair. Um punhado de fichas de ônibus derramou-se.

Seria um longo dia.

SEIS HORAS DEPOIS, ENTRARAM NO DISTRITO POLICIAL.

A Divisão de Homicídios não tinha a agradável magia do seriadoMiami Vice, mas era quase tão arrumada e limpa quanto as delegaciasdos bairros residenciais afastados nos subúrbios da cidade. Dois anos

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antes, haviam-se pintado as paredes com o que Ben se referia comobege de prédio de apartamentos. A cerâmica do piso suava no verãoe conservava o frio no inverno. Por mais ativo que fosse o serviço demanutenção com desinfetante de pinho e flanelas, as salas cheiravamo tempo todo a fumaça saturada, grãos de café úmido e suor fresco.Era verdade que haviam feito uma vaquinha na primavera e delega-do a um dos detetives a compra de algumas plantas para o parapeitodas janelas, que não estavam morrendo, mas também não floresciam.

Ben passou por uma mesa e acenou para Lou Roderick, quedatilografava um relatório. Era o policial da equipe que registravaconstantemente a quantidade de casos tratados durante determinadoperíodo, como um contador registra as finanças da empresa.

— Harris quer ver você — disse Lou e, sem erguer os olhos,conseguiu transmitir um toque de solidariedade. — Acabou de che-gar de uma reunião com o prefeito. E acho que Maggie Lowensteintem um recado pra você.

— Obrigado. — Ben deu uma olhada comprida para a barra dechocolate na mesa de Roderick. — Escute, Lou...

— Nem pensar.Roderick continuou a datilografar o relatório sem interromper o

ritmo.— A fraternidade é isso aí — resmungou Ben, e encaminhou-se

devagar para Maggie Lowenstein.Ela era um tipo inteiramente diferente de Roderick, pensou.

Trabalhava em surtos, parava e retomava, e sentia-se mais à vontadena rua que diante de uma máquina de escrever. Ben respeitava a pre-cisão de Lou, mas como apoio na retaguarda a escolheria, pois osadequados duas-peças e vestidos elegantes não escondiam o fato deque ela tinha as melhores pernas do departamento. Deu-lhes umarápida olhada antes de sentar-se a um canto da mesa dela. Era umapena que fosse casada, pensou.

Remexendo como quem não quer nada em seus papéis, eleesperou-a terminar a ligação telefônica.

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— Como andam as coisas, Maggie?— Meu triturador de lixo na pia está expelindo tudo pra cima e

o bombeiro quer trezentos paus, mas tudo bem, porque meu mari-do vai consertar. — Ela girou um formulário no rolo da máquina deescrever. — Só que nos custará duas vezes dessa forma. E você? —Deu-lhe um tapa na mão para afastá-la da Pepsi na mesa. — Temalguma coisa nova sobre nosso padre?

— Apenas um cadáver. — Se havia ressentimento na voz dele,era difícil detectar. — Já esteve no Doug’s, mais adiante do Canal?

— Eu não tenho a sua vida social, Paris.Ele bufou rapidamente e pegou a caneca gorda onde ela guarda-

va os lápis.— A moça era uma garçonete que servia coquetéis. Vinte e sete

anos.— De nada adianta deixar isso nos abater — ela murmurou, e

então, vendo a expressão dele, passou-lhe a Pepsi. — Mas semprenos abate. Harris quer ver você e Ed.

— É, eu sei. — Ele tomou um longo gole e deixou o açúcar e acafeína se derramarem no organismo. — Você tem um recado pramim?

— Ah, sim. — Com um sorriso afetado, ela remexeu nos papéisaté encontrá-lo. — Bunny ligou. — Como a voz alteada, estridente,não despertou ânimo algum nele, ela lançou-lhe um olhar brejeiro eentregou-lhe o papel. — Ela quer saber a que horas vai buscá-la.Parecia engraçadinha mesmo, Paris.

Ele enfiou o papel no bolso e riu.— É engraçadinha mesmo, Maggie, mas eu a largaria num

minuto se você quisesse trair seu marido.Quando ele saiu andando sem devolver-lhe o refrigerante, ela

riu e retomou a datilografia do formulário.— Vão transformar meu apartamento em condomínio. —

Ed desligou o telefone e foi com Ben ao escritório de Harris. —Cinqüenta mil. Deus do céu!

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— Tem encanamento ruim.Ben esvaziou o restante da Pepsi e jogou-a numa lata.— É. Tem alguma vaga no seu?— Ninguém sai de lá, a não ser morto.Através da larga vidraça do escritório de Harris, viram o capitão

parado em pé junto à mesa, falando ao telefone. Mantinha-se emboa forma para um homem de cinqüenta e sete anos, que passara osúltimos dez atrás de uma mesa. Tinha muita força de vontade paradeixar-se engordar. O primeiro casamento fora por água abaixo porcausa do trabalho, o segundo por causa da bebida. Abandonara abebida e a esposa, e agora o trabalho ocupava o lugar de ambos. Ospoliciais do departamento não necessariamente gostavam dele, maso respeitavam. Harris preferia as coisas assim. Erguendo os olhos,fez sinal para que os dois entrassem.

— Quero os relatórios do laboratório antes das cinco. Se haviaum pedaço de fio no suéter dela, quero saber de onde veio. Façamseu serviço. Dêem-me alguma coisa em que trabalhar pra eu poderfazer o meu. — Quando desligou, foi até a chapa de aquecimentoelétrico e serviu café. Após cinco anos de abstinência, ainda deseja-va uísque, se fosse escocês. — Me falem de Francie Bowers.

— Ela servia as mesas no Doug’s havia quase um ano. Mudou-se de Virgínia para a capital no último novembro. Morava sozinhanum apartamento em North West. — Ed deslocou o peso do corpode um pé para outro e conferiu o caderno de anotações. — Casadaduas vezes, nenhuma das duas durou mais de um ano. Estamosinvestigando os ex. Trabalhava às noites e dormia de dia, por isso osvizinhos não sabem muita coisa sobre ela. Saiu do trabalho à umada manhã. Parece que cortou caminho pelo beco pra chegar aoponto do ônibus. Não tinha carro.

— Ninguém ouviu nada — acrescentou Ed. — Nem viu coisaalguma.

— Perguntem de novo — disse Harris apenas. — E encontremalguém que tenha ouvido ou visto algo. Mais alguma coisa sobre anúmero um?

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Ben não gostava de citar as vítimas por números e enfiou asmãos nos bolsos.

— O namorado de Carla Johnson em L.A. conseguiu umpequeno papel numa novela. Está limpo. Parece que ela teve umabriga com outro estudante na véspera do assassinato. Testemunhasdisseram que foi muito acalorada.

— O rapaz admitiu — continuou Ed. — Pelo que consta, saí-ram duas vezes e ela não estava mais interessada.

— Álibi?— Ele afirma que se embriagou e pegou uma caloura. — Com

uma encolhida de ombros, Ben sentou-se no braço de uma cadeira.— Estão noivos. Podemos investigá-lo de novo, mas nenhum de nósacredita que ele tenha qualquer coisa a ver com isso. Não tem liga-ção alguma com Barbara Clayton nem com Francie Bowers.Quando investigamos, descobrimos que o rapaz é um típico estu-dante americano de família de classe média-alta, com um bom cur-rículo. Tem mais chance de Ed ser um psicótico do que o universi-tário.

— Obrigado, parceiro.— Bem, investigue-o de novo, mesmo assim. Qual o nome

dele?— Robert Lawrence Dors. Dirige um Honda Civic e usa cami-

sas pólo. — Ben pegou um cigarro. — Mocassins brancos semmeias. — Roderick vai interrogá-lo.

— Espere um minuto...— Estou designando uma força-tarefa pra esse negócio — disse

Harris, interrompendo Ben. Serviu-se uma segunda xícara de café.— Roderick, Lowenstein e Bigsby vão trabalhar com vocês. Queroesse cara antes que ele mate a próxima mulher que por acaso estejacaminhando sozinha. — Manteve a voz branda, moderada e defini-tiva. — Vocês têm algum problema com isso?

Ben encaminhou-se até a janela e olhou para fora. Era pessoal eele sabia bem das coisas.

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— Não, todos queremos o cara.— Inclusive o prefeito — acrescentou Harris, com apenas um

levíssimo traço de ressentimento. — Quer ter condições de dar àimprensa alguma coisa positiva até o final da semana. Chamamosum psiquiatra pra nos dar um perfil.

— Psiquiatra? — Com um arremedo de risada, Ben deu meia-volta. — Por favor, capitão.

Como ele também não gostava da idéia, a voz de Harris gelou:— O Dr. Court concordou em cooperar conosco, a pedido do

prefeito. Não sabemos como ele é, talvez seja hora de descobrirmoso que pensa. A essa altura — acrescentou com um olhar niveladoaos dois policiais —, estou disposto a consultar até uma bola de cris-tal se pudermos conseguir uma pista. Estejam aqui às quatro.

Ben ia abrir a boca, mas captou o olhar de advertência de Ed.Sem uma palavra sequer, os dois saíram.

— Talvez a gente devesse chamar um paranormal.— Mente tacanha.— Realista.— A psique humana é um mistério fascinante.— Você anda lendo de novo.— E os que têm formação para entendê-la podem abrir portas

às quais os leigos apenas batem.Ben suspirou e acendeu o cigarro quando saíram no estaciona-

mento.— Merda!

— MERDA — RESMUNGOU TESS, QUANDO OLHOU PELA JA-

nela do consultório. Não tinha o menor desejo de fazer duas coisasnesse momento. A primeira era batalhar com o tráfego na chuva friae detestável que começara a cair. A segunda, envolver-se com oshomicídios que assolavam a cidade. Teria de fazer a primeira, por-que o prefeito pedira, e seu avô a pressionara a fazer a segunda.

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Já tratava de um número de casos pesado demais. Poderia terrecusado o pedido do prefeito com educação, e até justificativa. O avôera outra história. Nunca se sentia Dra. Teresa Court quando lidavacom ele. Após cinco minutos, não tinha mais um metro e sessenta ecinco de altura, com corpo de mulher e diploma emoldurado empreto atrás. Tornava a ser uma menina magricela de doze anos, domi-nada pela personalidade do homem a quem mais amava no mundo.

Ele garantira a obtenção daquele diploma emoldurado em preto,não garantira? Com sua confiança, pensou, e fé irrestrita nela. Comopodia dizer não quando ele lhe pedia para usar seu talento? Porquetratar do número de casos atuais exigia-lhe dez horas diárias. Talvezfosse o momento de mostrar-se obstinada e contratar uma auxiliar.

Tess olhou o consultório em tons pastéis ao redor, com as seletasantiguidades e aquarelas. Seu, pensou. Cada pedacinho. E o arquivode carvalho alto, de cerca de 1920, cheio de pastas dos pacientes.Também seus. Não, não iria contratar uma auxiliar. Dentro de umano, faria trinta. Tinha sua clientela, o consultório e os própriosproblemas. Era assim mesmo que desejava manter tudo.

Tirando a capa de chuva forrada de vison do armário, enfiou-senela. E talvez, apenas talvez, pudesse ajudar a polícia a encontrar ohomem alardeado nas manchetes dia após dia. Poderia ajudá-los aencontrá-lo e detê-lo, para ele, por sua vez, obter a ajuda de que precisava.

Pegou a bolsa e a pasta, gorda de arquivos a serem selecionadose analisados naquela noite.

— Kate. — Saindo na ante-sala do consultório, ela levantou agola. — Vou ao escritório do capitão Harris. Não passe nenhumaligação, a não ser que seja urgente.

— Devia pôr um chapéu — respondeu a recepcionista.— Tenho um no carro. Até amanhã.— Dirija com cuidado.Já pensando adiante, ela cruzou a porta remexendo na bolsa à

procura das chaves do carro. Talvez pudesse comprar comida

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chinesa para levar a caminho de casa e desfrutar de um jantar tran-qüilo antes de...

— Tess!Mais um passo e teria entrado no elevador. Praguejando baixi-

nho, ela virou-se e conseguiu dar um sorriso.— Frank.Tivera tanto sucesso ao evitá-lo por quase dez dias.— Você é uma moça difícil de encontrar.Ele dirigiu-se a ela. Impecável. Era essa a palavra que sempre lhe

escapava da mente quando via o Dr. F. R. Fuller. Antes de chato. Ochato vestia um terno cinza-perolado da Brooks Brothers e a grava-ta listrada tinha o matiz e o rosa-bebê da camisa Arrow. Cabelospenteados à perfeição no estilo conservador. Ela tentou com esforçonão deixar o sorriso desfazer-se. Não era culpa de Frank a perfeiçãodele não entusiasmá-la.

— Tenho andado ocupada.— Você sabe o que dizem sobre só trabalho, Tess.Ela rangeu os dentes para impedir-se de responder não; o que

era mesmo que diziam? Ele apenas riria e lhe daria o resto do clichê.— Terei simplesmente de correr o risco.Apertou o botão para descer e torceu para que o elevador che-

gasse logo.— Mas está saindo cedo hoje.— Trabalho externo.Ela olhou de propósito para o relógio de pulso. Tinha tempo de

sobra.— E já um pouco atrasada — mentiu, sem escrúpulo.— Venho tentando entrar em contato com você. — Apertando

a palma da mão na parede, Frank curvou-se sobre ela. Mais um doshábitos dele que Tess se viu detestando. — Seria de imaginar queisso não fosse um problema, pois nossos consultórios ficam ao ladoum do outro.

Onde diabo estava um elevador quando se precisava?

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— Sabe como são os horários, Frank.— Na verdade, sei. — O colega vizinho disparou-lhe um sorri-

so de anúncio de pasta de dentes e ela se perguntou se ele achava quesua colônia a enlouquecia. — Mas todos precisamos relaxar de vezem quando, certo, doutora?

— À nossa própria maneira.— Tenho ingressos para a peça de Noel Coward no Centro

Kennedy amanhã à noite. Que tal relaxarmos juntos?Na última vez, a única, que ela concordara em relaxar com ele,

mal escapara com as roupas no corpo. Pior, antes do cabo-de-guerra,quase morrera de tédio durante três horas.

— É gentileza sua pensar em mim, Frank. — Mais uma vez, elamentiu sem hesitação: — Lamento já ter compromisso amanhã.

— Por que a gente não...As portas abriram-se.— Opa, estou atrasada. — Lançando-lhe um sorriso radiante,

ela entrou. — Não trabalhe demais, Frank. Sabe o que dizem.Devido à chuva e ao tráfego intensos, ela consumiu quase todo o

tempo de sobra dirigindo até o distrito policial. O estranho era que abatalha de meia hora a deixou animada. Talvez, pensou, por ter esca-pado tão primorosamente de Frank. Se tivesse coragem, e não tinha,teria apenas lhe dito que ele era um imbecil e seria o fim da história.Até ele encurralá-la além da conta, ela usaria tato e desculpas.

Estendendo a mão ao lado, pegou um chapéu de feltro e amon-toou os cabelos por baixo. Olhou no retrovisor e franziu o nariz. Denada adiantava fazer reparos agora. A chuva os tornaria perda detempo. Mesmo assim, devia ter um banheiro feminino lá dentro,onde pudesse pegar a bolsa de truques mágicos e sair parecendodigna e profissional. Por enquanto, iria apenas parecer molhada.

Com um empurrão, Tess abriu a porta do carro, segurou o cha-péu com a mão e deu uma corrida até o prédio.

— Veja só isso.Ben parou o parceiro nos degraus que levavam à matriz.

Olharam, alheios à chuva, Tess a saltar sobre poças.

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— Belas pernas — comentou Ed.— Se são. Melhores que as de Maggie.— Talvez. — Ed pensou um instante. — Difícil dizer na chuva.Ainda correndo, cabisbaixa, Tess precipitou-se degraus acima e

chocou-se com Ben. Ele ouviu-a praguejar antes de segurar-lhe os om-bros e afastá-la apenas o suficiente para dar uma boa olhada no rosto.

Valia a pena ficar molhado.Elegante. Mesmo com a chuva correndo sobre o rosto, Ben pen-

sou em elegância. O recorte acentuado das maçãs do rosto era forte,alto o bastante para fazê-lo lembrar-se de donzelas viquingues. Bocasuave e molhada, lembrando-lhe outras coisas. A pele clara tinhaapenas um toque rosado. Mas foram os olhos que o fizeram esque-cer a observação superficial que lhe ocorrera. Grandes, frios e apenasum pouco irritados. Violeta. Ele achava que a cor fora reservada aElizabeth Taylor e flores silvestres.

— Desculpe — conseguiu dizer Tess quando recuperou o fôle-go. — Eu não vi você.

— Não. — Ben queria continuar encarando-a, mas deu umjeito de afastar o olhar. Tinha uma reputação mítica com mulheres.Exagerada, mas baseada em fatos. — À velocidade que você corria,não me surpreende. — Era agradável segurá-la, ver a chuva grudar-se nos cílios. — Eu podia detê-la por atacar um policial.

— A senhora está ficando molhada — murmurou Ed.Até então, Tess tivera consciência apenas do homem que a segu-

rava, encarando-a como se houvesse surgido numa baforada defumaça. Agora se forçou a desviar o olhar e examinar e avaliar ooutro homem de cima a baixo. Viu um gigante molhado, de olhossorridentes e uma massa de cabelos ruivos gotejantes. Era uma dele-gacia de polícia, pensou, ou um conto de fadas?

Ben manteve uma das mãos no braço dela ao abrir a porta.Deixou-a entrar, mas não iria deixá-la escapulir. Ainda não.

Tão logo entrou, Tess lançou outro olhar a Ed, decidiu que erareal e desviou-o para Ben. Também. E ele continuava segurando seubraço. Sorrindo, ela ergueu uma sobrancelha.

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— Policial, informo que, se me prender por ataque, eu vou darqueixa de brutalidade policial. — Quando ele sorriu, ela sentiualguma coisa dar um clique. Então não era tão inofensivo quantoachara. — Agora, se me der licença...

— Esqueça as acusações. Se precisar resolver uma multa porestacionamento...

— Sargento...— Detetive — ele corrigiu. — Ben.— Detetive, talvez eu aceite sua oferta outra hora, mas no

momento estou meio atrasada. Se quiser ser útil...— Sou um funcionário público.— Então pode soltar meu braço e me dizer onde encontro o

capitão Harris?— Capitão Harris? Homicídios?Ela viu a surpresa, a desconfiança, e sentiu o braço livre.

Intrigada, inclinou a cabeça e retirou o chapéu. Os cabelos louro-claros caíram-lhe sobre os ombros.

— Isso mesmo.Ben deslizou o olhar pela queda dos cabelos e tornou a olhar o

rosto dela. Não se encaixava, pensou. Ele desconfiava de coisas quenão se encaixavam.

— Dra. Court?Sempre era necessário um esforço para enfrentar descortesia e

cinismo com graça. Tess não se incomodou em fazê-lo.— Isso mesmo mais uma vez... Detetive.— Você é psiquiatra?Ela devolveu-lhe um olhar idêntico.— Você é policial?Cada um poderia ter acrescentado uma coisa não muito lisonjei-

ra se Ed não desatasse a rir.— Soou a campainha pro primeiro round — disse, apaziguan-

do. — O escritório de Harris é uma área neutra.Tomou o braço de Tess e mostrou-lhe o caminho.

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